Sérgio Inácio Jung

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UNIVERSIDADE REGIONAL DO NOROESTE DO ESTADO DO
RIO GRANDE DO SUL – UNIJUÍ
Departamento de Ciências Administrativas, Contábeis, Econômicas e da Comunicação
Departamento de Estudos Agrários
Departamento de Ciências Jurídicas e Sociais
MESTRADO EM DESENVOLVIMENTO
SÉRGIO INÁCIO JUNG
ASPECTOS DA GESTÃO AMBIENTAL DA PRODUÇÃO DE ÁLCOOL
E CACHAÇA NO NOROESTE–MISSÕES
DO RIO GRANDE DO SUL
Ijuí (RS)
2012
1
SÉRGIO INÁCIO JUNG
ASPECTOS DA GESTÃO AMBIENTAL DA PRODUÇÃO DE ÁLCOOL
E CACHAÇA NO NOROESTE–MISSÕES
DO RIO GRANDE DO SUL
Dissertação apresentada ao curso de Pós-Graduação
Stricto Sensu, Mestrado em Desenvolvimento, Linha de
Pesquisa: Gestão de Organizações para o Desenvolvimento, da Universidade Regional do Noroeste do
Estado do Rio Grande do Sul (Unijuí), requisito parcial
para obtenção do título de Mestre em Desenvolvimento.
Orientadora: Professora Doutora Sandra Beatriz Vicenci Fernandes
Ijuí (RS)
2012
2
Catalogação na Publicação
J95a
Jung, Sérgio Inácio.
Aspectos de gestão ambiental da produção de álcool e cachaça no
Noroeste – Missões do Rio Grande do Sul / Sérgio Inácio Jung. – Ijuí,
2012. –
93 f. : il. ; 29 cm.
Dissertação (mestrado) – Universidade Regional do Noroeste do
Estado do Rio Grande do Sul (Campus Ijuí). Desenvolvimento.
“Orientadora: Dra. Sandra Beatriz Vicenci Fernandes”.
1. Gestão de resíduos de cana. 2. Viabilidade técnica – Produção de
cachaça e etanol. 3. Viabilidade econômica – Produção de cachaça e
etanol. 4. Viabilidade ambiental – Produção de cachaça e etanol. 5.
Bagaço de cana-de-açúcar. 6. Vinhaça. I. Fernandes, Sandra Beatriz
Vicenci. II. Título.
CDU: 502.33
504.06
Aline Morales dos Santos Theobald
CRB 10/1879
3
UNIJUÍ - Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul
Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento – Mestrado
A Banca Examinadora, abaixo assinada, aprova a Dissertação
ASPECTOS DE GESTÃO AMBIENTAL DA PRODUÇÃO DE ÁLCOOL E
CACHAÇA NO NOROESTE – MISSÕES DO RIO GRANDE DO SUL
elaborada por
Sérgio Inácio Jung
como requisito parcial para a obtenção do grau de
Mestre em Desenvolvimento
Banca Examinadora:
Profa. Dra. Sandra Beatriz Vicenci Fernandes (UNIJUÍ): _____________________________
Profa. Dra. Marlise Amália Reinehr Dal Forno (UFRGS): ____________________________
Profa. Dra. Leonir Terezinha Uhde (UNIJUÍ): ______________________________________
Ijuí (RS), 29 de agosto de 2012.
4
Dedico esta dissertação à Carmen e à
Letícia, pela compreensão e estímulo com
palavras ou na falta delas.
5
AGRADECIMENTOS
Agradeço à professora Sandra Fernandes, pela orientação segura, pela paciência e
apoio incondicional em todos os momentos.
Pelas palavras, pela persistência, perspicácia e
perseverança e o estímulo para melhorar. As
palavras apenas tentam descrever o sentimento
de carinho, respeito e gratidão pelos ensinamentos recebidos.
À minha família, amigos e professores,
colegas de trabalho do IESA de Santo Ângelo,
e a todos que colaboraram nesta jornada que
ora está findando.
6
“Existem três tipos de empresas (e
pessoas). As que fazem as coisas acontecer, as
que ficam vendo as coisas acontecer e as que
se perguntam: ‘o que aconteceu?’”
Philip Kotler (2002).
7
RESUMO
A produção de álcool e de cachaça na região Noroeste-Missões do Rio Grande do Sul
é responsável pela dispersão de dejetos líquidos representados pela vinhaça e dejetos sólidos
oriundos do bagaço da cana-de-açúcar e das cinzas da combustão que produz energia térmica
nas unidades beneficiadoras, usinas e destilarias. A proposta deste estudo é analisar e discutir
a viabilidade técnica, econômica e ambiental do impacto provocado pela disposição no
ambiente dos dejetos resultantes da manufatura artesanal ou industrial dos derivados da canade-açúcar pelos estabelecimentos produtores. O estudo caracteriza-se como pesquisa aplicada
e descritiva, sendo classificado também como pesquisa de campo, documental e bibliográfica.
Os potenciais impactos foram acessados mediante questionário aplicado aos responsáveis por
usinas e destilarias de 24 municípios da região Noroeste-Missões do Rio Grande do Sul, a
partir do qual se buscou conhecer o processamento de cana para produção de álcool e
cachaça. O trabalho descreve as características da região produtora de cana-de-açúcar, as
principais etapas do processo produtivo de álcool combustível e cachaça e os potenciais
impactos ambientais decorrentes das modalidades de gestão dos resíduos decorrentes do
processo produtivo. Discute também a gama de alternativas de gestão desses resíduos,
atendendo aos requisitos legais. Depreende-se do estudo que vinhaça representa tanto o maior
potencial de gerar danos ambientais, como uma grande possibilidade de emprego em
biofertilizantes, representando ganhos ambientais de grande relevância. O mesmo ocorre pela
utilização de dejetos sólidos, tanto do bagaço quanto das cinzas como matérias-primas
alternativas. Conclui-se que há um conjunto de possibilidades viáveis para o uso da vinhaça e
do bagaço da cana-de-açúcar que representam atenuação de impactos ambientais, podendo
gerar ganhos ambientais de grande relevância.
Palavras-chave: Gestão de resíduos de cana. Viabilidade técnica, econômica e
ambiental da produção de cachaça e etanol. Bagaço de cana-de-açúcar. Vinhaça.
8
ABSTRACT
The production of alcohol and white lightning (cachaça) in the Northwest-Mission
region of Rio Grande do Sul is responsible for the dispersion of the liquid waste represented
by the vinasse and the solid waste from the sugarcane bagasse and from the ashes of the
combustion which produce thermo energy in the manufacturing units, plants and distilleries.
The proposal of this study is to analyze and discuss the economical and financial viable
alternatives in order to mitigate the impact caused by the disposal of the waste resulting from
the handicraft or industrial manufacturing of the sugarcane derivatives by the producing
establishments in the environment. The specific objectives of the study are: to analyze the
environmental impact caused by the disposal of the waste in the nature by the producing
establishments; to identify and analyze economical and financial viable alternatives which are
legally supported by the management of the residues generated by the production; to create a
distinctive model for small, medium and big producers while identifying the polluting
potential for the three categories; to present a study of the economical and financial viability
of the internalization of the alternatives by the reduction of the impact caused by the
production waste in nature. The study is characterized as a descriptive and applied research,
being classified as a field, documental and bibliographical research as well. A questionnaire
was applied to the people responsible for distilleries and plants in 24 municipalities in the
Northwest-Mission region of Rio Grande do Sul, and it aimed at learning about the cane
processing for the production of alcohol and white lightning. It is possible to deduce form the
study that the alternative possibilities for the use of vinasse as a biofertilizer represent, above
all, highly relevant environmental gains. The same happens with the environmental gain from
the use of solid waste, either the bagasse or the ashes, as alternative raw material. It is
concluded that the possible alternatives for the use of sugarcane vinasse or bagasse represent
highly relevant environmental gain.
Key words: Sugarcane. White lightning and ethanol economical-financial production
viability. Residue management. Vinasse. Sugarcane bagasse.
9
LISTA DAS SIGLAS
ADCE
BAH
CCA
CETESB
CNRH
CONAMA
CTC
DAP
DBO
DBQ
EIA
FND
IBRACON
LI
LO
LP
NPA
OCDE
PNMA
SEAMA
SEBRAE
SISNAMA
–
–
–
–
–
–
–
–
–
–
–
–
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–
–
–
–
–
–
–
–
–
Associação dos Dirigentes Cristãos de Empresas
Bagaço de Cana-de-açúcar Auto-Hidrolizado
Coordenação de Controle Ambiental
Companhia de Tecnologia e Saneamento Ambiental do Estado de SP
Conselho Nacional de Recursos Hídricos
Conselho Nacional do Meio Ambiente
Capacidade de Troca Catiônica
Departamento de Atendimento ao Público
Demanda Bioquímica de Oxigênio
Demanda Química de Oxigênio
Estudo de Impacto Ambiental
Fibra Detergente Neutro
Instituto dos Auditores Independentes do Brasil
Licença de Instalação
Licença de Operação
Licença Prévia
Norma e Procedimento de Auditoria
Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico
Política Nacional de Meio Ambiente
Secretaria do Estado para Assuntos do Meio Ambiente
Serviço de Apoio às Micro e Pequenas
Sistema Nacional de Meio Ambiente
10
LISTA DAS FIGURAS
Figura 1.
Figura 2.
Figura 3.
Figura 4.
Figura 5.
Figura 6.
Figura 7.
Figura 8.
Figura 9.
Figura 10.
Figura 11.
Figura 12.
Localização da área de abrangência – municípios com produção
canavieira para produção de álcool e cachaça. Região Noroeste-Missões
do RS, 2012...................................................................................................
Distâncias médias entre os mananciais hídricos e as unidades produtoras
de álcool e cachaça na Região Noroeste-Missões (RS), 2012......................
Classes de solo predominantes no cultivo de cana na região NoroesteMissões, RS...................................................................................................
Percentual de adubação de plantio e de manutenção....................................
Modalidades de colheita da cana na região Noroeste-Missões (RS),
2012...............................................................................................................
Emprego de mão de obra própria ou contratada para corte de cana
destinada a destilarias e usina na Região Noroeste-Missões (RS), 2012......
Altitude em que se situam os estabelecimentos de produção de cachaça e
álcool na Região Noroeste-Missões (RS), 2012...........................................
Modalidade de moagem da cana destinada à produção de álcool e cachaça
na região Noroeste-Missões (RS), 2012........................................................
O uso do bagaço como meio de combustão na usina de álcool e nas
destilarias de Cachaça no Região Noroeste-Missões (RS), 2012.................
Armazenagem provisória adequada dos dejetos na produção de álcool e
cachaça na Região Noroeste-Missões (RS), 2012.........................................
Forma de gestão dos resíduos de cabeça e cauda na produção de cachaça
na Região Noroeste-Missões (RS), 2012......................................................
Disposição e/ou tratamento adequado do bagaço e cinzas da produção de
álcool e cachaça na região Noroeste-Missões (RS), 2012............................
49
52
54
61
63
66
67
71
72
74
75
80
11
LISTA DOS QUADROS
Quadro 1.
Quadro 2.
Quadro 3.
Quadro 4.
Caracterização físico-química da vinhaça......................................................
Caracterização da produção de cana destinada à aguardente e etanol na
região Noroeste-Missões do Rio Grande do Sul, 2012...................................
Produção de resíduos de cana em função do potencial produtivo de
materiais. Região Noroeste –Missões (RS), 2012...........................................
Tempo médio de duração dos canaviais destinados a destilarias de cachaça
e produção de etanol. Região Noroeste-Missões (RS), 2012..........................
33
51
57
59
12
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ...................................................................................................................... 14
1 REVISÃO DE LITERATURA ........................................................................................... 17
1.1 A RESPONSABILIDADE SOCIAL E AMBIENTAL ..................................................... 17
1.2 VISÃO ECONÔMICA DA GESTÃO AMBIENTAL ....................................................... 18
1.2.1 Internalização de custos ambientais ............................................................................ 21
1.3 INSTRUMENTOS DE GESTÃO AMBIENTAL............................................................. 24
1.3.1 Licenciamento ambiental .............................................................................................. 29
1.4 CARACTERIZAÇÃO E DESTINO DOS RESÍDUOS DA PRODUÇÃO DE
CACHAÇA E ÁLCOOL .......................................................................................................... 31
1.5 NORMATIZAÇÃO E ASPECTOS LEGAIS DO MANEJO DE RESÍDUOS DE
CANA ....................................................................................................................................... 38
1.5.1 Outras alternativas de destinação da vinhaça ............................................................ 42
1.5.2 Destino do bagaço da cana-de-açúcar.......................................................................... 44
1.5.3 As cinzas do bagaço da cana e suas aplicações ........................................................... 46
2 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS ..................................................................... 48
2.1 CARACTERIZAÇÃO METODOLÓGICA ...................................................................... 48
2.2 CARACTERIZAÇÃO DOS EMPREENDIMENTOS E DOS IMPACTOS DO
PROCESSAMENTO DE CANA PARA PRODUÇÃO DE ÁLCOOL E CACHAÇA ........... 49
2.2.1 Coleta de dados .............................................................................................................. 49
2.2.2 Características da produção de cana na região Noroeste-Missões ........................... 51
2.2.3 Localização geográfica das unidades produtoras em relação aos mananciais
hídricos e potencial de contaminação ambiental ................................................................. 53
2.2.4 Características dos solos da região produtora de cana .............................................. 54
3 APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS ............................................. 57
3.1 CARACTERIZAÇÃO DO POTENCIAL DE IMPACTO AMBIENTAL DA
PRODUÇÃO DE DERIVADOS DE CANA ........................................................................... 57
3.1.1 Estimativa do potencial de produção de dejetos ......................................................... 57
3.1.2 Sistemas de cultivos de cana ......................................................................................... 60
3.1.3 Manejo de colheita da cana-de-açúcar ........................................................................ 63
3.1.4 Aspectos relativos à colheita da cana-de-açúcar......................................................... 65
3.1.5 Disposição espacial das unidades produtoras de álcool e cachaça em relação
aos mananciais hídricos ......................................................................................................... 68
3.1.6 Características e destino do bagaço produzido ........................................................... 70
3.2 ALTERNATIVAS VIÁVEIS PARA ATENUAÇÃO DOS IMPACTOS
AMBIENTAIS DO PROCESSAMENTO DA CANA ............................................................ 74
13
3.2.1 Gestão dos dejetos da vinhaça ...................................................................................... 74
3.2.2 Gestão do bagaço e das cinzas ...................................................................................... 76
CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................................. 83
REFERÊNCIAS ..................................................................................................................... 87
APÊNDICE ............................................................................................................................. 93
14
INTRODUÇÃO
A produção de álcool e de cachaça na região Noroeste-Missões do Rio Grande do Sul
tem se mostrado uma atividade econômica promissora que vem buscando tanto afirmação
econômica em sintonia com a demanda dos mercados consumidores como viabilidade
financeira entre custos e benefícios monetários das atividades produtivas. A manufatura de
derivados da cana-de-açúcar, especialmente a produção de álcool e de cachaça, são atividades
consideradas de alto potencial poluidor. Embora se trate de unidades produtoras de pequeno
porte, os dejetos da produção da usina de álcool e das destilarias de cachaça possuem alto
potencial para contaminar os recursos do solo, da água e do ar.
A preocupação com recursos naturais empregados no processo produtivo
frequentemente recebe atenção secundária dos empreendimentos empenhados em produzir
derivados da cana-de-açúcar, a exemplo do álcool e da cachaça. A emissão e o destino dos
dejetos de produção, com frequência, são ignorados pelas fontes poluidoras. A alta
concentração de pequenos estabelecimentos pode aumentar o potencial risco poluidor da
atividade, entretanto, a eleição de técnicas de manejo adequadas pode atenuar a ação destes
dejetos nos meios onde são dispostos, de outra forma, métodos incompatíveis com a
oportunidade podem agravar e potencializar os efeitos nocivos da ação destes rejeitos no meio
ambiente.
Discutir e analisar alternativas econômicas e financeiras viáveis e legalmente
amparadas para a gestão dos resíduos gerados pela produção pode contribuir de forma
decisiva para a identificação e adoção de novas técnicas, capazes de atenuar ou neutralizar os
efeitos nocivos dos dejetos. A vinhaça e o bagaço são os rejeitos mais volumosos do
processamento da cana. O primeiro tem maior potencial de dano ambiental, mas pode ter
destinação adequada como biofertilizante, por exemplo, ao passo que o segundo, de menor
potencial de impacto, encontra ampla utilização como matéria prima para diversos bens
acabados, produção de energia, alimentação animal, entre outros. As cinzas oriundas da
15
combustão também possuem alternativas de utilização como insumo de produção de outros
bens acabados, fonte de cálcio, aditivos de cimento Portland, entre outros.
O potencial poluidor está diretamente ligado ao tamanho dos empreendimentos alvo
de análise no presente estudo – usina de álcool e destilarias de cachaça. A categorização dos
empreendimentos que processam cana em pequenos, médios e grandes produtores possibilita
acessar o potencial poluidor para as referidas categorias e, consequentemente, a identificação
de alternativas viáveis ajustadas a cada realidade. As alternativas para gestão dos dejetos
devem, em primeiro lugar, obedecer à legislação ambiental pertinente e, num segundo
momento, serem norteadas pela viabilidade econômica. A viabilidade financeira identifica a
relação positiva entre os custos para o beneficiamento dos dejetos em novos produtos e
serviços e as receitas oriundas de sua comercialização.
Apresentar uma análise econômico-financeira da internalização das alternativas
viáveis pela redução do impacto dos rejeitos de produção no ambiente pode representar a
possibilidade de receitas extras a partir do beneficiamento de dejetos. Não é de se esperar, no
entanto, que a internalização dos custos de todos os dejetos e todas as alternativas
apresentadas encontre superávit financeiro. Entende-se que os empreendimentos devem
comprometer-se com a responsabilidade ambiental sobre os dejetos que emitirem e os
impactos causados ao meio ambiente por tais emissões. É possível que em alguns casos não
haja superávit na relação custo benefício, entretanto, a necessidade e o compromisso da
internalização dos custos ambientais devem ser absorvidos com a melhor relação custobenefício possível, em favor do meio ambiente, com a desoneração da sociedade por danos
privados que devem ser internalizados pelas entidades que os promoverem.
O objetivo deste estudo é analisar e discutir alternativas que sejam viáveis do ponto de
vista técnico, econômico e ambiental para atenuar o impacto provocado pela disposição no
ambiente dos dejetos resultantes da manufatura artesanal ou industrial dos derivados da canade-açúcar pelos estabelecimentos produtores da região Noroeste-Missões do Rio Grande do
Sul. Assim, o desafio a que se propõe o presente estudo é caracterizar e analisar situações de
desenvolvimento local e regional e a influência destes fenômenos sob os aspectos sociais e
ambientais, bem como os impactos decorrentes sobre o meio.
A discussão preconizada neste estudo tem a intenção de propor uma análise crítica das
reais possibilidades de ganhos socioambientais a partir da consideração dos pressupostos da
sustentabilidade ambiental na implantação de projetos com grande impacto econômico, mas
com custos sociais e ambientais também elevados, custos estes a serem internalizados de
forma sustentável pelas fontes produtoras.
16
O estudo é caracterizado como pesquisa aplicada e descritiva, sendo classificada
também como pesquisa de campo, documental e bibliográfica. Um questionário foi utilizado
na busca das informações, a partir das quais se compreendeu o processamento de cana para
produção de álcool e de cachaça.
O presente estudo está dividido em três capítulos. O primeiro apresenta a revisão da
literatura, em que se busca a ampliação dos conhecimentos sobre responsabilidade social e
ambiental, a visão econômica da gestão ambiental, o papel das empresas na sociedade, a
normatização e o licenciamento ambiental e os efeitos dos resíduos dispostos
inadequadamente no ambiente. O segundo traz a metodologia utilizada e o instrumento de
coleta de dado. O terceiro capítulo, finalmente, caracteriza o potencial de impacto ambiental
da produção de derivados de cana e propõe alternativas viáveis. Seguem as considerações
finais e as referências que embasaram o estudo.
17
1 REVISÃO DE LITERATURA
1.1 A RESPONSABILIDADE SOCIAL E AMBIENTAL
Para que o desenvolvimento seja sustentável do ponto de vista econômico, social e
ambiental deverá contar com o esforço da gestão das organizações modernas. O
desenvolvimento deve projetar os avanços tecnológicos sem causar prejuízos sociais. Assim, a
palavra-chave no processo de gestão tecnológica é o equilíbrio, em que pese produzir sem
destruir.
A responsabilidade social representa uma mudança na concepção de empresa e de seu
papel na sociedade, uma vez que se constitui em uma nova visão da realidade, fazendo com
que cresça constantemente o número de organizações que buscam reconhecimento como
socialmente responsáveis.
As organizações, além de buscar a eficiência devem se preocupar com o impacto que
suas atividades causam ao meio, investir em tecnologias modernas, menos agressivas ao meio
ambiente. Estas medidas são vistas como vantagens competitivas para as empresas, pois a
sociedade tem feito pesadas críticas às organizações que não têm demonstrado tal
preocupação.
No campo da gestão Donaire (1999) enfatiza a necessidade de incorporar a dimensão
ambiental em seus cenários de tomada de decisão, assim como a manutenção de uma postura
ética e responsável em relação à referida questão.
É de se observar a crescente preocupação das pessoas e, por consequência, das
empresas que são dirigidas e orientadas por profissionais que desenvolveram a consciência da
preservação. Muito mais que uma questão ética, esta passou a ser uma questão de
sobrevivência, e as próximas gerações poderão sofrer as consequências dos atos praticados
hoje.
Além da responsabilidade econômica e financeira, as organizações necessitam
preocupar-se com as questões políticas, culturais e sociais, incorporando os direitos que
asseguram a vida em sociedade (FISCHER, 2002).
A posição de muitas empresas denota a importância dada às questões ambientais. Mais
que uma questão mercadológica, esta preocupação tem conotação financeira e estratégica. A
responsabilização por atos praticados pelas empresas pode representar gastos adicionais aos
projetados para reparar os danos causados ao meio ambiente.
18
Com a adoção dos princípios de responsabilidade social as empresas acabam
desenvolvendo uma imagem mais aprazível sob os olhos dos consumidores, e isto pode se
traduzir em mais vantagens junto a estes consumidores. Uma empresa que é vista como
socialmente responsável possui uma vantagem estratégica em relação àquela que não tem essa
imagem perante o público (DONAIRE, 1999).
O compromisso social é o ponto de partida para uma mudança de cultura nas
organizações. Este compromisso gera um conjunto de ações que passam pelo ambiente
interno da organização e buscam investimentos em recursos humanos, departamentos
financeiros, tecnológicos, ambientais, projetos de interesse público, entre outros, que visam
proporcionar um melhoramento social.
