o significado dos direitos humanos da criança e do

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MARIA WILMA DE SOUZA BEZERRA LEIROS
O SIGNIFICADO DOS DIREITOS HUMANOS DA
CRIANÇA E DO ADOLESCENTE
EM EXCLUSÃO SOCIAL
UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA
CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS LETRAS E ARTES
II CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO EM DIREITOS HUMANOS
JOÃO PESSOA
2002
MARIA WILMA DE SOUZA BEZERRA LEIROS
O SIGNIFICADO DOS DIREITOS HUMANOS DA CRIANÇA
E DO ADOLESCENTE EM EXCLUSÃO SOCIAL
Monografia apresentada ao II Curso de
Especialização em Direitos Humanos da
Universidade Federal da Paraíba, em
cumprimento às exigências para
obtenção do Título de Especialista em
Direitos Humanos
Orientadora: Profª. Drª. Maria de Fátima Martins Catão
Universidade Federal da Paraíba
Centro de Ciências Humanas Letras e Artes
II Curso de Especialização em Direitos Humanos
MARIA WILMA DE SOUZA BEZERRA LEIROS
O SIGNIFICADO DOS DIREITOS HUMANOS DA CRIANÇA
E DO ADOLESCENTE EM EXCLUSÃO SOCIAL
Aprovada em 10 de dezembro de 2002
BANCA EXAMINADORA
Profª Drª Maria de Fátima Martins Catão
Profª Drª. Maria da Penha de Lima Coutinho
Prof. Dr. Giuseppe Tosi
Com muito amor, ao meu esposo Júlio César de Oliveira e às
crianças e adolescentes do Projeto Cre/ser, dedico esta obra
que pode ser de vocês também.
AGRADECIMENTOS:
A Deus presença constante em minha vida.
Aos meus pais (Iris e Leiros) pelo incentivo.
Ao Projeto Cres/ser, pela confiança em mim depositada.
À Prof.ª Dr. Maria de Fátima Martins Catão, pela orientação e ensinamentos
ministrados e, sobretudo, pelo estímulo às minhas atividades profissionais.
Ao Prof. Dr. Joselí Bastos da Costa, pelo apoio recebido.
E, aos demais, de alguma forma, contribuíram na elaboração deste trabalho.
SUMÁRIO
APRESENTAÇÃO ............................................................................................................. 09
CAPÍTULO
I:
A
CRIANÇA,
O
ADOLESCENTE
E
O
PROCESSO
DE
EXCLUSÃO/INCLUSÃO SOCIAL ................................................................................... 12
1.1.A HISTÓRIA SOCIAL DOS DIREITOS HUMANOS............................................17
1.2. A HISTÓRIA SOCIAL DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE...........................21
1.3. DA CONSTRUÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS À CONSTRUÇÃO DO
INDIVÍDUO ................................................................................................................ 24
1.4. EXCLUSÃO SOCIAL E PROJETO DE VIDA..................................................... 27
CAPÍTULO II: PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS ............................................. 32
1. CARACTERIZAÇÃO DOS SUJEITOS .................................................................... 35
2. DEFINIÇÃO DO CAMPO DE ATUAÇÃO ...............................................................36
3. INSTRUMENTOS E PROCEDIMENTOS DE COLETA DE DADOS ....................41
4. PROCEDIMENTOS DE ANÁLISE............................................................................42
CAPÍTULO III: OS DIREITOS HUMANOS DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE.
3.1. O SIGNIFICADO DOS DIREITOS HUMANOS PARA AS CRIANÇAS EM
EXCLUSÃO ................................................................................................................ 44
3.2. O SIGNIFICADO DOS DIREITOS HUMANOS PARA OS ADOLESCENTES EM
EXCLUSÃO ................................................................................................................ 49
3.3 CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................... 56
BIBLIOGRAFIA ..................................................................................................................58
RESUMO
LEIROS, Maria Wilma de S. B. O SIGNIFICADO DOS DIREITOS
HUMANOS DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE EM EXCLUSÃO
SOCIAL:. 2002. 50. UFPB. João Pessoa.
