FUNEDI Universidade do Estado de Minas Gerais – UEMG

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Fundação Educacional de Divinópolis – FUNEDI
Universidade do Estado de Minas Gerais – UEMG
Mestrado em Educação, Cultura e Organizações Sociais
INCLUSÃO PRODUTIVA E ADOLESCENTES
EM CONFLITO COM A LEI:
Análise sobre desafios e perspectivas em
unidades socioeducativas de internação
Jaqueline Lago
Divinópolis/MG
2010
Jaqueline Lago
INCLUSÃO PRODUTIVA E ADOLESCENTES
EM CONFLITO COM A LEI:
Análise sobre desafios e perspectivas em
unidades socioeducativas de internação
Dissertação apresentada ao Curso de Mestrado da Fundação
Educacional de Divinópolis – FUNEDI, unidade associada à
Universidade do Estado de Minas Gerais – UEMG, como
requisito à obtenção do título de Mestre em Educação,
Cultura e Organizações Sociais.
Área de Concentração: Estudos Contemporâneos
Linha de Pesquisa: Espaço e Sociedade
Orientadora: Profª. Dra. Batistina M. S. Corgozinho
Divinópolis/MG
2010
L177i
Lago, Jaqueline
Inclusão produtiva e adolescentes em conflito com a lei: análise
sobre desafios e perspectivas em unidades socioeducativas de internação
[manuscrito] / Jaqueline do Lago Homem Antunes. – 2010.
112 f., enc.
Orientador : Batistina Maria de Souza Corgozinho
Dissertação (mestrado) - Universidade do Estado de Minas Gerais,
Fundação Educacional de Divinópolis.
Bibliografia : f. 113 a 119
1. Adolescência. 2. Medida Socioeducativa. 3. Socioprofissionalização
Inclusão Produtiva. 4. Trabalho. I. Corgozinho, Batistina Maria de
Souza. Universidade do Estado de Minas. Fundação Educacional de
Divinópolis. III. Título.
CDD: 362.74
Dissertação intitulada: “Inclusão Produtiva e Adolescentes em
Conflito com a Lei: Análise sobre desafios e perspectivas em unidades
socioeducativas de internação”, de autoria da mestranda Jaqueline do
Lago Homem Antunes, aprovada pela banca examinadora constituida
pelos seguintes professores:
No sinal fechado / Ele vende chiclete
Capricha na flanela / E se chama Pelé
Pinta na janela / Batalha algum trocado
Aponta um canivete / E até...
PIVETE
Chico Buarque
Composição:
Francis Hime e
Chico Buarque
DEDICATÓRIA
Dedico este trabalho à todos os adolescentes em cumprimento de
medida socioeducativa de internação que dele participaram e a todos
os outros que mesmo em conflito com a Lei, buscam de alguma
forma traçar um projeto de vida ou simplesmente alternativas
produtivas distantes da criminalidade, mesmo com as angústias e
todo estigma social que são alvo, visando sempre o que lhes é mais
precioso: a liberdade e a juventude.
AGRADECIMENTOS
Ao Criador, pelo dom da vida e pela oportunidade de realizações tão
significativas nessa breve estada terrestre. Hari Om!
Aos meus pais pelo apoio e incentivo. Meu eterno, obrigada!
Ao meu companheiro Ricardo Alexandre que esteve presente nesse processo,
incentivando e contribuindo para que o meu sonho se realizasse. Meu beijo carinhoso!
Aos amigos(as) que contribuíram direta ou indiretamente e que torcem pelo meu
sucesso profissional. Beijos mil...
Aos(as) adolescentes, que se mostraram disponíveis a explicitarem um pouco de
suas histórias de vida. Valeu!
A todos os profissionais que participaram deste estudo e que se dedicam a difícil
tarefa de educar. Agradeço a acolhida!
A Patrícia e a Helena, que se envolveram nas transcrições do material coletado e
ao Geraldo Afonso pela minuciosa correção. Obrigada!
Aos colegas, professores e demais funcionários da FUNEDI/UEMG, pela
parceria, pela contribuição e pelo empenho nesses dois anos de luta. Obrigada por tudo!
Ao Professor Alexandre Simões, pelas preciosas orientações e compreensão nos
momentos de inquietação. Minha eterna admiração!
A Professora Batistina pela eficiente orientação deste trabalho. Agradeço
Imensamente!
RESUMO
O presente estudo é resultado de pesquisa realizada nos 05 Centros Socioeducativos da cidade
de Belo Horizonte/MG – responsáveis pelo cumprimento da medida de internação por
adolescentes que cometeram atos infracionais. Tais instituições são administradas pela
Secretaria de Estado de Defesa Social – SEDS, através da Subsecretaria de Atendimento às
Medidas Socioeducativas – SUASE. A inclusão produtiva é uma modalidade de ação
pedagógica que visa contribuir para a preparação do cidadão e futura inserção no mundo do
trabalho. O objetivo geral deste estudo foi o de analisar os desafios e perspectivas da inclusão
produtiva para o adolescente, em cumprimento de medida socioeducativa de internação e
identificar formas que estejam contribuindo para o seu protagonismo e para sua (re)inserção
social. Especificamente buscou-se investigar como o adolescente autor de ato infracional
percebe o mundo do trabalho e se já realizou alguma atividade pregressa, bem como a
existência de ações efetivas da SUASE, voltadas para a sua socioprofissionalização, visando o
cumprimento do ECA e do SINASE. No tocante à metodologia, a investigação é um estudo de
natureza qualitativa, fundamentada nos depoimentos dos atores sociais, através de entrevistas
semi-estruturadas com os(as) adolescentes e com as Diretoras e a realização de grupos focais
com os profissionais das unidades socioeducativas. As informações foram analisadas através
da técnica do Discurso do Sujeito Coletivo – DSC de LEFÈVRE & LEFÈVRE. É relevante
investigar o processo de inclusão produtiva do adolescente autor de ato infracional, pois essa
forma de inclusão pode possibilitar a ele a busca por sua autonomia e a construção de um
projeto de vida longe da criminalidade. Foram identificados o crescente envolvimento dos
adolescentes com o narcotráfico e a falta de Políticas Públicas que privilegiem a temática em
questão, desconsiderando a legislação vigente e os direitos dos adolescentes privados de
liberdade. O resultado deste estudo aponta, as dificuldades encontradas pelos adolescentes
sobre uma futura inserção no mercado de trabalho. Mas acredita-se que essa lacuna poderá ser
preenchida pelo Poder Público através da iniciação socioprofissional desses adolescentes,
visando sua futura inclusão produtiva, através de parcerias público-privadas.
Palavras-chave: adolescência, medida socioeducativa, socioprofissionalização, inclusão
produtiva, trabalho.
ABSTRACT
The present study is the result of research conducted in 05 socio-educational centers of the
city of Belo Horizonte / MG - responsible for enforcing the measure of adolescents
hospitalization that have committed crimes. These institutions are administered by the
Ministry of Social Defense - SEDS, through the Secretariat of Social Assistance - SUASE.
The inclusion is a form of productive pedagogic actions, that contributs to the preparation of
citizens and future integration into the world of a job. The aim of this study was to examine
the challenges and prospects of productive inclusion for adolescents in socio-admission and
identify ways that contributs to their role and to reintegration into society. Specifically we
sought to investigate how the adolescent, that was an author of infractions, see the world of
work and the one that already done some previous activity and the existence of effective
actions of his own, directed to its socio-profissionalization, for compliance with the ECA and
SINASE. Regarding the methodology, the research is a qualitative study, based on the speech
of social actors, through semi-structured interviews with people and with the Directors and
conducting the focus on groups with socio-professional units. The material collected was
analyzed using the technique of the Collective Subject Discourse - DSC LEFÈVRE &
LEFÈVRE. It is important to investigate the process of productive inclusion of teenagers
author of infractions, because this form of inclusion may enable him to search his autonomy
and construct a project of life out of the crime life. Was identified the increasing involvement
of adolescents with drugs trafficking and lack of policies that emphasizes the theme in
question, disregarding the law and the rights of incarcerated adolescents. The results of this
study highlights the difficulties found by adolescents on a future integration into the labor
market. But its true that this gap can be filled by the Government through socio-professional
initiations to these teenagers, seeking their futures productive inclusion, through publicprivate partnerships.
Keywords: adolescence, sócio-educative methods, socio-profissionalization, productive
inclusion, job.
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
FIGURA 1 – Visão geral do Sistema de Garantia de Direitos............................................ 28
FIGURA 2 – Organograma do Sistema de Defesa Social de Minas Gerais........................ 64
FIGURA 03 – Vista frontal do CRSSJ.............................................................................. 124
FIGURA 04 – Vista Interna do CSESC............................................................................. 124
FIGURA 05 – Vista frontal do CSESH............................................................................. 125
FIGURA 06 – Vista interna do CSEST............................................................................. 125
FIGURA 07 – Vista frontal do CEAD............................................................................... 126
FIGURA 08 – Grupo Focal realizado no CSESH.............................................................. 126
FIGURA 09 – Biblioteca do CSESC.................................................................................. 127
FIGURA 10 – Sala de Atendimento decorada.....................................................................127
FIGURA 11 – Enfermaria do CSESH................................................................................. 128
FIGURA 12 – Sala de Aula do CSESC.............................................................................. 128
FIGURA 13 – Esporte no CEAD........................................................................................ 129
FIGURA 14 – Aula de Informática no CEAD.................................................................... 129
FIGURA 15 – Oficina de Informática do SENAC no CSESC........................................... 130
FIGURA 16 – Sala de Oficina Profissionalizante no CSESC............................................. 130
FIGURA 17 – Atividade Artística de adolescente no CRSSJ............................................. 131
FIGURA 18 – Produto Artesanal do CSEST...................................................................... 131
FIGURA 19 – Produto Artesanal do CSESH...................................................................... .132
FIGURA 20 – Produtos Artesanais do CSESC................................................................... 132
FIGURA 21 – Stand do CEAD no 2º Simpósio Mineiro de Assistentes Sociais – Maio /2009
no Minascentro - Belo Horizonte/MG................................................................................ .133
FIGURA 22 – Apresentação Musical do Grupo Tamborlescentes do CEAD no 2º Simpósio
Mineiro de Assistentes Sociais-Maio /2009 no Minascentro- BH/MG............................... .133
GRÁFICO 1 – Atores envolvidos no estudo ...................................................................................... 69
GRÁFICO 2 – Atividades realizadas pelos adolescentes antes da internação.................................... 83
QUADRO 1 – Percepções dos adolescentes sobre o mundo do trabalho........................................... 78
QUADRO 2 – Atividades realizadas pelos adolescentes antes da internação...................................
82
QUADRO 3 – Atividades realizadas pelos adolescentes em cumprimento de medida de internação 86
QUADRO 4 – Expectativas de futuro e/ou projetos de vida dos adolescentes após o desligamento da
Unidade Socioeducativa...................................................................................................................... 88
QUADRO 5 – Percepções das Gestoras quanto ao direito à profissionalização e proteção ao trabalho,
de acordo como artigo 69 do ECA....................................................................................................... 90
QUADRO 6 – Responsáveis pelas ações relativas à socioprofissionalização dos adolescentes......... 92
QUADRO 7 – Ações realizadas na unidade socioeducativa que propiciem o protagonismo dos
adolescentes.......................................................................................................................................... 92
QUADRO 8 – Posicionamento dos gestores quanto às ações de inclusão produtiva dos adolescentes 95
QUADRO 9 – Impressões sobre a música Pivete de Chico Buarque e Francis Hime apresentada e
relacionada à realidade vivenciada pelos adolescentes......................................................................... 98
QUADRO 10 – Ações e percepções sobre preparação e/ou inserção socioprofissional dos adolescentes
.......................................................................................................................................................... 102
LISTA DE TABELAS
TABELA 1 – Total de adolescentes em 2008............................................................................
65
TABELA 2 – Tipo de atos infracionais mais frequentes............................................................
66
TABELA 3 – Média de idade dos adolescentes.........................................................................
66
TABELA 4 – Etnia dos adolescentes........................................................................................
66
TABELA 5 – Escolaridade dos adolescentes..............................................................................
67
TABELA 6 – Tipo de convivência familiar...............................................................................
67
TABELA 7 – População de adolescentes nos Centros Socioeducativos de Internação de Belo
horizonte/MG, fevereiro/março de 2009....................................................................................
68
LISTA DE SIGLAS
CAPES – Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior
CESAM – Centro Salesiano do Adolescente Trabalhador
CONANDA - Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente
CLT – Consolidação das Leis Trabalhistas
CNS - Conselho Nacional de Saúde
DIEESE – Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Sócio Econômicos
DGIP - Diretoria de Gestão da Informação e Pesquisa
ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente
IBICT – Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia
IPEA – Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada
ISJB – Inspetoria São João Bosco
OIT – Organização Internacional do Trabalho
OS - Organização Social
ONG – Organização não governamental
PBH – Prefeitura Municipal de Belo Horizonte
PDCA – Planejamento, Execução, Monitoramento e Avaliação
PEA – População Economicamente Ativa
PUC – Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais
SEDH - Secretaria Especial dos Direitos Humanos
SEDS – Secretaria de Estado de Defesa Social
SGD - Sistema de Garantia de Direitos
SINASE – Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo
SPDCA - Subsecretaria Especial de Promoção dos Direitos da Criança e do Adolescente
SUASE – Subsecretaria de Atendimento às Medidas Socioeducativas
TRT - Tribunal Regional do Trabalho
TST - Tribunal Superior do Trabalho
UFMG – Universidade Federal de Minas Gerais
UNESCO - Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura
UNICEF – Fundo das Nações Unidas para a Infância
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ........................................................................................................................ 12
CAPÍTULO I – ADOLESCÊNCIA E INFRAÇÃO ................................................................ 21
1.1 Aspectos sobre a Proteção Social à Infância e Caracterização da Adolescência ............... 21
1.2 A Constituição “Cidadã”, o ECA e o SINASE .................................................................. 26
1.3 Internação e o processo socioeducativo ............................................................................. 29
CAPÍTULO II - TRABALHO, EDUCAÇÃO E SOCIEDADE ............................................. 36
2.1 Considerações sobre o tema Trabalho ................................................................................ 36
2.2 Aspectos Gerais sobre Educação Inclusiva e a Inclusão Produtiva.................................... 45
2.3 Iniciação socioprofissional de adolescentes e a função das organizações sociais .............. 56
CAPÍTULO III – PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS ............................................... 62
3.1 Campo de estudo ................................................................................................................ 62
3.2 Atores da pesquisa .............................................................................................................. 67
3.3 Metodologia ........................................................................................................................ 69
3.4 Obtenção de Informações ................................................................................................... 72
3.5 Aspectos éticos ................................................................................................................... 76
CAPÍTULO IV – INCLUSÃO PRODUTIVA: PERCEPÇÃO DOS DIFERENTES SUJEITOS........ 77
4.1 Adolescentes (A) ................................................................................................................ 78
4.2 Diretores (D) ....................................................................................................................... 90
4.3 Profissionais (P).................................................................................................................. 98
CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................................. 105
REFERÊNCIAS ..................................................................................................................... 113
APÊNDICES .......................................................................................................................... 120
ANEXOS................................................................................................................................ 134
INTRODUÇÃO
[...] é necessário que as atividades profissionalizantes possibilitem ao adolescente o
desenvolvimento de habilidades que tenham colocação no mercado de trabalho
(VOLPI, 2002, p. 36).
A trajetória acadêmica e profissional da pesquisadora possibilitou a definição do
tema de interesse e sua relevância para a presente dissertação.
Desde o seu ingresso no curso de graduação em Serviço Social pela PUC MINAS,
atuou em projetos sociais, mais especificamente na área da criança e do adolescente. Devido a
sua motivação profissional, em 2006 concluiu o Curso de Pós-Graduação Lato Sensu –
Especialização Interdisciplinar em Adolescência, pela Faculdade de Ciências Médicas de
Minas Gerais.
Sendo assim, no período entre 2002 e 2007 atuou no sistema socioeducativo1 de
atendimento ao adolescente em conflito com a lei2. Esta atuação teve inicio em unidade de
semiliberdade3 e em seguida de internação4, ambas gerenciadas pela Inspetoria São João
Bosco – ISJB (organização não governamental – ONG), em parceria com a Secretaria de
Estado de Defesa Social (SEDS) e também atuou na Subsecretaria de Atendimento às
Medidas Socioeducativas (SUASE), ligada à SEDS, no cargo de Diretora de Formação
Profissional e Saúde do Adolescente. Conforme sua experiência profissional verificou que a
inserção no mundo do trabalho5 é almejada por grande parte dos adolescentes em
cumprimento de medida socioeducativa e é vista por eles como possibilidade “única” para o
não retorno à criminalidade.
Nesse sentido, entende-se oportuno registrar o seguinte depoimento de um
adolescente nas condições supracitadas:
______________
2
O termo Sistema Socioeducativo refere-se ao conjunto de todas as medidas privativas de liberdade (internação
e semiliberdade), as não privativas de liberdade (liberdade assistida e prestação de serviços à comunidade) e a
internação provisória.
2
O adolescente em conflito com a lei é aquele que cumpre medida socioeducativa, a saber: advertência,
reparação do dano, prestação de serviços à comunidade, liberdade assistida, semiliberdade e internação.
4
A semiliberdade é uma medida socioeducativa que não comporta prazo determinado e afasta o adolescente do
convívio familiar, mas não o priva totalmente de seu direito de ir e vir (Art. 120 do ECA).
4
A Internação constitui medida privativa de liberdade sujeita aos princípios de brevidade e excepcionalidade e é
aplicada aos adolescentes que cometem atos graves e não comporta prazo determinado (Art. 121 do ECA).
5
A inserção do adolescente no mundo do trabalho seja ele formal ou informal, será denominada pela
pesquisadora como Inclusão Produtiva, bem como toda qualificação socioprofissional voltada para a geração de
trabalho e renda.
13
[...] A vida do crime é assim, você entra brincando, mas para sair é difícil... Falei
com Deus que já tinha aprontado muito, mas se Ele me desse mais uma
oportunidade... eu ia cumprir tudo e que queria ter um emprego quando saísse de lá.
Precisa ter apoio, mas a primeira coisa é a gente querer mudar... porque as tentações
são muitas. Tive apoio de minha família, da minha mulher, dos Salesianos e agora
do pessoal do restaurante. Eu agradeço muito essa oportunidade, o trabalho é ótimo.
Tenho sonho de construir uma casa, morar com minha mulher e meu filho. O
Renato6 do passado não existe mais. (ENTREVISTA DE UM ADOLESCENTE
QUE TEVE EXPERIÊNCIA DE INCLUSÃO PRODUTIVA, 2003).
Diante do depoimento deste adolescente em cumprimento de medida
socioeducativa de semiliberdade, que a pesquisadora teve a oportunidade de acompanhar no
período de 2002 à 2004, pode-se verificar que a inclusão produtiva é vista nesse depoimento
como uma “válvula de escape” para se livrar do envolvimento com o tráfico de drogas e com
a criminalidade e também como uma alternativa de se construir um projeto de vida lícito.
O acompanhamento de adolescentes envolvidos em atos infracionais ainda é um
desafio, pois os atos infracionais cometidos pelos mesmos são permeados por fatores sociais,
econômicos, políticos e principalmente subjetivos. Fatores intensos e por vezes contraditórios,
onde em muitos casos a necessidade de sobrevivência leva o adolescente ao envolvimento
com o narcotráfico, que passa a ser a uma das formas de sustento da família, levando-o para
um ciclo vicioso, onde o foco é a criminalidade, mesmo depois do cumprimento de medida
socioeducativa. Todos esses fatores podem ser percebidos pelos profissionais durante o
processo socioeducativo do adolescente e estão presentes em suas trajetórias de vida e na
maioria das vezes refletem negligência, exploração, violência, pobreza, submissões e exclusão
social.
Diante deste contexto muitos projetos de vida construídos por eles não se
efetivam. Em alguns casos, esta impossibilidade é permeada pela falta de apoio familiar e de
Políticas Públicas que permitam aos adolescentes o gerenciamento de suas vidas distante da
criminalidade. Para Alberti (2004) a desistência dos pais para com os filhos é assustadora,
pois o adolescente se vê perdido e em completo desespero e normalmente inicia uma busca
que poderá resultar em catástrofe. Para a autora esta é uma fase de transição e todo o
adolescente busca reconhecimento e possibilidade de escolhas.
Estar diante de um adolescente com perspectivas educativas e produtivas e muitas
vezes se deparar com uma gama de situações como baixa escolaridade, evasão escolar,
exclusão social, entre outras, produz tanto no adolescente como no profissional das unidades
socioeducativas a emergência de sensações intensas: nos primeiros a falta de possibilidades de
______________
6
O nome do adolescente citado é fictício, de acordo com artigo 17 do ECA.
14
escolha e no segundo a constante impotência de se realizar efetivamente um trabalho
socioeducativo.
De certa forma, esse quadro permite o questionamento dos múltiplos aspectos da
prática socioeducativa e a necessidade de um trabalho interdisciplinar que irá despertar no
adolescente sua autonomia, ou melhor, seu protagonismo. O termo protagonismo juvenil é
definido por Costa (1999, p. 179) como “modalidade de ação educativa, é a criação de
espaços e condições capazes de possibilitar aos jovens envolverem-se em atividades
direcionadas à solução de problemas reais, atuando como fonte de iniciativa, liberdade e
compromisso.”
O protagonismo juvenil está diretamente ligado à participação dos adolescentes
nos diversos espaços coletivos e sociais, legitimando sua cidadania, pois ele passa a ser o
agente de uma ação. Tal protagonismo muitas vezes, pode ser descaracterizado por uma série
de dificuldades – incompleta efetivação dos direitos elencados no Estatuto da Criança e do
Adolescente – ECA e no Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (SINASE),
desvalorização social do trabalho que realizam, permanência de práticas referendadas pelo
antigo Código de Menores (1979), entre outras – encontradas muitas vezes no desenrolar do
próprio processo socioeducativo. Um contexto de privação de liberdade com base apenas na
contenção e punições, limita a participação dos adolescentes nos espaços de decisões
coletivas. Isto pode ocasionar uma maior segregação do adolescente autor de ato infracional7
e o consequente fortalecimento das relações e vivências típicas do “mundo do crime”8,
dificultando ainda mais a sua inclusão social e produtiva.
A inclusão produtiva significa uma modalidade de ação pedagógica voltada para o
cidadão em situação de vulnerabilidade pessoal e/ou social acima de 16 anos de idade, no
sentido de contribuir para sua preparação e futura inserção no mundo do trabalho. De acordo
com o Dicionário de Termos Técnicos da Assistência Social (2007), segue seu objetivo
principal:
A inclusão produtiva tem por objetivo qualificar o cidadão para sua inserção no
mundo do trabalho através da formação, qualificação profissional e projetos de
geração de trabalho e renda. São oferecidos cursos através de uma ação pedagógica
orientada a formar cidadão a partir de 16 anos em situação de risco social ou pessoal
(BELO HORIZONTE, 2007. p. 51).
______________
7
Ato Infracional é conduta descrita no ECA como crime ou contravenção penal.
“Mundo do Crime” é uma expressão utilizada constantemente pelos adolescentes envolvidos em atos
infracionais para identificar as relações estabelecidas com a criminalidade.
8
15
Diante disso, alguns questionamentos se fazem pertinentes: Quais as formas de
(re)inserção social dos adolescentes envolvidos em atos infracionais? Como os adolescentes
envolvidos em atos infracionais percebem o fazer profissional? Qual o nível de escolaridade
desses adolescentes? Existem iniciativas de parcerias público-privada no tocante a
profissionalização dos adolescentes visando o cumprimento do ECA e do SINASE? Como
esses adolescentes estão sendo preparados e absorvidos pelo mundo do trabalho? Existem
políticas públicas efetivas voltadas para a inclusão produtiva desse adolescente? Se existem
quais e como?
Segundo pesquisa realizada pelo Departamento Intersindical de Estatística e
Estudos Socioeconômicos – DIEESE (2001), tendo como base o ano de 1999, em seis
capitais9 do país, revela altas taxas de desemprego entre os jovens10 maiores de 16 anos
incluídos na População Economicamente Ativa (PEA). Em Belo Horizonte a taxa de
desemprego ficou em 30,3% e a mais elevada foi em Salvador, chegando a 43,2%. Mesmo
com índices elevados em todas as capitais pesquisadas, permanecem distorções, se
comparadas as regiões sudeste com nordeste, pois esta última região é reconhecida por taxas
acentuadas de pobreza. A Organização Internacional do Trabalho (OIT, 2001) confirma tal
situação, no que diz respeito às taxas de desemprego total e juvenil no Brasil, que cresceram
entre 1989-1999, colaborando para isto as mudanças econômicas, tecnológicas e as crises
financeiras. A OIT considera como “crítico” o desemprego juvenil, não só no Brasil como em
diversos países da América Latina e em alguns da União Européia.
Em 2009, a taxa de desemprego (PEA), em seis das principais regiões
metropolitanas do País ficou em 15% em julho, segundo dados divulgados pela Fundação
Sistema Estadual de Análise de Dados (SEADE) e pelo Departamento Intersindical de
Estudos Socioeconômicos (DIEESE). O desemprego praticamente não se alterou em relação
ao mês de junho, quando estava em 14,8%, mas subiu em relação a julho de 2008, quando
estava em 14,6%. O contingente de desempregados aumentou em 45 mil pessoas nas regiões
metropolitanas de Belo Horizonte, Porto Alegre, Recife, Salvador, São Paulo e Distrito
Federal, para 3.029 milhões.
______________
9
As áreas metropolitanas pesquisadas, com altas taxas de desemprego entre os jovens, foram: São Paulo, Belo
Horizonte, Porto Alegre, Recife, Salvador e Distrito Federal.
10
De acordo com o IPEA, jovem é aquele que possui idade entre 18 e 24 anos, mas a pesquisa do DIEESE citou
jovem e inclusive o colocou como maiores de 16 anos, mas mesmo assim a pesquisadora optou pela pesquisa em
referência para ilustrar a problematização, devido a escassez de dados específicos de adolescentes. Ao longo do
texto foram utilizados também outros autores que citam o termo jovem.
16
O segmento jovem da população brasileira, na busca por inserção no mercado de
trabalho, tem enfrentado as dificuldades deste cenário econômico. A pesquisa de 2001 citada
demonstrou que o desemprego entre a população jovem supera o da população adulta; esta é
uma realidade não somente brasileira como mundial. Estima-se que cerca de 60 milhões de
jovens em todo o mundo estejam desempregados ou em empregos precários.
É significativo o fato de que em momentos de crise econômica os jovens sejam
um dos primeiros a perder o posto de trabalho, uma vez que não são considerados como
aqueles responsáveis pelo sustento de uma família (FORTUNY, 2001). Essa constatação de
Fortuny nos faz refletir que, ao mesmo tempo que é natural o jovem perder seu emprego em
momentos de crise, não se pode generalizar que os jovens não sejam os responsáveis diretos
pela família. Pois constatamos nesse estudo, que muitos adolescentes são arrimo de seu grupo
familiar e como não conseguem colocação no mercado de trabalho e/ou a remuneração é
pequena, optam pela criminalidade.
A pesquisa do DIESSE, citada acima, permite vislumbrar uma pequena faceta do
cenário nacional e evidencia a difícil recolocação daqueles que estavam empregados e
perderam seus empregos, quanto mais a busca e obtenção do primeiro emprego.
Diante dessa realidade consideramos que existem iniciativas público-privadas
pontuais e pulverizadas em relação a socioprofissionalização11 do adolescente em conflito
com a lei, porém elas não se configuram enquanto políticas públicas efetivas preconizadas no
ECA e no SINASE. A educação formal e a qualificação profissional são aspectos essenciais,
mas não são fatores suficientes para garantir a inserção do adolescente em conflito com a lei
no mercado de trabalho e na sociedade, porque depende de fatores externos inerentes a
situação socioeconômica de cada indivíduo. A inclusão produtiva para o adolescente em
cumprimento de medida socioeducativa de internação é fundamental, mas não suficiente para
garantir o protagonismo e a (re)inserção social do mesmo, porque diante das propostas
“atrativas” do narcotráfico, muitas optam por continuarem em conflito com a lei. Essas
hipóteses foram analisadas no decorrer do processo da presente pesquisa.
Segundo o artigo 69 do ECA, “o adolescente tem direito à profissionalização e à
proteção no trabalho, observados os seguintes aspectos, entre outros: I - respeito à condição
peculiar de pessoa em desenvolvimento; II - capacitação profissional adequada ao mercado de
______________
11
Na maioria dos textos e documentos legais o termo citado é profissionalização e que será utilizado neste
estudo de socioprofissionalização, que nada mais é do que a educação para o trabalho.
17
trabalho.” E o SINASE12 no tocante à Profissionalização, Trabalho e Previdência, legitima
que se faz necessário:
Encaminhar os adolescentes ao mercado de trabalho desenvolvendo ações concretas
e planejadas no sentido de inserí-los no mercado formal, em estágios remunerados, a
partir de convênios com empresas privadas ou públicas, considerando, contudo, o
aspecto formativo.” (SINASE, 2006, p. 64).
Nessa mesma perspectiva, Volpi (2002) defende que os adolescentes em
cumprimento de medidas socioeducativas devem ser orientados pela concepção do trabalho
como princípio educativo. Ele cita também que pesquisas anteriores ao ECA registraram que
a maioria dos “adolescentes internos13” apresentava uma concepção negativa em relação ao
trabalho, devido à obrigação de realizar atividades sem utilidade prática e muitas vezes
vexatórias, utilizadas apenas como punição. Para ele as atividades profissionalizantes e o
trabalho não podem ser utilizados como castigo, mas como uma importante dimensão da vida
humana.
Michel Foucault (2008) também deixa claro que as formas de repressão, por si só,
não constituem em aderência as atividades de forma geral, nem tampouco refletem na
mudança da trajetória infracional do sujeito. Enfatiza este autor, que apenas o receio à
punição não será o suficiente para agir sobre o “detento”, sendo certo que o mesmo deverá se
conscientizar. Torna-se necessário ao indivíduo fazer um trabalho consigo mesmo, nas
profundezas de sua própria consciência para poder introjetar sua real mudança no tocante a
sua conduta social. Nesse contexto, consideramos que as unidades socioeducativas têm o
papel fundamental de contribuir para tal, através de ações socioeducativas de qualidade e que
favoreçam esse aspecto.
O trabalho, em qualquer cultura, é uma condição para que as pessoas se
posicionem, digam qual o papel que exercem e qual a sua importância na sociedade. Torna-se,
assim, impossível separar o trabalho da vida, uma vez que é uma atividade social presente em
todas as sociedades, embora possa receber diferentes definições (BLASS, 1998). Além disso,
a entrada do adolescente para o mercado de trabalho apresenta variáveis de acordo com cada
região em que vive e suas tendências culturais.
______________
12
O Tema Profissionalização, Trabalho e Previdência, comum a todos os programas que executam a internação
provisória e as medidas socioeducativas, pode ser verificado no SINASE, no eixo temático 6.3.7,
especificamente no 6.3.7.1 do item quatro.
13
O autor Volpi (2002) designa de “adolescentes internos” aqueles em cumprimento de medida socioeducativa
de internação, delineados no presente estudo.
18
A ausência de políticas de geração de emprego e renda para o adolescente
colabora para a instalação de uma “geração insegura”, pois segundo Machado (2001), os
jovens são importantes agentes de mudanças, e quanto mais tardia é a sua entrada no mercado
de trabalho, mais demorada se torna a chance de ser independente. A dificuldade de se
estabelecer profissionalmente compromete a vida do jovem e principalmente do adolescente
não só nos aspectos psicológicos, fisiológicos, mas gera dificuldades econômicas, refletindo
na dinâmica da sociedade. Verifica-se, portanto, a extrema importância da iniciação
socioprofissional do adolescente, nesse momento de mudanças.
Os adolescentes também precisam viver experiências grupais, a fim de suprir
necessidades afetivas e de apoio. Segundo Maakaroun et al. (1991, p. 06), “o adolescente não
se separa da turma, nem de seus caprichos e modas [...]. Ele é profundamente dependente dos
valores e julgamentos do grupo [...].” Esses grupos, que são criados na escola, no trabalho,
entre outros locais, levam os adolescentes a experimentar sensações de pertencimento,
identificação e uma enorme gama de sentimentos que são essenciais para seu pleno
desenvolvimento.
Podemos considerar a inclusão produtiva desse adolescente um fator essencial
para favorecer essas experiências grupais, pois o ser humano precisa encontrar um sentido
para sua vida, algo em que valha a pena investir (FRANKL, 1999). A entrada para o mercado
de trabalho se torna uma espécie de ritual de passagem, significando a passagem da
adolescência para a idade adulta, onde terá a oportunidade de construir sua própria vida (OIT,
2001).
No contexto das relações capitalistas, a capacidade de consumir credencia e
qualifica o sujeito e interfere na maneira de vivenciar sua ascensão social. No caso específico
do Brasil, onde a desigualdade social é marcante, isto se torna mais visível. Muitos sujeitos,
diante desta realidade, encontram no narcotráfico e na criminalidade a alternativa para ter
acesso aos bens de consumo. Para isto, colocam suas vidas em risco através do enfrentamento
permanente, tentando alcançar o tão almejado status social, através do consumismo. Essa
lógica é a que rege o mundo do adolescente e é estimulada pela sociedade de consumo que
incentiva o acúmulo de bens materiais a curto prazo. Isto gera ansiedade e frustração, na
medida em que ele é estimulado a ter acesso ao que é colocado como valor social e de status
no momento.
Para analisar essas questões é necessário refletir sobre a política de proteção à
criança e ao adolescente no Brasil a partir da Constituição Federal de 1988 (CF/88), com o
19
advento do ECA e do SINASE, além disso refletir sobre os desafios e as perspectivas do
mundo do trabalho no contexto social, político e econômico brasileiro.
O objetivo geral dessa pesquisa é analisar os desafios e perspectivas da inclusão
produtiva para o adolescente em cumprimento de medida socioeducativa de internação e
identificar formas que estejam contribuindo para o seu protagonismo e para sua (re)inserção
social.
Especificamente buscou-se investigar como o adolescente autor de ato infracional
percebe o mundo do trabalho e se já realizou alguma atividade pregressa e registrar o nível de
escolaridade e os tipos de atividades educativas e produtivas internas e externas realizadas
pelo adolescente na unidade socioeducativa de internação. Além disso, buscou-se
compreender como a unidade socioeducativa de internação estimula o protagonismo do
adolescente tendo em vista sua iniciação socioprofissional e investigar a existência de ações
efetivas da SUASE voltadas para a socioprofissionalização do adolescente, visando ao
cumprimento do ECA e do SINASE e analisar os seus desafios e perspectivas.
A investigação foi realizada numa abordagem qualitativa. Iniciamos com análise
documental, baseada em dados e informações estatísticas coletadas na Diretoria de Gestão da
Informação e Pesquisa (DGIP) da SUASE e no setor administrativo do próprio Centro
Socioeducativo.
O presente estudo justifica-se na medida em que busca evidências do
funcionamento dos Centros Socioeducativos, bem como os desafios e perspectivas da
inclusão produtiva para o adolescente em cumprimento de medida socioeducativa de
internação. Além disso, contribui para identificar as relações estabelecidas por eles com a
criminalidade que engendram a experimentação ocupacional, ou seja, as atividades ilegais.
Existe uma escassez de estudos acadêmicos que priorizem a temática em questão, pois os
estudos encontrados abarcam de forma tangenciada14 a questão da iniciação socioprofissional
de adolescentes e a perspectiva que adotamos foi a da inclusão produtiva.
Pelo senso comum, mesmo após o advento do ECA, ainda admite-se que o
adolescente autor de ato infracional é meramente “o Menor Infrator” sujeito apenas às
medidas coercitivas e de contenção e que não necessita de oportunidades. No entanto, não se
______________
14
Geralmente os trabalhos envolvendo o adolescente autor de ato infracional enfocam a legislação, o
atendimento, a família do adolescente, sua relação com substâncias entorpecentes, as causas da violência, entre
outros. No tocante às questões relativas ao mercado de trabalho e/ou a profissionalização dos adolescentes em
conflito com a lei, poucos trabalhos foram encontrados e nenhum utilizando-se o termo Inclusão Produtiva.
20
problematiza como o sistema socioeducativo contribuirá para a (re)inserção social deste
adolescente.
Portanto, tornou-se relevante investigar os desafios e perspectivas do processo de
inclusão produtiva do adolescente autor de ato infracional que cumpre medida socioeducativa
de internação, o que poderá possibilitar a busca por sua autonomia e a construção de um
projeto de vida longe da criminalidade. Isso ainda se configura como um grande desafio na
sociedade contemporânea, diante do estigma que esse adolescente é alvo e da escassez de
Políticas Públicas que privilegiem a temática em questão.
