200 A FILOSOFIA E O ENSINO SECUNDÁRIO: UMA ABORDAGEM HISTÓRICA NO CONTEXTO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA Raryson Maciel ROCHA RESUMO A história da Filosofia, enquanto disciplina no currículo escolar brasileiro, está ligada também à história do ensino secundário no país com suas reformas e reestruturações nesses quase quinhentos anos de existência da educação nacional. Todavia, a educação de nível médio, em cada momento histórico brasileiro, sempre se configurou de tal modo a atender melhor cada sistema políticoideológico vigente. Levamos em conta para essa afirmação, a partir das leituras realizadas, a importância que os governantes deram à educação, porém, não como requisito de formação críticoemancipatória e política, mas como elemento para difundir ideologias, assim como instrumento de sustentação das ordens socioeconômicas que estiveram presentes no país desde o período colonial. O objetivo do presente artigo é evidenciar os inúmeros golpes sofridos pelo ensino de Filosofia no Brasil e, como consequência disso, expor o seu não desenvolvimento, de maneira efetiva, em uma educação crítica nacional. Para alcançarmos concretização do trabalho, utilizamos pesquisa do tipo bibliográfica e documental, com a abordagem qualitativa para a análise dos dados encontrados. Ressaltamos que o presente trabalho é resultado parcial da pesquisa sobre o ensino de Filosofia no ensino de nível médio brasileiro. Após primeiras análises, percebemos que o ensino de Filosofia na educação média brasileira sempre se mostrou estéril ao pensamento crítico-político, assim, ajudando a alicerçar a ideologia política e econômica dos governos durante a história. PALAVRAS-CHAVE: Filosofia. Educação. Ensino secundário. INTRODUÇÃO A história da Filosofia, enquanto disciplina no currículo escolar brasileiro, está ligada também à história do ensino secundário no país com suas reformas e reestruturações nesses mais de quinhentos anos de existência da educação nacional. Todavia, a educação de nível médio, em cada momento histórico brasileiro, sempre se configurou de tal modo a atender melhor cada sistema político-ideológico vigente. Levamos em conta para essa afirmação, a partir das leituras realizadas, a importância que os governantes deram à educação, porém, não como requisito de formação crítico-emancipatória e política, mas como elemento para difundir ideologias, assim como instrumento de sustentação das ordens socioeconômicas que estiveram presentes no país desde o período colonial. Para alcançarmos a proposta do artigo, discutiremos os períodos históricos separadamente, evidenciando os golpes desferidos no ensino de Filosofia, justificado pelo momento político vivido em cada época, o que resultou ora em um ensino acrítico, em defesa de uma ideologia do Estado, ora em sua exclusão do currículo escolar brasileiro. ROCHA, Raryson Maciel. A filosofia e o ensino secundário: uma abordagem histórica no contexto da educação brasileira. ANAIS do III Colóquio de Letras da FALE/CUMB, Universidade Federal do Pará, Breves, 18, 10 e 20 fevereiro 2016. ISSN 2358-1131 201 1 - A COMPANHIA DE JESUS E O ENSINO DE FILOSOFIA A partir do ano de 1555 a Companhia de Jesus1 dirigiu seus esforços aos trabalhos educacionais. Seus trabalhos nas instituições escolares, com a aprovação da Coroa portuguesa, têm início primeiramente em Portugal e posteriormente na colônia. Assim, as […] instituições escolares, ou seja, [...] colégios de ensino secundário e universidades: em Coimbra, por exemplo, o Colégios das artes humanísticas, preparatório para a Universidade, passou a ser controlado pelos jesuítas desde 1555. […] quando o trabalho missionário se rearticulou por volta dos fins da década de 60, os jesuítas abrem uma terceira frente de atividades: os colégios para os filhos dos colonos (HILSDORF, 2011, p. 08, grifos do autor). No entanto, a realidade educacional nunca despropositada – nesse ponto entende-se a educação como aquela que defende um interesse, ideologia ou mesmo um valor – se encontra fortemente influenciada, principalmente, pelos “interesses econômicos europeus, o pragmatismo imperialista português, a consciência ocidental portuguesa marcada pela fé cristã, pelo desejo de expandi-la e derrotar o protestantismo” (SILVA, 2009, p. 1). Assim, a atuação educacional jesuítica, em conformidade com a visão religiosa do Concílio de Trento2, acabava por difundir dentro dos Colégios e Universidades uma educação que salvaguardasse a fé católica, tornando o ensino de Filosofia um instrumento de firmação da mesma. Nesse período, a presença religiosa, assim como a manipulação dos conteúdos a serem ministrados dentro das instituições escolares, é tão forte que […] os professores de filosofia são obrigados a jurar, periodicamente, com toda a solenidade, sua obediência à fé católica. A ação fiscalizadora do Santo Ofício, a catequese da Companhia de Jesus e a vigilância do Paço fixaram balizas ao ambiente do pensamento [...] (VITA, 1969 apud SILVA, 2009 p. 05). A partir da formulação da Ratio Studiorum3, o pensamento difundido dentro dos Colégios e Universidades buscou resgatar a máxima da Segunda Escolástica, tornando obrigatório o estudo dos 1 A Ordem dos Jesuítas, mais conhecida como Companhia de Jesus, foi criada em 1539 por Inácio de Loyola e tendo sua Constituição aprovada pelo Papa Paulo III, em 1540. Surgi com objetivo missionário e, pouco tempo depois, a ordem se consagra, também, ao ensino (CORRER, 2006, p. s/n). 