O CONTROLE DAS INFECÇÕES URINÁRIAS EM PESSOAS COM LESÃO MEDULAR PRIGOL, Ana Paula1; MIGOTT, Ana Maria B.²; AMARAL, Renata Busin³ Educação em Saúde; Traumatismo da Medula Espinal; Cateterismo Uretral Intermitente; Atividades Cotidianas. Introdução O traumatismo de medula espinal (TME) é cada vez mais frequente devido, principalmente, ao aumento da violência urbana. O trauma pode resultar em alterações das funções motora, sensitiva e autônoma, implicando perda parcial ou total dos movimentos voluntários ou da sensibilidade (tátil, dolorosa e profunda) em membros superiores e/ou inferiores e alterações no funcionamento dos sistemas respiratório, circulatório, intestinal, urinário, sexual e reprodutivo. Além disso, o grau e a extensão do dano à medula espinhal determinam a extensão e severidade dos déficits sensoriais e motores (ASSIS e FARO, 2011). A bexiga neurogênica é uma das disfunções funcionais mais comuns após o trauma medular. Normalmente leva a alterações na sensibilidade vesical e na perda do controle esfincteriano. Esta dissinergia vesical pode trazer vários problemas sociais e clínicos para o paciente, entre eles, a incontinência urinária, as infecções urinárias de repetição, a litíase vesical, a hidronefrose e a insuficiência renal (LINDOZO, 2011), que são responsáveis pela maior parte dos índices de morbimortalidade nesta população. Controlar a eliminação urinária é um dos muitos desafios de adaptação para a qual a pessoa com trauma na medula deve ser educada até que obtenha domínio. A maneira pela qual ela é orientada nesse processo, ajudarlhe-á a obter uma melhor qualidade de vida (MOROÓKA e FARO, 2002). De acordo com Lindozo (2011) o manejo da bexiga das pessoas com trauma medular, objetiva assegurar o armazenamento e esvaziamento com baixas pressões intravesicais, evitar lesões por repetida distensão, prevenir complicações do trato urinário superior devido à alta pressão intravesical, bem como prevenir infecções e promover a continência, favorecendo à reintegração social. 1 Ana Paula Prigol,. Acadêmica de Enfermagem, bolsista Paidex da Universidade de Passo Fundo-RS. [email protected]; ²Ana Maria Bellani Migott, doutora em medicina e ciências da saúde, docente pertencente ao quadro de professores extensionistas da Universidade de Passo Fundo, [email protected]; ³Renata Busin do Amaral. Professora Coordenadora, mestre em medicina e ciências da saúde, docente pertencente ao quadro de professores extensionistas da Universidade de Passo Fundo, coordenadora do projeto de extensão, [email protected]. A introdução da técnica do cateterismo vesical intermitente limpo (Lapides et al., 1972) revolucionou o cuidado do trato urinário para os pacientes com trauma de medula espinal. Essa técnica contribuiu muito para diminuir a morbidade associada ao uso crônico cateteres uretrais (FERA; LELIS e GLASHAN, 1999). Lindozo (2011) relata que o uso prolongado de cateteres permanentes na bexiga resulta em mais complicações urológicas, tais como cálculos vesicais e renais, infecções urinárias, fístulas uretrais, estenoses e neoplasias de bexiga. Portanto, hoje, o autocateterismo vesical intermitente limpo é a técnica mais indicada para o recondicionamento desses pacientes, pois permite o esvaziamento rítmico da bexiga sob baixa pressão, possibilita o esvaziamento vesical completo, evita urina residual e diminui a probabilidade do alcance ao volume limite para deflagrar contrações vesicais reflexas, o que evita o comprometimento do sistema urinário (ROCHA; GOMES, 2010). Este estudo tem por objetivo relatar a forma de esvaziamento vesical prevalente em um grupo de pessoas com lesão medular, participantes do projeto de extensão – “O autocuidado à pessoa com lesão medular: uma questão de educação popular em saúde como corresponsabilidade social de profissionais da saúde”- da Universidade de Passo Fundo/RS. Metodologia O grupo foi composto por 36 pessoas com lesão medular participantes do projeto de extensão que se dispuseram a relatar a forma de esvaziamento vesical adotada. As entrevistas foram realizadas, pelos extensionistas, após uma das reuniões de grupo operativo, que correm semanalmente. A forma de esvaziamento vesical adotada foi explicada por cada participante do projeto, sob a forma de entrevista individual. Os dados coletados foram anotados nos prontuários e posteriormente analisados de forma descritiva. Resultados e Discussão Nesse estudo constatamos que 75% dos 36 pacientes não realizam o autocateterismo vesical intermitente limpo, que é o indicado após trauma da medula espinal. Destes, 30,6% realizam cateterismo vesical assistido (com auxílio do cuidador), 25% usam fraldas e 19,4% utilizam sondagem vesical de demora. Para compreender a função renal após a lesão