Comparação entre os Miocárdios Ventriculares

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Arq Bras Cardiol
volume 72, (nº 5), 1999
Xavier-Vidal
e Madi
Artigo
Original
Miocárdios ventriculares D e E no feto
Comparação entre os Miocárdios Ventriculares Direito e Esquerdo
durante Período Fetal Humano. Uma Avaliação Estereológica
Ricardo Xavier-Vidal, Kalil Madi
Rio de Janeiro, RJ
Objetivo - Desenvolver uma comparação estereológica entre estruturas miocárdicas dos ventrículos direito (VD) e esquerdo (VE), durante o 3o trimestre gestacional humano.
Métodos - Foram utilizados 5 corações fetais humanos do 3o trimestre gestacional e obtidas amostras representativas de 5 miocárdios ventriculares direitos e 4 esquerdos. O material foi fixado em formaldeído a 10%,
tamponado e processado por métodos de rotina e contados
15 campos microscópicos aleatórios em cada miocárdio
ventricular com uso de um sistema teste “M-42”. Os seguintes parâmetros estereológicos foram avaliados: Vv (%), Lv
(µm2), Sv (µm2/mm3), Vp (µm3), Nv (1/µm3) e N total.
Resultados – Não foi demonstrada diferença significativa entre qualquer dos parâmetros estereológicos das
estruturas miocárdicas avaliadas, quando comparados os
VD e VE.
Conclusão - Os miocárdios ventriculares humanos direito e esquerdo se aparentam bastante similares durante o
período fetal, pelo menos quanto a sua questão estrutural.
Palavras-chave: desenvolvimento cardíaco, fetos, morfologia, morfometria, estereologia,
biometria
Hospital Universitário Clementino Fraga Filho - UFRJ.
Correspondência: Prof. Ricardo Xavier-Vidal - ASSOCIAÇÃO XAVIER-VIDAL para
Direitos Humanos, Ciência, Tecnologia e Desenvolvimento, Caixa Postal 100.768,
Niterói, RJ, Brasil, Cep 24001-970. E-mail: rxavier-vidal@interclub. com.br
Recebido para publicação em 21/9/98
Aceito em 6/1/99
Apesar de atualmente possuirmos um nível razoável
de conhecimento do desenvolvimento cardíaco intrauterino, certos detalhes do desenvolvimento cardiovascular ainda têm sido motivo de várias discussões científicas
ou solucionados nos últimos anos, merecendo, ainda, confirmações dos resultados, tanto nas mesmas como em outras espécies 1-10. É também importante avaliarmos as diferenças interespecíficas, de forma a evitarmos erros grosseiros de interpretação dos resultados obtidos 9-11. Ainda que
as diferenças entre estruturas miocárdicas ventriculares direita e esquerda, em um mesmo indivíduo, durante o desenvolvimento, sejam alvo de algumas controvérsias, poucos
trabalhos têm enfocado o assunto 12,13.
Um aspecto relevante nas avaliações cardiovasculares
de estudos anatomopatológicos é que a causa mortis pode
ser mais rapidamente esclarecida, durante o período perinatal, quando o óbito foi fruto de malformações macroscópicas. Contudo, as dificuldades tornam-se maiores quando os eventos estão principalmente vinculados às esferas
estruturais microscópicas 14. Por exemplo, ainda que alterações miocárdicas durante a morte súbita na infância tenham
sido descritas, o conhecimento nessa área continua sendo
incipiente 14,15. Nos países industrializados, a morte súbita
perfaz cerca de 300 a 400 mil óbitos por ano e as doenças
cardíacas coronarianas perfazem de 80 a 90% do total de
casos. É sabido que cerca de 50% das mortes por doenças
cardíacas coronarianas são súbitas, sendo as anomalias
congênitas das artérias coronárias eventos de grande importância para a ocorrência dessas mortes 16. Essas anomalias coronarianas, possivelmente, levam a alterações do leito
capilar e da estrutura geral do miocárdio, que, provavelmente, são significativas para a mortalidade perinatal. Por exemplo, ainda que a parada cardiorrespiratória súbita em crianças seja muito rara (com resultados de reanimação nem sempre muito animadores) e a fibrilação ventricular ocorra em
menos de 10% durante esse evento, estas ocorrências são
mais comuns nas crianças portadoras de cardiopatias congênitas 17. As paradas cardiorrespiratórias aliadas ou não a
anomalias congênitas, levam, em muitos casos, a algum tipo
de alteração cardíaca que pode chegar a algum grau de reor-
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ganização estrutural do miocárdio. A morte súbita após
infarto do miocárdio é, usualmente, atribuída a anormalidades na eletrofisiologia celular causada pela isquemia. Contudo, a morte súbita parece estar antes vinculada ao processo de cicatrização pós-infarto, já que o subseqüente e persistente potencial arritmogênico emergente não é dependente, primariamente, do efeito da isquemia na eletrofisiologia celular, mas, antes, da alteração da estabilidade da
estrutura tecidual lesada e em reparo 18. Assim, avaliar a organização estrutural do tecido miocárdico, definindo o padrão normal, é de importância científica, já que bebês de corações anormais e/ou acometidos de morte súbita parecem
possuir, pelo menos o número de núcleos (Nv) dos miócitos
por unidade de volume no miocárdio, inferior aos padrões
normais 13. Outra importante alteração tecidual, em casos de
síndrome de morte súbita em bebês, é a ocorrência de fibrose reativa (fibrose intersticial) 15, onde é possível, neste aspecto, o envolvimento do débito do óxido nítrico 19. Esta
fibrose, também pode ser sensível à avaliação pelo método
estereológico.