2 [...] realizado de 1545 a 1563, é certamente um dos mais importantes, sendo talvez aquele que goza de maior notoriedade, embora não tenha sido o mais numeroso nem o mais faustoso [...]. A importância desse concílio está no fato de que ele a) tomou clara posição doutrinária acerca das teses dos protestantes e b) promoveu a renovação da disciplina da Igreja, tão invocada pelos cristãos há muito tempo, dando indicações precisas a respeito da formação e do comportamento do clero” (REALE; ANTISERI, 2007, p. 121). 3 Plano pedagógico formulado pela Companhia de Jesus, aprovado e publicado em 1599, após mais de 15 anos de seu trabalho redacional. Continha 467 regras que organizavam o ensino nas escolas portuguesas e é considerado um dos mais singulares documentos filosófico-pedagógico do século XVI. Seu título completo é Ratio atque Institutio Studiorum Societatis Jesu. (CORRER, 2006, p. s/n). ROCHA, Raryson Maciel. A filosofia e o ensino secundário: uma abordagem histórica no contexto da educação brasileira. ANAIS do III Colóquio de Letras da FALE/CUMB, Universidade Federal do Pará, Breves, 18, 10 e 20 fevereiro 2016. ISSN 2358-1131 202 textos de Sto. Tomás de Aquino4 e alguns pré-selecionados de Aristóteles, excluindo os autores que não se enquadravam nesta forma de pensamento. Desse modo, devido à educação filosófica jesuítica, desde o ensino secundário, estar voltada para proteção da doutrina católica, embasada, sobretudo, em um ensino verbalístico, “a cultura filosófica passa a ser mero comentário teológico, fundado, principalmente na renovação da escolástica aristotélica” (CARTOLANO, 1985 apud SILVA, 2009, p. 5). É importante ressaltar que, devido o resgate dos estudos escolásticos, os jesuítas se valem da máxima “philosophia ancilla theologiae”5 empregada na idade média para marcar o verdadeiro lugar do ensino filosófico dentro da Igreja. Segundo Silva (2009, p. 13), [...] a filosofia era considerada, pelos jesuítas, um conhecimento básico na formação do homem, mas esta estava subordinada e a serviço da teologia. Era, portanto, a filosofia da Escola, particularmente, da escola única, totalmente desvinculada da realidade circundante. Cabia ao professor de filosofia apenas os estudos e os comentários seletos das obras de Aristóteles, enquanto preparação para o estudo e a compreensão da Suma Teológica de São Tomás de Aquino, a única obra, além da Bíblia e das resoluções do Concílio de Trento, que era trabalhado no curso de Teologia. Outra característica importante da educação filosófica nesse período é que o ensino da Filosofia, igualmente como a educação secundária, era destinado a garantir o futuro dos filhos da elite colonial, “esses [...] seriam ou padres ou advogados, ocupariam cargos públicos, possibilitariam a sociedade se reproduzir” (PAIVA, 2010, p. 44). Assim, por conta do ensino elitista, a educação filosófica além de ser verbalística, inclinada a auxiliar a manutenção da doutrina da Igreja e de seguir as diretrizes humanistas clássicas, estava fadada a não ter nenhuma preocupação utilitária e a permanecer totalmente distante da realidade social. Desta forma, [...] a filosofia era assim considerada uma disciplina livresca. Da Europa ela nos vinha já feita. Era sinal de grande cultura o simples fato de saber reproduzir as idéias mais recentes chegadas. A novidade supria o espírito de análise, a curiosidade supria a crítica [...] (COSTA, 1967 apud MAZAI, 2001, p. 3). 4 Santo Tomás de Aquino o maior expoente e ponto de culminância do pensamento escolástico, considerado o maior dos filósofos da Idade Média e um dos maiores pensadores da história. Discípulo de Santo Alberto Magno, tornou-se um verdadeiro gênio metafísico e elaborador de um sistema de pensamento admirável pela transparência lógica, tendo o pensamento aristotélico como um de seus principais apoios. (REALE; ANTISERI, 2007, p. 552) 5 Essa ideia é defendia pelos escolásticos na Idade Média, principalmente a partir da abertura da Igreja para o estudo do pensamento de Aristóteles. “O séc. XIII foi marcado por intensos debates a respeito da idéia servil da Filosofia para a Teologia. É considerado […] o século da aceitação ou da rejeição de Aristóteles, do repensamento de sua doutrina no contexto das verdades cristãs ou de sua “cristianização”. Em suma, trata-se da questão da relação sistemática entre fé e razão, entre filosofia e teologia. As modalidades de concordância ou as relações recíprocas entre uma e outra assumiram diversas tonalidades, mas o certo que o objetivo desse intenso debate, que se prolongaria por todo o século, seria o da submissão definitiva da razão a fé, da filosofia à teologia, da ciência a sabedoria”. (REALE; ANTISERI, 2007, p. 532) ROCHA, Raryson Maciel. A filosofia e o ensino secundário: uma abordagem histórica no contexto da educação brasileira. ANAIS do III Colóquio de Letras da FALE/CUMB, Universidade Federal do Pará, Breves, 18, 10 e 20 fevereiro 2016. ISSN 2358-1131 203 Os jesuítas responsabilizaram-se pelo ensino em Portugal e na Colônia brasileira por pouco mais de dois séculos. Entretanto, a reforma pombalina no século XVIII obrigou os jesuítas a abandonarem o ensino em Portugal e na Colônia e deixar para trás tudo o que fora por eles conseguido. As reformas na educação brasileira a partir dessa época foram de extrema significância, principalmente, para o ensino de filosofia que acolherá um aspecto mais cientificista abandonando, aos poucos, o eclesiástico. 