tcc hanseníase kelly 09-11-2011 - Faculdade de Biomedicina

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1
UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ
INSTITUTO DE CIÊNCIAS BIOLÓGICAS
FACULDADE DE BIOMEDICINA
KELLY EMI HIRAI
CARACTERIZAÇÃO IMUNOHISTOQUÍMICA DO ANTÍGENO LEWIS Y
(LeY) NA INFECÇÃO POR MYCOBACTERIUM LEPRAE.
BELÉM-PARÁ
2011
2
KELLY EMI HIRAI
CARACTERIZAÇÃO IMUNOHISTOQUÍMICA DO ANTÍGENO LEWIS Y
(LeY) NA INFECÇÃO POR MYCOBACTERIUM LEPRAE.
Trabalho
de
Conclusão
de
Curso apresentado a Faculdade
de Biomedicina da Universidade
Federal do Pará, como requisito
parcial para a obtenção do grau
de Bacharel em Biomedicina.
Orientadora: Profª Drª Tereza Cristina de Oliveira Corvelo
BELÉM-PARÁ
2011
3
KELLY EMI HIRAI
CARACTERIZAÇÃO IMUNOHISTOQUÍMICA DO ANTÍGENO LEWIS Y
(LeY) NA INFECÇÃO POR MYCOBACTERIUM LEPRAE.
Trabalho de Conclusão de
Curso apresentado a Faculdade
de Biomedicina da Universidade
Federal do Pará, como requisito
parcial para a obtenção do grau
de Bacharel em Biomedicina,
aprovado com o conceito 10
(EXCELENTE).
Banca Examinadora:
___________________________
Profª Drª Ermelinda do Rosário Moutinho da Cruz
ICS-UFPa
___________________________
Profª M.Sc. Rosane do Socorro Pompeu de Loiola
LACEN-Pará
Belém (Pa), 02 de dezembro de 2011.
BELÉM-PARÁ
2011
i
4
“Dificuldades e obstáculos são
fontes valiosas de saúde e força
para qualquer sociedade.”
Albert Einstein
ii
5
A Deus e a minha família.
6
iii
AGRADECIMENTO
Agradeço primeiramente a Deus pela realização deste trabalho.
Ao meu Pai Alberto, a minha Mãe Creuza e a minha Irmã Lêda por todo o apoio e
incentivo que me deram nos momentos bons e ruins.
A minha Orientadora Professora Doutora Tereza Cristina de Oliveira Corvelo pela sua
dedicação e imensa contribuição para o desenvolvimento deste trabalho.
A Professora Doutora Ermelinda Moutinho pela dedicação no auxílio da leitura das
lâminas de imunohistoquímica para a composição dos resultados deste trabalho.
A Mestre Rosane Loiola por todo conhecimento e atenção disponibilizados durante o
estágio no Laboratório de Imunogenética.
A Eny de Azevedo Valente pelo auxílio na realização da técnica de Imunohistoquímica
utilizada para a obtenção dos resultados deste trabalho.
Aos meus Professores por todo conhecimento repassado no decorrer da graduação.
Ao Laboratório de Imunogenética, ao qual devo a maior parte dos conhecimentos
práticos aprendidos durante esses dois anos nos quais fiz parte da equipe técnica.
Aos meus colegas de classe que me acompanharam nessa jornada (César Fôro,
Rodrigo Furtado, Darlen Carvalho, Sirlene Araújo, Adriane Silva, Kauê Santana, Luana
Barbosa, Raquel Bouth, Daniela Rodrigues); e
As demais pessoas que contribuíram de forma direta e/ou indireta para a concretização
deste trabalho.
Muito Obrigada!
7
iv
SUMÁRIO
1.
INTRODUÇÃO ..................................................................................................... 13
1.1.
CONSIDERAÇÕES GERAIS................................................................................ 13
1.2.
AGENTE ETIOLÓGICO ....................................................................................... 14
1.3.
CLASSIFICAÇÃO DOS CASOS DE HANSENÍASE............................................. 15
1.4.
TRANSMISSÃO ................................................................................................... 17
1.5.
EPIDEMIOLOGIA ................................................................................................. 17
1.6.
RESPOSTA IMUNE ............................................................................................. 19
1.7.
DIAGNÓSTICO .................................................................................................... 21
1.8.
TRATAMENTO ..................................................................................................... 23
1.9.
O ANTÍGENO LEWIS Y ....................................................................................... 24
2.
JUSTIFICATIVA ................................................................................................... 27
3.
OBJETIVOS ......................................................................................................... 29
3.1.
OBJETIVO GERAL ............................................................................................... 29
3.2.
OBJETIVOS ESPECÍFICOS ................................................................................ 29
4.
MATERIAL E MÉTODOS..................................................................................... 30
4.1.
CASUÍSTICA: ....................................................................................................... 30
4.2.
DELINEAMENTO DO ESTUDO: .......................................................................... 30
8
v
4.3.
ASPECTOS ÉTICOS: ........................................................................................... 30
4.4.
INDICADORES DE POBREZA:............................................................................ 30
4.5.
TAXA DE DETECÇÃO DA HANSENÍASE: .......................................................... 31
4.6.
EXAME HISTOPATOLÓGICO: ............................................................................ 31
4.7.
IMUNOHISTOQUÍMICA: ...................................................................................... 31
4.7.1. Detecção imunohistoquímica dos marcadores de predisposição genética a
infecção pelo M. leprae: Lewis Y ................................................................................ 31
4.7.2. Controles da reação imunohistoquímica: ........................................................ 32
4.8.
ANÁLISE DA REAÇÃO DE IMUNOHISTOQUÍMICA: .......................................... 32
4.9.
ANÁLISE ESTATÍSTICA: ..................................................................................... 33
5.
RESULTADOS ..................................................................................................... 34
5.1.
EPIDEMIOLOGIA ................................................................................................. 34
5.2.
CARACTERIZAÇÃO IMUNOHISTOQUÍMICA DO ANTÍGENO DE GRUPO
SANGUÍNEOS LEWIS Y EM BIOPSIAS DE PELE. ....................................................... 40
6.
DISCUSSÃO ........................................................................................................ 45
6.1.
EPIDEMIOLOGIA ................................................................................................. 45
6.2.
IMUNOHISTOQUÍMICA ....................................................................................... 46
7.
CONCLUSÃO ...................................................................................................... 50
8.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .................................................................... 51
9
vi
LISTA DE FIGURAS
FIGURA
1:
Espectro
imunopatológico
da
hanseníase.
Os
campos
representam cada um dos tipos histopatológicos da hanseníase na
classificação de Ridley e Jopling (1966). Na parte superior as biópsias foram
coradas com hematoxilina-eosina. Na parte inferior foi realizada a coloração
de FITE-FARACO (1938).....................................................................................
16
FIGURA 2: Taxas de prevalência da lepra, os dados notificados à OMS em
Janeiro de 2009.................................................................................................... 18
FIGURA 3: Na forma TT, no padrão de resposta tipo 1, a IL-2 é um fator de
crescimento autócrino para células T helper, que faz ativação de macrófago
mediada pelo IFN-γ (imunidade mediada por célula). No padrão de resposta
tipo 2, na forma LL, IL-4 é um fator de crescimento para células T supressoras
estimulando a diferenciação de células B para produção de anticorpos
(imunidade humoral): Na presença de IL-4, uma subclasse de célula TCD4+
(Th3) são ativadas para produção de TGF- β, potente fator supressor de
macrófago. Citocinas de macrófagos são cruciais em cada padrão: no tipo 1,
IL-12 é um poderoso estímulo para células T helper; no tipo 2, IL-10 suprime o
próprio macrófago. Citocinas produzidas em um tipo de resposta podem
mutuamente se inibir de um modo multifacetado, simplificado aqui por duas
grandes setas....................................................................................................... 21
FIGURA 4: Distribuição dos casos de hanseníase pelas mesorregiões do
Estado do Pará..................................................................................................... 36
FIGURA 5: Distribuição das formas de hanseníase de acordo com a Região
do Estado do Pará................................................................................................ 37
10
vii
FIGURA 6: Taxa de detecção de hanseníase segundo o PIB Per Capto de
2007 no Estado do Pará....................................................................................... 38
FIGURA 7: Redimento per capto das regiões do Estado do Pará ......................