Em 1960 foi constituída a Associação dos Dirigentes Cristãos de Empresas (ADCE),
com sede em São Paulo, iniciando assim um discurso sobre responsabilidade social entre os
dirigentes das empresas. Em 1977, a ADCE organizou o 2º Encontro Nacional de Dirigentes
de Empresas, tendo como tema central o Balanço Social da Empresa. Em 1979, a ADCE
passou a organizar seus congressos anuais e o Balanço Social tem sido objeto de reflexão
(TINOCO, 2001).
Em 1984 foi elaborado o primeiro trabalho acadêmico do professor João Eduardo
Prudêncio Tinoco, que é uma dissertação de mestrado do Departamento de Contabilidade e
autoria da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São
Paulo (FEA-USP), com o título Balanço Social: uma abordagem socioeconômica da
Contabilidade.
1.2 VISÃO ECONÔMICA DA GESTÃO AMBIENTAL
O crescimento demográfico exponencial representa um aumento quantitativo da
demanda de bens e serviços. O aumento da produção para atender esta demanda deve guardar
o equilíbrio entre o desenvolvimento produtivo e a preservação dos recursos naturais.
O Relatório da Comissão Mundial sobre o Meio Ambiente, editado em 1987 com o
título de “Nosso Futuro Comum” disseminou a expressão “desenvolvimento ecologicamente
sustentado” e definiu como sustentável aquele sistema que responde pela produção presente
sem comprometer as gerações futuras. A transposição deste conceito para o desenvolvimento
econômico fez emergir a gestão ambiental empresarial, como forma de reduzir os impactos
dos sistemas produtivo sobre o ambiente.
19
A gestão ambiental sustentável envolve um posicionamento estratégico para produzir e
a organização como um todo deve ser preparada para este posicionamento. É fundamental que
todos estejam comprometidos e conscientes dos objetivos a serem alcançados.
Andrade, Tachizawa e Carvalho (2002) salientam que o primeiro passo no caminho da
produção ecologicamente sustentada é acompanhado da ideia que qualquer mudança na forma
de produzir resulte no aumento dos custos e despesas ou na redução do aproveitamento
produtivo, o que resulta em menor produção. Donaire (1999) contrapõe salientando que
muitas empresas aumentam seus lucros a médio e longo prazo. Outras empresas conseguiram
significativas melhoras nos custos de produção já em curto prazo.
Independentemente de a empresa conseguir uma adaptabilidade para reduzir custos e
aumentar a produção a curto, médio ou longo prazo, a pressão exercida pelos mercados de
consumos tem compelido sistematicamente os produtores de bens e serviços à redução na
emissão de poluentes. Percebe-se o crescente envolvimento das nações, principalmente no
continente europeu e latino-americano, competindo para uma gestão ambiental limpa e
responsável.
Os novos tempos e os novos cenários econômicos fizeram despertar a cultura
preservacionista. Mesmo com a tendência mais competitiva dos mercados que, em parte, é
estimulada pelo movimento evolucionista dos mercados de consumo, os consumidores estão
cada vez mais conscientes e empenhados na causa ambiental. Os mercados competitivos
sofrem a pressão coercitiva do conjunto normativo imposto pelo Estado que, por sua vez,
atende aos anseios da animosidade humana que forma a imensa onda preservacionista.
De acordo com Faria et al. (2006, p. 2):
A sociedade industrial, surgida no século XIX, estruturou-se sobre a ideologia do
liberalismo, tendo como princípio fundante a livre concorrência – a liberdade de
empresa, cujos padrões de produção e consumo vêm gerando notável depredação
ambiental em decorrência de: aumento de poluição pelas fábricas e veículos
automotores; emprego desordenado de substâncias tóxicas na produção agrícola;
consumismo desmedido; uso irracional dos recursos naturais; e acúmulo de lixo não
degradável.
Donaire (1999) afirma que na visão tradicional da instituição apenas o lado econômico
está voltado para a maximização de lucros, controle e redução de custos. Assim, a mudança
de posicionamento estratégico em relação ao meio ambiente não foi assimilada
instantaneamente e sem resistência, fato que pode ser constatado a partir de Friedmann (1985,
p. 23):
20
Ultimamente um ponto de vista específico tem obtido cada vez maior aceitação – o
de que os altos funcionários das grandes empresas e os líderes trabalhistas têm uma
responsabilidade social além dos serviços que devem prestar aos interesses de seus
acionistas ou de seus membros. Este ponto de vista mostra uma concepção
fundamental errada do caráter e da natureza de uma economia livre. Em tal
economia só há uma responsabilidade social do capital – usar seus recursos e
dedicar-se a atividades destinadas a aumentar seus lucros até onde permaneça dentro
das regras do jogo, o que significa participar de uma competição livre e aberta, sem
enganos ou fraudes.
O modelo preconizado por Friedmann (1985) pressupõe que as questões éticas estão
na esfera individual, se manifestando na sociedade por meio das normas e padrões de conduta
social estabelecidas, refletidas, pressupostos legais e jurídicos. Estas regras jurídicas e legais
funcionam como meio de pressão quando a empresa pratica algum ato arbitrário com prejuízo
socioambiental que prejudica a coletividade.
Ainda de acordo com Friedman (1985, p. 22):
A existência de um mercado livre não elimina, evidentemente, a necessidade de um
governo. Ao contrário, um governo é essencial para a determinação das regras do
jogo e um árbitro para interpretar e pôr em vigor as regras estabelecidas. O que o
mercado faz é reduzir sensivelmente o número de questões que devem ser decididas
por meios políticos - e, por isso, minimizar a extensão em que o governo tem de
participar diretamente do jogo.
O mesmo autor complementa: “Papéis básicos do governo numa sociedade livre –
prover os meios para modificar as regras, regular as diferenças sobre seu significado e garantir
o cumprimento das regras por aqueles que de uma forma ou de outra forma não se
submeteriam a elas” (FRIEDMAN, 1985, p. 22).
Friedman (1985) é um crítico feroz das ações e decisões tomadas pelos
administradores para a contribuição social em detrimento dos interesses da corporação. E cita
como exemplos: deixar de aumentar preços dos produtos para contribuir com o objetivo social
de prevenir a inflação; despender recursos que vão além dos requisitos legais para a melhoria
do meio ambiente, à custa dos lucros da corporação; contratar desempregados em vez de
trabalhadores mais qualificados com o objetivo de reduzir a pobreza. Ele vê estas ações como
uma violação da função dos negócios. O dinheiro gasto em projetos sociais é uma imposição e
o dispêndio de taxas com o dinheiro dos outros para atender ao interesse geral da sociedade
reduz os salários e os dividendos dos acionistas e aumenta os preços ao consumidor. Essas
ações transformam os executivos em funcionários públicos ou servidores da sociedade civil,
os quais tomam decisões seguindo critérios políticos e sociais para alocar recursos e definir
quais são os interesses sociais coletivos.
21
Para Friedman (1985, p. 23):
Se os homens de negócios têm outra responsabilidade social que não obter o
máximo de lucro para seus acionistas, como poderiam saber qual é ela? Podem os
indivíduos saber o que é interesse social? Podem eles decidir que carga impor a si
próprios e aos acionistas para servir ao interesse social? É tolerável que funções
públicas sejam exercidas pelas pessoas que estão no momento dirigindo empresas
particulares, escolhidas para estes postos por grupos estritamente privados?
Farias e Bastos et al. (2006) argumentam que o alucinante progresso econômico do
século 20 teve como fundamento o uso indiscriminado dos recursos naturais antes
considerados inesgotáveis. Por outro lado, foi a polêmica suscitada pela questão da energia
nuclear nos anos 60, e o aumento inesperado dos preços do petróleo, nos anos 70, que
provocaram os primeiros debates sobre a escassez de recursos naturais e levaram à percepção
da finitude da biosfera. Esta preocupação ambientalista tornou-se sensível, desde os anos 60,
com o aparecimento de um movimento social engajado no enfrentamento da questão nuclear
em vários países europeus e nos Estados Unidos. A sociedade civil e seus movimentos
ativistas passaram a volver seu olhar, também, para o problema da degradação do meio
ambiente, que já ameaça a continuidade da sobrevivência na Terra.
Nesse sentido, em contraponto à visão de Friedman, Drucker (1992) é enfático no
papel de liderança dos executivos na comunidade, ultrapassando os limites das organizações.
A ideologia predominante nos anos 60 de que o governo-estado podia e devia cuidar dos
problemas da comunidade foi superada pelas evidências de que os governos não podem tomar
conta dos problemas da comunidade, e tampouco os negócios e o mercado livre podem tomar
conta dos problemas da comunidade, mas, em parceria com a sociedade civil, representada
pelo terceiro setor, compreendido pelas organizações comunitárias não lucrativas, as empresas
devem se responsabilizar pelas soluções dos problemas da comunidade, fornecendo os
recursos materiais e o trabalho voluntário de seus colaboradores.
1.2.1 Internalização de custos ambientais
A busca por competitividade pelas empresas modernas tem desencadeado uma
exploração intensiva dos recursos disponíveis e lançado mão de metodologias que nem
sempre são revertidas em avanços produtivos sustentáveis. A competitividade em produzir
pelo menor preço faz com que algumas etapas importantes do processo sejam suprimidas ou
simplificadas em nome da redução de gastos com manufatura, sob o risco de os custos de
22
produção onerarem os produtos ou serviços finais de tal forma que os mesmos se tornem
pouco atraentes sob o ponto de vista mercadológico. Assim, alguns processos importantes a
exemplo do manejo de dejetos resultantes do processo de manufatura são suprimidos ou
simplificados de forma a se externalizarem, causando prejuízos ambientais compartilhados
pela sociedade.
Soares (2003, p. 4) salienta o compartilhamento social dos custos privados:
A externalidade é um importante conceito econômico utilizado para entendermos
como a economia e a formação de preços frequentemente deixam de incorporar os
impactos sociais, ambientais e sanitários consequentes das atividades produtivas que
geram produtos e serviços.
Ainda de acordo com Soares (2003), a forma de competição entre agentes econômicos
por melhores preços oferecidos ao mercado, longe de otimizar o funcionamento da economia,
pode se constituir num dos maiores entraves para a sustentabilidade do desenvolvimento, pois
externaliza diversos custos sociais, ambientais e sanitários que permanecem ocultos nos
preços das mercadorias e terminam por serem socializados.
A crítica de Dupas (2008) é contundente em relação aos resultados catastróficos desta
ação do homem sobre o meio, em nome da competitividade mercadológica, quando afirma
que o envolvimento das corporações com os danos ambientais tornou-se mais problemático
pela assunção plena, por parte das empresas, da definição dos vetores tecnológicos, ocorrida a
partir da segunda metade do século 20. Isso foi consequência da liberdade quase absoluta que
as corporações assumiram pela escolha e criação dos produtos ou serviços que deverão ser
transformados em objetos de desejo dos consumidores para manter viva a lógica da
acumulação, essencial à produção de riqueza no capitalismo.
Para Griesse (2007) deve ser reconhecido, em primeiro lugar, que a aproximação entre
ética e economia é um reflexo da condição global de desequilíbrios sociais crescentes,
degradação da natureza e falta de um desenvolvimento sustentável. É necessário um sistema
de interação mais global para fazer transformações significativas. Para a empresa ir além do
princípio do lucro e do interesse próprio, de modo sistemático, há que ter o apoio institucional
da sociedade, do poder público e de outras empresas para transformar o tecido cultural e a
forma de se entender a ética nos negócios.
Soares e Porto (2009) complementam enaltecendo que isso ocorre quando florestas
são desmatadas, rios e solos são poluídos, trabalhadores e consumidores são contaminados, e
as doenças e mortes – frequentemente invisíveis no conjunto das estatísticas de saúde –
23
acabam sendo coletivamente absorvidas pela sociedade e pelos sistemas públicos
previdenciários e de saúde.
A este respeito Soares (2003, p. 4) entende que:
A introdução de discussões oriundas da economia no campo da saúde pública, como
a externalidade ambiental, permite ampliar o olhar sobre a relação saúde-ambiente a
partir dos processos sociais e econômicos de desenvolvimento que se encontram por
detrás de inúmeros problemas de saúde.
Nesse mesmo sentido, Soares (2003, p. 5) afirma que “estabelecer novos vínculos
entre a saúde coletiva, a economia e as ciências sociais poderá contribuir para a construção de
novas estratégias de promoção da saúde”.
Há necessidade de desenvolvimento de políticas estratégicas de normatização e
controle sobre a emissão e externalização de resíduos para compartilhamento social, sob pena
de o descaso produzir índices irreversíveis de degradação ambiental.
Neste sentido, citam Soares e Porto (2009, p. 3) que: “Os exemplos de políticas
possíveis de serem adotadas podem ser indutores de mudanças estruturais de tecnologias
produtivas, ou de comando-controle para situações onde a saúde pública reconheça a
existência de riscos mais graves para a população”.
Para Milanez e Porto (2009, p. 2): “as discussões teóricas e as experiências empíricas
apontam para a existência de eixos de desenvolvimento econômico no Brasil, ambientalmente
insustentáveis e socialmente injustos, que intensificam os conflitos socioambientais”.
Há necessidade, portanto, de consciência ambiental e desenvolvimento cultural
voltados ao monitoramento e controle a partir da imposição de regras claras que tenham força
para inibir atitudes sociais que provoquem desequilíbrio de recursos naturais. Os argumentos
de que um crescimento econômico, mesmo que a partir de instituições privadas, apresentem
inúmeros benefícios sociais que compensam os custos sociais externalizados, são fortemente
contestados.
Veiga (2009, p. 4) afirma nesse sentido:
A teoria da maximização da eficiência econômica induziria a uma busca de alocação
dos recursos de forma mais eficiente, tais como reduzir o custo econômico através
de ganhos de produtividade e deslocamento de riscos para comunidades de menor
nível socioeconômico. Porém, por essa lógica competitiva capitalista, a existência de
forças socio-econômicas e políticas desiguais poderia provocar ou agravar situações
de injustiça socioambiental. Com isso, pôde-se inferir a existência da relação inversa
entre eficiência econômica e justiça socioambiental.
24
O comportamento privado em relação às externalidades e utilização de recursos
naturais e o consequente compartilhamento dos custos com o meio social, pode não ser o
melhor resultado numa perspectiva de bem-estar social e mesmo individual no longo prazo.
Isso porque o custo marginal ou benefício marginal individual pode desprezar efeitos para a
saúde humana e dos ecossistemas, assim como os impactos destes para o sistema de saúde,
previdenciário e a sociedade como um todo (SOARES, 2003).
Pearce (apud SOARES, 2003, p. 6) confirma seu posicionamento em relação às
externalidades com custo social por benefícios privados:
As externalidades surgem por divergência entre interesses sociais e privados: os
livres mercados seriam baseados num estreito interesse pessoal, onde o gerador da
externalidade não tem qualquer incentivo para contabilizar os custos que impõe a
terceiros. Se a externalidade for negativa, há maior produção desta pelo agente
gerador, em equilíbrio competitivo, do que seria socialmente desejável.
Os benefícios sociais “podem ser definidos pelo embate entre grupos sociais a partir
de seus interesses e valores envolvendo de forma central questões ecológicas, como o meio
biofísico, o uso dos territórios e seus recursos naturais” (MILANEZ; PORTO, 2009, p. 6).
Ainda segundo esses autores:
Em linhas gerais, nossa principal argumentação é que a emergência e intensificação
dos conflitos no atual contexto brasileiro (mas também internacional) decorrem de
uma visão economicista restrita de desenvolvimento. Esta visão é pautada por
critérios de crescimento econômico – visto como alternativa única de progresso – de
natureza produtivista e consumista. Tal visão desrespeita a vida humana e os
ecossistemas, bem como a cultura e os valores dos povos nos territórios onde os
investimentos e as cadeias produtivas se realizam (MILANEZ; PORTO, 2009, p. 6).
Apresentado o papel das empresas na sociedade e a sua atividade de gestão ambiental,
o tópico que segue traz a normatização e o licenciamento ambiental.
1.3 INSTRUMENTOS DE GESTÃO AMBIENTAL
A Constituição Federal de 1988 (CF/88) destacou o meio ambiente em capítulo
próprio, o de número 5, integrando-o ao Título VIII – da Ordem Social – o qual tem como
objetivo o bem-estar e a justiça sociais. A Lei Maior salvaguarda o direito de todos ao meio
ambiente em equilíbrio para atender ao reclamo dos indivíduos e da coletividade a uma vida
sadia, em sintonia com a natureza.
25
Consoante se deflui do art. 225 da CF/88, impõe-se ao Poder Público o escopo de
assegurar a efetividade desse direito:
a)
preservar os ecossistemas, as espécies, a integridade do patrimônio genético do
País;
b) definir os espaços territoriais, nas unidades da Federação, a serem protegidos;
c) exigir estudo prévio de impacto ambiental, para instalação de obra ou atividade
potencialmente causadora de significativa degradação ambiental, devendo ser
dada publicidade; controlar a produção, a comercialização e o emprego de
técnicas, métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de
vida e o meio ambiente;
d) promover a educação ambiental em todos os níveis de ensino;
e) proteger a fauna e a flora.
Faria et al. (2006) salientam que a Carta Constitucional de 1988, em seu preâmbulo,
declara um Estado democrático de Direito, tendo como princípio fundamental a dignidade da
pessoa humana. A Constituição Federal assume uma postura coerente por desenvolver a ideia
da objetivação da responsabilidade em relação ao dano ambiental provocado por pessoas
jurídicas que, notadamente, por vezes, têm se revelado as mais degradadoras do meio
ambiente.
Os instrumentos de política ambiental empregados com vistas ao enfrentamento das
questões ambientais são de duas ordens: Instrumentos Regulatórios, do tipo Comando e
Controle e os Instrumentos de Incentivos Econômicos ou de Mercado. O primeiro grupo
corresponde àquelas políticas que visam identificar problemas ambientais específicos. As
regulamentações formam um conjunto de normas, regras, procedimentos e padrões que devem
ser obedecidos com vista à adequação a determinadas metas ambientais, acompanhadas de um
conjunto de penalidades previstas para aqueles que não as cumprirem. O licenciamento
ambiental é o principal deles.
Para problemas ambientais decorrentes de práticas agropecuárias Bartholomeu (2006)
apresenta de forma detalhada algumas soluções por intermédio de políticas ambientais. Via de
regra, as soluções são propostas por mecanismos de gestão ambiental e correspondem a
incentivos econômicos e de controle, os quais podem ser aplicados para a maior parte dos
casos:
 regulamentos e sanções (estabelecimento de padrões de emissões; exigência de
licenciamento para atividades; restrições ao uso do recurso; aplicação de multas;
estabelecimento de fechamento da atividade);
 taxas, impostos e cobranças (taxas por não cumprimento da legislação ambiental ou para
racionalizar o uso de determinado recurso; bônus de desempenho etc.);
26
 criação de mercado (licenças comercializáveis para direito de captação de água ou
emissões, por exemplo); e
 intervenção de demanda final (programas de rotulagem, processos de certificação, adoção
de selos “verdes” etc.).
A normatização imposta de forma coercitiva e unilateral pelo Estado representa a
evolução teleológica dos movimentos sociais que buscam reconhecimento e tem a finalidade
de regulamentar a conduta social. O conjunto de regras normatiza as relações entre a
sociedade, em que pese identificar o interesse público tutelado pelo Estado.
Dupas (2006) considera que o modelo de desenvolvimento mais difundido passa a ser
uma contingência da própria lógica capitalista de reprodução contínua dos ciclos de escassez
— dos novos produtos objetos de desejo — com os de abundância, quando esses mesmos
produtos tornam-se consumo de massa. Em vez da maior prosperidade geral, para que a
engrenagem da acumulação funcione, assiste-se a um sucateamento contínuo de produtos em
escala global, gerando imenso desperdício de matérias-primas e recursos naturais ao custo
imenso de degradação contínua do meio ambiente e de escassez de energia. É a opção
privilegiada e inexorável pela acumulação de capital, em detrimento do bem-estar social
amplo.
Os países em desenvolvimento e com forte vocação agrícola representam um mercado
profícuo às indústrias químicas que despejam produtos à base de princípios ativos rejeitados
na maioria dos países europeus e outros países desenvolvidos em função do risco que
representam à biodiversidade. É inviável pensar em modelos socioambientais sustentáveis
sem investir em tecnologias limpas que permitam produzir com qualidade.
Uma das alternativas para a gestão socioambiental responsável e equilibrada pode
estar no desenvolvimento biotecnológico. Nesse contexto emerge o conceito de bioeconomia
adotado pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) e
transcrito por Barros e Machado (2007): “aquela parte das atividades econômicas que
capturam valor a partir de processos biológicos e biorrecursos para produzir saúde,
crescimento e desenvolvimento sustentável”. Neste sentido, os autores enfatizam que resta
saber o grau em que o conhecimento biológico pode ser difundido na forma de aplicações
biotecnológicas, bem como as políticas que serão eficientes para promover o uso dessa nova
onda de inovações.
A Agenda 21, programa estabelecido em 1992 pela Conferência das Nações Unidas
sobre Ambiente e Desenvolvimento, assevera que a biotecnologia promete fazer uma
contribuição significante em possibilitar o desenvolvimento de, por exemplo, melhor cuidado
27
da saúde, melhor segurança alimentar por meio de práticas agrícolas sustentáveis, melhor
oferta de água potável, processos de desenvolvimento industriais mais eficientes para
transformação de matérias-primas, apoio a métodos sustentáveis de aflorestamento e
reflorestamento e também de destoxificação de resíduos.
Dentre os mecanismos de mercado, a política de Mercado de Carbono pode
representar mais um impulso para a ativação da cultura preservacionista, como possível
instrumento de efetivação de práticas socioambientais sustentáveis e viabilização de
investimentos para aproveitamento de resíduos e geração de energia. Usinas sucroalcooleiras
estão investindo em aumento de eficiência do processo de cogeração de energia (substituição
por caldeiras e turbinas mais eficientes), capaz de utilizar o bagaço da cana durante todo o ano
para gerar sua própria energia e vender o excedente para a rede brasileira de energia elétrica
(BARTHOLOMEU, 2006).
A evolução cultural que desenvolve um novo comportamento social em relação ao
modelo de gestão da produção em que pese administrar de forma mais consciente os dejetos
emitidos por estes processos fabris, faz surgir, como fruto dos debates norteados por anseios
sociais, um conjunto de regramento legal ou de convenções doutrinárias orientadas para a
preservação de recursos naturais. Na contramão deste processo estão interesses particulares de
clãs setoriais que resistem ao novo modelo de gestão ambiental de resíduos em nome da
lucratividade de produtos e serviços e da rentabilidade dos capitais investidos, fazendo com
que os custos externalizados pelos danos ambientais causados sejam compartilhados e arcados
pela sociedade.
