Pressupostos vygotskyanos do interacionismo sociodiscursivo Assumptions vygotskyan of the sociodiscursivo interactionism Marcia Cristina Corrêa Adriana Silveira Bonumá RESUMO O presente trabalho propõe um resgate do escopo teórico vygotskyano, que constitui o quadro do interacionismo sociodiscursivo (ISD), através de pesquisa bibliográfica. A psicologia da linguagem, em consonância com os pressupostos norteadores do interacionismo social, apresenta-se como ponto de partida do ISD. Os fundamentos para o fato de que as condutas humanas, que são concebidas como ações significantes, integrem o quadro interacionista-social encontram-se principalmente em Vygotsky. Para demonstrarmos a relevância do trabalho de Vygotsky para o ISD, privilegiaremos as noções de linguagem, desenvolvimento e mediação e internalização das funções superiores. PALAVRAS-CHAVE Conceitos; Vygotsky; interacionismo sociodiscursivo. ABSTRACT This paper proposes a bailout of the Vygotskyan theoretical scope, which is the framework of interactionism sociodiscursivo (ISD), through bibliographic research.The psychology of language, in line with the guiding assumptions of social interactionism, is presented as a starting point of the ISD. The grounds for the fact that human behaviors, which are conceived as significant actions, to integrate the social-interactionist framework are mainly in Vygotsky. To demonstrate the relevance of Vygotsky’s work for the ISD, focusing on notions of language, development and mediation, and internalization of higher functions. KEY WORDS Concepts; Vygotsky; interactionism sociodiscursivo. Pressupostos vygotskyanos do interacionismo sociodiscursivo INTRODUÇÃO O presente trabalho pretende apresentar e discutir os conceitos fundamentais formulados por Vygotsky, e posteriormente desenvolvidos, complementados e/ou reformulados por seus seguidores, e que se constituem como base do sócio-interacionismo, consequentemente, do interacionismo sociodiscursivo na perspectiva de Bronckart. A psicologia da linguagem, em consonância com os pressupostos norteadores do interacionismo social, se apresenta como ponto de partida do interacionismo sociodiscursivo. Bronckart (1999) afirma que “é sobretudo a obra de Vygotsky que constitui o fundamento mais radical do interacionismo em psicologia e é então a ela que se articula mais claramente nossa própria abordagem” (p. 24). O quadro interacionista-social, cujos fundamentos encontram suporte, dentre outros estudiosos, em Vygotsky, é integrado pela noção de que as condutas humanas, concebidas como ações significantes, são produtos de socialização. Tais ações se manifestam nos contextos de atividade em funcionamento nas formações sociais, e é nessas ações que os agentes humanos têm sua consciência e capacidades mentais constituídas. Vygotsky considera que o homem é um organismo vivo que, além de ser dotado de propriedades biológicas, é, principalmente, constituído socialmente. Suas ideias, projetos e sentimentos são traduzidos por capacidades psíquicas, já que também é um ser consciente, cujo desenvolvimento é indissociável das dimensões históricas, sociais e culturais. Há, para Bronckart (1999), duas premissas a se considerar para tratar dessa proposição vygotskyana. A primeira diz respeito ao fato de o homem ser dotado de capacidades comportamentais particulares no processo de evolução, o que lhe permitiu a criação de instrumentos mediadores para se relacionar com o meio, organizar uma cooperação no trabalho e desenvolver formas verbais de comunicação com seus pares. A segunda refere-se à noção de que se deve admitir que a reapropriação dessas atividades instrumentais e discursivas de um 58 Nonada • 17 • 2011 Marcia Cristina Corrêa e Adriana Silveira Bonumá meio sócio-histórico é o requisito de emergência de capacidades auto-reflexivas ou conscientes que conduzem à reestruturação do conjunto do funcionamento psicológico. Para alcançar a relevância da contribuição de Vygotsky nos estudos interacionistas, desenvolveremos as noções de linguagem; desenvolvimento e mediação; e internalização das funções superiores. A LINGUAGEM E SUA IMPORTÂNCIA NO DESENVOLVIMENTO HUMANO Para Vygotsky (2007), o homem é entendido como ser histórico e social, constituído na e pela linguagem, através de suas interações sociais. Decorre disso, que o