38
FIGURA 8: Padrão de reação para o antígeno Lewis Y com positividade
heterogênea na epiderme. Método de imunohistoquímica com fosfatase
alcalina. Coloração de fundo: Hematoxilina. Aumento 400X...............................
40
FIGURA 9: Padrão de reação para o antígeno Lewis Y com positividade nas
glândulas sudoríparas, em células do endotélio vascular e em células
inflamatórias da lesão. Método de imunohistoquímica com fosfatase alcalina.
Coloração de fundo: Hematoxilina. Aumento 400X............................................
41
Figura 10: Expressão de Lewis Y nas diferentes formas clínicas de
hanseníase........................................................................................................... 44
11
viii
LISTA DE TABELAS
Tabela 1: Antígenos de grupo sanguíneo..............................................................
24
Tabela 2: Frequência dos tipos histológicos de Hanseníase apresentados pelas
biópsias
analisadas,
correlacionadas
com
gênero
e
procedência
dos
pacientes...............................................................................................................
35
Tabela 3: Avaliação epidemiológica da Hanseníase segundo a localidade do
Estado do Pará no período de 2000 a 2008........................................................... 39
Tabela 4: Expressão do antígeno Lewis Y em biópsias de pele de indivíduos
hansênico distribuído em relação às formas clínicas.............................................
42
12
ix
RESUMO
Introdução: A hanseníase é uma infecção crônica causada pelo Mycobacterium leprae,
que provoca lesões na pele e nos nervos periféricos. Este patógeno possui a
capacidade de infectar grande número de indivíduos, mas poucos adoecem pela sua
baixa patogenicidade, propriedade depende da sua relação com o hospedeiro e o grau
de endemicidade do meio. Objetivo: Detectar por análise imunohistoquímica a
expressão dos antígenos de grupos sanguíneos Ley, em biópsias de lesão de pele de
indivíduos com infecção pelo M. leprae e associar os resultados com as diferentes
formas clínicas da doença. Material e métodos: Foram analisadas 54 amostras de
biópsias de pele com suspeita clínica de hanseníase, utilizando a coloração de HE no
diagnóstico histopatológico e por imunohistoquímica a detecção da expressão do
antígeno Ley. Resultados: Neste estudo, a forma mais prevalente foi a MHI (48%) e
MHT (33%). A distribuição entre os gêneros (masculino e feminino) não foi significativa,
embora, tenha sido observada uma maior proporção de homens afetados com a forma
de hanseníase dimorfa tuberculóide. A expressão do antígeno Lewis Y foi detectada em
59% dos indivíduos, localizada de forma isolada e/ou combinada em diferentes áreas
da epiderme, no endotélio vascular, histiócitos, linfócitos, células epitelióides e
glândulas sudoríparas. A expressão deste antígeno não parece estar relacionada com
as diferentes formas clínicas da doença, embora, tenha sido notada uma tendência
significativa ao aumento do número de casos que expressavam o antígeno Lewis Y
entre pacientes com a forma clínica dimorfa tuberculóide em relação aos tipos
indeterminado e tuberculóide. As diferentes formas clínicas não estão relacionadas com
as regiões geográficas do Estado do Pará. Por outro lado, a mesoregião nordeste
apresentou maior concentração dos casos da doença (31%), incluindo as formas mais
severas, MHDV e MHV. Foi evidenciada uma associação significativa entre o nível
sócio econômico baixo e a taxa de detecção elevada da doença. Conclusão: Estes
resultados indicam que o antígeno Ley deve ter participação ativa nos processos
inflamatórios, funcionando como molécula de adesão induzindo ou mediando a adesão
leucocitária ao endotélio vascular. A expressão do antígeno Ley concentrou-se
preferencialmente nas células endoteliais, que parece corroborar os achados sobre os
efeitos angiogênicos deste antígeno, que atua como agente quimiotático nos processos
inflamatórios. Entretanto, mais estudos são necessários para esclarecer a contribuição
deste antígeno nos mecanismos imunopatológicos das diversas formas clínicas da
hanseníase.
Palavras-chave: Hanseníase, Lewis y, Imunohistoquímica.
13
1. INTRODUÇÃO
1.1. CONSIDERAÇÕES GERAIS
A hanseníase é uma infecção crônica causada pelo Mycobacterium leprae,
patógeno intracelular obrigatório, que provoca lesões na pele e nos nervos periféricos.
É uma doença que possui diagnóstico e tratamento bem estabelecido, entretanto,
quando estes se iniciam tardiamente podem trazer graves consequências para os
portadores e seus familiares, pelas lesões que deformam e incapacitam fisicamente o
seu portador (MARTELLI et al., 2002; MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2002; ARAÚJO, 2003;
WALKER & LOCKWOOD, 2006).
Esta é uma doença bastante antiga, papiros da época de Ramsés II (4.300
a.C.) descrevem casos no Egito. Acredita-se que exércitos persas e romanos tenham
espalhado a enfermidade pela Europa Oriental e a distribuição pela Europa feita por
sarracenos e pelas cruzadas, já no ocidente, pelos espanhóis e portugueses
(MINISTÉRIO DA SAÚDE, 1960), pois a cepa do Mycobacterium leprae responsável
pela doença nas Américas é o uma variedade próxima a da Europa e do Norte da
África, indicando que o colonialismo e a emigração do Velho Mundo contribuiram
provavelmente para a introdução da hanseníase no Novo Mundo (MONOT et al., 2005).
No Brasil, os primeiros casos foram relatados no Rio de Janeiro no ano de 1600,
acredita-se que portugueses e escravos africanos doentes trouxeram a doença para o
país; posteriormente ela se propagou para os estados de São Paulo, Minas Gerais,
Espírito Santo e Maranhão sendo considerada uma endemia no século XVII (OSUGUE
et al., 2004).
Entretanto, apenas em 1873 Gerhard Armauer Hansen, médico norueguês,
descreveu pela primeira vez bastonetes encontrado em lesões lepromatosas, fato
importante que contribuiu para as pesquisas na época, já que se acreditava que a
14
hanseníase era uma patologia hereditária (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 1960; FOSS, 1999
e GOMES, 2000).
1.2. AGENTE ETIOLÓGICO
Micobacterium leprae pertencente à classe Actinobacteria; subclasse
Actinobacteridae; ordem Actinomicetalis; subordem Corynebacterineae; e família
Mycobacteriaceae. É um bacilo álcool-ácido resistente (BAAR), pois se cora em
vermelho pela fucsina e não se descora pelo álcool-ácido, possui aproximadamente 0,2
a 0,5 mícra de diâmetro e 1,5 a 8 micra de comprimento, podem ser encontrados em
amostras de linfa ou biópsias, apresentando-se isolados ou formando conjuntos
característicos chamados globias (REES, 1985).
Possui membrana plasmática constituída por uma bicamada fosfolipídica
com
presença
de
glicolipídios
peculiares
como
fosfatidilinositolmanosídios,
a
lipoarabinomanana e a lipomanana; e parede celular é rica em lipídios, principalmente
os ácidos micólicos, o que lhes confere a propriedade álcool-ácido resistente, é na
parede celular que se encontra o glicolipídio fenólico-I (PGL-I) envolvido na
imunopatogenicidade da infecção por M. leprae, sendo responsável por induzir a
produção de anticorpos IgM nos pacientes (HUNTER & BRENNAN, 1981).
O genoma do M. leprae é composto por 3.268.203 pares de bases (pb),
sendo que apenas 49,5% do genoma possui genes codificadores, o restante é formado
por pseudogenes e sequências não codificantes (COLE et al, 2001). A grande
quantidade de genes inativos pode relacionar-se a condição intracelular obrigatória do
patógeno e com a sua incapacidade de crescer in vitro (BROSH, et al., 2000; BRITTON
& LOCKWOOD, 2004).