A problemática questão das crianças e dos jovens marginalizados pela
sociedade vem-se colocando como um dos principais fenômenos produzidos
pelo processo econômico globalizado. A má distribuição de renda criou um
contigente de pessoas que vivem em extrema pobreza em todo mundo. Neste
contexto de inclusão/exclusão encontram-se as criança e adolescentes do
Projeto Cres/ser-FUNDAC - Fundação Desenvolvimento da Criança e do
Adolescente “Alice de Almeida”, que coordena e executa a Política de Proteção
Especial e Garantias de Direitos, em cumprimento à Lei n° 8.069/90 – Estatuto
da Criança e do Adolescente na cidade de João Pessoa. Frente a esta realidade
social indaga-se: “Como as crianças e adolescentes incluídas no projeto cres/ser
apreendem seus direitos? Vivenciando o espaço institucional do projeto
cres/ser, surgem então os seguintes questionamentos: O que é ser
criança/adolescente? O que é o direito da criança/adolescente? O que eles
querem para suas vidas? Qual o significado do Projeto Cres/ser para eles? Qual
a relação entre o que eles querem para suas vidas, e o que o Projeto oferece?
Qual a relação entre o que eles fazem e o direito da criança/adolescente? Este
trabalho propõe-se, a identificar o significado de direitos humanos para as
crianças e adolescentes do projeto. Para tanto, optamos por uma pesquisa
qualitativa e um estudo descritivo, numa articulação com as bases teóricas
fundamentadas basicamente na Teoria das Representações Sociais (Moscovici)
e nos estudos sobre Projeto de Vida, Exclusão Social e Direitos Humanos
(Catão, Jodelet, Sawaia). Como instrumento de investigação, utilizamos a
entrevista semi-estruturada. A pesquisa foi realizada no Projeto Cres/ser, com
30 crianças e adolescentes do sexo masculino de 8 a 18 anos, entre a 1ª e 5ª
séries. Os dados apreendidos apresentam o significado dos direitos humanos
das crianças e adolescentes como: Brincar; estudar; família e trabalho.
Apresentam representações sociais consensuais nos dois grupos. Este trabalho,
é uma forma de apresentar como as crianças e adolescentes da instituição
Cres/ser apreendem seus direitos humanos.
Palavras-chave: Direitos Humanos, Representações Sociais, Exclusão Social e
Projeto de Vida.
ABSTRACT
LEIROS, Maria Wilma de S. B. THE MEANING OF HUMAN RIGHTS OF
CHILD AND ADOLESCENT IN SOCIAL EXCLUSION. 2002. 50. UFPB.
João Pessoa.
The problematic subject of the children and youths marginalized by the society
has been placed as one of the main phenomena produced by the process
economical globalization. The bad distribution of income, has created a
contingent of people that live in extreme poverty in the whole world. In this
inclusion/exclusion context there are the children and adolescents of the Project
Cres/ser - FUNDAC – “Fundação para o Desenvolvimento da Criança e do
Adolescente Alice de Almeida”, that coordinates and executes the “Politics of
Special Protection and Guaranteed Rights”, according to n° 8.069/90 Law from
the “Statute of the Child and Adolescent” in the city of João Pessoa. In front of
this social reality the following questions take place: “How do the children and
adolescents included in the project Cres/ser apprehend their human rights?.
Living, in the institutional space of the project Cres/ser, some other questions
appear: What is to be child/adolescent? What is the right of the child/
adolescent? What do they want for their lives? What does Cres/ser Project mean
for them? What is the relationship between their projects of life and what the
Project offers? What is the relationship between what they make and the right
of the child / adolescent? Objectives: This work intends to identify the meaning
of human rights for the children and adolescents of the Cres/ser Project. For
this aim we have chosen a qualitative research and a descriptive study based on
the Theory of the Social Representations (Moscovici) and on the studies on
Project of Life, Social Exclusion and Human Rights (Catão, Jodelet, Sawaia).
As investigation instrument, we used a semi-structured interview. The research
was accomplished to the project Cres/ser and involved 30 children and
adolescents, male, aged from 8 to 18 years, from 1st to 5th series. The results
present the meaning of the children and adolescents’ human rights like: playing;
to studying; family and work. They also present consensual social
representations in the two groups. This work is allows to understand the way
the children and adolescents of the institution Cres/ser apprehend their human
rights.
Key-words: human rights, social representations, social exclusion and project of
life.
9
APRESENTAÇÃO:
Em nosso país, a questão das crianças e dos jovens marginalizados pela sociedade
vem-se colocando como um dos principais fenômenos produzidos pelo processo econômico
de má distribuição de renda, com uma política neoliberal excludente geradora de
conseqüências sociais negativas. As desigualdades sociais históricas, agravadas pelas
dificuldades do homem em obter os meios de sobrevivência, substituído que é pela
tecnologia avançada, criam historicamente um contigente de pessoas que vivem em
extrema pobreza em todo país.