Dessa forma, inicialmente serão tratados os aspectos sobre Adolescência e
Infração no capitulo I. A seguir discutiremos sobre Trabalho, Educação e Sociedade no
Capitulo II. No Capítulo III, foram enfatizados os aspectos metodológicos. Ao final, foi
analisado como o adolescente, em cumprimento de medida socioeducativa de internação,
percebe o mundo do trabalho, se já havia realizado alguma atividade pregressa e quais
atividades estavam inseridas no momento do cumprimento da medida. Além disso, buscou-se
compreender a visão dos profissionais relativa à temática em questão e analisar os seus
desafios e perspectivas, tendo em vista sua iniciação socioprofissional, bem com a existência
de ações efetivas da SUASE visando o cumprimento do ECA e do SINASE.
CAPÍTULO I – ADOLESCÊNCIA E INFRAÇÃO
1.1 Aspectos sobre a Proteção Social à Infância e Caracterização da Adolescência
Para delinearmos os aspectos sobre a adolescência torna-se necessário iniciar este
capítulo com um breve histórico sobre a infância e a juventude, sem perder de vista algumas
concepções sócio-jurídicas no Brasil até o início da década de 80 e em seguida entraremos no
tema propriamente dito.
Segundo Del Priore (1996), até o século XVI tanto crianças como adolescentes
eram vistos como pequenos adultos e a infância era considerada um período de total
dependência física. Desde o século XVII, as autoridades brasileiras já enfrentavam o
problema do abandono, constatando um elevado número de crianças e adolescentes nas ruas e
terrenos baldios, sobrecarregando com isso o orçamento público e tornando precária a
assistência. Para atenuar esse problema, seguindo a antiga tradição portuguesa, foi fundada na
Santa Casa de Misericórdia do Rio de Janeiro, em 1738, a Roda15. A promulgação da Lei do
Ventre Livre, em 1871, favoreceu o aumento do número de crinças pardas e negras
abandonadas e não trouxe benefícios para os filhos de escravos. Visando lucros, muitos
senhores de escravos abandonavam os filhos de escravos e vendiam suas mães como amas de
leite. Os abandonados eram deixados nas Casas dos Expostos, conhecidas como Casas da
Roda, forma típica de atendimento nos séculos XVIII e XIX, onde permaneciam de um a dois
meses. Aqueles que sobrevivessem eram enviados à criadeiras, pagas pelas Santas Casas de
Misericórdia e, após sete anos, eram encaminhados a famílias adotivas ou ao Artesanal de
Marinha, no caso dos meninos, e ao Recolhimento de Órfãs, no caso das meninas.
Del Priore (1996) relata que a Roda recebeu, aproximadamente, 42.200
“enjeitados”, durante os séculos XIII e XIV na Europa. Era procurada por pessoas pobres,
sem condições financeiras para criarem seus filhos; pela elite, no caso de mulheres que não
podiam assumir um filho ilegítimo, ou por adultério e, também, por senhores que
abandonavam adolescentes escravos. A Roda foi criada com o objetivo de salvar a vida de
recém-nascidos abandonados mas, em consequência dos altos índices de mortalidade, passou
a adotar medidas de higiene e práticas de puericultura. Deu-se espaço para a investida médica
______________
15
“A roda era um dispositivo cilíndrico, dividido em duas partes, dando, respectivamente, uma para a rua e outra
para o interior da Santa Casa. Era assistida por uma ama-rodeira, que, dia e noite, vigiava a entrega dos expostos,
tendo como obrigação dar logo parte ao Magistrado da Terra, ou administrador da Roda, da sua entrada.” (DEL
PRIORE, 1996, p. 30)
22
e, por volta de 1872, pediatria e filantropia se associaram, iniciando, assim, uma preocupação
voltada à saúde no atendimento à infância. Com o surgimento dos primeiros internatos,
iniciou-se o processo de substituição das Casas da Roda.
No século XIX, devido à quantidade de “enjeitados” a sociedade contou com uma
vasta população de anônimos, e nesse período foram redefinidos os papéis sociais de
mulheres, crianças e adolescentes. Fato esse, devido ao avanço acelerado da industrialização e
e pela organização do operariado.
A partir do século XX, movimentos sociais, principalmente de médicos e
filantropos, pressionaram o Estado no sentido de proteger o menor. O órfão, o abandonado e
o adolescente delinquente passaram a merecer atenção especial. As primeiras legislações
destinadas à criança e ao adolescente foram criadas no final do século XIX.
Entre as décadas de 20 e 30, período em que se deu a aprovação do primeiro
Código de Menores (1927), com a desativação da Roda dos Expostos (1938) e a criação e
regulamentação por parte do Poder Judiciário, do Juizado de Menores e de todas as entidades
auxiliares, o Estado passa a ser o responsável legal pela tutela da criança órfã e abandonada.
Enquanto diversos países ditos avançados ainda admitiam o castigo físico, a legislação
brasileira já se encaminhava no sentido da proteção à infância, por mais perigoso que fosse o
menor ou por mais grave que fosse a sua infração.
O Código de Menores delegava aos Estados da Federação Brasileira a execução do
atendimento, que se caracterizou, no período de 1930/1945, pela intervenção dos Estados no
controle da população carente. Em 1938, foi criado o Serviço Social de Menores, através do
Decreto nº 9.744 e, a partir de 1947, passou a subordinar-se à Secretaria da Justiça e Negócios
do Interior, tornando-se, então, o órgão executivo da Política Estadual de Assistência ao
Menor. Nessa época, os menores apreendidos nas ruas, independentemente das causas, eram
recolhidos ao abrigo de triagem do Serviço Social de Menores. De um modo geral, os
menores abandonados e infratores recebiam a mesma denominação, ou seja, todos eram
tratados como infratores. (DEL PRIORE, 1996)
Tentando prestar atendimento aos adolescentes “desvalidos e infratores”, o Estado
autoritário criou o Serviço de Assistência ao Menor (SAM), em 1942. Tratava-se de um órgão
do Ministério da Justiça que atuava em caráter correcional-repressivo, o equivalente a um
sistema penitenciário para a população menor de idade. Seu atendimento baseava-se em
internatos (reformatórios e casas de correção) para adolescentes autores de infração penal e de
patronatos agrícolas e escolas de aprendizagem de ofícios urbanos para os menores carentes e
abandonados. (DEL PRIORE, 1996)
23
Nas décadas de 40 e 50, ampliou-se a discussão sobre o problema do menor,
contribuindo para o surgimento do primeiro documento legal de âmbito internacional: a
Declaração Universal dos Direitos da Criança, aprovada em 1959 pela Assembléia Geral das
Nações Unidas. No período entre 1946 e 1964, o Estado brasileiro passou por transformações,
de tal forma que o gasto social público fortaleceu segmentos do setor empresarial e atendeu às
necessidade básicas dos setores mais vulneráveis da população. A partir dessa declaração, um
forte movimento de sensibilização se alastrou pelo mundo, no sentido de rever o trato com a
infância, tanto nas relações privadas quanto principalmente na esfera das políticas públicas. O
regime militar de 1964 veio destruir a política social no Brasil, passando a ser usada para
outros fins. No entanto, o período pós-64 introduziu alterações significativas nos padrões de
proteção social à criança e ao adolescente. (DEL PRIORE, 1996).
Para o atendimento aos direitos da criança e do adolescente em circunstâncias
difíceis, o Estado criou a Lei 4.513/64, que estabelecia a Política Nacional de Bem-Estar do
Menor e a Lei 6.697/79 (Código de Menores), que tratava da proteção e vigilância aos
menores em situação irregular. Estas medidas destinavam-se ao menor carente, ao
abandonado e ao infrator. (DEL PRIORE, 1996).
No Código de Menores/79, não há distinção de gênero entre adolescentes. Os
mesmos não são definidos como sujeitos de direitos e não há menção a deveres do Estado e da
sociedade ou de penalidades previstas para violadores. No início da década de 70, formulouse uma Política Nacional de Atendimento à Criança, através da criação da Fundação Nacional
do Bem-Estar do Menor (FUNABEM), extinguindo o antigo SAM. (DEL PRIORE, 1996).
Em seus primeiros anos de existência, a FUNABEM deu prioridade à melhoria
dos serviços de atendimento existentes como internatos, à implantação de serviços de
recepção, triagem e centros de reeducação. Estimulou a montagem de uma rede urbana de
programas para atender a população infanto-juvenil na sua comunidade, além de serviços
especiais. Passou também a exigir estruturas específicas para berçário e creche, atendendo
crianças de zero a seis anos.
Em meados dos anos 80, a sociedade brasileira, através dos movimentos sociais,
começou a reagir contra as diretrizes apresentadas juridicamente, visando libertar a criança e
o adolescente das condições precárias de atendimento e a ineficácia de seus programas
sociais. Posteriormente, serão explicitados os avanços significativos em termos jurídicos e
sociais ocorridos com a promulgação da Constituição Federal de 1988. A seguir entraremos
no tema da adolescência, alvo do presente capítulo.
24
A adolescência16 para Maakaroun (1991, p. 3) é “um periodo de transição entre a
infância e a idade adulta, continuando um processo dinâmico de evolução da vida, iniciado
com o nascimento”. Esse período correponde a segunda década da existência e essa fase do
desenvolvimento humano pode ser caracterizada como uma das construções identitárias
culturais mais significantes da sociedade contemporânea. Dessa mesma forma, o historiador
Ariés (1981) entendeu a fase denominada adolescência como uma importante etapa da vida,
no sentido de ser um momento de reconhecimento social para o indivíduo e denominou o
desenvolvimento humano como “idades da vida”.
A maturação biológica é comum à espécie humana, sendo denominada de
puberdade, termo que o senso comum confunde com a palavra adolescência. A pubescência é
entendida como a etapa em que acontecem as modificações físicas que levam à puberdade,
período em que a maturidade reprodutiva é obtida e segundo Maakaroun (1991, p. 3) “a
puberdade inaugura biologicamente a adolescência.” Essas variações físicas recebem a
influência dos fatores genéticos e ambientais, bem como da qualidade de vida e do histórico
familiar. Por esses motivos o início e duração dessa fase variam de indivíduo para indivíduo,
mas as modificações puberais são inerentes ao adolescente de forma geral. Contudo, o
crescimento pode acontecer de modo que partes diferentes do corpo se desenvolvam mais
rapidamente que outras.
Segundo Aberastury e Knobel (1981), do ponto de vista psicanalítico, a revolução
psicológica da adolescência pode ser comparada a um processo de luto através das perdas
reais ou simbólicas, pois o adolescente tem de elaborar a perda do corpo e identidade infantil
dos pais e da infância. Na adolescência a auto-imagem que foi construída na infância, tem que
ser desconstruída a partir das novas mudanças corporais, dos novos modelos de
relacionamento desencadeados com o mundo e consigo mesmo.
No tocante a socialização, os adolescentes precisam viver experiências grupais, a
fim de suprir necessidades afetivas e de apoio. Segundo Maakaroun et al. (1991, p. 6), “o
adolescente não se separa da turma, nem de seus caprichos e modas [...]. Ele é profundamente
dependente dos valores e julgamentos do grupo [...].” Esses grupos, que são criados na escola,
no trabalho, entre outros locais, levam os adolescentes a experimentar sensações de
pertencimento, identificação e uma enorme gama de sentimentos que são essenciais para seu
pleno desenvolvimento.
______________
16
Os dados desse tópico têm por base o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e autores como: Erikson,
Philippe Áries, Arminda Aberastury, Maurício Knobel, Contardo Calligares, Marília Maakaroun, Peter Blos e
Musss.
25
Em seu processo de individuação e de construção da sua identidade, o adolescente
busca referências nos seus pares, expressando uma crítica às regras, crenças e atitudes do
mundo adulto. A crítica denota a capacidade do adolescente, cada vez mais consolidada no
sentido de formular seus próprios pensamentos sobre a realidade social. O comportamento
“rebelde” e agressivo a todo momento em relação ao adulto, é resultado da crítica que o
adolescente consegue fazer nesta etapa.
Sendo assim, a convivência no grupo é fundamental para o adolescente aprender
formas de sociabilidade referentes à sua idade, seu gênero e sua condição social, a fim de
nortear seu processo de busca da autonomia. O processo de amadurecimento do adolescente e
a construção de sua identidade é um processo angustiante, principalmente na sociedade
contemporânea onde os valores humanos estão em constante processo de transformação.
A puberdade é um processo que atinge todos os seres humanos, porém a
adolescência não é um fenômeno universal, pois não são todos os adolescentes que deixam a
infância em direção a vida adulta, vivenciando os mesmos conflitos e tensões no mesmo
espaço temporal. (MAAKAROUN, 1991)
A definição de adolescência não é única, pois existem muitas tentativas de
definição do termo e da faixa etária que a delimita. Cada cultura possui um conceito próprio
de adolescência, baseando-se sempre nas diferentes idades para definir esse período. O
consenso é o de que a adolescência é representada por um papel social, ou ainda uma fase
simultânea à puberdade na qual o indivíduo constituirá seus relacionamentos, sua
individualidade e estará introjetando costumes e regras.
Segundo Calligares (2000, p. 77), “o termo adolescência passou a ser usado a
partir do século XX, por Granville Stanley Hall, que já a considerava uma etapa na qual os
jovens precisavam de proteção por mais tempo”. Em decorrência dessa percepção de
Granville desenvolve-se a defesa dos direitos juvenis, e os jovens de sua época passaram a ter
escolarização obrigatória.
Dentre as diversas concepções que compõem esta fase da vida, considera-se nesse
estudo, o período da adolescência segundo o critério cronológico adotado pela Lei nº 8.069,
de 13 de julho de 1990 (ECA), citado no artigo 2º e definido através da faixa etária
compreendida entre doze e dezoito anos de idade.
A adolescência não é vivida de um único modo em todas as sociedades. No caso
do Brasil, segundo o ECA ela é situada entre 12 e 18 anos e como sugere a Organização
Mundial de Saúde – OMS (1975), entre 10 e 19 anos. A oscilação nesses limites deve-se ao
26
fato de que o critério etário não é suficiente para caracterizar essa fase, pois nesta é necessário
considerar também o aspecto social e histórico, fundamental na sociedade contemporânea.
No Brasil, a adolescência apresenta características específicas, que variam de
acordo com a camada ou classe social, com o gênero, com o período histórico e com a cultura
em que o adolescente está inserido (ALVES-MAZZOTTI, 2002). A fase da adolescência pode
ser considerada a partir da emergência de novas formas de sociabilidade dos adolescentes com
as diferentes esferas da vida social, quando passam a viver sentimentos conflitantes e
procuram autonomia e independência diante dos pais e dos adultos e amparo nos grupos afins.
Para Erikson (1991), citado por Maakaroun (1991), “[...] a adolescência é
considerada como um período crucial para a formação da identidade. Somente neste estágio, a
pessoa localiza, verdadeiramente, seu Ego no tempo e no espaço [...].” Para o adolescente,
esse é um período de transformação, importante para o desenvolvimento da personalidade
através da participação, o que lhe propicia assumir uma postura protagonista em relação aos
diferentes contextos sociais. Nas sociedades capitalistas ocidentais a adolescência constitui
uma fase de transição conturbada, que tende a prolongar-se inclusive nos países
economicamente mais desenvolvidos (UNESCO, 1981). É neste contexto social, plural e
sistêmico que se busca considerar o desafio de tantos adolescentes crescerem nas
adversidades, como sujeitos sociais, sujeitos de direitos e deveres e protagonistas de suas
próprias histórias.
1.2 A Constituição “Cidadã”, o ECA e o SINASE
É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente
com absoluta prioridade o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao
lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à
convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de
negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.
(Art. 227 da Constituição Federal de 1988)
O tema “infância e adolescência” ganhou grande visibilidade no Brasil,
principalmente no final da década de 80, com a promulgação da Constituição Federal de
1988, chamada de “Cidadã”, quando avanços significativos em termos jurídicos e sociais
27
foram introduzidos no ordenamento jurídico pátrio. Aboliu-se o emprego do termo “menor17”
carregado de preconceitos e estigmas, referindo-se à criança e ao adolescente menores de 18
anos, em situação de abandono, como infratores ou delinquentes. Sendo assim, a criança e o
adolescente passaram a ser vistos, ao menos na Legislação, como sujeitos de direitos, com
prioridade absoluta, alvo de responsabilidade do Estado e da sociedade civil.
A Constituição Cidadã, em seu Art. 227, consolidou assim no Brasil, a Doutrina
da Proteção Integral, e ao observar a estrutura do caput deste artigo, nota-se que ali existem
dois agrupamentos de direitos da criança e do adolescente e de deveres da família, da
sociedade e do Estado. O primeiro diz respeito aos direitos que devem ser promovidos: o
direito à vida, à educação, ao lazer, à liberdade, à convivência familiar e comunitária. E o
segundo agrupa situações em relação às quais a criança e o adolescente devem ser defendidos,
situações das quais devem eles ser colocados a salvo de qualquer mal, como de toda forma de
negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.
A partir desses pontos, como resultado de movimentos de mobilização e
organização social, foi promulgado em 13 de julho de 1990 o Estatuto da Criança e do
Adolescente (ECA), Lei nº 8.069/90 e com este dispositivo, esta população específica passou
a ser detentora de direitos atribuídos a todos os cidadãos além de outros especiais pela sua
condição peculiar de pessoa em desenvolvimento.
O Estatuto da Criança e do Adolescente, apresentou e representou em nossa
sociedade contemporânea um considerável avanço nas garantias dos direitos da infância e da
juventude. Este documento legal representa uma verdadeira revolução em termos de doutrina,
ideias, práxis, frente à criança e ao adolescente. Ele expressa os novos direitos da população
infanto-juvenil brasileira, inovando em termos de concepção geral e processo de elaboração.
Costa (1996) ressalta que o Estatuto transformou em Lei maior a proposta gerada
no seio da sociedade civil, tendo importante participação em comissões municipais e, em uma
segunda etapa, o Fórum de Defesa da Criança e do Adolescente. Ressalte-se que o ECA
apresenta um novo conceito de infância e adolescência, pois é um documento que traz uma
nova maneira de se pensar e perceber as diversas situações em que se encontram tantas
crianças e adolescentes.
O ECA é um documento jurídico que estabelece direitos e deveres, e explicita na
sociedade brasileira a personalidade jurídica da criança e do adolescente. Refere-se à criança e
ao adolescente como pessoas em desenvolvimento, e isso diz respeito a todas, não apenas
______________
17
O termo “menor” ainda continua sendo utilizado pelo senso comum e pela mídia no sentido de desqualificar a
criança e o adolescente e inviabilizar o ECA.
28
como grupo estigmatizado, por estar em situação de risco pessoal e/ou social ou por estar em
conflito com a lei.
Com o objetivo de concretizar os avanços contidos no ECA e contribuir com o
Sistema de Garantia de Direitos (SGD)18 dos adolescentes em conflito com a lei, o Conselho
Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (CONANDA)19 responsável por deliberar
sobre a política de atendimento à infância e adolescência, no ano de 2002 juntamente com a
Secretaria Especial dos Direitos Humanos (SEDH), entre outros, realizaram encontros em
âmbito municipal, estadual e nacional com os operadores dos SGD, no sentido de debater e
avaliar a proposta de Lei referente a elaboração de parâmetros e diretrizes para a execução das
medidas socioeducativas. A figura mostra a estrutura do SGD:
FIGURA 1 – Visão geral do Sistema de Garantia de Direitos
Fonte: SINASE (2006)
Como resultado desses encontros, em fevereiro de 2004 a SEDH, por meio da
Subsecretaria Especial de Promoção dos Direitos da Criança e do Adolescente (SPDCA), em
conjunto com o CONANDA e com o apoio do Fundo das Nações Unidas pela Infância
(UNICEF) sistematizaram a proposta do Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo
(SINASE). Em 2006, fruto de uma construção coletiva dos operadores do Sistema de Garantia
de Direitos foi entregue à sociedade o SINASE. Documento legal organizado em dez
capítulos que objetiva o desenvolvimento de uma ação socioeducativa sustentada nos
princípios dos direitos humanos e sustentado por bases éticas e pedagógicas.
______________
18
O Sistema de Garantia de Direitos (SGD) é composto pelos Sistemas: Educacional, de Justiça e Segurança
Pública, de Saúde e de Assistência Social, conforme o esquema acima. (SINASE, 2006)
19
O CONANDA foi regulamentado pela Lei Federal nº 8.242 de 12/10/91.
29
1.3 Internação e o processo socioeducativo
Para adentrarmos no tema em questão, referente ao processo socioeducativo dos
adolescentes em cumprimento de medida de internação, é fundamental caracterizarmos
primeiramente as medidas socioeducativas.
Segundo Volpi (2002) as medidas socioeducativas são aplicadas de acordo com as
características da infração, circunstância sociofamiliar e disponibilidade de programas sociais.
Possuem natureza coercitiva, uma vez que são aplicadas exlusivamente a adolescentes20 que
cometeram atos infracionais ou mais popularmente como adolescentes em conflito com a lei.
De acordo com a legislação vigente, os aspectos educativos, denominados a partir de 2006 de
socioeducativos, de acordo com o SINASE, deverão ser contemplados no sentido da formação
integral, oportunizando a formação, informação e sempre que possível encaminhamento
social e profissional. As medidas são aplicadas de acordo com a gravidade do ato praticado
e/ou sua reiteração.
As medidas socioeducativas tem o objetivo de responsabilizar o adolescente que
comete o ato infracional, mas são também uma tentativa constante de superar a sua condição
de exclusão, bem como agregar valores éticos imprescindíveis à vida em sociedade. Segue
uma breve definição com os tipos/característica das medidas socioeducativas, de acordo com
o Capítulo IV - Artigo 112 do ECA, aplicadas sempre por autoridades21 competentes aos
adolescentes que praticam o ato infracional:
• Advertência: Admoestação verbal, reduzida à termo e assinada;
• Obrigação de Reparar o Dano: ressarcimento do dano ou compensação do
prejuízo;
• Prestação de Serviços à Comunidade (PSC): realização de tarefas gratuítas de
interesse geral, por um período de no máximo 06 (seis) meses e 8 (oito) horas
semanais, levando em conta às aptidões do adolescente. É de responsabilidade do
município;
• Liberdade Assistida (LA): seu objetivo é acompanhar, auxiliar e orientar o
______________
20
As medidas socioeducativas são aplicadas apenas aos adolescentes na faixa etária compreendida entre 12 a 17
anos e 11 meses de idade. Caso a criança cometa ato infracional serão aplicadas apenas as medidas protetivas
cabíveis a ela e aos seus responsáveis legais. Como os adolescentes poderão permanecer até 03 (três) anos em
cumprimento de medida, caso ocorra, é possível e permitido pelo ECA, ele atingir os 21 anos de idade no centro
socioeducativo.
21
A aplicação da medida socioeducativa é de responsabilidade da Vara da Infância e Juventude do município.
30
adolescente; seu prazo mínimo é de 06 (seis) meses e também é executada pelo
município;
• Semiliberdade: é uma medida que não comporta prazo determinado e contempla
aspectos coercitivos pois afasta o adolescente do convívio familiar, mas não o
priva totalmente do direito de ir e vir. A escolarização e a profissionalização são
obrigatórias e; é de responsabilidade do Estado;
• Internação: constitui medida privativa de liberdade, mas guarda em si conotações
coercitivas e principalmente as educativas, porém, somente é aplicada aos
adolescentes que cometem atos graves; sujeita aos princípios de brevidade e
excepcionalidade, apesar de não comportar prazo determinado, devendo ser
reavaliada a cada 06 (seis) meses e não podendo exceder a 03 (três) anos.
Também é de responsabilidade do Estado.
A aplicação das medidas socieducativas tem que ocorrer independentemente do
contexto social, político e econômico dos adolescentes. Devido a isso, foram organizadas as
políticas públicas do Estado, a fim de assegurar os deveres e direitos infanto-juvenis, com
prioridade absoluta, conforme prevê o ECA.
O processo socioeducativo dos adolescentes privados de liberdade, de uma forma
geral visa à responsabilização por seus atos e à formação para a cidadania, sempre no intuito
de auxiliar o mesmo a traçar um projeto de vida lícito, distante da criminalidade. A proposta
pedagógica da unidade socioeducativa de internação, tem que ser coerente com a Política de
Atendimento aos Direitos da Criança e do Adolescente, seguindo as diretrizes do ECA (1990),
do SINASE (2006) e legislação correlata, conforme discutiremos a seguir.
Tendo por base as diretrizes do SINASE (2006), é importante ressaltar que os
resultados da aplicação das medidas socioeducativas poderão ser eficazes, se houver um
espaço reservado aos adolescentes para se dedicarem à educação formal, pois esta é
obrigatória nas unidades. É preciso também que haja um espaço externo para recreação ao ar
livre, podendo os adolescentes usufruir de momentos de lazer e espaços apropriados à
realização de atendimentos e oficinas diversificadas. Através das atividades lúdicas,
esportivas e profissionalizantes, as normas e regras repassadas aos adolescentes nestas
atividades poderão facilitar, portanto, a convivência coletiva, evitando a rigidez e o
autoritarismo que na maioria das vezes são utilizados quando se trata de entidades que tem
por base apenas normas e regras, esquecendo-se que o adolescente ainda é um ser em
formação. A uniformalização e a disciplina severa são um fator que limita a expressão de
necessidades e desejos individuais dos adolescentes. O bom senso por parte dos gestores e
31
demais funcionários auxiliará na manutenção de um clima saudável, com opção pelo diálogo,
estabelecendo as diretrizes e colocando limites, sempre que necessário, desde que não
impeçam a naturalidade e a espontaneidade presentes no ambiente juvenil. Assim, é
fundamental compreender que as normas e as regras são essenciais à convivência coletiva,
desde que utilizadas de forma a contribuir para um ambiente saudável e harmônico a toda
Comunidade Socieducativa22 envolvida no processo. As atividades aplicadas em grupo, são
essenciais buscando desenvolver a solidariedade, a compreensão e o espírito de equipe entre
os próprios adolescentes, o que pode levá-los a uma reflexão maior frente aos seus atos. É
fundamental que a unidade recorra à atividades externas, abrindo possibilidades para que o
adolescente, mesmo privado de liberdade, conviva socialmente, ajudando-o a trabalhar seu
protagonismo juvenil e sua autoestima, preparando-o para o retorno ao convívio social.
No livro “A presença da Pedagogia – Teoria e Prática da Ação Socioeducativa”,
Costa (1999) define:
[...] O termo Protagonismo Juvenil, enquanto modalidade de ação educativa, é a
criação de espaços e condições capazes de possibilitar ao jovens envolverem-se em
atividades direcionadas à solução de problemas reais, atuando como fonte de
iniciativa, liberdade e compromisso. O termo Protagonismo Juvenil, vem do grego.
Proto quer dizer o primeiro, o principal. Agon significa luta. Agonista, lutador.
Protagonista, literalmente, quer dizer o lutador principal. No teatro, o termo passou
a designar os atores que conduzem a trama, os principais atores. O mesmo
ocorrendo também com os personagens de um romance. No nosso caso, ou seja, no
campo da educação, o termo Protagonismo Juvenil designa a atuação dos jovens
como personagens principais de uma iniciativa, atividade ou projeto voltado para a
solução de problemas reais. O cerne do protagonismo, portanto, é a participação
ativa e construtiva do jovem na vida da escola, da comunidade ou da sociedade
mais ampla (COSTA, 1999, p.179).
De uma forma geral, torna-se fundamental abrir espaços nos centros
socioeducativos, através da realização de oficinas de artes, música, dança, teatro e tudo que
for possível... deixando, assim, fluir o desenvolvimento natural e espontâneo do adolescente
através de seu protagonismo, visando com isso abrir caminhos para a construção de seu
projeto de vida. (SINASE, 2006)
Conforme determina o artigo 19 do ECA, é importante ressaltar que o trabalho
com o grupo familiar do adolescente é essencial nas unidades socioeducativas, pois a família é
______________
22
De acordo com o eixo 5.1.2. Comunidade Socioeducativa – Cap. 5 – Gestão dos Programas do SINASE, na
convivência coletiva e gestão participativa o objetivo superior deverá ser alcançado com a lógica da Comunidade
Socioeducativa, composta pelos profissionais de forma geral e pelos adolescentes dos programas e/ou unidades
de atendimento socioeducativo, que deverão operar com transversalidade, todas as deliberações, planejamento e
execução de forma que as ações sejam sempre compartilhadas, contemplando as peculiaridades e singularidades
de todos os atores sociais envolvidos (SINASE, 2006).
32
tida como a base fundamental para o desenvolvimento e proteção tanto da criança quanto do
adolescente.
Segundo Lago (2006), compreender o processo socioeducativo de adolescentes
nas unidades de internação,
[...] implica entendê-lo em seus diferentes aspectos; de socialização, de
individualização, de limite e das relações sociais que envolvem os funcionários, o
quadro de dirigentes e o adolescente; assim como entendê-lo também em nível de
suas práticas institucionais, através do regimento interno, do cumprimento da lei, das
normas, regras, da contenção, ou seja, a forma como se realiza o funcionamento da
unidade de internação diante das transformações impostas pelo ECA (LAGO, 2006,
p. 25).
Após a promulgação do ECA, nota-se que mudanças significativas ocorreram em
relação aos direitos da criança e do adolescente. No tocante às medidas socioeducativas, em
especial em seu art. 112, destinadas exclusivamente aos adolescentes e cujo objetivo principal
refere-se à responsabilização do mesmo frente ao ato infracional cometido, levará em conta
sua capacidade de cumpri-la, as circunstâncias e a gravidade da infração. Não são admitidos a
prestação de trabalho forçado e métodos de contenção violentos. Vale ressaltar que tal medida
é, ainda, um grande desafio, pois representa uma ruptura com os modelos tradicionais e
propõe uma nova modalidade de atendimento, cuja lógica é baseada numa ação voltada para
uma proposta pedagógica que visa à educação do adolescente de forma integral, priorizando a
convivência em todos os aspectos.
A análise sobre a educação escolar implica num conhecimento sobre o contexto
social, econômico e político do país. O Brasil é hoje um país onde a desigualdade social é um
fator predominante e a aplicação da lei, no que se refere aos direitos da criança e do
adolescente, é reflexo da omissão da cobrança da responsabilidade pública. Assim, fala-se e
escreve-se no Brasil sobre direito à educação, mas não se garante, de fato, a consolidação
desse direito. Apesar da lei, ainda se presencia um quadro dramático de adolescentes fora da
escola, vivendo a marginalização, a segregação, a violência e o abandono. Para Draibe (1989)
o país defende, através da lei, a universalização, mas na verdade é marcado por uma cultura
elitista, residual e seletiva, onde a riqueza e o direito, infelizmente, são ainda parceiros na
sociedade brasileira, retratando a distância real entre o proposto e o posto, levando a uma
cultura de descrédito no dispositivo legal.
Neste contexto de privação de liberdade, a educação escolar é um desafio ainda
maior, visto que uma enorme parcela dos adolescentes tem baixa escolaridade, visto a evasão
escolar e vivem em situação de extrema pobreza, passando um longo tempo nas ruas, onde as
necessidades materiais, afetivas e sociais encontram-se fragmentadas, não encontrando ali as
33
referências básicas para o seu desenvolvimento biopsicossocial. Essa informação pode ser
confirmada através dos dados apresentados pela SUASE apresentados na página 68 a seguir.
Para compreender as barreiras do trabalho socioeducativo numa unidade de
internação, que é permeada pela contenção e a segurança, faz-se necessário também entender
um pouco sobre o processo de institucionalização tradicional, com o objetivo de refletir sobre
o desafio atual em torno da educação e da segurança. A institucionalização na perspectiva
tradicional apresenta um caráter fechado, tornando-se uma barreira para o adolescente com o
mundo externo, o que muitas vezes implica em proibições e impossibilidades, impedindo a
saída do adolescente para a vida, o que pode ser notado pela própria estrutura física da
unidade: grades e muros que os separam da sociedade.
Uma disposição básica da sociedade moderna é que o indivíduo tende a dormir,
brincar e trabalhar em diferentes lugares, com diferentes co-participações, sob
diferentes autoridades e sem um plano racional geral. O aspecto central das
instituições totais pode ser descrito com a ruptura das barreiras que comumente
separam essas três esferas da vida (GOFFMAN apud CAMPOS, 1985, p. 22).
Isso leva a refletir sobre a prática institucional, envolvendo todos os aspectos da
vida individual e social, como o banho, a alimentação, o lazer, o trabalho realizados sempre
em conjunto, no mesmo horário e no mesmo local, determinados pelos funcionários e com a
presença constante de uma autoridade, como forma de garantir o funcionamento da entidade e
a ordem interna. Isto demonstra a importância das diretrizes preconizadas no SINASE (2006).
Conforme Campos (1985), a imposição de disciplina pode trazer consequências
importantes sobre o desenvolvimento do adolescente, sendo uma delas a impossibilidade de
criar significações. A maior parte de seus atos e gestos é esvaziada de significação, tornandose alienante e repetitivo, inteiramente exterior ao adolescente. A privacidade e a
individualidade são fatores quase inexistentes nas entidades. O atendimento é massificante,
em série. Qualquer possibilidade de ter um objeto que lhes dê a sensação de posse é tolhida,
todos os objetos são coletivos, todos os lugares são de uso comum, até mesmo um momento
de recolhimento tem a interferência de outra pessoa que quer se relacionar ou provocar.
Campos (1985) relata ainda que o tipo de vínculo que se estabelece entre adolescentes,
funcionários e os próprios colegas; os valores; as normas e as ligações internas e externas se
articulam e formam um ambiente psicossocial determinado, privando-os muitas vezes de
viver sua individualidade.
34
Através do internamento, o indivíduo é despojado de suas defesas e, ao ser
submetido às experiências de mortificação, separação do mundo externo, rotina
diária da vida institucional, restrições de movimentos, convívio com grupos de
outros indivíduos, obediência a determinadas normas, restam-lhe possibilidades
mínimas de conservar a concepção de si mesmo e apoio na constituição do eu
(GOFFMAN apud CAMPOS, 1985, p. 30).
Lago (2006) confirma em parte as palavras de Goffman (1985), através de sua
experiência profissional no interior das Unidades Socioeducativas de Internação, e destaca:
[...] o adolescente privado de sua liberdade é despojado de seus desejos, suas
aspirações, seus sentimentos e pensamentos, muitos se fecham e se calam; outros se
rebelam, apresentando comportamentos agressivos; e alguns conseguem, apesar das
dificuldades, conviver com tal situação e não influenciar-se pela mesma, saindo de
cabeça erguida23 (LAGO, 2006, p. 28).
De acordo com Campos (1985), a brincadeira, ou o lúdico, é um espaço de
liberdade, criatividade, sonho, prazer, uso da imaginação, possibilidade de se investir em um
determinado objeto. Desta forma, surge a oportunidade de individualização. Como este é um
fator que foge à rotina diária da entidade, delimita-se o tempo de atividades e, quando são
realizadas é sob forte vigilância, pois a brincadeira torna-se perigosa e por isso precisa ser
limitada, impedida e barrada. Neste contexto, a institucionalização configurou-se como uma
prática tradicional, sem levar em conta a individualidade, a relação familiar, a comunidade, e
muito menos o futuro dos adolescentes que por ela passaram.
A partir do ECA, mudanças significativas ocorreram especialmente no tratamento
oferecido aos adolescentes privados de liberdade. Eles passaram a ser vistos como sujeitos de
direitos, garantidos por lei, e de responsabilidade do conjunto da sociedade. Neste sentido, as
entidades estão sendo orientadas a reverem suas práticas e adotarem medidas alternativas de
atendimento, valorizadoras da cidadania e da dignidade. As medidas de contenção e
segurança são vistas como um meio para responsabilizar o adolescente e ajudá-lo a retornar
ao convívio social e ser um cidadão integrado e participativo, conforme desejado por esse
estatuto.
Sem dúvida que os impasses são inevitáveis, pois devido as mudanças na
legislação, as unidades de internação ainda estão em fase de reconstrução, numa ruptura com
o modelo tradicional, pois a Doutrina da Proteção Irregular aprovava a contenção rígida,
agressiva e autoritária ao “menor infrator” e hoje, com a Doutrina da Proteção Integral, o
aspecto educativo se torna um aliado da segurança para que esses adolescentes em conflito
______________
23
A expressão “cabeça erguida” é sempre verbalizada por adolescentes no interior dos Centros Socioeducativos
que almejam cumprir toda a medida imposta.
35
com a lei possam cumprir sua medida socioeducativa de forma adequada, ou seja, conforme o
ECA. Caso seja necessário a contenção, ela deverá ser de forma não violenta e respeitando
todos os direitos do adolescente, conforme a legislação já citada.