processo de apropriação pelo homem da experiência histórico cultural propicia o desenvolvimento das estruturas humanas. O homem é concebido como participante de um processo histórico, em que as relações produzidas em uma determinada cultura transformam-no e o fazem transformar-se. Por isso, o autor entende que o indivíduo não traz manifestas, desde o nascimento, as características especificamente humanas, e, da mesma forma, tais características não se apresentam como meros resultados das pressões do meio externo, mas são resultados da interação dialética do homem com seu meio sócio-cultural. Ao tratar do instrumento e do símbolo no desenvolvimento da criança, Vygotsky (2007) focaliza-se na descrição de aspectos comportamentais do desenvolvimento, que são essencialmente humanos. Para tanto, o autor utiliza-se de pesquisas de diversos estudiosos, como Buhler, Kohler e Shapiro e Gerke, que, por meio do método comparativo, suas análises partem de experimentos que contrapõem o homem e o animal, mais precisamente os chimpanzés. Esses estudiosos buscaram respostas acerca do desenvolvimento da criança, desde o seu comportamento, passando por processos psicológicos elementares, até os processos intelectuais superiores. A tentativa Nonada • 17 • 2011 59 Pressupostos vygotskyanos do interacionismo sociodiscursivo de compreensão dessas características humanas, contudo, parte da análise da inteligência prática da criança, que se manifesta por meio de instrumentos, e que se assemelha muito ao comportamento animal. O que fica claro é que, nessa fase, o desenvolvimento de habilidades técnicas independe da fala. Nesse sentido, é interessante a consideração de Buhler (apud Vygotsky, 2007, p. 6) de que “os primeiros esboços de fala inteligente são precedidos pelo raciocínio técnico e este constitui a fase inicial do desenvolvimento cognitivo”. Já Shapiro e Gerke, citados por Vygotsky (2007), introduziram a noção de experiência social no desenvolvimento humano, estabelecendo essa relação por meio do processo de imitação da forma de agir e usar instrumentos do adulto pela criança. Isso caracteriza uma concepção mecanicista de repetição, uma vez que à experiência social caberia a função de atribuição de esquemas motores. Ao mesmo tempo, propõem os pesquisadores um papel especial à fala, que, contudo, não inclui sua contribuição no desenvolvimento organizacional da atividade prática. Essa concepção diverge do pensamento vygotskyano de que a fala tem relevante importância no desenvolvimento das funções psicológicas superiores. O referido estudo ressaltou ainda que a essência do comportamento humano complexo, traduzido pelo desenvolvimento intelectual, em especial em adultos, advém da união da inteligência prática e do uso dos signos. Embora se defenda que, na infância, esses sistemas funcionem separados. Essa atividade simbólica teria, então, função organizadora, capaz de construir novas formas de comportamento humano. É assim que a linguagem, em suas funções cognitivas e comunicativas, assume papel preponderante no desenvolvimento humano. Por meio dela, a criança desenvolve a habilidade de selecionar instrumentos que possibilitam a resolução de tarefas complexas, controla os impulsos, faz preceder o planejamento de ações à execução e domina seu comportamento. Ademais, são os signos e as palavras os primeiros meios de contato social da criança com outras pessoas. 60 Nonada • 17 • 2011 Marcia Cristina Corrêa e Adriana Silveira Bonumá Vygotsky (2008) defende a tese de que as funções psíquicas dos indivíduos têm origem cultural, ou seja, surgem das relações do indivíduo com seu contexto cultural e social, logo, do desenvolvimento histórico e das formas sociais da vida humana. Entretanto, o funcionamento psicológico possui também uma base biológica, à qual é atribuída a mais importante função da atividade mental, que é o cérebro. Toda atividade de interação do homem com os outros e com o mundo que o cerca se constitui através da mediação. Tal mediação se dá com o uso de instrumentos técnicos ou de sistemas de signos, em especial a linguagem, que carrega os conceitos criados pela cultura humana. Vygotsky (2007) refere essa questão ao tratar do domínio sobre a memória e o pensamento. Nesse sentido, propõe a normatização da estrutura e do desenvolvimento de operações com