Riggoto (2002) é enfático ao lamentar que no Brasil, apesar de haver uma legislação e
instituições destinadas a aplicar as leis de proteção ao meio ambiente, as atividades humanas,
sejam domésticas ou econômicas, continuem a provocar a degradação ambiental.
Bartholomeu (2006, p. 1) salienta nesse sentido que:
Apesar de a legislação ambiental brasileira ser abrangente, não se verifica, na
prática, o cumprimento de diversas regulamentações. Neste sentido, o problema
parece estar concentrado em duas frentes: por um lado há uma clara ineficiência no
processo de fiscalização e estabelecimento do enforcement e, por outro, há um
desconhecimento generalizado, por parte dos produtores, da existência de tais
legislações e normas.
Segundo Bartolomeu (2006), o investimento em práticas sustentáveis ainda é visto
como um custo desnecessário. Em alguns anos, entretanto, isto poderá representar vantagens
competitivas no comércio ou, de forma mais radical, a própria exclusão do produtor da
28
atividade. O fato de as práticas recomendadas não serem utilizadas provoca custos sociais na
forma de externalidades negativas. Deve-se, pois, consolidar a avaliação de impactos
ambientais em qualquer atividade potencialmente poluidora. Tal avaliação não deve ser vista
como mais uma barreira às atividades produtivas, mas como instrumento para identificar os
problemas ambientais de determinada atividade, servindo como subsídio para a elaboração de
políticas que ajam no sentido de minimizar os impactos negativos ao meio ambiente. A
identificação de saídas eficientes depende de investimento em ciência e tecnologia que, em
seguida, levarão a resoluções e normas legais que poderão ser cobradas pelos agentes
fiscalizadores.
Para Leite (2000), questões como os resíduos gerados pelos processos produtivos e as
externalidades merecem destaque e preocupação especial. Estes resíduos contaminam o solo,
os recursos hídricos e o ar, através da poluição local (queimadas) ou global (emitindo gases
que prejudicam o efeito estufa). O desafio é encontrar alternativas de tratamento e, se
possível, explorar de forma viável as potencialidades destes dejetos na produção de novas
formas de energia limpa, se possível, ou até mesmo a produção de energia pela redução da
emissão de poluentes. Estas formas alternativas de energia podem encontrar tratamento e,
quando possível, serem aproveitadas como fonte energética para o abastecimento da
propriedade ou até mesmo de pequenas comunidades locais como já vem sendo verificado em
algumas propriedades suinícolas (aproveitamento do biogás, produzido pelos dejetos), usinas
de açúcar e álcool (utilização do bagaço da cana para cogerar energia e dos dejetos da vinhaça
na fertirrigação das lavouras de cana-de-açúcar), madeireiras (serragem), beneficiadoras de
arroz (aproveitamento da palha de arroz), entre outros.
No que se refere às atividades econômicas, de acordo com Callenbach e Capra (2000),
a regulamentação sozinha não resultará em uma maneira nova ou criativa de pensar sobre
numerosos aspectos das operações de uma empresa. Para tanto, são necessárias metodologias
inovadoras. Todas as atividades econômicas causam impacto sobre a sociedade e o meio
ambiente e, portanto geram custos sociais e ecológicos.
As soluções apresentadas só serão efetivas se, por um lado, os problemas ambientais
forem bem identificados e quantificados (mediante parceria com universidades e centros de
pesquisa), se existirem alternativas viáveis para a adequação (tecnologias, financiamento,
crédito etc.) e, finalmente, se os produtores tiverem conhecimento tanto das exigências quanto
das alternativas existentes.
29
1.3.1 Licenciamento ambiental
O licenciamento ambiental emergiu formalmente no Brasil, assim como em boa parte
do mundo, na década de 1970. As primeiras iniciativas tinham como objetivo o controle da
poluição
industrial,
norteado
pelas
diretrizes
do
Segundo
Plano
Nacional
de
Desenvolvimento, em 1975. No início da década de 1980, mais exatamente em 1983, com a
Política Nacional de Meio Ambiente (PNMA), constituiu-se a base institucional e legal do
Licenciamento Ambiental aos moldes do modelo conhecido nos dias atuais.
Na institucionalização do modelo de licenciamento ambiental destacam-se dois órgãos
com importância fundamental dentro do PNMA: o Conselho Nacional do Meio Ambiente
(Conama) e o Sistema Nacional de Meio Ambiente (Sisnama), que tem por instância superior
o Conama. O Sisnama compreende o conjunto de instituições na esfera federal, estadual e
municipal que formulam e regulam a política ambiental e aplicam a legislação pertinente,
sendo responsáveis pelo licenciamento ambiental.
A emergência da consciência ambiental e o desenvolvimento da cultura de proteção
aos recursos naturais refletidos no conjunto de leis e regras burocráticas são importantes
barreiras para frear o ímpeto da utilização dos meios naturais públicos em benefício
particular, externalizando custos privados para que sejam compartilhados pela sociedade.
Para Ribeiro (1997), as preocupações da sociedade com os efeitos adversos do
desenvolvimento econômico e a visão de impactos ambientais mais abrangentes e interrelacionados estão muito além da regulação da poluição industrial pontual. Para tanto foi
estabelecida pela PNMA um conjunto de instrumentos metódicos e burocráticos como
instrumentos de regulação das atividades com potencial poluidor, tais como:
a) o estabelecimento de padrões de qualidade ambiental;
b) o zoneamento ambiental (ecológico-econômico);
c) a avaliação de impactos ambientais; e
d) o licenciamento e a revisão de atividades efetivas ou potencialmente poluidoras ou
causadoras de degradação ambiental.
Para Machado (1998), as Resoluções 001 e 011/1986 e a 237/1997 do Conama,
basicamente estabelecem os instrumentos mais comentados do sistema de licenciamento
ambiental brasileiro: o Estudo de Impacto Ambiental (EIA) e as licenças ambientais: prévia
(LP); de instalação (LI) e de operação (LO). A partir de 1997 o empreendedor passou a ter o
direito de participar do estabelecimento das exigências do estudo de impactos e
30
condicionantes de licenciamento, tornando-se também responsável pela contratação da equipe
técnica que realiza o Estudo de Impacto Ambiental.
No Rio Grande do Sul as atividades estatais de Licenciamento Ambiental são
realizadas pela Fundação Estadual de Proteção Ambiental (FEPAM), constituída por uma
fundação pública ligada à Secretaria Estadual da Saúde e do Meio Ambiente. Suas
incumbências específicas, além da operação de Licenciamento Ambiental das atividades de
impacto supralocal, são:
 aplicação da Legislação Ambiental e fiscalização em conjunto com os demais órgãos do
SEMA – Secretaria Estadual do Meio Ambiente, Municípios e Batalhão Ambiental da
Brigada Militar;
 avaliação, monitoramento e divulgação de informação sobre a qualidade ambiental. Este
trabalho é a base para a priorização e avaliação da efetividade das ações desenvolvidas
(como o próprio licenciamento ambiental);
 diagnóstico e planejamento para que a ação do Sistema Estadual de Proteção Ambiental
(SISEPRA), a avaliação das mudanças ambientais e o licenciamento ambiental de
atividades individuais sejam vistos dentro do marco de diretrizes regionais e da
capacidade suporte do ambiente;
 apoio, informação, orientação técnica e mobilização de outros atores importantes como os
Municípios, os Comitês de Bacia e organizações da sociedade civil.
O Serviço de Apoio às Micro e Pequenas (SEBRAE, 2001), em suas publicações
técnicas tem manifestado preocupação com o desenvolvimento das atividades fabris, em
escala industrial ou artesanal, de cachaça ou aguardente de cana-de-açúcar, atividade
considerada de grande potencial poluidor, embora o porte da maioria dos empreendimentos
seja de pequenos estabelecimentos industriais ou artesanais.
Por analogia, o SEBRAE também manifesta a preocupação dos grandes
estabelecimentos produtores de álcool, compostos de grandes usinas, com elevado potencial
poluidor e escala ampliada. Estas publicações deixam evidente a necessidade de
enquadramento normativo dos estabelecimentos, tanto os de escala industrial quanto artesanal
para a produção de álcool e para de cachaça ou aguardente. A partir dessas publicações é
possível identificar um roteiro recomendado para o licenciamento ambiental dessas atividades
a partir do conjunto normativo emitido pela legislação SEAMA:
 Licença Prévia (LP) – emitida na fase inicial do planejamento do empreendimento,
visando à aprovação da área pretendida.
31
 Licença de Instalação (LI) – emitida com base no cumprimento das condicionantes
(exigências) contidas no verso da Licença Prévia (LP) e documentos/informações
necessários. Essa Licença autoriza o início da implantação da atividade.
 Licença de Operação (LO) – É emitida após a instalação dos equipamentos e toda a
infraestrutura necessária à operação do empreendimento, bem como a implantação dos
sistemas de controle de poluição hídrica, atmosférica e de resíduos sólidos, ruídos e
vibrações. Com esta Licença, o empreendedor poderá iniciar a operação de suas
atividades, devendo, porém, ter cumprido as condicionantes (exigências) anexas à Licença
de Instalação. O prazo de validade dessa Licença varia de quatro a seis anos, sendo este
prazo determinado pelo próprio órgão ambiental que defere o licenciamento.
1.4 CARACTERIZAÇÃO E DESTINO DOS RESÍDUOS DA PRODUÇÃO DE CACHAÇA
E ÁLCOOL
A compreensão do fluxograma de produção de derivados de cana é o passo inicial para
o planejamento e gestão do conjunto de resíduos produzidos, sendo também condicionante
para adaptar plantas agroindustriais ao correto manejo destes dejetos, desde a produção até o
destino final, tanto para os rejeitos sólidos como para os rejeitos líquidos resultantes da
manufatura. Neste sentido, o bagaço e as cinzas produzidos são oriundos de etapas diferentes
do processo fabril. O bagaço é originado da moagem da cana-de-açúcar, que depois de
estabilizado em ambiente coberto, para que haja a redução de líquidos capazes de promover a
fermentação, poderá ser disposto em solo agrícola, apresentando-se como excelente material
de cobertura de solo. Já as cinzas são produzidas a partir da combustão do próprio bagaço
utilizado para aquecimento de caldeiras ou também da combustão de outras fortes de energia,
a exemplo da lenha. As cinzas podem ser dispostas em solo agrícola após a redução da
temperatura, não havendo a necessidade de nenhum processo adicional.
A vinhaça é resultante da fermentação do caldo da cana-de-açúcar, que destilado
resultará no produto desejado – etanol ou cachaça, e o restante representa o resíduo não
aproveitável, frequentemente é disposto em solo agrícola após a redução da temperatura
resultante do processo de destilação.
A vinhaça é o produto de calda na destilação do licor de fermentação do álcool ou da
cachaça da cana-de-açúcar, ou seja, é o líquido residual também conhecido regionalmente por
restilo ou vinhoto (SILVA; GRIEBELER; BORGES, 2007). Este resíduo é conhecido em
muitos países do mundo como subproduto na produção de álcool e bebidas alcoólicas
32
oriundas das mais diferentes matérias primas, a exemplo da cana-de-açúcar no Brasil, da
beterraba na Europa, e do milho nos Estado Unidos. Da mesma forma como se origina dos
mais diferentes materiais, também sua composição sofre alterações de propriedades químicas
e biológicas peculiares a cada tipo de materiais que lhe dão origem.
A vinhaça ou vinhoto é o principal resíduo resultante do beneficiamento da cana-deaçúcar em seus derivados – o etanol, o açúcar e a cachaça. De acordo com Silva, Griebeler e
Borges (2007), para cada litro de etanol produzido restam entre 10 e 18 litros de vinhaça
líquida. Para Oliveira et al. (2009), o volume residual da vinhaça na produção de cachaça
artesanal ou industrial, libera, em média, entre 8 e 10 litros para cada litro de produto final
manufaturado. Ainda de acordo com Silva, Griebeler e Borges (2007), o constituinte principal
da vinhaça é a matéria orgânica, constituída basicamente por ácidos orgânicos e, em menores
quantidades, por cátions como o potássio, o cálcio e o magnésio, sendo que sua riqueza
nutricional está ligada à origem do mosto.
Os mesmos autores relatam grandes desequilíbrios ambientais causados por esta
disposição em mananciais e águas superficiais, causando a mortandade de peixes e outros
animais. Em função disso há preocupação com o teor químico e biológico da vinhaça e o
impacto causado ao meio ambiente pela sua disposição indiscriminada e inadequada. A partir
dessas catástrofes surgiu o interesse de ambientalistas e estudiosos e, em alguns casos, das
empresas causadoras, em reduzir os danos causados por detritos resultantes da produção de
açúcar e, posteriormente, da produção de álcool.
Freire e Cortez (2000) afirmam que a disposição dos resíduos da vinhaça de forma
incorreta e indiscriminada na natureza pode causar a contaminação dos recursos hídricos,
além de alterar as propriedades físicas e químicas do solo. A preocupação em reduzir ou
neutralizar os impactos causados pela disposição deve ser uma preocupação preliminar de
quem se propõe beneficiar cana, especialmente na produção de etanol e da cachaça.
A vinhaça é constituída de um líquido de cor marrom escuro, mal cheiroso, de
natureza ácida, de elevada Demanda Bioquímica de Oxigênio (DBO), corrosivo e altamente
poluidor (CRUZ et al., 2008). É composta de aproximadamente 93% de água e 7% de sólidos.
Dos sólidos, 75% são representados por matéria orgânica e 25% por compostos minerais
diversos.
Freire e Cortez (2000) sustentam que a disposição destes resíduos, em função de suas
características fisico-químicas, de forma indiscriminada e sem controle no ambiente natural,
pode causar severos impactos sobre o meio. Gloeden et al. (1991) e Hassuda (1989) destacam
os constituintes da vinhaça que representam maior risco aos mananciais subterrâneos de água.
33
O cloro, o carbono, o amônio e o nitrogênio orgânico podem ser responsáveis, quando
atingirem águas subterrâneas, por comprometerem a qualidade desses recursos hídricos;
infiltrados no solo podem liberar em águas subterrâneas, a amônia, o magnésio, o alumínio, o
ferro, o manganês e também matéria orgânica.
Os mesmos elementos químicos encontrados na vinhaça e que lhe conferem a
condição de poluente, aplicados de forma controlada podem apresentar benefícios ao solo
como fertilizante. Entretanto, a alta concentração deste resíduo em limitado espaço físico
pode causar desequilíbrio geofísico do solo, além contaminar águas superficiais e profundas
em função de suas elevadas Demandas Biológicas de Oxigênio (DBO) e Demandas Químicas
de Oxigênio (DQB), ressalta Gloeden et al. (1991). Outro fator que causa desequilíbrio
ambiental é a falta de controle e a elevada temperatura de saída dos destiladores dos resíduos
depositados na natureza (SILVA, GRIEBELER; BORGES, 2007).
Freire e Cortez (apud SILVA; GRIEBELER; BORGES, 2007) afirmam que o alto
poder fertilizante em função de sua composição química e biológica contrasta com a alta
potencialidade poluidora e nociva à fauna, flora, microfauna e microflora das águas doces,
além de afugentar a fauna marinha que vem às costas brasileiras para procriação.
Hassuda (1989) apresenta as características do composto sólido da vinhaça. Destaca
quantidades significantes de potássio, de nitrogênio, fósforo, cálcio e magnésio. Também
destaca a presença de zinco, ferro, manganês e cobre, porém estes em quantidades menores.
Para Silva, Griebeler e Borges (2007), a vinhaça é caracterizada como o efluente de
destilarias com alto poder poluente e alto valor fertilizante. O poder poluente, cerca de 100
vezes maior que o do esgoto doméstico, decorre de sua riqueza de matéria orgânica, baixo pH,
elevada corrosividade e altos índices de Demanda Bioquímica de Oxigênio (DBO).
O quadro 1 apresenta a caracterização físico-química da vinhaça elaborado por Elia
Neto e Nakahodo (1995), a partir de um estudo analítico de 64 amostras coletadas em 28
usinas no Estado de São Paulo. Conforme os autores, o teor ácido da vinhaça provoca, a partir
da atividade microbiana por ela desenvolvida, a redução da acidez dos solos aonde são
dispostos estes dejetos.
34
Quadro 1. Caracterização físico-química da vinhaça.
Fonte: Elia Neto e Nakahodo (1995).
Glória e Orlando Filho (1983) enumeram os seguintes efeitos da disposição da vinhaça
no solo: a) elevação do pH; b) aumento da disponibilidade de alguns íons; c) aumento da
capacidade de troca catiônica (CTC); aumento da capacidade de retenção de água; e e)
melhoria da estrutura física do solo. Sustentam ainda que a vinhaça é agente de aumento da
população e capacidade microbiana do solo.
A matéria orgânica pode ser considerada fator importante na produtividade agrícola
devido à influência que exerce sobre as propriedades químicas, físicas e biológicas do solo.
35
No momento em que esta matéria orgânica contida na vinhaça é incorporada ao solo, ela é
colonizada por fungos, que a transformam em humos, neutralizando a acidez do meio e
preparando, deste modo, o caminho para a proliferação bacteriana (SILVA; GRIEBELER;
BORGES, 2007). Estes autores relatam a existência de estudos que comprovam o aumento da
eficiência dos fertilizantes aplicados em associação com a vinhaça, favorecendo o
desenvolvimento de microrganismos que atuam na mineralização e imobilização do
nitrogênio e sua nitrificação, desnitrificação e fixação biológica, assim como de
microrganismos participantes dos ciclos biogeoquímicos de outros elementos.
De acordo com Neves, Lima e Dobereiner (1983), a distribuição de vinhaça nos solos
e sua incorporação com a matéria orgânica podem permitir condições físicas adequadas,
capazes de promover maior disponibilidade e mobilidade de nutrientes em função de a
vinhaça apresentar-se de forma líquida e, portanto, mais solúvel. No entanto, Lyra, Rolim e
Silva (2003) advertem para o aumento da salinização dos solos a partir da utilização da
vinhaça associada com outros materiais orgânicos disponíveis no próprio solo e no caso da
colheita da cana-de-açúcar sem a queima da palha, o que resulta em abundante volume de
matéria orgânica. A salinização seria o resultado da aplicação prolongada, por muitos anos, de
vinhaça nos solos agrícolas e a reduzida lixiviação de nutrientes, ou seja, o baixo arraste de
sais minerais não absorvidos pelas plantas e, por consequência, o acúmulo residual nos solos
superficiais.
Outro problema correlato à mineralização deste efluente nos solos diz respeito à
possibilidade de contaminação do lençol freático por nitrato. Madejón et al. (apud SILVA;
GRIEBELER; BORGES, 2007) observam que embora os teores de nitrato se elevem nos
solos a partir da retirada da vegetação, por advento da colheita, a lixiviação, ou seja, o arraste
de nitratos para as camadas mais profundas é irrelevante e inexpressivo, tendo em vista que
estes permanecem em camadas pouco profundas do solo. Os autores chamam a atenção para a
necessidade de evitar a utilização de áreas próximas às nascentes d’água ou locais com lençol
freático superficial.
A preocupação com a contaminação de fontes de água superficiais e profundas é
crescente e constante, assim como o aumento da demanda pelos combustíveis renováveis não
fósseis que provocaram o aumento da produção de etanol e ou a transformação da cana-deaçúcar e outros derivados que apresentam a vinhaça como resíduo industrial. Canellas et al.
(2003) relacionam a utilização da vinhaça e a contaminação de águas subterrâneas por
potássio, decorrente do processo de lixiviação como pouco expressiva. Cunha et al. (apud
SILVA; GRIEBELER; BORGES, 2007) já afirmavam muito antes que o acúmulo dos níveis
36
de potássio disponibilizados ao solo através de fertirrigação pela vinhaça, resultante da
manufatura de derivados da cana-de-açúcar, se concentrava numa camada de solo aproximada
de 0,40 a 0,50m de profundidade. Mesmo em solos com alta capacidade de infiltração, o
arraste de potássio para as camadas mais profundas e o lençol freático foi insignificante.
A dosagem da aplicação é fator determinante no equilíbrio da utilização da vinhaça
como fertilizante. Glória e Magro (1977) discutem formas racionais de aplicação da vinhaça
em solo agrícola com vantagens produtivas na substituição parcial ou total da adubação
química, com o aproveitamento do teor de potássio contido nestes dejetos. Os autores
comprovam que a redução ou neutralização dos impactos sobre o meio e o melhor
aproveitamento como fertilizante são promovidos por doses menores.
Neste contexto cabe discutir o custo viável para utilização de técnicas adequadas de
distribuição em volume racional. O problema está ligado aos altos custos da frota, com
combustíveis, lubrificantes, pessoal e manutenção, despendidos para transportar estes dejetos
às áreas de aplicação.
A questão da dosagem está diretamente ligada ao tipo de dejeto que vai ser distribuído.
A UNESP (2007) discute a concentração da vinhaça, se diluída com águas residuárias,
aquelas provenientes do processo limpeza, condensação, coluna barométrica e lavagem da
cana. A vinhaça também pode ser concentrada, condição em que elimina um percentual de
água por meio de processo específico. Cabe uma avaliação financeira dos custos envolvidos
para aumentar a concentração de nutrientes, diminuindo o volume de água e o custo de
transporte para os locais aonde serão dispostos em solo agrícola. O alto custo para aumentar a
concentração pode inviabilizar o processo, sendo mais vantajoso o transporte e a disposição
diluída. A distância entre as usinas e o local de disposição da vinhaça é outra variável que
influencia e determina a conveniência financeira entre a distribuição concentrada ou diluída.
A distância é fator que interfere no volume de vinhaça distribuída nas lavouras. A
possibilidade de distribuição em locais próximos às usinas acaba determinando, em função
dos custos de transportes, uma distribuição prioritária nestas áreas. Assim, é comum que
ocorram excessos que podem comprometer os solos e, por consequência, as culturas destas
áreas atingidas.
Considerando a produção de um hectare de cana-de-açúcar, com potencial produtivo
de 100 toneladas e aproveitamento de 70% após a moagem, e considerando uma produção
média de 13 litros de vinhaça para cada litro de álcool, um hectare produz aproximadamente
65.000 litros de vinhaça não diluída e não concentrada. Este volume não é considerado
excessivo, de acordo com Silva, Griebeler e Borges (2007). Assim, áreas com a cultura da
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cana-de-açúcar podem receber, sem excessos, a vinhaça relativa aos materiais produzidos na
mesma área. O custo de transporte pode onerar o processo, mas há vantagens na redução de
impactos sobre o meio e na fertilização sem utilização de adubação química.
Silva, Griebeler e Borges (2007) apresentam o resultado da aplicação a campo de 100
m³/ha e concluem que a adição deste volume de vinhaça ao solo na cultura da cana, com
elevada concentração de potássio, atrasou consideravelmente a maturação da cultura, reduziu
o teor de sacarose e o acúmulo de cinzas no caldo, em prejuízo de aproveitamento de
materiais.