Os meninos em situação de exclusão social são resultado do sistema social desigual
e injusto. Eles são, abandonados, sem acesso aos meios sociais de sobrevivência, sem
educação, saúde, alimentação, habitação, lazer, ou mesmo uma família que possa dispor de
afetividade a eles dispensada.
Neste contexto de inclusão/exclusão encontram-se as crianças e adolescentes
inseridos no Projeto Cres/ser-FUNDAC-Fundação Desenvolvimento da Criança e do
Adolescente “Alice de Almeida”, que tem a peculiar missão de coordenar e executar a
Política de Proteção Especial e Garantias de Direitos, em cumprimento à Lei n° 8.069/90 –
Estatuto da Criança e do Adolescente.
Frente a esta realidade social cruel indaga-se “como as crianças e adolescentes
incluídos no Projeto Cres/ser apreendem os direitos humanos?”.
Vivenciando o espaço institucional do Projeto Cres/ser, como Assistente Social há
cinco anos, surgem então os seguintes questionamentos: O que é ser criança/adolescente? O
que é o direito da criança/adolescente? O que você quer para sua vida? Qual o significado
do Projeto Cres/ser para você? Qual a relação entre o que você quer para sua vida, e o que o
Projeto oferece? Qual a relação entre o que faz e o direito da criança/adolescente?
O interesse pela temática, originou-se na participação de pesquisa, enquanto
bolsista APB/CNPp, realizada com meninos de rua, interesse reforçado nas experiências
vividas e no convívio enquanto Assistente Social do Projeto CRES/SER-FUNDAC, que
trabalha com crianças e adolescentes em exclusão social que têm seus direitos violados por
ação ou omissão da sociedade na cidade de João Pessoa.
10
Este trabalho inicia-se com a premissa de que a origem do progresso humano está
na realização dos direitos das crianças e dos adolescentes. Este estudo, portanto, enfrenta
uma questão relevante pois é uma forma de se apresentar como as crianças e adolescentes
da instituição Cres/ser apreendem os direitos humanos no contexto de exclusão social em
que estão inseridos. Ele pretende ser uma forma de garantir alguns direitos humanos que
estão esquecidos pela sociedade local.
Portanto, como objetivos básicos podemos destacar:
-
Identificar o significado de direitos humanos para as Crianças e adolescentes do
Projeto Cres/ser.
-
Comparar a relação entre projeto de vida para si e o projeto de vida do projeto
Cres/ser.
-
Analisar a relação entre direitos humanos e a construção do Projeto de vida.
Para atingir tais objetivos optamos por uma pesquisa qualitativa e quantitativa,
numa articulação com as bases teóricas conceituais de Representações Sociais (Moscovici)
e Exclusão social (Martins, Veras, Catão, Jodelet, Sawaia).
O contexto social excludente impulsiona a pesquisa em questão, onde se trabalha
com meninos excluídos socialmente, sendo as instituições que os acolhem uma forma de
inserção social.
O capítulo I foi orientado de modo a sistematizar e analisar sobre os direitos
humanos, a criança e o adolescente, o proces
so de exclusão
social e projeto de vida. Os informes existentes para desenvolver o conteúdo deste capítulo
constam de um relato da história social da criança e do adolescente a partir do século XXI e
das transformações sociais ocorridas no seio da família, geradas pelo mundo do trabalho
que vem acentuando as desigualdades sociais e os avanços das políticas sociais voltadas
para a proteção integral à criança em todo o mundo.
O capítulo II é constituído da apresentação dos procedimentos metodológicos, tendo
como alternativa metodológica utilizada um estudo descritivo, através da exploração dos
aspectos qualitativos e quantitativos.
Faz-se uma apresentação dos sujeitos envolvidos na pesquisa e do campo de
atuação, o Projeto Cres/ser- FUNDAC, seu cotidiano e práticas. São apresentados neste
capítulo, os procedimentos de coleta de dados, os critérios para participação deste estudo,
11
os procedimentos de análise, com ênfase no conteúdo das “mensagens” do coletivo
estudado. Buscando a coerência entre a metodologia qualitativa e a forma adequada de
analisar as entrevistas, optou-se pela técnica de análise de conteúdo para compreender e
inferir novos conhecimentos objetivando a compreensão crítica das mensagens.
O capítulo III contém a análise do conteúdo das respostas, havendo uma busca da
apreensão do sentido de direitos humanos no senso comum, o significado do pensamento
sobre direitos humanos das crianças e adolescentes do Projeto Cres/ser. Como conclusão,
coloca-se uma comparação das respostas dadas por este coletivo estudado, organizada em
torno das Representações Sociais e apreensão dos direitos humanos.