signos na criança, além de mostrar a origem social dos signos e sua função no desenvolvimento da criança. O autor apresenta dois tipos de memória no ser humano: a memória natural e a mediada. A primeira diz respeito à retenção de experiências reais, configurando-se como consequência da influência dos estímulos externos nos seres humanos. A segunda está relacionada às operações com signos, resultante do desenvolvimento social, incorporando ao sistema nervoso humano esses estímulos artificiais, os signos. As operações realizadas com signos têm uma estrutura que se diferencia de operações simples, que se realizam por uma relação direta entre estímulo e resposta. A inserção de um signo nesse processo implica um elo intermediário, que se qualifica como um estímulo de segunda ordem, manifestado pelo próprio signo, fazendo surgir um ato complexo. A existência do signo acarreta, então, duas situações importantes, a saber, o engajamento do indivíduo para estabelecer esse elo; e o fato de o signo possuir a qualidade de ação reversa, uma vez que age sobre o indivíduo, e não sobre o ambiente. Importante salientar que o estímulo auxiliar, por possuir a função de ação reversa, permite ao indivíduo, por meio de estímulos exter- Nonada • 17 • 2011 61 Pressupostos vygotskyanos do interacionismo sociodiscursivo nos, controlar seu próprio comportamento, criando novas formas de processos psicológicos advindos da cultura, descolando-se assim do desenvolvimento biológico. Vygotsky (2007) descreve o experimento feito por Leontiev em um estudo sobre o papel dos signos na atenção voluntária e na memória de indivíduos de diferentes idades. Os resultados obtidos mostraram que, no primeiro estágio (idade pré-escolar), a criança não tem habilidade de controlar seu comportamento na organização de estímulos especiais, para evidenciar sua função instrumental. No segundo estágio, a criança já é capaz de utilizar os estímulos externos auxiliares na solução de problemas. No terceiro estágio (adulto), o desempenho na solução de problemas se dá em bases novas e superiores, mas ainda mediado, porém, agora, por meio da internalização. No processo de internalização, os signos externos transformam-se em internos, como um instrumento de memorização. O processo de operações com signos é longo e complexo, resultado de uma evolução psicológica, bem como de inúmeras transformações qualitativas. Uma transformação cria condições para o estágio subsequente, da mesma forma que sofre influência do precedente, de modo que o desenvolvimento se dê em um formato de espiral, o que caracteriza sua natureza histórica. No processo geral de desenvolvimento, distinguem-se duas linhas, os processos elementares, de origem biológica; e as funções psicológicas superiores, de origem sociocultural, fundadas no uso de instrumentos e na fala humana, ainda durante a infância. É dessas linhas que surge a história do comportamento da criança, e a esse processo costuma-se chamar história natural do signo. Relevante ainda considerar que o desenvolvimento de funções psicológicas mediadas, como é o caso da memória mediada, tem um caráter especial, uma vez que difere de processos elementares nos diferentes estágios de desenvolvimento. Em função disso, na criança, o ato de pensar corresponde a lembrar, 62 Nonada • 17 • 2011 Marcia Cristina Corrêa e Adriana Silveira Bonumá isto é, o pensar depende da memória, e não de construções lógicas de raciocínio que levam à abstração. Dessa forma, é possível entender que, nos primeiros estágios do desenvolvimento cognitivo, a memória, para além do pensamento abstrato, é o que guarda maior importância, fato que se modifica quando os indivíduos são adolescentes e adultos, que já têm a capacidade de organizar conceitos abstratos. É assim que, para Vygotsky (2007), a relação do homem com o mundo não é uma relação direta, mas mediada por instrumentos e signos, que, em última análise, são ferramentas criadas por uma capacidade exclusivamente dada ao homem, cuja função é a de servir como auxiliares da atividade humana. Na perspectiva sócio-histórica, tendo em vista que, é através dos instrumentos e signos que os processos de funcionamento psicológico são fornecidos pela cultura, a mediação passa a ter caráter fundamental. A FUNDAMENTAL NOÇÃO DE INTERNALIZAÇÃO Outra noção de extrema relevância