O objetivo deste trabalho é desenvolver uma comparação estereológica entre a estrutura miocárdica normal dos
ventrículos direito (VD) e esquerdo (VE) durante o 3o trimestre gestacional humano.
Métodos
Foram utilizados cinco corações fetais humanos do 3o
trimestre gestacional, com amostras representativas de cinco miocárdios ventriculares direitos e quatro esquerdos obtidas da parede cardíaca livre. Os fetos foram obtidos de abortos espontâneos e a idade materna e o sexo dos mesmos não
puderam ser considerados para as abordagens aqui desenvolvidas. Os fetos foram datados segundo avaliação do
comprimento do maior pé 20-23. O material foi fixado em
formaldeído a 10% tamponado, processado por métodos de
rotina, cortado em 5µm e corado com hematoxilina-eosina.
O efeito Holmes, o erro de superestimação 24, é considerado como sendo inexistente com o uso do método Disector 25-29. Para as avaliações estereológicas foram contados 15 campos microscópicos aleatórios em cada miocárdio ventricular, seja esquerdo como direito. As contagens
foram desenvolvidas com um sistema teste “M-42” montado em uma ocular Nikon CFW (10X) e uma objetiva de
imersão (100X). Foram contados números de estruturas e
de pontos e interseções sobrepostas às estruturas consideradas. Foram consideradas diferenças significativas entre os grupos aquelas que no teste de Student obtiveram
um p<0,05 30-31. Os parâmetros estereológicos considerados foram os seguintes 25,27,28-32: a) Vv% - densidade volumétrica 32.
PP
Vv% =
PT
* 100
onde: P P = pontos contados, P T = total de pontos
do sistema-teste; b) Sv (µ m2/µ m 3) - densidade de su582
perfície 32. Sv = 2 x I l; onde: Il = interseções das estruturas sobre as linhas teste; c) Nv (1/mm3) - densidade numérica [25-27].
S QNv =
S V(dis)
V(dis) = t x AT ; onde: V(dis) = volume do Disector; t = espessura da microtomia; At = área do sistema teste; S Q- =
somatório das estruturas contadas em uma das faces do
corte histológico; S V(dis) = somatório do volume do Disector; d) Vp (µm3) - volume ponderal 28. Vp = Vv/Nv; e) LV (µm2)
- densidade de comprimento 32; Lv = 2 x Qa, Qa (µm-2) - densidade de perfis na área teste.
S perfis
Qa =
At
onde: S perfis = número de estruturas na área-teste. At =
área-teste; f) N - número total de estruturas no órgão 27. N =
Nv (mm3) x peso cardíaco (mg).
Resultados
Nossos resultados não demonstraram diferença significativa entre quaisquer dos parâmetros estereológicos das
estruturas miocárdicas avaliadas, demonstrado na tabela I e
figuras 1 a 3. Desenvolvemos aqui, uma avaliação quantitativa miocárdica, tanto para miócitos, como para os seus respectivos núcleos. Os valores que não foram incluídos na
tabela I, já foram alvo de artigos anteriores e estão comentados na discussão.