Também há interesse no impacto que pode ser causado aos mananciais hídricos
superficiais pela possível lixiviação de componentes químicos e biológicos deste subproduto
oriundo do processo industrial, e ou a contaminação do lençol freático pela infiltração destes
mesmos componentes para as camadas mais profundas dos solos. Em ambos os casos haverá
uma interferência direta do tipo de solo e do seu poder de absorção e condutividade. Silva,
Griebeler e Borges (2007) observam e expõem que a capacidade de infiltração de água de um
solo é uma propriedade inerente e depende de sua granulometria, distribuição e tamanho dos
poros, umidade antecedente à chuva, condição superficial do solo e presença de adensamento
superficial.
A retenção de águas ocorrerá em função do estado de saturação superficial oferecida
pelos diferentes tipos de solo, mas dependerá também do microrrelevo superficial, rugosidade
e declividade do terreno e, principalmente, todos estes fatores combinados pela presença ou
não de vegetação de cobertura. A existência de uma vegetação de cobertura contribui de
maneira decisiva para a retenção dos componentes químicos e biológicos contidos na vinhaça
e o seu aproveitamento como nutriente pela vegetação. A retenção dos nutrientes evitando seu
escoamento por deflúvio, fenômeno de escoamento das águas da chuva, permite que sejam
aproveitados pela vegetação, objeto alvo da fertirrigação (SILVA; GRIEBELER; BORGES,
2007).
A forma de disposição da vinhaça também é determinante no aproveitamento dos
rejeitos como fertilizante com maior ou menor impacto sobre o meio. A UNESP (2007) faz
um relato histórico do modelo de armazenagem e aplicação da vinhaça a partir dos anos 50 do
século 20, ocasião em que se percebeu o maior impacto pela disposição inadequada da
vinhaça na natureza. No princípio, o detrito resultante da produção de açúcar era ignorado e
lançado na natureza sem qualquer controle. A partir das primeiras observações, com provas de
danos ambientais pela poluição de rios e morte de peixes e outros animais, a gestão de
resíduos da cana-de-açúcar tomou importância. Nesta época foram proibidos os lançamentos
38
em rios e córregos, dando origem às áreas de sacrifício, compostas por grandes lagoas, em
áreas próximas às usinas, ficando estas áreas inutilizadas para a agricultura, em razão da
salinidade do solo, resultante do depósito contínuo da vinhaça por longo período de tempo.
A busca por formas mais adequada de lançamento da vinhaça, sua utilização como
fertilizantes e o volume adequado dominam a preocupação de ambientalistas, empreendedores
do segmento sucroalcooleiro e a sociedade. A pesquisa científica e as evoluções tecnológicas
proporcionaram a associação de modernas técnicas de implantação e a manutenção da cultura
da cana-de-açúcar. O plantio no sistema de sulcos em nível proporciona distribuição mais
uniforme da vinhaça nos talhões. As barreiras criadas pelos sulcos permitem o
armazenamento e a retenção dos materiais distribuídos.
1.5 NORMATIZAÇÃO E ASPECTOS LEGAIS DO MANEJO DE RESÍDUOS DE CANA
A defesa dos interesses comuns nas relações sociais nem sempre pode aguardar pela
iniciativa espontânea da consciência e da responsabilidade de quem por ventura cause danos
ao meio ambiente pela disposição de dejetos oriundos dos processos produtivos. Ser
competitivo significa produzir com menores custos. Isso implica racionar gastos,
especialmente aqueles não ligados à produção e que, portanto, podem ser classificados como
evitáveis. Para Soares e Porto (2009), os produtores geralmente não estão interessados nos
possíveis danos que possam ser causados ao meio ambiente e pelos custos sociais
externalizados a partir de suas atividades produtivas.
Assim, as atividades produtivas, cuja emissão de dejetos e poluentes possa causar
impacto ao meio ambiente, não podem aguardar pela espontaneidade de quem externaliza os
ônus privados. O poder coercitivo do Estado deve normatizar a conduta desses produtores por
meio de um conjunto de normas gerais e específicas atinentes à administração de resíduos
resultantes dos processos de manufatura e dispostos no meio ambiente.
A Fundação Estadual de Licenciamento Ambiental (FEPAM) desenvolve as atividades
de Licenciamento Ambiental, tendo por base a Lei Federal nº 4.771/1965 – Código Florestal
Brasileiro, e Lei Federal nº 6.938/1981, que dispõe sobre a Política Nacional de Meio
Ambiente, além da Lei Estadual nº 11.520/2000 – Código Estadual de Meio Ambiente do Rio
Grande do Sul e a Legislação do Conselho Estadual de Meio Ambiente (CEMA),
especialmente as de nº 11/2000, 38/2003, 110/2005, 005/1998, 307/2002. No entanto, inexiste
uma legislação própria que normatize a gestão de dejetos oriundos da indústria de derivados
da cana-de-açúcar, em parte, justificada, pela existência de apenas uma usina de álcool sobre
39
território do Estado e também em função do pequeno porte dos demais estabelecimentos
beneficiadores de produtos derivados da cana-de-açúcar. A falta de um conjunto de regras ou
de estudos científicos que possam ser utilizados como indicadores de gestão dos dejetos da
agroindústria da cana e seus derivados é suprida, mesmo que de forma precária, pela
legislação similar apoiada em estudos científicos da Companhia de Tecnologia e Saneamento
Ambiental do Estado de São Paulo (CETESB).
Em publicação a respeito, a Companhia de Tecnologia e Saneamento Ambiental do
Estado de São Paulo (CETESB) editou o Procedimento nº 4.231, de 2006 – Vinhaça –
Critérios e Procedimentos para Aplicação no Solo Agrícola, por meio do qual faz uma
relação da legislação vigente e estabelece os critérios e procedimentos para armazenamento,
transporte e aplicação da vinhaça gerada pela produção sucroalcooleira no processamento de
cana-de-açúcar, no solo do Estado de São Paulo. A limitação territorial da normatização não
deixa de ser um indicativo importante para ser observado pelas outras unidades da federação,
adotando procedimentos correlatos, apoiados em estudos aprofundados daquele órgão em
análise do impacto causado pela disposição desordenadas dos dejetos.
A normatização brasileira está apoiada na Lei n. 4.771, de 15 de setembro de 1965,
que edita o Código Florestal brasileiro. Além desta lei, a Resolução nº 15, do Conselho
Nacional de Recursos Hídricos (CNRH), de 01 de junho de 2001, estabelece as diretrizes para
a gestão integrada das águas superficiais, subterrâneas e meteóricas. A Portaria do Ministério
do Interior, nº 158, de 3 de novembro de 1980, que dispõe sobre o lançamento de vinhoto em
coleções hídricas e sobre efluentes de destilarias e usinas de açúcar, também integra a
legislação aplicável à gestão de dejetos em solo agrícola.
De acordo com a normatização da CETESB (2006) e da técnica de fertirrigação, a área
de armazenagem provisória dos efluentes, assim como a área em que será disposta
definitivamente a vinhaça, não pode estar contida em Áreas de Preservação Permanente,
assim definidas pelo Código Florestal brasileiro, toda área enquadrada nos arts 2º e 3º da Lei
nº 4.771, coberta ou não por vegetação nativa, com a função ambiental de preservar os
recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica, a biodiversidade, o fluxo gênico de
fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem-estar das populações humanas. Igualmente
não pode se instalar em áreas de Reserva Legal, definida no Código Florestal brasileiro, Lei
Federal nº 4.771 e alterado pela Lei Federal nº 7.803 de 18 de julho de 1989 e pelas medidas
provisórias 2.166 e 2.167, de 2001. E tampouco nos limites da zona de amortecimento
definidos para as Unidades de Conservação e Proteção Integral, definidas pela Lei Federal nº
9.985 de 18 de julho de 2000, que compreende as Estações Ecológicas, as Reservas
40
Biológicas, os Parques Nacionais, os Monumentos Naturais e os Refúgios da Vida Silvestre.
No caso de Áreas de Proteção Ambiental, a aplicação da vinhaça não poderá estar em
desacordo com os seus regulamentos ou em casos destas áreas ainda não estarem
regulamentadas, a aplicação da vinhaça deverá ser aprovada pelo seu órgão gestor. Em
relação às Áreas de Preservação Permanente deve ser respeitada a distância de seis metros
para aplicação da vinhaça.
As Áreas de Preservação Permanente, definidas pelo Código Florestal Brasileiro de
1965, determinam a largura de 30 metros para matas ciliares em cursos d’água com até 10
metros de largura; a largura de 50 metros nas margens de rios entre 10 e 50 metros de largura,
e ao redor de nascentes de qualquer dimensão; a largura de 100 metros nas margens de rios
entre 50 e 200 metros de largura; a largura de 200 metros para rios entre 200 e 600 metros de
largura; a largura de 500 metros nas margens de rios com largura superior a 600 metros; a
largura 100 metros nas bordas de chapadas.
Além dessas condições, a regulamentação da CETESB (2006) ainda prevê a proibição
da aplicação de vinhaça em Áreas de Proteção de Poços ou em áreas em que a profundidade
do aquífero livre, no momento da aplicação da vinhaça, seja de, no mínimo, 1,50 metros. A
normatização também proíbe a aplicação dos resíduos da vinhaça provenientes das destilarias
e usinas em área de domínio das ferrovias e rodovias federais e estaduais, ou de área com
menos de 1000 metros de distância do perímetro urbano de concentrações populacionais.
A mesma regulamentação disciplina a aplicação da vinhaça em áreas de declive. Em
áreas com declividade menor que 15% não há regramento ou recomendação, mas para áreas
com declividade igual ou superior deverão ser adotadas medidas adequadas para evitar a
erosão. Para estes casos é recomendada, além das práticas conservacionistas, a escarificação
do solo. Ainda, se após este procedimento continuar o solo com capacidade limitada de
absorção, a distribuição deverá ser parcelada. A capacidade de absorção do solo deve ser
superior às doses distribuídas, permitindo que haja a absorção integral da vinhaça disposta.
Em relação aos tanques de armazenamento provisório, para posterior distribuição
definitiva em solo agrícola através da fertirrigação, deverão ser observadas normas relativas à
impermeabilização destes locais. Nesta proteção deverá ser utilizada geomembrana ou
material com efeito superior a esta. Também deverão ser posicionados quatro poços de
monitoramento (um a montante e três a jusante), localizados de acordo com o mapa
potenciométrico e construídos conforme a norma NBR 13.895:1997. A implantação de
drenos-testemunha, no entanto, dispensa a instalação de poços de monitoramento. Em relação
a estes poços de monitoramento ou os drenos-testemunha, deverão ser determinados os
41
seguintes parâmetros, devendo os mesmos atender aos padrões da legislação pertinente em
relação à: pH, dureza, sulfato, manganês, alumínio, ferro, nitrogênio nitrato, nitrogênio nitrito,
nitrogênio amoniacal, nitrogênio Kjeldhal, potássio, cálcio, cloreto, sólidos dissolvidos totais,
condutividade elétrica e fenóis totais. A observação deverá ocorrer em amostragens
semestrais, cuja metodologia de análise deve considerar os procedimentos consagrados para
suas versões vigentes. No caso específico da legislação criada para o Estado de São Paulo,
haverá o monitoramento dos resultados pelos órgãos gestores da própria CETESB,
comparados e de acordo com os padrões de potabilidade estabelecidos na Portaria do
Ministério da Saúde nº 518, de 25/03/2004.
A normatização pela CETESB (2006) no Estado de São Paulo suspendeu as
utilizações e vetou a criação das chamadas áreas de sacrifício, entendidas por reservatórios
naturais, canais mestres e canais de condução sem impermeabilização por geomembrana ou
outro material substituto com qualidade superior. Os reservatórios, assim como os canais, têm
a função de armazenar os dejetos que serão distribuídos em solo agrícola, no entanto, sofrem
maior impacto da carga de poluente da vinhaça. A mesma norma prescreve ainda a
necessidade de avaliação do solo e das águas das áreas de sacrifício, com o intuito de avaliar a
qualidade da água e sua contaminação por meio de poço, na proporção de 1 para cada 5.000
metros quadrados de reservatório. Estes poços de monitoramento instalados devem ter seção
filtrante com comprimento máximo de dois metros, instalada na parte superficial do aquífero
freático. As amostras coletadas devem ser analisadas e comparadas com os padrões de
potabilidade da água, de acordo com a Portaria nº 518/04 do Ministério da Saúde.
A publicação normativa da CETESB (2006) estabelece também normas específicas
que faz previsão de um Plano de Aplicação de Vinhaça para enriquecimento de solo agrícola.
As usinas devem apresentar antecipadamente e terem aprovados pela própria CETESB um
memorial descritivo da prática de aplicação pretendida, acompanhado de plano com escala de
1:20.000 ou superior, contendo as taxas indicativas de dosagem a serem aplicadas em m³/ha,
diferenciadas em cores, com intervalos de aplicações a cada 150m³/ha. As plantas e planilhas
que compõem o memorial descritivo devem indicar, no mínimo: a localização dos tanques de
armazenamento e dos canais mestres ou primários de uso permanente de distribuição; a
localização dos cursos d’água; poços utilizados para abastecimento; dados da geologia e
hidrogeologia local; resultados analíticos dos solos; as áreas de interesse ambiental e forma e
dosagem de aplicação de vinhaça.
A concentração indicada pela normatização da CETESB (2006) leva em consideração
o limite de potássio no solo que não pode exceder a 5% da Capacidade de Troca Catiônica
42
(CTC). Quando esse limite for atingido, a aplicação de vinhaça ficará restrita à reposição
deste nutriente em função da extração média pela cultura, que é de 185 kg de K2O por hectare,
por corte. Para aplicação como fertilizante esta vinhaça deve ser caracterizada quanto aos
seguintes parâmetros: pH, resíduo não filtrável total, dureza, condutividade elétrica,
nitrogênio nitrato, nitrogênio nitrito, nitrogênio amoniacal, nitrogênio Kjeldhal, sódio, cálcio,
potássio, magnésio, sulfato, fósforo total, DBO (Demanda Bioquímica de Oxigênio) e DQB
(Demanda Química de Oxigênio). A influência do tipo de solo que receberá a aplicação da
vinhaça também deve ter sua constituição química analisada. Esta amostra determinará o tipo
de solo e a capacidade de troca catiônica que demandará o volume de potássio a ser atendido
pela disposição da vinhaça.
1.5.1 Outras alternativas de destinação da vinhaça
As formas alternativas para a utilização da vinhaça vêm despertando um crescente
interesse de estudiosos, pesquisadores e empresários do segmento sucroalcooleiro na tentativa
de encontrar um meio econômico-financeiro viável e ambientalmente correto na gestão dos
resíduos provenientes da industrialização dos derivados da cana-de-açúcar, especialmente do
açúcar, do etanol e da cachaça. A identificação da viabilidade econômica relativa à demanda
de mercado para os bens e serviços oriundos dessas formas alternativas de gestão de dejetos e
a viabilidade financeira a partir do equilíbrio entre benefícios e custos envolvidos no processo
são premissas básicas.
Salomon (2007) desenvolveu estudo para aproveitamento da vinhaça na produção de
biogás em sistema de biodigestores, obtendo ótimos resultados, confirmando vantagens não
somente ao meio ambiente, mas também na questão do gerenciamento dos resíduos no país,
aumento de emprego e geração de eletricidade, etc. O plano de viabilidade econômica, no
Brasil, é sustentado por um potencial de demanda de energia que pode ser suprido pela
utilização do biogás, visto que a viabilidade econômica desta tecnologia seria possível em
locais com altas taxas de produção de biogás. Com isso, parte desta energia seria utilizada na
própria instalação onde se produziu o biogás e a outra parte poderia ser vendida à
concessionária de energia elétrica local.
Ainda de acordo com Salomon (2007), a geração de biogás e, consequentemente, a
energia proveniente da biodigestão da vinhaça, são apresentadas como alternativa de
tratamento da vinhaça no Brasil. O processo traz ainda benefícios como a utilização de uma
fonte alternativa de energia a partir de um gás combustível, valorização do resíduo, redução
43
de odores e ainda geração de um efluente fertilizante. Por outro lado, a biodigestão anaeróbia
da vinhaça não reduz o principal problema enfrentado no processo de adubação do solo que é
a não redução do teor de potássio no efluente. O seu potencial poluidor, que é o teor de
matéria orgânica, é reduzido no processo, mas os nutrientes permanecem. Acredita-se que esta
seja a principal razão para as usinas não utilizarem a biodigestão anaeróbia das vinhaças.
Pompermayer e Paula Júnior (2003) realizaram uma análise técnico-econômica da
produção brasileira de biogás a partir da biodigestão anaeróbia da vinhaça da cana-de-açúcar.
A avaliação foi baseada em três alternativas de aproveitamento do biogás gerado: a) todo o
biogás usado em veículos, após purificação e compressão; b) todo o biogás usado em
caldeiras e o efluente tratado disposto como fertilizante na plantação de cana-de-açúcar; c) 1/3
do biogás usado em veículos e o restante queimado em caldeiras e o efluente disposto como
fertilizante na plantação de cana-de-açúcar. Tomaram-se como referência as duas primeiras
alternativas e compararam-se os custos de produção do biogás com os preços de alguns
energéticos potencialmente concorrentes. Os resultados indicam grande potencial de produção
e competitividade com vários energéticos, particularmente os de origem fóssil.
Entretanto, problemas podem ocorrer na comercialização da energia elétrica produzida
com combustão do gás produzido por biodigestores movidos por vinhaça. A descontinuidade,
analisando a produção concentrada nas safras da cana e a estagnação na entressafra, prejudica
o fluxo de fornecimento e qualquer negociação envolvendo um fornecimento descontinuado.
As concessionárias de energia necessitam de qualidade de energia e de fornecimento
contínuo, o que na utilização de energia proveniente do biogás se torna difícil, além de
apresentar um valor de venda de eletricidade mais cara (SALOMON, 2007).
A utilização da vinhaça não fica restrita à técnica de fertirrigação para uso no solo
agrícola, especialmente para a cultura da cana-de-açúcar. Diversos trabalhos prescrevem a
possibilidade de utilização da vinhaça como suplemento alimentar em rações para ruminantes
na forma de leveduras concentradas ou adicionada ao bagaço da cana proveniente do mesmo
processo produtivo do açúcar, do etanol ou de bebidas destiladas à base de cana, a exemplo da
cachaça. Lacorte, Bose e Ripoli (1989) descrevem experimentos que utilizaram a levedura
seca concentrada da vinhaça adicionada ao bagaço de cana-de-açúcar auto-hidrolizado
(BAH), administrada para bovinos em regime de confinamento. Para proporcionarem ganhos
de peso de um kg por dia, as rações formuladas continham 50% de BAH como fonte de
volumoso. Como fonte de proteína a experiência utilizou três materiais distintos: farelo de
algodão, levedura da vinhaça seca e vinhaça concentrada na proporção 12,7%. A estas fontes
de proteínas foram adicionados 17,8% de milho e 12,7% de cana-de-açúcar in natura, picada
44
como volumoso complementar. Os resultados são indicativos de que a utilização da vinhaça
associada ao bagaço auto-hidrolizado são formas de dar um destino equilibrado e viável do
ponto de vista socioambiental. Lacorte, Bose e Ripoli (1989) relatam ainda que os melhores
resultados foram obtidos pela adição do farelo de algodão, com ganho diário de 0,843 kg/dia,
e da levedura seca de vinhaça, de 0,989 kg/dia, adicionados às rações que utilizaram o BAH
como material volumoso.
1.5.2 Destino do bagaço da cana-de-açúcar
O bagaço proveniente da industrialização da cana-de-açúcar em seus derivados sempre
representou preocupação para as empresas produtoras em função do significativo volume, que
representa 25% a 30% da cana processada. Esta preocupação se deve muito mais pelo espaço
ocupado pelo resíduo do que pelo seu potencial contaminante,
Botão e Lacava (2003) afirmam que o resíduo proveniente da moagem da cana não
apresenta impactos significativos ao meio ambiente. Composto basicamente por fibras de
celulose, o bagaço apresenta degradação relativamente rápida, em média de dois a três anos,
graças à ação macro e microbiana em condições ambientais ideais de umidade, temperatura e
insolação. Algumas áreas utilizadas para sua decomposição, no entanto, tendem a ficar
inutilizadas para o cultivo por tempo relativamente maior em função do excesso de matéria
orgânica remanescente e de difícil remoção.
A utilização do bagaço de cana-de-açúcar como alimentação de ruminantes, na forma
in natura, apresenta restrições devido à baixa digestibilidade em função do grande volume de
fibras lignocelulósicas que compõem este volumoso (LACORTE; BOSE; RIPOLI, 1989). A
sua utilização para consumo animal demanda a necessidade de aumentar a digestibilidade e a
palatabilidade destes materiais. O bagaço oriundo das destilarias de cachaça, muito em função
da utilização de tecnologias menos avançadas para extração do caldo da cana, possui um teor
de palatabilidade melhor do que aqueles materiais provenientes de usinas de açúcar e álcool,
de porte maior e que utilizam tecnologias mais avançadas. Estas realizam moagem da cana
triturada e a posterior lavagem a quente, para uma última prensagem, determinando
aproveitamento dos materiais muito superior às pequenas beneficiadoras. Enfim, a falta de
palatabilidade e digestibilidade deve ser compensada por processo químico que transforme
estes materiais em condições de uso como ração animal. Uma das formas mais utilizadas, de
acordo com Lacorte, Bose e Ripoli (1989), é a auto-hidrolização do bagaço mediante um
processo que submete estes materiais a uma alta pressão e alta temperatura por determinado
45
tempo, para em seguida promover uma rápida descompressão. De acordo com os autores, o
bagaço que passou pelo processo de auto-hidrolização apresenta, se comparado com o bagaço
in natura, uma diminuição considerável do teor de Fibra Detergente Neutro (FND). Isso está
relacionado, provavelmente, ao desaparecimento da hemicelulose; acréscimo no teor de
extrato etéreo; manutenção inalterada dos níveis de celulose, lignina e proteína; redução da
fibra bruta e incremento no teor extrativo não nitrogenado.
Lacorte, Bose e Ripoli (1989) mencionam certos limites para o resultado conclusivo
de utilização do BAH como ração animal, podendo variar entre 32% e 60% da matéria seca da
ração a ser administradas aos bovinos.