em Vygotsky (2007) é a internalização das funções psicológicas superiores, por meio da qual se busca compreender o papel dos signos. Através deles, a linguagem se constitui enquanto meio de interação social. Para tanto, é necessário estabelecer as relações existentes entre o uso de signos e o uso de instrumentos, tratando-os inicialmente como meios análogos, porém, distintos, uma vez que o signo é um meio auxiliar de uma atividade psicológica, e o instrumento tem sua função mediadora no trabalho. Bronckart (1999) refere que a criança, ao entrar na prática dos signos, apropria-se de seu valor comunicativo de ação sobre os outros, bem como de seu valor representativo para designar um objeto, de modo que, ao interiorizar os signos, ela mantém esse mesmo valor comunicativo. Contudo, devido a essa interiorização, a dimensão accional deixa de se dirigir aos comportamentos e representações dos outros, para dirigir-se aos comportamentos e representações da própria criança. Nonada • 17 • 2011 63 Pressupostos vygotskyanos do interacionismo sociodiscursivo Sabendo que, por meio da linguagem, ela age sobre os outros, a criança acaba por compreender que, também por meio da linguagem, pode agir sobre si mesma, sobre seus comportamentos, depois sobre suas representações e, então, começa a “pensar”. É essa tese central que Vygotsky se esforçou em validar com pesquisas experimentais apresentadas em Pensée et Langage. Esses trabalhos mostraram que a linguagem da criança, no início exclusivamente meio de comunicação com o social, a seguir, conservando plenamente suas características externas de oralização, torna-se um instrumento de controle dos próprios comportamentos (linguagem egocêntrica); depois que perde suas propriedades externas, torna-se uma linguagem interior, um discurso em relação a si mesmo, um instrumento de ação sobre suas próprias representações ou, ainda, um pensamento. (BRONCKART, 1999, p.55) Para alcançar esse propósito, Vygotsky (2007) investigou a ligação entre o uso dos signos e dos instrumentos no desenvolvimento cultural da criança. Para isso, apresentou três condições iniciais, a saber, semelhanças entre as duas atividades; as diferenças entre elas; e a existência de uma ligação psicológica entre ambas. No tocante às semelhanças, sabe-se que ambas possuem funções mediadoras, estando, portanto, incluídas no conceito de atividade indireta. Importa salientar, no entanto, que a atividade mediada não se esgota no uso de signos e instrumentos. Já suas diferenças manifestam-se na divergência das linhas de atividade mediada com que cada um, signo e instrumento, orienta o comportamento humano. O instrumento é orientado externamente, ocasionando mudanças nos objetos; já os signos, internamente, modificando o próprio indivíduo. E, finalmente, existe a ligação psicológica entre signos e instrumentos, uma vez que não se dissociam o controle da natureza e o controle do comportamento. Nesse sentido, a transição para a atividade mediada altera todas as operações psicológicas, da mesma forma que o uso de instrumentos amplia as possibilidades de atividades em que novas funções psicológicas podem operar. Vygotsky (2007) entende, aqui, 64 Nonada • 17 • 2011 Marcia Cristina Corrêa e Adriana Silveira Bonumá que função psicológica superior diz respeito à combinação entre signo e instrumento na atividade psicológica. Foram descritas, pelo autor, as fases das operações com signos. Na fase inicial, os signos externos determinam o esforço da criança. Nos últimos estágios do comportamento da criança, os signos externos assemelham-se ainda aos primeiros estágios de memorização. E, nos níveis mais superiores, não há mais dependência em relação aos signos externos, mas uma reconstrução interna de uma operação externa, conhecida como processo de internalização. Esse processo de internalização se reflete em uma gama de transformações no indivíduo. Inicialmente, ocorre uma operação em que uma atividade externa é reconstruída e passa a ocorrer internamente. Em seguida, um processo interpessoal (nível social) é transformado em intrapessoal (nível individual). Em síntese, a transformação de um processo interpessoal em intrapessoal é resultado dos eventos ocorridos ao longo do desenvolvimento, isto é, os processos só se tornam internos como consequência de um desenvolvimento