A seguir organiza-se toda a bibliografia consultada, que baseia a fundamentação
teórica deste estudo.
12
CAPÍTULO I
A CRIANÇA, O ADOLESCENTE E O PROCESSO DE
EXCLUSÃO/INCLUSÃO SOCIAL
No Brasil, as transformações sócio-econômicas não foram acompanhadas pelo
desenvolvimento social, o que tem acentuado o problema das desigualdades sociais e da má
distribuição de renda. Assim, a classe trabalhadora vem se concretizando em meio a um
mecanismo de exploração que tem causado o empobrecimento crescente de grandes
contigentes da população urbana e rural. Neste contexto em que ocorrem mudanças sociais
e econômicas na família, a atenção que era dada às crianças e aos adolescentes passou a ser
dispersa e difusa, uma vez que as rápidas transformações sociais propiciam não somente o
engajamento da mulher no mercado de trabalho, mas também o não estabelecimento de
uma política social com suporte e mudanças nas estruturas da sociedade por parte do
Estado. Isso veio a comprometer a função da família no processo de desenvolvimento da
criança, pois esta se viu obrigada a articular os mais variados tipos de estratégias de
sobrevivência para solucionar suas necessidades básicas. Segundo Ribeiro (1987), dentre
essas estratégias adotadas pela família está o envio de seus filhos menores para as ruas em
busca de uma complementação para o orçamento familiar.
As crianças, por si só, não podem lutar contra estas condições sociais ou mudá-las
para melhor. Neste contexto, a comunidade internacional exortou os governos a adotar uma
legislação que reconheça a situação as necessidades das crianças, que vivem em extrema
pobreza em todo mundo, criando um arcabouço jurídico que propicie proteção especial a
estas crianças. A nível internacional, a Assembléia Geral das Nações Unidas adotou, por
13
unanimidade, em 20 de novembro de 1989, a “Convenção Sobre os Direitos da Criança”
(CDC). Esta Convenção, reconhece os direitos das crianças até os 18 anos. Entretanto,
adolescentes não são mais crianças no sentido tradicional, e ainda não são adultos.
Trabalhando para ajudar a manter economicamente a família, e atuando como chefes de
famílias, os adolescentes geralmente acham que devem prover-se por si só, sem voz política
e sem a base do apoio da família e da comunidade que tinham quando pequenos. Levar o
adolescente até a margem da vida adulta para em seguida negar-lhe a oportunidade de
realizar seu potencial, é uma tragédia humana.
A criança e o adolescente contribuem para a sociedade. Quanto às atividades mais
comumente realizadas pelos meninos em exclusão social, segundo Gonçalves (1985),
Oliveira (1989) e Rizzini (1986), em seus estudos, constataram ser a de vendedor
ambulante a mais exercida, embora também tenham detectado um grande número de
crianças que se ocupavam de outras atividades tais como: engraxar sapatos, olhar e lavar
carros, ou carregar fretes em feiras livres e supermercados. Em síntese, as atividades por
eles desenvolvidas exigem pouca ou nenhuma qualificação e, em geral, elas atingem uma
jornada diária que gira de em torno de 8 a mais de 10 horas de trabalho. Muitas dessas
crianças, ao exercerem mais de uma atividade, acabam por prolongar ainda mais a jornada
de trabalho.
Desta forma é compreensível a dificuldade de tal população em conciliar o estudo e
o trabalho, e até mesmo de ter acesso àquele, apesar do ECA, no seu art.53, estabelecer a
obrigatoriedade de escolarização para crianças e adolescentes, no entanto, tal lei não é
cumprida. Pobreza e exclusão são sinônimos históricos em nosso país, e isto ocorre devido
à má distribuição de renda que gera as desigualdades sociais. Há uma dialética entre
exclusão/inclusão:
14
a sociedade exclui para incluir e esta transmutação é condição da ordem
social desigual, o que implica o caráter ilusório da inclusão”. Sawaia,
(1999:08). Isto é confirmado por Veras (1999:27): “O tema da exclusão
social não é novo no Brasil. Nossa história traz capítulos freqüentes de
dominação de vastos segmentos populacionais sem cidadania.
Veras cita Martins (1993) ao afirmar que nossa cultura barroca de fachada, com
base na conquista, exclui índios, camponeses no campo e, na cidade, migrantes, favelados,
encortiçados, sem teto etc., em uma fenomenologia bastante conhecida. Ainda para Martins
(1997), para entender a questão da exclusão torna-se necessário detectar os determinantes
históricos do país, e as relações humanas como são construídas hierarquicamente para
garantir a sua sobrevivência, apropriando-se dos bens e serviços acessíveis a uma pequena
camada social; isto permeia até os dias atuais.