Há bastante tempo o bagaço já vem sendo utilizado como fonte de energia nas usinas
produtoras de derivados da cana-de-açúcar. Batistelle, Marcílio e Lahr (2005) observam que o
bagaço tem sido importante fonte de combustão em usinas geradoras de energia que
movimentam a força propulsora de moendas e outras utilizações que geram o bagaço. Botão e
Lacava (2003) enumeram várias formas de utilização de bagaço de cana para geração de
energia: como meio de combustão das caldeiras que produzem energia térmica que
movimenta os destiladores que, por sua vez, transformam o mosto1, ou ainda como energia
térmica no processo de secagem e desidratação do açúcar nas usinas. A energia térmica, a
princípio, pode ser transformada em energia hidráulica que passa, através da pressão do vapor
d’água, a movimentar turbinas e geradores, transformando-a em energia elétrica.
Segundo Botão e Lacava (2003), o processo de combustão desse bagaço, sob a ótica
do impacto ambiental, possibilita o aumento da poluição ambiental pela descarga de dióxidos
e monóxidos de carbono na atmosfera. Ainda assim os autores enaltecem a menor carga
tóxica destes poluentes se comparado àqueles produzidos pela queima de combustíveis
fósseis, muito superiores aos produzidos pela energia oriunda das hidroelétricas.
Botão e Lacava (2003) observam que, apesar dos impactos causados pelos poluentes
gasosos depositados na atmosfera e das cinzas resultantes a serem utilizadas em solo agrícola
para reduzir a acidez, a utilização do bagaço tem se mostrado uma alternativa econômica para
gerar energia térmica e hidráulica nas usinas e destilarias. O impacto ao meio ambiente tende
a ser amenizado quando analisada a não utilização de combustíveis fósseis e sua elevada
carga poluente ou a manutenção de florestas, ainda que resultantes de reflorestamentos, que
deixam de ser utilizadas para produzir energia nas usinas e destilarias.
1
Mosto: produto obtido a partir do caldo da cana-de-açúcar fermentado, cujo processo de manufatura resultará
no etanol ou na cachaça e como resíduo a vinhaça (BOTÃO; LACAVA, 2003).
46
Batistelle, Marcílio e Lahr (2005) estudam a utilização do bagaço, aproveitando suas
propriedades lignocelulósicas para, associadas com as folhas do bambu da variedade
Dendrocalamus giganteus, produzirem chapas de aglomerado. A alternativa de utilização do
bagaço da cana-de-açúcar associada ao bambu representa ganhos ambientais incalculáveis. A
disponibilidade e a abundância de materiais, em função da adaptabilidade climática e a
facilidade de produção tanto da cana quanto do bambu, oferecem a perspectiva de uma
fórmula de sucesso na manufatura de chapas de aglomerado.
Um dos fins mais comuns dados ao bagaço da cana-de-açúcar está relacionado à
produção de papel, seja por meio de modernos processos, transformando os dejetos em papeis
de alta qualidade, seja através de utilização de técnicas artesanais para produzir papel
decorativo, ambos com grande demanda no mercado consumidor. Associar a preocupação
ambiental e o aproveitamento de resíduos para atender uma demanda de mercado cumpre
dupla função, com eficácia, no campo econômico e no campo socioambiental.
1.5.3 As cinzas do bagaço da cana e suas aplicações
Na condição de maior produto mundial de cana, o Brasil tem desempenhado
importante papel no desenvolvimento tecnológico para o aproveitamento tanto dos produtos
quanto dos subprodutos derivados do processo industrial de beneficiamento e transformação
da cana em produtos derivados. Do aproveitamento do bagaço da cana-de-açúcar na
coogeração de energia nas usinas de açúcar e álcool tem resultado a produção de 20 a 30 kWh
por tonelada de cana processada, como energia elétrica e mecânica (FEITOSA et al., 2009).
Da coogeração de energia, a partir do bagaço da cana resultam como resíduos as cinzas, que
representam importante função no contexto da reciclagem.
De acordo com Cordeiro (2005), as cinzas são constituídas predominantemente por
dióxido de silício (SiO2). O teor desse componente químico é considerado benéfico quando a
sílica e/ou silicato de alumínio encontra-se em estado amorfo, considerando que ao longo do
tempo têm-se reações que formam silicatos de cálcio hidratados, importantes para resistência
mecânica de pastas, argamassas e concretos, quando estas cinzas são utilizadas para como
componente de cimento portland.
O desenvolvimento científico tem contribuído de forma decisiva na redução do
impacto da disposição de resíduos no meio ambiente resultantes da industrialização. Para
Souto (2010), nos últimos anos a ciência tem dedicado grande atenção ao aquecimento global.
A emissão direta de dióxido de carbono na atmosfera tem sido apontada como o principal
47
fator responsável pelo aquecimento global, sendo a indústria cimenteira responsável por 7%
de todas as emissões de CO2 do mundo.
Com o objetivo de minimizar estes índices de emissões de CO2, bem como as
consequências do aquecimento global, pesquisas vêm sendo desenvolvidas com o intuito de
reduzir o volume de cimento produzido no Planeta através de adições minerais, com destaque
para o emprego dos resíduos da agroindústria (cinza da casca do arroz e cinza de bagaço da
cana), que somaram no Brasil, em 2010, um volume de 3,5 milhões de toneladas.
Além dessa possibilidade de emprego, as cinzas de bagaço de cana, por serem ricas em
nutrientes, podem ser aproveitadas em solos com baixa fertilidade natural, melhorando as suas
características físico-químicas (FEITOSA et al., 2009). De acordo com Malavolta (2001),
para cada 1000 kg de cana de açúcar são gerados, em média, 550 kg de bagaço e 16,5 kg de
cinza.
Quando aplicada como fertilizante ao solo, a sílica encontrada nas cinzas do bagaço da
cana-de-açúcar é apontada como uma alternativa no manejo de doenças patogênicas e ataque
de pragas com reflexos sobre a produtividade, especialmente em relação à sanidade. Acreditase que o silício proporcione maior resistência às paredes das células, tornando-as menos
vulneráveis às enzimas de degradação (KORNDÖRFER, 1995).
De acordo com Feitosa et al. (2009), as cinzas do bagaço da cana se destacam como
eficiente fonte de potássio. No entanto, os autores ressaltam a necessidade de estudos que
indiquem a sua melhor forma de aplicação, assim como a utilização das cinzas como
fertilizante nos mais diferentes tipos de solos, considerando a possibilidade de alterações dos
resultados do aproveitamento a partir dessas diferentes características de cada solo.
48
2 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
O presente estudo partiu de um levantamento de dados cujo objetivo foi identificar
práticas produtivas que impactam o meio ambiente pela disposição inadequada de dejetos
líquidos, especialmente a vinhaça, resultante do processo de destilação do álcool e da cachaça,
e dos dejetos sólidos resultantes do processo, identificados como o bagaço da cana-de-açúcar
e as cinzas resultantes da combustão responsável pela energia térmica necessária para a
destilação. A partir desta caracterização procurou-se analisar e discutir alternativas
econômicas e financeiras viáveis para atenuar o impacto provocado pela disposição no
ambiente de dejetos resultantes da produção artesanal ou industrial dos derivados da cana-deaçúcar pelos estabelecimentos produtores da região Noroeste-Missões do Rio Grande do Sul.
2.1 CARACTERIZAÇÃO METODOLÓGICA
De acordo com enquadramento de Vergara (2000), as pesquisas classificam-se quanto
aos fins e quanto aos meios. Quanto aos fins a pesquisa pode é considerada aplicada, pois a
partir da identificação do impacto causado pela disposição de dejetos, analisou-se e discutiuse a aplicação de alternativas com viabilidade econômica e financeira para internalizar os
custos, atenuando os efeitos nocivos da disposição de resíduos no meio ambiente, oriundos
dos estabelecimentos artesanais e industriais de derivados da cana-de-açúcar na região
Noroeste-Missões do Rio Grande do Sul, especialmente a cachaça e o álcool.
A pesquisa tem também caráter descritivo, pois a partir da descrição pormenorizada
das características dos estabelecimentos implicados identificou e discutiu alternativas
econômicas e financeiras viáveis de gestão de dejetos resultantes da manufatura de produtos
derivados da cana-de-açúcar.
Quanto aos meios, a pesquisa pode ser classificada como pesquisa de campo,
documental e bibliográfica. Como pesquisa de campo, o estudo se ocupou de buscar in loco
os dados junto aos estabelecimentos produtores, por meio de enquete, identificando: dados
que caracterizam o estabelecimento; tipo de produtos manufaturados; natureza das operações;
volume de produção anual; destino dado aos dejetos; potencial econômico das atividades; e
volume de negócios do estabelecimento.
A partir dos instrumentos de coleta de dados foi possível identificar a localização do
estabelecimento e a concentração de estabelecimentos por área ou município; a natureza das
atividades; o volume de produção e estimar o potencial poluidor; a forma de manejo dos
49
rejeitos; e, por fim, o potencial econômico dos estabelecimentos para adotar e adaptar
técnicas de manejo consideradas mais adequadas.
Como pesquisa documental o estudo utilizou-se de dados e informações da produção,
em relação aos custos e benefícios relativos aos processos de gestão de dejetos sólidos,
líquidos e gasosos oriundos do processo produtivo, assim como a legislação ambiental
vigente – leis, decretos, regulamentos e portarias que normatizam a gestão de dejetos
industriais, especificamente aqueles oriundos da manufatura da cana-de-açúcar e seus
derivados.
E, finalmente, como pesquisa bibliográfica, o estudo sistematizado teve por base as
publicações de artigos de periódicos científicos, livros, revistas técnico-científicas, jornais e
rede eletrônica, assim como outros materiais disponíveis sobre o assunto.
2.2 CARACTERIZAÇÃO DOS EMPREENDIMENTOS E DOS IMPACTOS DO
PROCESSAMENTO DE CANA PARA PRODUÇÃO DE ÁLCOOL E CACHAÇA
2.2.1 Coleta de dados
A coleta de dados foi realizada de maneira informal a partir de questionário
semiestruturado, a fim de identificar a natureza da atividade (produção de cachaça ou álcool)
e o volume potencial de produção de materiais (área ocupada pela cana-de-açúcar e o
potencial de produção específico de cada talhão dentro da mesma propriedade), possibilitando
uma estimativa de produção média de materiais cultivados pelo estabelecimento.
A fidedignidade dos dados levantados guarda relação direta com a forma utilizada no
levantamento. Como a maioria dos empreendedores produz na informalidade, em que pese
ignorar todas as normas sanitárias, e às expensas do erário público no que tange ao
recolhimento de tributos, qualquer maneira formal de coleta de dados em que o entrevistado
se sentir um “confessor” de dados do seu modelo produtivo, pode levá-lo a distorcer as
informações prestadas e comprometer a natureza das informações.
Para evitar esta situação foi projetada a aplicação de um instrumento de
questionamento não formalizado (em apêndice), mas preenchido pelo entrevistador, após
uma conversa informal e a visita in loco, em que foram evidentes algumas constatações da
real situação dos estabelecimentos e do tratamento dado aos dejetos produzidos, assim como
do potencial poluidor destes estabelecimentos pesquisados.
A coleta de dados contou com o apoio da Secretaria de Agricultura e/ou EMATER de
cada município, buscando assegurar uma relação de confiança, tendo em vista o fato de que o
50
entrevistador não era conhecido da maioria dos entrevistados, mantendo uma relação
amistosa e de reconhecimentos profissional e funcional.
A coleta de dados foi composta de uma enquete informal, visando a atender os
quesitos que identificam:
 os dados de identificação do empreendedor e sua localização, de forma que foi possível
mensurar a concentração de estabelecimentos congêneres por espaço territorial;
 a natureza das operações para que se identifique o modelo de produção entre o artesanal e
o industrial;
 o volume de produção anual de forma que seja possível conhecer a área de cultivo da
cana-de-açúcar, se próprio ou de terceiros, identificando a distância entre o local de
produção e o beneficiamento, assim como o volume de produção anual a fim de avaliar o
potencial poluidor;
 o destino dado aos dejetos líquidos e sólidos identificados pela vinhaça, o bagaço e as
cinzas oriundas do processo de produção;
 o potencial econômico das atividades e a capacidade instalada e capacidade para expansão
dos estabelecimentos.
O diagnóstico foi realizado em 24 municípios da região Noroeste-Missões do Rio
Grande do Sul, com observação e levantamento de dados em todos os estabelecimentos
possíveis de serem identificados e localizados.
Figura 1. Localização da área de abrangência – municípios com produção canavieira para produção
de álcool e cachaça. Região Noroeste-Missões do RS, 2012.
Fonte: adaptado do Mapa Rota-Missões e Rota-Rio Uruguai (2012).
51
O processo envolveu os municípios de Bossoroca (1), Caibaté (2), Campinas das
Missões (4), Cândido Godoi (28), Cerro Largo (3), Entre Ijuís (5), Giruá (8), Guarani das
Missões (9), Pirapó (11), Porto Lucena (26), Porto Xavier (12), Roque Gonzales (14),
Salvador das Missões (15), Santa Rosa (31), Santo Ângelo (16), Santo Cristo (29), São Borja
(não consta no mapa), São Miguel das Missões (19), São Luís Gonzaga (18), São Pedro do
Butiá (22), Senador Salgado Filho (30), Sete de Setembro (23), Vitória das Missões (24) e
Ubiretama (25), num total de 49 estabelecimentos produtores, dos quais 48 produtores de
cachaça e um produtor de álcool.
2.2.2 Características da produção de cana na região Noroeste-Missões
A amostra identificou o cultivo total aproximado de 2030,30 hectares de cana-deaçúcar, dos quais 1.820 hectares respondem por um volume potencial aproximado de 140.000
toneladas que atendem à produção da única usina de álcool da amostra.
A produção de cachaça, a partir dos 48 estabelecimentos produtores, corresponde a um
potencial para produção de 13.360 toneladas de matéria-prima produzida em 200,30 hectares,
o que representa uma média de 4,09 hectares por estabelecimento.
Outro fator importante a ser observado é o volume médio de cana produzida por
hectare na região e que atende à produção de cachaça e de álcool. Enquanto a média entre os
80 produtores de cana-de-açúcar que atendem a usina de produção de etanol é de
aproximadamente 76,9 toneladas por hectare, os produtores de cachaça obtêm média inferior,
em torno de 66,7 toneladas por hectare. Esta diferença pode estar associada à utilização da
fertilização das lavouras destinadas à produção de álcool.
A usina, por iniciativa própria, e também em atendimento a adequações ambientais,
desenvolve programa de distribuição da vinhaça nos talhões pela técnica de fertirrigação,
além de um programa de manejo de fertilidade, orientado pelo corpo técnico da cooperativa
que coordena a atividade produtiva da usina.
52
Produção líquida
total (l)
Álcool
Cachaça
Bossoroca
a
3,4
180.000
22.000
Caibaté
a
6,5
600.000
65.000
a
11,5
1.000.000
120.000
Campinas das Missões
b
2,5
250.000
30.000
Cândido Godoi
a
2,5
160.000
20.000
a
2,5
1.600.000
20.000
Cerro Largo
b
1
80.000
10.000
c
1,5
120.000
15.000
Entre Ijuís
a
1,5
100.000
12.000
Giruá
a
1,2
70.000
8.000
a
3,5
300.000
35.000
Guarani das Missões
b
4,5
330.000
40.000
c
2
120.000
15.000
a
4,5
420.000
50.000
Pirapó
b
2
160.000
20.000
a
16
540.000
65.000
b
12
670.000
80.000
c
8,5
580.000
70.000
Porto Lucena
d
7
420.000
50.000
e
5
330.000
40.000
f
7,5
380.000
45.000
a
690
50.000.000
3.000.000
b
5
330.000
40.000
Porto Xavier
c
3,5
120.000
15.000
d
3,5
200.000
25.000
a
1142
90.000.000
5.500.000
Roque Gonzales
b
8
50.000
60.000
a
6
460.000
55.000
Salvador das Missões
b
2,4
200.000
25.000
a
2,6
160.000
20.000
Santa Rosa
b
1
80.000
10.000
a
2
165.000
20.000
Santo Ângelo
b
2,5
165.000
20.000
Santo Cristo
a
3,2
250.000
30.000
São Borja
a
8
380.000
45.000
São Miguel das Missões
a
6
410.000
50.000
a
3,1
120.000
15.000
São Luiz Gonzaga
b
1,5
70.000
8.000
a
4
300.000
35.000
São Pedro do Butiá
b
2,6
120.000
15.000
a
3
120.000
15.000
b
4
200.000
25.000
Senador Salgado Filho
c
2,5
80.000
10.000
d
1,5
160.000
20.000
Sete de Setembro
a
3,5
160.000
20.000
a
3,8
250.000
30.000
Vitória das Missões
b
3
160.000
20.000
a
3,5
160.000
20.000
Ubiretama
b
2
80.000
10.000
TOTAL
49
2030,3
153.360.000
8.500.000
1.490.000
Quadro 2. Caracterização da produção de cana destinada à aguardente e etanol na região Noroeste-Missões do
Rio Grande do Sul, 2012.
Fonte: dados da pesquisa (2012).
Município
Unidades
produção
Área
plantada (ha)
Volume de
produção (t)
53
2.2.3 Localização geográfica das unidades produtoras em relação aos mananciais hídricos e
potencial de contaminação ambiental
A mensuração dos possíveis impactos a serem causados por disposição incorreta dos
dejetos oriundos da produção de álcool e cachaça, especialmente os dejetos líquidos no qual
prepondera a vinhaça, está diretamente ligado à localização das indústrias e agroindústrias em
relação a rios, lagos, córregos, nascentes e lençóis freáticos superficiais. A falta de adoção de
qualquer uma das medidas de gestão adequada de resíduos industriais, especialmente da
vinhaça, pode provocar a contaminação por lixiviação dos corpos hídricos. A localização de
indústrias e agroindústrias próximas a mananciais hídricos aumenta potencialmente o risco de
arraste e contaminação (SILVA; GRIEBELER; BORGES, 2007).
A pesquisa identificou a distância média entre as unidades beneficiadoras e os
mananciais hídricos de rios, lagos, nascentes e lençóis freáticos superficiais para identificar os
riscos potenciais no manuseio e armazenagem próximas a estes mananciais. A figura 2
representa as distâncias específicas de cada uma das unidades produtoras – a usina de álcool e
as destilarias de cachaça – e os mananciais hídricos mais próximos, representados por
nascentes, córregos, açudes, rios e lençóis freáticos superficiais.
Figura 2. Distâncias médias entre os mananciais hídricos e as unidades produtoras de álcool e
cachaça na Região Noroeste-Missões (RS), 2012.
Fonte: dados da pesquisa (2012).
Neste aspecto foi possível identificar que a distância média entre as unidades
beneficiadoras e estes mananciais é de, aproximadamente, 123 metros. Este dado é
54
especialmente relevante se considerado que apenas duas destilarias de cachaça fazem o
armazenamento dos dejetos líquidos.
A legislação brasileira, por intermédio da Lei Federal nº 4771/1965 – Código Florestal
brasileiro – prescreve a respeito das Áreas de Preservação Permanente (APP): a largura de 30
metros para matas ciliares em cursos d’água com até 10 metros de largura; a largura de 50
metros nas margens de rios entre 10 e 50 metros de largura, e ao redor de nascentes de
qualquer dimensão; a largura de 100 metros nas margens de rios entre 50 e 200 metros de
largura; a largura de 200 metros para rios entre 200 e 600 metros de largura; a largura de 500
metros nas margens de rios com largura superior a 600 metros; a largura 100 metros nas
bordas de chapadas. Exige autorização do Executivo Federal para supressão de vegetação
nativa em APP e para situações onde for necessária a execução de obras, planos, atividades ou
projetos de utilidade pública ou interesse social.
Assim, a distância entre as aguadas e as destilarias torna-se importante, se considerado
que a disposição dos dejetos ocorre indiscriminadamente e com o risco iminente de
contaminação das aguadas. O caminho natural desses dejetos são os locais mais baixos do que
as unidades produtoras, ou seja, os mananciais hídricos, aspecto observado in loco,
representando um descuido completo com os dejetos. Exceto as duas unidades citadas
anteriormente, e que se utilizam dos dejetos líquidos para biofertilização dos talhões de cana,
os demais estabelecimentos produtores de cachaça não desenvolvem qualquer programa ou
projeto de aproveitamento destes resíduos para reduzir o impacto pela disposição no meio
ambiente. A lixiviação dos dejetos será tanto maior quanto mais próximos estiverem às
unidades produtoras desses mananciais hídricos.
A identificação da altitude dos talhões foi realizada a partir da utilização de Sistema de
Posicionamento Global (GPS) com o objetivo de verificar a interferência de fatores climáticos
em relação à cultura, especialmente o frio e a geada, esta última potencialmente prejudicial à
cultura da cana.
2.2.4 Características dos solos da região produtora de cana
Outra constatação é a interferência das características físico-químicas dos solos na
adaptabilidade da cultura da cana e, por consequência, a sua produtividade. Latossolos de
altitude têm apresentado melhor adaptação para a cultura da cana-de-açúcar, embora exista a
crença de que a melhor qualidade da cachaça seja produzida a partir da cana oriunda de solos
com a presença de pedregulhos menores, que determinam menor potencial produtivo, mas
55
com ligeira vantagem em termos de qualidade, medidos pelo teor de açúcar encontrado nos
colmos. Vacaro e Lopes (2003) argumentam a necessidade de identificar a profundidade dos
solos que receberão a cultura da cana. Segundo os autores, estes locais devem ter
profundidade mínima de um metro, condição facilmente alcançada pelos latossolos, no
entanto, praticamente impossível em solos com pedregulhos.
A pesquisa mostrou a preponderância dos solos da classe Latossolo (profundos), os
quais representam 89% do total das áreas com o cultivo da cana-de-açúcar (figura 3). Solos
rasos e com alguma pedregosidade representam apenas 11% da amostra e apenas dois
produtores cujos solos eram distintos representavam a totalidade do cultivo, mesmo assim em
duas propriedades de pequeno porte: uma com área de 3,5 hectares e a outra com 1,5 hectares.
Figura 3. Classes de solo predominantes no cultivo de cana na região Noroeste-Missões, RS.
Fonte: dados da pesquisa (2012).
De forma similar, a área de cultivo dos cooperados da usina de álcool que ocorre em
classes de solos de menor profundidade, provavelmente Chernossolos, associados aos
Neossolos, representa apenas 10% do total dos talhões cultivados. Esse fato deve-se ao
alinhamento às recomendações técnicas para utilização prioritária de latossolos como forma
de aumentar potencialmente a produção física e a vida útil da cultura.
O tipo de solo e sua composição física, assim como o relevo e o método de plantio,
são fatores definidores do sucesso na aplicação da vinhaça pela técnica de fertirrigação. A
textura do solo determina a absorção dos nutrientes que compõem a vinhaça. Solos do tipo
latossolo, profundos e com elevado teor de argila, têm elevada capacidade de adsorção,
56
reduzindo o potencial de lixiviação de nutrientes se comparados aos demais tipos de solos,
com textura menos argilosa, ou mais rasos. Por esta razão, considerar o tipo de solo em que as
culturas estão implantadas possibilita julgar a possibilidade de sucesso na aplicação da
vinhaça como fertilizante a partir da absorção dos nutrientes disponibilizados pela cultura.