Nesse contexto, Lago concluiu que:
apesar da medida socioeducativa de internação ainda ser considerada um grande
desafio e colocá-la em prática se constitui tarefa árdua, pois não é fácil conciliar a
educação e a segurança, nota-se que aos poucos vem apresentando mudanças
significativas, graças à implementação da Lei 8.069/90 – ECA, que representa uma
conquista para a sociedade. Através do ECA, a sociedade civil (representada pelos
Conselhos de Direitos) e os órgãos competentes (como: Juizado da Infância e
Juventude e Ministério Público) podem questionar e exigir, fazendo indagações
referentes ao modo de funcionamento dos centros envolvidos (LAGO, 2006, p. 29).
Acreditamos que os Centros Socioeducativos de Internação tem o papel de realizar
um planejamento pedagógico que vise à inserção dos adolescentes em escola formal, em
práticas corporais, cultura e lazer e o acesso às atividades externas como: cinema, teatro,
exposições, entre outros. E, sempre que possível, reforçando a manutenção dos vínculos
familiares e comunitários, proporcionando um ambiente interno mesclado com o externo,
promotores da dignidade e da cidadania. Essa perspectiva está sendo reforçada pelo SINASE
(2006).
CAPÍTULO II - TRABALHO, EDUCAÇÃO E SOCIEDADE
2.1 Considerações sobre o tema Trabalho
Trabalho vem da expressão latina tripalium, referindo-se a um instrumento de
tortura usado pelos romanos para obrigar os escravos a trabalhar, uma espécie de canga que se
punha nos bois para propiciar a tração de carga. Nesse sentido a expressão designa um
instrumento de tortura feito de três paus e, por isso, o trabalho passou a ser visto
fundamentalmente como aquilo que “tortura” (CUNHA, 2000).
Com os cristãos, o trabalho apresenta-se com um duplo sentido. Primeiramente
como um complemento da obra do criador, ou seja, o homem deve imitar a Deus quando
trabalha, assim como quando repousa, pois o mesmo Deus quis apresentar-lhe a própria obra
criadora sob a forma de trabalho e sob a forma do repouso. É o que encontramos no segundo
capítulo do Livro do Gênesis (9): “Tendo Deus terminado no sétimo dia a obra que tinha feito,
descansou do seu trabalho. Ele abençoou o sétimo dia e o consagrou, porque nesse dia
repousara de toda a obra da criação” (BÍBLIA SAGRADA, 2002, p. 50). Em um segundo
sentido, o trabalho anda inevitavelmente junto à fadiga. No mesmo Livro do Gênesis, há uma
contraposição àquela benção original do trabalho contida no próprio mistério da criação e
ligada à elevação do homem como imagem de Deus. Por causa da maldição do pecado, o
homem agora terá que tirar da terra o seu próprio alimento: “Maldita seja a terra por tua
causa. Tirarás dela com trabalhos penosos o teu sustento todos os dias de tua vida. Comerás o
teu pão com o suor do teu rosto, até que voltes à terra de que foste tirado; porque és pó e em
pó te hás de tornar” (BÍBLIA SAGRADA, 2002, p. 50). Com base nesses preceitos, a
doutrina cristã vê o trabalho como uma obrigação, como um dever. O homem deve trabalhar,
quer pelo fato do criador lhes haver ordenado, quer pelo fato da sua subsistência e
desenvolvimento assim o exigirem.
Como castigo ou como tortura, o trabalho passou também a ser sinônimo de status
social. Na sociedade medieval, o artesão adquiriu status, pois, mesmo tendo sua origem nos
estratos mais baixos da sociedade, ele dominava técnicas utilizadas no processo de produção,
sobre o qual exercia controle desde sua concepção, execução, até a obtenção do produto final.
A nobreza e o clero, por outro lado, dedicavam-se a tarefa de governar e, somente a eles era
facultado o direito à educação formal (CUNHA, 2000).
37
A partir da Revolução Industrial Inglesa, o trabalho passou a ser visto como um
transformador da natureza e da sociedade e, com a Revolução Francesa, ele passou a ser um
símbolo da “liberdade” do homem. Vários pensadores viriam contribuir com suas teorias para
legitimar uma concepção de engrandecimento do trabalho, visando ao aumento da
produtividade (ENRIQUEZ, 1999).
Adam Smith no Século XVIII, também contribuiu ao afirmar que “o trabalho é o
que permite efetivamente aumentar a riqueza das nações”. Para ele, a divisão do trabalho era
essencial ao crescimento da produção e do mercado, e a sua aplicação eficiente dependia da
livre concorrência, que forçaria um aumento da produção, sendo necessário o
desenvolvimento de novas técnicas, aumentando assim a qualidade do produto e diminuindo o
custo da produção (ADAM SMITH apud ENRIQUEZ, 1999).
Também no século XVII, a visão de Comte, era de que a sociedade que surgia
deveria ser uma sociedade “industrial e positiva”. O Positivismo de Comte fundamentou-se na
ciência e na organização técnica e industrial da sociedade moderna, e considerou a
comprovação pelo método científico o “único” caminho válido para se atingir o
conhecimento. Desenvolveu-se na trilha do empirismo, aproveitando-se dos avanços das
ciências experimentais, sobretudo da química e biologia, e dos argumentos evolucionistas que
proclamavam uma visão de causa e efeito baseando-se na observação dos fatos, inspirado no
pensamento de Darwin (COMTE apud ENRIQUEZ, 1999).
No século XIX Spencer considerava que a sociedade deveria evoluir de um tipo
militar para um tipo industrial onde cada indivíduo poderia desenvolver-se plenamente e unirse livremente a seus semelhantes para atingir o bem-estar econômico e moral. Essa visão fez
muitos seguidores, principalmente nos primeiros anos da República, pois havia uma forte
pressão dos diversos grupos da sociedade para promoverem a industrialização nos seus países
de origem (SANTOS, 2000).
É importante destacar, também, no século XIX, a obra de Émile Durkheim – Da
Divisão do Trabalho Social de 1893, na qual ele discorre sobre a especialização das funções
entre os indivíduos de uma dada sociedade. De acordo com Durkheim, autor também
positivista, ao desenvolver-se, a sociedade multiplica-se em atividades a serem realizadas. A
partir daí, cada indivíduo tem uma função a cumprir, importante para o funcionamento de
todo o corpo social. Cada membro da sociedade desenvolvendo uma atividade útil e
especializada passa a depender cada vez mais dos outros indivíduos (DURKHEIM apud
CUIN; GRESLE, 1994).
38
Com isso, o efeito mais importante da divisão do trabalho social não é apenas seu
aspecto econômico – aumento de produtividade, mas também tornar possível a união e a
solidariedade entre as pessoas de uma mesma sociedade. É o que Durkheim chama de
solidariedade orgânica, que aparece quando a divisão do trabalho social aumenta e torna as
pessoas mais unidas, não por uma crença comum, mas pela interdependência das funções
sociais.
Karl Marx na obra: O Capital, volume I, editado pela primeira vez em 1867, dirá
que “o trabalho é a propriedade fundamental do homem”, pois é nas relações capitalistas de
produção, que os indivíduos livres estabelecem uma relação mediada pelo mercado, isto é,
aqueles que não são donos dos meios de produção vendem a única coisa de que dispõem – o
seu trabalho, em troca dos recursos necessários à sua sobrevivência. Marx afirmou que na
sociedade capitalista é o capital que explora o trabalho. É dessa exploração a que o
trabalhador está submetido, que resulta sua alienação, ou seja, por causa da fragmentação do
trabalho, o trabalhador se aliena ao processo total de produção. A alienação de que fala Marx
é consequência do afastamento entre os interesses do trabalhador e aquilo que ele produz. De
modo mais amplo, trata-se também do abismo entre o que se aprende apenas para cumprir
uma função no sistema de produção e uma formação que realmente auxilie o ser humano a
exercer suas potencialidades.
Com Weber (1905), em sua obra: A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo;
veremos que, a riqueza era um sinal não de prazer, mas de abstinência, o resultado do trabalho
árduo e da autonegação, exatamente aquilo que é necessário para se acumular capital. O
calvinista em ascensão via o seu próprio esforço como algo virtuoso. Weber indicou que a
ansiedade pela salvação levava a ações que, a longo prazo, produziam resultados que levavam
ao empreendimento – condição primordial para o capitalismo. No entanto, o trabalho que
anteriormente era visto como meio de alcançar a salvação, acaba por transformar o crente em
um burguês satisfeito com a recompensa mundana, e com isso, consolidar uma nova ordem
social, a ordem social capitalista (CUIN; GRESLE, 1994).
Para compreendermos o alcance das mudanças na vida da sociedade atual, deve-se
considerar as mudanças ocorridas na economia industrial no início do século XX, que ganhou enorme
eficiência com o Taylorismo, ao preconizar a divisão dos processos industriais em tarefas simples
cronometradas e organizadas, bem como com o Fordismo, que ampliou os princípios do
gerenciamento científico para a produção em massa. Após a década de 70 surge o Toyotismo, com a
adoção do modo de acumulação flexível de capital decorre de necessidade do capitalista superar a
crise e manter ou alcançar a maior taxa de lucros, que é o elemento motriz de todo o sistema. O novo
39
método, iniciado pelos japoneses, iria ter estoques muito menores, produzir o suficiente para abastecer
os vendedores just in time (no tempo justo ou na hora), e de qualquer modo com uma capacidade
muito maior de variar a produção, a fim de enfrentar as novas exigências do mercado. Essas
mudanças levaram a uma “economia do conhecimento” que contribuiu para o crescimento
econômico.
A partir dessa breve contextualização teórica sobre o trabalho vamos explicitar
alguns desafios e perspectivas do mundo do trabalho no Brasil a partir do século XX. Os
direitos sociais para os trabalhadores brasileiros foram alcançados na década de 30, mesmo
assim, foram atingidos apenas os funcionários públicos ou aqueles que tinham carteira de
trabalho assinada. Somente estes trabalhadores adquiriram o acesso à saúde, aposentadoria e
pensões. Aqueles que não estavam enquadrados nesta situação continuavam à mercê da falta
de políticas públicas. Para Telles (1999, p. 109) os trabalhadores deixaram de se submeterem
ao poder patronal e foram “jogados sob a tutela estatal”.
A partir da década de 50, o processo de industrialização no Brasil acelerou-se e
voltou-se para o mercado interno, gerando a migração das pessoas do campo para as cidades,
bem como para o sul e sudeste do país. Devido ao crescimento econômico nesse momento, as
taxas de desemprego tenderam a se manter altas, pois as políticas públicas que enfocavam a
área do trabalho eram de tradição européia e ainda não haviam sido efetivadas no Brasil.
Somente a partir dos anos 80, em resposta ao desemprego e outros fatores,
surgiram políticas macroeconômicas, estruturais e de proteção social, na tentativa de
minimizar os efeitos da crise no mercado de trabalho. A crise atingiu principalmente o jovem,
aumentando o desemprego juvenil, dificultando sua inclusão. Um autor que analisa as
questões relativas à inserção ocupacional dos jovens é Marcio Pochmann:
[...] o desemprego juvenil remete ao problema mais amplo de desestruturação do
mercado de trabalho, que teve início nos anos 80 e que está se aprofundando no
anos 90. Isso tende a agravar as dificuldades tradicionais de inserção dessa camada
da população no mercado de trabalho (POCHMANN, 1998, p. 7).
Para Azeredo (1998), o novo contexto de dificuldades dos anos 80 exigiu que as
políticas de emprego fossem repensadas, pois o Brasil não tinha um mecanismo que
assegurasse proteção ao trabalhador desempregado. No final dos anos 80, foram aprimorados
os direitos sociais, principalmente as políticas de proteção ao emprego. Diante do desemprego
crescente, buscaram-se alternativas para diminuir o impacto negativo sobre os trabalhadores,
40
pois surgiu outro fator de ameaça: a automação, que se tornava uma realidade e excluía ainda
mais os trabalhadores.
Para Escorel (1999, p. 23) a exclusão social “pode designar toda situação ou
condição social de carência, dificuldade de acesso, segregação, discriminação, vulnerabilidade
e precariedade em qualquer âmbito.” Como se vê, exclusão pode ser entendida tanto no
cenário econômico, social, cultural, político como até mesmo no conjunto destes. Ora,
excluído do mercado de trabalho, o trabalhador tem como principal objetivo sua
sobrevivência. Assim, a busca por satisfazer suas necessidades básicas é prioridade. Portanto,
na maioria das vezes o não ingresso no mercado de trabalho implica em exclusão social,
impedindo que a pessoa se perceba enquanto cidadão detentor de direitos. De tal maneira, a
vida destas pessoas fica comprometida e marcada pela incerteza de ter acesso ao trabalho,
moradia, educação, saúde, proteção e alimentação, podendo-se dizer que a desigualdade social
caminha lado a lado com a “exclusão”, interagindo-se e reforçando-se mutuamente.
Para Escorel (1999), a sociedade brasileira pode ser entendida como “desigual” no
aspecto social, pois os índices de distribuição de renda são considerados um dos piores do
mundo; depois de sucessivas crises econômicas presentes desde a década de 70, o Brasil foi
classificado em 1990, por organismos das Nações Unidas, “como um dos países de maior
desigualdade social” (ESCOREL, 1999, p. 26).
Em uma sociedade desigual, a possibilidade de ascensão dos atores sociais, pode
ser considerada como um “bálsamo”; mas o agravamento da situação socioeconômica e a
impossibilidade de ascensão social podem culminar em aumento da violência e do tráfico de
drogas. Daí a importância do trabalho enquanto fator de inserção ou exclusão social e,
acrescente-se a isso, as políticas sociais que dão suporte ao trabalhador (empregado ou
desempregado). Estas são condições significativas para se manter o mínimo necessário para
sobreviver, mínimo este, nem sempre fácil de definir, como declara Sposati (1997).
O desemprego no Brasil tornou-se, de fato, problema social na década de 80, para
o qual os governos, a sociedade, os sindicatos e os empresários buscam, até hoje, soluções.
Vale ressaltar que durante alguns anos as políticas de emprego e proteção social não foram
adotadas no Brasil. Com a desaceleração da economia nos anos 80, o país se viu
impossibilitado de entrar em um novo ciclo de crescimento econômico, como ocorrera
anteriormente (DIEESE, 2001).
Em 2009, a taxa de desemprego em seis das principais regiões metropolitanas do
País ficou em 15% em julho, segundo dados divulgados pela Fundação Sistema Estadual de
Análise de Dados (SEADE) e pelo Departamento Intersindical de Estudos Socioeconômicos
41
(DIEESE). O desemprego praticamente não se alterou em relação ao mês de junho, quando
estava em 14,8%, mas subiu em relação a julho de 2008, quando estava em 14,6%. O
contingente de desempregados aumentou em 45 mil pessoas nas regiões metropolitanas de
Belo Horizonte, Porto Alegre, Recife, Salvador, São Paulo e Distrito Federal, para 3.029
milhões.
Azeredo (1998) destaca as dificuldades para resolver os problemas do desemprego
no Brasil devido aos fatores histórico-estruturais, os quais, ao serem atingidos pela crise
econômica mundial, vieram à mostra, tais como a precariedade das relações de trabalho, a
desigualdade social, as falhas no sistema de proteção social e o baixíssimo nível de
escolaridade da força de trabalho, gerado pela deficiência do sistema educacional brasileiro.
A educação escolar tem sido vista como importante instrumento para resolver os
problemas do desemprego brasileiro. Muito embora tenha contribuído para o melhor
desenvolvimento social, a educação deve ser parte de um conjunto de ações inter-relacionadas
entre mercado de trabalho e sistema educacional, posição defendida por Azeredo (1998).
Nessa mesma perspectiva, Volpi (2002) defende que os adolescentes em
cumprimento de medidas socioeducativas, sejam orientados pela concepção do trabalho como
princípio educativo. Ele cita também que pesquisas anteriores ao ECA registraram que a
maioria dos adolescentes internos apresentava uma concepção negativa em relação ao
trabalho, devido à obrigação de realizar atividades sem utilidade prática e muitas vezes
vexatórias, utilizadas como punição. Para ele as atividades profissionalizantes e o trabalho
não podem ser utilizados como castigo, mas como uma importante dimensão da vida humana.
Michel Foucault (2008) deixa claro que as formas de repressão, por si só, não
constituem em aderência às atividades de forma geral, nem tampouco refletem na mudança da
trajetória infracional do sujeito. Enfatiza o autor, que apenas o receio à punição não será o
suficiente para agir sobre o “detento”, sendo certo que o mesmo deverá trabalhar-se
internamente, ou seja, nas profundezas de sua própria consciência, e as unidades
socioeducativas tem o papel de contribuir para tal.
O trabalho é uma condição para que as pessoas se posicionem, digam qual o papel
que exercem e qual a sua importância na sociedade. Torna-se, assim, impossível separar o
trabalho da vida, uma vez que é uma atividade social presente em todas as sociedades, embora
possa receber diferentes definições (BLASS, 1998).
A ausência de políticas de geração de emprego e renda para o adolescente
colabora para a instalação de uma “geração insegura”, pois segundo Machado (2001), os
jovens são importantes agentes de mudanças, e quanto mais tardia é a sua entrada no mercado
42
de trabalho, mais demorada se torna a chance de ser independente. A dificuldade de se
estabelecer profissionalmente compromete a vida do jovem e principalmente do adolescente
não só nos aspectos psicológicos, fisiológicos, mas gera dificuldades econômicas, refletindo
na dinâmica da sociedade. Verifica-se, portanto, a importância da iniciação socioprofissional
do adolescente, nesse momento de mudanças. O ser humano precisa encontrar um sentido
para sua vida, algo em que valha a pena investir (FRANKL, 1999). A entrada para o mercado
de trabalho se torna uma espécie de ritual de passagem, significando a passagem da
adolescência para a idade adulta, onde terá a oportunidade de construir sua própria vida (OIT,
2001).
No contexto das relações capitalistas a capacidade de consumir credencia e
qualifica os sujeitos e interfere na maneira de vivenciar sua ascensão social. No caso
específico do Brasil, onde a desigualdade social é marcante, isto se torna mais visível. Muitos
sujeitos, diante desta realidade, encontram no narcotráfico e na criminalidade a alternativa
para ter acesso aos bens de consumo. Para isto, colocam suas vidas em risco através do
enfrentamento permanente, tentando alcançar o tão almejado status social, através do
consumismo.
Frigotto (1985) em artigo referente ao Trabalho como Princípio Educativo
esclarece que mesmo na sociedade contemporânea, ainda existem ambiguidades entre as
categorias Trabalho e Educação. Para o esse autor não basta a mudança de termos como:
profissinalização, formação para o trabalho, educação pelo trabalho, entre outros, mas é
necessário uma análise mais profunda das relações sociais concretas que comandam o
processo de trabalho, suas relações de produção e o contexto educativo. Conforme Frigotto
(1985) sempre houve resistência por parte da classe trabalhadora em aderir às propostas
educacionais, por acreditarem que tais propostas servem apenas aos interesses do capital.
Atualmente grande parte dos trabalhadores reivindicam por escolaridade, por perceberem que
o saber no interior das relações sociais em que está inserido é uma forma de poder, mas por
outro lado ainda resiste a um tipo de educação que não tem nada a ver com seu contexto
cultural e socioeconômico. Frigotto (1985) diz que educar, neste contexto, é:
explicitar criticamente as relações sociais de produção da sociedade burguesa [...] e
criar as condições objetivas para que se instaure um novo bloco histórico onde não
haja exploradores e explorados [...] e que, pelo trabalho, mediatizados pela técnica,
os homens produzam sua existência de forma cada vez mais completa”
(FRIGOTTO, 1985, p. 51).
43
Gramsci (1968) suscitou a inseparabilidade entre ensino e trabalho produtivo
enfocando o princípio do trabalho como elemento educativo, num movimento chamado Escola
Única. A escola única poderá auxiliar as classes trabalhadoras partindo do seu senso comum,
de sua cultura, a elaborar e explicitar seu saber e sua consciência crítica, expressa ao mesmo
tempo, numa postura política e na necessidade de mediação técnica. O princípio da escola
única e pública é a criação das condições concretas para a eliminação do caráter de privilégio e
de elitismo, próprios da sociedade burguesa. O trabalho como princípio educativo indica que é
pelo trabalho que o ser humano encontra sua forma própria de “produzir-se” em relação aos
outros homens. A integração entre ensino e trabalho para Gramsci é colocada como sendo
possível dentro do próprio processo autônomo de ensino.
A fim de explicitar melhor o trabalho sob a ótica educativa e a função da Escola
Única Gramsciana, utilizaremos as explicações de Saviani (2007) que para tal, faz uma linha
de raciocínio iniciando no ensino fundamental e chegando até o ensino superior. A linguagem
escrita e a matemática já estão incorporadas na vida da sociedade atual: as ciências naturais,
cujos elementos básicos relativos ao conhecimento das leis que regem a natureza são
necessários para compreender as transformações operadas pela ação do homem sobre o meio
ambiente e as ciências sociais, pelas quais se pode compreender as relações entre os homens,
as formas como eles se organizam, as instituições que criam e as regras de convivência que
estabelecem, com a consequente definição de direitos e deveres. O último componente –
ciências sociais – corresponde, na atual estrutura, aos conteúdos de história e geografia. Eis aí
a forma como se configura o currículo do ensino fundamental.
O princípio educativo do trabalho é a base em que se assenta a estrutura do ensino
fundamental. O estudo das ciências naturais, assinala Gramsci (1968), visa a introduzir as
crianças na societas rerum, e pelas ciências sociais elas são introduzidas na societas hominum.
Uma vez que o princípio do trabalho é imanente à escola, isso significa que na Educação
Escolar a relação entre trabalho e educação está implícita. Ou seja, o trabalho orienta e
influencia o caráter de todo o currículo escolar em função das exigências da vida em
sociedade. A escola não precisa, então, fazer referência direta ao processo de trabalho, porque
ela se constitui basicamente como um meio, ao qual os indivíduos se apropriam daqueles
elementos, para a sua inserção efetiva na própria sociedade. Aprender a ler, escrever e contar,
e dominar as ciências naturais e sociais constituem pré-requisitos para compreender o mundo
em que se vive e entender a própria incorporação pelo trabalho dos conhecimentos científicos
no âmbito da vida e da sociedade.
44
Se no ensino fundamental a relação é implícita e indireta, no ensino médio a
relação entre educação e trabalho, entre o conhecimento e a atividade prática deverá ser tratada
de maneira explícita e direta. O saber tem uma autonomia relativa no processo de trabalho do
qual se origina. O papel fundamental da escola de nível médio será, então, o de recuperar essa
relação entre o conhecimento e a prática do trabalho.
Desta forma, no ensino médio, já não basta dominar os elementos básicos do
conhecimento que contribuem para o processo de trabalho na sociedade. Trata-se, agora, de
explicitar como o conhecimento, isto é, como a ciência, se converte em potência material no
processo de produção. Tal explicação deve envolver o domínio não apenas teórico, mas
também prático sobre o modo como o saber se articula com o processo produtivo. Pode-se
citar como exemplo, a atividade prática/manual de transformação da madeira e do metal pelo
trabalho humano (PISTRAK, 1981, p. 55-56), e como ela pode contribuir para explicitar a
relação entre ciência e produção. O trabalho com a madeira e o metal tem imenso valor
educativo, pois apresenta possibilidades amplas de transformação. No trabalho prático com
madeira e metal, aplicando os fundamentos de diversificadas técnicas de produção, pode-se
compreender como a ciência e seus princípios são aplicados ao processo produtivo. Pode-se
perceber como as leis da física e da química operam para vencer a resistência dos materiais e
gerar novos produtos. Faz-se, assim, a articulação da prática com o conhecimento teórico,
inserindo-o no trabalho concreto realizado no processo produtivo.
O ensino médio envolverá, pois o recurso às oficinas nas quais os alunos
manipulam os processos práticos básicos da produção; mas não se trata de reproduzir na
escola a especialização que ocorre no processo produtivo. O horizonte que deve nortear a
organização do ensino médio é o de propiciar aos alunos o domínio dos fundamentos das
técnicas diversificadas utilizadas na produção. Não a formação de técnicos especializados, mas
de politécnicos (SAVIANI , 2007).
Conforme Saviani (2007) Politecnia significa, especialização como domínio dos
fundamentos científicos das diferentes técnicas utilizadas na produção moderna. Nessa
perspectiva, a educação de nível médio concentrará as modalidades fundamentais que darão a
base a uma infinidade de processos e técnicas de produção existentes.
A concepção anteriormente formulada por Saviani (2007) implica a necessidade do
ensino médio como formação necessária para todos, independentemente do tipo de ocupação
que cada um venha a exercer na sociedade. Sobre a base da relação explícita entre trabalho e
educação desenvolve-se, portanto, uma escola média de formação geral. Nesse sentido, tratase de uma escola de tipo “desinteressado” como propugnava Gramsci (1968, p. 123-125). É
45
assim que ele entendia a escola ativa, e não na forma como essa expressão aparecia no
movimento da Escola Nova. Para ele, o auge dessa escola ativa seria a escola criativa,
entendida como o momento em que os educandos atingiriam a autonomia. Completava-se,
dessa forma, o sentido gramsciano da escola mediante a qual os educandos passariam da
anomia à autonomia, pela mediação da heteronomia. Ou seja, passariam de um estado de falta
de objetivos e perda de identidade a uma investidura em seus próprios interesses, mas levando
em conta a vontade da coletividade.
Ao término do ensino fundamental e médio, os jovens têm diante de si alguns
caminhos: a vinculação permanente ao processo produtivo, por meio da ocupação profissional,
a especialização universitária ou ambos. A educação superior para Saviani (2007), tem como
tarefa, organizar e possibilitar que os indivíduos participem plenamente da vida cultural,
independentemente do tipo de atividade profissional que professem.
A opção pela continuidade dos estudos, além de propiciar o clima estimulante
imprescindível à continuidade do desenvolvimento cultural e da atividade intelectual, tal
mecanismo funciona como um espaço de articulação entre os trabalhadores e os estudantes,
criando a atmosfera indispensável para vincular de forma indissociável o trabalho intelectual e
o trabalho material. Essa afirmação de Saviani foi uma tentativa de desconstruir a idéia de que
o trabalho intelectual seja incompatível com o trabalho material, conforme é sempre
estimulado pela sociedade capitalista no imaginário dos indivíduos.
Esta proposta é diversa da atual função da extensão universitária, que ainda coloca
a população trabalhadora como receptora passiva. Tal proposta tende a evitar que os
trabalhadores caiam na passividade intelectual e ao mesmo tempo, que os universitários caiam
apenas no academicismo. Aliás, Gramsci (1968, p. 125-127), imaginava que tal função viesse
a ser desempenhada exatamente pelas academias que, para tanto, deveriam ser reorganizadas e
totalmente revitalizadas.
2.2 Aspectos Gerais sobre Educação Inclusiva e a Inclusão Produtiva
Neste item serão explicitados alguns conceitos e ponderações fundamentais que farão
parte da reflexão sobre a inclusão produtiva, um termo ainda “carente” de re-significação,
diante da escassez de estudos acadêmicos referentes ao tema em questão e como a educação
inclusiva entra nesse contexto e poderá contribuir para sua efetivação.
Para iniciarmos, é imprescindível citarmos que os movimentos inclusivos surgiram
para as pessoas com necessidades especiais nos Estados Unidos e na Europa. Contudo, o
46
movimento brasileiro somente teve seu início na década de 90, quando a Organização das
Nações Unidas para a educação, a ciência e a cultura, convocou uma reunião mundial para
discutir uma política de educação para todos.
O movimento ocorreu na Tailândia e contou com a participação de instituições
mundiais como Banco Mundial e o UNICEF – Fundo das Nações Unidas para a Infância, de
representantes dos diferentes governos, inclusive o do Brasil, além da participação da
sociedade civil. Esses representantes produziram uma declaração mundial. Diante disso foi
possível perceber que a política inclusiva é primordial, a educação é uma estratégia, uma
chave de mudança, um instrumento de transformação. Porém, não se pode depositar todos os
créditos das mudanças na educação, é necessário reorganizar e fortalecer a luta em busca da
universalização da cidadania, principalmente quando se fala de inclusão (SANTOS M., 2000).
A Declaração de Jomtien ou Conferência Mundial de Educação Para Todos entende
que a educação pode contribuir para conquistar um mundo mais seguro, mais sadio, mais
próspero e ambientalmente mais puro, que ao mesmo tempo favoreça o progresso social,
econômico e cultural, a tolerância e a cooperação internacional, reiterando ainda que a
educação é fundamental para o progresso pessoal e social (UNESCO, 1990) . Essa conferência
estabelecu objetivos fundamentais a serem alcançados:
1. Cada pessoa – criança, jovem ou adulto – deve estar em condições de aproveitar as
oportunidades educativas voltadas para satisfazer suas necessidades básicas de
aprendizagem. Essas necessidades compreendem tanto os instrumentos essenciais
para a aprendizagem – como a leitura e a escrita, a expressão oral, o cálculo, a
solução de problemas quanto aos conteúdos básicos da aprendizagem – como
conhecimentos, habilidades, valores e atitudes necessários para que os seres humanos
possam sobreviver, desenvolver plenamente suas potencialidades, viver e trabalhar
com dignidade, participar plenamente do desenvolvimento, melhorar a qualidade de
vida, tomar decisões fundamentadas e continuar aprendendo. A amplitude das
necessidades básicas de aprendizagem e a maneira de satisfazê-las variam segundo
cada país e cada cultura, e, inevitavelmente, mudam com o decorrer do tempo;
2. A satisfação dessas necessidades confere aos membros de uma sociedade a
possibilidade e, ao mesmo tempo, a responsabilidade de respeitar e desenvolver a sua
herança cultural, linguística e espiritual, de promover a educação de outros, de
defender a causa da justiça social, de proteger o meio ambiente e de ser tolerante com
os sistemas sociais, políticos e religiosos que difiram dos seus, assegurando respeito
aos valores humanistas e aos direitos humanos comumente aceitos, bem como de
trabalhar pela paz e pela solidariedade internacionais em um mundo interdependente.
3. Outro objetivo, não menos fundamental, é o enriquecimento dos valores culturais e
morais comuns. É nesses valores que os indivíduos e a sociedade encontram sua
identidade e sua dignidade;
4. A educação básica é mais do que uma finalidade em si mesma. Ela é a base para a
aprendizagem e o desenvolvimento humano permanentes, sobre a qual os países
podem construir, sistematicamente, níveis e tipos mais adiantados de educação e
capacitação (UNESCO,1990).
47
O Brasil é um dos membros do Grupo de Alto Nível sobre Educação para Todos
(EFA). Portanto, o combate às desigualdades educacionais está intimamente ligado às
desigualdades socioeconômicas. Sendo assim, mesmo com os financiamentos de apoio cedido
pelos países mais ricos as correções dos desníveis ainda são uma grande barreira à educação
para todos, pois conforme dados de 1990 o Brasil investiu apenas 5% do PIB brasileiro na
educação e o atualmente (2009) o investimento representa 4,6%, ou seja, ocorreu uma queda.
O movimento de Educação para Todos deu início, no Brasil e em vários países, à
criação de um novo paradigma, que preconiza a inserção socioeducacional. Esse movimento
mundial, conduziu a um conceito de sociedade inclusiva e fez surgir outros que deram início a
uma cultura inclusiva ou a chamada “Onda Inclusiva”. A onda inclusiva realçou a necessidade
de fazer cumprir algumas leis já existentes e promoveu uma avalanche de novas leis a favor do
processo inclusivo. Contudo, a legislação proporcionou uma série de ações afirmativas que
culminaram numa nova maneira de pensar a Educação e agora idealizar a educação para todos,
Os indivíduos não são iguais e para ser igualitária a educação deve respeitar as diferenças,
assim instaura-se o primeiro paradoxo na sociedade inclusiva (REIS, 2007). Em Salamanca,
1994, a UNESCO promoveu a reunião mundial a respeito dos Portadores de Necessidades
Especiais de Educação, quando acabou sendo aprovada a Declaração de Salamanca
(UNESCO 1994). A partir daí, inúmeros eventos e projetos em todo o mundo tiveram início
ou foram dinamizados em prol de uma educação inclusiva e até hoje caminham nesse rumo,
mas ainda de maneira tímida (REIS, 2007).
Adorno (1995) diz que o que foi negado historicamente ao indivíduo, vítima de
preconceito, foi a possibilidade de modificação dessa realidade, na qual deveria ser pensada
nos seus próprios termos, para que não se tornasse uma resignação. A sociedade só será
inclusiva quando a própria pessoa fizer suas demandas, realçando seus desejos e necessidades
para que não se tornem passivos, mas realmente façam parte de uma sociedade, como
verdadeiros cidadãos.
O movimento de inclusão no Brasil vem percorrendo um caminho difícil, com uma
problemática de ensaio e erro, pois os entraves permitem, apenas, uma inclusão parcial dos
indivíduos. Ao longo dos dezesseis anos da proposta inicial, percebem-se muitas mudanças
significativas, porém não se pode ainda comemorar uma sociedade inclusiva, de um modo
geral, voltada para o cumprimento dos direitos dos indivíduos. Nem as leis generalistas, como
por exemplo, aquela em que a Constituição preconiza que todos têm direito à educação, ao
trabalho, a moradia, entre outros, foram efetivadas. Tendo em vista este fato e muitos outros, a
sociedade brasileira ainda não é inclusiva, em decorrência de fatores de ordem cultural,
48
política, econômica, etc. Não se acaba com o preconceito somente com políticas públicas.
Falar de uma sociedade inclusiva é mostrar uma sociedade que esteja preparada para receber o
indivíduo e a atender suas reais necessidades, seja ele portador ou não de necessidades
especiais.
Várias escolas, têm se esforçado para receber os alunos com necessidades especiais24,
contudo, o número de pessoas incluídas ainda é pequeno, conforme pesquisas do
Departamento de Ciência Política (2004) e da Fundação João Pinheiro (2005). Um dos fatores
que mais impede a inclusão dessas pessoas é o fator acesso, sendo que em populações mais
vulneráveis o problema é potencializado: falta o transporte, é deficitário o acesso físico às
ruas, há falta de equipamentos individuais e outros.
Todos esses fatores contribuem para dificultar a idéia de inclusão na sociedade
brasileira, mas não afastam os esforços de pessoas e instituições que continuam em busca de
possibilidades inclusivas e, assim, a responsabilidade muitas vezes é transportada para o
terceiro setor e para os órgãos fiscalizadores e jurídicos. As ações do Ministério Público, bem
como de certos setores do judiciário, têm propiciado o cumprimento desse direito social.
Conforme alerta Kátia Caiado (2003), a educação inclusiva é um processo árduo, que
exige reflexão da realidade, organização e além de tudo produção de conhecimento, tendo em
vista que a complexidade da inclusão envolve um grande desafio político. Sendo assim,
necessita de ações políticas e principalmente as que envolvem políticas públicas mais
eficientes.
Portanto, a sociedade inclusiva no Brasil ainda necessita de um caminhar mais
direcionado. Sem desconsiderar outras categorias carentes de oportunidades que poderíamos
elencar, mas vamos focar nesse momento o público alvo desse estudo, ou seja, os adolescentes
em cumprimento de medida socioeducativa em busca de oportunidades de inclusão no campo
produtivo.
A percepção da diferença como algo inerente ao humano, nos faz refletir que a
pessoa considerada “excluída” nada mais é do que um cidadão que necessita apenas de
oportunidades para melhor adaptar-se às exigências do meio. Essa dinâmica produz os
processos de inclusão/exclusão e vale argumentar em favor de uma visão que integre políticas
e práticas públicas a uma análise do movimento social mais amplo em que se inserem. O
exame da política de inclusão é particularmente interessante, porque neste caso, as diferenças
______________
24
O termo foi cunhado para definir pessoas que demandam um atendimento diferenciado ou mesmo adaptações
para viver plenamente no ambiente em que vivem, ou seja, não somente as pessoas deficientes.
49
entre indivíduos e grupos entram em conflito imediato com os modos de funcionamento do
sistema, evidenciando suas tensões sociais. (CAIADO, 2003)
No Brasil, apenas em 1988, com a promulgação da Constituição Federal, foi
oficializado um dos princípios inclusivos: o de que os portadores de necessidades especiais
devem ser educados preferencialmente na rede regular de ensino. E seu artigo 227 dispõe, por
sua vez, sobre a criação de programas de prevenção, atendimento especializado, integração
social, treinamento para o trabalho e remoção de barreiras arquitetônicas. Torna-se necessário,
então, a ampliação de outros princípios nesse mesmo modelo inclusivo, direcionando-o para
outras áreas, como exemplo podemos citar a inclusão produtiva, que estamos analisando.