2 – A FILOSOFIA NA EDUCAÇÃO POMBALINA E IMPERIAL Com pouco mais de dois séculos a frente da educação - na Colônia e em Portugal -, cai o domínio educacional jesuítico com a nomeação de Sebastião José Carvalho e Melo à Ministro Principal do Reino português, o qual futuramente ficaria conhecido como Marquês de Pombal. Suas ideias inovadoras, influenciadas pelo Iluminismo europeu, buscaram reformular os aspectos político, social, cultural e principalmente educacional no Reino. As reformas por ele feitas foram enquadradas dentro do que ficou conhecido como despotismo iluminista, sendo criticado pelos nobres e pela ordem jesuítica da época. O enfoque educacional jesuítico voltado para a defesa da fé católica “representava um obstáculo e uma fonte de resistência às tentativas de implantação da nova filosofia iluminista que se difundia rapidamente por toda a Europa” (MACIEL; NETO, 2006, p. 469). Por conta disso, e além de outros motivos aqui não expostos, a aversão de Pombal pelos jesuítas tornou inevitável a expulsão da Ordem do processo educacional português. Desta forma, Pombal, transferindo a responsabilidade da educação para o Estado, destituiu os padres jesuítas dos seus cargos de mestres e [...] em 28/6/1759 fecha os colégios jesuíticos em todo o reino e funda, nas cabeças de comarca, aulas régias avulsas secundárias – para meninos – de gramática latina, grega e hebraica, de retórica e de filosofia, a serem preenchidas por professores escolhidos em concurso público e pagos pelo Erário Régio, portanto, contratados como funcionários do Estado (HILSDORF, 2011, p. 20, grifos do autor). Nesse momento, a metodologia educacional de caráter puramente eclesiástico é derrubada pelo espírito moderno da escola pública e laica. Em decorrência do fato, a mudança do pensamento religioso para o cientificista suscitado pelo iluminismo moderno, trouxe consequências diretas para o ensino da Filosofia devido, agora, a mesma está voltada “para a formação profissional e não mais como um ensino propedêutico visando a formação sacerdotal e a propagação da fé cristã” (MAZAI 2001, p. 05). Assim, passaram a ser usados ROCHA, Raryson Maciel. A filosofia e o ensino secundário: uma abordagem histórica no contexto da educação brasileira. ANAIS do III Colóquio de Letras da FALE/CUMB, Universidade Federal do Pará, Breves, 18, 10 e 20 fevereiro 2016. ISSN 2358-1131 204 [...] nas aulas de filosofia [...] texto de Verney, Genovesi e outros autores do método científico-indutivo, fazendo da “filosofia natural”, isto é, da física, a disciplina central do curso, no lugar da moral prática ou “lição de casos de consciência”, que era a disciplina central no currículo filosófico dos jesuítas (HILSDORF, 2011, p. 21). Contudo, as reformas pombalinas não conseguiram alcançar as metas previstas. Por não haver uma imediata sistematização da educação portuguesa acumulam-se à ela consequências negativas, após a expulsão dos jesuítas. As propostas apresentadas pela reforma educacional pombalina nunca obtiveram, de fato, a realização seus objetivos, devido ao não sucesso de tais reformas em preencher a grande lacuna deixada pela Companhia de Jesus. Assim sendo, da [...] expulsão dos jesuítas em 1759 e a transplantação da corte portuguesa para o Brasil em 1808, abriu-se um parêntese de quase meio século, um largo hiatus que se caracteriza pela desorganização e decadência do ensino colonial. Nenhuma organização institucional veio, de fato, substituir a poderosa homogeneidade do sistema jesuítico, edificado em todo o litoral latifundiário, com ramificações pelas matas e planalto, e cujo os colégios e seminários forma, na Colônia, os grandes focos de irradiação da cultura (AZEVEDO, 1976 apud MACIEL; NETO 2006, p.474). Para o ensino da Filosofia essas mudanças tiveram consequências desastrosas, como por exemplo, o fechamento de diversos colégios no Brasil diminuindo o acesso ao ensino secundário; a mudança de eixo do ensino filosófico antes conservador e de tendência humanística para o cientificista sem uma adequada sistematização; os professores, muitos dos quais leigos, arriscaremse em uma educação cientificista já que, em sua maioria, tiveram formação aristotélico-tomista da Companhia de Jesus. Dessa forma, “a educação e a Filosofia se manifestaram de forma frágil e de pouca consistência para a formação de uma cultura essencialmente brasileira” (NETO, 2007, p.35). Porém, de uma forma geral, podemos dizer que a reforma da educação portuguesa promovida por Pombal, ainda que com todos os seus altos e baixos, proporcionou uma abertura para uma nova mentalidade, para novas concepções filosóficas, políticas e econômicas. Essa reforma ensejou o início da transformação da realidade brasileira, substituindo a visão eclesiástica da educação por uma científica. Com a mudança da Corte portuguesa para o Brasil, transformações ocorreram no cenário do país, principalmente no que diz respeito a forma de pensamento. Sua presença [...] em solo brasileiro desencadeou transformações significativas na Colônia tais como a abertura dos