15
1.3. CLASSIFICAÇÃO DOS CASOS DE HANSENÍASE
A classificação mais empregada na prática clínica para as formas
intermediárias é a de Madrid (1953), ela baseia-se na clínica, bacteriologia, imunologia
e histologia da hanseníase. Na clínica, o foco são os aspectos das lesões, onde se
observam o número, o tamanho, características das margens e distribuição pelo corpo;
na bacteriologia são analisadas a presença ou ausência de bacilos e suas
características morfológicas (sua integridade e formação de globias). Na imunologia é
observado a imunorreatividade a lepromina, também conhecida como reação de
Mitsuda, sendo considerada positiva a presença de pápula com 5 mm de diâmetro, e na
característica histológica são observados aspectos imunopatológicos das lesões
(MADRID, 1953; LANGUILLON & CARAYON, 1986).
Ridley e Jopling em 1966 propuseram uma classificação baseada nas
diferenças presentes no grupo de pacientes com hanseníase, em conformidade aos
achados imunológicos e histopatológicos, em hanseníase tuberculóide (TT), dimorfa ou
indeterminada tuberculóide (DT), dimorfa dimorfa (DD), dimorfa lepromatosa (DL) e
hanseníase lepromatosa ou virchowiana (LL).
Pacientes com hanseníase tuberculóide (TT) apresentam uma efetiva
resposta imune mediada por células e de hipersensibilidade tardia, possuem lesão com
bordas
bem
delimitadas,
hipopigmentação
central
e
hipostesia.
A
análise
histopatológica destes pacientes revela granulomas inflamatórios bem delimitados e
com a presença de poucos bacilos na lesão (FIGURA 1). Já os pacientes enquadrados
no outro pólo extremo, hanseníase lepromatosa (LL), apresentam um grande número
de lesões nodulares mal delimitadas espalhadas por toda parte do corpo, na
histopatologia são observados aglomerados de histiócitos, com apenas alguns
linfócitos, e grande número de bacilos agregados formando as globias. No entanto,
existem pacientes que se encontram nas formas dimorfas (DT, DD e DL), em que os
achados histopatológicos não são bem definidos como nos pólos tuberculóide e
lepromatoso, com amplo espectro de manifestações clínicas (SCOLLARD et al., 2006).
16
A forma clínica Dimorfa Tuberculóide caracteriza-se pela presença de lesões com raros
bacilos e granulomas de células epitélioides focalizadas por zona periférica de
linfócitos, com presença de células gigantes multinucleadas tipo Langhans e tipo corpo
estranho. Enquanto que, a hanseniase Dimorfa Lepromatosa caracteriza-se por
apresentar lesões infiltrativas de bordas difusas com grande número de bacilos, os
granulomas são compostos por infiltrado linfocitário e macrófagos indiferenciados
(FLEURY, 2000 citado por VENTURINI, 2008).
FIGURA 1: Espectro imunopatológico da hanseníase. Os campos representam
cada um dos tipos histopatológicos da hanseníase na classificação de Ridley e Jopling
(1966). Na parte superior as biópsias foram coradas com hematoxilina-eosina. Na parte
inferior foi realizada a coloração de FITE-FARACO (1938) (Retirado de SCOLLARD et
al., 2006).
17
O Ministério da Saúde (2002) seguindo os critérios da Organização Mundial
da Saúde classifica operacionalmente a hanseníase pelos sinais e sintomas
apresentados pelo paciente em: paucibacilar, para aquele que apresenta até cinco
lesões na pele; e multibacilar para o que possui mais de cinco lesões. Essa
classificação é importante para que seja selecionado o sistema de tratamento
poliquimioterápico adequado.
1.4. TRANSMISSÃO
Admite-se que o homem seja reservatório natural do bacilo, apesar de existir
relatos de animais selvagens como tatus e macacos naturalmente infectados
(VISSCHEDIJK et al., 2000), sendo assim a transmissão da hanseníase dá-se através
do convívio de pessoas susceptíveis com doentes portadores do M. leprae não
tratados. A principal porta de entrada e eliminação do bacilo são as vias aéreas
superiores, entretanto lesões na pele e mucosas também podem servir de entrada para
o patógeno (TALHARI & NEVES, 1997; VAN BEERS et al., 1996).
1.5. EPIDEMIOLOGIA
A Organização Mundial da Saúde (OMS) divulgou em 2010 que o Brasil no
ano de 2009 apresentou a maior taxa de prevalência de Hanseníase no mundo, com
mais de dois casos a cada 10.000 habitantes (FIGURA 2). Segundo o Ministério da
Saúde (2011), em 2009 foram detectados 37.610 novos casos de hanseníase no Brasil,
o estado do Mato Grosso liderou apresentando um coeficiente de 89,48; o Pará
ocupava a 5ª posição neste ranking com um coeficiente de 55,70.
18
FIGURA 2: Taxas de prevalência da lepra, os dados notificados à OMS em Janeiro de
2009 (OMS, 2010).
Em Prudentópolis, Estado do Paraná, 35% dos pacientes com hanseníase
encontravam-se na faixa etária economicamente ativa, de 31 a 45 anos, sendo que
63% dos casos apresentavam-se na forma multibacilar, com predominância da forma
virchowiana, indicando um processo de intensa transmissão da doença (SANCHES et
al., 2007).
Penna et al. (2008) realizaram uma pesquisa em que analisaram aspectos
clínicos e epidemiológicos de pacientes com hanseníase atendidos pelo Hospital
Universitário de Brasília entre os anos de 1985 a 2005, onde observaram que a forma
lepromatosa era a mais prevalente entre os casos, representando 42.9% do total.
Batista et al. (2011) em seu estudo analisando pacientes diagnosticados
com hanseníase no município de Campos dos Goytacazes (Rio de Janeiro) observaram
que houve predomínio de casos em regiões com precárias condições socioeconômicas,
19
sendo que 50,8% dos pacientes pertenciam ao gênero feminino e as formas de maior
prevalência eram a tuberculóide (49,6%) e dimorfa (21,3%).
Já no município de Buriticupu, Estado do Maranhão, dos pacientes
acometidos pela hanseníase 48,4% eram do gênero masculino e 51,6 % do feminino; e
50% do total apresentavam a forma clínica tuberculóide (SILVA et al., 2010).
No ano de 1998, Amador (2004) selecionou municípios considerados
endêmicos para a hanseníase (≥ 20 casos/10.000 hab), entre eles estavam:
Curionópolis (43,72/10.000 hab.), Eldorado do Carajás (15,74/10.000 hab.), Rondon do
Pará (43,00/10.000 hab.), Xinguara (26,77/10.000 hab.) e Dom Eliseu (61,37/10.000
hab.).
1.6. RESPOSTA IMUNE
A resposta imune contra qualquer invasor engloba uma resposta imune inata,
que possui como característica o mecanismo de defesa não especifico, apresentando
ação geral sobre os microrganismos, independente de sua natureza, e uma resposta
imune adaptativa que apresenta mecanismos específicos de defesa baseados no
reconhecimento de antígenos específicos presentes no patógeno (MENDONÇA et al.,
2008).
As
células
do
hospedeiro
reconhecem
padrões
moleculares
das
micobactérias, por meio de receptores de reconhecimento de padrões (PRR). Os
receptores Toll-like (TLRs) são exemplos desses tipos de receptores, eles são
indispensáveis para o reconhecimento do patógeno pelas células dendríticas e pelos
macrófagos durante a resposta imune inata (BRIGHTBILL et al., 1999).
As lipoproteínas do M. leprae são capazes de ativar receptores TLRs, em
especial o TLR-2, e iniciar a resposta protetora com a secreção de interleucina (IL) 1212
20
e 23 e com a diferenciação de macrófagos e células dendríticas (VERRECK et al.,
2004; KRUTZIK et al., 2005).
As células dendríticas apresentam antígenos e por meio da secreção de IL
12 causam a ativação de células T virgens (DEMANGEL & BRITTON, 2000), isso pode
gerar a diferenciação e expansão de células Th1 que produzem interferon γ (IFN-γ) que
estimula elementos da resposta imune a eliminar o patógeno, controlando a evolução
da doença (BRIGHTBILL et al., 1999).