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional - LDBEN nº 9.394/96, estabelece
no seu artigo 59, que os sistemas de ensino devem se organizar para assegurar aos alunos com
necessidades especiais “currículos, métodos, técnicas, recursos educativos e organização
específicos, para atender as suas necessidades”. Deve ser oferecida, também, educação
especial para o trabalho25 e acesso igualitário aos benefícios dos programas sociais
suplementares.
O Plano Nacional de Educação – PNE - Lei nº 10.172/2001, afirma, entre outras
metas, o desenvolvimento e a ampliação de programas educacionais em todos os municípios, o
trabalho em parceria com as áreas de saúde e assistência social, a realização de ações
preventivas e educação continuada dos educadores em exercício. Porém, muitas metas do
PNE, ainda, não foram alcançadas.
Em 2001, as Diretrizes para a Educação Especial mencionam, pela primeira vez, a
inclusão. O documento cita a legislação anterior como base para a sua elaboração e dá
destaque à Declaração de Salamanca (UNESCO, 1994), enquanto fonte de inspiração
filosófica. Como lembra Kassar (2004), a idéia norteadora da Declaração é a de que todas as
escolas deveriam acomodar todas as crianças, portadoras ou não de necessidades especiais e
encontrar uma maneira de educá-las com êxito. Essa idéia impulsionou a difusão do termo
“inclusão” e também popularizou a noção de que todas elas devem ser educadas no mesmo
ambiente.
______________
25
“IV – A Educação especial para o trabalho, visa a sua efetiva integração na vida em sociedade, inclusive
condições adequadas para os que não revelarem capacidade de inserção no trabalho competitivo, mediante
articulação com os órgãos oficiais afins, bem como para aqueles que apresentam uma habilidade superior nas
áreas artística, intelectual ou psicomotora”. A menção ao trabalho competitivo, por oposição a um tipo de
trabalho que não é competitivo, sugere a necessidade de uma reflexão mais profunda sobre o estatuto do trabalho
na sociedade e as formas de participação de diferentes grupos sociais, cabe aqui dar crédito à professora Gilberta
Jannuzzi pela sua insistência em incentivar a importância de abordar esta questão (LAPLANE, 2004b).
50
Por outro lado, Laplane (2004a), revelou o apagamento da dimensão política e a
persistência da visão ingênua que atribui à educação o poder de mudar, sozinha, a sociedade e
uma certa tendência à prescrição. A leitura das diretrizes legais permite identificar, em alguns
momentos, a persistência dessas características. Vejamos a sua primeira definição de inclusão:
[...] a garantia a todos do acesso contínuo ao espaço comum da vida em sociedade,
sociedade essa que deve estar orientada por relações de acolhimento à diversidade
humana, de aceitação das diferenças individuais, de esforço coletivo na equiparação
de oportunidades de desenvolvimento, com qualidade, em todas as dimensões da
vida (LAPLANE, 2004a, p. 7).
Esta definição remete a um conceito amplo de inclusão, e a afirmação, de que a
sociedade “deve estar orientada por relações de acolhimento à diversidade humana” evidencia
o fato de que a sociedade ainda, não se caracteriza por essa orientação,
Nesse sentido, a inclusão pode ser entendida como um princípio filosófico que
preconiza a convivência das diversidades, pressupondo que as diferenças são constituintes do
ser humano e caracterizam-se como a maior riqueza da vida em sociedade (OLIVEIRA, 2003,
p. 33).
Assim, as Diretrizes da Constituição Federal de 1988 destacam o surgimento de uma
nova mentalidade (BRASIL, 2001, p. 8) e assumem como princípios: o direito à dignidade, à
busca de identidade e o exercício da cidadania (p. 9). A noção de inclusão é objeto de nova
elaboração, enfatizando-se que ela não é um mero mecanismo, mas requer a revisão de
concepções e paradigmas (p. 12). A política inclusiva exige a intensificação da formação de
recursos humanos, a garantia de recursos financeiros e de apoio pedagógico e o exercício da
descentralização do poder. Deverão ser criados sistemas de informação que permitam a
avaliação das condições reais para a inclusão e o conhecimento da demanda, assim como a
identificação, análise, divulgação e intercâmbio de experiências inclusivas (BRASIL, 2001, p.
13). As estratégias de comunicação e ação comunitária são também consideradas como formas
de reafirmar o compromisso político com a inclusão.
No início de 2004, a Secretaria de Educação Especial do Ministério da Educação
lançou a série Educação Inclusiva, um conjunto de documentos destinados a promover a
implementação da política de inclusão. A série é composta de quatro documentos que abordam
os aspectos filosóficos da inclusão, o papel dos municípios, da escola e da família. O primeiro
deles assume como ponto de partida a Declaração Universal dos Direitos Humanos, os
princípios de liberdade, igualdade e fraternidade e o respeito à diversidade como uma
consequência dos anteriores. Na sequência, a idéia de uma sociedade inclusiva fundamenta-se
51
numa filosofia que reconhece e valoriza a diversidade como característica inerente à
constituição de qualquer sociedade. Partindo-se desse princípio e tendo-se como horizonte o
cenário ético dos Direitos Humanos, afirma-se a garantia de acesso e a participação de todos,
independentemente das peculiaridades de cada indivíduo e/ou grupo social (BRASIL, 2004, p.
8). Também preconiza que a escola deve organizar-se “de forma a garantir que cada ação
pedagógica resulte em uma contribuição para o processo de aprendizagem de cada aluno”
(BRASIL, 2004, p. 9). A autora
afirma que: “escola inclusiva é aquela que garante a
qualidade de ensino educacional a cada um de seus alunos, reconhecendo a cada um de acordo
com suas potencialidades e necessidades”(LAPLANE, 2006, p. 18-19).
“O ensino inclusivo é a prática da inclusão de todos – independentemente de seu
talento, deficiência, origem socioeconômica ou origem cultural – em escolas e salas de aula
provedoras, onde todas as necessidades dos alunos são satisfeitas”(KARAGIANNIS,
STAINBACK E STAINBACK, 1999, p. 21). Neste sentido, a sociedade só poderá ser
considerada inclusiva quando estiver organizada para favorecer o cidadão, independentemente
de etnia, sexo, idade, necessidades especiais, condição social ou qualquer outra situação de
vulnerabilidade e/ou exclusão.
Desde o final do século passado – década de 90, existe um questionamento
fundamental, de que não há mais como aceitar práticas sociais que intensifiquem os processos
de exclusão social. E é neste contexto que acontece um aprofundamento na discussão sobre a
inclusão, cujo movimento busca denunciar essa sociedade excludente se inserindo num
movimento mundial, na busca de uma sociedade mais igualitária e mais justa, a qual não
restrinja as oportunidades das pessoas somente ao poder econômico. Vê-se, portanto, que a
questão da inclusão e exclusão, antes de tudo, é uma questão política (OLIVEIRA, 2003, p.
34).
O processo de inclusão deve ser capaz de atender a todos, indistintamente, sendo
capaz de incorporar as diferenças no contexto social, o que exigirá a transformação e,
certamente, o surgimento de “novas formas de organização, comprometidas com uma nova
forma de pensar a sociedade e principalmente de como fazer educação” (OLIVEIRA, 2004, p.
109). Assim, a proposta de uma sociedade inclusiva coloca-nos frente a este grande desafio: a
transformação.
Estamos diante de uma das metas mais complexas vivenciadas nos últimos tempos:
aliar o processo de democratização quantitativa ao processo de qualificação de Políticas
Públicas, voltadas para a inclusão, num cenário político ainda pouco favorável a uma proposta
inclusiva. Embora possamos observar alguns avanços no delineamento de ações inclusivas as
52
propostas ainda estão timidamente colocadas no contexto social. Muitas vezes limitam-se
apenas à inserção de pessoas com necessidades especiais, reduzindo, sobremaneira, os
princípios teóricos e legislativos de uma educação inclusiva na íntegra. Observa-se, assim, o
desvirtuamento do prescrito nas próprias regulamentações nacionais, ocasionando um
“distanciamento entre o discurso oficial e o planejamento das condições concretas, não só da
educação especial, mas da escola pública como um todo” (OLIVEIRA, 1996, p. 39).
De acordo com Ferreira (2004), outro aspecto que deve ser lembrado ao falarmos de
políticas públicas de inclusão e que está no bojo das reformas observadas na década de 90,
refere-se ao processo de descentralização, como decorrência do prescrito na Constituição
Federal de 1988 (BRASIL, 1994). Se, por um lado, apontamos as dificuldades inerentes ao
processo de descentralização do poder, por outro, devemos apontar a possibilidade, mesmo
que latente, de a comunidade reivindicar seus direitos de cidadania, lutando pelos preceitos
que, mesmo estando estabelecidos em lei, se encontram ainda distantes da prática cotidiana. E
é exatamente aqui que vislumbramos um cenário favorável à ampliação das Políticas Públicas
Inclusivas, através de ações reivindicatórias que busquem principalmente melhores condições,
que promovam as adequações necessárias para garantir, entre outras coisas, o acesso e a
permanência de pessoas em situação de vulnerabilidade pessoal e/ou social de forma geral.
Para Oliveira (2004) esse, certamente, é um momento precioso para o
desenvolvimento de uma Educação Inclusiva, uma vez que ações inclusivas não surgem
espontaneamente, mas dependerão de ações planejadas, as quais envolvem todos os setores
sociais, não se restringindo à educação em si. O atendimento às necessidades educacionais
extrapola a esfera meramente escolar e atinge todas as instâncias sociais, desde os setores de
saúde e assistência social até o âmbito familiar. Como vemos, concretizar a idéia de um
sistema inclusivo exige um planejamento bastante complexo, que engloba desde as ações a
serem implementadas no macrossistema, a partir da elaboração de uma política diferenciada,
até as ações pontuais no cotidiano através de um planejamento que atenda à diversidade.
O artigo 227 da Constituição Federal de 1988 (BRASIL, 1994), também estabelece
que a promoção e defesa dos direitos humanos só ocorrem quando se respeitam as diferenças
individuais, garantindo a todos os cidadãos a igualdade de direitos e proteção a qualquer
discriminação, e isso não deveria ser diferente em nenhum contexto. Entendemos, desse modo,
que a inclusão deve basear-se no princípio da igualdade, em que respeitar a diferença não é se
opor à igualdade e sim garantir direitos iguais para atender às necessidades específicas de cada
um, considerando que todos são diferentes. Essa ideia é complementada pelo princípio da
equidade que, por sua vez, postula o favorecimento de condições diferenciadas para suprir as
53
desigualdades sociais, culturais e econômicas daqueles que se encontram em situação de
desvantagem.
Aranha (2004), ao se referir a essas considerações, sintetiza a aplicação desses
princípios, quando relata que reconhecer a diferença é ético. A falta da ética se dá quando as
diferenças são utilizadas para a promoção de ações injustas, que desvelem desigualdades
intoleráveis. Esta autora acrescenta que a adoção da inclusão social (promulgada em Jontiem,
Salamanca e Dakar) delineia contornos da convivência não segregada e do acesso ao espaço
comum e aos recursos disponíveis na sociedade. Isso vai ocorrer a partir das adaptações e da
disponibilização de suportes necessários para participação de todos na vida doméstica; escolar;
social; profissional e econômica. O Brasil, por ser partidário e signatário desse paradigma,
deve estabelecer parâmetros que possibilitem a transformação social, em consonância ao
atendimento à diversidade.
Nessa perspectiva, estamos num momento de transformação das ideias, buscando
compreender de forma diferenciada o processo de inclusão e papel da educação e da sociedade
de forma geral neste contexto de formação humana, tendo consciência dos limites e atuando
nas suas possibilidades.
Os objetivos deste modelo inclusivo do qual estamos falando, centram-se na
aprendizagem e no apoio ao educador e ao cidadão, no sentido de garantir o desenvolvimento
das capacidades individuais. Para Mantoan (2001, p. 62), inclusão “é a nossa capacidade de
entender e reconhecer o outro e, assim, ter o privilégio de conviver e compartilhar com
pessoas diferentes de nós.” Como se pode perceber, a definição de inclusão é ampla e abrange
não apenas as necessidades especiais, mas toda a variedade e diversidade social, devendo visar
à aprendizagem e à construção de competências que habilitem para a cidadania. Para Corbett
(2001) “a educação inclusiva diz respeito à qualidade da educação comum e não somente à
educação especial”. Os questionamentos que percorrem o presente estudo, são resultado de
leituras, conversas, observações e reflexões sobre o papel da inclusão produtiva e sua conexão
com a educação, formando um sistema de parceria fundamental.
Apesar dos principais conceitos acima serem voltados para a educação e inclusão de
pessoas com necessidades especiais, será imprescindível conceituarmos o tema em questão,
pois conforme o Dicionário de Termos Técnicos da Assistência Social, (BELO HORIZONTE,
2007), a inclusão produtiva deverá ser respaldada por uma ação pedagógica orientada. Segue
seu objetivo principal:
54
A inclusão produtiva tem por objetivo qualificar o cidadão para sua inserção no
mundo do trabalho através da formação, qualificação profissional e projetos de
geração de trabalho e renda. São oferecidos cursos através de uma ação pedagógica
orientada a formar cidadão a partir de 16 anos em situação de risco social ou pessoal
(BELO HORIZONTE, 2007. p. 51).
Segundo a Política Nacional de Assistência Social (PNAS) os projetos de inclusão
produtiva devem estar articulados com as políticas setoriais e inseridos em políticas de
desenvolvimento regional, e objetivam: a) promover ações que possibilitem a inserção de
indivíduos no mercado de trabalho; c) contribuir para o seu processo de emancipação social;
d) ampliar os trabalhos executados por cooperativas comunitárias e outros sistemas
associativos; e) abertura de frentes de trabalhos compatíveis com a vocação econômica do
município; f) garantir a convivência familiar e comunitária.
Sendo assim, a inclusão produtiva pode ser caracterizada através de ações de
enfrentamento às vulnerabilidades socioeconômicas, conforme estabelecido no art. 25, Inciso
V, da Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS), viabilizando a promoção social do cidadão
em situação de vulnerabilidade, visando a sua autonomia e garantindo o seu acesso às
condições mínimas de sobrevivência, elevando assim a sua qualidade de vida.
A partir das considerações apresentadas anteriormente, principalmente sobre os
processos de inclusão produtiva voltados para o cidadão em situação de vulnerabilidade,
principalmente no caso do adolescente, devemos considerar que a sua inserção ocupacional
exerce duas funções que devem ser consideradas: a) a função moral e disciplinadora; b) a
função de subsistência. A primeira aparece no sentido de manter o adolescente ocupado,
afastando-o do crime e da marginalidade. Através do pressuposto de que o espaço laboral é o
ambiente oposto à desorganização da rua, por exemplo, a exploração do trabalho infantil foi
muitas vezes justificada (MINAYO-GOMEZ; MEIRELLES, 1997). A segunda função
encontra consonância no caráter de subsistência do trabalho. A percepção deste como meio de
obtenção do sustento econômico é bastante forte atualmente e, em muitos momentos acaba por
justificar a utilização indevida do trabalho de crianças e adolescentes como componentes
estruturais da economia brasileira (MINAYO-GOMEZ; MEIRELLES, 1997). Assim, ainda
que para parte da população a escolha profissional seja determinada pela interação entre as
aspirações individuais e as determinações sociais, sendo que cada um tem sua parcela na
efetivação dessa escolha, para grande parte dos adolescentes em situação de vulnerabilidade as
condições socioeconômicas são fortemente determinantes na inserção desse público no mundo
do trabalho, devido comprovações neste estudo.
55
Referente à inclusão produtiva é necessário apontar uma possibilidade pouco
enfatizada nas propostas de intervenção existentes: considerar o trabalho como fonte de
satisfação e prazer e como elemento fundamental no processo de construção da identidade
juvenil, juntamente com a família, a escola e os grupos sociais (BOHOSLAVSKI, 1997).
Sendo assim, a inclusão produtiva muda o status do indivíduo a quem se atribui valores
importantes como o respeito e a assimilação das normas necessárias ao convívio social. Além
disso, o trabalho confere um sentimento de utilidade aos adolescentes trabalhadores, em
oposição ao não-trabalho, associado ao sentimento de inutilidade.
Dentro de uma sociedade em que se valoriza a centralidade do trabalho na vida das
pessoas (SUPER D.; SAVICKAS; SUPER C., 1996), ironicamente esse aspecto é preterido
nas intervenções com adolescentes em situação de vulnerabilidade, que parecem não ter a
permissão de buscar prazer no trabalho e estruturar seus projetos de vida a partir dele,
passando apenas a cumprir tarefas. E é justamente a ausência de uma identidade pessoal e
social que torna tanto a educação quanto o trabalho sem significado para esse público
(ZAGOTTO et al., 2001).
Consideramos que a reflexão sobre o papel da inclusão produtiva possui como
objetivo a resignificação do trabalho na vida do indivíduo – reavaliando crenças e valores
presentes em suas histórias de vidas e propondo uma mudança de paradigmas na representação
do mesmo. Cabe ressaltar que a partir do ECA (1990), algumas iniciativas surgiram com o
intuito de fechar esta lacuna, propondo programas que tem como objetivo a educação “pelo
trabalho” e não, a educação “para o trabalho”, ao qual estamos chamando no presente estudo
de inclusão produtiva. Essas iniciativas devem subordinar o produtivo ao formativo, dando
apoio integrado ao adolescente e novo significado à atividade exercida (MELO-SILVA;
DUARTE; OLIVEIRA, 2003). Em relação à conexão trabalho-escola numa vertente inclusiva,
existem evidências de que esta relação pode ser fundamental. Acredita-se que a escola pode,
ainda, auxiliar o adolescente a desenvolver sua identidade profissional. As escolas ditas
“inclusivas” devem auxiliar os adolescentes a obter aprendizado pelo trabalho.
A partir dos objetivos, conceitos e reflexões explicitados foi possível chegar ao
seguinte significado de inclusão produtiva: é uma ação pedagógica voltada para o cidadão em
situação de vulnerabilidade pessoal e/ou social acima de 16 anos de idade, no sentido de
contribuir para sua preparação e futura inserção no mundo do trabalho.
56
2.3 Iniciação socioprofissional de adolescentes e a função das organizações sociais
Segundo o artigo 69 do ECA, “o adolescente tem direito à profissionalização e à
proteção no trabalho, observados os seguintes aspectos, entre outros: I - respeito à condição
peculiar de pessoa em desenvolvimento; II - capacitação profissional adequada ao mercado de
trabalho.” No caso dos adolescentes em conflito com a lei, o SINASE no eixo temático 6.3.7 que diz respeito à Profissionalização, Trabalho e Previdência, especificamente no 6.3.7.1 Comum a todas as entidades e/ou programas que executam a internação provisória e as
medidas socioeducativas, no item 4 preconiza:
Encaminhar os adolescentes ao mercado de trabalho desenvolvendo ações concretas
e planejadas no sentido de inserí-los no mercado formal, em estágios remunerados, a
partir de convênios com empresas privadas ou públicas, considerando, contudo, o
aspecto formativo” (SINASE, 2006, p. 64).
Nessa mesma perspectiva, Volpi (2002) defende que os adolescentes em
cumprimento de medidas socioeducativas devem ser orientados pela concepção do trabalho
como princípio educativo. Ele cita também nessa obra, que pesquisas anteriores ao ECA
registraram que a maioria dos adolescentes internos apresentava uma concepção negativa em
relação ao trabalho, devido à obrigação de realizar atividades sem utilidade prática e muitas
vezes vexatórias, utilizadas como punição. Para ele as atividades profissionalizantes e o
trabalho não podem ser utilizados como castigo, mas como uma importante dimensão da vida
humana.
Quando se fala em iniciação socioprofissional de adolescentes, não se pode deixar
de citar a família, pois ela constitui uma instituição relevante no processo de reprodução
social, e para tal, configura-se como grupo de convivência organizado por elementos
culturais, no qual os interesses individuais de cada um de seus integrantes se conjugam com o
interesse coletivo da unidade doméstica como um todo (ROMANELLI, 1997). Enquanto
primeiro grupo de convivência, a família tem dois lugares distintos: um das representações
simbólicas e outro da maneira pela qual organiza o consumo de bens materiais devido à
cooperação econômica de seus componentes (DURHAM, 1980). Por isso, a esfera privada
configura-se como espaço de reelaboração das representações sobre a esfera pública, pois
segundo Hannah Arendt (1991) “[...] tudo que vem do público pode ser visto e ouvido por
todos [...]” e envolve o modo como os indivíduos interpretam, dentre outros, o universo do
trabalho, da política, do sistema educacional, da religião e do lazer.
As famílias em situação de vulnerabilidade podem ser consideradas como
constituídas pela população “pobre”, principalmente dos grandes centros urbanos, que vivem
57
em condições financeiras precárias, decorrentes da reduzida qualificação ocupacional e da
baixa escolaridade de seus integrantes, limitado aos serviços públicos, como educação e saúde
(ROMANELLI, 1997)26
A importância do rendimento do trabalho dos filhos para assegurar o consumo de
bens e serviços necessários à sobrevivência e reprodução do grupo doméstico foi
documentada em estudos sobre as classes em situação de vulnerabilidade, principalmente na
obra de Machado Neto (1980). Os estudos apontam a importância que estas famílias atribuem
à escolarização dos filhos, a qual resulta da representação que pais e filhos fazem da escola e
do mercado de trabalho, isto é, a possibilidade de se conseguir emprego e melhores
colocações profissionais nas representações da família, o acesso ao ensino público –
fundamental e médio – o que é considerado pelos integrantes do grupo familiar como
obrigação do Estado, ou seja, um direito social de todo cidadão.
A seguir serão explicitados alguns pontos da legislação sobre a aprendizagem
voltada para o público adolescente de uma forma geral e não somente para os que estão em
cumprimento de medida socioeducativa.
De acordo com o Juiz Dr. Hélio Mário de Arruda, do Tribunal Regional do
Trabalho – TRT da 17ª Região (ARRUDA, 2001), no direito do trabalho brasileiro o contrato
de aprendizagem é destinado ao adolescente trabalhador entre quatorze e dezoito anos de
idade. Inexplicavelmente o legislador não determinou a aplicação das normas especiais de
aprendizagem ao trabalhador de 18 anos de idade em diante. Na década de cinquenta já se
criticava a falta de orientação aos jovens a partir de 18 anos de idade segundo a Consolidação
das Leis Trabalhistas (CLT), que ainda persiste, mesmo com a nova Lei n° 10.097 de 2.000
(ANEXO 08), que alterou vários artigos pertinentes à aprendizagem. A referida lei alterou a
CLT e também alterou a lei do FGTS, no que se refere ao percentual do depósito relativo ao
trabalhador aprendiz. O empregador deverá sempre contratar o aprendiz por escrito e por
prazo determinado. O adolescente deverá estar inscrito em programa de aprendizagem. As
obrigações de cada um em relação ao objetivo da aprendizagem deverá vir expresso no
contrato (CLT, art. 428). A cláusula salarial fixará o salário pactuado que nunca será inferior
ao salário mínimo hora (idem, § 2°).
Preferencialmente os cursos de iniciação profissional serão ministrados pelos
Serviços Nacionais de Aprendizagem, e supletivamente pelas Escolas Técnicas de Educação
ou pelas entidades sem fins lucrativos – ONG’s, que tenham por objetivo a assistência ao
______________
26
Romanelli (1997) e a maioria dos autores citados neste estudo utilizaram o termo “classes populares”, sendo
substituído pelo termo atual, “famílias em situação de vulnerabilidade social”, conforme explicado acima.
58
adolescente e à educação profissional, desde que registradas no Conselho Municipal dos
Direitos da Criança e do Adolescente (CLT, art. 430). É imprescindível que tais entidades
tenham uma estrutura adequada ao desenvolvimento dos programas de aprendizagem, de
forma a manter a qualidade do processo de ensino, bem como em condições de acompanhar e
avaliar os resultados (idem, § 1°). O certificado de qualificação profissional será concedido
aos aprendizes que concluírem os cursos de aprendizagem, com aproveitamento (idem, § 2°).
Cabe ao Ministério do Trabalho e Emprego fixar as normas para avaliação da competência de
tais entidades, ou seja, os critérios para a avaliação do desempenho das entidades de
aprendizagem (idem, § 3°). O curso se desenvolverá em atividades teóricas e práticas,
metodicamente organizadas em tarefas de complexidade progressiva desenvolvidas no
ambiente de trabalho (CLT, art. 428, § 4°).
Todos os estabelecimentos de qualquer natureza são obrigados a empregar e
matricular nos cursos dos Serviços Nacionais de Aprendizagem um número de aprendizes
equivalente a 5% no mínimo, e 15% no máximo, dos trabalhadores existentes em cada
estabelecimento, cujas funções demandem formação profissional. O percentual será calculado
não pelo conjunto dos trabalhadores na empresa, mas sim dos trabalhadores em cada
estabelecimento, ou seja, fábrica, loja, entre outros (CLT, art. 429). O limite percentual é
inaplicável quando o empregador for entidade sem fins lucrativos, que tenha por objetivo a
educação profissional (idem, § 1°-A). As frações de unidade, no cálculo da percentagem
darão lugar à admissão de um aprendiz (idem, § 1°).
A Carteira de Trabalho e Previdência Social do adolescente aprendiz deverá ser
anotada; ele deverá estar matriculado e frequentando a escola, caso não tenha concluído o
ensino fundamental, além de estar inscrito em programa de aprendizagem desenvolvido sob a
orientação daquelas entidades acima referenciadas (CLT, art. 428, § 1°). O Adolescente
trabalhador poderá ser contratado não somente pela empresa onde se realizará a
aprendizagem, mas também pelos Serviços Nacionais de Aprendizagem ou entidades
similares, em autêntica terceirização, mediante contratação por empresa interposta. Nesse
caso o vínculo de emprego será com a entidade educadora e não com a empresa tomadora dos
serviços. Todavia, é aplicável, à hipótese, a Súmula n° 331, IV, do Tribunal Superior do
Trabalho (TST), em ocorrendo a inadimplência do empregador/instituição de ensino,
respondendo subsidiariamente o tomador dos serviços (CLT, art. 431).
Os cursos de aprendizagem não poderão ser estipulados por tempo superior a dois
anos (CLT, art. 428, § 3°). A jornada de trabalho será no máximo de 06 (seis) horas, afastada
qualquer possibilidade de prorrogação e compensação de jornada, exceto aos aprendizes que
59
já tiverem completado o ensino fundamental, se nelas forem computadas as horas destinadas à
aprendizagem teórica, estes poderão ter uma jornada de 08 (oito) horas (CLT, art. 432, § 3°).
Nesta última hipótese será obrigatória a concessão de intervalo para descanso e refeição
(CLT, art. 411). O depósito do FGTS será somente no percentual de 2% da remuneração paga
ou devida no mês anterior (Lei n. 8.036/90, art. 15, § 7°). No termo do contrato de
aprendizagem ou quando o aprendiz completar 18 anos de idade acarretará a extinção do
contrato, e em algumas hipóteses poderá extinguir-se antecipadamente. O desempenho
insuficiente ou inadaptação do aprendiz, ou seja, quando o adolescente não tiver bons
resultados escolares ou não conseguir se adaptar às atividades de formação profissional
poderá acarretar a extinção do contrato de aprendizagem (CLT, art. 433, I). A falta disciplinar
grave autorizará a despedida do adolescente trabalhador (inciso II). A ausência injustificada à
escola que implique perda do ano letivo também autorizará a extinção do contrato de
aprendizagem (inciso III). Finalmente, o pedido de demissão do próprio aprendiz também
implicará a extinção do contrato de aprendizagem (inciso IV).
Inadmissível será a rescisão do contrato de aprendizagem, sem justa causa, por
parte do empregador. Contraditória foi a redação do § 2°, do art. 433, da CLT, no que tange a
inaplicabilidade do artigo 479, porquanto nenhuma das hipóteses dos incisos do artigo 433, da
CLT, se refere a despedida do empregado sem justa causa. Se o legislador teve essa intenção,
frustrada ela ficará face ao erro no enquadramento legal. Na verdade o empregador continuará
tendo que indenizar o empregado na despedida do aprendiz sem justa causa, conforme
entendimento do Juiz Dr. Hélio Mário de Arruda, citado anteriormente.
Podemos citar no contexto de aprendizagem descrito, a função das Organizações
Sociais (OS’s), que vem desenvolvendo seu trabalho junto a adolescentes das classes mais
vulneráveis e tem como objetivo dar-lhes formação socioprofissional, orientação educacional,
cultural e esportiva, defendendo seus direitos trabalhistas e previdenciários e controlando suas
relações no trabalho, em conformidade com as disposições da Lei 10.097 de 2000, citada e do
ECA. Uma das formas de atuação das OG’s tem sido a participação nos Conselhos de Direitos
da Criança e do Adolescente, tanto em nível municipal como Estadual e até nacional e
também pela atuação do Ministério do Trabalho e Emprego em locais impróprios ao trabalho
de adolescentes.
A expansão das Organizações Sociais nos anos 1990 fez com que estas se
tornassem quase que substitutas dos movimentos sociais da década anterior (GOHN, 1997).
Estas organizações têm a função de orientar o adolescente, acompanhar o seu processo
60
escolar27 e (re)encaminhá-lo à escola sempre que necessário e principalmente realizar sua
iniciação profissional, baseada no exercício da cidadania e futuramente inseri-lo em trabalho
adequado à sua condição peculiar de pessoa em desenvolvimento.
O ambiente de trabalho, quando condizente com o descrito no Capítulo V do ECA
(Direito à Profissionalização e à Proteção no Trabalho), pode favorecer ao adolescente o
aprendizado de novas formas de sociabilidade e suas variadas representações, mesmo estando
ele submetido ao controle de seus superiores, principalmente no tocante a continuidade de
seus estudos. O adolescente deverá ter a oportunidade de ampliar suas experiências, o que
favorece o seu processo de amadurecimento psicológico e intelectual. Através do trabalho
remunerado o adolescente conquistará sua autonomia financeira e, consequentemente, diante
da autoridade dos responsáveis, conquistará também uma maior liberdade.
Para Hannah Arendt (1991), “o que preside o processo de labor e todos os
processos de trabalho executados à maneira do labor não é o esforço intencional do homem
nem o produto que ele possa desejar, mas o próprio movimento do processo e o ritmo que este
impõe aos operários”. Daí ser necessário evitar atividades limitadas a movimentos repetitivos,
monótonos e automatizados, devido às consequências negativas que tais atividades podem
acarretar nesta fase de desenvolvimento físico, psicológico e social dos adolescentes.
As Organizações Sociais devem oferecer os seguintes programas de treinamento
aos adolescentes: Formação para a Cidadania e Valores Humanos, Qualificação, Proteção e
Inserção do Adolescente no Mercado de Trabalho. Toda equipe técnica, principalmente o
profissional de Serviço Social responsável por encaminhá-lo, deverá levar em conta o perfil e
o desejo do candidato28.
As empresas que empregam os adolescentes deverão manter um Contrato de
Prestação de Serviço com a organização responsável, que repassará mensalmente à segunda
um salário mínimo a ser pago ao adolescente, além de arcar com todos os encargos sociais e
com o pagamento de 10% do salário-mínimo para a manutenção da organização. O contrato
ainda estipula que os adolescentes serão submetidos a exame médico antes da admissão na
empresa, terão registro em carteira de trabalho, direitos previdenciários garantidos e seguro de
vida (VOLPE, 1999).
______________
27
A preocupação com a escolarização dos adolescentes torna-se mais relevante quando se trata de alunos das
classes mais vulneráveis, pois registram-se elevados índices, tanto de analfabetismo quanto de reprovação e
evasão escolar (ZAGO, 2000).
28
Volpe (1999) enfatiza a importância do perfil e do desejo do candidato, para um desempenho adequado à
função oferecida pela empresa.
61
O Serviço Social tem a atribuição de entrar em contato com empresas para
abertura de novas vagas para os adolescentes, desenvolver trabalho junto às escolas através de
palestras, participar de fóruns regionais com o intuito da erradicação do trabalho infantil e na
formação de Conselhos Municipais. Devem também servir de canal de veiculação de
informações sobre o ECA para os empresários, adolescentes e seus grupos familiares.
Conforme a Lei 10.097/2000, torna-se necessário enfatizar que, para o adolescente
ser integrado nestas Organizações Sociais é necessário estar matriculado e frequentando a
escola regularmente, já que a idéia básica de profissionalização, contida no ECA, é que ela se
dará atrelada ao sistema educacional, com a finalidade de iniciá-lo profissionalmente, mas não
perdendo de vista o cidadão29. Periodicamente as escolas e as empresas deverão enviar à
equipe técnica das Organizações Sociais um controle da frequência escolar e notas dos alunos,
bem como o desempenho e a conduta dos adolescentes no trabalho. É importante ressaltar que
as atividades exercidas pelos adolescentes concentram-se basicamente no setor de serviços e
ao completarem 18 anos, cessa o contrato dos adolescentes com a organização e com a
empresa contratante, podendo ele ser novamente contrato ou não, dependendo do interesse da
empresa e do desempenho e habilidade do mesmo quanto ao trato interpessoal e nas
atividades laborais.
______________
29
Iniciar o adolescente profissionalmente não perdendo de vista o indivíduo como cidadão, nos dá a
possibilidade de denominar este subitem de iniciação socioprofissional.
CAPÍTULO III – PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
3.1 Campo de estudo
O campo de estudo é concebido como o recorte que fizemos, em termos de espaço,
em uma realidade social, representativa da realidade empírica estudada.
Segundo Bourdieu (1983), um recorte espacial é ocupado por pessoas e grupos
que convivem numa dinâmica de interação social e são atores de um determinado contexto a
ser investigado. O campo se constitui como espaços estruturados de posições. Tais postos
possuem propriedades inerentes que variam de acordo com o local que ocupam, podendo ser
analisadas independentemente das características de seus ocupantes, mas é em parte
determinada por elas. Estes espaços sociais possuem leis gerais que regem campos diversos, o
que permite a elaboração de uma teoria que seja aplicável a todos os campos, para sua análise.
Juntamente com as leis gerais, os campos apresentam regulações específicas que contribuem
para o conhecimento dos mecanismos gerais, já que estes se especificam em razão de
variáveis secundárias.
A partir dessa abordagem bourdiniana, consideramos 05 Centros Socioeducativos
de Internação de Belo Horizonte/MG, descritos a seguir; como campos para a realização do
estudo pretendido:
a) Centro de Reeducação Social São Jerônimo (CRSSJ): possui capacidade para
trinta adolescentes do sexo feminino em regime de internação e internação
provisória30 e está localizado à Rua Santo Agostinho, nº 1361- Horto;
b) Centro Socioeducativo Santa Clara (CSESC): possui capacidade para 50
(cinquenta) adolescentes do sexo masculino em regime de internação e está
localizado na Estrada Beira Linha, s/nº – Capitão Eduardo;
c) Centro Socioeducativo Santa Helena (CSESH): possui capacidade para 30
(trinta) adolescentes do sexo masculino em regime de internação e está localizado
na Av. Senador Levindo Coelho, nº 940 – Distrito Industrial – Vale do Jatobá;
______________
30
O Centro Socioeducativo São Jerônimo possui também regime de internação provisória por ser o único para
adolescentes do sexo feminino no Estado de Minas Gerais. A internação provisória deverá ser aplicada a
adolescente pelo prazo máximo de 45 dias, até que ocorra audiência, onde o Juiz da Vara da Infância e Juventude
aplicará a medida adequada ao caso em questão. Foi verificado que a incidência de adolescentes do sexo
feminino é menor que a do masculino, mas mesmo assim existe a necessidade de mais Centros dessa modalidade
no Estado de Minas Gerais.
63
d) Centro Socioeducativo Santa Terezinha (CSEST): possui capacidade para 30
(trinta) adolescentes do sexo masculino em regime de internação e está localizado
na Rua Conselheiro Rocha, nº 3792 – Santa Tereza;
e) Centro de Atendimento ao Adolescente (CEAD): possui capacidade para 30
(trinta) adolescentes do sexo masculino em regime de internação e está localizado
na Rua Viva de Carvalho, nº 64 – Lindéia;
Estes cinco Centros Socioeducativos de Belo Horizonte descritos estão sob a
responsabilidade direta da Secretaria de Estado de Defesa Social (SEDS) através da
Subsecretaria de Atendimento às Medidas Socioeducativas (SUASE), atualmente localizada
na Rua Rio de Janeiro 471, 18º andar, Centro – Belo Horizonte/MG.
A seguir apresentamos um breve histórico sobre a Secretaria de Estado de Defesa
Social (SEDS) e sobre a Subsecretaria de Atendimento às Medidas Socioeducativas (SUASE)
a partir de informações envidadas pela DGIP/SUASE em março de 2009.