prolongado. Ressalta-se, enfim, que a internalização dos processos culturais de comportamento também envolve esta estrutura de reconstrução da atividade psicológica a partir das operações com signos, e é tal internalização que constitui a característica básica da psicologia humana. CONSIDERAÇÕES FINAIS Para Vygotsky, só é possível entender o homem como ser histórico e social por meio da linguagem, e este entendimento deve ser alcançado a partir das perspectivas individual e histórica. A concepção sócio-histórica entende a linguagem, como afirma Corrêa (2002), como o lugar de interação e de interlocução, capaz de constituir os polos da alteridade e da subjetividade, e concomitantemente ser modificada pelo sujeito que atua sobre ela. A autora ainda afirma: Nonada • 17 • 2011 65 Pressupostos vygotskyanos do interacionismo sociodiscursivo Essa concepção permite não só visualizar uma relação dinâmica e constitutiva entre o sujeito e a linguagem, como também voltar a atenção para os sujeitos e suas histórias individuais de relação com a linguagem. Assim, dentro dessa concepção, os papéis de sujeito e de outro na linguagem adquirem relevância e, com isso, passam a interessar os indivíduos que ocupam esses papéis discursivos, em situações reais de interlocução, historicamente situadas. (Corrêa, 2002, p. 25) Foi a partir dessa perspectiva interacionista de linguagem, que se buscou elementos, em Vygotsky, capazes de fundamentar a teoria do interacionismo sociodiscursivo. Para tanto, levou-se em consideração premissas relevantes trazidas por Vygotsky: i) a relação entre indivíduo e sociedade; ii) a importância do elemento cultura nas funções psíquicas; iii) o fato de ser o cérebro a base biológica do funcionamento psicológico; iv) o fato de toda atividade humana ser mediada; e v) a diferença entre os processos psicológicos complexos e os mecanismos mais elementares. Para o Interacionismo Sociodiscursivo, as verdadeiras bases da psicologia encontram-se no fecundo campo de trabalho produzido por Vygotsky. No entanto, Bronckart (1999) refere que, a despeito de ele próprio utilizar-se da psicologia vygotskyana, não ignora que essa teoria apresenta algumas dificuldades teóricas e metodológicas, e as expõe enfatizando três delas. A primeira diz respeito à unidade de análise da psicologia, buscada por Vygotsky, na tentativa de um conceito unificador das dimensões biológica, comportamental, mental e verbal. Tal conceito somente foi alcançado por seus seguidores, que tratam a ação e/ou atividade como unidades integradoras. Leontiev, em especial, dentro dessa abordagem, desconsidera as dimensões sociais e verbais da atividade. A segunda dificuldade relaciona-se ao tipo incongruente de delimitação e articulação que sofrem o social e o psicológico. Para a psicologia interacionista, há a necessidade de um empréstimo de uma conceitualização pertinente aos fatos sociais, restrita às dimensões organizacionais e representacionais. Já para o interacionismo, que postula que esses fatos sociais são determinantes para os fatos psicológicos, faz-se necessário identificar 66 Nonada • 17 • 2011 Marcia Cristina Corrêa e Adriana Silveira Bonumá e definir, separadamente, unidades sociológicas e unidades psicológicas, a fim de conceitualizar suas interações. Isso se torna relevante para que se possa sustentar a tese de que a “atividade nas formações sociais (unidade sociológica) constitui o princípio explicativo das ações imputadas a uma pessoa (unidades psicológicas)”. (Bronckart, 1999, p. 30) A terceira, enfim, diz respeito à natureza da linguagem em suas relações com a atividade social e as ações, do que decorre a questão sobre qual unidade verbal deve-se considerar. Nesse sentido, para uma teoria interacionista, a dimensão discursiva é a que deve prevalecer, haja vista que nela estão imbricadas as ações humanas, com os aspectos sociais e discursivos que as constituem. A despeito dessas dificuldades, entende-se que Vygotsky lançou na psicologia objetivos específicos audaciosos, que evidenciaram um olhar para a frente. É a partir de seus pressupostos que o interacionismo sociodiscursivo funda um de seus pilares, para considerar as ações humanas em suas dimensões sociais e discursivas. REFERÊNCIAS BRONCKART, Jean-Paul. 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