Entretanto, o problema mais grave não é a exclusão, mas sim a incapacidade ou
impossibilidade da inclusão ou re-inclusão dos excluídos, as ineficientes tentativas de
redefinição de posições e localizações das pessoas excluídas no mundo do trabalho. Dentro
desta realidade, as instituições que funcionam como meio de suprir as necessidades básicas
dos que estão à margem da sociedade tornam-se precárias e instáveis ao tentar incluir as
crianças e adolescentes em situação de exclusão no mundo do trabalho.
Catão (2001:23),
ao situar a questão da exclusão/inserido, afirma que “excluído é o afastado, o desviado, o
retirado e o inserido, o envolvido, o assimilado, o abrangido”.
A maioria das pessoas estão inseridas de algum modo no processo econômico
do capital, pois a maioria das inclusões se dão mediante a insuficiência do padrão
econômico alcançado por poucos. O processo de exclusão passa a ser entendido como fruto
do descompromisso sócio-político. A inclusão mencionada é parte constitutiva da exclusão
social.
15
Jodelet (1999:53), afirma que: “a exclusão induz sempre uma organização
específica de relações interpessoais ou intergrupais”.
A Psicologia Social tem como um dos objetivos principais tentar compreender
como as pessoas ou determinados grupos que são objetos de uma distinção são
construídos como uma categoria à parte. A exclusão atualmente tem suscitado debates
sociais e políticos, sendo um verdadeiro fenômeno social, econômico e institucional.
Neste contexto, cabe à Psicologia Social apenas analisar os processos psicológicos,
cognitivos e simbólicos que acompanham a questão da exclusão/inclusão: Como pôde ser
observado, as condições de vida das crianças e jovens excluídos/incluídos não se
assemelham à dos meninos de outras camadas sociais, aos quais é permitido suprir as
necessidades básicas, tais como: saúde, alimentação, lazer e estudo. Como meninos
excluídos resta-lhes apenas o direito à sobrevivência. Estão excluídos da sociedade por
não terem acesso aos serviços mínimos garantidos pelo Estado.
No processo de construção da identidade e do projeto de vida que direcionará o
futuro desses meninos, o Projeto Cres/ser que os acolhe, tirando-os das ruas que os
excluem, investe na formação destes jovens como pessoa, como cidadãos. Ao acolher de
forma humana e eficaz os adolescentes a quem se dirige o trabalho da ação sócioeducativa, estes são tratados como fonte de compromisso e liberdade, abrindo espaços
para que os educandos atuem como parte da solução, e não como parte de um problema,
procurando resgatar dentro da instituição o papel da família, assumindo de frente a
questão do abandono, da violência doméstica e urbana, e o próprio processo de exclusão
social. O Projeto procura ver em cada menino acolhido não aquilo que o separa ou o
diferencia das demais crianças e adolescentes de sua idade, mas sim tudo aquilo que ele
tem em comum com os demais. Dentro da instituição evita-se perguntar o que o educando
16
não sabe, o que ele não tem, o que ele não traz de sua vida familiar ou comunitária; ao
contrário, cumpre descobrir o que o educando é, e o que ele sabe, o que traz de bom
consigo, o que ele se mostra a fazer. Assim, evita-se compará-los com um suposto padrão
de normalidade social, que traça um perfil totalmente negativo destes.
Diante tal realidade, a categoria existencial Projeto de Vida se coloca como uma
janela que, uma vez aberta, possibilita ao educando romper com o imediatismo e abrir-se
para o futuro. Sabe-se que, no Brasil, o aparato institucional voltado para a questão da
criança e do adolescente excluído, tem seu perfil dentro da rotina estabelecida no sistema,
gerando um sentimento de abandono, de desvinculação, de desencontro, de solidão, de
incomunicabilidade.
Apesar das dificuldades enfrentadas na rotina institucional brasileira, a principal
preocupação do Cres/ser enquanto instituição é com “o interesse superior da criança”.
Comungando com as medidas prescritas na Convenção de 1989 sobre os Direitos da
Criança , considera-se que “criança é todo ser humano menor de 18 anos, salvo se, nos
termos da lei que lhe for aplicável, atingir a maioridade mais cedo“ (CDC/1989, artigo
1º). Não há, em seus termos, dúvidas de que as crianças podem desfrutar dos mesmo
direitos humanos e liberdades dos adultos. Certos direitos fundamentais, como direito à
vida, liberdade e segurança pessoal, o direito à liberdade de pensamento e expressão e o
direito a reuniões e associações pacíficas, são reiterados firmemente na convenção. Além
disso, esta também dispõe sobre a “proteção contra violência, negligência e exploração da
criança” (CDC, artigo 32 a 36).