A SEDS foi criada em 2003 pelo Governador Aécio Neves, em substituição às
Secretarias de Segurança Pública e Justiça. A criação da SEDS vai além da junção dessas
duas Secretarias. Ela representou o início do delineamento de uma Política Estadual de
Segurança Pública, pois sua missão é promover a segurança da população em Minas Gerais,
desenvolvendo ações de prevenção à criminalidade, integração operacional dos órgãos de
Defesa Social, custódia e reinserção social dos indivíduos privados de liberdade,
proporcionando a melhoria da qualidade de vida das pessoas. A característica principal do
antigo modelo era o “gerenciamento de crises”, já o novo é de “Gestão por Resultados”,
específico para o combate à criminalidade. Esse modelo consiste em acompanhamento
intensivo das atividades, que são desenvolvidas em quatro etapas: Planejamento, Execução,
Monitoramento e Avaliação (PDCA).
Uma das principais inovações do novo modelo foi a criação do Colegiado de
Integração de Defesa Social, instância deliberativa máxima do Sistema de Defesa Social,
composta pela SEDS, através da Subsecretaria de Administração Prisional (SUAPI) e
Subsecretaria de Atendimento às Medidas Socioeducativas (SUASE), da Polícia Civil
(PCMG), da Polícia Militar (PMMG), do Corpo de Bombeiro (CBMMG) e da Defensoria
Pública de Minas Gerais, que se reúnem periodicamente para discutir, planejar e deliberar.
Segue o organograma do Sistema de Defesa Social:
64
FIGURA 2 – Organograma do Sistema de Defesa Social de Minas Gerais
Fonte: Secretaria de Defesa Social de Minas Gerais
No tocante à Política de Atendimento ao adolescente em conflito com a lei, autor
de ato infracional, pode-se dizer que foi fortalecida no Estado a partir de 2003, e foi
impulsionada em 2007, com a criação da Subsecretaria de Atendimento às Medidas
Socioeducativas (SUASE), específica para esse fim. Entre 2003 e 2008, foram criadas 603
vagas para atendimento de medidas socioeducativas de privação de liberdade no Estado de
Minas Gerais. Nesse período, o número de unidades mais do que dobrou. Há cinco anos eram
12 unidades e 420 vagas. Atualmente, são 26 Centros Socioeducativos, com 1.023 vagas em
todo Estado, devido ao aumento de atos infracionais cometidos pelos adolescentes. E segundo
informações colhidas na SUASE, até 2010, deverão ser inauguradas mais sete unidades de
internação, gerando mais 540 vagas no sistema, de forma que todas as regiões do Estado
possuam um centro regionalizado para atendimento das demandas.
Nos centros socioeducativos de internação, os adolescentes participam de projetos
culturais, esportivos e de inclusão social. As atividades têm o objetivo de ensiná-los noções de
trabalho coletivo, disciplina e força de vontade, além de contribuir para a melhoria de sua
autoestima. Os adolescentes também frequentam aulas regulares do Ensino Fundamental e
Ensino Médio.
A SUASE também trabalha com a medida de semiliberdade em parceria com
organizações da sociedade civil. Cabe a ela o repasse de recursos e toda a coordenação
política do programa. Aos parceiros, cabe executar a parte administrativa, segundo
orientações da SEDS. A semiliberdade em Minas Gerais foi desvinculada das medidas de
privação de liberdade, ou seja, atualmente ela faz parte das medidas de meio aberto. O
adolescente que cometeu ato infracional de menor potencial ofensivo é encaminhado a estas
unidades, onde retorna para dormir, após cumprir uma série de atividades, utilizando o
aparato comunitário: escola, oficinas profissionalizantes, atividades esportivas etc.
Em maio de 2009 foi criado o Centro de Encaminhamento para Semiliberdade
(CES), no bairro Horto, em Belo Horizonte, com capacidade para 32 adolescentes. Ainda no
mesmo ano serão abertas mais quatro casas de semiliberdade na capital (sendo uma feminina)
65
e uma em Contagem, gerando 75 novas vagas. O ano de 2008 fechou com um total de 159
adolescentes atendidos em dez casas de semiliberdade.
O Governo do Estado de Minas Gerais, através da SEDS, ampliou também o apoio
técnico e financeiro às prefeituras mineiras que tiveram seus projetos de implantação de meio
aberto selecionados, ou seja, nos Programas Liberdade Assistida (LA) e Prestação de Serviços
a Comunidade (PSC). O meio aberto é uma modalidade que permite a execução de medidas
de caráter socioeducativo sem a restrição da liberdade aos adolescentes autores de ato
infracional de menor gravidade. A proposta visa a reduzir a reincidência de casos e a
necessidade permanente de abertura de vagas de internação.
Através do meio aberto, o autor de ato infracional cumpre a medida judicial com
acompanhamento do Poder Judiciário, Ministério Público e da própria família, contando com
o apoio de assistentes sociais e psicólogos. O cumprimento de medidas socioeducativas para
autores de atos infracionais pelo meio aberto já contava, em 2007 com 170 vagas mantidas em
convênios da SEDS com as prefeituras do interior de Minas Gerais. A SEDS firmou novas
parcerias em 2008 com outros municípios totalizando o apoio e fomento a 540 vagas em meio
aberto (LA e PSC) no Estado.
No sentido de caracterização dos sujeitos da pesquisa, seguem dados documentais
enviados pela DGIP/SUASE31 em março de 2009, referentes aos adolescentes nos 05 centros
socioeducativos supra referidos no período de 2008:
Caracterização dos Adolescentes:
TABELA 1
Total de adolescentes em 2008
Centro
CEAD
CSESC
CSEST
CRSSJ
CSESH
Total
Frequência
%
46
74
62
211
51
444
10,4
16,6
14
47,5
11,5
100
Fonte: DGIP/SUASE (2009)
______________
31
Nem todos os dados solicitados foram enviados pela SUASE. Isto poderá ser verificado no ANEXO A –
Roteiro de Dados Documentais.
66
TABELA 2
Tipo de atos infracionais mais frequentes
Ato Infracional
Homicídio
Tentativa de homicídio
Lesão corporal
Furto
Roubo
Latrocínio
Tráfico de drogas
Porte ilegal de armas
Descumprimento de medidas
Outros
Total
CEAD
4,8%
11,9%
14,3%
47,6%
2,4%
9,5%
4,8%
4,8%
100%
CSESC
20,8%
2,8%
1,4%
8,3%
36,1%
22,2%
4,2%
4,2%
100%
Centro
CSEST
6,6%
6,6%
1,6%
11,5%
42,6%
13,1%
14,8%
3,3%
100%
Fonte: DGIP/SUASE (2009)
TABELA 3
Média de idade dos adolescentes
Idade
12
13
14
15
16
17
18
19
20
Total
%
,5
2,5
6,3
14,4
17,3
26,8
20,5
9,9
1,8
100,0
Fonte: DGIP/SUASE (2009)
TABELA 4
Etnia dos adolescentes
Raça ou cor
Branco
Pardo
Preto
Total
%
30,6
51,6
17,7
100,0
Fonte: DGIP/SUASE (2009)
CRSSJ
6,8%
2,5%
5,9%
17,8%
2,5%
50,8%
,8%
1,7%
11,0%
100%
CSESH
8,0%
10,0%
6,0%
44,0%
2,0%
26,0%
4,0%
100%
67
TABELA 05
Escolaridade dos adolescentes
Faixas de
escolarização
1ª a 4ª séries
5ª a 9ª séries
1º ao 3º anos
Total
%
23,7
72,1
4,2
100,0
Fonte: DGIP/SUASE (2009)
TABELA 6
Tipo de convivência familiar
Convivência
Em família de origem
Sozinho
Com sua própria família
Em grupo
Abrigo
Outras instituições
Trajetória de rua
Total
%
57,8
3,4
7,3
19,0
,7
,7
11,0
100,0
Fonte: DGIP/SUASE (2009)
3.2 Atores da pesquisa
Os atores envolvidos neste estudo foram o(a) Diretor(a) Geral do Centro
Socioeducativo, os adolescentes e alguns profissionais nas cinco unidades de Belo Horizonte,
conforme detalhamento a seguir. Os primeiros atores sociais entrevistados foram os
Diretores(as) dos Centros Socioeducativos32. Em cada um dos centros entrevistamos a
Diretora Geral e todas eram do sexo feminino, num total de 05. A seguir entrevistamos os
adolescentes em cumprimento de medida de internação, na faixa etária de 16 a 18 anos de
idade. Nos meses de Fevereiro e Março de 2009 ocorreu a obtenção das informações e nesse
período a população total nos 05 Centros Socioeducativos era de 161 (cento e sessenta e um)
adolescentes, sendo que o público alvo da presente pesquisa era de 114 (cento e quatorze)
______________
32
É necessário informar que o Centro Socioeducativo possui um Diretor(a) Geral, um Diretor(a) de Atendimento
Socioeducativo e um Diretor(a) de Segurança.
68
adolescentes na faixa etária de 16 a 18 anos. Foram realizadas 43 (quarenta e três) entrevistas
semi-estruturadas, ou seja, um percentual de 37,71% dos adolescentes, conforme Tabela 7:
TABELA 7
População de adolescentes nos Centros Socioeducativos de Internação de
Belo Horizonte/MG, fevereiro/março de 2009
CENTROS
SOCIOEDUCATIVOS
Total de
Adolescentes
Total de
Adolescentes
(16 a 18 anos)
Total de
Adolescentes
Entrevistados
(16 a 18 anos)
Centro de Atendimento ao Adolescente
(CEAD)
28
06
06
Centro de Reeducação Social São Jerônimo
(CRSSJ)
34
26
07
Centro Socioeducativo Santa Clara (CSESC)
36
35
10
Centro Socioeducativo Santa Helena (CSESH)
31
24
10
Centro Socioeducativo Santa Terezinha
(CSEST)
32
24
10
161
114
43
GERAL
Fonte: Centros Socioeducativos de Belo Horizonte/MG, meses de Fevereiro e Março de 2009.
O terceiro grupo foi o dos profissionais das unidades socioeducativas e para tal foi
utilizada, em cada Centro, a técnica do Grupo Focal, num total de 05. Esta técnica foi
realizada com profissionais de diversas funções, dentro da disponibilidade de cada centro a
fim de facilitar a coleta dos depoimentos num menor espaço de tempo, devido ao grande
número de atividades realizadas pelos profissionais no interior das unidades: no CEAD com
12; no CSESH com 09; no CSESC com 06; no CRSSJ com 05 e no CSEST com 09
profissionais.
O GRÁFICO 1 explicita o universo de informações obtidas nos 05 Centros
Socioeducativos de Belo Horizonte/MG:
69
GRÁFICO 1
Atores envolvidos no estudo
Fonte: Centros Socioeducativos de Internação de Belo Horizonte/MG - Fevereiro/Março de 2009
3.3 Metodologia
Minayo define a metodologia como “o caminho do pensamento e a prática
exercida na abordagem da realidade”, acrescentando que a metodologia inclui as concepções
teóricas de abordagem, o conjunto de técnicas que possibilitam a construção da realidade e
também o potencial criativo do pesquisador. A autora aponta, em outro momento, uma
tendência contemporânea para a valorização do vivido, do qualitativo, das ciências que se
ocupam dos significados, das motivações, dos valores (MINAYO, 2007, p. 14).
A presente pesquisa foi realizada numa abordagem qualitativa, o que tornou
possível uma reflexão teórica e crítica a respeito do conteúdo analisado. Essa abordagem foi
utilizada por considerar a relação dinâmica entre o real e o sujeito, entre o mundo objetivo e o
subjetivo o que dificilmente poderá ser traduzido em indicadores quantitativos, conforme
Minayo (2007)
[...] A pesquisa qualitativa responde a questões muito particulares. Ela se ocupa, nas
Ciências Sociais, com um nível de realidade que não pode ou não deveria ser
quantificado. Ou seja, ela trabalha com o universo dos significados, dos motivos, das
aspirações, das crenças, dos valores e das atitudes. Esse conjunto de fenômenos
humanos é entendido aqui como parte da realidade social, pois o ser humano se
distingue não só por agir, mas por pensar sobre o que faz e por interpretar suas ações
dentro e a partir da realidade vivida e partilhada com seus semelhantes. O universo
da produção humana que pode ser resumindo no mundo das relações, das
representações e da intencionalidade e é objeto da pesquisa qualitativa dificilmente
pode ser traduzido em números e indicadores quantitativos (MINAYO, 2007, p. 21).
70
Antes da pesquisa empírica, foi necessário obter um embasamento teórico, que
orientou todo o trabalho de obtenção das informações, de acordo com os seus objetivos. Este
embasamento contribuiu para clarear e facilitar a construção dos instrumentais.
Minayo (2007) sustenta que, ao invés de reconhecer na subjetividade um obstáculo
para a construção científica, é necessário trazê-la para o interior da análise, considerando que
nas ciências sociais o objeto é também sujeito e a produção científica é sempre uma criação
que carrega a marca de seu autor. Nessa perspectiva, considerou-se a importância desta
reflexão para abordar o adolescente em cumprimento de medida socioeducativa de internação.
Os instrumentais utilizados no exercício investigativo qualitativo foram: a Coleta
Documental, realizada e enviada pela Diretoria de Gestão da Informação e Pesquisa – DGIP
da SUASE e pelo próprio Centro Socioeducativo e a realização das Entrevistas SemiEstruturadas (com o Diretor(a) e com os adolescentes) e dos Grupos Focais (com
profissionais). A princípio foi feita uma seleção dos adolescentes pela equipe técnica do
Centro Socioeducativo, a fim de não interromper as atividades dos mesmos e posteriormente
foram entrevistados apenas os adolescentes que concordaram em participar da pesquisa.
Optamos por desenvolver o estudo com os adolescentes na faixa etária entre 16 à 18 anos de
idade considerando os que estavam e que não estavam, inseridos em alguma atividade
produtiva ou de geração de renda.
O Grupo Focal é uma técnica bastante utilizada e que oferece informações
qualitativas, por isso, a opção por realizá-la com os profissionais das unidades
socioeducativas, com no mínimo 06 e no máximo 12 pessoas em diferentes funções –
técnicos, agentes socioeducativos, serviços gerais, enfermeiros, professores, entre outras.
As entrevistas semi-estruturadas foram fundamentais e são consideradas por Gil
(1999) como uma das técnicas mais adotadas pelos pesquisadores sociais, devido a sua
flexibilidade e por propiciarem uma forma de interação social entre investigador e
investigado. Por meio das entrevistas pretendeu-se captar e compreender histórias de vida,
discursos e opiniões dos atores pesquisados, pautando-se pelo cuidado em captar e registrar,
fielmente, o ponto de vista sobre a realidade vivenciada pelos adolescentes e delimitada no
objeto.
Utilizou-se, para o tratamento dos dados, a técnica denominada Discurso do
Sujeito Coletivo (DSC) modalidade temática proposta por Lefèvre F. e Lefèvre A.: “A
elaboração dos Discursos do Sujeito Coletivo é uma das formas de que o pesquisador pode
lançar mão para reconstruir o universo de representações existente no campo pesquisado [...]
(LEFÈVRE F.; LEFÈVRE A., 2003, p. 37).
71
O motivo da escolha dessa técnica se justifica por ser uma técnica de pesquisa
qualitativa, que consiste basicamente em analisar o material coletado de entrevistas e
documentos, extraindo-se deste material as Expressões Chaves (ECH), Ancoragem (AC), as
Ideias Centrais (IC), e finalmente os discursos individuais considerados como base dos
discursos coletivos, ou discursos-síntese, que estarão na forma de enunciados a nos fornecer
através de palavras escritas ou depoimentos, as informações que buscamos a partir de nossos
objetivos para fundamentar a análise sobre o tema pesquisado.
Os DSC – que podem resultar tanto das Ideias Centrais quanto das Ancoragens –
podem ser compostos de um ou mais depoimentos que apresentam um sentido singular que,
sob uma forma discursiva refletem os pensamentos e os valores associados a um dado tema,
presentes numa formação sócio-cultural num dado momento histórico.
No DSC, por um lado, os elementos do conjunto, os conteúdos das informações
individuais, não se anulam já que o objetivo não é produzir uma soma matemática, mas um
discurso coletivo que veicule um sentido, um posicionamento, uma opinião onde o colorido e
os matizes que cada depoimento individual confere a esta opinião coletiva estejam
preservados. Dessa forma, optou-se por utilizar somente as ECH’s e as IC’s dos discursos,
podendo ser definidos sinteticamente como:
As Expressões Chaves (ECH) são pedaços, trechos ou transcrições literais do
discurso, que devem ser sublinhados, iluminados, coloridos, pelo pesquisador, e que revelam
a essência do depoimento. A esta base denominamos de Ancoragem (AC) e esta é a base
teórica onde o discurso está fundamentado.
A Idéia Central (IC): é um nome ou expressão linguística que revela e descreve da
maneira mais sintética, precisa e fidedigna possível o sentido das afirmações específicas
presentes em cada um dos discursos analisados. É importante assinalar que a IC não é uma
interpretação, mas uma descrição do sentido de um depoimento ou de um conjunto de
depoimentos.
O DSC, enquanto figura metodológica é um discurso-síntese, redigido na primeira
pessoa do singular, sendo elaborado a partir das Ideias centrais, expressões chaves e/ou
ancoragens, compondo a soma das Ideias e da base contextual dos discursos elaborados. O
processo de construção do DSC foi baseado nas entrevistas semi-estruturadas e nos grupos
focais e na identificação das ECH’s, uma figura metodológica constituída por trechos
selecionados nos Instrumento de Análise 1, 2 e 3 (IAD 1; IAD 2 e IAD 3), separadamente
para cada resposta relacionada a uma pergunta específica.
72
A seguir, as IC’s identificadas nos depoimentos de cada informante foram listadas
conjuntamente para cada pergunta respondida como parte do Instrumento de Análise 1, 2 e 3.
As IC’s identificadas como equivalentes, foram instituídas como categorias que somaram
respostas de diferentes informantes sobre uma mesma denominação de modo a preservar a IC
de cada um deles. Com isso foi possível chegar ao DSC em cada questão do roteiro de
entrevistas e de grupo focal.
Buscou-se, na verdade, através do DSC, o sentido ou os sentidos produzidos pelas
falas dos informantes, enquanto elementos recorrentes que possam oferecer indicações sobre a
temática da inclusão produtiva em questão, observando com cautela a relação entre o que é
dito e o que é escrito, ou seja, a forma como o discurso é recebido por quem ouve ou lê suas
palavras. Dessa forma os DSC’s permitem reconstruir as representações como entidades
qualitativas na medida em que estas aparecem como discursos. É importante esclarecer que
nesse estudo, conforme Castro (2008) consideraremos o discurso como uma construção
social, não individual, e que só pode ser analisado considerando seu contexto histórico-social;
significa ainda que o discurso reflete uma visão de mundo determinada necessariamente,
vinculada à do(s) seu(s) autor(es) e à sociedade em que vivem. Tais discursos são qualidades
porque são coisas que não existiam sob esta forma, antes da pesquisa. Uma representação
social33 construída pelo DSC é uma qualidade muito particular que poderíamos chamar de
opinião ampliada. (LEFÈVRE F.; LEFÈVRE A., 2006)
3.4 Obtenção de Informações
Conforme já explicitado anteriormente, os dados foram obtidos através de
diferentes técnicas de pesquisa, especificamente: a pesquisa documental; as entrevistas semiestruturadas e o grupo focal, descritos a seguir.
A palavra documento tem uma conotação ampla, abrangendo material escrito,
estatístico e iconográfico. Assim, esclarece Godoy (1995), o exame de materiais de natureza
diversa, que ainda não receberam um tratamento analítico ou que podem ser reexaminados,
buscando-se novas formas e/ou interpretações complementares, constitui o que foi
denominado de Pesquisa Documental. Esse tipo de forma de obter informações, oferece
______________
33
De acordo com a Wikipédia, a enciclopédia livre, Representações Sociais são o conjunto de explicações,
crenças e ideias que nos permitem evocar um dado acontecimento, pessoa ou objeto. Estas representações são
resultantes da interação social, pelo que são comuns a um determinado grupo de indivíduos.
73
vantagens como o estudo de pessoas e situações às quais não podemos acessar, o fato de se
poder contar com uma fonte não-reativa, uma vez que os dados não se alteram por um longo
período de tempo e de possibilitar análises longitudinais, através do estudo de longos períodos
de tempo na identificação de tendências.
Para a coleta de material sob a forma de documentos escritos e estatísticos foi
utilizado um roteiro específico (APÊNDICE A). Os dados obtidos foram fornecidos pela
Diretoria de Gestão da Informação e Pesquisa (DGIP) da SUASE.
As entrevistas do tipo, semi-estruturadas foram realizadas concomitantemente,
com dois segmentos com roteiros específicos: a) um para os(as) os Diretores(as) dos Centros
Socioeducativos (APÊNDICE B), constituída de identificação e 05 questões. Em cada um dos
centros a Diretora Geral, a qual denominaremos de DSC-D, independentemente do centro
socioeducativo que estão responsáveis; b) e outro para os adolescentes em cumprimento de
medida de internação (APÊNDICE D), na faixa etária, entre 16 a 18 anos de idade, conforme
explicitado no item Atores da Pesquisa (3.2 do Capítulo III) do presente estudo, constituída
de identificação e oito questões e serão denominados DSC-A. As entrevistas foram realizadas
mediante consentimento de cada informante, após os esclarecimentos sobre a participação dos
mesmos na pesquisa. Este consentimento foi estabelecido pela assinatura de Termo de
Consentimento Livre e Esclarecido (ANEXO C).
As entrevistas foram realizadas nas próprias unidades socioeducativas em horários
pré-estabelecidos pela Direção, inclusive em finais de semana, no sentido de não interferir na
rotina de atividades realizadas pelos(as) adolescentes. As entrevistas foram gravadas em
aparelho de MP3, mediante consentimento verbal da Direção e de cada informante, com
assinatura do Termo citado acima e posteriormente transcritas e digitadas. Além dos dados de
identificação constantes nesses roteiros, esses foram complementados pelos dados da coleta
documental.
Para complementar as informações de forma mais eficiente, contemplando um
maior número de profissionais e facilitar a interlocução interdisciplinar sobre o tema em
questão, foram realizados, cinco grupos focais nos Centros Socioeducativos já descritos.
Os grupos foram realizados apenas com profissionais que foram escolhidos pela
direção, de acordo com a disponibilidade dos mesmos, respeitando apenas um maior número
de especificidades profissionais possíveis: no CEAD com 12; no CSESH com 09; no CSESC
com 06; no CRSSJ com 05 e no CSEST com 09. Esse segmento foi denominado DSC-P.
Para realização dos grupos foi necessário um empenho da equipe de direção do
Centro Socioeducativo e disponibilidade dos profissionais. Assim, foram necessárias cinco
74
datas previamente agendadas em cada uma das instituições. A pesquisa de campo aconteceu
em fevereiro e março de 2009. Devido ao grande número de atividades o grupo foi organizado
em apenas um dia por aproximadamente uma hora e trinta minutos. A técnica do grupo focal34
foi introduzida com a música Pivete, composição de Chico Buarque e Francis Hime, no
sentido de sensibilizar e introduzir o tema em questão (ANEXO A). Ocorreu sem maiores
problemas, necessitando apenas da pesquisadora para dar sequência às questões chaves e à
temática relacionada que deveria ser enfocada nas discussões, conforme o roteiro
(APÊNDICE C).
Segundo Minayo (2000) a técnica de Grupo Focal viabiliza o acesso, através da
interação às visões e aos dados que dificilmente seriam disponibilizados sem a situação
peculiar da troca e do debate. Krueger (1994, p. 15) define Grupo Focal como “uma
determinada técnica de entrevista, direcionada a um grupo que é selecionado pelo pesquisador
a partir de determinadas características identitárias, visando obter informações qualitativas.”
Minayo (2000, p. 24) ressalta que “ao buscar obter informações qualitativas,
persegue-se apreender os valores e códigos do grupo, seus modelos explicativos da realidade
social e de suas próprias experiências; assim como seus quadros de relevância.” Buscando
apreender mais essa técnica e retirar dela todo o potencial para o trabalho compreensivo,
tornou-se necessário entender seu uso e sua história nas ciências sociais. Apenas na década de
40 o termo “Grupo Focal” foi utilizado e estruturado por Robert Merton e colaboradores, que
realizaram pesquisas sociais com soldados durante a Segunda Guerra Mundial, cujo objetivo
era conhecer a eficácia do material de treinamento para as tropas e o efeito de propagandas
persuasivas. Em 1952, Thompson e Demerath estudaram os fatores que influenciavam a
produtividade nos grupos de trabalho, ao mesmo tempo em que Paul Lazarsfeld e outros
adaptaram o Grupo Focal para pesquisas em Marketing. Nos anos 90, esta metodologia
passou a ser amplamente utilizada em pesquisas de opinião, de marketing, mas também em
várias áreas de conhecimento, dentre as quais o campo da saúde, vários autores têm analisado
o comportamento em crianças, adolescentes e adultos a partir dessa técnica, inclusive Minayo
(2000).
O Grupo Focal foi definido por Morgan (1987) como uma técnica de pesquisa. É
denominado grupo, por envolver mais de dois participantes, possuir sessão ou sessões semiestruturadas, um setting informal e um moderador que coordena e lidera as atividades e os
______________
34
Mesmo tendo ciência dos procedimentos e roteiros da técnica do Grupo Focal, a pesquisadora sob anuência da
orientadora, introduziu um elemento novo, ou seja, a música - no sentido de possibilitar abertura para o tema em
questão, auxiliando na descontração dos profissionais.
75
participantes. O termo focal é designado pela proposta de coletar informações sobre um
tópico específico.
Os Grupos Focais são eficientes na etapa de levantamento de informações, pois
um número pequeno de grupos pode gerar um extenso número de Ideias sobre as categorias
necessárias para o estudo desejado. Auxilia o pesquisador a conhecer a linguagem que a
população usa para descrever suas experiências, seus valores, os estilos de pensamento e o
processo de comunicação. A seleção dos participantes do Grupo Focal tem como base suas
experiências em comum e relacionadas ao tópico de investigação. Quanto maior a
complexidade do tema, menor deve ser o número de participantes no grupo. O ideal é de seis
a doze pessoas por sessão. É importante que haja duas pessoas neste processo onde uma delas
faz o papel de moderador do grupo e outra se responsabiliza pela relatoria e pela gravação.
Minayo (2000).
Os cinco grupos realizados nos Centros Socioeducativos apresentaram
características bastante similares. Ambos tiveram o número de participantes desejável e foram
contemplados 41 profissionais de diversas áreas. Os grupos contaram com a participação de
duas pessoas, a pesquisadora que fez o papel de moderadora, e uma auxiliar convidada que
ficou responsável por registrar o debate.
Antes de iniciar o trabalho de grupo, que aconteceu em uma sala isolada onde o
sigilo pudesse ser mantido, explicamos o sentido da pesquisa, a importância de utilizar o
gravador e que era imprescindível sua presença ali por vontade própria. Pedimos o
consentimento dos profissionais e todos que concordaram assinaram o Termo de
Consentimento Livre e Esclarecido (ANEXO C) e iniciamos a técnica.
Em um dos grupos realizados35 a direção não concordou com a gravação,
dificultando assim a sistematização das Ideias centrais, necessitando de nossa intervenção no
sentido de explicitar aos profissionais a seriedade e dimensão de um trabalho de pesquisa, a
fim de não ocorrer tais impedimentos com pesquisadores futuros.
Por conhecer com maior profundidade a realidade dos Centros Socioeducativos,
sabíamos de antemão que o nosso roteiro não deveria ser muito longo, pela dificuldade dos
profissionais de se ausentarem das atividades diárias. Isso demandou a elaboração de um
roteiro objetivo que complementasse as entrevistas realizadas com os adolescentes e com a
direção (APÊNDICES B e D). Enfatizamos assim três questões chave: a) O que é o mundo do
trabalho? b) Existem ações voltadas para a preparação do adolescente em cumprimento de
______________
35
A direção do Centro Socioeducativo Santa Clara não concordou com a gravação do grupo focal e demais
técnicas.
76
medida de internação para o mundo do trabalho? c) Para a equipe, quais são os desafios e as
perspectivas quando um adolescente tem possibilidade de inserção no mundo do trabalho?
É importante assinalar que neste estudo, o Grupo Focal foi utilizado como fonte
complementar em triangulação de métodos ou multimétodos, uma vez que tornava-se
necessário saber as impressões dos profissionais sobre a temática em questão e as entrevistas
semi-estruturadas realizadas com os adolescentes e com a direção já haviam sido realizadas.
3.5 Aspectos éticos
Quanto aos aspectos éticos que envolveram este estudo, foram adotados vários
procedimentos. A princípio o Projeto de Pesquisa foi enviado à SUASE, mais precisamente
no mês de Agosto de 2008, para apreciação. Em seguida, a SUASE sugeriu algumas
adequações que foram revistas pela pesquisadora, e uma pré-autorização foi formalizada, mas
somente no dia 23 de janeiro de 2009 foi concedida a autorização definitiva para realizar a
busca pelas informações nas Unidades Socioeducativas de Internação de Belo Horizonte/MG.
Anteriormente foi apresentado ao Comitê de Ética em Pesquisa – CEP da
FUNEDI/UEMG o Projeto de Pesquisa e toda a documentação necessária para análise e em
18 de dezembro de 2008 a investigação foi aprovada sob o Parecer nº 36/2008.
Nos meses de Fevereiro e Março de 2009 a obtenção de informações foi realizada
e os atores, alvo desta investigação, foram esclarecidos sobre os objetivos da pesquisa e
confidencialidade dos dados. Algumas posturas éticas de proteção foram adotadas aos atores
sociais envolvidos como: a) garantia da não citação dos nomes dos profissionais e
adolescentes que fizessem parte da pesquisa; b) orientação prévia aos profissionais e
adolescentes de que, ao realizar a técnica de intervenção36 esta seria gravada e os que
concordassem o fariam voluntariamente, não existindo nenhum constrangimento, ficando a
eles reservada a possibilidade de não aceitar o convite ou de desistir em qualquer etapa do
procedimento; c) informação aos adolescentes de que os depoimentos relatados teriam caráter
sigiloso, não sendo levado ao conhecimento do poder judiciário seu conteúdo na íntegra ou
parte deles. Além disso, foram esclarecidos que, em qualquer situação, interna ou externa, a
unidade socioeducativa não faria referência a sua identidade; d) realização de uma análise
rigorosa dos dados obtidos através de técnicas e instrumentos metodológicos, garantindo a
validação dos resultados obtidos.
Os que concordaram em participar assinaram um Termo de Consentimento Livre e
Esclarecido para pesquisas científicas com seres humanos, de acordo com a resolução 196 de
1996 do Conselho Nacional de Saúde (CNS). Os documentos citados farão parte dos
Anexos/Apêndices da presente dissertação.
______________
36
As técnicas de intervenção realizadas foram: entrevistas semi-estruturadas com os adolescentes e com a
Direção e a realização de um grupo focal com os demais profissionais da unidade.
CAPÍTULO IV – INCLUSÃO PRODUTIVA: PERCEPÇÃO DOS DIFERENTES SUJEITOS
O processo de pesquisa realizado ao longo dos últimos dois anos foi um
compromisso desafiador, primeiro pela opção de se trabalhar com um tema socialmente
polêmico e ainda restrito no sentido acadêmico. Além disso, o objeto de estudo fez parte da
trajetória profissional da pesquisadora, convocando-a a lançar um novo olhar sobre uma
prática vivenciada por muito tempo, como se fosse um contexto diferente e estranho. Este
caminhar favoreceu observar para descrever, explicar e interpretar fenômenos que fazem parte
das inquietações, que foram colocados nesse estudo como problemas de uma pesquisa
científica. Realizar esta experiência, portanto, foi um desafio, por que implicou, conforme
Oliven (2002) pensar de uma forma antropológica, e observar acontecimentos conhecidos, ou
seja, corriqueiros ou cotidianos e construir novas interpretações.
Considerando esta trajetória, este estudo teve etapas bem definidas, que foram
constituído de análise documental e organização dos discursos orais e escrito coletado nas
entrevistas semi-estruturadas e nos grupos focais realizados. Com estes resultados, elaborouse a discussão em tópicos. Estes tópicos foram subdivididos levando em consideração os
objetivos específicos da pesquisa e explicitados na introdução da presente dissertação, ao qual
apresentaremos em forma de quadros, seguidos das análises e inferências.
Esclarecemos que os dados documentais desse estudo e fornecidos pela SUASE,
por meio da Diretoria de Gestão da Informação e Pesquisa referente ao ano de 200837, foram
utilizados apenas para caracterizar os adolescentes, explicitado no item Campo de Estudo
(3.1. do Capitulo III) e servirá também para ilustrarmos as análises. É importante registrar que
nem todos os dados solicitados (APÊNDICE A) foram informados por falta de sistematização,
principalmente no tocante a média socioeconômica e profissionalização dos adolescentes.
A técnica do Discurso do Sujeito Coletivo utilizada para análise dos resultados
dessa dissertação pode ser, considerada uma proposta explícita de reconstituição de um ser ou
entidade empírica coletiva, opinante na forma de um sujeito de discurso emitido na primeira
pessoa do singular. Por que essa opção? Porque conforme Bourdieu (1990), o social falando –
estrutura estruturante ou falado – estrutura estruturada, nos indivíduos, na primeira pessoa do
singular, é o regime natural de funcionamento das opiniões ou representações sociais. De fato,
as opiniões ou representações sociais são eficientes, funcionam justamente, porque os
indivíduos acreditam que realmente são suas, ou seja, geradas em seus cérebros. Por isso, o
______________
37
É relevante ressaltar que os dados fornecidos pela DGIP são referentes à 2008, pois conforme informações do
setor em referência, somente ao final de cada ano os dados são compilados.
78
DSC, como esse sujeito de discurso aparentemente paradoxal, já que redigido na primeira
pessoa do singular, mas reportando um pensamento coletivo, é, sociologicamente, possível.
Uma coletividade, falando na primeira pessoa do singular, não apenas ilustra o
regime regular de funcionamento das representações sociais como também é um recurso para
viabilizar as próprias opiniões como fatos coletivos atinentes a coletividades qualitativas (de
discursos) e quantitativas (de indivíduos). De fato, ninguém duvida que indivíduos
compartilhem a(s) mesma(s) ideia(s), mas quando tais indivíduos opinam, individualmente,
veiculam apenas uma parte do conteúdo da idéia compartilhada (LEFÈVRE F.; LEFÈVRE A.,
2006).
Esse método de análise aplicado neste estudo permitiu considerar o contexto de
forma geral, independente de qual Centro Socioeducativo estivessem os atores sociais. Eles
foram separados apenas por segmentos, ou seja, adolescentes (A), profissionais (P) e
diretoras (D).
Um sujeito no DSC vai se constituindo numa tentativa de reconstituir um sujeito
coletivo que, enquanto pessoa coletiva, esteja ao mesmo tempo falando como se fosse
indivíduo, isto é, como um sujeito de discurso “natural”, mas veiculando uma representação
com conteúdo ampliado, fruto das relações estabelecidas e dos conhecimentos adquiridos em
seu cotidiano, em seu contexto de vida.
4.1 Adolescentes (A)
QUADRO 1
Percepções dos adolescentes sobre o mundo do trabalho
Expressões Chaves (ECH’s)
Ideias Centrais (IC’s)
• Pra mim é…a pessoa tá ali, trabalhando, com o suor dela, ganhando
grana sem precisar tirar nada dos outros. Na honestidade... A1
• Trabalhar é ganhar dinheiro honestamente, prá não precisar de
roubar. (A3)
• Trabalho é serviço honesto! Nunca ficar devendo nada a sociedade...
Droga dá dinheiro, mas não é a praia, né? Você corre risco, de tomar
tiro e arrumar guerra. (A14)
• Pra mim, acho que emprego é você ter um sustento pra sua família.
Você saber que vai comprar uma casa e ela vai ser sua pro resto da
vida e não tem o risco de perder ela amanhã. Entendeu? Acho que ter
emprego é ter dignidade. Você poder andar de cabeça erguida, sem
devê nada a ninguém. (A16)
• Acho que eu não tinha noção do que era trabalho. Era totalmente
diferente! Pra mim trabalho hoje, tem que ser uma coisa com
dignidade, né? (A26)
• Trabalho é uma responsabilidade... que a pessoa está criando. Está
• Trabalho como sinônimo
de Honestidade e
Dignidade.
• Responsabilidade ligada à
maturidade.
• Segurança e condições de
consumo.