portos ao comércio exterior – fato que contribuiu para a penetração de novas ideias filosóficas e políticas oriundas da Europa – e dada a necessidade de se formar e fortalecer o quadro político administrativo exigido para manutenção da burocracia do Estado, foram criados cursos de nível superior (FERREIRA, 2012, p. 23). ROCHA, Raryson Maciel. A filosofia e o ensino secundário: uma abordagem histórica no contexto da educação brasileira. ANAIS do III Colóquio de Letras da FALE/CUMB, Universidade Federal do Pará, Breves, 18, 10 e 20 fevereiro 2016. ISSN 2358-1131 205 Dessa forma, no Brasil Imperial (1822-1889) – período que a educação profissionalizante era altamente prestigiada pelo governo – as reformas ocorridas no currículo do ensino secundário criaram certa oscilação entre as tendências cientificista e humanística, consequência da recente história educacional brasileira. No entanto, mesmo com as oscilações dessas tendências na educação, a disciplina Filosofia permanecia presente no sistema educacional brasileiro desde o início do período colonial. Contudo, a realidade em seu ensino mudará com a Proclamação da República em 1889. A Filosofia passará a ser vista como desnecessária, e seu espaço na educação ficará comprometido por objetivos políticoeconômicos. 3 – O ENSINO DE FILOSOFIA NA REPÚBLICA Durante o período pré-republicano brasileiro, mais precisamente, por volta de 1880 à 1900 adentram em território nacional novas correntes filosóficas, principalmente no meio acadêmico. Entre essas correntes estavam, dentre outras, o darwinismo6 e o positivismo7. Contudo, a corrente mais influente dentro do meio acadêmico brasileiro foi, sem dúvida, o positivismo. Podemos afirmar, dessa forma, que [...] a razão fundamental desse facto alicerça-se na pré-existente tradição cientificista iniciada com as reformas pombalinas, à luz das quais se estabeleceu todo o sistema de ensino superior, em bases que privilegiavam a ciência aplicada e a instrução estritamente profissionalizante [...] (RODRIGUEZ, 1987, p. 384). Assim, a recém-proclamada República toma para si o ideal positivista, primando o estudo científico visto que, agora, se enveredava um projeto político de desenvolvimento do Brasil. A educação profissionalizante, que se inicia no período pombalino, ganha mais poder dentro do projeto político desenvolvimentista republicano e, a partir desse momento, o governo dispensa tudo o que é considerado supérfluo no currículo educacional. A partir desse momento, a Filosofia, vista como uma disciplina sem muita serventia, entra em um movimento pendular dentro do currículo educacional brasileiro, mais precisamente, no currículo do ensino secundário. As razões de suas idas e vindas no currículo dependerão das políticas empregadas em cada momento da história republicana brasileira, pois, em cada momento 6 Doutrina cujo nome deriva de seu principal representante, o naturalista britânico Charles Darwin, que elaborou diversos estudos sobre o meio ambiente e é considerado o “pai da Teoria da Evolução”. 7 O positivismo (vem do termo positivo = ordem) é uma corrente filosófica iniciada pelo francês Auguste Comte. Essa corrente tenta empregar dentro das ciências humanas e principalmente das sociais, como da recém-criada sociologia, métodos próprios das ciências naturais e exatas por considerar que essas alcançam respostas muito mais corretas. Assim sendo, desconsidera todas as reflexões teológicas e metafísicas. ROCHA, Raryson Maciel. A filosofia e o ensino secundário: uma abordagem histórica no contexto da educação brasileira. ANAIS do III Colóquio de Letras da FALE/CUMB, Universidade Federal do Pará, Breves, 18, 10 e 20 fevereiro 2016. ISSN 2358-1131 206 histórico, o ensino da Filosofia pode ser considerado ora significante, ora ineficaz e ora subversivo ao sistema. 3.1 – A Filosofia e o início da República Desde as primeiras décadas da colonização brasileira até o final do período imperial, isto é, no final do século XIX onde se inicia a Primeira República, o ensino da Filosofia no Brasil sofreu interferências diretas das correntes de pensamento advindas da Europa como, também, das estruturas políticas vigentes. Todavia, mesmo com as mudanças políticas e de pensamento no Brasil nessas épocas, sempre esteve presente no currículo educacional brasileiro. Entretanto, a instauração da República no país abriu as portas para novas perspectivas políticas que, necessariamente, não viam serventia na educação filosófica. A primeira reforma educacional na Rep blica ocorreu com o decreto n 1, de oito de novembro de 1890, elaborado pelo ministro Benjamin Constant. Ela representou um duro golpe no ensino de Filosofia, porque o decreto determinava no seu artigo 3 quais seriam as disciplinas aplicadas nas escolas primárias do 1 grau [...]. Na leitura do artigo 3 do decreto n 1, percebe-se a ausência da disciplina de Filosofia das escolas com 1 grau na medida em que não constava a Filosofia entre as disciplinas do currículo escolar. Ainda nesse decreto, o artigo 4 dissertava sobre as disciplinas das escolas primárias do 2 grau [...]