57
3 APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS
3.1 CARACTERIZAÇÃO DO POTENCIAL DE IMPACTO AMBIENTAL DA PRODUÇÃO DE DERIVADOS DE CANA
3.1.1 Estimativa do potencial de produção de dejetos
A mensuração de potencial produtivo do volume de cana produzido possibilita estimar
o volume de dejetos líquidos, sólidos e gasosos resultantes do processo de manufatura. Entre
os estabelecimentos produtores de cachaça foram identificados potenciais produtivos que
variam entre 8.000 e 120.000 litros. Somados os volumes de produção de cana destinados à
produção de cachaça constatou-se o potencial de produção de 1.490.000 litros pelo conjunto
dos 48 estabelecimentos produtores, o que representa uma média de 31.042 litros por
estabelecimento produtor.
Já o potencial produtivo da usina de álcool é de 8.500.000 de litros por ano. A
avaliação do potencial de produção considerou as dimensões dos talhões de cultivo de cana, o
potencial produtivo da cultura em relação ao tempo de implantação, as condições de
fertilidade dos solos, a adubação de plantio e de manutenção, assim como as características
edafoclimáticas que interferem na adaptabilidade da cultura e responsáveis diretas pelo
volume de cana produzido. Neste sentido, foi possível identificar produções extremas dos
talhões avaliados de até 106.667 toneladas de cana por hectare em contraste com o volume de
32.000 toneladas em outros talhões.
Com base nos dados levantados que quantificam as potencialidades de produção é
possível dimensionar o volume de dejetos a serem produzidos em cada safra. De acordo com
estes dados e respaldados por Silva, Griebeler e Borges (2007), é possível estimar o volume
de dejetos gerados em cada safra em função do potencial de produção. Os autores afirmam
que para cada litro de etanol produzido restam entre 10 e 18 litros de vinhaça líquida. Já
Oliveira et al. (2009) sustentam que o volume residual da vinhaça na produção de cachaça
artesanal ou industrial, libera, em média, entre 8 e 10 litros, para cada litro de produto final
manufaturado. Desta forma, e baseado nestas premissas, estabeleceu-se para fins de análise o
valor médio do volume de emissão de dejetos de 13 litros de vinhaça para cada litro de etanol
produzido e o volume médio de 9 litros de vinhaça para cada litro de cachaça produzido.
Assim, considerando o volume total da produção de etanol e de cachaça nas unidades
produtoras que fizeram parte da amostra é possível estimar o volume de dejetos por safra, que
58
totaliza 110.500.000 litros de vinhaça (8.500.000 litros de álcool x 13 litros de vinhaça) a
partir da produção de álcool e, na produção de cachaça, 13.410.000 litros de vinhaça por safra
(1.490.000 litros de cachaça x 9 litros de vinhaça), como apresenta o Quadro 3, a seguir.
Potencial produtivo
Álcool
Cachaça
Produtos acabados (l)
8.500.000
1.490.000
Vinhaça
Volume médio/litro de produto acabado
13 litros
9 litros
Volume total (l)
110.500.000
13.410.000
Volume de materiais (t)
140.000
13.810
Bagaço
Percentual médio de resíduos/kg de cana
30%
35%
Volume total de resíduos (kg)
42.000.000
4.833.500
Quadro 3. Produção de resíduos de cana em função do potencial produtivo da cana. Região Noroeste-Missões
(RS), 2012.
Fonte: dados da pesquisa (2012).
O processamento da cana tem como importante subproduto o bagaço, podendo
representar 30% da cana moída. Sua composição é predominantemente fibra e resíduos de
açúcar (VACARO; LOPES, 2003).
A produção de bagaço também leva em consideração o volume de materiais
produzidos em cada safra. Em dados coletados nos estabelecimentos pesquisados – usina de
álcool e destilarias de cachaça – levantou-se o percentual médio de bagaço produzido a cada
tonelada de cana esmagada. Assim, foi possível estabelecer uma média de 30% e 35% de
bagaço para a usina e para as destilarias, respectivamente. A diferença de percentual se deve à
melhor tecnologia utilizada pela usina para extração do caldo da cana, com sistema de
trituração e lavagem, enquanto que na maioria das destilarias o processo de moagem é
bastante rudimentar, com baixo aproveitamento de materiais, alguns inclusive com produção
de bagaço superior a 40%. No geral, a média entre as destilarias se situa em 35%. Assim, o
volume total estimado de bagaço produzido por safra na usina é de 42.000.000 quilos
(140.000.000 kg de cana x 30%) e entre as destilarias de cachaça, de 4.833.500 quilos
(13.810.000 kg de cana x 35%), conforme Quadro 2. A massa média estimada de bagaço,
resultante do processamento na usina e nas destilarias, não é o melhor indicador de impacto
em razão da baixa densidade do material, expressa em kg por metro cúbico, que acaba por
resultar em volume expressivo, com efeito visual impactante.
Outro aspecto importante evidenciado é a qualidade dos materiais vegetais produzidos
na região e que abastecem a usina e as destilarias. A produção de etanol ou cachaça terá maior
rendimento quanto mais qualidade tiverem os materiais empregados no processamento.
Comparada com a média alcançada na região Sudeste do Brasil, a baixa produção média por
área identificada na pesquisa é compensada pelo alto teor de açúcar da cana, mensurado pelo
59
grau Brix. A seleção de variedades melhor adaptadas, a adubação de plantio e de manutenção,
a colheita de talhões com maturação homogênea são apontados pelos proprietários dos
estabelecimentos como determinantes para que o material tenha a qualidade esperada.
O clima é outro fator fundamental responsável por elevar a qualidade da cana-deaçúcar produzida na região Sul do Brasil, especialmente na região Noroeste-Missões, onde se
encontra a usina de álcool e as destilarias. O moderado volume pluviométrico da estação de
verão, o aumento das chuvas no outono e o frio do inverno são ideais para o desenvolvimento
de alto teor de açúcares na cultura. Especialmente o frio do outono e inverno determina uma
maturação mais uniforme dos talhões pela redução da atividade metabólica da planta. Assim,
a colheita ocorre quando todos os colmos estiverem maduros, independendo inclusive da
época de brotação e do porte individual de cada colmo. Desta forma, facilmente se atinge a
média de 21º Brix, determinando a necessidade de diluição do caldo em água, tanto para a
produção de álcool quanto para a produção da cachaça, a fim de proporcionar um melhor
aproveitamento da fermentação do mosto, que transformará os açúcares em álcool.
O maior ou menor potencial produtivo de um talhão guarda relação direta com o
tempo de implantação e estabelecimento da cultura. Conforme observam Vacaro e Lopes
(2003), culturas com maior tempo de implantação apresentam produção decrescente com o
passar do tempo, em função da depleção o desgaste do solo motivado pela carência de
nutrientes, especialmente o potássio, acentuando-se a partir do quarto ano de implantação.
Assim, a redução do volume de produção geralmente é compensada pelo plantio em novas
áreas, submetendo as áreas antigas à rotação de culturas, com implantação de leguminosas.
O elevado custo de implantação das lavouras de cana-de-açúcar, no entanto, concorre
com a manutenção dos talhões por maior tempo, além dos quatro anos recomendados para
rotação de culturas. Na prática, a pesquisa detectou que o plano de assistência técnica da
cooperativa, responsável pela industrialização da usina de álcool, é instrumento de persuasão
para a produção de maior volume de cana de açúcar por área cultivada. Assim, motivados por
incentivos financeiros, tais como maior remuneração proporcional por hectare a partir do
aumento de produção e pelos financiamentos para custear novos plantios, além da
disponibilidade de máquinas e equipamentos adequados para efetuar esta renovação de
culturas o em períodos de tempo menores, os produtores de matéria de cana respondem
positivamente, investindo no plantio em áreas nobres, solos melhor estruturados e utilização
de fertilizantes na adubação de plantio e de manutenção e renovação mais frequente de
canaviais com produção decrescente.
60
Geralmente emprega-se no plantio a adubação química e a manutenção é realizada
com adubação química combinada à fertirrigação com aplicação da vinhaça. Na prática, e de
acordo com informações recolhidas na pesquisa, a colheita fora de época provoca atraso da
rebrota dos talhões e prejudica o volume da próxima safra. Pelo menos 90% dos produtores de
cachaça afirmaram categoricamente que estendem o período de produção de junho a
novembro, e que percebem que o atraso no corte é um dos principais fatores de redução do
volume de produção na próxima safra. O Quadro 4 reflete o exposto em relação à maior
média de produção entre os produtores de cana que atendem a usina e o tempo médio de
renovação dos canaviais para esta categoria. No caso desses produtores, o tempo médio de
renovação dos cultivos é de quatro anos. Nos estabelecimentos de produção de cachaça
identificou-se o tempo médio de renovação dos canaviais a cada seis anos.
Estabelecimento produtor
Longevidade média dos canaviais (anos)
Usina
4
Destilarias
6
Quadro 4. Tempo médio de duração dos canaviais destinados a destilarias de cachaça e produção de etanol.
Região Noroeste-Missões (RS), 2012.
Fonte: dados da pesquisa (2012).
Estima-se que a redução da produção média por hectare dos produtores de cachaça em
relação aos produtores de cana que atendem à usina se deva, justamente, em razão da
renovação da cultura na forma de novos plantios. Se for considerado que a colheita com a
queima da palhada condiciona uma degradação gradual do solo, conforme defendem Vacaro e
Lopes (2003), a produção que atende a usina tenderia a ter seu volume reduzido.
3.1.2 Sistemas de cultivos de cana
O rendimento físico do cultivo da cana tem relação direta com o sistema de cultivo
praticado pelos estabelecimentos produtores. O tempo da implantação, a adubação de
cobertura e de manutenção, o método de corte e transporte, as características físico-químicas
do solo e as condições climáticas determinam o potencial produtivo e a quantidade
efetivamente produzida.
A cana-planta, assim definida a cultura do primeiro ano de implantação, possui
potencial produtivo inferior ao primeiro ano da planta-soca, que corresponde ao segundo ano
após a implantação da cultura. Isso se dá pelo melhor perfilhamento do segundo para o
terceiro ano. A partir do terceiro ano, que corresponde ao segundo ano da planta-soca, a
61
tendência é decair o volume de produção, muito em função da perda de fertilidade dos solos e
do manejo.
No Rio Grande do Sul, em razão do frio severo dos meses de inverno, responsável
pela maturação homogênea dos talhões, o manejo adotado possibilita a colheita de varredura,
ou seja, o corte uniforme de todo talhão. Desta forma, corta-se toda cultura, inclusive das
novas brotações. Este corte facilita muito a colheita, mas prejudica a cultura e reduz sua
longevidade. Observa-se que em outras regiões do Brasil a produção que abastece as usinas de
álcool tem na colheita coletiva uma prática comum, ou seja, o sistema mecanizado e a colheita
manual após a queima da palha em função da viabilidade de custos para manejar altos
volumes de produção. Os proprietários de muitas destilarias produtoras de cachaça, no
entanto, salientam a existência de canaviais com vida útil superior a quatro anos e com
produção expressiva em função do método de colheita seletiva por catação. Este método
seleciona apenas os colmos maduros, de elevado teor de açúcar medido em graus Brix, com o
intuito de obter um produto final de superior qualidade e evitar o plantio de novas áreas, com
consequente redução de custos de implantação. Um aspecto determinante da adoção da
colheita seletiva dos colmos maduros é o maior custo com mão de obra para colheita,
inviabilizando a prática em áreas maiores.
Vacaro e Lopes (2003) enaltecem as vantagens da colheita manual com a manutenção
da matéria orgânica e a consequente ciclagem de nutrientes. A mais relevante seria a redução
da acidez dos solos e o aumento dos teores de fósforo, tanto que na adubação de manutenção
não haveria necessidade deste nutriente, mesmo em áreas onde a adubação de plantio não
oferece o teor de fósforo demandado.
A precariedade da adubação de implantação ou de manutenção também é responsável
pela redução drástica do volume produzido a partir do terceiro ano de implantação da cultura
da cana. A recomendação é que seja feita rotação de culturas, implantando uma leguminosa
na área após o quarto ano de implantação da cana, oportunidade em que o baixo volume de
produção compromete a viabilidade em função da relação custo-benefício desfavorável. Maia
e Campelo (2005) recomendam a utilização fertilizante de formulação com baixa
concentração nitrogenada para cana-planta (plantio), e com baixa concentração de fósforo na
adubação cana-soca (manutenção).
Especialmente em relação à produção de cachaça existe a recomendação para que seja
evitada qualquer adubação química, especialmente a nitrogenada, sob o risco de perda da
qualidade do produto final destinado para consumo humano. Vacaro e Lopes (2003)
recomendam apenas a utilização de fosfato natural de rochas e outros materiais alternativos
62
para o plantio e fertilizantes orgânicos produzidos a partir de elementos naturais como
fertilizante de manutenção.
A figura 4, a seguir, representa o percentual de adubação de plantio e de manutenção
aplicada nas usinas e destilarias, cujos dados foram obtidos a partir da aplicação dos
questionários. O fornecimento de materiais para a unidade produtora de álcool, que conta com
a assistência técnica da Cooperativa gestora da usina, administra um programa de incentivo e
monitoramento destes cultivos, financiando insumos e fertilizantes para que haja adubação de
plantio e de manutenção, além da distribuição da vinhaça. A aplicação de adubação química
na totalidade da área de cana-de-açúcar cultivada visa aumentar os níveis de produção,
intensificando o uso da terra e o consequente aumento da produção de bens manufaturados a
partir da cana produzida. Neste caso é utilizada a fertirrigação com a vinhaça associada à
adubação química.
Figura 4. Percentual de adubação de plantio e de manutenção.
Fonte: dados da pesquisa (2012).
Os dados levantados também identificam que em 87% das áreas de cultivo que
atendem a destilarias de cachaça, os produtores fazem adubação de plantio e em apenas 58%
da área, adubação de manutenção. Destes, apenas dois utilizam a aplicação de vinhaça como
biofertilizante, não utilizando fertilizante químico. Um destes produtores afirmou que a
fertirrigação supre com sucesso a necessidade de nutrientes para alcançar alta produção, em
torno de 92,3 toneladas por hectare, índices próximos das melhores áreas e superior à maioria
das áreas de cultivo mantidas com adubação química, mesmo em áreas com cana-soca de seis
63
anos. O segundo produtor que utiliza fertirrigação sem adubação química, no entanto, produz
uma média de 47,8 toneladas por hectare.
3.1.3 Manejo de colheita da cana-de-açúcar
Os dados relativos ao conjunto de aspectos da produção, tais como corte, moagem,
fermentação, destilação e separação de resíduos, disposição dos resíduos e aplicação final dos
dejetos, assim como o impacto causado ao meio ambiente pela disposição inapropriada dos
resíduos e dejetos constitui a essência deste estudo. Caracterizar o roteiro do processo
produtivo é fundamental no diagnóstico e na formulação de alternativas legalmente
amparadas para a gestão de resíduos gerados na transformação da cana.
O manejo de corte e de transporte também pode determinar redução ou manutenção de
potenciais produtivos da cultura da cana-de-açúcar. A colheita da cana crua, sem a queima,
representa ganhos ambientais elevados, no entanto, em talhões com alta concentração de
matéria orgânica, especialmente a palha depositada após o corte, representa barreiras naturais
que prejudicam a brotação e o perfilhamento da cultura. Em pequenas áreas o manejo pode
ser feito manualmente pela remoção da palha sobre os sulcos, de maneira a possibilitar a
adequada insolação, necessária ao processo de rebrota e perfilhamento. O trânsito de
máquinas sobre as áreas de cultivo após a colheita também prejudica a brotação e o
perfilhamento.
Os dados coletados demonstram que a prática da queimada para facilitar a colheita
ainda prepondera. Dos 2.020,30 hectares que compõem a amostra, apenas 8% da cana é
colhida crua, prática utilizada em sua totalidade pelos produtores de cachaça, que utilizam
majoritariamente esta técnica, ou seja, destes, 82% fazem a colheita da cana crua enquanto
18% utilizam-se das queimadas para facilitar a colheita e reduzir o custo com o processo.
A modalidade de manejo da colheita da cana pelos produtores que atendem a usina e
os que transformam a própria cana em cachaça, nas destilarias, está representada na figura 5, a
seguir.
64
Figura 5. Modalidades de colheita da cana na região Noroeste-Missões (RS), 2012.
Fonte: dados da pesquisa (2012).
A cana destinada à usina tem, em sua totalidade, a queima da palhada como regra. São
inúmeras as dificuldades para a erradicação das queimadas – as máquinas de colheita, além do
custo elevado, exigem terreno plano, sem elevada declividade. Outro aspecto a considerar diz
respeito à dimensão social. Em que pese a dificuldade, penosidade e periculosidade do corte
manual, ainda é uma fonte de emprego para uma parcela significativa de trabalhadores rurais
temporários.
Outro aspecto de relevância diz respeito a qualidade da cachaça produzida. Galinaro e
Franco (2009) relatam que a cachaça pode sofrer a contaminação por Hidrocarbonetos
policíclicos aromáticos (HPAs) originados pela queima da cana-de-açúcar durante a colheita.
Hidrocarbonetos policíclicos aromáticos são substâncias que pertencem à classe dos prócarcinogênicos sendo, portanto, riscos potenciais a saúde humana. São formados pela queima
de matéria orgânica em elevadas temperaturas, por meio da combustão incompleta ou pirólise
de materiais contendo átomos de carbono e hidrogênio.
Há que salientar que no Estado de São Paulo a Lei 11.241/2002 estabelece que, a
partir da safra de 2017, estarão legalmente extintas as queimadas nos canaviais como forma
de colheita. A discussão teleológica que cercou a aprovação desta legislação considerou
aspectos ambientais e sociais que certamente também influenciam a redução ou eliminação
das queimadas na cana-de-açúcar na região Noroeste Missões do Rio Grande do Sul.
65
3.1.4 Aspectos relativos à colheita da cana-de-açúcar
Nos plantios convencionais, a eliminação da palha do canavial pelo fogo aumenta o
rendimento de corte e facilita o manejo pelos cortadores. Como desvantagens, Vacaro e Lopes
(2003) enumeram a perda de açúcares nos colmos, aumento das impurezas minerais (terra,
areia, entre outros) aderentes aos colmos e, dependendo das condições de umidade e
temperatura, pode haver contaminação microbiana.
O impacto produzido pela disposição no meio ambiente de resíduos produzidos pelas
queimadas nas lavouras de cana, de acordo com Zancul (1998), pode determinar a mudança
do microclima das zonas canavieiras, afetando o ciclo hidrológico e a incidência de radiação
solar, o aumento de incidência de doenças respiratórias na população da região, danos à flora
e a fauna, prejuízos à estética do meio ambiente, aumento da erosão em razão do solo estar
descoberto e desprotegido, o desequilíbrio ecológico pela mortandade de insetos, aves, répteis
e plantas e o acúmulo dos sedimentos produzidos pela fuligem oriunda das queimadas, que se
espalha causando muitos transtornos ao cotidiano das pessoas que vivem nas proximidades de
cultivos.
Uma das possíveis soluções para reduzir o volume das queimadas nas lavouras
canavieiras está na mecanização do processo de colheita, o que requer um investimento inicial
em máquinas e equipamentos. Entretanto, há que se avaliar e discutir a empregabilidade da
mão de obra ocupada a partir da colheita manual da cana. Todo o processo de colheita
mecanizado deixaria de empregar um contingente humano na execução das tarefas de corte,
carga e descarga, provocando por consequência um desequilíbrio social, conforme salienta
Ribeiro e Ficcarelli (2009).
Neste tocante, foi realizado o levantamento minucioso dos processos produtivos na
produção de etanol e cachaça na região das Missões do Rio Grande do Sul. Os dados relativos
ao corte procuraram identificar se os serviços são realizados pelas unidades produtoras ou
subcontratados. Esta informação pode determinar, em função dos custos mais elevados na
colheita da cana crua, que se passe à colheita da cana queimada. A coleta de dados identificou
uma expressiva proporção de cana colhida com queima da palha. Na área de cultivo que
atende a destilaria de álcool, a cana em sua totalidade é colhida pela utilização desta técnica,
como forma de facilitar a colheita e reduzir os custos operacionais nesta etapa.
A utilização de máquinas colhedoras é uma das alternativas viáveis para a colheita da
cana sem a queima da palha, atendendo assim a demanda pela solução de colheita com menor
custo e menor impacto sobre o meio. Se for considerado o alto custo de aquisição das
66
máquinas colhedoras como investimento inicial, os benefícios financeiros proporcionados
podem compensar este investimento inicial, especialmente se forem financiadas com recursos
de longo prazo. Neste caso há que se considerar que a redução no impacto pela emissão de
poluentes na atmosfera representa uma vantagem ambiental importante, no entanto, a
preocupação é com o impacto social pela redução de empregabilidade da mão de obra, quando
o trabalho dos obreiros é substituído pela mecanização do processo de colheita.
De outro modo, a erradicação das queimadas sem a consequente mecanização forçaria
a realização da colheita manual. Esta metodologia, sob o ponto de vista social é ainda mais
impactante, de acordo com Ribeiro e Ficarelli (2009). O nível de esforço despendido pelo
trabalhador na realização da colheita manual da cana crua é muito superior ao esforço para a
colheita da cana queimada. O volume de materiais tende a ser, em variedades sem desfolha
natural, bem menor que o método da colheita de cana queimada. A redução do volume de
materiais processados por cada trabalhador demandaria um número maior de operários para
esta tarefa, considerando a mesma área. Este aumento do custo da mão de obra impactaria
com o aumento do custo da colheita e, por consequência, do custo final de produto
industrializado, neste caso o álcool ou a cachaça.
Há que considerar também a já escassa mão de obra no meio rural, em função das
baixas remunerações, condições ambientais de trabalho e, principalmente, da descontinuidade
de demanda, cuja safra tem duração média de seis meses, exemplo típico dos serviços
prestados no corte da cana. A demanda não atendida de mão de obra rural foi apontada pelos
produtores de cachaça como o fator limitante da expansão da produção. A subcontratação de
trabalhadores para a colheita sofre restrição, principalmente pela dificuldade da colheita da
cana crua, razão que força alguns produtores de cachaça, em pequenos talhões, a praticar a
queimada para facilitar a colheita subcontratada.
Os dados levantados também revelam a prática da queimada entre os produtores de
cachaça, que em tese operam com áreas de cultivo menores e que, em função destas
características poderiam realizar a colheita manual sem a queima. Inclusive é recomendação
técnica para a produção de cachaça artesanal de qualidade superior, que seja manufaturada a
partir de cana colhida sem queima (RIBEIRO, 1997).