• Trabalho entrelaçado à
superação, independência e
valorização pessoal.
79
amadurecendo. Pode ver que ela está amadurecendo quando trabalha.
(A31)
• Tudo! Tudo de tudo. Porque você precisa trabalhar pra ter seu
dinheiro, pra conseguir as coisas... É Fundamental! (A35)
• Pra mim hoje trabalho é uma atividade física, que você pode pegar
um dinheiro que não te atrapalha em nada. Que ajuda a você
conquistar os seus ideais, as coisas que você precisa. É uma coisa
benéfica! (A36)
• Hoje seria... a única forma digna, porque se você não trabalha, você
não tem jeito de se superar. Trabalho pra mim é o maior significado
de dignidade. De independência. De valorização pessoal. De
realização. ... É o meu sonho, agora! (A40)
Fonte: Centros Socioeducativos de Belo Horizonte, meses de Fevereiro e Março de 2009.
No QUADRO 1, procurou-se captar as percepções dos adolescentes sobre o tema
trabalho e percebe-se através dos discursos que, a maior parte dos adolescentes ficou centrada
nas qualidades e/ou nas virtudes que o trabalho poderá oferecer aos indivíduos e poucos
falaram da importância das escolhas profissionais, valorização e satisfação pessoal que o
trabalho pode oferecer ao indivíduo.
Diante dos relatos podemos dizer que para o adolescente em cumprimento de
medida socioeducativa, o trabalho está diretamente ligado aos conceitos de honestidade e
dignidade, e até fazem referências às atividades ilegais realizadas por eles antes da internação
e os efeitos que elas produziram em seu histórico de vida. Fato esse também verificado por
parte de alguns profissionais nos Grupos Focais realizados nos Centros Socioeducativos,
quando foi abordado tal tema: Trabalho é o que dá dignidade para o ser humano. Sem o
trabalho a gente não é ninguém! (P2)
Indiscutivelmente, para os adolescentes entrevistados e para os profissionais, o
trabalho honesto e digno é considerado uma virtude. Enaltecem a honestidade com que um
indivíduo executa a sua função, como também a sua própria natureza, quando justa. Eles nos
passam que é honroso que um indivíduo se dedique a uma atividade que seja honesta e justa
por si mesma, e que o exercício dessa atividade seja da mesma forma justo, pois o dinheiro
sem o trabalho, não dignifica e nem traz segurança para o indivíduo.
No entanto, pensa-se na honestidade quase sempre somente em termos do
indivíduo – isto é, se ele age ou não de forma honesta dentro daquilo que ele foi designado a
realizar. Mas há um tipo de honestidade que vale a pena refletir e que não é, de forma alguma,
menos importante que é a honestidade enquanto dever moral individual. É a honestidade das
relações de trabalho. Um trabalho não é honesto apenas pela maneira como ele é conduzido
pelo indivíduo. Ele é honesto tanto em si quanto na relação que estabelece entre indivíduos.
Trabalhos que se baseiam na exploração de pessoas não são considerados honestos. O que
80
existe nesses casos são indivíduos dentro de relações de trabalho desonestas, como no caso
dos adolescentes envolvidos em atividades ligadas ao tráfico de drogas: “Eu parti para o
tráfico com 12 anos. Eu parei de estudar para vender drogas, vendia era pedra. Material mais
cheio de maconha, mesmo! Era no centro da cidade e tirava uns 200 contos por semana.”
(A28)
O viés da exploração pela via do trabalho foi muito bem expresso por um trecho
da música “Fábrica”, da Legião Urbana, do álbum “Dois”, de 1986. Nessa letra, Renato Russo
faz uma crítica à exploração capitalista, mas que servirá de exemplo também para a
exploração infanto-juvenil pelo narcotráfico: “Quero trabalhar em paz / Não é muito o que
lhe peço / Eu quero trabalho honesto / Em vez de escravidão.”
Nesse sentido, o que o trabalhador reivindica ao seu patrão capitalista, é um
trabalho honesto. Nota-se, presente na letra da música de forma implícita, a ideia de que a
prática do trabalho honesto não é algo que depende unicamente do indivíduo trabalhador, mas
também da relação que estabelece em seu trabalho e das oportunidades que ele passa a ter.
A dignidade só é possível com a liberdade, porque somente o homem livre é
digno, pois terá reconhecida sua honradez, a sua nobreza de ser humano. Pode-se observar no
discurso da adolescente (A40), quando diz: “...Trabalho pra mim é o maior significado de
dignidade. De independência...” Essa independência enfatizada pela adolescente é reforçada
por Campos (1985), quando incluiu a liberdade, juntamente com outros fatores, como uma
oportunidade de individualização do adolescente, essencial nessa fase de desenvolvimento, já
explicitada no Capítulo I do presente estudo.
Para ocorrer uma humanização abrangente, as Organizações Sociais, sejam
públicas ou privadas, necessitam reconhecer seus membros por seus atributos intrínsecos
humanos, e não somente pelos seus atributos materiais externos como riqueza material, pois é
inconcebível perceber muitos indivíduos se submeterem a ter uma vida miserável enquanto
outros esbanjam. Se compararmos os séculos passados com a cena contemporânea, a situação
avançou consideravelmente, mas ainda há uma grande opressão à dignidade humana, pela
dificuldade de acesso a melhores condições de vida e mesmo de poderem obter o mínimo de
dignidade, mormente pela grande distinção de classes em decorrência do descontrole
econômico.
A desigualdade social tem causado o crescimento de jovens sem preparação para a
vida profissional e muitos deles não conseguem oportunidades e acabam sendo
marginalizados. Outro fator que agrava essa situação é a violência que cresce a cada dia. O
fato é que, muitas vezes, o Estado e a Sociedade Civil, são as principais causadoras desse
81
processo de desigualdade, que causa exclusão e que gera um aumento da violência, agravado
principalmente pela mídia.
Torna-se fundamental que as autoridades, com o apoio da sociedade civil,
projetem uma vida mais digna para os indivíduos, principalmente das classes mais
vulneráveis, a fim de se inserirem e re-inserirem no mercado de trabalho e conseguirem o
sustento do lar, não optando a exercer e se submeter às atividades ilegais e/ou desonestas
conforme a maioria dos adolescentes entrevistados e enfatizado pelo discurso do adolescente
(A28) no quadro 1, que se envolveu no tráfico aos 12 anos de idade e do (A3), que acredita
que “Trabalhar é ganhar dinheiro honestamente, pra não precisar de roubar.”
Percebe-se que a minoria dos adolescentes citou a importância da valorização e
satisfação pessoal que o trabalho pode oferecer ao indivíduo, mas para alguns, representado
pela fala da adolescente (A40), citada no quadro1, o trabalho está intrinsecamente ligado a
idéia de superação, independência e valorização pessoal, o que nos provocou a seguinte
reflexão: será que a passagem da adolescente pelo sistema socioeducativo, com o devido
apoio, diálogo e acompanhamento da equipe, causou na mesma um despertamento para a
importância do trabalho?
De acordo com Maakaroun et al. (1991), a presença de “figuras” adequadas,
principalmente as parentais, facilita o processo de conquista da identidade, o que pode ser
favorecido com diálogo e contato afetivo, o que irá favorecer sua evolução, com o mínimo de
tropeços. Essa autora observa também que é no final da adolescência, ou seja, entre os 16 e 17
anos, que afloram os interesses e as habilidades voltados para a escolha profissional. Fato esse
também que coincide com a idade permitida pela Lei 10.097/00, favorável à iniciação
profissional, conforme já foi abordada anteriormente no Capítulo II do presente estudo.
Sendo assim, pode-se considerar que um processo socioeducativo adequado, com
as características de acolhimento, limites e afetividade pode favorecer o amadurecimento do
adolescente, mesmo ele estando temporariamente privado de sua liberdade.
82
QUADRO 2
Atividades realizadas pelos adolescentes antes da internação
Expressões Chaves (ECH’s)
Ideias Centrais (IC’s)
• Vigiava carro e malabaris no sinal, tinha doze anos, por aí. ...fiquei um
tempão tendo que olhar carro ...pra mim ter dinheiro. ...vinte, cinqüenta
real por dia.(A3)
• Tráfico. ...fiquei um tempão, tinha uns treze, quatorze até a pouco
tempo. ... ah! por dinheiro, roupas caras, condições... dois a três mil
por dia. (A6)
• Ah, eu já engraxei sapato ... prá ajudar dentro de casa, mesmo! Pra
ajudar minha mãe. ...devia ter uns treze ou quatorze anos, no dia eu
conseguia vinte cinco, trinta reais. (A7)
• Eu fazia muita coisa, mas trabalhar era difícil. Só tráfico, mesmo!
Iniciei com uns treze anos, quatorze mais ou menos ...pra ganhar
dinheiro. Pra eu não depender da minha mãe. Ter oportunidade...
Começar a vida! Pra não ficar dependendo da família. Ganhava muito:
uns cinco mil. ... uns quatro em cinco dias. (A8)
• Eu vendia droga. comecei... com catorze anos. Pra uso, mesmo! ...pra
comprar roupa. ...minha mãe me dava o que podia... hoje em dia a
maioria dos adolescentes quer ter roupa cara! Ter melhores condições
de vida. Eu fazia isso mais pra usar droga, mesmo! Por dia... eu tirava
uns duzentos reais. (A20)
• Babá aos treze anos. ...para ajudar minha mãe. ...ganhava cem reais.
Já trafiquei (Cocaína) uma vez, com quatorze ou quinze. ...fiquei quase
dois anos por dinheiro fácil. ...se eu vendesse muito, levava o lucro, de
todo o dia, mais ou menos oitocentos, dependendo. (A27)
• Eu só jogava bola e estudava, mesmo. (A29)
• De produtivo? Não. Ah! eu vendia drogas desde os treze anos, até uns
meses aí. ...porque eu sempre quis dar de tudo pros meus filhos. Pelo
fato de ele não ter pai, eu acho que sou pai também, então eu quero dar
tudo de bom e do melhor, não quero dar coisa fajuta! (A36)
• Eu vendia roupa desde os meus 14 anos até pouco tempo, pela
independência. ...tem vez que dá pra tirar livre, fora viagem e tudo mil e
quinhentos reais. (A40)
• Estratégias de Sobrevivência.
• Atividades legais.
• Atividades ilegais.
Fonte: Centros Socioeducativos de Belo Horizonte, meses de Fevereiro e Março de 2009.
É visível nos discursos dos adolescentes, relativo às atividades realizadas antes da
internação, que a maioria foi estratégia de sobrevivência utilizadas pelos mesmos no sentido
de conseguir recursos e acesso aos bens de consumo. Resultado semelhante também foi
encontrado por Assis (1999) em seu estudo com jovens que praticaram ato infracional, onde
90% dos entrevistados haviam trabalhado em diferentes tipos de atividades em algum
momento de suas vidas.
Vendruscolo (1998) em sua dissertação sobre experiências de trabalho de jovens
que praticaram ato infracional, atendidos pelo Serviço Social da Promotoria Pública de
Ribeirão Preto no ano de 1995/1996, identificou que 56,3% eram jovens com experiência de
trabalho.
83
Este fato pode vir a confirmar que, como discutido na escassa literatura existente
sobre o assunto, crianças e jovens em situação de vulnerabilidade social diante das reais
necessidades de sobrevivência tentam buscar alternativas para o seu sustento e/ou de sua
família. Embora a literatura em geral considere as atividades ligadas à sobrevivência dos
jovens aquelas identificadas como experiências de trabalho, seja na rua ou não, nesse estudo
consideramos todas as atividades relatadas pelos adolescentes, sejam elas legais ou ilegais.
Portanto, essa análise não se propõe a realizar uma distinção entre o ato infracional e as
demais atividades e/ou estratégias de sobrevivência, e sim, considerá-la mais uma das opções
relatadas pelos adolescentes, quando esse foi mencionado como uma forma de conseguir
recursos, acesso aos bens de consumo e até o tão almejado status social.
Dos 43 adolescentes entrevistados 79,06 % relataram ter realizado alguma
atividade, seja ela legal ou ilegal antes da internação e apenas 18,60 % disseram não estar
incluídos em nenhuma atividade e o QUADRO 2, com exemplo de alguns discursos, vem
demonstrar essa realidade.
GRÁFICO 2
Atividades Realizadas pelos Adolescentes antes da
Internação
18,60%
39,53%
11,63%
30,24%
Atividades Legais
Atividades Ilegais
Atividades Legais/Ilegais
Não Incluídos
Fonte: Centros Socioeducativos de Belo Horizonte, meses de Fevereiro e Março de 2009.
No GRÁFICO 2 é visível a diferença entre a frequência dos adolescentes que
relataram somente atividades legais e os demais grupos. No entanto, as atividades legais
aparecem com significativa frequência quando associada às ilegais: em
39,53 % dos
discursos. Este dado pode sugerir que as atividade legais acabam sendo complementadas ou
sendo um complemento das ilegais, pois esta última, referida por 41,87 % dos adolescentes, já
84
que 11,63%, relataram realizarem ambas atividades. Será que esses adolescentes estão
querendo dizer que tiveram mais acesso às atividades ilegais do que as legais?
Esse questionamento pode ser confirmado no discurso do adolescente (A41)
descrito, quando inicia relatando a falta de oportunidades e a busca por sua
liberdade/autonomia, optando assim pela via do narcotráfico para a solução de suas questões:
Ah, porque estava faltando oportunidade. Não tinha... Tava faltando serviço. E eu
queria ter uma certa liberdade, aí minha mãe... nem ela sabia o que era certo ou o
que era errado, e ela deixava. “Nó! Eu via meus amigos saindo e pensava: eu não
posso! Eu vou entrar no crime. Eu tentei fugir de casa... sair de casa. Saí, daí...
comecei a vender droga... (A41)
Se forem consideradas principalmente as precárias condições de trabalho
oferecidas a esses adolescentes, as novas exigências do mercado de trabalho quanto a
qualificação socioprofissional e o grau de escolaridade, as necessidades próprias do período
juvenil, principalmente referentes à questão do consumo, podemos pressupor que as
atividades ilegais acabam sendo mais acessíveis, pois de alguma forma, não exclui esse
adolescente, seja por qualificação profissional ou sua escolarização.
Esse aspecto pode ser confirmado no presente estudo pela própria SUASE em
dados de 2008, fornecidos pela DGIP, pois de acordo com a TABELA 5 – Faixa de
Escolarização, 72,1% dos adolescentes estavam entre a 5ª e a 9ª série e na TABELA 3 –
Idade, a maior parte dos adolescentes em cumprimento de medida socioeducativa de
internação em Belo Horizonte estavam com 17 anos de idade, ou seja, 26,8 %, demonstrando
assim, a baixa escolaridade e a grande defasagem entre faixa-etária e escolaridade dos
mesmos.
Além disso, através das atividades ilegais, como o ato infracional, esse adolescente
tem acesso a um dos requisitos mais valorizados na sociedade contemporânea e de certa
forma facilitador de “inclusão”: a possibilidade de adquirir bens de consumo de forma mais
rápida, atendendo aos imediatismos da própria fase da adolescência, como confirmado pela
fala do adolescente (A6): “Tráfico! ...fiquei um tempão, tinha uns treze, quatorze até ha
pouco tempo. ... ah! por dinheiro, roupas caras, condições... dois a três mil por dia”.
De acordo com Abramovay et al. (1999), existe uma necessidade destes
adolescentes terem um complemento financeiro para conseguir suprir suas necessidades e
desejos de consumo. No entanto, a baixa qualificação não permite que os mesmos consigam
realizar um trabalho com boa remuneração. Assim, alguns adolescentes acabam buscando
85
outras alternativas para complementar a renda, como as mais relevantes: o tráfico de drogas,
roubo, entre outras.
Por fim, refletindo um pouco mais a respeito da prática do ato infracional como
uma forma de promover a “inclusão” desses adolescentes, concordamos com Sawaia (1999)
para quem, todas as pessoas estão inseridas no sistema econômico capitalista, mesmo que seja
de forma insuficiente e não digna. Nesse caso, a infração possibilita a esse adolescente sua
inclusão nesse sistema perverso, que ao mesmo tempo promove sua exclusão, lhe negando o
direito a liberdade e a vivenciar sua juventude sem riscos. Essa autora ressalta a dialética da
inclusão/exclusão.
Percebemos através dos depoimentos de alguns adolescentes que a possibilidade
de livre acesso aos bens de consumo é uma necessidade emergente, capaz de mascarar as
consequências geradas pelo contato desse adolescente com as atividades ilegais, criando-lhes
a sensação de inclusão social. Nesse caso, parece que o valor dado a possibilidade de ter
acesso aos bens de consumo é maior do que o risco de morte e de envolvimento com a justiça,
através da prática do ato infracional que o leva para a situação de exclusão.
Ficamos então com um questionamento: o que será que esse adolescente mais
valoriza no seu momento de vida e que o faça sentir-se “incluído”? Silva (1997) pode nos
auxiliar nessa reflexão, pois cita que existe uma enorme influência de super valorização do
consumo na formação da identidade desses adolescentes, que só passam a se reconhecer
enquanto sujeitos e se sentirem valorizados, quando inseridos na cultura do consumo. De um
modo geral, nos depoimentos dos adolescentes foi percebido um grande número de
entrevistados que relataram ter utilizado o dinheiro para o próprio benefício, comprando
roupas, tênis, comida, além do gasto com diversão, drogas e outros.
O consumismo estimulado de diversas formas, principalmente pelos meios de
comunicação de massa, desperta desejos irrefreáveis nos adolescentes. Satisfazer esses
desejos através da prática de atos infracionais, muitas vezes, é a saída mais rápida, quando
combinados com a precariedade e fragilidade das instituições como família e igreja, que cada
vez mais se tornam impotentes na arte de educar e colocar o limite necessário, nessa fase tão
importante e complexa que é a adolescência.
86
QUADRO 3
Atividades realizadas pelos adolescentes em cumprimento de medida de internação
Expressões Chaves (ECH’s)
Ideias Centrais (IC’s)
• Interna: Aqui eu vou pra escola e faço Oficina de Sabonete. Externa: • As atividades realizadas
Arte do circo, Cinema e Informática. (A1)
nos Centros
Socioeducativos se
• Interna: Escola e eu participo do Tamborlescentes (Grupo Musical).
dividem em internas e
Eu toco, canto, estou no coral. Eu toco tamtam, cidinho ripilica,
externas;
carola. Aneurola, chic-chic. Canto vários tipos de música: axé,
melody, funk, hip-hop. Externa: Eu tô fazendo curso lá fora... no
CESAM. Tem office-boy, computação e outras coisas lá. (A4)
• Foram relatadas vários
tipos de atividades:
• Interna: Aqui dentro só faço quadrinho e escola. Externa: Lá fora
Pedagógicas; Artísticoainda não. (A7)
Culturais;
• Interna: Ah, eu fiz tanto... Escola. Ah! que eu gosto mais é de pintar,
Profissionalizantes e de
mais eu gosto de pintar parede, né. Externa: Cabelereiro. (A16)
Geração de Renda;
• Interna: Tapeçaria; Oficina de quadrinhos e escola. Externa: ...já fiz
oficina... Eu jogava futebol. Ah, agora eu tô fazendo o curso de
• Adolescente participando
Pizzaiolo/Salgadeiro, mas o curso mesmo é que me interessa. (A25)
de Curso de Iniciação
• Interna: Aqui eu faço percussão e escola. A gente tem um grupo de
Profissional no Centro
percussão e faço aula de espanhol. Externa: Percussão é externa,
Salesiano do Adolescente
também. A gente saí para tocar... (A26)
Trabalhador – CESAM.
• Interna: Tapeçaria. Curso de desinfetante, Espanhol e escola.
Externa: estou fazendo habilitação.(A29)
• Interna: Todas. Gosto mais de pintura. Faço tbém Bijouteria. A gente
faz... e vai e vende. Fica uma porcentagem pro Centro e outra pra
gente. Externa: Já fiz depilação. ...no Senac. Foi bom, eu nunca tinha
pedido curso aqui. Eles falavam que é difícil, mas quando eu fui fazer,
eu gostei. Eu gostei muito! (A34)
• Interna: Além da escola, Bijouteria. Externa: Eu acabei o curso de
porteiro. Mas eu vou começar outro terça-feira: Mecânica de motos.
(A43)
Fonte: Centros Socioeducativos de Belo Horizonte, meses de Fevereiro e Março de 2009.
Em relação ao QUADRO 3, os adolescentes relataram as atividades que realizam
do interior dos Centros Socioeducativos e foi detectado que as atividades se dividem em
internas e externas e podem ser classificadas em: Pedagógicas; Artístico-Culturais;
Profissionalizantes e de Geração de Renda.
Através das entrevistas realizadas foi possível verificar que recentemente as
propostas pedagógicas das unidades pesquisadas procuram ser coerentes com a Política de
Atendimento aos Direitos da Criança e do Adolescente, respeitando dentro do possível o ECA
e o SINASE em seu item 6.3 que trata dos Parâmetros Socioeducativos, principalmente nos
aspectos referentes à escolarização, a cultura, ao esporte, ao lazer e algumas ações de geração
de renda. Um fato interessante é que no momento da coleta de informações todos os
adolescentes entrevistados estavam inseridos na escola, pois é fundamental que haja espaço
reservado aos adolescentes para se dedicarem à educação formal, já que ela é obrigatória nas
unidades, conforme legislação em vigor.
87
As atividades lúdicas, esportivas e de lazer também são relatadas pelos
adolescentes e foram percebidos espaços ao ar livre em todos os Centros para sua prática,
sendo necessário registrar que uns são mais adequados que outros. Sempre que possível os
adolescentes podem usufruir de locais externos às unidades de acordo com o ECA, que zela
pelo princípio da incompletude institucional, utilizando sempre e ao máximo os serviços
disponíveis na comunidade, não se limitando aos muros da instituição.
No tocante a preparação socioprofissional no momento das entrevistas, apenas um
adolescente estava participando de Curso de Iniciação Profissional no Centro Salesiano do
Adolescente Trabalhador (CESAM), aspecto relevante para o presente estudo, pois após a
preparação do adolescente a instituição faz uma avaliação de seu rendimento e ele aguarda
sua inserção no mercado de trabalho.
Nos discursos dos adolescentes diversas atividades foram mencionadas, o que
pode ser constatado através das fotos38 colocadas no APÊNDICE E do presente estudo.
Ressaltamos a apresentação do Grupo Musical Tamborlescentes, do Centro de Atendimento
ao Adolescente (CEAD), que se apresentou no 2º Simpósio Mineiro de Assistentes Sociais,
em Maio de 2009.
Ficou evidente neste estudo que a maioria dos adolescente entrevistados se
encontrava inserida em alguma atividade/curso/oficina voltada(o) à socioprofissionalização,
mas muitas vezes encontram dificuldades para a sua realização, devido aos pré-requisitos
necessários à participação, sem falar no custo, quando a equipe não consegue a sua isenção.
Alguns cursos são oferecidos no interior dos Centros e outros são externos, ou seja, realizados
por entidades públicas ou privadas, em sua maioria por ONG’s, através das diversas parcerias
firmadas pela SUASE e/ou pelos próprios profissionais que atuam no Sistema
Socioeducativo, conforme já relatado anteriormente.
Sendo assim, é importante ressaltar que muitas vezes os cursos e/ou oficinas
oferecidos aos adolescente em cumprimento de medida socioeducativa à título de qualificação
profissional resultam em poucas possibilidades reais de ingresso no mundo do trabalho, fato
esse devido a dois fatores: primeiro a falta de opção na escolha da atividade e segundo
______________
38
O registro fotográfico realizado pela pesquisadora com objetivo de enriquecer este estudo foi mediante
autorização dos(as) gestores(as) dos Centros Socioeducativos no ato da pesquisa de campo, deixando claro que
caso tivesse algum adolescente no momento seu rosto não poderia aparecer, respeitando assim as determinações
do ECA e essa prerrogativa foi devidamente respeitada. Foi considerada exceção apenas as fotos dos
adolescentes do Grupo Tamborlescentes, que se apresentaram publicamente para quase duas mil pessoas em
maio de 2009, no 2º Simpósio Mineiro de Assistentes Sociais em Belo Horizonte/MG e também veiculadas no
site do Conselho Regional de Serviço Social da 6ª Região: www.cress-mg.org.br.
88
principalmente devido ao preconceito que sofrem por estarem ou por terem passado pelo
Sistema Socioeducativo.
QUADRO 4
Expectativas de futuro e/ou projetos de vida dos adolescentes após o
desligamento da Unidade Socioeducativa
Expressões Chaves (ECH’s)
Ideias Centrais (IC’s)
• Ah, eu quero viver com minha mãe, né. Tem muita coisa que atrapalha
nesse negócio de criminalidade. Você não convive em família. Só ver
sua mãe triste, isso não faz bem nenhum. A namorada também fica
infeliz. Tem isso também, né. Ter filho, casar. Eu quero entrar no
exército.. Seguir o exército.(A10)
• Dar finalidade nos estudos. E arrumar um emprego. ...eu liguei para
minha mãe e ela, falou assim: “se você tivesse aqui, eu tinha
arrumado emprego para você”. Lá onde meu irmão trabalha, numa
loja. O vendedor pediu. Só que tem um preconceito. Como eu estou
aqui, aí não dá! Porque tem meios de melhorar ainda aqui... Eu acho
que ...não começo como vendedor. Eu começo no gerais e tal. Mas
está bom para mim. Eu tenho interesse. (A26)
• Vou estudar primeiro e morar com minha mãe. Aí vou ajudar minha
mãe a cuidar da minha irmã pequena. Tem cinco meses. (A30)
• Eu penso em arrumar um serviço, ficar de boa... Conviver mais com a
minha família. Não me envolver mais com crime. (A32)
• Eu quero fazer Direito ou Veterinária.... Qualquer um dos dois. Eu
parei de estudar em 2007 porque eu não tinha nota. (A35)
• O que eu queria fazer é trabalhar. Com coisa de eletricidade de auto.
Tava fazendo curso no SENAI Horto. Agora eu vou arrumar outro
curso. Daí quando me desligar vou arrumar, um trabalho. (A37)
• Quando eu sair daqui... construir a minha casa. Não depender de
pensão do meu ex-marido. Concluir o meu terceiro ano, né.. Quem
sabe fazer minha faculdade. Levar uma vida honesta. Um trabalho...
um emprego. Ter uma vida estável. Sem ter problemas na justiça.
Nada ligado a crime, nem desonestidade de nenhuma forma. (A40)
• Estudar... Curso que eu queria fazer era de Advogado. Dar uma boa
vida para minhas filhas, né. Pagar uma escola e uma faculdade para
elas. Ajudar elas na vida. ...Isso leva tempo. (A42)
• Saindo daqui eu só quero dar uma continuidade aos estudos e
procurar emprego. (A43)
• Conseguir Trabalho /
Emprego.
• Convivência familiar.
• Retomar estudos e alguns
almejam a Educação
Superior.
Fonte: Centros Socioeducativos de Belo Horizonte, meses de Fevereiro e Março de 2009.
Observa-se nos discursos dos adolescentes (QUADRO 4), as expectativas de
estudar, de conseguir um emprego, de ajudar a família e ter uma convivência familiar
agradável. Eles pensam no futuro, assim como ocorre com qualquer indivíduo, principalmente
nos segmentos mais vulneráveis da população.
O trabalho realizado com os adolescentes em conflito com a lei, em cumprimento
de medidas socioeducativas, particularmente a privação de liberdade, que é o caso dos
Centros Socioeducativos de Internação de Belo Horizonte/MG, significa, a partir da
89
promulgação do ECA, uma chamada à responsabilização desse adolescente, em face da
transgressão cometida. Francischini e Campos (2005) avaliando o caráter socioeducativo das
instituições apontam que uma boa estrutura física, a adequada preparação de profissionais
para as ações educativas e um trabalho transdisciplinar são alguns dos aspectos que podem
fazer a diferença em um ambiente “prisional”. As medidas socioeducativas, cujo foco não seja
a “punição” e seus objetivos estejam centrados na reinserção social dos adolescentes, no
fortalecimento dos vínculos familiares e comunitários, podem provocar a transformação e o
desejo de realização de projetos de vida longe da criminalidade.
Nesse sentido, percebe-se pelos discursos que o caráter educativo do trabalho
desenvolvido pelas instituições de atendimento ao adolescente em cumprimento de medida de
internação, visando à sua reinserção social, implica em educar, ainda que com regras para um
melhor convívio social. Isto, consequentemente, requer a responsabilização do mesmo,
quando ele desenvolve condutas transgressoras fora desses padrões. Nesse caminho, Barbosa
(2002) defende que o processo de desenvolvimento do adolescente passa pela aprendizagem
de um posicionamento crítico e responsável em relação às suas condutas.
Percebemos que, para se efetivar um trabalho socioeducativo de fato, é
imprescindível uma ação pedagógica sistematizada, mesmo quando se trata de medida de
privação de liberdade, fato esse verificado nos discursos dos adolescentes no QUADRO 4. A
observação da realidade atual dos Centros Socioeducativos, mostra que através da ação
educativa é possível a construção do projeto de vida dos adolescentes. Verificou-se que
muitas vezes esta ação revela-se parcialmente condicionada apenas à finalidade de
responsabilização ou “punição”, muito embora sua efetividade dependa muito do caráter
socioeducativo que se dê à medida. Sabe-se que o trabalho socioeducativo é alvo constante de
críticas da mídia e que muitas vezes deixam margem para interrogações entre o que é
preconizado pela lei e o que é efetivamente desenvolvido no interior dos Centros.
Portanto, apesar dos discursos dos adolescentes mostrarem indícios de que o
cumprimento da medida pode atuar de forma significativa sobre suas percepções, despertando
interesses, desejos de mudança e a vontade de se manterem longe da criminalidade, pode-se
dizer que o processo socioeducativo é parcial e relativo, não havendo certeza de que ele
atenda todas as suas expectativas, uma vez que o adolescente é um sujeito fruto de uma
dinâmica que, em muito extrapola esse processo.
90
4.2 Diretores (D)
QUADRO 5
Percepções das Gestoras quanto ao direito à profissionalização e proteção ao trabalho, de
acordo como artigo 69 do ECA
Expressões Chaves (ECH’s)
Ideias Centrais (IC’s)
• O desafio maior é que o adolescente chega sem escolaridade para ser
inserido em cursos de Aprendizagem Social que exige segundo grau.
(D1)
• A baixa escolaridade, às vezes atrapalha ser inserido no curso de
profissionalização. Isso é uma realidade! ...adolescentes na 8ª, na 7ª e
até inferior a isso. Acredito e aposto é que a gente tenha uma maior
articulação com a escola para que esse adolescente possa ser
promovido... Hoje a gente investe muito na Formação Básica para o
Trabalho, que é a aprendizagem. (D2)
• No momento é que se pensa na profissionalização, pois anterior a
isso, mesmo com o ECA, acho que ninguém dava muita importância.
Agora com a nova proposta socioeducativa (SINASE) é que se tem
pensando em focar mais na profissionalização. Acho também que
limita muito por causa da idade e escolaridade. Vc tem que procurar
cursos que atendam essas limitações! (D3)
• É essencial, porque muitas vezes esses adolescentes entram prá
criminalidade em função de um não investimento em
profissionalização. ... mas tem que ser associada ao desenvolvimento
e investimento na escolaridade! Nós temos muitas dificuldades... por
causa da baixa escolaridade, às vezes as condições que alguns cursos
oferecem para o adolescente ser inserido não casam com a
escolaridade e interesse. (D4)
• Devido às questões de escolaridade e de oportunidade para o
adolescente, o que tem sido feito ainda é muito pouco! Temos que
chegar a possibilitar que 90% ou até 100% dos adolescentes tenham o
mínimo de possibilidade de aprendizagem. Tem uma deficiência muito
grande nessa preparação! A gente recebe aqui adolescentes com
baixo nível de escolaridade, com apenas o ensino fundamental ...a
SUASE está possibilitando no momento um convênio com o SENAC, é
o que está propiciando um aumento na estatística de Preparação
Básica para o Trabalho e Aprendizagem. (D5)
• Grande desafio é a falta de
escolaridade dos
adolescentes devido a
evasão escolar.
• Poucas oportunidades de
Profissionalização dos
adolescentes.
Fonte: Centros Socioeducativos de Belo Horizonte, meses de Fevereiro e Março de 2009.
A percepção das gestoras no tocante ao direito à profissionalização e proteção ao
trabalho ficou muito centrada nos desafios decorrentes desse processo, principalmente em
relação à escolaridade dos adolescentes, fato este demonstrado também nas estatísticas
repassadas pela DGIP/SUASE de acordo com a Tabela 05 – Campo de Estudo do Capítulo
III do presente estudo, onde 72,1 % dos adolescentes encontravam-se no ensino fundamental,
corresponde à 5ª e 9ª séries incompletas.
De acordo com Volpi (2001, p. 83) em seus estudos com adolescentes autores de
ato infracional, a escolaridade “[...] está concentrada nos primeiros anos de estudo, definindo
91
um índice de defasagem na relação série idade muito superior à media geral. Trata-se,
portanto de jovens de muito baixa escolaridade e alto grau de defasagem.”
Acredita-se que crianças e adolescentes que deixam de frequentar a escola, iniciem
um comportamento transgressor, principalmente se os mesmos começarem a frequentar as
ruas de forma constante e sem a imposição de limites por parte dos pais e/ou responsáveis.
Dentro desta perspectiva, Sérgio Adorno (1991) atribui também à escola o papel de protetora
e mantenedora da ordem social. Como o discurso do adolescente (A43), que vem confirmar a
perspectiva do autor: “Eu comecei a ficar envolvido na escola. Na hora em que passei para
noite, para estudar. A noite. Eu comecei: de 14 para 15. Eu comecei a me envolver, a fumar
maconha: de 14 para 15 anos, eu já estava no crime.”
No entanto, o mesmo autor aponta para a necessidade de questionar se a escola
cumpre efetivamente este papel. Apesar de não ser o foco desse estudo, vale ressaltar que em
geral, o espaço escolar se mostra distante do contexto deste público, não oferecendo
condições para uma efetiva realização social. Muitas vezes, devido ao fato de se mostrar
incompatível com o universo sócio-cultural dos mesmos, além de ser muitas vezes um espaço
“[...] destituído de emoções e de atrações lúdicas, espaço desinteressante e desmotivador.”
(ADORNO, 1991, p. 78).
Observa-se que o investimento em socioprofissionalização é ressaltado, também,
como forma de minimizar o acesso ao mundo do crime, visto que a maior parte dos
adolescentes segundo Kodato e Silva (2000, p. 509), provém das camadas pobres da
população devido à “[...] baixa escolaridade, desemprego, baixa qualificação profissional dos
responsáveis e condições de moradia”, daí a necessidade dos adolescentes realizarem
atividades que consigam um retorno financeiro. O que pode ser demonstrado pelos discursos
das gestoras no QUADRO 5 e também no QUADRO 3, que diz respeito às atividades
realizadas pelos adolescentes antes da internação.
92
QUADRO 6
Responsáveis pelas ações relativas à socioprofissionalização dos adolescentes
Expressões Chaves (ECH’s)
Ideias Centrais (IC’s)
• Pedagoga e Terapeuta Ocupacional, sendo que a Diretora de
Atendimento tem um papel fundamental. (D1)
• Responsáveis diretos:
Terapia Ocupacional e
• Normalmente é a Pedagoga e a Terapeuta Ocupacional com a
Pedagogia.
participação de toda equipe. É um trabalho coletivo, integrado! (D2)
• A Pedagoga junto com a Terapeuta Ocupacional, pois as duas
trabalham articuladas. Toda equipe articula. Aqui a referência é a • Social no papel de
articulador da rede.
Pedagoga. (D3)
• Nós temos três profissionais: a Terapeuta Ocupacional que faz um
histórico ocupacional desse adolescente; a Assistente Social que • Demais profissionais:
trabalho integrado.
articula a rede no sentido de sensibilizar as instituições que acolham
esses adolescentes no sentido da profissionalização e o Pedagogo que
acompanha o adolescente quando já está inserido. ...mais toda a
comunidade educativa é envolvida neste processo. (D4)
• Como referência dessas ações, fica para a Terapia Ocupacional, mas
a comunidade educativa é quem define, a gente tem um grupo de
mediação dentro da unidade, composto pela Equipe Técnica,
Supervisores, coordenadores e o corpo efetivo da unidade. (D5)
Fonte: Centros Socioeducativos de Belo Horizonte, meses de Fevereiro e Março de 2009.
A partir do QUADRO 6, pode-se concluir que de forma geral os responsáveis
diretos pelas ações de socioprofissionalização nos Centros Socioeducativos são os técnicos da
área da Terapia Ocupacional e da Pedagogia. O profissional de Serviço Social foi apontado
como tendo um papel importante na articulação da Rede de Atendimento, no sentido de
sensibilizar às instituições a acolherem os adolescentes no tocante a oferecerem oportunidades
de inserção em cursos e/ou atividades profissionalizantes.