A resposta imune adaptativa é mediada por receptores que se localizam na
membrana dos linfócitos T e B, que reconhecem antígenos específicos, esta resposta é
subdividida em resposta do tipo 1 (Th1) ou celular e resposta do tipo 2 (Th2) ou
humoral. Os linfócitos auxiliares (CD4+) possuem capacidade de induzir resposta imune
celular ou humoral dependendo dos tipos de citocinas secretadas proporcionando
assim o desenvolvimento de respostas Th1 ou Th2 (MORAES et al., 2006).
Células T que produzem e secretam IL-2, interleucina que estimula o
crescimento de células T antígeno específicas, e IFN-γ que ativa macrófagos
predispõem resposta tipo TH1, levando ao desenvolvimento de uma patologia mais
branda ou até mesmo a cura (CHER & MOSMANN, 1987). Já células T que secretam
IL-4 e IL-10 que estimulam células B a se diferenciarem em plasmócitos e secretarem
anticorpos e inibem a ativação de macrófagos resultando em um avanço na infecção
(FIGURA 3) (STEVENS et al., 1988; SIELING & MODLIN, 1994).
21
FIGURA 3: Na forma TT, no padrão de resposta tipo 1, a IL-2 é um fator de crescimento
autócrino para células T helper, que faz ativação de macrófago mediada pelo IFN-γ
(imunidade mediada por célula). No padrão de resposta tipo 2, na forma LL, IL-4 é um
fator de crescimento para células T supressoras estimulando a diferenciação de células
B para produção de anticorpos (imunidade humoral): Na presença de IL-4, uma
subclasse de célula TCD4+ (Th3) são ativadas para produção de TGF- β, potente fator
supressor de macrófago. Citocinas de macrófagos são cruciais em cada padrão: no tipo
1, IL-12 é um poderoso estímulo para células T helper; no tipo 2, IL-10 suprime o
próprio macrófago. Citocinas produzidas em um tipo de resposta podem mutuamente se
inibir de um modo multifacetado, simplificado aqui por duas grandes setas. (GOULART,
2002. Adaptado de GOULART, 1995 e MODLIN & BLOOM 1993).
1.7. DIAGNÓSTICO
O diagnóstico da hanseníase é realizado através da observação de
alterações na sensibilidade da pele no local da lesão, espessamento dos nervos
22
periféricos, e visualização dos Mycobacterium em esfregaços (baciloscopia) de muco
nasal, linfáticos e lesões cutâneas utilizando-se a coloração de Ziehl-Neelsen para
identificar os índices bacilares do paciente. A histopatologia é utilizada como auxílio
diagnóstico para confirmar as suspeitas clínicas e estabelecer o diagnóstico na
classificação de Ridley e Jopling (CARDONA-CASTRO et al., 1998; MINISTÉRIO DA
SAÚDE, 2002; PAVANI et al., 2008).
A pesquisa de anticorpos contra o M. leprae tem sido alvo de vários estudos,
entre os exames que se destacam estão Enzyme Linked Immunosorbent Assay (ELISA)
e teste rápido de fluxo lateral para Mycobacterium leprae (ML-Flow), ambos os ensaios
buscam detectar a presença de imunoglobulinas contra o glicolipídio fenólico I (PGL-I),
partícula antigênica específica do bacilo. Os estudos relatam que a positividade dos
testes estão relacionados a carga bacilar do paciente. Nos pacientes pertencentes ao
pólo lepromatoso verificou-se uma grande produção de imunoglobulinas tipo IgM com
soropositividade de 80 a 100%, enquanto que os pertencentes ao pólo tuberculóide
apresentaram níveis baixos de anticorpos com cerca de 30 a 60% de soropositividade
(CHANTEAU et al.,1989; HUSSAIN et al., 1990; PARKASH et al., 2008). Entretanto, a
detecção de anticorpos IgM anti-PGL-I não pode ser utilizada como um teste de
diagnóstico, é necessário que sejam realizados outros exames como a avaliação do
quadro clínico do paciente, baciloscopia e a histopatologia para se confirmar a doença.
A detecção de anticorpos é particularmente útil no diagnóstico de hanseníase
multibacilar, mas o nível de anticorpos em pacientes paucibacilares pode ser muito
baixo ou indetectável (BÜHRER-SÉKULA, 2008).
Por não ser um microorganismo cultivável in vitro, a identificação definitiva do
M. leprae é bastante problemática, ensaios moleculares como a reação em cadeia da
polimerase (PCR) tem sido utilizados para a detecção da bactéria em diferentes
amostras provenientes de pacientes com hanseníase, como esfregaços das lesões na
pele (KANG et al., 2003; Torres et al., 2003), biópsias de pele (HARTSKEERL et al.,
1989; WILLIAMS et al., 1990), lesões de nervo (CHEMOUILLI et al., 1996). Além da sua
23
aplicabilidade na confirmação diagnóstica da infecção, esse ensaio também tem sido
utilizado
para
a
detecção
de
mutações,
fornecendo
resultados
rápidos
de
suscetibilidade as drogas antimicrobianas em amostras obtidas diretamente do paciente
(SCOLLARD et al., 2006).
A PCR mostrou 100% de especificidade e sensibilidade de 34-80% em
pacientes paucibacilares e 90% em pacientes multibacilares, sendo assim a PCR pode
fornecer um complemento excelente para o diagnóstico clínico e histopatológico da
hanseníase, entretanto, este ensaio ainda não é utilizado na rotina de diagnóstico
laboratorial devido seus elevados custos (SCOLLARD et al., 2006).
1.8. TRATAMENTO
O Ministério da Saúde (2002) adota o tratamento poliquimioterápico
padronizado pela Organização Mundial de Saúde para o tratamento de pacientes com
hanseníase. Este tratamento tem por finalidade matar o bacilo, inviabilizando assim a
evolução da doença e prevenindo novas contaminações
O tratamento é constituído pela associação dos medicamentos rifampicina,
dapsona e clofazimina, a administração em conjunta dessas drogas evita que o bacilo
adquira resistência, fato que ocorre frequentemente com a utilização de apenas um
medicamento, dificultando assim a cura da doença (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2002).
Para os pacientes classificados com paucibacilares é administrado sob
supervisão uma dose mensal de 600 mg de rifampicina (duas cápsulas contendo 300
mg cada), e uma dose de 100 mg de dapsona, além disso deve ser utilizadas doses
diárias de dapsona, o tratamento possui
supervisionadas
de
rifampicina.
Nos
casos
duração de seis doses mensais
de
pacientes
multibacilares
são
administradas doses mensais supervisionadas de rifampicina (duas cápsulas de 300
mg), clofazimina (três cápsulas de 100 mg) e dapsona (uma cápsula de 100), e doses
24
diárias de 50 mg de clofazimina e 100 mg de dapsona com duração média de doze
doses mensais supervisiondas de rifampicina (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2002).
1.9. O ANTÍGENO LEWIS Y
O antígeno de grupo sanguíneo
Lewis Y (LeY) é um tetrassacarídeo
difucosilado derivado da cadeia precursora de tipo 2, isômero posicional do antígeno de
grupo sanguíneo Lewis b e um derivado fucosilado de Lewis X, sua diferença em
relação ao antígeno Lewis X deve-se apenas a adição do resíduo terminal 1,2 fucose
(YOUNG, et al. 1986) (Tabela 1).
Tabela 1: Antígenos de grupo sanguíneo (Adaptado de YOUNG, et al. 1986).
ANTÍGENO
DETERMINANTE ANTIGÊNICO
Cadeia do tipo 2
Lewis Y
Lewis X
Estudos mostraram que durante o período da embriogênese o antígeno
Lewis y foi detectado no citotrofoblasto e em células endoteliais do vilo coriônico
(MINAS et al., 2007), em tecidos do feto e em recém-nascidos (HELLER & THUNG,
1990; CANDELIER et al., 2000). Em adultos são expressos em precursores
hematopoiéticos, células endoteliais vasculares, em superfícies epiteliais do trato
25
gastrointestinal como no esôfago, estômago, intestino grosso e delgado, algumas
células exócrinas do pâncreas, e no epitélio ciliado da traquéia e dos brônquios
(MOLLICONE et al., 1985; KITAMURA et al., 1994; KIM et al., 1986; CAO et al., 2001;
HELLSTROM et al., 1990; ZHANG et al., 1997). Níveis elevados de Lewis y foram
encontrados no acrossoma e estavam ausentes na membrana plasmática de
espermatozóides saudáveis, já em espermatozóides defeituosos foi observado a
expressão deste antígeno na membrana plasmática (PANG et al., 2007).