. O artigo 4 não citava a disciplina de Filosofia e com isso ficava ausente também do currículo do 2 grau. Os artigos 3 e 4 da Reforma enjamin Constant retiravam do ensino escolar a necessidade de oferecer o conteúdo filosófico. (SOARES, 2012, p. 21) Acolhida pelo governo republicano, a frente positivista no Brasil marcou a educação nacional implantando mudanças na escola primária e secundária. Como consequência disso, o ensino da Filosofia, que não condizia com os valores almejados pelos positivistas – a saber: difusão do nacionalismo e cidadania –, foi excluído do currículo nacional por ser entendido, no momento, como educação humanista-cristã aspecto que não “casava” com os ideais positivos. Todavia, dez anos depois o Decreto nº. 3.914 de 26 de janeiro de 1901, conhecido como reforma Epitácio Pessoa, determinou a duração de seis anos ao ensino secundário ratificando sua finalidade como preparação para o ingresso no ensino superior. Com ela a Filosofia é reincorporada no currículo secundário através do estudo da Lógica. A Filosofia manteve-se no currículo por mais dez anos, até que, pela Reforma Rivadávia em 1911, acabou sendo extinta novamente pelo Decreto nº. 8.659 de 05 de abril que pretendeu implantar uma orientação mais prática para o currículo, talvez ainda por influência do positivismo no Brasil, voltando ao contexto educacional quatro anos após sua retirada do currículo brasileiro ROCHA, Raryson Maciel. A filosofia e o ensino secundário: uma abordagem histórica no contexto da educação brasileira. ANAIS do III Colóquio de Letras da FALE/CUMB, Universidade Federal do Pará, Breves, 18, 10 e 20 fevereiro 2016. ISSN 2358-1131 207 pelo decreto 11.530 de 18 de março de 1915, com reforma Carlos Maximiliano tornando-se, porém, um curso facultativo. Outra reforma importante para educação brasileira e para o ensino da Filosofia, no início da República, foi a reforma de 1925 denominada Rocha Vaz, onde, segundo Ferreira (2012), o Decreto nº. 16.782-A de 13 de janeiro em seu artigo 47 traz a percepção de uma mudança no que concerne ao intuito do ensino secundário, que abandona seu objetivo principal, que é a preparação para o ingresso ao nível superior, e passa a ter como desígnio uma preparação para a vida fornecendo a todos contato com a cultura geral independente da futura opção profissional. 3.2 – O ensino da Filosofia: de Vargas a LDB de 1961 Em 1930, com a tomada do poder por Getúlio Vargas, ocorrem mudanças em quase todos os setores brasileiros, isto é, nos setores econômico, político, cultural, educacional, etc. Essas mudanças são causas da tentativa governamental em assumir um papel desenvolvimentista no Brasil com sua política nacionalista, fechando as portas para o capital exterior e buscando inculcar nos cidadãos um pensamento pátrio. Assim como Constant, Vargas viu na educação uma forte aliada para garantir o objetivo de seu projeto. Deste modo, o Ministério da educação e Saúde Pública [...] foi instituído logo após a tomada do poder, no ano de 1930. Era esse Ministério a primeira das grandes realizações práticas, mas, diga-se de passagem, não constituía propriamente uma novidade, já que no início da República ele existira, embora tivesse tido curta duração. Sua ação se fez sentir logo, através dos atos de seu primeiro Ministro da Educação e Saúde Pública Sr. Francisco Campos. A chamada reforma Francisco Campos efetivou-se através de uma série de decretos [...] (ROMANELLI, 2007, p. 131). O Decreto nº 19.890 de 19 de abril de 1931 dispõe sobre a organização do ensino secundário. Segundo Romanelli (2007), o ensino secundário até aquele momento, pelo menos na maioria do território nacional, não passava de cursos preparatórios de caráter propedêutico, não tendo, assim, uma digna organização que pudesse carregar esse nome. Isso se devia ao fato do sistema de ensino no Brasil ser organizado pelos Estados sem nenhum tipo de articulação com o sistema central, isto é, não havia uma efetiva política de educação nacional. Assim, com a criação de um sistema educacional nacional e com o intuito de [...] reforçar o nacionalismo o Estado Novo destacou no currículo dos cursos elementares e secundários a importância da educação física, do ensino da moral católica e da educação cívica pelo estudo da História e da Geografia do Brasil, do canto orfeônico e das festividades cívicas, como a “Semana da Pátria”. Ecoando Comte – uma das importantes matrizes do pensamento de Vargas –, no ensino primário o objetivo da formação era dar “sentimento patriótico” e no secundário, a “consciência patriótica”. (HILSDORF, 2011, p.100, grifos do autor) ROCHA, Raryson Maciel. A filosofia e o ensino secundário: uma abordagem histórica no contexto da educação brasileira. ANAIS do III Colóquio de Letras da FALE/CUMB, Universidade Federal do Pará, Breves, 18, 10 e 20 fevereiro 2016. ISSN 2358-1131 208 Nesse contexto a Filosofia, em quanto disciplina, apresenta-se, ainda, de maneira tímida. Isso devido o ensino secundário ter sido dividido em dois ciclos: “Fundamental, com duração de cinco anos [...] e o Complementar, com duração de dois anos, com a finalidade de adaptar os alunos as futuras especializações profissionais a serem obtidas no ensino superior” (GONÇALVES; PIMENTA, 1992, p. 31). Aqui, o ensino da Filosofia é oferecido no segundo ciclo, isto é, no ciclo complementar destinado principalmente aos filhos da elite brasileira. Porém, somente se fazia matéria obrigatória nos dois anos da educação complementar que tinha como objetivo preparar o aluno para um futuro curso de direito, aos demais sua