O trabalho interdiscpilinar foi apontado como fator unânime para o sucesso das
ações relativas a socioprofissionalização, pois é realçada a importância da realização de um
trabalho coletivo, onde todos os profissionais que fazem parte da comunidade socioeducativa
podem e devem contribuir com esse processo.
QUADRO 7
Ações realizadas na unidade socioeducativa que propiciem o protagonismo dos adolescentes
Expressões Chaves (ECH’s)
Ideias Centrais (IC’s)
• Assembléia mensal nos núcleos! Essa é a mais relevante, mas temos
outras. (D1)
• Na nossa plenária... Tudo que a gente faz aqui tem participação do
adolescente, ou seja, o Regimento Interno, o Regulamento Disciplinar.
... Eles participam... e quando participam se apropriam, e isso é
interessante!...Eu acho que isso é protagonismo! (D2)
• Temos as comissões, e fazem parte delas tanto adolescentes como
agentes e técnicos. O que foi discutido em reunião o representante
leva para o grupo e cobra mesmo! Eles discutem e levam uma pauta.
O Espaço Aberto é mais para as questões do dia-a-dia e a Assembléia
• Ações que propiciem a
autonomia e participação
dos adolescentes:
Assembléias; plenárias;
comissões, etc.
• Adolescente como sujeito
de direitos.
• Lógica da participação
93
para questões mais específicas. (D3)
• Existem várias ações que propiciam essa autonomia; o espaço na
assembléia, as comissões ...onde educadores e adolescentes
participam e constroem propostas para o funcionamento do Centro.
De forma geral a lógica do nosso trabalho possibilita que o
adolescente e as famílias possam construir esse trabalho no dia-adia... e esse é um aspecto que favorece o protagonismo juvenil. (D4)
• A gente tem tentado dar autonomia... acho que tem que ser trabalhada
em toda comunidade educativa... Esse sujeito tem opiniões, é capaz!
Tem sua cultura e é adequada a sua realidade... é preciso fortalecer
sua autonomia porque lá fora nada vai mudar: - o tráfico ta lá, e vai
bater na sua porta! A gente tem que criar expectativas de mudança
pessoal do sujeito ou da sua vontade. ... Temos que cuidar das pessoas,
não somos agentes penitenciários e sim socioeducativos. (D5)
coletiva, através da
Comunidade Educativa.
Fonte: Centros Socioeducativos de Belo Horizonte, meses de Fevereiro e Março de 2009.
Para analisarmos os discursos referentes às ações protagonistas dos adolescentes
nos Centros Socioeducativos, torna-se necessário enfatizar que o debate acerca da
participação social teve seu marco histórico no processo de redemocratização do País. Nesse
período o Brasil vivenciou um novo contexto social, marcado pelo fim do ciclo militar e pela
aprovação da Constituição Federal de 1998, a qual assegurou o estado de direito, garantindo a
participação da sociedade na elaboração, controle e fiscalização de Políticas Públicas.
No tocante à área da Criança e do Adolescente, em 1990, o ECA, conforme
explicitado no item 1.3 do Capítulo I deste estudo, veio a regulamentar norma constitucional,
assegurando que crianças e adolescentes fossem sujeitos de direitos e deveres. Com esse
dispositivo legal, o modelo democrático deixou de ser apenas representativo para tornar-se
participativo e assegurou, também, a crianças e adolescentes a participação social nos espaços
de discussão, proposição e deliberação.
No caso dos adolescentes em conflito com a lei, surgiu também o SINASE, que
legitimou ainda mais a questão do protagonismo juvenil, que está diretamente ligada a
participação dos adolescentes, conforme regulamentado no SINASE, item 3, referente as
Diretrizes Pedagógicas do Atendimento Socioeducativo - 6.1, do Capitulo 6 que trata dos
Parâmetros da Gestão Pedagógica no Atendimento Socioeducativo, conforme se vê:
É fundamental que o adolescente ultrapasse a esfera espontânea de apreensaão da
realidade para chegar à esfera crítica da realidade, assumindo conscientemente seu
papel de sujeito. Contudo, esse processo de conscientização acontece no ato de açãoreflexão. Portanto, as ações socioeducativas devem propiciar concretamente a
participação crítica dos adolescentes na elaboração, monitoramento e avaliação das
práticas sociais desenvolvidas, possibilitando, assim, o exercício – enquanto sujeitos
sociais – da responsabilidade, da liderança e da autoconfiança (BRASIL, 2006).
94
Diante das constatações legais acima, dos discursos dos profissionais responsáveis
pela gestão dos Centros Socioeducativos e também de vários profissionais, detectados nos
Grupos Focais, pode-se perceber que mesmo de forma ainda insuficiente, são realizadas
ações pontuais que propiciam a autonomia e participação dos adolescentes como:
assembleias; plenárias; comissões, entre outras. Essa lógica de participação denominada no
SINASE (2006) como Comunidade Socieducativa, é importante, pois propicia um
entrelaçamento de ações e responsabilidades de todos os atores sociais que fazem parte da
dinâmica dos centros, considerando o próprio adolescente como parte do processo educativo e
sujeito de direitos.
A concepção de protagonismo foi elaborada a partir de uma ampla discussão sobre
as experiências e práticas pedagógicas com adolescentes, realizadas pela Fundação Odebrecht
em 1988 (COSTA, 2000), que auxiliaram a construção do conhecimento sobre o tema do
protagonismo juvenil, através de reflexões, discussões e diálogos entre adolescentes, jovens e
educadores sociais. No contexto da experiência relatada, Costa (2000, p.20) afirma que “[...] o
termo protagonismo, em seu sentido atual, indica o ator principal, ou seja, o agente de uma
ação, seja ele um jovem ou um adulto, um ente da sociedade civil ou do Estado, uma pessoa,
um grupo, uma instituição ou um movimento social.”
O protagonismo pode ser realizado por diversos atores sociais, gestores e até
mesmo instituições, em suas atuações diversas e possibilidades de participação social.
Compreende-se, assim, que tal conceito é amplo e abrangente e não está limitado à atuação
apenas, do adolescente. Costa (2000), ao descrever o processo político-pedagógico
desencadeador do protagonismo juvenil, toma como referência um tipo particular de
protagonismo, que é aquele desenvolvido pelo adolescente e, ainda, faz um recorte mais
específico, que é o daqueles na faixa etária entre 12 (doze) e 18 (dezoito) anos de idade, de
acordo com a legislação brasileira – ECA, Lei, 8.069/90. Erikson, citado por Maakaroun et al.
(1991), afirmou que é no período da adolescência que as ações de participação propicia o
desenvolvimento da personalidade e auxilia o próprio adolescente a assumir uma postura
protagonista em relação a contextos sociais diversos.
95
QUADRO 8
Posicionamento dos gestores quanto às ações de inclusão produtiva dos adolescentes
Expressões Chaves (ECH’s)
Ideias Centrais (IC’s)
• Estas ações são compostas de parcerias diversas como: SENAC; • Ações e iniciativas em
construção tendo em
Juizado da Infância e Juventude de BH e o Ministério do Exército,
vista a inclusão produtiva
entre outros, mas ainda são iniciativas. (D1)
dos adolescentes.
• Na maioria das vezes a própria unidade busca os parceiros. Existe um
incentivo da política de inclusão! Na hora que a gente esbarra na
formação de um Ser, isso demora muito. Todos ajudam. Acho que é • Incentivo da Política de
inclusão produtiva e
uma função da Gerência, mas algumas são articulações da(o)
diversas parcerias.
Assistente Social. (D2)
• Acho que está caminhando... ainda está em construção. (D3)
• O desafio primeiro é quebrar com os preconceitos das instituições • Desafios: Preconceitos,
avanço da educação e
para atender os adolescentes em Conflito com a Lei; o segundo, seria
atender as demandas de
o avanço da educação, pois não adianta pensar na profissionalização
qualificação profissional.
sem pensar primeiro na educação. Outro é atender as demandas de
E inserção no mercado de
qualificação desses adolescentes, pois muitas vezes estão distantes da
trabalho.
sua realidade e dos seus desejos. Por último é a questão do emprego,
a dificuldade de se inserir no mercado, já que isso é uma realidade
para a maioria dos adolescentes e ainda mais para os que estão em • Dicotomia: mercado de
conflito com a Lei. (D4)
trabalho x tráfico.
• Existem iniciativas nesse sentido, acho que ainda falta uma política.
...melhoramos nosso entendimento depois do GEDUC (Gestão
Educacional da SUASE) e começamos a ver a real e cruel realidade
do Sistema Socioeducativo dentro dessa temática. O desafio está
lançado, em vários sentidos e principalmente na questão da
profissionalização... pois diante do tráfico o mercado de trabalho não
encanta! Ele nos forma para “ganhar dinheiro”, mas a idéia não
deveria ser essa. Seria fundamental a realização através do trabalho.
Vejo que temos ainda muito a fazer neste sentido. (D5)
Fonte: Centros Socioeducativos de Belo Horizonte, meses de Fevereiro e Março de 2009.
Pelas análises das entrevistas semi-estruturadas realizadas com as cinco gestoras
dos Centros Socioeducativos de Internação, demonstradas no QUADRO 8 e também dos
discursos dos 41 profissionais que estiveram presentes nos Grupos Focais, ficou claro que
existe um incentivo e ações pontuais quanto à inclusão produtiva dos adolescentes, mas os
desafios são enormes, no tocante à efetivação de uma política de atendimento nesse sentido e
que atenda as demandas do público alvo do presente estudo, confirmada pelas falas das
Diretoras (D3) e (D5), respectivamente: “Acho que está caminhando... ainda está em
construção.” e “Existem iniciativas nesse sentido, acho que ainda falta uma política.”
Constata-se, assim, as dificuldades de inclusão produtiva dos adolescentes de uma
forma geral, ainda mais dos que estão ou que já estiveram em conflito com a lei, pois o
mercado de trabalho não oferece empregos suficientes e de qualidade para atender à
população “jovem” que ano após ano precisa de inserir-se. A realidade para Pochmann (1998)
é escassez de empregos regulares para a população “jovem”.
96
Fica evidente nesta situação a dificuldade para o adolescente ingressar no mercado
de trabalho, confirmada por Fausto e Cervini (1992), que demonstraram que a população
“jovem” forma um excedente de mão-de-obra que acaba por ser absorvido no mercado
informal ou em pequenas unidades de produção em que o nível de exigência é baixo. Estas
ocupações que anteriormente absorviam trabalhadores com pouca ou nenhuma escolaridade,
na atualidade são disputadas por aqueles com escolaridade mais elevada.
Dupas (1999) confirma que há um número elevado de desempregados entre
aqueles que pretendem ingressar no mercado de trabalho, e, um número significativo de
jovens com escolaridade elevada sendo absorvido em empregos precários. Esta situação não é
diferente para Pochmann (1998), já que os postos de trabalho que não exigem qualificação
elevada têm sido ocupados por indivíduos jovens com escolaridade mais elevada.
Outro fator preponderante que dificulta a socioprofissionalização dos adolescentes
é a contradição entre mercado de trabalho e tráfico de drogas, registrado nas falas das
gestoras, devido à presença do narcotráfico recrutando esse adolescente e remunerando-o de
forma bastante atrativa, pois conforme (D5): “[...] O desafio está lançado, em vários sentidos
e principalmente na questão da profissionalização... pois diante do tráfico o mercado de
trabalho não encanta! [...]” Fato esse também confirmado nas entrevistas dos próprios
adolescentes no QUADRO 2, como se vê:
Fiquei seis anos no tráfico. Vendia pedra. Cocaína e maconha vendi também [...]
[...] no centro (cidade) não dá pra vender tudo, porque tem uma divisão, né. Tipo!
aqui pode vender isso, ali não pode vender aquilo. [...] no centro eu vendia pedra.
[...] na favela, eu vendia menos. No centro, eu ficava na gerência. Eu só gerenciava
sozinha. Trabalhando... (A16).
Já vendi droga. Desde os 11 anos... é boa! (a atividade). Eu fazia mais por causa de
dinheiro, também... Dependia. Ah... uns 900 por noite. Eu tirava uns 4 mil por mês.
Eu torrava tudo! (A11).
A inserção no mundo do trabalho e/ou a inclusão produtiva pode ser entendida
como uma oportunidade de crescimento pessoal, uma vez que passam a adquirir novas
responsabilidades. A fala da adolescente A16 que ficava na “gerência” demonstra esse fato,
que mesmo realizando uma atividade ilegal, teria suas responsabilidades, se sentia importante
quando relata que “gerenciava sozinha” e encarava tal atividade como trabalho, facilitando o
tão almejado status social.
Diante da contradição entre mercado de trabalho e tráfico apresentada pelos
próprios adolescentes e no depoimento da Diretora (D5), é importante analisar que os dados
referentes à quantia recebida pelos adolescentes podem ser percebidos como um entrave ao
97
avanço da socioprofissionalização, pois nos mostrou que a mesma variou bastante se
pensarmos na relação do narcotráfico com os outros tipos de atividades. Pode-se concluir que
através dessa atividade ilegal, o adolescente (A11) conseguiu ganhar até 9 vezes mais do que
com as atividades legais ou regime de aprendizagem, tendo como base o salário mínimo.
Percebemos que o mercado de trabalho não é sempre “legal”. Existe, também,
para esse público, o “ilegal”, capaz de remunerar bem mais por esse “trabalho”. O que a
“atividade legal” oferece a mais, de forma a compensar a baixa remuneração é a segurança do
indivíduo - poder realizar essa atividade publicamente, sem o risco de ser preso ou de ser
punido. A legalidade das atividades laborais promove também, o status social e a dignidade,
além da proteção trabalhista que oferece ao indivíduo.
Dupas (1999) e Machado (2001) acreditam que a dificuldade de acesso ao
mercado de trabalho pode elevar a violência social; os jovens acabam se tornando vulneráveis
às situações de delinquência, em que o retorno financeiro é certo, bem como a possibilidade
de fazer parte da sociedade de consumo, conforme relato do A11, que enfatizou a sua
“remuneração” de aproximadamente quatro mil por mês e a sua finalidade consumista, pois
de acordo com ele: “torrava tudo”. A OIT (2001) endossa esse aspecto sobre o desemprego
juvenil39, pois de acordo com pesquisas ele pode contribuir para o aumento da violência em
alguns países e defende o combate ao que chama de “epidemia”. O desemprego juvenil pode
contribuir para a apatia social, impedindo os jovens de se envolverem em causas políticas em
prol da sociedade, tão próprias de sua faixa etária. Sendo assim, os jovens não chamam a
responsabilidade para si, somente esperam acontecer e reagem às situações, passando a não se
preocupar com o coletivo, colocando a culpa em tudo e em todos. O que importa para eles é o
hedonismo individual.
Uma das alternativas dos Centros Socioeducativos, no sentido de inclusão dos
adolescentes, é a captação de parcerias nesse sentido, tanto da própria SUASE, quanto dos
profissionais no interior das unidades, utilizando-se assim do princípio que rege o Art. 86 do
ECA, que refere-se a necessidade de ações articuladas, sejam elas governamentais ou não
governamentais, para a efetivação de uma política de atendimento. Este fato pode ser
percebido nos discursos das Diretoras (D1) e (D2).
______________
39
O desemprego juvenil pode ser entendido neste estudo como acesso ao primeiro emprego.
98
4.3 Profissionais (P)
QUADRO 9
Impressões sobre a música Pivete de Chico Buarque e Francis Hime apresentada e relacionada
à realidade vivenciada pelos adolescentes
Expressões Chaves (ECH’s)
Ideias Centrais (IC’s)
• Aqui contraria o que se fala do mundo do trabalho, pois: tem freio e
direção. A música diz que o menino “não tem freio e nem direção”. E
se ele não se liga em freio e direção, quer dizer que não tem limites.
Desde criança eles não tem limites! ...eles não foram educados... ou a
maioria não. (P1)
• O adolescente foi para o sinal, quando deveria estar na escola, num
projeto social. Às vezes, para... às vezes, não. ...eu falo, pois conheço
caso de adolescente que foi para a rua e deslanchou na vida. Mas sem
ter acesso. Sem ter direito a praticamente nada. Com todos os direitos
violados. A gente vê, eles numa situação de vítima, mas muitas vezes,
a vítima começa a fazer vítimas, né? (P2)
• Nessa parte aqui, “sonha com a menina... prancha... cheira parafina...
dorme gente fina...”, a gente vê um pouco no discurso deles, assim,
né. Do desejo de terem uma vida diferente da que eles tem. Do sonho
de consumo.... Que é o Rio, as minas, o surfista, a parafina. Ele tem
um ideal na vida deles, e tentam chegar nisso! (P3)
• Eu acho que eles querem ser incluídos. Ter um tênis de marca, talvez
equivaleria a ser um filhinho de papai, um playboy. Aí, mesmo que ele
não seja, ele tem um tênis igual ao dele. Talvez a aparência dele possa
se parecer com a do outro! Talvez assim se sintam incluídos. (P3)
• A gente fica naquela máxima: filho de rico que usa droga é
dependente químico ou problemático. Filho de pobre é sem-vergonha,
safado! Tem que ir pra cadeia e a polícia pega. Agora, filho de rico,
não. Vai prá clínica particular! Não que a violência não exista nas
outras classes sociais, mas só aparece nas classes inferiores. Muitos
desses meninos...Pivetes, de Chico Buarque, a gente vê, aqui. Né?
Acho que mais é a questão social. (P4)
• Na primeira estrofe ele vende a alma dele. Foi vender o chiclete pro
outro. Daí não deu certo, ele aponta o canivete. Quer dizer, o chiclete
não deu certo. Ele começa de canivete. E para baixo... deve ser a
visão do Chico: aponta que o sistema é que jogou ele no meio. (P3)
• Algumas tem oportunidades. Fazem curso aqui, vai lá fora, é indicada
no emprego, mas acabam voltando pro tráfico. Por quê? Eu acho que
o salário é maior. Porque elas falam assim: “o que eu ganho no mês,
elas ganham em um dia”. Eu acho que é muito essa questão, mesmo.
É fácil! (P4)
• O interessante, que quando você vai perguntar sobre se já
desempenharam alguma atividade ou se já trabalhou, algumas se
refere ao tráfico como tipo de trabalho. Tem essa referência, porque
através do tráfico conseguem dinheiro. Então, o conceito que elas tem
de trabalho, está ligado muito, só a questão do dinheiro, né. (P4)
• Eu acho que tudo começa num universo maior, né. Como criança ele
vai para rua, onde não deveria estar. Pode começar até através da
venda de chiclete, mas pelo local onde ele está vendendo esse chiclete,
aí no desenrolar da música fala: que ele sobe e desce ladeira e daí a
pouco um assalto no carro, né! ...começa os roubos e vai
desenrolando outras coisas piores...(P5)
• Acho que a diferença é exatamente a questão cultural. A gente... nós,
tivemos oportunidades, nós vivemos em mundos bem diferentes. Ele
• Necessidade de Inclusão
Social.
• Questão Social leva a
criminalidade.
• Tráfico percebido como
trabalho e como meio de
sobrevivência.
• A falta de limites e as
perdas contribuiem para
agravar a situação
infracional dos
adolescentes.
• Dificuldades e inserção no
mundo do trabalho.
99
não teve esse embasamento. Acho que é uma questão social mesmo!
De família e de cultura. Aqueles são os valores dele, mas ele busca as
mesmas coisas que eu. Só que ele tem outros valores, diferentes dos
meus. (P5)
• Quando fala: “num sinal fechado, ele vende chiclete”- acho que para
ele o mercado de trabalho está fechado! A saída dele seria ser um
ambulante... Começa vendendo chiclete, mas depois ele descobre
outras coisas... com as drogas ele ganha muito mais... tem um retorno
muito melhor, né. E aí? (P5)
Fonte: Centros Socioeducativos de Belo Horizonte, meses de Fevereiro e Março de 2009.
A música popular foi utilizada, pois é capaz de penetrar profunda e
transversalmente as camadas sociais e expressar, com elevado grau de significância as
manifestações culturais de uma sociedade, permitindo surpreender preciosos recortes do
imaginário, e devido a isso, torna-se uma expressão representativa. Podemos perceber que ao
invés de uma simples instância representativa, o imaginário constitui-se numa dimensão que,
mais do que se nivelar com o real, pode ser concebido como instaurador de outras dimensões,
como percebida nas impressões dos profissionais, podendo ser confirmada mais diretamente
no discurso do (P5), quando diz: “acho que para ele o mercado de trabalho está fechado! A
saída dele seria ser um ambulante [...]” O profissional faz um contraponto do mercado de
trabalho com o semáforo fechado, lócus onde o Pivete vende chicletes, ou seja, ele realiza e
acredita estar inserido no mundo do trabalho.
Segundo Durand (1999), o estudo do imaginário permite a compreensão do
dinamismo que regula a vida social e suas manifestações culturais. O imaginário consiste no
capital inconsciente dos gestos do homo sapiens, sendo também o conjunto de imagens que
constituem o capital pensado do homo sapiens e o universo das configurações simbólicas e
organizacionais. Portanto, estão subjacentes ao imaginário os modos de pensar, sentir e agir
de indivíduos, culturas e sociedades.
A música “Pivete”, cantada por Chico Buarque de Hollanda é de autoria dele e de
Francis Hime, utilizada para introdução e sensibilização dos profissionais nos Grupos Focais
realizados nos Centros Socioeducativos, serviu para iniciar a discussão sobre o tema trabalho,
e fez um contraponto com a inclusão social desse adolescente e as demais temáticas que
envolvem a questão do adolescente em conflito com a lei, de forma geral. Na obra poéticomusical emerge a questão social, representada a princípio pela luta pela sobrevivência no
sentido da realização de atividades laborativas conforme a estrofe “capricha na flanela...
batalha algum trocado...”, diante da dura realidade social de tantas crianças e adolescentes do
País, e é eufemizada pelo compositor na figura do “Pivete”. A representação dramática da
música é percebida quando o “jovem trabalhador” é transformado em “infrator”, confirmada
100
nas estrofes: “Aponta um canivete e até...” e “descola uma Bereta”, confirmação que não
deixa dúvidas sobre sua condição infracional.
Devemos destacar que o trabalho é uma temática recorrente na obra Buarquiana,
surgindo em diversos momentos de sua trajetória como compositor. Em texto publicado na
Revista Concinnitas, Eloiza Oliveira (2002) realiza uma “leitura” do texto buarquiano, através
da Análise do Discurso, buscando os significados relativos ao tema trabalho. Conclui que eles
descortinavam uma “cena discursiva”, em que atores-falantes atuavam e interagiam. Os
“atores” da obra de Chico Buarque, no que se refere ao trabalho, podem ser classificados
como: operários, prostitutas, malandros, pivetes, entre outros, e tais ideias, sentidos e
símbolos compõem o imaginário social.
Pode-se perceber que as instâncias do trabalho e da inclusão social constituem-se
em objeto privilegiado do conteúdo do imaginário dos atores sociais, de forma geral. Elas se
exibem e se oferecem à análise de inúmeras formas. Neste ponto, vale a referência a um
conceito de fundamental importância para qualquer estudo na área, mas muitas vezes
negligenciado, sobre o imaginário social. Trata-se do enunciado de Durkheim (1960, p. 4647), quanto à existência de uma “consciência coletiva”. O autor explicita sua visão ao teorizar
sobre a divisão do trabalho social, quando analisa o que denomina “solidariedade mecânica”
ou quando fala dessa “consciência coletiva ou comum”, que é “a mesma do Norte e do Sul,
nas grandes e pequenas cidades, nas mais diferentes profissões. Da mesma forma, não muda a
cada geração, mas ao contrário, enlaça umas às outras as gerações sucessivas”.
A relação trabalho/inclusão social está magistralmente reinventada por Chico
Buarque em “Pivete”. E nosso compositor o faz mediante o uso hábil e eficiente de imagens
contrapostas, que auxiliaram os discursos dos profissionais (QUADRO 9). Ou será por acaso
que “Pivete” foi uma expressão disfarçada do momento vivido no Brasil por tantas crianças e
adolescentes nos grandes centros urbanos e a urgente necessidade de inclusão social e
produtiva desses atores através das diversas Políticas Públicas direcionadas a uma realidade
social pautada de um lado pela luta pela sobrevivência e de outro pela banalização da
violência?
O adolescente foi para o sinal, quando deveria estar na escola, num projeto social.
Às vezes, para... às vezes, não. ...eu falo, pois conheço caso de adolescente que foi
para a rua e deslanchou na vida. Mas sem ter acesso... Sem ter direito a
praticamente nada. Com todos os direitos violados. A gente vê eles numa situação
de vítima, mas muitas vezes, a vítima começa a fazer vítimas, né? (P2).
101
Os versos da música representam um tempo de trabalho infantil, ilegal para a
criança e informal para o adolescente, perpassando entre a atividade legal e passando
gradativamente à ilegal. A gestão do imaginário vem à tona, e passa pelo desejo e pelo sonho
– “sonha aquela mina”; também pela discriminação do sujeito – “e tem as pernas, tortas” e
pela falta de limite – “não se liga em freio nem direção.” Sendo que esse último, que está
diretamente ligado na questão dos limites, foi realçado nos discursos dos profissionais e até de
adolescentes, a exemplo podemos citar o (A41), “...e eu queria ter uma certa liberdade, aí
minha mãe... nem ela sabia o que era certo ou o que era errado, e ela deixava.”
Conforme Calligares (2000, p.43), “[...] não é difícil enumerar os comportamentos
mais frequentes da delinquência do adolescente. Sua banalidade só demonstra a banalidade
dos desejos que os adolescentes conseguem descobrir atrás do silêncio dos adultos [...]” A
transgressão do adolescente reflete no adulto justamente o que eles querem reprimir. O grupo
é o portador de um coletivo cultural onde ele se sente plural, define suas ações, estabelece sua
ordem e coloca seus próprios limites. Fato esse percebido pelo profissional (P1), quando fala:
“A música diz que o menino não tem freio e nem direção. E se ele não se liga em freio e
direção, quer dizer que não tem limites. Desde criança eles não tem limites! ...eles não foram
educados... ou a maioria não.”
A canção mostra claramente a opção de crianças e adolescentes (ou falta de
oportunidades) pelo tráfico como meio de sobrevivência e status social, mas também reflete o
cansaço e até o lócus de produção da doença mental, através da estrofe: “dorme gente fina e
acorda pinel”, e existe também o contexto de drogadição que pode ou não estar diretamente
ligado ao tráfico – “meio se maloca... agita numa boca... descola uma mutuca e um papel”,
mas que pode ser traduzida por um contexto de perdas diversas e marcadas pelos traços de um
futuro incerto. Como afirmou (A28): “...Ah, eu acho que tinha muita revolta, né. Eu já vi o
meu pai morrer na minha frente, eu tinha sete anos. Aí, cometia crime. Tráfico...” As
situações descritas e principalmente as relativas às perdas que sofrem durante suas vidas, fato
esse exemplificado pelo adolescente (A28), descrito, podem contribuir como porta de entrada
para a criminalidade. Ainda que boa parte dos estudiosos e do senso comum não consiga fazer
uma conexão entre infração e perdas, mas é impossível não consideramos esse aspecto.
Portanto, o estudo do simbolismo presente na música “Pivete” permitiu refletir as
dimensões macro e micro-estruturais, isto é, empreender a análise da música co-relacionandoa aos discursos dos profissionais, sem desconsiderar os grandes sistemas que envolvem o
social mais amplo. Isto revela, nesse caso, a complexidade e a heterogeneidade das relações
entre o mundo do trabalho e a necessidade de inclusão desse indivíduo, consolidando assim,
102
sua perspectiva cidadã, principalmente no caso do adolescente, que está em fase peculiar de
desenvolvimento.
QUADRO 10
Ações e percepções sobre preparação e/ou inserção socioprofissional dos adolescentes
Expressões Chaves (ECH’s)
Ideias Centrais (IC’s)
• O Estado através da medida socioeducativa, procura em primeiro • Necessidade de uma
lugar: uma equipe que vai oferecer para esse adolescente uma série de
Equipe qualificada voltada
trabalhos, tem a equipe da terapia ocupacional, da pedagogia e do
para a
serviço social. (P1)
socioprofissionalização dos
adolescentes.
• Eu acho que tem muitas oportunidades pros meninos sim! Minha visão é
que muitas vezes não se oferece recurso, formação, sei lá... dentro
daquilo que eles querem, nas perspectivas deles. (P2)
• Acreditam que existem
oportunidades para os
• Na realidade a gente tem preparado os adolescentes até para
adolescentes, mas poucas
apresentação pessoal. Começa com a auto-estima, com as oficinas de
que atendam o desejo dos
auto-cuidado. Incentivamos o trabalho informal, porque até que este
mesmos.
adolescente esteja capacitado para estar enfrentando um curso ou
trabalho lá fora, ele terá condições de fazer um trabalho informal como
o artesanato. (P2)
• Algumas experiências
voltadas para a
• Já tivemos alguns adolescentes no CESAM, em curso de preparação
socioprofissionalização e
profissional e depois conseguiram trabalho. Acho que são heróis,
inserção no mercado de
porque nós “trancados” aqui, será que retornaríamos? Alguns vão para
trabalho.
trabalho, ficam parte do dia fora, chegam tocam campainha pra poder
entrar, ainda tem que pedir autorização para tudo. Tem que depender
de alguém. - Tem hora que eu penso e me coloco no lugar deles, será • Existem parcerias mas
que eu daria conta disso? (P2)
ações são mínimas e
dificuldade de captação
• De acordo com o envolvimento no cumprimento da medida. Quando
desses parceiros.
chega a um nível de maturidade. Aí, ele é avaliado pela equipe, pra ver
se ele tem o perfil para fazer o curso externo.(P3)
• A gente tem que buscar parceiros. Tem dificuldades e às vezes, o
adolescente não tem o perfil. Tentamos, mas arranjar parceiros não é
uma coisa fácil.(P3)
• Eu acho que ainda esta começando... ações mínimas. Devem ser feitas
muito mais ações nesse sentido da inserção desses adolescentes no
mundo do trabalho. O que tem sido feito atualmente aqui, e que veio do
SINASE, são as parcerias, né. Parcerias com o SENAC e outras. Essas
parcerias funcionam (P4)
• Ás vezes, a gente se sente impotente. No dia em que a adolescente X foi
embora, olhava pra mim, chorava e dizia: “Pelo amor de Deus, me
ajuda. Arruma um emprego pra mim. Me ajuda, gente! Eu não posso
voltar pro mundo do crime, ...eu tenho meus filhos.” Eu pensei: nós não
podemos te ajudar. O ideal seria que todas quando saísse daqui como
aconteceu com a adolescente Y, tivesse um encaminhamento pro
emprego.(P4)
• Penso que a gente consegue passar para ele um pouquinho disso. Que
lá fora, nas empresas, é como aqui, né. Ele tem que cumprir horários.
...qual o objetivo da empresa. ...filosofia de trabalho. A gente faz isso!
(P5)
• As vezes a burocracia do Estado atrapalha, mas tivemos três
adolescentes contratados, saíram e foram trabalhar numa Pizzaria,
depois um foi embora para o interior, pois era de Pará de Minas, o
outro ficou no serviço, na unidade da Pampulha. (P5)
Fonte: Centros Socioeducativos de Belo Horizonte, meses de Fevereiro e Março de 2009.
103
O QUADRO 10 foi fruto das discussões dos profissionais nos Grupos Focais
realizados nos Centros Socioeducativos sobre as percepções dos mesmos no sentido da
socioprofissionalização dos adolescentes. Um dos pontos abordados foi à necessidade de uma
equipe qualificada e bem preparada para desenvolver essas ações, pois a complexidade no
trato com adolescente em conflito com a lei, exige compromisso dos profissionais em geral,
principalmente do técnico (citaram nesse caso; a Terapia Ocupacional, a Pedagogia e o
Serviço Social). Ele deve estar atento a imprimir um enfoque interdisciplinar ou no mínimo
esforçar-se para o redimensionamento das questões, numa perspectiva sistêmica e dinâmica,
que talvez seja “única” na vida destes adolescentes. Nesse sentido o profissional auxiliará o
adolescente, a redesenhar a sua história e de seu grupo familiar, e talvez constituir-se como
uma alternativa real para o não retorno a criminalidade.
A interdisciplinariedade ainda é um grande desafio, pois propõe que haja uma
troca entre os profissionais para que na convivência surja o aprendizado e com isso a
ampliação do referencial teórico-prático de cada categoria profissional. A partir desta
perspectiva, a interdisciplinariedade propiciará uma articulação entre os saberes e práticas
específicas, sendo que, para que isso ocorra é essencial a competência na área de atuação e a
mudança de paradigma no pensar e no fazer profissional. Isto significa valorizar cada área em
suas especificidades e naqueles conteúdos similares ao de todos que estão inseridos na equipe.
Outro ponto relevante foi que a maioria dos profissionais acredita que existam
ações e oportunidades para os adolescentes no sentido de preparação para o mundo do
trabalho, através de cursos e/ou oficinas profissionalizantes, mas poucos são aqueles que
atendam ao desejo dos mesmos. Esse fator pode contribuir para a desmotivação dos
adolescentes e até para sua evasão, como ocorre muitas vezes na escola regular. Esse ponto
foi também ressaltado no QUADRO 8 pelas gestoras, como desafio, conforme a Diretora (D4)
“... Outro (desafio) é atender as demandas de qualificação desses adolescentes, pois muitas
vezes estão distantes da sua realidade e dos seus desejos...”
Nos discursos dos profissionais dos Centros Socioeducativos foram detectados que
existem algumas experiências voltadas para a preparação socioprofissional do adolescente,
tanto internas como externas e até de inserção dos mesmos no mercado de trabalho. Um fato
em especial marcou o presente estudo através do discurso de um Agente Socioeducativo de
um dos Centros, que utilizou a metáfora do herói para designar a força de vontade de um
adolescente que sai para uma atividade externa, nesse caso específico era um trabalho,
viabilizado através do Centro Salesiano do Adolescente Trabalhador, onde passa o dia todo
fora e retorna para ser novamente privado de sua liberdade: “...Acho que são heróis, porque
104
nós “trancados” aqui será que retornaríamos? Alguns vão para trabalho, ficam parte do dia
fora, chegam, tocam campainha pra poder entrar, ainda tem que pedir autorização para
tudo...” (P2).
O discurso do profissional acima suscita reflexões: a primeira é que muitas vezes é
possível promover a ressocialização desse adolescente, contribuindo para o seu retorno ao
convívio social de uma forma saudável e com perspectivas de futuro. Isso se dá através de um
trabalho socioeducativo de qualidade, voltado tanto para a responsabilização desse indivíduo
perante o ato infracional cometido, como a atenção aos fatores pedagógicos, psicológicos e
sociais implícitos nesse contexto. A segunda, que não podemos deixar de citar, é que muitos
adolescentes, enquanto estão acautelados nos Centros, conseguem manterem-se no trabalho,
mas quando retornam a sua comunidade de origem são convidados insistentemente ao retorno
a criminalidade e como foi constatado neste estudo, a remuneração oferecida pelo narcotráfico
é bem maior que a do mercado capitalista.
Um fator muito citado em todos os Grupos Focais realizados foi à necessidade de
parceiros para a efetivação de ações socioprofissionais que visem a uma futura inserção desse
adolescente no mundo do trabalho. Citam que às vezes a burocracia estatal dificulta as ações
nesse sentido. Concluem que elas existem, mas são mínimas, ficando claro a dificuldade de
captação dessas parcerias e a efetivação de uma política de inclusão, fato esse também citado
no QUADRO 8, de forma mais clara pelas gestoras dos Centros Socioeducativos.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A situação atual do adolescente em conflito com a lei, em especial aqueles que se
encontram sob medida socioeducativa de internação, é uma realidade constante que se
presencia por todo o país. No entanto, ainda é pouco o que tem sido feito para combater esse
quadro, pois a violência a cada dia está mais presente em nossa sociedade e torna-se
necessário oferecer melhores condições de realização de um atendimento socioeducativo de
qualidade, que permita ao adolescente traçar um projeto de vida que o torne efetivamente
cidadão.
A experiência de construir um projeto e desenvolver este estudo foi um grande
desafio pessoal e profissional, pois no universo do adolescente privado de liberdade, que faz
parte das preocupações da pesquisadora, são poucos que ficam a vontade para realizar uma
pesquisa, principalmente devido a complexidade do sistema socioeducativo e a dificuldade de
se conseguir anuência dos órgãos oficiais para adentrar às unidades socioeducativas de
internação.