A expressão elevada de Lewis y foi encontrada na maioria dos carcinomas,
incluindo câncer de mama, ovário e de cólon, sendo que sua expressão está
relacionada com o grau de severidade e progressão da doença (ARAI & NISHIDA,
2003; MADJD et al., 2005).
Halloran et al. (2000) em sua pesquisa sugeriram que o antígeno Lewis Y
possui importante contribuição no processo de angiogênese inflamatória, baseando-se
na habilidade de um análogo de Lewis Y induzir a migração de células in vitro e
promover o crescimento de vasos sanguíneos in vivo. A expressão e a regulação de
Lewis Y na superfície de células endoteliais da microvasculatura dermal humana é
determinado por citocinas, já que foi observada uma maior expressão deste antígeno
em células estimuladas com exposição a Fator de Necrose Tumoral α (TNF-α) e por
Interleucina 1β (IL-1β). Shi et al. (2008) observaram que a interação específica entre o
domínio recombinante de trombomodulina (rTMD1) com o antígeno Lewis Y amplifica o
mecanismo na modulação da resposta inflamatória mediada por LPS.
Além disso, Nyström et al. (2007) observaram a expressão elevada (30-40%)
de Lewis Y no citoplasma e na superfície de fibroblasto infectadas por Citomegalovirus,
isso deve-se pelo fato deste vírus induzir a expressão de fucosiltrasnferase 1 (FUT 1),
necessário para a expressão de LeY. A indução deste antígeno pode ser significativa
para a disseminação do vírus e para o possível escape da resposta imune, já que
provavelmente
o
antígeno
LeY
está
envolvido
na
adesão
de
leucócitos
polimorfonucleados, que possuem papel central na disseminação deste vírus. Assim
26
como, Wirth et al. (1996) relataram que 89% das H. pylori isoladas apresentavam
determinantes Lewis expressos em seus lipopolissacarídeos, imitando glicoconjugados
presentes na superfície de célululas humanas. Sugerindo que a grande expressão de
LeX e LeY por cepas de H.pylori CagA1 positivas poderia contrabalançar sua maior
atividade pró-inflamatória, facilitando assim a persistência da infecção.
27
2. JUSTIFICATIVA
A infecção ativa pelo Mycobacterium leprae é caracterizada por uma grande
diversidade no curso clínico da infecção, variando de uma doença paucibacilar na qual
poucos bacilos estão presentes, a uma doença multibacilar, na qual uma grande carga
bacilar está presente nas lesões.
A hanseníase é uma doença típica de regiões pobres, nas quais o baixo nível
sócio-econômico das famílias leva a um aglomerado humano, facilitando a propagação
da bactéria. Somando-se a esta situação, temos ainda as baixas condições de higiene
e desnutrição, que tornam o organismo mais suscetível às doenças (KERR-PONTES et
al., 2006). No contexto biopsico-social, o comprometimento de nervos periféricos
acarreta deformidades e incapacidades físicas que podem levar o indivíduo a
problemas psicológicos, incluindo a redução de suas atividades laborais e de vida
social, o que determinam que a doença ainda seja vista como estigma e preconceito.
Desta forma, é importante que se determine o estágio e a forma da doença, a fim de
que a pessoa possa ser tratada e deixe de ser um contactante, não havendo
necessidade de isolamento social (KERR-PONTES et al., 2006; MINISTÉRIO DA
SAÚDE, 2002).
O M. leprae tem a capacidade de infectar grande número de indivíduos, mas
poucos adoecem pela sua baixa patogenicidade, propriedade esta que não é função
apenas de suas características intrínsecas, mas que depende, sobretudo, de sua
relação com o hospedeiro e grau de endemicidade do meio. O domicílio é apontado
como importantes espaços de transmissão de doença, embora ainda existam grandes
lacunas de conhecimento quanto aos prováveis fatores de risco implicados,
especialmente aqueles relacionados com o ambiente social (MINISTÉRIO DA SAÚDE,
2002).
Neste aspecto, torna-se fundamental avaliar as possíveis relações entre
certos marcadores genéticos do hospedeiro, como os histoantígenos Lewis, estruturas
28
presente nas células epiteliais e secreções, envolvidos nos processos de comunicação
e reconhecimento celular, provavelmente regulando também interações hospedeiropatógeno, posto que, durante os processos inflamatórios e de diferenciação,
crescimento, reparo e sobrevivência celular, os antígenos fucosilados Lewis atuam na
adesão celular e parecem exercer atividades angiogênicas e de migração celular,
inerentes aos mecanismos de homeostasia e de defesa do hospedeiro.
Neste sentido, vem sendo questionada a relação entre os diferentes níveis
de suscetibilidade para certas infecções e a expressão destes histoantígenos de grupos
sanguíneos no hospedeiro, que manifestam uma regulação diferencial em vários órgãos
e tecidos do mesmo indivíduo, com possíveis implicações na interação dos agentes
patogênicos.
Portanto, a necessidade de investigar a distribuição deste antígeno Lewis Y
em pacientes com M. leprae é primordial para aprofundar o limitado entendimento da
patogênese da hanseníase.
O valor de estudos genéticos de suscetibilidade ao M. leprae não só contribui
para um melhor entendimento da biologia e patogênese da doença, mas também
permite identificar populações de risco e promover estratégias de prevenção e controle
epidemiológico no processo saúde-doença.
29
3. OBJETIVOS
3.1. OBJETIVO GERAL
Analisar por imunohistoquímica, a expressão dos antígenos de grupos
sanguíneos LeY em biópsias de lesão de pele de indivíduos com diagnóstico de
infecção pelo M. leprae, provenientes do Estado do Pará, e associar a presença deste
antígeno com os achados histopatológicos das diferentes formas clínicas da doença.
3.2. OBJETIVOS ESPECÍFICOS
Detectar por imunohistoquimica o antígeno de grupo sanguíneo Lewis Y em
biópsias de lesão de pele dos casos com diagnóstico de hanseníase.
Analisar a relação entre o espectro histopatológico das várias formas clínicas
exibidas pelos indivíduos com hanseníase, com os achados imunohistoquímicos da
expressão dos antígenos Lewis Y.
Verificar a distribuição das formas de manifestações clínicas diferenciadas
da doença, com as condições sócio-econômicas dos municípios investigados.
30
4. MATERIAL E MÉTODOS
4.1. CASUÍSTICA:
Foram analisadas 54 amostras de biópsias de lesões de pele de pacientes
com hanseníase, encaminhadas para o Serviço de Histopatologia do Laboratório
Central do Estado do Pará (LACEN), no período de 2000 a 2008, para avaliação
diagnóstica.
4.2. DELINEAMENTO DO ESTUDO:
Trata-se de um estudo observacional descritivo, transversal e retrospectivo.
4.3. ASPECTOS ÉTICOS:
O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Instituto de
Ciências da Saúde da UFPA, protocolo nº 067/09, conforme rege a resolução 196/96,
do Conselho Nacional de Ética em Pesquisa.
4.4. INDICADORES DE POBREZA:
As informações sobre os indicadores de desenvolvimento sócio-econômico
das regiões do Estado do Pará avaliadas foram obtidas dos sites do IBGE e da
UNESCO, que considerou o número de habitantes por município, o PIB per capta para
o ano de 2007 e índice de desenvolvimento Humano estimado em 2000.
31
4.5. TAXA DE DETECÇÃO DA HANSENÍASE:
Foi calculada de acordo com os critérios estabelecidos pelo Ministério da
saúde que se baseia na razão entre o número de casos confirmados pelo número total
de habitantes multiplicado por 10.000 hab, adotando assim a classificação das taxas de
detecção de casos por 10 mil habitantes: baixa (menor que 0,2), média (0,2 a 0,9), alta
(1,0 a 1,9), muito alta (2,0 a 3,9) e situação hiperendêmica (maior ou igual a 4,0).