obrigatoriedade passa ser de apenas um ano. As reformas de Campos vigoraram até 1942, isto é, até as reformas de Gustavo Capanema que ficaram conhecidas como Leis Orgânicas do Ensino8. Em 1942, Gustavo Capanema, então Ministro da Educação, organizou novamente o ensino secundário em dois ciclos: o primeiro com duração de quatro anos, que passa a ser chamado ginasial, e o segundo com duração de três anos que ficara conhecido como colegial. O último era subdividido em dois outros cursos, a saber: o clássico e científico. Contudo, a Filosofia, no início das reformas educacionais pelas Leis Orgânicas, embora sendo disciplina obrigatória nos dois cursos do ciclo colegial, era somente incluída no componente curricular do último ano de ambos os cursos. Desta forma, podemos perceber que as Reformas Capanema e Francisco Campos, [...] no que tange a disciplina de filosofia elas representaram um avanço significativo, pois a filosofia passou a ocupar espaço efetivo e obrigatório no currículo do ensino secundário. Não obstante a sua obrigatoriedade, é preciso destacar que no curso Clássico a filosofia permaneceu com seis horas aulas até a década de 1960 distribuídas ora em duas séries ora nas três séries do curso Clássico. No curso Científico a carga horária de filosofia oscilou de 4 para 3 horas aulas durante o mesmo período [...] (FERREIRA, 2012, p. 39). Após a reforma de Capanema passam-se aproximadamente 18 anos sem mudanças significativas no currículo da educação nacional. Somente em 1961, com a criação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Brasileira (LDB), a organização curricular se modifica privilegiando algumas disciplinas em detrimento de outras que, agora, passam ser optativas – a Filosofia enquadra-se na linha das optativas. Destarte, não há mudanças de extrema significância na 8 Editadas por meio de decretos-lei, pelo ministro Capanema, entre 1942-46[...]elas visavam à construção de um sistema centralizado e articulado intrapartes, e atingiram tato o ensino público quanto o particular mediante o mecanismo de equiparação, com efeitos legais para as escolas privadas que se submetessem à fiscalização federal. (HILSDORF, 2011, p.101) ROCHA, Raryson Maciel. A filosofia e o ensino secundário: uma abordagem histórica no contexto da educação brasileira. ANAIS do III Colóquio de Letras da FALE/CUMB, Universidade Federal do Pará, Breves, 18, 10 e 20 fevereiro 2016. ISSN 2358-1131 209 estrutura do ensino secundário brasileiro permanecendo basicamente a mesma organização proposta por Capanema. Quanto à obrigatoriedade de disciplinas no ensino secundário da educação brasileira desse período, podemos afirmar que: Para o Ensino Médio, foi determinada a existência de disciplinas obrigatórias (estabelecidas pelo Conselho Federal de Educação) até o número de cinco, cabendo aos Conselhos Estaduais complementarem esse número. Aos estabelecimentos de ensino foi permitido incluir disciplinas optativas. Inegavelmente, estas determinações legais foram um avanço. Entretanto, na prática, as escolas organizaram o seu currículo levando em conta os recursos materiais e humanos que dispunham, mantendo assim o mesmo currículo de antes (GONÇALVES E PIMENTA, 1992, p. 43). Deste modo, com a reformulação organizacional do currículo, passa-se a adotar o número obrigatório de cinco disciplinas, sendo elas: Português, Matemática, Geografia, História e Ciências. A legislação concedia, porém, determinado número de disciplinas optativas a serem incluídas pelos estabelecimentos de ensino. A Filosofia, a partir da nova legislação, passa a ser optativa no colegial, perdendo novamente sua obrigatoriedade. Assim, seu ensino começa a perder força facilitando, posteriormente, a exclusão total de seu ensino pelo não tão distante golpe militar de 1964. 3.3 – A Filosofia: da ditadura militar aos nossos tempos Com o golpe militar em 1964, o governo passa a adotar uma política de desenvolvimentismo totalmente dependente do capital estrangeiro e embasada na indústria. A prioridade dada à educação técnica com o intuito de investir na melhoria do capital humano dentro do país é visível. Com isso, [...] a reforma educacional proposta pelos militares visava modernizar o ensino escolar brasileiro, entretanto a modernização proposta tornou-se sinônimo de valorização das áreas tecnológicas em detrimento das humanidades e ciências sociais. O currículo escolar passou a ter forte tendência tecnicista [...] (FERREIRA, 2012, p. 42). A educação torna-se fator de extrema importância ao governo militar, justamente por ver nela um pilar de sustentação da ordem socioeconômica de concentração de renda já presente no país desde o governo de Juscelino Kubitschek. O esforço em dar continuidade à ordem socioeconômica vigente transforma a educação, novamente, em instrumento de apoio a política tecnicista do Estado, permitindo através dela, o desenvolvimento político e industrial no país. Nesse momento, o sistema de ensino nacional se adéqua para atender a necessidade do período, isto é, a exigência por melhores níveis de escolaridade por parte da indústria. Como a expansão das ofertas de vagas, em particular no ensino superior, não foi suficiente para atender à demanda e, por outro lado, o modelo econômico exigia ROCHA, Raryson Maciel. A filosofia e o ensino secundário: uma abordagem histórica no