Discussão
Ainda que alguns trabalhos tenham sido desenvolvidos nos últimos anos, o número de estudos quantitativos
estereológicos e alométricos sobre o miocárdio durante o
período fetal humano continua sendo de pouca expressão
na literatura científica 33-38. A comparação entre dados de
indivíduos humanos e de animais é importante para evitarmos distorções de interpretação, que podem ocorrer a partir
dos estudos experimentais 9,11. Os modelos morfométricos
são importantes para determinar tanto as variações fisiológicas como as variações mórbidas que ocorrem nos tecidos
biológicos 26-27,39-43.
O grau de proliferação/hipertrofia dos cardiomiócitos
durante o período perinatal, ainda é foco de algumas controvérsias 5,44,45. O grau de regeneração do miocárdio durante a
vida perinatal varia de forma, diretamente, proporcional com
o potencial de proliferação celular 5. Foi sugerido que diferenças de leito capilar poderiam ser responsáveis pela diferença no padrão de crescimento entre os VD e VE 12. Outros
autores, contudo, têm identificado um padrão de crescimento similar do Nv dos miócitos (por unidade de volume no
miocárdio), em ambos os ventrículos, durante o período
perinatal 13. Nossos resultados não demonstraram diferen-
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Tabela I - Comparação entre os parâmetros estereológicos dos miocárdios ventriculares esquerdo e direito de fetos humanos do 3º trimestre
gestacional (média/erro padrão)
VE (n=4)
VD (n=5)
p
-
64,64/1,76
29,14/1,26
6,22/0,81
-
1366,45/63,30
-
1203,03/58,58
174,06/45,63
>0,05
-
Sv (1/µm2)
Vasos
1,63E-02/5,67E-03
2,41E-02/5,58E-03
>0,05
Lv (µm2)
Vasos
4,32E-04/1,53E-04
5,40E-04/1,03E-04
>0,05
561028,21/42908,17
43156,02/15284,33
547116,74/40675,67
399675,48/41712,1
54021,18/10321,14
>0,05
>0,05
1,51E+10/1,97E+09
<0,001
Vv(%)
Miócitos
Tecido conjuntivo (evs)
Vasos sangüíneos
Vp (µm3)
Miócito
Núcleo
3
Nv (1/mm )
Miócito
Núcleo
Vasos
Número total de estruturas (“N”) (n = 4, tanto para VE como para VD)
Miócito
1,55E+10/1,40E+09
evs = excuindo vasos sanguíneos; E = notação científica; neste caso a vírgula deverá ser levada até o número de casas decimais do número situado imediatamente
após o sinal. E+, para a esquerda do número (direita do leitor) e E- para a direita do número (esquerda do leitor).
ças significativas entre os parâmetros estereológicos relativos aos vasos sangüíneos, quando comparamos os VD e
VE humanos. Contudo, é possível que um aumento no número de campos a serem contados — e aumento no número de
corações considerados — forneça diferenças significativas
para as avaliações de vascularização miocárdicas. Um número de campos significativo a serem contados para uma abordagem relativa aos miócitos gira em torno de 10 campos por
ventrículo, porém, para uma abordagem significativa específica aos vasos sangüíneos, o número de campos deve ser
sensivelmente maior, situando-se em torno de 142 campos por
miocárdio ventricular 46,47. Um outro exemplo ocorre no rato
adulto, já que para uma avaliação consistente dos vasos
miocárdicos desses animais é também necessário um número
de campos bem superior aquele obrigatório para abordagens
relativas aos miócitos e tecido conjuntivo 43. Nesse caso o
número de campos a serem contados deve se situar em torno
de 422 campos por miocárdio ventricular 46,47.
Estudos relativos aos núcleos dos cardiomiócitos são
importantes, por exemplo, para a identificação da orientação
dos próprios feixes de cardiomiócitos no miocárdio, o que
pode ser desenvolvido através do uso do confocal laser 48.
Particularmente em certas cardiomiopatias, têm sido descritos
desarranjos na orientação dos feixes dos cardiomiócitos 49-52.
É sabido que estas enfermidades também são passíveis de
acometerem os indivíduos humanos, pelo menos, desde sua
idade tenra 14. Provavelmente, a mais enfática diferença entre o miocárdio do coração de um bebê e o miocárdio do coração de um adulto é o diâmetro dos miócitos, que é bem
menor no bebê. Também no bebê o núcleo é proporcionalmente maior que na célula adulta. Outras características importantes são que, no bebê, o endocárdio e o epicárdio são
mais finos, com o epicárdio se apresentando com bem menos acúmulo de tecido adiposo 15.