4.6. EXAME HISTOPATOLÓGICO:
Foram realizadas as colorações de rotina Hematoxilina-Eosina para
diagnóstico histopatológico e classificação da Hanseníase de acordo com critérios de
Ridley e Jopling (1966), além da coloração de FITE-FARACO (1938) para detecção do
bacilo de Hansen nas biópsias de pele.
4.7. IMUNOHISTOQUÍMICA:
4.7.1. Detecção imunohistoquímica dos marcadores de predisposição
genética a infecção pelo M. leprae: Lewis Y
Os fragmentos de pele fixados em formalina foram processados, incluídos
em blocos de parafina, cortados de forma serial com espessura de 4 a 5 µm e dispostos
em lâminas silanizadas. Estes cortes foram submetidos à técnica de imunohistoquímica
indireta (adaptada de Pedal, 1987; Pedal et. al., 1989) para detecção dos antígenos
LeY. Inicialmente, as lâminas são aquecidas em estufa e desparafinizadas em xilol.
Para detecção dos antígenos LeY as lâminas foram submetidas à hidratação
em banhos de concentrações decrescentes de etanol e lavadas em tampões Tris/HCl
32
(pH 7.6), duas vezes, durante 5 minutos. Todos os cortes testados para o antígeno
Lewis y foram incubados em tampão bloqueador (tampão Tris/HCl e albumina bovina
em diluição de 1:20) e seguida pela incubação com anticorpos monoclonais primários
LeY (1:50) diluído com solução bloqueadora. Após a incubação com este anticorpo foi
realizada lavagem em tampão Tris/HCl e posteriormente foram incubadas com o
anticorpo secundário anti-mouse (IgM) conjugado à fosfatase alcalina (diluição 1:50). A
reação de revelação de cor foi realizada com o kit Histomark Red (KPL laboratories)
durante 20-30 minutos, segundo a especificação do fabricante. Os cortes são lavados
abundantemente em água destilada, coloridos com hematoxilina e desidratados em
etanol e montadas com resina sintética e lamínula.
4.7.2. Controles da reação imunohistoquímica:
Negativo: Os anticorpos primários e secundários foram substituídos por
tampão Tris/HCl na reação.
Positivo: Estruturas celulares internas conhecidas por expressarem os
antígenos a serem investigados foram utilizadas como controle.
4.8. ANÁLISE DA REAÇÃO DE IMUNOHISTOQUÍMICA:
O padrão de reação do antígeno Lewis Y na pele (epiderme, derme,
incluindo endotélio vascular e glândulas) foi classificado segundo o tipo de coloração
encontrada. Foram consideradas positivas as reações que coraram de forma
homogênea toda a região analisada, enquanto foram agrupadas, em padrão de reação
heterogênea, as que continham células com e sem coloração, além do padrão negativo,
sem coloração. Esta expressão antigênica foi graduada de acordo com as proporções
de células positivas versus a intensidade de reação, considerada fraca (1); moderada
(2) e forte (3) adquirindo escore que variou de 0 a 300. A marcação com escore maior
33
ou igual a 270 foi considerada uniformemente positiva, as amostras que obtiveram
escore maior que 30 e menor que 270 foram consideradas com redução de expressão
e aquelas que ficaram com escore abaixo de 30 foram consideradas negativas.
4.9. ANÁLISE ESTATÍSTICA:
Foram empregados testes estatísticos adequados como: teste G, regressão
logística múltipla, teste binomial e teste de tendência, para avaliar as diferenças entre
as proporções amostrais. O aplicativo de computador utilizado foi o Bio Estat versão 5.0
com significância estatística aceita ao nível de 95% (Ayres et al., 2007).
34
5. RESULTADOS
5.1. EPIDEMIOLOGIA
Foram analisados 54 pacientes dos quais, 26 (48%) apresentaram
hanseníase do tipo indeterminado (MHI), 18 (33%) tinham hanseníase tuberculóide
(MHT), 6 (11%) com hanseníase dimorfa tuberculóide (MHDT), 2 (4%) com hanseníase
dimorfa virchorviana (MHDV) e 2 (4%) apresentaram hanseníase virchoviana (MHV)
(Tabela 2).
A média de idade observada foi de 30 anos, variando de 06 meses a 74
anos.
A distribuição entre os gêneros de uma maneira geral, não mostrou um
predomínio entre o gênero masculino e o feminino, ou vice versa (Tabela 2). Embora,
tenha sido observada uma maior proporção de homens afetados com a forma de
hanseníase dimorfa tuberculóide (Teste Binomial, Z = 2,3094, p = 0,0209).
35
Tabela 2: Frequência dos tipos histológicos de Hanseníase apresentados pelas
biópsias analisadas, correlacionadas com gênero e procedência dos pacientes.
TIPOS HISTOLÓGICOS
Frequências
Gênero
Procedência
(Mesorregião)
MHI
MHT
MHDT
MHDV
MHV
TOTAL
Absoluta
26
18
6
2
2
54
Relativa (%)
0,48
0,33
0,11
0,04
0,04
1
Masculino
10
10
5
1
0
26
Feminino
16
8
1
1
2
28
Belém
8
3
1
0
0
12
Marajó
5
4
1
0
0
10
Nordeste
7
5
1
2
2
17
Sudeste
0
3
0
0
0
3
Sudoeste
6
3
3
0
0
12
O estudo demonstrou que a hanseníase tem uma distribuição geográfica
heterogênea no estado do Pará, existindo áreas com baixa prevalência, permeadas por
aquelas de grandes concentrações de casos (Tabela 2). Os municípios da região
Nordeste do estado do Pará detêm 31% dos casos detectados nesta amostra (FIGURA
4).
36
FIGURA 4: Distribuição dos casos de hanseníase pelas mesorregiões do Estado do
Pará.
De um modo geral, uma associação entre região geográfica e as formas de
hanseníase não foi evidenciada (Teste G (Williams) = 13,2979; p = 0,6509) (FIGURA 5),
contudo é importante salientar que como a mesoregião nordeste foi a que apresentou
maior concentração dos casos da doença, as formas mais severas, de menor
prevalência, foram detectadas nesta região, que detém todos os casos de MHDV e os
de MHV (Tabela 2).
37
FIGURA 5: Distribuição das formas de hanseníase de acordo com a Região do Estado
do Pará.
Em relação às condições sócio econômicas das populações, este estudo
evidenciou uma associação altamente significativa (Teste G (Williams) = 32,6869; p <
0,0001) entre a baixa renda salarial e a taxa de detecção elevada da doença (FIGURA
6), concentradas principalmente na região Nordeste, Sudoeste e Marajó (FIGURA 7).
Uma agregação da doença foi mais evidentes nos municípios de Igarapé-Miri, Portel e
Altamira (Tabela 3) que apresentam um dos mais baixos PIB per capita do Estado. O
Índice de Desenvolvimento Humano estimado para o ano de 2000 para a maioria das
cidades avaliadas neste estudo atingiu um médio desenvolvimento, perdendo somente
para o Capital, que atingiu um índice alto (Tabela 3).
38
FIGURA 6: Taxa de detecção de hanseníase segundo o PIB Per Capto de 2007 no
Estado do Pará.
FIGURA 7: Redimento per capto das regiões do Estado do Pará.
39
Tabela 3: Avaliação epidemiológica da Hanseníase segundo a localidade do Estado do Pará no período de 2000 a 2008.