Chama atenção a utilização da prática da queima da palha pelas pequenas destilarias
de cachaça. Os dados do diagnóstico mostram que 18% dos estabelecimentos utilizam a
queima dos talhões para facilitar a colheita. Alegam os empreendedores que a falta de
disponibilidade de mão de obra precisa ser compensada pela prática da queimada, com o
67
objetivo de atender a demanda no volume adequado para que não interrompa o fluxo de
produção.
A figura 6, a seguir, apresenta um resumo da modalidade de mão de obra utilizada na
usina de álcool e nas destilarias de cachaça que compõem a amostra. A partir desta
visualização é possível perceber o grau de dependência total da usina e a dependência relativa
das destilarias em relação à utilização de mão de obra de terceiros, subcontratada para os
serviços de corte. O aspecto é realçado por todos os entrevistados como o fator mais
vulnerável da produção, tanto de álcool quanto de cachaça e outros derivados, os quais
dependem da cana de açúcar como matéria prima.
Figura 6. Emprego de mão de obra própria ou contratada para corte de cana destinada a destilarias
e usina na Região Noroeste-Missões (RS), 2012.
Fonte: dados da pesquisa (2012).
A usina tem a totalidade dos serviços de colheita da cana atendidos por serviços
subcontratados. Em relação às destilarias, 58% utilizam serviços de terceiros para as
operações de colheita. Estes dados alertam para dependência da mão de obra de terceiros no
processo produtivo e as limitações de aumento de produção, fato salientado por muitos
entrevistados.
A falta de mão de obra na colheita da cana, o alto custo para o manejo da cana crua,
aliado ao impacto das queimadas são questões apontadas pela maioria dos produtores de
cachaça como de resolução relativamente fácil. A pesquisa e implantação de variedades com
desfolha natural representam, em tese, a possibilidade de redução drástica dos custos com
68
mão de obra de colheita em função da possibilidade de maior rendimento de corte por
operário/dia, diminuindo assim a demanda de maior número de trabalhadores.
É unanime dentre os entrevistados que a expansão da produção requer a seleção de
variedades que apresentem maior facilidade da colheita. A seleção para o plantio de
variedades com desfolha natural e caule ereto pode representar a redução do volume de
produção a campo em razão da falta de melhor adaptação ao clima e solo, mas poderão
apresentar compensação financeira pela redução de custos de colheita (RIBEIRO, 1997).
3.1.5 Disposição espacial das unidades produtoras de álcool e cachaça em relação aos
mananciais hídricos
A identificação da altitude dos talhões realizada a partir da utilização do Sistema de
Posicionamento Global (GPS) tem o objetivo de verificar a interferência de fatores climáticos
em relação à cultura, especialmente o frio e a geada, esta última, potencialmente prejudicial
para a cultura da cana. A figura 7 apresenta a altitude dos estabelecimentos analisados na
amostra. A usina está estabelecida a 86 metros de altitude a partir do nível do mar e as
destilarias estão a uma altitude média de 207 metros. Entre os estabelecimentos há grande
amplitude entre a maior altitude, de 427 metros, e a menor altitude, de 74 metros acima do
Metros
nível do mar.
Figura 7. Altitude em que se situam os estabelecimentos de produção de cachaça e álcool na
Região Noroeste-Missões (RS), 2012.
Fonte: dados da pesquisa (2012).
69
Segundo Vacaro e Lopes (2003), a cana pode ser considerada uma cultura bastante
sensível às geadas intensas e prolongadas. Antes de decidir pela implantação da cultura, o
produtor deverá considerar também os riscos que a ocorrência de geadas poderá causar na sua
lavoura. Por isso o cultivo em locais muito baixos, ou próximos de rios ou de lagos, deverá
ser evitado em razão dos maiores riscos de ocorrência dessas geadas. Relatos de produtores,
entretanto, que remontam a dados históricos de cultivos de cana-de-açúcar nas margens do
Rio Uruguai, que banha os municípios de Porto Lucena, Porto Xavier e Roque Gonzales,
relatam o cultivo em áreas ribeirinhas protegidas das geadas pela neblina formada pela ação
das águas do rio.
Em áreas distantes do Vale do Rio Uruguai, em talhões com maior altitude há menor
incidência de geadas severas. As características do local de implantação dos talhões
produtivos da cana-de-açúcar em relação ao relevo e à altitude também podem interferir,
facilitando ou dificultando a aplicação da vinhaça como estratégia de fertirrigação. Outro
inconveniente em implantar as culturas em terrenos de maior altitude é a incidência de ventos
que podem prejudicar o desenvolvimento e danificar folhas, colmos e a manutenção ereta dos
colmos (VACARO; LOPES, 2003).
Como as destilarias de cachaça são dependentes de um grande volume de água para o
arrefecimento do destilado no processo produtivo, é comum que a implantação das unidades
produtivas seja feita com aproveitamento do potencial hídrico disponível nas plantas
agroindustriais, por desnível, portanto, sem custos adicionais de energia no recalque da água.
Assim, é comum que as plantas agroindustriais estejam instaladas nas áreas mais baixas da
propriedade e próximos a nascentes, rios, açudes e lençóis freáticos superficiais.
Na prática, o diagnóstico realizado evidenciou a obediência aos preceitos legais por
parte da usina de álcool. Nesta unidade foi desativada a área de sacrifício que armazenava
provisoriamente a vinhaça, prática extinta desde 2004 quando foram implantados tanques
impermeáveis em alvenaria para armazenagem provisória e posterior distribuição nas lavouras
de cana dos associados. O custo de distribuição da vinhaça foi internalizado, sendo
incorporado ao custo de produção com fertilizantes.
O monitoramente, em atendimento aos requisitos de licenciamento e imposição dos
órgãos ambientais, exerce pressão para o destino adequado da vinhaça, tendo em vista seu alto
potencial poluidor, mesmo quando os volumes são menores, como é o caso de uma usina de
pequeno porte, podendo comprometer as condições ambientais de solo em recursos hídricos
dos entornos da usina.
70
O diagnóstico apontou também o descuido dos gestores das unidades produtoras de
cachaça que, por conveniência financeira, falta de equipamentos adequados e/ou maiores
distâncias entre as unidades processadoras e os talhões, deixam de utilizar este rejeito como
biofertilizante. Dos 48 estabelecimentos produtores de cachaça apenas dois fazem a
armazenagem adequada dos dejetos líquidos, acondicionando e distribuindo aos talhões para
fertilização. Nestes estabelecimentos, a proximidade entre a lavoura e unidade de manufatura
contribui para o destino correto da vinhaça. O processo de distribuição, no entanto, carece de
melhor adequação. A distribuição da vinhaça com tanques em aço carbono e o uso do
distribuidor de dejetos líquidos têm como inconveniente a compactação demasiada do solo
pelo trânsito de máquinas pesadas. A compactação poderá comprometer tanto a absorção dos
nutrientes adicionados como também afetar o comportamento físico-hídrico do solo e o
desenvolvimento da cultura.
Este manejo ainda deve contar com condições ideais em relação ao teor de umidade
dos solos. Solos mais encharcados e a aplicação em momentos que antecedem às chuvas
torrenciais podem causar lixiviação da vinhaça disposta in natura, arrastando os nutrientes e
biofertilizantes nela contidos para as correntes d’água e lençóis freáticos superficiais,
provocando danos ambientais e reduzindo a disponibilidade dos biofertilizantes para a cultura
(SILVA; GRIEBELER; BORGES, 2007).
3.1.6 Características e destino do bagaço produzido
A coleta dos dados relativos à moagem teve duplo propósito: o de identificar o
aproveitamento dos materiais processados na moenda, em função do volume percentual de
caldo extraído, e a qualidade do bagaço produzido, cujo percentual de umidade poderá
determinar sua forma de utilização em diferentes processos.
Foram identificadas três modalidades distintas de moagem: moagem precária – aquela
cujo percentual de aproveitamento é inferior a 60%, ou seja, a cada tonelada moída são
obtidos, no máximo, 600 litros de caldo. Na segunda classificação são obtidos percentuais
entre 600 e 700 litros de caldo por tonelada de cana processada. Por fim, o processo mais
adequado utiliza a cana triturada para o esmagamento, com a posterior lavagem a quente do
bagaço. Neste caso o índice de extração é máximo, sofrendo variação apenas em relação à
qualidade da cana, tendo em vista que algumas variedades são mais abundantes em fibras, o
que resulta numa menor quantidade de caldo.
71
A maior ou menor presença de caldo no bagaço pode determinar o destino de sua
utilização. Bagaços mais impregnados de caldo, com percentual maior de umidade,
dificilmente serão utilizados como meio de combustão nas caldeiras ou a fogo direto, ou ainda
para geração de energia térmica ou a partir desta, em energia elétrica, sem antes passarem por
processo de estabilização para que reduzam seu percentual de umidade. Esses materiais in
natura estão sujeitos ao processo fermentativo que ocorre no início do processo de
decomposição. Já o bagaço com menor percentual de caldo pode ser utilizado com facilidade
como meio de combustão na geração energia térmica, especialmente demandada no processo
de destilação, tanto na produção de cachaça quanto na produção de álcool.
A utilização do bagaço como meio de combustão, por exemplo, reduz o volume
necessário de lenha. A geração de energia térmica pode poupar florestas de árvores nativas ou
reflorestadas. Justifica-se, portanto, a identificação dos meios de combustão utilizados pelas
usinas e/ou destilarias na geração da energia térmica demandada nos processo produtivos.
Neste tocante, o estudo identificou que 90,09% do volume total de cana processada
são submentidos à moagem lavada, e que 5,52% dos materiais são submetidos à moagem
precisa, com a produção de bagaço em condições de ser utilizada como meio de combustão,
seja como geradora de energia térmica na própria unidade beneficiadora, ou utilizada como
meio para produzir energia térmica a ser transformada em energia elétrica na movimentação
de turbinas, bastante difundidas no atual momento da alta demanda energética mundial. A
usina de álcool é responsável pela produção de 100% do bagaço lavado a quente. A moagem
precisa é realizada pelas produtoras de cachaça que utilizam equipamentos mais evoluídos
tecnologicamente e mais bem ajustados, capazes de extrair maior percentual de caldo e
produzir bagaço com menor percentual de umidade. Os resíduos produzidos nestas duas
situações são utilizados potencialmente na produção de energia e sem nenhum tratamento
adicional para sua estabilização.
Os dados provenientes da pesquisa também identificaram um percentual mínimo de
moagem precária, em torno de 4% do total do volume de bagaço produzido. Estes materiais
dificilmente poderão ser utilizados como meio de combustão diretamente e in natura, sem
estabilização, por apresentarem um percentual de umidade que inviabiliza sua utilização
imediata para tal fim.
A figura 8 apresenta uma síntese dos processos de moagem da cana e a resultante
qualidade do bagaço produzido, o que possibilita sua utilização como meio de combustão ou,
mediante operação adicional de estabilização, sua utilização posterior como meio de
combustão, ou ainda, para simples distribuição em solo agrícola com o mínimo impacto.
72
Figura 8. Modalidade de moagem da cana destinada à produção de álcool e cachaça na
Região Noroeste-Missões (RS), 2012.
Fonte: dados da pesquisa (2012).
A alternativa preconizada inclusive pelos órgãos de controle ambiental é a
estabilização do bagaço em ambiente coberto para que seja reduzido seu percentual de
umidade e, assim, possa ser utilizado como meio de combustão. Haverá, neste caso, um custo
adicional de armazenagem e manuseio dos materiais. Uma alternativa é a utilização do bagaço
para disposição em solo agrícola. Para tanto é recomendada a estabilização dos materiais em
abrigo fechado para evitar a fermentação in loco, o que poderá causar impacto à biota do solo,
podendo em seguida ser disposto em solo agrícola, em quantidades adequadas, como forma de
cobertura.
Além da possibilidade potencial de utilização do bagaço de cana como meio de
combustão, o mesmo foi identificado como fonte geradora de energia, seja pela utilização de
caldeira a vapor ou a fogo direto. O avanço tecnológico que introduziu a caldeira a vapor na
capacidade instalada das usinas e destilarias abriu a possibilidade de utilização do bagaço de
cana como meio de combustão com maior eficiência, em larga escala, substituindo outras
fontes alternativas, especialmente a lenha, com facilidade, praticidade e sem custos adicionais.
Constatou-se, porém, a baixa utilização do bagaço como meio de combustão. Apesar
de ser utilizado por algumas pequenas destilarias de cachaça mesmo em sistema de fogo
direto, a utilização como meio de combustão ainda é limitada a poucas experiências. A usina
de álcool utiliza o bagaço como meio de combustão, substituindo parcialmente a lenha no
processo de produção. Estima-se que 40% do bagaço produzido na usina de álcool seja
utilizado com fonte de energia. Entre as destilarias de cachaça, apenas uma faz a utilização
73
intensiva do bagaço como meio de combustão, em substituição à lenha. Isso se deve à
associação tecnológica pelo uso da caldeira de vapor adaptada a sistema de ventilação
forçada. Neste caso, cerca de 50% do bagaço produzido é utilizado com meio de combustão,
representando entre 60% e 70% dos meios totais de combustão utilizados pela destilaria em
substituição à lenha, constituindo-se em fonte alternativa de energia. Apenas esta destilaria
utiliza caldeira a vapor na destilação. As demais destilarias utilizam sistema de fogo direto
para destilação e por esta razão empregam lenha como fonte de energia e, eventualmente,
adicionam bagaço ao fogo, mas em percentuais insignificantes.
A figura 9 apresenta as informações levantadas em relação à utilização do bagaço
como meio de combustão. Foi possível identificar a utilização desta fonte alternativa de
energia na totalidade da produção na usina. Por outro lado, 27% do potencial produtivo das
destilarias de cachaça utilizam a mistura de lenha e bagaço como meio de combustão.
Figura 9. O uso do bagaço como meio de combustão na usina de álcool e nas destilarias de
cachaça no Região Noroeste-Missões (RS), 2012.
Fonte: dados da pesquisa (2012).
Uma das possíveis explicações para a reduzida utilização do bagaço como fonte de
combustão é a precariedade tecnológica das capacidades instaladas. A única destilaria a
utilizar esta alternativa para produzir energia térmica no processo de destilação possui uma
caldeira de vapor. Esta caldeira está adaptada à ventilação forçada, possibilitando um melhor
aproveitamento do bagaço, mesmo quando este apresenta algum percentual de umidade, no
entanto, não muito elevado.
74
A possibilidade de utilização do bagaço como fonte alternativa de energia é enaltecida
pela maioria dos proprietários de destilarias de cachaça. Sua inexpressiva utilização e baixa
eficiência nos casos citados, no entanto, está condicionada à prática de destilação a fogo
direto, processo que limita a eficiência desta fonte de energia. Das 48 destilarias de cachaça
analisadas, 47 delas utilizam esta tecnologia de produção.
3.2 ALTERNATIVAS VIÁVEIS PARA ATENUAÇÃO DOS IMPACTOS AMBIENTAIS
DO PROCESSAMENTO DA CANA
3.2.1 Gestão dos dejetos da vinhaça
Do processo de destilação, tanto nas usinas de álcool quanto nas destilarias de
cachaça, resultam resíduos potencialmente poluidores do meio ambiente quando depositados
indiscriminadamente na natureza. Assim, independentemente do porte do empreendimento –
pequeno, médio ou grande – seu alto potencial poluidor tem despertado a atenção e a
preocupação dos órgãos de proteção ambiental e da sociedade civil, quanto aos impactos
causados pela disposição indiscriminada de dejetos resultantes do processo produtivo que
transforma a cana-de-açúcar em álcool ou cachaça.
A gestão adequada dos dejetos, especialmente os rejeitos líquidos representados pela
vinhaça, pode reduzir o impacto causado pela sua disposição inadequada ao meio ambiente. A
armazenagem provisória para posterior distribuição desta vinhaça pode ser determinante para
a redução do impacto produzido ao meio. O acondicionamento da vinhaça em recipiente
impermeabilizado, com geomembranas ou outras formas tecnologicamente mais avançadas
para posterior transporte e distribuição em solo agrícola mediante a técnica de fertirrigação é a
condição e a recomendação legal para reduzir o impacto causado ao meio ambiente. O
acondicionamento em reservatórios provisórios denominados de “áreas de sacrifício”, de solo
permeável, pode resultar em alto impacto poluidor sobre o meio.
No sentido de identificar o potencial poluidor procurou-se caracterizar a forma de
armazenagem dos dejetos líquidos de cada estabelecimento, gerados a partir do processo de
destilação, tanto da produção de álcool como da produção de cachaça. Assim, foi possível
diagnosticar a forma de armazenagem provisória para disposição final da vinhaça e outros
dejetos líquidos gerados na usina de álcool, atestando a condução correta desta armazenagem
para posterior distribuição em solo agrícola. O mesmo não pode ser afirmado em relação às
destilarias de cachaça. Constata-se que apenas dois estabelecimentos se utilizam dos
75
procedimentos adequados de armazenamento em tanques de alvenaria, e impermeabilizados
com geomembranas, os quais representam 7% do potencial produtivo relativo às destilarias de
cachaça. A figura, a seguir, 10 apresenta a estratificação da forma de armazenamento
provisório dos dejetos líquidos a serem posteriormente distribuídos em solo agrícola como
biofertilizante mediante a técnica de fertirrigação.
Figura 10. Armazenagem provisória adequada dos dejetos na produção de álcool e cachaça
na Região Noroeste-Missões (RS), 2012.
Fonte: dados da pesquisa (2012).
Na produção de cachaça, a mistura da primeira parte do destilado é conhecida como
“água de cabeça”, composto de alta toxidez. Maia e Campelo (2005) consideram-na imprópria
para o consumo, assim como a parte final, chamada de “água fraca”, as quais devem ser
descartadas, mas que frequentemente são misturadas à porção aproveitável com intuito de
aumentar o volume do destilado produzido para comercialização. Assim, a adição da porção
rejeitada da destilação pode elevar ainda mais o teor contaminante da vinhaça. Da mesma
forma, a última parte da destilação também costuma ser descartada por comprometer a
qualidade gustativa e olfativa da bebida e contém menor grau de toxidez, porém com aroma e
sabor desagradável. Os resíduos de cabeça e cauda, descartados na destilação da cachaça,
podem aumentar potencialmente o teor de toxidez da vinhaça em função de sua carga de
metano (RIBEIRO, 1997).
A separação dos componentes de cabeça e cauda pode ser utilizada na produção de
álcool hidratado, com investimentos mínimos em equipamento para retificação de calda
alcoólica, útil como material de limpeza e que pode ser utilizado inclusive para abastecer
76
veículos, dependendo do grau de pureza, reduzindo drasticamente o nível de toxidez pela
disposição inadequada ao solo. Apenas 7% das destilarias, representado por dois
estabelecimentos, realizam a armazenagem da vinhaça, fazem a separação dos rejeitos de
cabeça e cauda, mas em nenhum dos casos ocorre a diluição com a vinhaça (figura11).
Figura 11. Forma de gestão dos resíduos de cabeça e cauda na produção de cachaça na
Região Noroeste-Missões (RS), 2012.
Fonte: dados da pesquisa (2012).
Identificar a possibilidade de que os estabelecimentos produtores estejam misturando o
composto de cabeça e cauda (porção inicial e final da destilação) junto do destilado para
consumo foi uma das preocupações desta pesquisa. Neste sentido, foi possível diagnosticar
que nenhum dos estabelecimentos produtores de cachaça adota a prática de descarte dos
rejeitos de cabeça e cauda junto à vinhaça. No caso das duas destilarias que fazem o
recolhimento deste descarte para melhorar a qualidade da bebida destilada, uma delas o utiliza
na produção de álcool na pequena propriedade, a outra recolhe o rejeito e redestila na próxima
porção destilada – próximo lote de produção. O álcool produzido é utilizado para abastecer a
frota de veículos próprios da empresa.
3.2.2 Gestão do bagaço e das cinzas
O destino dos resíduos sólidos, representados pelo bagaço e pelas cinzas resultantes da
combustão que produz energia térmica, representa preocupação menor que a dispensada para
77
a destinação da vinhaça, devido ao menor impacto causado na natureza. A ausência de
componentes químicos nocivos ao meio ambiente reduz o impacto de sua disposição em solo
agrícola, no entanto, este material em decomposição ocupa e compromete espaço importante
no entorno das usinas e destilarias.
Em relação à gestão dos resíduos de bagaço e das cinzas foram identificados os mais
diversos usos desses materiais, abundantes no entorno das destilarias e da usina. Percebe-se
uma preocupação maior em dar destino adequado a estes rejeitos do que aquela manifestada
em relação à vinhaça, considerada potencialmente muito mais impactante. A exposição do
bagaço produz alteração do visual das unidades produtoras e, em alguns casos, a visualização
impactante funciona como meio de divulgação da produção, proporcionando a
comercialização in loco.
Outra constatação importante diz respeito à utilização do bagaço nos meios de cultivo
como forma de proteção da camada superficial do solo, especialmente em locais aonde
existem sinais de erosão e de forte perda de nutrientes. O bagaço funciona como barreira
protetora que impede a enxurrada em solos com declive, contribuindo de forma direta para a
redução da degradação dos solos pelo processo erosivo. Esta forma de utilização é perceptível
nas propriedades visitadas. Inclusive é possível visualizar talhões e locais aonde esta técnica
foi utilizada em anos anteriores. A decomposição não impede que os materiais sigam
exercendo o papel protetor do solo em função do aumento de matéria orgânica e dos níveis de
fertilidade.
A utilização do bagaço como meio alternativo para a produção de papel, tanto
artesanal quanto industrial, é sustentada em bibliografia emergente. A abundância e
disponibilidade no território brasileiro e a possibilidade de aproveitamento de um resíduo
industrial é sustentado por Oliveira, Silva e Gobbi (2011): “Tendo em vista que o bagaço de
cana possui em suas paredes celulares, biopolímeros como celulose, lignina e outros açúcares,
faz-se necessário o tratamento com aditivos químicos”.
Os autores afirmam ainda que:
A etapa de desinfecção com hipoclorito de sódio serve para a retirada de lignina das
fibras e o branqueamento da mesma. A lignina é um polímero amorfo e complexo
que tem por finalidade proteger as plantas de ataques biológicos. [...] O papel
artesanal com aparas e fibras vegetais pode ter usos diversos, tais como: material de
escritório, convites, pastas para congressos, livros e etc. (OLIVEIRA; SILVA;
GOBBI, 2011).
78
A prática de reuso de resíduos orgânicos no fabrico de papel artesanal propicia
condições para uma nova cadeia de produção, além de despertar práticas sustentáveis na
fabricação de papel.