Volume
ponderal
µm3
a
a
b
b
VD-VE, p > 0,06
a = cardiomiócitos; b = núcleos
Fig. 1 - Gráfico comparando a densidade volumétrica dos cardiomiócitos, tecido conjuntivo e vasos sangüíneos dos ventrículos direito e esquerdo.
Fig. 2 - Gráfico comparando o volume ponderal dos cardiomiócitos e núcleos dos
cardiomiócitos dos ventrículos direito e esquerdo.
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Nv
1/mm3
a
a
b
b
c
c
VD-VE, p > 0,06
a = cardiomiócitos; b = núcleos; c = vasos
Fig. 3 - Gráfico comparando a densidade numérica dos cardiomiócitos, núcleos dos
cardiomiócitos e vasos sangüíneos dos ventrículos direito e esquerdo.
Em análise estereológica, usando o método Disector,
identificamos uma redução do Nv (1/mm3) relativa aos núcleos dos miócitos do miocárdio ventricular esquerdo de 703948
(EP = 70490) para 397304 (EP = 27362), do 2o para o 3o trimestre
gestacional, respectivamente. A média (2o + 3o trimestres) se
situou em 550626/mm3. Contudo, o número total de núcleos
(N) no coração cresceu significativamente de 2101152700 (EP
449634529) no 2o trimestre para 11147569300 (EP 2222847632)
no 3o trimestre gestacional, o que ocorre por razão do aumento do volume do próprio coração ao longo do tempo (p<0,06;
Mann-Whitney Rank Sum Test). Em humanos, o Vv% do
núcleo apresenta uma redução significativa durante o desenvolvimento fetal, a partir do 2o para 3o trimestre gestacional 36. Os componentes da parede ventricular, como
miócitos, tecido conjuntivo e vasos, contudo, mantêm uma
relação proporcional do 2o para o 3o trimestre gestacional 33.
No rato, durante os períodos fetal e perinatal, o crescimento
do coração se dá em grande intensidade pelo aumento do
número de células miocárdicas, o que cessa após aproximadamente duas semanas de idade. Após este período, o crescimento se dá antes por hipertrofia do que por aumento do
número de miócitos, que acaba por cessar seu processo de
divisão 1,53.
A densidade volumétrica (Vv%) diz respeito à proporção das estruturas avaliadas no órgão ou tecido em estudo 32.
Em artigo anterior, identificamos para o VE, no 3º trimestre, a
Vv% dos miócitos, tecido conjuntivo (excluindo vasos) e
vasos sangüíneos como 67.67, 25.94 e 6.39, respectivamente 33, enquanto que no presente artigo os valores para o VD
foram, respectivamente, 64.64, 29.14 e 6.22. Testando a diferença entre as amostras, não identificamos diferenças significativas entre as duas paredes ventriculares (p>0,05). Também em artigo anterior 36, avaliando o número de núcleos
(Nv) e o seu volume (Vp), no VE, igualmente durante o 3º trimestre gestacional, encontramos valores para o Nv de 397304 (1/mm3) e para o Vp de 97,66 (µm3). No presente artigo
os valores do VD para o Nv e Vp foram, respectivamente,
584
399675,48 (1/mm3) e 174,06 (µm3). Testando a diferença entre
as amostras, não identificamos diferenças significativas
entre as duas paredes ventriculares (p>0,05). O volume
ponderal (Vp) é o volume da célula (ou estrutura) obtido de
forma indireta, como aqui descrito (Vp = Vv/Nv) 28. Para a
obtenção do volume direto é necessário uso do método de
Cavalieri (com cortes seriados ou alternados), que também
é um método morfométrico 47. A densidade numérica (Nv)
diz respeito ao número de estruturas por determinado volume (por exemplo mm3) 25-27. Neste caso, nem sempre o número de células é muito próximo ao número de seus núcleos
em dado volume. No presente trabalho, enquanto o número
de miócitos no VD é de 547116,74, o Nv é de 399675,48, ficando, contudo, bem claro a visibilização no coração hipertrofiado por algum processo mórbido, quando comparamos
com um coração normal. Quanto mais volumosa é a célula,
mais raramente os núcleos das células são visibilizados no
interior da grade de contagem. Da mesma forma, é mais comum se encontrar mais núcleos dos cardiomiócitos de fetos
humanos dentro da grade de contagem, do que os núcleos
dos cardiomiócitos de um indivíduo humano adulto.