Taxa de
Mesorregião
Microrregião
Município
Casos População
Detecção/10000
hab
Região
Metropolitana
Marajó
IDH
Renda
5
1437600
0.03
Baixa
Alto
>1
Barcarena
7
92567
0.76
Média
Médio
>1
Portel
10
48945
2.04
Muito Alta
Médio
<1
Abaetetuba
1
139819
0.07
Baixa
Médio
<1
Cametá
1
117099
0.09
Baixa
Médio
<1
Igarapé-Miri
12
57003
2.11
Muito Alta
Médio
<1
Ajurú
1
24967
0.40
Média
Médio
<1
Guamá
Ourém
1
15841
0.63
Média
Médio
<1
Salgado
Salinópolis
1
39184
0.26
Média
Médio
<1
Paragominas
1
97350
0.10
Baixa
Médio
>1
Rondon do Pará
1
47772
0.21
Média
Médio
<1
Portel
Nordeste
Limoeiro do
Paragominas
Sudoeste
epidemiológica
Belém
Belém
Cametá
Sudeste
Avaliação
São Félix do
São Félix do
Xingu
Xingu
1
57003
0.18
Baixa
Médio
<1
Itaituba
Novo Progresso
1
21504
0.47
Média
Médio
>1
Altamira
Altamira
11
98750
1.11
Alta
Médio
<1
40
5.2. CARACTERIZAÇÃO IMUNOHISTOQUÍMICA DO ANTÍGENO DE GRUPO
SANGUÍNEOS LEWIS Y EM BIOPSIAS DE PELE.
O antígeno Lewis Y (LeY) foi detectado em 59% (32/54) dos indivíduos
com hanseníase. Este antígeno foi localizado de forma isolada e/ou combinada em
diferentes áreas da epiderme (FIGURA 8), no endotélio vascular, histiócitos,
linfócitos, células epitelióides, glândulas sudoríparas (FIGURA 9), enquanto sua
expressão nos neutrófilos e nervo foi detectada em um frequência muito baixa.
FIGURA 8: Padrão de reação para o antígeno Lewis Y com positividade
heterogênea na epiderme (seta fina). Método de imunohistoquímica com fosfatase
alcalina. Coloração de fundo: Hematoxilina. Aumento 400X.
41
FIGURA 9: Padrão de reação para o antígeno Lewis Y com positividade
nas glândulas sudoríparas (seta fina), em células do endotélio vascular (seta grossa)
e em células inflamatórias da lesão (
). Método de imunohistoquímica com
fosfatase alcalina. Coloração de fundo: Hematoxilina. Aumento 400X.
42
A tabela 4 lista a frequência de positividade de coloração para o antígeno
Y
Le de acordo com a ocorrência nas diferentes estruturas histológicas da pele nos
diferentes espectros das formas clínicas analisadas.
Tabela 4: Expressão do antígeno Lewis Y em biópsias de pele de indivíduos
hansênicos distribuída em relação às formas clínicas.
Reatividade do antígeno Lewis Y
MHI
MHT
MHV
MHDT
MHDV
N=26(%)
N=18(%)
N=2 (%)
N=6 (%)
N=2 (%)
Estruturas histológicas
Epiderme
Superficial/Granulosa
8
(31)
8
(44)
1
(50)
1
(17)
1
(50)
Malpighi/Basal
8
(31)
9
(50)
1
(50)
2
(33)
2
(100)
Histiócitos
9
(35)
9
(50)
1
(50)
3
(50)
2
(100)
Endotélio Vascular
15
(58)
10
(56)
1
(50)
5
(83)
1
(50)
Linfócitos
8
(31)
8
(44)
0
(0)
3
(50)
2
(100)
Células epitelióides
1
(4)
6
(33)
0
(0)
1
(17)
2
(100)
Glândulas sudoríparas
7
(27)
6
(33)
2
(100)
3
(50)
0
(0)
Neutrófilos
2
(8)
1
(6)
0
(0)
2
(33)
0
(0)
Nervos
3
(12)
0
(0)
0
(0)
1
(17)
0
(0)
No grupo controle, constituído de pele normal de indivíduos sadios, o
anticorpo usado para Lewis Y não marcou nenhuma destas estruturas histológicas.
Quanto ao padrão de reação, observou-se uma variação na intensidade
da marcação, que foi classificado como homogêneo, caracterizado por apresentar
uma forte reatividade (+++) e com distribuição histológica uniforme; heterogênea
43
quando o padrão de reação variava apresentado áreas com forte marcação e outras
estruturas com reatividade fraca (++/+).
O padrão homogêneo de reatividade frequentemente estava associado
com a severidade das lesões inflamatórias, sendo que, a marcação mais intensa e
homogênea para o antígeno LeY ocorreu com elevada frequência em células de
áreas com maior grau de alteração histológica, enquanto nas áreas com aparência
normal não foi encontrada qualquer reatividade.
Em nível celular, a reação imunohistoquímica apresentou uma tendência
para a marcação citoplasmática, contudo frequentemente também predominava a
coexistência de coloração na membrana e citoplasma ou marcação apical da
membrana citoplasmática em algumas áreas, visível particularmente, em estruturas
glandulares.
Neste estudo, a atividade antigênica Lewis Y detectada nos espécimes de
biópsia (sem considerar a localização específica por estrutura histológica) não
demonstrou dependência com as várias formas clínicas da doença (Teste
G(williams) = 1,6247; p = 0,8043), entretanto, a partir desta relação, foi notada uma
tendência significativa (Teste de tendência, A = 13,9597, X2 = 33,7005, p < 0,0001)
ao aumento do número de casos que expressavam o antígeno Lewis Y entre os
pacientes com a forma clínica dimorfa tuberculóide em relação aqueles que
apresentavam as formas clínicas e imunológicas mais estáveis, os tipos
indeterminado e tuberculóide (FIGURA 10).
44
FIGURA 10: Expressão de Lewis Y nas diferentes formas clínicas de hanseníase.
As formas lepromatosas e dimorfa lepromatosa foram excluídas desta
análise comparativa, devido à escassez do número de casos disponíveis, que
impossibilitou os testes estatísticos.
Assim, o número de casos com atividade antigênica Lewis Y, não permitiu
um perfil diferenciado entre as formas mais graves, pólo lepromatoso, e as formas
mais estáveis da doença.
Além disso, não foi evidenciada uma associação estatisticamente
significativa, através da análise de regressão logística múltipla, entre a presença
deste antígeno no endotélio vascular (59,26%) com as variáveis de gênero, idade,
procedência e condições sócio-econômicas.
Merece ressaltar que o antígeno Lewis Y estava expresso na maior
proporção dos casos nas células endoteliais, seguida pela marcação dos histiócitos
e linfócitos.
45
6. DISCUSSÃO
6.1. EPIDEMIOLOGIA
A hanseníase é uma doença infecto-contagiosa com espectro de formas
clínicas e que apesar de efetivos regimes de tratamento e programas de controle,
continua a ser a principal causa de neuropatias periféricas, levando a incapacidade
física e social quanto mais tardia for seu diagnóstico e tratamento.
O Pará é um dos estados do Brasil com maior prevalência, assim medidas
urgentes precisam ser tomadas para minimizar a expansão da doença. A principal
fonte de infecção é o homem tendo como provável porta de entrada as vias aéreas
superiores. Em áreas endêmicas, o ciclo de transmissão da doença pode ser
favorecido por locais de péssimas condições de saneamento básico e de higiene,
uma vez que, o M. leprae pode ser viável por meses no ambiente (MATSUOKA et al,
1999; DESIKAN & SREEVATSA, 1995), assim o bacilo teria maior probabilidade de
estabelecer uma infecção no hospedeiro suscetível, o que manteria ou mesmo
aumentaria a incidência da doença na região.
Provavelmente, a agregação da doença em alguns municípios como
Igarapé-Miri, Portel e Altamira (Tabela 3) associa-se com as precárias condições de
vida das populações e a acessibilidade aos serviços, cuja dificuldade atinge os mais
carentes. Esta averiguação é semelhante ao descrito para outras localidades do
Brasil (AQUINO et al, 2003; SAHO, 1998). O ambiente não apenas possibilita como
determina a ocorrência de endemias e sua distribuição.
Logo, o acesso do paciente e sua integração com os serviços primários
de saúde são imprescindíveis e precisam ser aprimorados, permitindo um melhor
monitoramento e controle da infecção.
O estudo mostrou que a incidência da hanseníase apresentou taxas
similares entre homens e mulheres, com maior prevalência entre aqueles com idade
46
acima de 15 anos, o que está de acordo com outros dados descritos na literatura
(BARBIERI & MARQUES, 2009; IMBIRIBA et al., 2009).