17
1.1 A HISTÓRIA SOCIAL DOS DIREITOS HUMANOS
Os princípios fundamentais que constituem a legislação moderna dos direitos humanos
têm existido através da história, expressando-se com maior nitidez no estabelecimento do
Estado moderno, através da sistematização e ordenação das relações entre o estado e os
cidadãos. Como afirma Bobbio,
“O Direito é considerado do ponto de vista do Estado ou do ponto de
vista do poder soberano, que é o ponto característico do poder do Estado,
de onde parte depois de Hobbes, a tendência em definir o Direito como
um conjunto de regras postas ou impostas por aqueles ou por aqueles que
detêm o poder soberano“ (Bobbio, 1986:349).
No entanto, foi somente neste século que a comunidade internacional tornou-se
consciente da necessidade de desenvolver padrões mínimos para o tratamento de cidadãos
pelos governos. As razões para essa conscientização encontram-se melhor exprimidos no
Preâmbulo da Declaração Universal dos Direitos Humanos, adotada pela então recém
fundada Organização das Nações Unidas, em 1948:
“Reconhecimento da dignidade inerente e... direitos iguais e inalienáveis a
todos os membros da família humana constituem o fundamento da liberdade,
da justiça e da paz no mundo... o desconhecimento e o desprezo dos direitos
humanos conduziram a atos da barbárie... é essencial a proteção dos direitos
do homem de um estado de direito, para que o homem não seja compelido, em
supremo recurso, à revolta contra a tirania e a opressão...”
Do ponto de vista histórico, os direitos humanos caracterizam-se por ser resultado
de grandes lutas da história política e social da humanidade. É certo que nenhuma conquista
histórica foi resultado da luta da classe dominante; no decorrer da história, as lutas
populares foram o cerne que possibilitou os espaços de libertação humana.
18
O marco temporal vai dos séculos XVII e XVIII, na ascensão da burguesia que
reivindicava maior liberdade de ação e de representação política frente á nobreza e ao clero.
São antecedentes da Declaração Universal dos Direitos Humanos:
A Declaração de Direitos (Bill of Rights) de 1668 da assim chamada
Revolução Gloriosa que concluiu o período da “revolução inglesa”, iniciado
em 1640, levando à formação de uma monarquia parlamentar.A Declaração
dos Direitos (Bill of Rights) do Estado da Virgínia de 1777, que foi a base da
declaração da independência dos Estados Unidos da América (em particular
os primeiros 10 emendamentos de 1791). A Declaração dos direitos do homem
e do cidadão da Revolução francesa de 1789 que foi o “atestado de óbito” do
Ancien Regime e abriu caminho para a proclamação da República. Tosi
(2001:22).
Usualmente, para determinar a origem da declaração no plano histórico, é costume
remontar à Declaration des droits de L`homme et du citoyen, votada pela Assembléia
Nacional francesa em 1789, na qual se proclamava a liberdade e a igualdade nos direitos de
todos os homens, reivindicavam-se os seus direitos naturais e imprescritíveis (a liberdade, a
propriedade, a segurança, a resistência à opressão), em vista dos quais se constitui toda a
associação política legítima. Na verdade, a Déclaration tinha dois grandes precedentes: os
Bills of Rights de muitas colônias americanas que se rebelaram em 1776 contra o domínio
da Inglaterra e o Bill of Rights inglês, que consagrava a gloriosa Revolução de 1689. Do
ponto de vista conceptual, não existem diferenças substanciais entre a Déclaration francesa
e os Bills of Rights americanos, dado que todos amadurecem no mesmo clima cultural
dominado pelo jusnaturalismo e pelo contratualismo: os homens têm direitos naturais
anteriores à formação da sociedade, direitos que o Estado deve reconhecer e garantir como
direitos do cidadão.
A partir da Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948, através de várias
conferências, pactos, protocolos internacionais a quantidade de direitos se desenvolveu a
19
partir de três tendências: Universalização; multiplicação - nos últimos 50 anos a ONU
(Organização das Nações Unidas) promoveu uma série de conferências específicas que
aumentaram a quantidade de bens que precisavam ser defendidos (a natureza e meioambiente, a identidade cultural dos povos e das minorias, o direito a comunicação e a
imagem); Diversificação - a pessoa humana não foi mais considerada de maneira abstrata e
genérica, mas em sua especificidade e diferentes maneiras de ser.