Porter e Bankston 3, estudando fetos de ratos, encontraram a Vv% média para os miócitos cardíacos de 85,6%,
para o tecido conjuntivo de 2,8% (excluindo vasos) e para os
vasos 11,6%. Zak 45 e Weber 54 estimam que os miócitos do
miocárdio ventricular no adulto ocupam 75% do espaço estrutural, enquanto que o interstício cardíaco (substância
intercelular incluindo vasos) ocupam os restantes 25%.
Santos e Mandarim-de-Lacerda 38, desenvolvendo também
um estudo estereológico durante o 3o trimestre gestacional,
obtiveram resultados em parte próximos aos nossos. As
médias encontradas foram: para a Vv% de 77,8% no caso dos
cardiomiócitos e de 22,2% para o interstício. O Nv do cardiomiócito (calculado a partir do número de seus núcleos) foi de
574000/mm3. O volume do miócito foi de 1412,3 µm3. O “N”
total médio dos miócitos por coração foi de 5,06E+09.
Os resultados do presente artigo não demonstraram
diferença significativa entre quaisquer dos parâmetros
estereológicos das estruturas miocárdicas avaliadas, comparando os miocárdios ventriculares direito e esquerdo,
sugerindo que, pelo menos quanto a questão estrutural, os
miocárdios ventriculares humanos direito e esquerdo se
apresentam bastante similares durante o período fetal. Entretanto, pelo menos no rato adulto, é possível que haja diferenças quanto a determinados detalhes bioquímicos, já
que, por exemplo, o VD tende a ser notavelmente mais sensível às lesões fruto do bloqueio sistêmico do óxido nítrico
(modelo L-NAME) do que o VE, contudo, também é possível
que essa maior intensidade de lesões ocorrera por razão da
maior demanda do VE durante o processo hipertensivo
neste modelo 19.
Os outros parâmetros estereológicos, aqui estudados, como, densidade de superfície (Sv, 1/µm2) e densidade
de comprimento (Lv, µm2) foram utilizados apenas para vasos sangüíneos. A densidade de comprimento (Lv, µm2) diz
respeito à variação no comprimento das estruturas avaliadas. Já densidade de superfície (Sv, 1/µm2) é o valor relacio-
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nado à variação da superfície de contato com o meio externo
e é sensível à variação no volume da estrutura avaliada. A
avaliação da hipertrofia celular é uma maneira clara de entender a sensibilidade da densidade de superfície. Em trabalho anterior 43, avaliando o processo hipertensivo e a hipertrofia cardíaca via bloqueio sistêmico do óxido nítrico (modelo L-NAME), encontramos nos cardiomiócitos normais
(controles) a densidade de superfície (Sv) média igual a
0,152 (1/µm2), enquanto que nos cardiomiócitos hipertrofiados, identificamos um aumento do seu volume médio em
cerca de 30%, com redução da densidade de superfície média para 0,0812 (1/µm2) (p<0,001).
Atualmente, com o avanço dos equipamentos de
microscopia acoplados a equipamentos que utilizam
softwares para tratamento de imagens, como no caso do
confocal laser, é possível fazer observações em planos profundos nos tecidos sejam fixados ou vivos. Nessas análises, utilizam-se focos finos e precisos em um único plano.
Esses planos podem ser aprofundados no tecido de forma a
se obter imagens seqüenciais ao longo das estruturas. E
assim, é possível estipular a profundidade do plano focal de
visibilização, por exemplo, em 2 e 7 µm de profundidade, o
que facilita muitíssimo as observações segundo o método
Disector 55. O foco em um único plano, como ocorre em aparelhos confocais, torna inexistente o efeito Holmes 24. Análises por reconstruções tridimensionais são também possíveis de desenvolvimento em aparelhos como esses 55. O
confocal laser possui uma versatilidade muito acentuada,
prestando-se tanto para estudos de identificação de estruturas de adesão como as gap junctions 56 e do aparecimento
de moléculas de adesão durante o período embrionário 57 até
o estudo da orientação dos feixes de células musculares no
tecido cardíaco 55.
Agradecimentos
Aos Profs. W.S. Costa, C.A. Mandarim-de-Lacerda,
Vera Aires, M. Costa-Neves, W.N. Viana, V.C. Villar, L.R. Mendes Barboza, M. Guimarães e Dempson Chilinque, pelo incentivo. Apoio da CAPES, CNPq e CIC-HUCFF/UFRJ, AXV.
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