contexto da educação brasileira. ANAIS do III Colóquio de Letras da FALE/CUMB, Universidade Federal do Pará, Breves, 18, 10 e 20 fevereiro 2016. ISSN 2358-1131 210 melhor qualificação para o trabalho daqueles que concluíam os graus anteriores de ensino, a legislação educacional procurou equacionar a crise. No caso específico do ensino de 2º grau, o caráter compulsório e universal de profissionalização tem clara finalidade de desviar parte da clientela para o mercado de trabalho, como assinala Cunha e, ao mesmo tempo, exige-se do sistema educacional produtividade, formação de mão-de-obra barata e numerosa, qualificada tecnicamente, mas disciplinada, dócil e ajustada ás necessidades do sistema econômico vigente. (GONÇALVES; PIMENTA, 1992, p.48) O regime coercitivo e centralizador do governo militar ceifava tudo àquilo que pudesse representar perigo a sua política governamental. Por assim ser, o ensino da Filosofia passa a ser rejeitado por ser considerado nocivo aos projetos políticos militar. Assim, segundo Mazai (2001, p.10), “a educação acabou exercendo um papel ideológico, pois, foram impostos valores culturais estrangeiros, como modelo a serem seguidos pela educação no Brasil. O modelo educacional a ser seguido era totalmente técnico e burocrático”. A Filosofia passa a ser facultada no currículo do ensino secundário brasileiro, dando espaço à duas novas disciplinas, a saber: Educação Moral e Cívica (EMC) e a Organização Social e Política do Brasil (OSPB). As últimas entram no currículo da educação nacional para garantir o não desvio do pensamento oficial, isto é, assegurar a conservação dos ideais de segurança nacional. Por assim ser, a Filosofia foi recusada pelo fato de não conseguir evitar debates dos problemas sociais e políticos da sociedade. Com isso, evitou-se a crítica do sistema vigente. Contudo, a proteção dos ideais de segurança nacional não seria o único motivo do afastamento da Filosofia do currículo secundário. Segundo Carminati (2004), além do motivo exposto, tudo leva a crer que, naquele momento, mesmo que a Filosofia se submetesse ao sistema, sendo a ele obediente, sua educação não parecia grande investimento ao ver dos tecnocratas, por ser considerada inútil para o país que almeja o desenvolvimento técnico-industrial. A Filosofia na educação secundária permanece alheia ao processo educacional no Brasil até a queda do regime militar. E com o enfraquecimento e a queda do governo militar, retorna, ainda na forma optativa, no sistema educacional de alguns Estados. E assim permaneceu até meados 1990. Novas expectativas são criadas por conta da reformulação da LDB em 1996, devido essa representar, para muitos professores, um grande progresso para o plano educacional nacional. Infelizmente, não chegou a contemplar vários aspectos propostos originalmente pelos educadores, assim como [...] não colocou a filosofia como disciplina, porém o art. 36, §1ºo, III abriu espaço para a filosofia no currículo [...]. Todavia o texto da lei não definiu de que maneira esses conhecimentos de filosofia seriam ofertados para os estudantes, embora se possa interpretar a letra da lei e entender que a filosofia deva ser uma disciplina para contribuir com a formação cidadã, a lei não afirma isso claramente (FERREIRA, 2012, p. 47). ROCHA, Raryson Maciel. A filosofia e o ensino secundário: uma abordagem histórica no contexto da educação brasileira. ANAIS do III Colóquio de Letras da FALE/CUMB, Universidade Federal do Pará, Breves, 18, 10 e 20 fevereiro 2016. ISSN 2358-1131 211 A LDB/96, art. 36, §1º, III dispõe sobre o ensino de filosofia da seguinte forma: Art. 36. O currículo do ensino médio observará o disposto na Seção I deste Capítulo e as seguintes diretrizes: § 1º Os conteúdos, as metodologias e as formas de avaliação serão organizados de tal forma que ao final do ensino médio o educando demonstre: III - domínio dos conhecimentos de Filosofia e de Sociologia necessários ao exercício da cidadania. Devendo-se a isso, sua legitimidade como disciplina obrigatória no currículo não ocorreu e sua interpretação, na lei, ficou vaga, podendo, até mesmo, ser entendida como educação transversal, isto é, usando seus conteúdos próprios nas discussões das demais matérias. Isso é ratificado pelos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) de 1999, no qual a filosofia é recomendada como conteúdo e não como disciplina. Com as Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Médio (Resolução CEB/CNE n. 3/98), aprovadas pelo Conselho Nacional de Educação em 1998, os PCNEM (de 1999), os responsáveis oficiais pela política educacional do período – ministro, membros da Secretaria de Educação Média e Tecnologia (SEMTEC) e pareceristas do Conselho Nacional de Educação (CNE) – procuraram caracterizar os conhecimentos filosóficos a serem trabalhados nas escolas como temas transversais. Embora os documentos não excluam o ensino disciplinar, a presença transversal nos currículos garantiria, em tese, o cumprimento da LDB quanto à necessidade de domínio de conhecimentos de filosofia, sem a necessidade de uma disciplina específica (FAVERO; et al., 2004, p. 259). O simples fato de alocarem os temas filosóficos como transversais, embora não excluindo a possibilidade do ensino disciplinar, retira do governo a responsabilidade da oferta do ensino de Filosofia