A temática da inclusão produtiva abordada é ainda pouco pesquisada e polêmica, o
que significou, para nós, um esforço no sentido de encontrar elementos que permitissem
compreendê-la em seus aspectos teóricos e práticos e em seguida discuti-la criticamente à luz
de um referencial teórico acadêmico-científico.
Constatamos através dos dados empíricos, a realidade de dezenas de adolescentes
acautelados e no intuito de contribuir de alguma forma para uma compreensão maior dos
desafios e perspectivas relativas ao mundo do trabalho, foram registradas tanto as percepções
dos adolescentes como a dos profissionais envolvidos com a questão, não existindo, portanto,
a pretensão de apontar soluções para a difícil tarefa da reinserção social. Isso ainda se
configura como um grande desafio na sociedade contemporânea, diante do estigma de que o
adolescente é alvo e da precariedade das Políticas Públicas que privilegiem a temática em
questão.
A política de proteção aos direitos da criança e do adolescente, entre as décadas de
80 e 90, foi possibilitada pela conquista de um Estado Democrático de Diretos, devido à
promulgação de instrumentos fundamentais, como a Constituição Federal de 1988 e o
Estatuto da Criança e do Adolescente, em 1990. Do ponto de vista formal, o ECA constituiu
um avanço, ao apontar os direitos dos adolescentes, abrindo a possibilidade de se elaborar
uma política social contra a exclusão, bem como, contra os riscos pessoais e/ou sociais
106
presentes no cotidiano desses adolescentes. Entretanto, a missão do ECA ainda está longe de
ser cumprida, estando ainda em construção no Brasil dos dias atuais. Da situação de abandono
à segregação social, os adolescentes veem constantemente seus direitos violados, impedindoos, assim, de serem de fato cidadãos.
Segundo o ECA, a internação, ou seja, a medida privativa de liberdade deveria ser
uma medida sujeita aos princípios de brevidade e excepcionalidade, respeitando o adolescente
como pessoa em condição peculiar de desenvolvimento, mas na prática isso não acontece,
tornando-se uma medida ainda extensa, devido ao longo período em que os mesmos
permanecem institucionalizados, o que na maioria das vezes pode vir a comprometer o seu
desenvolvimento biopsicossocial.
No cotidiano dos adolescentes pesquisados, manifestado em seus discursos,
podemos perceber que as condutas e os valores dentro ou fora das unidades socioeducativas
sofrem as influências do contexto ao qual estão inseridos naquele dado momento de suas
vidas e do grupo ao qual pertencem, o que será melhor visualizado a seguir.
Alguns questionamentos foram aparecendo no decorrer do estudo e a primeira
consideração a ser feita é que encontramos adolescentes que são rotulados pela mídia de
“menores infratores”, que em algum momento de sua trajetória carregaram outros rótulos
quando foram “crianças de rua”, trabalhadores infantis ou adolescentes trabalhadores e/ou
aprendizes. No entanto, percebemos duas dimensões que merecem destaque; uma é que para
grande parte da sociedade a imagem registrada é a de ameaça – do furto, do roubo, do tráfico,
ou seja, da violência. E a outra é da proteção, no que se refere à fragilidade dos adolescentes,
pois alguns não os consideram culpados pela situação em que se encontram, atribuindo o fato
a uma questão mais ampla, social ou estrutural. Essas questões foram abordadas na música
Pivete de Chico Buarque de Holanda e Francis Hime e analisada pelos profissionais nos
Grupos Focais realizados nos Centros Socioeducativos.
O que podemos pensar a esse respeito? Que por um lado, independentemente da
trajetória percorrida por esses adolescentes, estará sempre em evidência somente a forma ou
as estratégias utilizadas por eles, que ameaçam à ordem social, embora essas não sejam
percebidas como tal, apenas como atos de violência praticados por eles e contra a sociedade.
E por outro lado, por não terem acesso aos meios de sobrevivência e de consumo próprios da
fase em que estão, trilham um caminho já esperado. E, no imaginário social, se tornam
criminosos em potencial, devido à falta de oportunidades, que o próprio sistema econômico
não oferece.
107
Percebemos que o relato desses adolescentes, contribuiu para compreender, como
também é apontado por alguns autores que o trabalho ainda continue sendo visto pela
sociedade como importante fonte de socialização e normatização. Porém, as mudanças
ocorridas no mundo do trabalho no interior da sociedade contemporânea, como o acesso ao
primeiro emprego, diante da pouca escolaridade, qualificação e perspectivas profissionais,
acabam interferindo na forma do adolescente compreender a dimensão real do trabalho, que
consiste na valorização e satisfação pessoal que o mesmo pode oferecer.
O adolescente em sua maioria, não entende o trabalho como uma necessidade
vital, um dever moral, como analisado pelo pensador grego Hesíodo: um caminho para se
alcançar a areté, mas apenas como um instrumento que possa garantir sua autonomia
financeira para atingir o tão esperado status social e vivenciar a sua juventude e o sonho de
consumo.
Diante desse, novo olhar adolescente, direcionado ao mundo do trabalho, no
tocante às diversas atividades exercidas pelos mesmos antes da internação, percebemos que as
Atividades Ilegais passaram a ter uma função semelhante às legais e acabaram sendo, em
alguns momentos, uma alternativa factível para estes adolescentes e melhor remunerada para
garantir-lhes os ideais de consumo.
Nesse estudo observamos que, ao buscar compreender como o adolescente autor
de ato infracional percebe o mundo do trabalho e se já havia realizado alguma atividade
laboral pregressa, pudemos conhecer alguns aspectos importantes referentes à realidade de
vida dos mesmos, suas ações na inter-relação com a sociedade, a família, o Estado e consigo
mesmo.
No caso desse estudo, observamos a necessidade de ser feita uma crítica real à
sociedade do trabalho e as condições de mercado, e uma crítica velada à sociedade do direito,
pois os adolescentes oriundos de camadas populares em situação de vulnerabilidade social,
em sua maioria, com baixo grau de escolaridade e qualificação profissional, demonstraram
encontrar nas Atividades Ilegais (trabalho infantil, trabalho em situação de rua, ato infracional
e narcotráfico) uma forma para conseguir certa autonomia financeira. Dessa forma garatem o
acesso aos bens de consumo que lhes permitem, de alguma forma, vivenciar sua adolescência.
Verificou-se que, o acesso a Atividades Ilegais é facilitado, pois não exige grau de
escolaridade e/ou qualificação profissional para sua realização.
É interessante mostrar que a possibilidade de adquirir bens de consumo parece ser
um imperativo na vida desses adolescentes, uma vez que, por ser uma prerrogativa inerente à
sociedade capitalista contemporânea, acaba funcionando como um mecanismo para promover
108
simultaneamente a inclusão e a exclusão dos mesmos, e projetá-los na manutenção do seu
status quo. As estratégias dos adolescentes para alcançar tal condição social podem significar
quase que um direito fundamental, como o direito a vida ou a liberdade, mas que se volta
contra eles mesmos.
Um aspecto importante é que o fato dos adolescentes terem relatado um maior
número de Atividades Ilegais, em detrimento das Legais, nos fez perceber que é menor o
acesso às Atividades Legais, e que, quando o adolescente relatou a presença dessas últimas em
algum momento da sua vida, sua inclusão produtiva se deu de forma inadequada, sem a
devida formação e preparação através de ações pedagógicas orientadas. Neste sentido, foram
detectadas apenas atividades informais e/ou de sub-emprego, com baixa remuneração e
poucas perspectivas de valorização e crescimento profissional e pessoal.
A partir disso, podemos fazer algumas observações. Independentemente da
trajetória desses adolescentes, nas atividades relatadas por eles antes da internação, existe a
manutenção de uma posição social estigmatizada: “pobre”, perigoso em potencial e
trabalhador subserviente. Percebemos, também, que a realização de Atividades Legais ou
Ilegais é cercada por ações que de certa forma atuam como limitadoras da auto-estima e da
valorização pessoal, pois mesmo nas ditas Legais, a limitação é implícita, porque os sonhos e
os desejos dos adolescentes são quase sempre subordinados aos interesses do mercado de
consumo. Já para as Ilegais, a limitação é explicita, pois ele perde a condição de adolescente e
passa a ser visto como mero “infrator”, perdendo assim muitos dos “direitos” conquistados,
enquanto pessoa em situação peculiar de desenvolvimento.
O Ter nesse momento significa mais do que o Ser, e de certa forma o acesso aos
bens de consumo, sejam eles por via legal ou ilegal, permite ao adolescente a sensação de
inscrição no social, ou seja, ele consegue um passaporte para o mundo adulto, o que reforça a
sua autonomia e valorização, mas conforme constatado na pesquisa, muito mais utilizado pela
via ilegal.
Especificamente em relação à inclusão produtiva, os adolescentes carregam
consigo o título atávico, de que, para eles, basta apenas uma formação mínima que garanta
qualquer inserção no mundo do trabalho. É a partir desse pressuposto que se vê
continuamente os adolescentes sendo inseridos em atividades laborais, apenas para manter o
status quo.
Embora ajudar no sustento da família seja uma prerrogativa para a maioria dos
adolescentes entrevistados, isto não quer dizer que tenham que sair da escola. Parece que a
saída da escola acontece por questões estruturais, antes da sua internação; tais como o
109
desemprego dos responsáveis diretos e os atrativos do narcotráfico, onde as possibilidades de
ganhos exorbitantes enfeitiçam os adolescentes, criando-lhes a falsa sensação que não
necessitarão do estudo para se estabilizar financeiramente e para conseguir sua inscrição no
social.
Foi verificado nesse estudo, que para a maioria dos adolescentes essa percepção é
alterada durante o cumprimento da medida judicial imposta, pois no Quadro 4 mostramos as
perspectivas de futuro, sendo detectado que em relação aos estudos, a maioria dos
entrevistados nutriam o desejo de prosseguí-los. Diante das dificuldades enfrentadas antes da
internação, passam a acreditar que este é o único caminho para uma vida melhor, bem como a
oportunidade de ajudar de maneira mais efetiva na manutenção ou melhoria das condições de
vida familiar. Nessa contradição é possível perceber onde se localiza a força maior para o
êxito da ação socioeducativa.
Eles conseguem perceber a dificuldade de se inserir no mercado de trabalho,
mesmo para aqueles que têm estudos, quanto mais para os que não os tem. Apesar disso, eles
sabem que a ausência do estudo torna praticamente inviável o ingresso e a manutenção do
mesmo no trabalho. Eles expressam isso de maneira clara e consciente e, às vezes, algum
parente é o exemplo da necessidade dos estudos. Assim, eles instauram a política, no sentido
original da expressão, em suas vidas. Entre os jovens entrevistados, aqueles que não
estudavam antes da internação e devido a obrigatoriedade nos Centros Socioeducativos,
passam a perceber a sua necessidade e querem continuar os estudos, uma vez que começam a
refletir que a baixa escolaridade se torna um fator dificultador para sua inclusão produtiva e
para seu crescimento profissional.
A percepção das gestoras e dos profissionais no tocante ao Direito à
profissionalização e proteção ao trabalho preconizado no ECA e no SINASE, também não é
diferente e ficou muito centrada nos desafios decorrentes desse processo, principalmente em
relação à escolaridade dos adolescentes.
Buscando facilitar a inclusão produtiva dos adolescentes, foi percebido no
atendimento socioeducativo diversos projetos e propostas, principalmente ligados às
Organizações Sociais, no sentido de garantir ao público alvo, alguma formação profissional
que possa facilitar sua futura reinserção social e profissional, mas ainda são incipientes tais
ações, conforme relato dos profissionais dos Centros Socioeducativos.
Historicamente, a concepção que subjaz grande parte das ações e projetos de
intervenção no sentido de incluir produtivamente esses adolescentes, apresentam o trabalho
como atividade-fim, ou seja, traz implícita a realização do trabalho com um objetivo em si
110
mesmo, com a justificativa de que o adolescente não permaneça desocupado. É o que
Minayo-Gomez e Meirelles (1997) denominam de função moral e disciplinadora, segundo a
qual, ao realizar algum trabalho, o adolescente se afasta do risco de agir em dissonância com
as regras sociais ou morais. Outro pressuposto, por outro lado, está presente em parte nos
projetos, apresentando o trabalho como atividade-meio, ou seja, como uma forma de se
alcançar algum objetivo. Porém, na maioria dos casos, a finalidade da atividade laboral é
meramente a obtenção de recursos financeiros, descritos por Minayo-Gomez e Meirelles
(1997) como reapresentando a função de subsistência e bem marcada nos discursos dos
adolescentes.
Indiscutivelmente, os projetos voltados à iniciação socioprofissional de
adolescentes, apresentam grande relevância social, pois consideram o trabalho como
princípio educativo como enfatizado por Gramsci (1968) e Frigoto (1985), e também como
atividade-meio, não sendo apenas o espaço onde será possível obter recursos financeiros, mas
um meio efetivo de formar integralmente o futuro cidadão. A função formadora do trabalho
tem por pressuposto o desenvolvimento de atividades e competências envolvendo diferentes
contextos e níveis de relação, como social, familiar, escolar e cultural dentre outros. Há que se
desenvolver o cidadão em sua plenitude, abordando direitos e deveres em relação ao trabalho.
As organizações sociais que veem desenvolvendo esse tipo de trabalho junto aos
adolescentes das classes mais vulneráveis tem como objetivo dar-lhes formação
socioprofissional, orientação educacional, cultural e esportiva, defender seus direitos
trabalhistas e previdenciários e controlar suas relações no trabalho, em conformidade com as
disposições do ECA e no caso dos adolescente em conflito com a lei, também do SINASE.
Os adolescentes entrevistados, em sua maioria, demonstraram indícios de que a
internação pode atuar sobre suas percepções de forma positiva, despertando-lhes sentimentos
de auto valia e interesse pela construção de um projeto de vida longe da criminalidade.
Entretanto, não obtivemos subsídios concretos para perceber se as ações desenvolvidas no
interior do sistema socioeducativo conseguem atender efetivamente uma perspectiva
socializadora ou de reinserção social, como é habitualmente chamada. O que temos convicção
é de que para o adolescente, um processo de institucionalização prolongado pode atuar
negativamente no sentido de limitar a sua autonomia e protagonismo, fatores esses
fundamentais para sua inserção no mundo adulto, onde o trabalho é parte fundamental.
Não podemos desconsiderar que existe uma relação de dependência pessoal do
adolescente internado com a instituição e está diretamente influenciada pelo contexto social
que ele estava inserido antes da internação e ao qual será submetido ao ser privado de sua
111
liberdade, pois sabemos que seu poder de escolha será automaticamente diminuído e ele
sentirá os efeitos da institucionalização. Colocamos aqui, em discussão: quais instrumentos
serão oferecidos para que esses adolescentes se sintam protagonistas e consigam administrar
as suas escolhas e desejos diante do estigma de infrator que a sociedade lhe impõe, mesmo
que de forma justa?
Diante da realidade estudada, percebemos que existem espaços institucionais
dentro e fora das unidades socioeducativas que favorecem a autonomia e individualidade dos
adolescentes e eles poderão se sentir parte do contexto. Mas é certo que ainda serão
necessárias muitas ações e intensas discussões, para que se tornem protagonistas. Para que a
sociedade como um todo, consiga perceber esses adolescentes como adolescentes e não
somente como “infratores”, e assim pensar em propostas de atendimento que não os
coloquem como problemas, mas como cidadãos, mesmo estando privados de sua liberdade.
A complexidade no trato com os adolescentes em conflito com a lei exige que o
profissional do Sistema Socioeducativo, esteja atento a um enfoque interdisciplinar, que
sabemos que é outro desafio nas instituições de uma forma geral. Esse enfoque propõe que
haja troca de conhecimentos e percepções, visando um aprendizado mútuo e que com isso
surja um entrelaçamento entre as categorias profissionais. A partir desta perspectiva, a
interdisciplinaridade propiciará uma articulação entre os saberes e práticas específicas, sendo
que, para que isso ocorra, é essencial a competência na área específica de atuação e
flexibilidade para aceitar a mudança de paradigmas que refletirá no pensar e agir profissional,
ampliando assim o trabalho em equipe, contribuindo no trato com o adolescente.
As dificuldades encontradas para os adolescentes se inserirem no mercado de
trabalho é uma realidade não só no Brasil, mas também em diversos países do mundo. Este
percurso nunca foi dos mais fáceis, todavia em um mundo globalizado, com inovações
tecnológicas constantes e o número de empregos tendendo a diminuir, a passagem do mundo
adolescente para o mundo adulto tem-se tornado mais complexa. De fato, quando se aliam às
questões estruturais do próprio mercado como a baixa escolaridade, a falta de qualificação e
as situações de vulnerabilidade, a inserção é ainda mais complexa.
Para os adolescentes em situação de vulnerabilidade pessoal e/ou social, a insersão
social é uma luta diária e necessária para se entrar no mercado de trabalho, uma vez que não
podem prolongar o tempo com estudos, pois necessitam de trabalhar para ajudar no sustento
da família. Esta lacuna, portanto, pode ser preenchida pelo Poder Público através de cursos de
iniciação socioprofissional a serem oferecidos para estes adolescentes, visando sua futura
inclusão produtiva, através de parcerias público-privadas neste sentido.
112
Seria recomendável que se instituísse também um “Relatório” como o Warnock,
que situasse a Inclusão Produtiva no patamar da educação especial e fosse vista como
“adicional e suplementar”, e não “separada e alternativa” ao ensino regular, não ficando a
cargo somente das organizações sociais a responsabilidade de incluí-lo produtivamente. Para
a maioria dos adolescentes, ela deveria ocorrer concomitantemente ao ensino fundamental,
portanto, na própria sala de aula, como conteúdo interdisciplinar. O grupo familiar, nesse
caso, poderia ser considerado co-participante no processo de inclusão produtiva do
adolescente e auxiliaria na tomada de decisões.
Enfim, gostaríamos que uma nova era se iniciasse para o tema da Inclusão
Produtiva, cientes de que viabilizar esse processo é um caminho árduo, que demanda, antes
de mais nada, um compromisso ético de todos os atores envolvidos com a questão. Implica,
antes de tudo, a necessidade de se alterar o quadro social com mudanças profundas na
conjuntura do país, buscando a implementação de uma rede de ações integradas. É necessário
a afirmação de uma Cultura Produtiva, onde a educação para os aprendizes e/ou para os
adolescentes trabalhadores, recaísse numa atitude efetiva e responsável, tanto de autoridades
como de educadores, seja no âmbito escolar, nas empresas públicas ou privadas e na
sociedade como um todo. Importa frisar que em qualquer circunstância o adolescente, assim
como a criança, tem prioridade absoluta e sua educação deve ser assegurada de forma
integral, mesmo estando privado de sua liberdade.
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APÊNDICES
APÊNDICE A
Roteiro de Dados Documentais
Roteiro para SUASE referente. às unidades socioeducativa de internação de BH
Nome da Unidade: ________________________________________________________________
Período: _________________________________________________________________________
Endereço: _______________________________________________________________________
Diretor(a): _______________________________________________________________________
1) Perfil Institucional
a. Número total de adolescentes
b. Tipo de atos infracionais mais frequentes
c. Quadro funcional por categoria
d. Atendimento Geral Técnico
2) Perfil do Adolescente
a. Idade
b. Etnia
c. Escolarização
d. Profissionalização
e. Saúde
f.
Esporte, Lazer e Cultura
g. Tipos de Atos infracionais
h. Tipos de substâncias entorpecentes utilizadas
3) Perfil Familiar
a. Domicílio
b. Média socioeconômica
c. Tipo de Convivência
APÊNDICE B
Roteiro de entrevista semi-estruturada com Diretor(as)
Roteiro de entrevista semi-estruturada com o Diretor (a) da unidade socioeducativa de internação
em Belo Horizonte.
Nome da Unidade: ______________________________________________ Data: ____/____/____
Diretor(a) Geral: __________________________________________________________________
Formação Acadêmica: _____________________________________________________________
4) De acordo com o ECA em seu artigo 69, o adolescente tem direito à profissionalização e a
proteção ao trabalho, como gestor(a) dessa unidade como percebe esse temática?
__________________________________________________________________________________
________________________________________
________________________________________________________________________________
5) Do quadro técnico da unidade socioeducativa quem é o responsável por ações relativas à
profissionalização dos adolescentes?
__________________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________________
______________________________________________________________________
6) Como é sistematizado nesta unidade ações que propiciem a autonomia dos adolescentes?
________________________________________________________________________________
________________________________________________________________________________
7) Existem algum programa de acompanhamento ao adolescente e seu grupo familiar, que está em
processo de desligamento da unidade socioeducativa?
________________________________________________________________________________
________________________________________________________________________________
8) O SINASE no Eixo Profissionalização / Trabalho / Previdência – na página 64, preconiza o
cumprimento do artigo 69 do ECA, citado acima, quais são os principais desafios e perspectivas no
sentido de inserção do adolescente em cursos de qualificação profissional e encaminhamento ao
mercado de trabalho, seja ele formal ou informal. Existe alguma política pública específica ou outras
iniciativas neste sentido? Quais?
__________________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________________
_______________________________________
APÊNDICE C
Roteiro de debate do Grupo Focal
Roteiro de debate de grupo focal40 a ser realizado com equipe da unid. soc. de internação em BH
Unidade: _____________________________________________________ Data: ____/____/____
DADOS PESSOAIS
Nº de Participantes: __________________________________ Funções: _____________________
__________________________________________________________________________________
______________________________________________________________________________
Questão-chave 1) O que é o “mundo do trabalho”?
Na visão dos profissionais da unidade? ( )
Comentários sobre a percepção dos adolescentes em relação ao tema? ( )
Relação com a formação básica para o trabalho/aprendizagem? ( )
Relação com a Educação Formal ( )
Questão-Chave 2) Existem ações voltadas para a preparação do adolescente em cumprimento de
medida de internação para o mundo do trabalho?
Quais são os tipos de ações? ( )
Quais os critérios para seleção do adolescente? ( )
Caracterização das ações internas? ( )
Caracterização das ações externas? ( )
Existem instituições parceiras? Quais? Tipo: Públicas ou Privadas? ( )
Questão-Chave 3) Para a equipe quais são os desafios e as perspectivas quando um adolescente
tem possibilidade de inserção no mundo do trabalho?
Em relação a escolaridade do adolescente? ( )
Em relação as competências socioprofissionais do adolescente? ( )
Em relação ao protagonismo /autonomia do adolescente? ( )
Em relação a família do adolescente? ( )
Em relação a (re)inserção social do adolescente? ( )
______________
40
1 O grupo focal poderá ser realizado com no mínimo 06 e no máximo 12 pessoas com diferentes funções
(técnicos, agentes socioeducativos, serviços gerais, enfermeiros, professores, etc.) e terá a duração mínima de
uma hora e trinta minutos e máxima de duas horas. A pesquisadora fará o papel de mediadora e precisará levar
um relator e um observador e a discussão deverá ser gravada com a prévia anuência da equipe participante, para
um melhor aproveitamento da técnica investigativa.
APÊNDICE D
Roteiro de entrevista semi-estruturada com adolescentes
Roteiro de entrevista semi-estruturada com adolescentes de 16 a 18 anos em cumprimento de
medida socioeducativa de internação em Belo Horizonte
DADOS PESSOAIS:
Unidade: ______________________________________________________ Data: ____/____/____
Adolescente: ________________________ Idade: _______ Etnia:_______ Escolaridade: ________
Referência Familiar: __________________ Média Sócio-Econômica: _______________________
Ato(s) Infracional(is):______________________________________1ª Medida: (
) sim (
) não
Tempo de cumprimento da atual medida: ______________________
ENTREVISTA COM ADOLESCENTE
9) Você já realizou alguma atividade / trabalho?
10) O que é trabalho para você?
__________________________________________________________________________________
______________________________________________________________________________
11) Com quem residia e qual atividade ou trabalho que a pessoa realizava?
________________________________________________________________________________
12) Como e porque você começou a cometer atos infracionais?
________________________________________________________________________________
13) Quais são as atividades internas que você participa?
( ) Escola
( ) Oficina ______________________ ( ) Oficina: __________________________
Outras: _________________________________________________________________________
________________________________________________________________________________
14) Você participa ou participou de alguma atividade (escola, curso profissionalizante ou trabalho)
externo à unidade? Qual(is)? Por quanto tempo? Como foi a experiência?
__________________________________________________________________________________
15) Qual outra atividade e/ou curso profissionalizante que gostaria de realizar ou aprender?
________________________________________________________________________________
16) Quais suas expectativas e/ou projetos após seu desligamento da unidade socioeducativa?
__________________________________________________________________________________
APÊNDICE E
Fotografias dos Centros Socioeducativos pesquisados
FIGURA 03 – Vista frontal do CRSSJ
Fonte: Acervo Pessoal. Fev/Mar-2009
FIGURA 04 – Vista Interna do CSESC
Fonte: Acervo Pessoal. Fev/Mar-2009
125
FIGURA 05 – Vista frontal do CSESH
Fonte: Acervo Pessoal. Fev/Mar-2009
FIGURA 06 – Vista interna do CSEST
Fonte: Acervo Pessoal. Fev/Mar-2009
126
FIGURA 07 – Vista frontal do CEAD
Fonte: Acervo Pessoal. Fev/Mar-2009
FIGURA 08 – Grupo Focal realizado no CSESH
Fonte: Acervo Pessoal. Fev/Mar-2009
127
FIGURA 09 – Biblioteca do CSESC
Fonte: Acervo Pessoal. Fev/Mar-2009
FIGURA 10 – Sala de Atendimento decorada
pelas Adolescentes do CRSSJ
Fonte: Acervo Pessoal. Fev/Mar-2009
128
FIGURA 11 – Enfermaria do CSESH
Fonte: Acervo Pessoal. Fev/Mar-2009
FIGURA 12 – Sala de Aula do CSESC
Fonte: Acervo Pessoal. Fev/Mar-2009
129
FIGURA 13 – Esporte no CEAD
Fonte: Acervo Particular do CEAD. Foto de 2006.
FIGURA 14 – Aula de Informática no CEAD
Fonte: Acervo Particular do CEAD. Foto de 2006.
130
FIGURA 15 – Oficina de Informática do SENAC no CSESC
Fonte: Acervo Pessoal. Fev/Mar-2009
FIGURA 16 – Sala de Oficina Profissionalizante no CSESC
Fonte: Acervo Pessoal. Fev/Mar-2009
131
FIGURA 17 – Atividade Artística de adolescente no CRSSJ
Fonte: Acervo Pessoal. Fev/Mar-2009
FIGURA 18 – Produto Artesanal do CSEST
Fonte: Acervo Pessoal. Fev/Mar-2009
132
FIGURA 19 – Produto Artesanal do CSESH
Fonte: Acervo Pessoal. Fev/Mar-2009
FIGURA 20 – Produtos Artesanais do CSESC
Fonte: Acervo Pessoal. Fev/Mar-2009
133
FIGURA 21 – Stand do CEAD no 2º
Simpósio Mineiro de Assistentes Sociais
Maio/2009 no Minascentro
Belo Horizonte/MG.
Fonte: Acervo Pessoal. Maio-2009
FIGURA 22 – Apresentação Musical do Grupo Tamborlescentes do CEAD no
2º Simpósio Mineiro de Assistentes Sociais- Maio /2009 no Minascentro- BH/MG
Fonte: Acervo Pessoal. Maio-2009
ANEXOS
ANEXO A
Letra da música Pivete utilizada nos Grupos Focais
PIVETE
Chico Buarque
Composição: Francis Hime e Chico
Buarque
No sinal fechado / Ele vende chiclete
Capricha na flanela / E se chama Pelé
Pinta na janela / Batalha algum trocado
Aponta um canivete / E até...
Dobra a Carioca, olerê
Desce a Frei Caneca, olará
Se manda pra Tijuca / Sobe o Borel
Meio se maloca / Agita numa boca
Descola uma mutuca / E um papel
Sonha aquela mina, olerê
Prancha, parafina, olará
Dorme gente fina / Acorda pinel
Zanza na sarjeta / Fatura uma besteira
E tem as pernas tortas / E se chama Mané
Arromba uma porta / Faz ligação direta
Engata uma primeira / E até...
Dobra a Carioca, olerê
Desce a Frei Caneca, olará
Se manda pra Tijuca / Na contramão
Dança pára-lama / Já era pára-choque
Agora ele se chama / Emersão
Sobe no passeio, olerê
Pega no Recreio, olará
Não se liga em freio / Nem direção
No sinal fechado / Ele transa chiclete
E se chama pivete / E pinta na janela
Capricha na flanela / Descola uma bereta
Batalha na sarjeta /E tem as pernas tortas
ANEXO B
Lei 10.097 de 19 de dezembro de 2000
LEI Nº 10.097, DE 19 DE DEZEMBRO DE 2000.
Altera dispositivos da Consolidação das Leis do Trabalho - CLT, aprovada pelo Decreto-lei nº 5.452,
de 1º de maio de 1943.
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA
Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:
"Art 1º.Os arts. 402, 403, 428, 429, 430, 431, 432 e 433 da Consolidação das Leis do Trabalho CLT, aprovada pelo Decreto-lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943, passam a vigorar com a seguinte
redação:
"Art. 402. Considera-se menor para os efeitos desta Consolidação o trabalhador de quatorze até
dezoito anos. "(NR)
"Art. 403. É proibido qualquer trabalho a menores de dezesseis anos de idade, salvo na condição de
aprendiz, a partir dos quatorze anos. "(NR).
"Parágrafo único. O trabalho do menor não poderá ser realizado em locais prejudiciais a sua formação,
ao seu desenvolvimento físico, psíquico, moral e social e em horários e locais que não permitam a
freqüência à escola. "(NR)
"a) revogada; "
"b) revogada; "
"Art. 428. Contrato de aprendizagem é o contrato de trabalho especial, ajustado por escrito e por prazo
determinado, em que o empregador se compromete a assegurar ao maior de quatorze e menor de
dezoito anos, inscrito em programa de aprendizagem, formação técnico-profissional metódica,
compatível com o seu desenvolvimento físico, moral e psicológico, e o aprendiz, a executar, com zelo
e diligência, as tarefas necessárias a essa formação. "(NR)
"§ 1º. A validade do contrato de aprendizagem pressupõe anotação na Carteira de Trabalho e
Previdência Social, matrícula e freqüência do aprendiz à escola, caso não haja concluído o ensino
fundamental, e inscrição em programa de aprendizagem desenvolvido sob a orientação de entidade
qualificada em formação técnico-profissional metódica. "(AC)*
"§ 2º. Ao menor aprendiz, salvo condição mais favorável, será garantido o salário mínimo hora. "(AC)
"§ 3º. O contrato de aprendizagem não poderá ser estipulado por mais de dois anos. "(AC)
"§ 4º. A formação técnico-profissional a que se refere o caput deste artigo caracteriza-se por suas
atividades teóricas e práticas, metodicamente organizadas em tarefas de complexidade progressiva
desenvolvidas no ambiente de trabalho. "(AC)
"Art. 429. Os estabelecimentos de qualquer natureza são obrigados a empregar e matricular nos
cursos dos Serviços Nacionais de Aprendizagem número de aprendizes equivalente a cinco por cento,
no mínimo, e quinze por cento, no máximo, dos trabalhadores existentes em cada estabelecimento,
cujas funções demandem formação profissional. "(NR)
"a) revogada; "
"b) revogada; "
"§ 1º. A O limite fixado neste artigo não se aplica quando o empregador for entidade sem fins
lucrativos, que tenha por objetivo a educação profissional. "(AC)
"IV - a pedido do aprendiz. "(AC)
"Parágrafo único. Revogado. "
"§ 2º. Não se aplica o disposto nos arts. 479 e 480 desta Consolidação às hipóteses de extinção do
contrato mencionadas neste artigo. "(AC)
"§ 1º. As frações de unidade, no cálculo da percentagem de que trata o caput, darão lugar à admissão
de um aprendiz. "(NR)
"Art. 430. Na hipótese de os Serviços Nacionais de Aprendizagem não oferecerem cursos ou vagas
suficientes para atender à demanda dos estabelecimentos, esta poderá ser suprida por outras entidades
qualificadas em formação técnico - profissional metódica, a saber. "(NR)
"I - Escolas Técnicas de Educação; "(AC)
"II - entidades sem fins lucrativos, que tenham por objetivo a assistência ao adolescente e à educação
profissional, registradas no Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente. "(AC)
136
"§ 1º. As entidades mencionadas neste artigo deverão contar com estrutura adequada ao
desenvolvimento dos programas de aprendizagem, de forma a manter a qualidade do processo de
ensino, bem como acompanhar e avaliar os resultados. "(AC)
"§ 2º. Aos aprendizes que concluírem os cursos de aprendizagem, com aproveitamento, será concedido
certificado de qualificação profissional. "(AC)
"§ 3º. O Ministério do Trabalho e Emprego fixará normas para avaliação da competência das entidades
mencionadas no inciso II deste artigo. "(AC)
"Art. 431. A contratação do aprendiz poderá ser efetivada pela empresa onde se realizará a
aprendizagem ou pelas entidades mencionadas no inciso II do art. 430, caso em que não gera vínculo
de emprego com a empresa tomadora dos serviços. "(NR)
"a) revogada; "
"b) revogada; "
"c) revogada; "
"Parágrafo único. "(VETADO)
"Art. 432. A duração do trabalho do aprendiz não excederá de seis horas diárias, sendo vedadas a
prorrogação e a compensação de jornada. "(NR)
"§ 1º. O limite previsto neste artigo poderá ser de até oito horas diárias para os aprendizes que já
tiverem completado o ensino fundamental, se nelas forem computadas as horas destinadas à
aprendizagem teórica. "(NR)
"§ 2º. Revogado. "
"Art. 433. O contrato de aprendizagem extinguir-se á no seu termo ou quando o aprendiz completar
dezoito anos, ou ainda antecipadamente nas seguintes hipóteses: "(NR)
"a) revogada; "
"b) revogada; "
"I - desempenho insuficiente ou inadaptação do aprendiz; "(AC)
"II - falta disciplinar grave; "(AC)
"III - ausência injustificada à escola que implique perda do ano letivo, ou"(AC)
Art 2º. O art. 15 da Lei nº 8.036, de 11 de maio de 1990, passa a vigorar acrescido do seguinte § 7º:
"§ 7º. Os contratos de aprendizagem terão a alíquota a que se refere o caput deste artigo reduzida para
dois por cento. "(AC)
Art 3º. São revogadas o art. 80, o § 1º do art. 405, os arts. 436 e 437 da Consolidação das Leis do
Trabalho - CLT, aprovada pelo Decreto-lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943.
Art 4°. Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.
Brasília, 19 de dezembro de 2000; 179º da Independência e 112º da República.
FERNANDO HENRIQUE CARDOSO
Francisco Dornelles. Fonte: Justiça do Trabalho
ANEXO C
Termo de consentimento livre e esclarecido
Comitê de Ética em Pesquisa da FUNEDI-UEMG
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
Eu,______________________________________________________________________,
compreendo o objetivo e procedimentos da pesquisa A INCLUSÃO PRODUTIVA DO
ADOLESCENTE EM CONFLITO COM A LEI: Desafios e Perspectivas nas Unidades
Socioeducativas de Internação de Belo Horizonte, realizada pela pesquisadora Jaqueline do Lago H.
Antunes, vinculada à Universidade Estadual de Minas Gerais - Campus Divinópolis –
UEMG/FUNEDI, tendo como garantias: 1. o acesso, a qualquer tempo, a informações sobre
procedimentos, riscos e benefícios relacionados à pesquisa, inclusive para prestar os esclarecimentos
que se fizerem necessários; 2. a salvaguarda da confidencialidade, sigilo e privacidade; 3. o direito de
retirar-me da pesquisa no momento em que desejar.
Nesse sentido, o (a) pesquisador (a) acima mencionado me assegura a confidencialidade, a privacidade
e o sigilo das informações individuais obtidas. Os resultados desse estudo poderão ser publicados em
artigos e/ou livros científicos apresentados em congressos profissionais, mas informações pessoais
serão mantidas em sigilo.
Quaisquer informações sobre a pesquisa podem ser obtidas através da UEMG/FUNEDI pelo telefone
(37) 3229-3511 ou pelo site: funedi.edu.gov.br - email: [email protected].
Belo Horizonte, ____ de ____________________ de 2009.
Assinatura do entrevistado:________________________________________________
Assinatura do representante legal (quando necessário):_________________________
Assinatura do (a) pesquisador (a): __________________________________________
FUNDAÇÃO EDUCACIONAL DE DIVINÓPOLIS – FUNEDI/UEMG
Av. Paraná, 3.001 – Jardim Belvedere II – Divinópolis/MG – CEP: 35.501-170.
Telefone (37) 3229-3500 – Email: funedi.edu.gov.br
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