medular Moroóka e Faro (2002) trazem a seguinte explicação: a bexiga é controlada por mecanismos fisiológicos voluntários e involuntários e, imediatamente após um trauma medular torna-se atônica, não mais contraindo com a atividade reflexa. Passada a fase de choque medular, e se a lesão for acima da cauda eqüina, a bexiga poderá funcionar de forma reflexa, o que diminui consideravelmente sua capacidade de armazenamento de urina. No entanto, independente do tipo de disfunção vesical, haverá urina residual caso a forma de esvaziamento vesical empregada não seja o cateterismo vesical (FERA, LELIS E GLASHAN, 1999). Dessa forma, considerando a disfunção vesical, inerente ao trauma de medula, a complicação mais comum provocada pela forma inadequada de esvaziamento vesical é a infecção urinária que poderá levar à deterioração renal. Essas complicações são resultantes da estase urinária residual, com aumento da pressão vesical para as vias urinárias superiores, favorecendo as infecções urinárias e o desenvolvimento de refluxo uretral, hipertrofia renal e sua futura deterioração (FURLAN; FERRIANE e GOMES, 2003). Um estudo realizado por Weld e Dmochowsky (2000) sobre as complicações urológicas mostra que, de 316 pacientes com trauma medular, somente 27,2% dos que realizavam o cateterismo intermitente limpo desenvolveram complicações. O grupo que realizava autocateterismo vesical intermitente apresentou taxas significativamente mais baixas de complicações quando comparado com o grupo que fazia uso de sondagem permanente. Os autores, ainda, compararam o grupo de pacientes que mantinha esvaziamento vesical espontâneo com o grupo que realizava sondagem vesical de demora e não encontraram diferenças na reincidência de complicações. Esse estudo traz a importância e a eficácia da técnica limpa do autocateterismo vesical intermitente limpo na prevenção de infecções urinárias de repetição. Além disso, a técnica limpa de autocateterismo vesical intermitente, quando comparada à técnica asséptica, não apresenta diferenças significativas em relação à incidência de infecções urinárias (ASSIS e FARO, 2011). O autocateterismo vesical intermitente é um procedimento que requer regularidade, disponibilidade e disciplina; e, por se tratar de uma terapia prolongada, depende, sobretudo, da adesão do paciente (FERA; LELIS e GLASHAN, 1999). Para isso, deve-se trabalhar a reabilitação vesical, através de medidas educacionais, intervencionistas e medicamentosas. É importante, também, conhecer as repercussões do trauma medular e os objetivos e prioridades de cada paciente, podendo determinar a satisfação, adesão e continuidade à execução adequada da técnica de esvaziamento vesical. (KESSLER, RYU e BURKHARD, 2008). Conclusão Esse estudo mostrou que boa parte dos pacientes não realiza a técnica preconizada, conseqüentemente ficam mais expostos à reincidência de infecções urinárias. O autocateterismo uretral intermitente como forma de esvaziamento vesical, após trauma medular, previne e reduz a morbimortalidade de pessoas com lesão medular. Programas de reabilitação funcional de pessoas com lesão medular devem incluir a (re)educação para o esvaziamento vesical adequado. Referências ASSIS, G.M.; FARO, A.C.M. Autocateterismo vesical intermitente na lesão medular. Revista Escola de Enfermagem da USP, São Paulo, v.45, nº1, p. 289-93, 2011. FERA, P.; LELIS, M. A. S.; GLASHAN, R. Q. Caracterização de pacientes em programa de cateterismo vesical intermitente. Revista Escola de Enfermagem da USP, São Paulo, v.33, n. especial, p. 124-128, 1999. FURLAN, M F F M, FERRIANE, M G C, GOMES, R. O cuidar de crianças portadoras de bexiga neurogênica: representações sociais das necessidades dessas crianças e de suas mães. Revista Latino Americana de Enfermagem, São Paulo, v.11, nº 6, p.763-770, 2003. KESSLER, T M, RYU, G, BURKHARD, F C. Clean intermittent self-catheterization: A burden for the patient? Neurourology and Urodynamics, v. 28, p.18–21, 2009. LINDOZO, Marjoyre Anne Pereira. O suporte social e a continuidade do cateterismo vesical intermitente. 2011. 82 f. Tese de Mestrado (Stricto Sensu) - Curso de Enfermagem, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2011. MOROÓKA, M.; FARO, A. C. M. A técnica do autocateterismo vesical intermitente: descrição do procedimento realizado pelos pacientes com lesão medular. Revista Escola de Enfermagem, São Paulo, v.36, n. 4, p. 324-331, 2002. ROCHA, F. E. T.; GOMES, C. M. Bexiga Neurogênica. In: NARDOZZA JÚNIOR, A.; ZERATI FILHO, M.; REIS, R. B. dos (Org.) Urologia Fundamental. São Paulo: Sociedade Brasileira de Urologia, 2010. p. 240-249. WELD, K.J, DMOCHOWSKI RT. Effects of bladder management on urological complications in the spinal cord injured patient. J Urol, 2000.