6.2. IMUNOHISTOQUÍMICA
Gliconjugados (glicoproteínas/glicolipideos) são conhecidos por constituir
a base química de vários sistemas de grupo sanguíneo no homem e desempenham
importantes funções nos mecanismos imunes e na interação célula-célula, assim
como ligantes microbianos, embora ainda não esteja clara a sua relação direta com
nenhuma destas funções (HOLGERSSON et al., 1992; FEIZI, 2000 e LEE et al.,
2002).
O antígeno de grupo sanguíneo Lewis Y é um tetrassacarídeo
difucosilado
(Fucα1→2Galβ1→3[Fucα1→4]
GlcNAcβ1→R),
encontrados
em
glicolipídeos com cadeias oligossacarídicas do tipo 2, portanto um isômero
posicional do antígeno Leb e um derivado fucosilado do antígeno Lex, que exercem
funções nos processos de adesão e motilidade celular, atuando no tráfico de
leucócitos e resposta inflamatória (HAKOMORI, 1991; KUIJPERS,1993; HENRY et
al., 1995).
Assim, o antígeno Lewis Y é identificado como um antígeno carboidrático
oncofetal relacionado a ontogênese (MIYAKE et al., 1988), apoptose celular
(HIRAISHI, et al., 1993; YAMADA et al.,1996) e câncer humano (MIYAKE et al.,
1992; YIN et al., 1996; TANAKA et al., 1998). Este determinante LeY é expresso
principalmente nas membranas de células endoteliais e em algumas células
epiteliais, mas pode está também presente em células circulantes do sistema
hematopoiético (KITAMUTA et al., 1994; MADAMANCHI et al., 2001) e ainda em
certas circunstâncias patológicas este antígeno também aparece em células da
linhagem linfóide, por exemplo nos linfócitos infectados com o vírus HIV (ADACHI et
al., 1988).
47
No presente estudo, este antígeno LeY mostrou reatividade em áreas
histológicas com lesões inflamatórias da pele de indivíduos com infecções
hansênicas, contudo encontrava-se negativamente regulado nas biopsias de pele de
indivíduos normais do grupo controle. De forma similar, nos também observamos
expressão seletiva deste antígeno LeY restrita a estas áreas lesionadas e,
contrariamente, sem expressão nas outras áreas não inflamadas de espécimes de
pele do mesmo indivíduo com doença hansênica. Estes resultados sugerem que o
antígeno LeY deve ter participação ativa nos processos inflamatórios, funcionando
como molécula de adesão e/ou na forma solúvel, é capaz de induzir a expressão
dessas moléculas, pois estudos prévios (MALY et al., 1996; HALLORAN et al., 2000;
ZHU et al., 2003) mencionam a importância na inflamação desta propriedade
antigênica LeY em induzir adesão leucocitária ao endotélio vascular.
O Lewis Y é um antígeno citocina induzível, mediada em condições
inflamatórias por inteleucina 1β e TNF-α, que pode regular sua expressão nas
células endoteliais. Sob estas circunstâncias este antígenos se ligaria a um receptor
desconhecido, talvez um receptor tipo lectina C, a exemplo da trombomodulina
(CD141), identificado como receptor para Lewis Y (SHI et al., 2008), presentes nas
células endoteliais microvasculares dermais, que por ativação da via da sinalização
JAK-2/STATE3 intensificaria a transcrição de genes da molécula ICAM -1, que
diretamente promoveria o recrutamento de células inflamatórias com o ligante
CD11a/CD18 (LFA-1) na superfície destas células (PORTER & HOGG 1997; ZHU et
al., 2003).
Por outro lado, reforçando as observações acima, nossos resultados
demonstraram que a expressão do antígeno LeY localizou-se preferencialmente nas
células endoteliais, e ainda particularmente em histiócitos e linfócitos das biópsias
pele de pacientes hansênicos. Estas observações não surpreenderam, visto que
estes tipos de células apresentam uma intensa atividade durante a resposta imune
inata. Deste modo, estes dados acima mencionados corroboram os achados da
literatura sobre os efeitos angiogênicos do antígeno LeY, visto que em estudo prévio
de Halloran et al. (2000) com experimentos in vitro mostraram que o antígeno LeY
solúvel seria quimiotático para as células endoteliais microvasculares da derme
48
humana e induz neo-vascularização do tecido inflamado, cuja a resposta in vivo foi
similar aquela de outros potentes fatores angiogênicos, como o do fator de
crescimento endotelial vascular e o de crescimento fibroblástico básico. Portanto,
segundo estes autores a família de moléculas tipo antígeno Lewis incluindo LeY e H
e seus ligantes, a exemplo de E-selectina no caso de Sialil-Lewis X, regulariam a
angiogênese via mimetismo estrutural.
O presente estudo tentou avaliar a inter-relação de suscetibilidade
genética inerente a resposta imunológica do hospedeiro, usando, como marcador a
expressão
imunohistoquímica
do
antígeno
Lewis
Y,
com
as
diferenças
histopatológicas das lesões cutâneas, caracterizadas nas várias formas clínicas da
doença. Contudo, neste estudo esta relação não pode ser elucidada, em decorrência
das limitações metodológicas quanto à representatividade amostral entre as formas
clínicas da doença.
O patógeno M. leprae infecta pelo menos dois tipos de células,
macrófagos e células de Schwann, ambas contribuído para a patogênese desta
doença. Recentemente, Teles et al. (2010) concluíram que os mecanismos de
interação patógeno-hospedeiro em lesões de nervo periférico na hanseníase
dependem da expressão do receptor tipo lectina C, conhecido como CD 209 ou DCSIGN (molécula de adesão intercelular 3 especifica de células dendrítica). Este
representaria o mecanismo comum pelos quais macrófagos e células de Schwann
ligam e fagocitam o M. leprae, resultando em destruição do invasor e também em
inflamação de nervos periféricos, que é a causa principal de morbidade do paciente
hansênico.
O reconhecimento do M. leprae pelo CD209 é mediado pela interação
com resíduos específicos de manose (MAN-LAM) presente na parede celular desta
bactéria (GEIJTENBEEK et al., 2003; GRINGHUIS et al., 2007). Assim, a regulação
da expressão de CD 209 em células de Schwann, células endoteliais e macrófagos
teciduais podem afetar a indução da resposta imune. Este receptor CD 209 ou DCSIGN demonstra uma elevada afinidade por antígenos de grupo sanguíneo Lewis
que contém resíduos de fucose (LeX, LeY, Lea e Leb). Portanto, DC-SIGN através do
49
antígeno LeY expresso em ICAM-2 leva a adesão e o rolamento de células
dendríticas no endotélio vascular (GUO et al., 2004; APPELMELK et al., 2003;
SVAJGER et al., 2010).
Como acima mencionado, este receptor CD209 além de ligar-se a
antígenos estranhos também interagem com grande número de ligantes endógenos,
particularmente ICAM-2 nas células endoteliais e ICAM-3 em linfócitos T
contribuindo para a migração transendotelial de células dendríticas (GEIJTENBEEK
et al., 2000a; GEIJTENBEEK et al., 2000b; SVAJGER et al., 2010).
De acordo com van Kooyk et al. (2003), revisado em Svajger et al. (2010),
a ligação de DC-SIGN por diferentes patógenos, a exemplo do M. leprae, pode levar
a infecções crônicas, manipulando o balanço de trocas da resposta imune Th1
versus Th2, que é crucial para a virulência e persistência destes patógenos no
hospedeiro.
50
7. CONCLUSÃO
Neste estudo, notou-se uma maior prevalência das formas clínicas MHI
(48%) e MHT (33%).
Foi observada uma porcentagem maior de casos registrados na região
Nordeste do Pará (31%).
Evidenciou-se associação entre a baixa renda salarial e a taxa de
detecção elevada da doença (p<0,0001).
O antígeno Lewis Y estava expresso principalmente nas células
endoteliais, seguido pela marcação dos histiócitos e linfócitos. Entretanto, a
atividade antigênica Lewis Y não demonstrou dependência com as várias formas
clínicas da doença (p= 0,8043).
Foi notada uma tendência significativa (p<0,0001) ao aumento do
número de casos que expressavam o antígeno Lewis Y entre os pacientes com a
forma clínica dimorfa tuberculóide.
51
8. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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