como disciplina específica no currículo. E pelos respaldos conseguidos pelo PCN de 99, o artigo da lei permanece o mesmo por mais de uma década. Infelizmente, embora sendo uma educação necessária para a formação humana, a não obrigatoriedade em lei tem como consequência a não oferta de seu ensino. Assim, críticas surgiram, por parte de muitos educadores a partir dessa visão oferecida ao seu ensino. Com as críticas surgi um projeto de lei complementar9, que visava à substituição do art. 36 da LDB na busca da consolidação da obrigatoriedade das disciplinas Filosofia e Sociologia no currículo do ensino médio brasileiro. O projeto obteve aprovação das duas instâncias do legislativo federal, sendo encaminhada para apreciação do Presidente da República. Contudo, 9 O projeto de Lei Complementar 3.178/97 de autoria do deputado Padre Roque Zimmermann (PT-PR), arrastou-se por mais três anos em tramitação na Câmara e no Senado Federal até seu veto em 2001 pelo então presidente Fernando Henrique Cardoso. ROCHA, Raryson Maciel. A filosofia e o ensino secundário: uma abordagem histórica no contexto da educação brasileira. ANAIS do III Colóquio de Letras da FALE/CUMB, Universidade Federal do Pará, Breves, 18, 10 e 20 fevereiro 2016. ISSN 2358-1131 212 [...] o projeto foi vetado em outubro de 2001 pelo então presidente Fernando Henrique Cardoso. Os argumentos que sustentaram o veto foram basicamente dois, já mencionados: a) a inclusão das disciplinas Filosofia e Sociologia implicaria incremento orçamentário impossível de ser arcado pelos estados e municípios; b) não haveria suficientes professores formados para fazer frente às novas exigências da obrigatoriedade da disciplina (FAVERO; et al., 2004, p. 260) Apesar disso, após mais de seis anos de intensos debates, a Filosofia – assim como a Sociologia – ocupou lugar de obrigatoriedade na educação média brasileira a partir da Lei nº 11.684 de 2 de junho de 2008, que dispõe: Art. 1o O art. 36 da Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996, passa a vigorar com as seguintes alterações: “Art. 36. ...................................................................... IV – serão incluídas a Filosofia e a Sociologia como disciplinas obrigatórias em todas as séries do ensino médio. § 1o .............................................................................. III – (revogado). ........................................................................................” (NR) Assim sendo, recentemente a Filosofia se faz presente nos três anos do Ensino Médio brasileiro. A sua obrigatoriedade no currículo e seu ensino de forma mais veemente traz-nos novas esperanças na busca por uma educação crítica, em favor da formação humana, podendo ajudar a cultivar, nas escolas brasileiras, mentes capazes de analisar a realidade circundante, denunciando os abusos e participando de forma ativa na transformação da realidade vigente. CONCLUSÃO Percebemos no decorrer do trabalho que o ensino de Filosofia esteve quase sempre presente na história da educação Brasileira. Em apenas três momentos dessa história a disciplina em questão foi excluída completamente do currículo, esses foram durante: 1) O início da República brasileira (1890); 2) A reforma Rivadária (1911); e por fim, 3) A reforma da educação de 2º grau, implementada pelo governo militar (1971). Se levarmos em consideração o início dos trabalhos educacionais aos filhos dos colonos brasileiros pelos padres Jesuítas (1568-1569) até os dias de hoje, teremos cerca de 447 anos de história da educação no Brasil. Agora, somando-se todos os períodos de exclusão completa do ensino de Filosofia no Brasil (consideraremos a exclusão no período militar a partir 1971 até a aprovação da lei 9394/96) obteremos algo em torno de 40 anos de exclusão completa do currículo escolar. Considerando quantitativamente, parece-nos relativamente pouco o tempo de ausência da disciplina na educação brasileira. Todavia, considerando qualitativamente, como podemos perceber, ROCHA, Raryson Maciel. A filosofia e o ensino secundário: uma abordagem histórica no contexto da educação brasileira. ANAIS do III Colóquio de Letras da FALE/CUMB, Universidade Federal do Pará, Breves, 18, 10 e 20 fevereiro 2016. ISSN 2358-1131 213 os resultados não são tão animadores. Embora o ensino de Filosofia tenha permanecido dentro do currículo da educação brasileira em quase toda sua história, essa presença em nada o engrandeceu. Ou seja, a Filosofia enquanto essência, isto é, inquietar-se com a realidade e desvelá-la, buscar incessantemente a verdade do que a nós se apresenta e, principalmente, dar uma formação política e crítica ao jovem, parece-nos nunca ter sido uma realidade na educação brasileira. Ela que nasce como espaço ao contraditório, prestou-se a servir as ideologias religiosa, política ou econômica dos governos durante quase toda a história da educação no Brasil. Deste modo, podemos afirmar que Filosofia no ensino brasileiro sempre se mostrou estéril ao pensamento crítico-político, assim, ajudando a alicerçar a ideologia política e econômica dos governos durante a história. REFERÊNCIAS BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional: nº 9394/96. Brasília, DF, Senado, 1996. Disponível em: http://portal.mec.gov.br/arquivos/pdf/ldb.pdf. 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