A promulgação da Declaração Universal de Direitos Humanos há 50 anos constitui
um ponto de referência para a humanidade, uma forma de libertação. Propiciou, nas
décadas seguintes, um enorme desenvolvimento teórico das questões de direitos humanos,
promulgando outros direitos tais como: econômicos, sociais e culturais. A ampliação
conceitual dos Direitos Humanos, incorporando novos direitos, é positiva na luta contra
violações e o efetivo exercício destes direitos.
Em 1948, com a universalização dos direitos, os cidadãos de um Estado são
transformados em cidadãos do mundo. No entanto, é preciso observar que, apesar das
intenções da Declaração, os Direitos Humanos não são, de fato, universais, nem tampouco
podem ser universalizáveis, pois precisam reproduzir a exclusão/exploração das sociedades.
Desta forma, o caráter histórico contraditório dos Direitos Humanos questiona a pretensão
européia e ocidental de se considerar o lugar por excelência da emancipação universal.
Historicamente, os direitos humanos têm raiz nos postulados cristãos e europeus do
cristianismo que está em transformação secular. Estes estavam condicionados por idéias
religiosas alheias à justiça secular, onde se poderia constatar um fato por meios racionais.
Houve uma desmistificação dos direitos baseados em depoimentos utópicos, pois estes
perderam sua credibilidade no século XVIII, mediante a desmoralização destes
testemunhos.
20
O direito tem ordenamento coativo com o Estado, substituindo a dicotomia entre
direito privado e direito público. Para Weber, “o grande Estado moderno é o Estado em
que a legitimidade do poder depende se sua legalidade”, (apud Bobbio, 1986:350). Há
uma forma de interpretação, a partir do poder estatal ou seja, direitos em função do poder.
A doutrina dos direitos humanos é nascida num contexto de classe, porém é uma grande
conquista para a sociedade; mas os direitos são meramente formais, principalmente para
aqueles não têm a capacidade material de desfrutá-los.
Marx propunha estender tais direitos a todos os homens, e não a uma minoria que
detinha o poder de posse. Ele criticou a doutrina dos direitos humanos não por ser
iluminista, mas devido à sua infidelidade quanto aos direitos universais apregoados pelos
iluministas. A questão de se estender direitos universais iguais arrasta-se até os dias atuais,
onde há uma acirrada crítica quanto à sua institucionalização.
Neste contexto histórico, nos deparamos com formas distintas de conceitos e
concepções, construídos a partir das relações sociais e econômicas desiguais e de exclusão
social.
No decorrer dos anos, o mundo do trabalho vem acentuando as desigualdades
sociais, com a efetivação da tecnologia e da informática. É, clara a idéia de substituição do
homem pela máquina, geradora de um contigente de desempregados, que são os “excluídos
sociais”, os que estão à margem da sociedade, gerado pelos setores econômicos
dominantes. Esse modo consumista de viver impõe, por sua vez, modos de relações e de
subjetividades que interferem nas relações familiares, sociais e institucionais.
O modo de sobrevivência dos que estão à margem da produção social é tratado pela
sociedade em práticas sociais e institucionais.
21
1.2. A HISTÓRIA SOCIAL DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE
No início do século XXI crianças e adolescentes constituem ainda a maioria das
pessoas que vivem na pobreza em todo mundo. Seus direitos, na forma como foram
estabelecidos, na “Convenção Sobre os Direitos da Criança”, em 20 de novembro de 1989,
são violados diariamente em números de tal magnitude que se torna impossível sua
quantificação. Porém, a humanidade presenciou avanços espantosos e deu passos enormes
em favor da criança e do adolescente, muitos ao longo da última década, muitos outros no
espaço de uma geração. Seus direitos foram reconhecidos; para proteger esses direitos,
criaram-se leis e mecanismos para garantir seu cumprimento.
Entretanto, apesar dos avanços, muitas metas permanecem fora de alcance par
centenas e milhões de crianças e adolescentes em todo o mundo. Sua vida e seu futuro estão
ameaçados em um mundo marcado por condições de pobreza mais difíceis de dominar.
A Constituição brasileira, em seu Art. 22 ( 5/10/1988), assegura que:
É, dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao
adolescente, com absoluta prioridade o direito á vida, à saúde, à alimentação,
à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito,
à liberdade e ao convívio familiar e comunitário, além de colocá-los a salvo
de formas de negligência, discriminação, exploração, crueldade e de
opressão.
E o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), criado pela Lei 8.059. de 12 de
julho de 1990, vem reforçar estas garantias no seu Art.1º que afirma: “Esta lei dispõe sobre
a proteção integral á criança e ao adolescente”.