Dentre as formas alternativas, o emprego do bagaço da cana-de-açúcar e das folhas
caulinares do bambu da espécie Dendrocalamus giganteus na produção de chapas de
partículas tem sido apontado por fontes bibliográficas como uma aplicação do resíduo. A
adição de adesivo à base de ureia-formaldeído (UF) e emulsão de parafina tem a função de
preencher os vazios entre as partículas, água, papéis-alumínio e celofane. Para Battistelle,
Marcílio e Lahr (2005), todos esses materiais foram selecionados, principalmente devido ao
baixo ou praticamente nulo custo dos materiais. E como resultado, a produção de materiais de
larga utilização em habitações com interesse social.
Raros foram os relatos da utilização do bagaço como meio de combustão entre as
destilarias de cachaça. Ainda que algumas utilizem prensas de moagem com boa tecnologia e
precisão, produzindo um bagaço com baixos níveis de umidade, algumas dificuldades no
manejo desta biomassa e os baixos preços da lenha de eucalipto, oriunda de reflorestamentos,
fazem com que a combustão da lenha tenha a preferência dos produtores.
Em relação ao bagaço produzido pela usina de álcool, vários são os projetos para
utilização deste rejeito como matéria-prima de produção para bastões prensados, o que
facilitaria a sua utilização como meio de combustão em substituição à lenha utilizada nos
mais diversos sistemas produtivos que se utilizam da energia térmica gerada por caldeiras ou
trocadores de calor. Neste caso, o custo de processamento do bagaço concorre com o custo de
formas alternativas de combustão, especialmente a lenha, em função de preços competitivos
na razão direta do aumento da oferta acima do aumento da procura pelo mercado consumidor.
Alternativa bastante discutida é a utilização, pela usina, do bagaço da cana para
geração de energia térmica a ser transformado em energia elétrica, podendo esta atender a
demanda da própria usina. Existem algumas experiências inovadoras a partir de rejeitos
produtivos de outras indústrias beneficiadoras, a exemplo do arroz, cuja casca vem sendo
utilizada para estes fins, com custo/benefício favorável e com a redução do impacto causado
pelos detritos dispostos no meio ambiente. Ainda assim, a emissão de gases pela combustão
destes materiais é prejudicial à atmosfera.
O uso do bagaço como ração animal é largamente relatado pela bibliografia recorrente.
Leme et al. (2003) sustentam que a utilização de cana na alimentação de ruminantes está na
dependência da viabilidade técnica e econômica, levando-se em consideração as vantagens e
limitações do seu valor nutritivo. Concluem os autores confirmando a viabilidade do uso de
79
15 ou 20% de bagaço de cana-de-açúcar como única fonte de volumoso para novilhos em
confinamento, alimentados com dietas com elevada proporção de concentrado, contendo
milho, polpa cítrica e farelo de soja. O bagaço da cana-de-açúcar pode ser uma alternativa
interessante, já que é um resíduo da agroindústria produzido em grande quantidade e baixo
custo, podendo ser de utilidade na produção de bovinos, em sistemas de confinamento e ou de
escassez de forragem.
A forma de administração do bagaço aos bovinos é relatada por Teixeira, Pires e
Nascimento
(2007),
enfatizando
as
baixas
propriedades
nutritivas
deste
resíduo
lignocelulósico, que em função da alta concentração de lignina, proporciona um baixo
aproveitamento na alimentação de animais. Alguns tratamentos adicionais, no entanto, podem
reduzir o potencial fibroso e aumentar o valor nutritivo do bagaço, se comparado à
administração in natura como fonte de volumoso aos bovinos, tanto para a pecuária de leite
como para a pecuária de corte.
Lacorte, Bose e Ripoli (1989) sustentam que a baixa densidade e digestibilidade têm
sido os fatores limitantes na utilização do bagaço de cana in natura em alimentação de
ruminantes e que a sua utilização em volumes excessivos prejudica o desempenho de bovinos
em regime de confinamento.
Dentre os processos adicionais para aumentar a palatabilidade e o valor nutritivo do
bagaço relatados por Teixeira, Pires e Nascimento (2007) está o tratamento do bagaço com
hidróxido de sódio. Alguns limitantes, no entanto, podem prejudicar seu aproveitamento, a
exemplo da menor possibilidade de degradação da fibra e menor tempo de retenção da mesma
no rúmen dos animais, maior excreção urinária pela necessidade de eliminar o excesso de
sódio ingerido e a influência negativa no balanço mineral no organismo dos ruminantes.
Outro método citado é o tratamento com amônia que apresenta limitantes que podem
inviabilizar a sua utilização, a exemplo da dificuldade do manejo e os riscos de intoxicação,
além do elevado custo de tratamento que representa a falta de viabilidade financeira do
processo. Ainda de acordo com os mesmos autores, uma das alternativas mais viáveis do
ponto de vista econômico-financeiro é o tratamento com ureia, em razão do custo acessível e
da facilidade de manejo associada ao baixo risco no manuseio e preparação dos bagaços.
Das experiências relatadas, o processo mais eficiente e eficaz é o tratamento com
vapor e sob pressão. A utilização de cápsula hermeticamente fechada com a injeção de vapor
por curto espaço de tempo promove o aumento do valor nutritivo com menor custo e maior
benefício. A disponibilidade de vapor nas unidades fabris é um aliado que facilita o processo
e reduz sensivelmente o custo do produto final (TEIXEIRA; PIRES; NASCIMENTO, 2007).
80
No mesmo sentido, Lacorte, Bose e Ripoli (1989) afirmam que o processo de auto-hidrólise
que denomina a técnica de tratamento a vapor e sob pressão é capaz de promover alteração
positiva considerável na digestibilidade no bagaço da cana e com baixo custo dos processos.
Dos levantamentos in loco nas unidades produtoras que compuseram o período
amostral da pesquisa foram identificadas muitas destilarias de cachaça que dispõem parte do
bagaço produzido aos bovinos para consumo in natura. A forma de administração é,
geralmente, consorciada com diversas fontes alternativas de volumosos, suplementados ou
não com concentrados proteicos. Algumas destas experiências são relatadas com afirmação
pela viabilidade técnica, no entanto, a maioria das situações é proporcionada pela absoluta
falta de outro destino para o bagaço. Essa disponibilidade não alimenta qualquer expectativa
de ganho de peso para os bovinos de corte ou aumento da produção leiteira. Também não foi
registrado qualquer instrumento de controle para monitorar e avaliar os resultados obtidos a
partir destes experimentos a campo.
A distribuição do bagaço, sem qualquer critério de aproveitamento, constitui uma
regra entre os produtores de cachaça. Em todas as posições que compõem a amostra
observada é possível constatar algum procedimento inadequado na condução dos resíduos
sólidos representados pelo bagaço. Problema típico percebido foi a distribuição irregular na
forma de acúmulo ou a falta de distribuição do bagaço de forma homogênea e em dosagem
incompatível com a possibilidade de decomposição sem impactar os recursos naturais de solo
e água dos locais aonde foi disposto este material. A utilização mínima de recursos
financeiros e humanos poderia solucionar pendências ambientais importantes, proporcionando
equilíbrio ao ambiente de produção. A recomendação dos órgãos de controle ambiental é para
que haja uma estabilização do bagaço in natura para posterior distribuição em solo agrícola
como forma de reduzir a capacidade fermentativa destes materiais a partir de ataque
bacteriano, que causam danos à microfauna e à microflora dos solos ou podem ter alguns
detritos desta fermentação arrastados por lixiviação para os mananciais d’água.
As cinzas oriundas da caldeira de vapor também têm sido dispostas em solo agrícola.
As propriedades físico-químicas deste rejeito e a alta concentração percentual de cálcio
funcionam como corretivo da acidez. Aplicados em talhões de cana com maior tempo de
implantação, contribuem para corrigir solos degradados pela própria cultura fornecedora de
materiais paras as destilarias.
A pesquisa procurou identificar, entre as unidades que compõem a amostra, os
procedimentos que tratam do bagaço e das cinzas resultantes do processo de manufatura. A
figura 12, a seguir, apresenta um resumo do diagnóstico de tratamento dado ao bagaço e às
81
cinzas produzidas no processo produtivo da usina produtora de álcool e das 48 destilarias
produtoras de cachaça que compõem a amostra.
Figura 12. Disposição e/ou tratamento adequado do bagaço e cinzas da produção de álcool
e cachaça na região Noroeste-Missões (RS), 2012.
Fonte: dados da pesquisa (2012).
No diagnóstico do tratamento destes dejetos foi possível constatar que apenas duas
destilarias de cachaça, que representam 7,24% da amostra na categoria destilarias, obedecem
a um manejo adequado com estabilização para posterior distribuição do bagaço. A usina
também tenta dar destino adequado ao bagaço excedente, não utilizado como meio de
combustão. Quanto às cinzas oriundas da combustão de lenha e ou bagaço foi possível
observar que esta tem como destino o solo agrícola, no entanto, na maioria das situações
dispostas de forma não homogênea, em excesso, quando poderiam ser distribuídas numa área
maior, em concentrações menores.
Quanto ao aproveitamento das cinzas, recente estudo de Souto (2010) propõe a adição
das cinzas do bagaço de cana na proporção de 5 a 30% em concretos da classe C30. O sucesso
do experimento foi comprovado pelos testes físicos em concreto, a partir de ensaios
mecânicos em corpo-de-prova, sendo verificada a resistência à composição axial, tração por
compressão diametral e módulo de deformação para índice de até 20% de substituição em
massa de areia, sendo registrados ganhos de até 12% em comparação com o concreto de
referência. A pesquisa contribui para a aplicação do bagaço de cana, como material
82
alternativo na produção de concreto Portland, por promover resistências elevadas e baixo
consumo de cimento.
O uso alternativo das cinzas também compreende a possibilidade de utilização como
fertilizante, seja associado com outros materiais ou isoladamente. Neste sentido, Lima (2011)
propõe a utilização dos resíduos provenientes da produção de biocombustíveis, especialmente
o bagaço e as cinzas do bagaço da cana, os quais podem ser empregados na formulação de
compostos orgânicos como forma de contribuição para a obtenção de fertilizantes com maior
conteúdo de substâncias húmicas e rico em silício, os quais podem atuar na redução da sorção
de fósforo em solos tropicais. Ainda conforme Lima (2011), a queima do bagaço da cana que
vem sendo utilizado para produção de energia nas usinas de açúcar e álcool tem gerado
grande volume de cinzas após o término da estação de moagem. O destino final desta cinza,
de forma sustentável e com o menor impacto ambiental, é um desafio para o setor
agroindustrial que se utilizam da cana como matéria prima para produção de álcool, cachaça
ou outros derivados.
Em estudo a partir da aplicação das cinzas produzidas a partir da combustão do bagaço
da cana em área de cultivo de milho, Feitosa et al. (2009) concluem não haver necessidade de
incubação do solo para a instalação da cultura do milho, a partir da aplicação das cinzas como
corretivo de solos, prática essa recomendada para aplicação de corretivos químicos.
Apresentam também como conclusão a possibilidade de substituição da adubação química
convencional da cultura do milho na dosagem de 60 a 90 toneladas de cinza por hectare.
Pan et al. (1978) afirmam serem as cinzas provenientes da combustão do bagaço da
cana, material rico em silício, em teores entre 65 e 81%, e pondera que quando aplicada ao
solo, contribui para o aumento da produção de cana-de-açúcar em torno de 20%. De acordo
com EMBRAPA (2009), as cinzas do bagaço da cana fornecem excelente adubo potássicofosfatado, podendo auxiliar a adubação da cultura.
83
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A pesquisa que levantou as condições reais de produção de álcool e de cachaça,
compreendendo o manejo da cultura da cana-de-açúcar e os processos produtivos, bem como
o destino dado aos resíduos na região Noroeste-Missões do Rio Grande do Sul, coloca em
evidência algumas alternativas. O tema trouxe para análise e discussão o impacto causado
pela disposição dos rejeitos líquidos – vinhaça, e dos rejeitos sólidos – bagaço e cinzas, no
meio ambiente, e analisou a influência das técnicas de manejo de plantio e colheita em relação
aos recursos naturais.
Avaliou-se a adequação de algumas técnicas, especialmente relacionadas à colheita,
para que reduzam os efeitos nocivos causados ao meio. A tradicional metodologia da queima
da palha, para facilitar a tarefa de colheita, é altamente degradadora das condições ambientais,
enquanto que a colheita da cana crua é tarefa de extrema penosidade, sendo recomendada
apenas para os produtores de cachaça em pequenas áreas. A introdução da colheita mecânica é
uma adequação passível de avaliação. Cabe ainda analisar o impacto social causado pela
substituição da mão de obra do corte e a utilização das colhedoras de cana. A mão de obra até
então empregada no corte poderia ser remanejada para outras atividades menos insalubres,
absorvendo parte do contingente de operários empregados desta atividade, inclusive para
servir às colheitas de menores áreas, cultivadas para a produção de cachaça. Este fato tenderia
assegurar a qualidade da produção de cachaça em caráter artesanal.
A vinhaça tem se constituído ao longo do tempo na maior preocupação, por
representar o maior volume de resíduo e, consequentemente, maior potencial poluidor. Sua
elevada Demanda Bioquímica de Oxigênio (DBO) e concentração em potássio e outros
nutrientes, determina um elevado potencial de impacto aos recursos hídricos e, eventualmente
ao solo, quando empregadas altas dosagens na fertirrigação. No entanto, todo potencial
poluidor pode ser transformado em fonte de biofertilizante, se utilizado em dosagens
equilibradas e adequadas.
84
A usina de álcool se utiliza de técnicas adequadas de armazenamento provisório e
distribuição uniforme e equilibrada da vinhaça, no entanto, a maioria das destilarias de
cachaça não tem qualquer preocupação com a vinhaça produzida e a dispõe na natureza sem
critérios. Um número muito pequeno de produtores de cachaça tem real preocupação com a
forma correta de gestão dos resíduos agroindustriais produzidos, e adota manejos adequados
de gestão. Constatou-se também que não há o aumento do potencial poluidor pela mistura à
vinhaça da porção inicial e final da destilação na produção de cachaça. Outra constatação
importante é o emprego pela usina de todas as técnicas recomendadas para o correto
aproveitamento do biofertilizante aplicado sobre a cultura da cana, como o cultivo em sulcos,
o transporte para as áreas mais distantes, a distribuição homogênea e a adequação de
condições ideais para aplicação em relação aos níveis de saturação hídrica superficial dos
solos.
As possibilidades alternativas para o uso da vinhaça como biofertilizante representam,
acima de tudo, ganhos ambientais de grande relevância. A transformação de um despejo com
potencial poluidor, em fonte de uso com benefícios, representa a internalização de custos
ambientais antes socializados.
A gestão dos resíduos sólidos desperta menor preocupação se comparada à gestão da
vinhaça. A maior gama de possibilidade de aproveitamento destes materiais para uso agrícola
ou industrial concorre para o menor potencial poluidor do bagaço e das cinzas. A demanda
por fontes de energias renováveis tem gerado expectativa quanto à utilização do bagaço da
cana como fonte de combustão para produção de energia elétrica. Assim como vem ocorrendo
com os resíduos sólidos do beneficiamento do arroz, o bagaço pode ser transformado em
energia térmica e, a partir desta, convertido em energia elétrica.
Esta possibilidade abre a discussão sobre a geração de poluentes gasosos decorrente da
emissão da fumaça liberada na combustão. Uma análise deve estabelecer os custos e os
benefícios ambientais de tais manejos, haja vista que foge do conceito de produção limpa.
O uso em larga escala como matéria orgânica disposta em solo agrícola é o mais
antigo e mais frequente emprego deste resíduo. A falta de uniformidade e as dosagens
excessivas podem prejudicar sua utilização para este fim. A aplicação na superfície do solo
tem atenuado a ação da erosão por escoamento superficial da água e remoção das camadas
superficiais do solo, de maior fertilidade, constituindo barreira natural para evitar o avanço do
processo erosivo. Os prejuízos se limitam à ação decorrente do processo metabólico de
decomposição, que poderiam ser atenuados pela estabilização do bagaço a partir da secagem
ou redução do percentual de umidade logo após a moagem.
85
O bagaço também pode ter aplicação na produção de papel. Experiências bemsucedidas transformam o resíduo agroindustrial em papel de qualidade diferenciada. Esta
tecnologia depende de uma capacidade mais complexa de manufatura de bens de qualidade
superior, no entanto, experimentos rudimentares têm produzido papel de forma artesanal. Esta
opção atende à demanda de materiais utilizados por artesãos e empregados na produção de
embalagens para cachaça das destilarias. Seu uso é bastante limitado em termos de volume de
produção e não absorve volume expressivo de materiais.
A produção de chapas de partículas constitui-se em outra alternativa viável. A
associação com outros materiais, em experimentos relatados, pode atender à demanda da
construção civil, como a produção de divisórias de uso interno. A combinação com as folhas
caulinares de bambu resulta num produto final de qualidade e preço competitivo. Esta
modalidade pode representar a absorção de um volume elevado de materiais.
A alternativa mais promissora da utilização do bagaço da cana está relacionada à
alimentação de bovinos. Diversos experimentos, com a utilização de diferentes técnicas, têm
relatado uma gama de possibilidades de uso como volumoso administrado à pecuária de corte
e à pecuária leiteira. O consumo in natura praticamente inviabiliza o uso do bagaço, em razão
do baixo valor nutritivo e a sua baixa digestibilidade, associada ao elevado teor de fibras.
Muitas são as alternativas para aumentar o valor nutritivo do bagaço, viabilizando
financeiramente sua administração como insumo na alimentação de bovinos. O tratamento
com hidróxido de sódio é financeiramente viável, no entanto, incorre em riscos decorrentes do
manuseio e preparação dos materiais. O tratamento com amônia também é alternativa viável,
no entanto, os riscos em administrar estes materiais aos animais devem ser considerados. O
tratamento com ureia é uma das alternativas mais promissoras, por contar com custos
reduzidos e a simplicidade que o processo de tratamento requer. Do ponto de vista financeiro,
é uma das melhores relações entre custos de produção e benefícios alcançados.
Entre todas as possibilidades de utilização do bagaço como ração animal, a que
proporciona maior vantagem é o tratamento do bagaço em vapor e sob a aplicação de pressão,
por demandar capacidade instalada mínima, sendo necessária apenas uma cápsula
hermeticamente fechada e o vapor produzido pelas caldeiras nas usinas e destilarias que
utilizam esta tecnologia. Os menores custos e os maiores benefícios tornam esta metodologia
uma forma segura de produzir volumoso para alimentar bovinos de corte e de leite, podendo
ser a principal fonte de volumoso, associado com concentrados à base de grãos.
As cinzas também são resíduos produzidos pela usina de álcool e pelas destilarias de
cachaça. Embora de volume limitado, sua potencialidade com corretivo e fertilizante em solo
86
agrícola e outros fins alternativos podem transformar este dejeto em fonte de exploração
econômica e financeira viável. O cálcio encontrado em sua composição é recomendado como
corretivo de acidez dos solos, especialmente aqueles cultivados com cana-de-açúcar. Esta
prática foi constatada, entretanto, preocupa a falta de uniformidade na aplicação. O depósito
em solo agrícola poderia ser mais bem utilizado, promovendo uma cobertura com menor
proporção em área maior. Outra alternativa é a utilização das cinzas do bagaço da cana para
compor cimento Portland. Os testes em corpo de prova atestam a substituição do cimento
pelas cinzas da cana em percentuais de 5 a 30%, com a resistência exigida.
As práticas relatadas representam reais oportunidades de ganhos ambientais pela
utilização de dejetos sólidos, tanto do bagaço quanto das cinzas como matérias primas
alternativas, seja como meio de combustão, componentes fibrosos para chapas de partículas,
produção de papel ou alimentação de bovinos, assim como as cinzas na produção de cimento
ou como corretivo em solo agrícola. O mínimo impacto sobre o meio ambiente no manejo e
utilização destes dejetos é realçado como um avanço importante na relação entre a produção
de álcool e cachaça e a gestão dos, os quais representam externalidades que são socializadas
coletivamente, ao passo que os resultados econômicos desta produção são apropriados
individualmente pelos empreendimentos.
A identificação, as análises e as discussões sobre as alternativas econômicas e
financeiras viáveis e legalmente amparadas para a gestão dos resíduos gerados pela produção
de álcool e cachaça na região Noroeste-Missões do Rio Grande do Sul não se encerram com a
divulgação dos resultados deste estudo. O surgimento de novas tecnologias abre a perspectiva
para outras possibilidades de utilização destes rejeitos, reduzindo ou neutralizando o impacto
causado pela sua disposição ao meio ambiente, internalizando parte dos custos ambientais
decorrentes do processo de manufatura.
A consciência ambiental deve ser capaz de considerar a responsabilidade privada pelo
impacto causado, na medida em que os benefícios são de natureza privada e, por
consequência, os custos de redução ou atenuação destes impactos também devem ser
privados. Nestes casos, trata-se de efetiva responsabilização social dos agentes
empreendedores.
O princípio fundamental da responsabilidade socioambiental é de que o plano
estratégico formal ou informal de qualquer empreendimento, concebido com a possibilidade
de geração de poluente, deve contar com a projeção que contemple a viabilidade econômica e
financeira das alternativas para internalizar os custos ambientais atinentes ao projeto, sob o
risco de serem estes empreendimentos, inviáveis.
87
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93
APÊNDICE
QUESTIONÁRIO – INSTRUMENTO DE COLETA DE DADOS
Identificação
a) Município
b) Localidade
c) Área de cana plantada
d) Potencial produtivo da cultura
e) Capacidade de produção
f) Plantio raso/sulcos
g) Qual o tempo de duração da cultura
h) Qual a adubação de plantio
i) Qual adubação de manutenção
j) Qual o tipo de solo Tipo de solo
k) Qual a altitude do terreno
l) Qual a posição da destilaria em relação aos talhões
m) Qual a proximidade dos talhões e da destilaria de rios, nascentes e lençóis freáticos
superficiais
n) Como é o acesso dos talhões
Produção
a) Colheita da cana cru ou queimada
b) Corte próprio ou com terceiros
c) Qual o tipo de transporte utilizado
d) Qual a tecnologia da moagem
e) Qual o tipo de fermentação
f) Qual o tipo de combustão
g) Qual o tamanho do destilador
h) Há separação de cauda e cabeça e qual o destino deste resíduo
i) Fogo direto, caldeira ou trocador de calor
94
Gestão de dejetos
a) Tipo de armazenagem de dejetos líquidos
b) Qual o tipo de solo de armazenagem de dejetos líquidos
c) Qual a proximidade do depósito de vinhaça em relação a rios, nascentes e lençóis freáticos
superficiais
d) Como é a disposição para fertirrigação pela vinhaça
e) Qual a concentração
f) Tipo de armazenagem para bagaço e cinzas
g) Como é a disposição do bagaço
h) Como é a disposição das cinzas
i) Qual a proximidade do depósito de bagaço e cinzas em relação a rios, nascentes e lençóis
freáticos superficiais
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