Apesar das iniciativas empreendidas em relação à prioridade dos direitos, há
necessidade de maiores investimentos em políticas públicas econômicas e sociais, voltadas
para nossas crianças, que são mais um dos vários contingentes de excluídos deste país que
22
prega um discurso de um Estado voltado para o bem-estar social, ou seja, um Estado
democrático de direito.
Para entender-se esta realidade faz-se necessária uma análise de como evolui, ao
longo da história de nossas sociedades, a história social da criança, o que implica em
conhecer como evolui o modo de entender e tratar a criança.
As idades ou fases da vida na Idade Média eram uma forma de conceber a biologia
humana. Segundo Áries,
“A primeira idade é a infância que planta os dentes, e essa idade começa
quando a criança nasce e dura até os sete anos, e nessa idade aquilo que
nasce é chamado enfant (criança), que quer dizer não falante, pois nessa idade
a pessoa não pode falar bem nem formar perfeitamente suas palavras, pois
ainda não tem seus dentes bem ordenados nem firmes. Após a infância, vem a
Segunda idade, que chama-se puerita e é assim chamada porque nessa idade a
pessoa é ainda como a menina do olho, e essa idade dura até os 14
anos”.(Àries, 1981:36).
No século XII, não havia lugar para a criança, elas não eram bem vistas, tal como a
adolescência. A duração da infância era reduzida. Ao apresentar uma certa “independência”
física, a criança logo era inserida no mundo dos adultos, ou seja, quando eram consideradas
capazes de dispensar a ajuda das mães ou das amas, misturavam-se com os adultos.
Transformava-se em homem jovem, sem passar pelas etapas da infância, que talvez fossem
praticadas antes da Idade Média e que se tornaram aspectos essenciais das sociedades
atuais. A socialização da criança não era controlada pela família. A educação era garantida
pela aprendizagem, uma vez que, seu processo de aprendizagem dava-se através de
realização de tarefas com adultos. A presença da criança na família era muito
insignificante. As demonstrações de carinho davam-se enquanto era uma criancinha em
seus primeiros anos de vida, sendo facilmente substituída caso viesse a óbito, por outra.
23
A partir do final do século XVII, ocorreram mudanças no contexto familiar e, por
conseguinte, em relação à criança. A escola passa a substituir a aprendizagem como meio
de educação. A criança deixou de ser inserida no mundo dos adultos. O colégio tornou-se,
nos séculos XVIII e XIX, um enclausuramento; inicia-se assim a escolarização. Isto só
ocorria mediante autorização das famílias, pois a criança passou a ser alvo de afeição; a
afetividade familiar era um sentimento novo. Neste contexto, a família passa a organizar-se
em torno da criança, dando-lhe tal importância.
Juventude significava força da idade, pois até o século XVII, a adolescência foi
confundida com infância, não havendo lugar para a adolescência; não havia limitação da
infância pela puberdade; só se saia da infância ao sair da dependência.
A família cumpria uma função, assegurava a transmissão da vida, dos bens e dos
nomes, mas não penetrava na questão da sensibilidade, e a aprendizagem afastava os laços
afetivos entre pais e filhos. Hoje, nossa sociedade depende do seu sistema de educação, de
sobrevivência econômica. Nosso mundo é obcecado pelos problemas físicos, morais e
sexuais da infância, o que não ocorria na civilização medieval; nessa sociedade não existia
problemas pois, a criança assim que era desmamada, tornava-se companheira natural do
adulto.
Analisar as relações familiares, sobretudo a partir das mudanças dos papéis sociais
familiares, torna-se inevitável frente à crescente interdependência causada pela
globalização da economia. Os ajustes econômicos ocorridos nos últimos dez anos em nosso
país têm colocado a família brasileira em acelerado processo de empobrecimento, alterando
profundamente sua estrutura, seu sistema de relações sociais, papéis, modelos e formas de
reprodução social inevitável diante da crescente incorporação da mulher no mercado de
24
trabalho e contracepção cada vez mais assegurada. Torna evidente uma questão estrutural
na família brasileira moderna:
“o conflito entre, de um lado, a afirmação da individualidade, uma
possibilidade do mundo moderno, em que a tradição vem sendo abandonada
como em nenhuma época da história, transformando a intimidade, e de outro,
o respeito às obrigações e às responsabilidades próprias dos vínculos
familiares”. (Giddens, 1993:36).
Partir do princípio de que todas as crianças e adolescentes têm direitos significa
desafiar muitas das crenças arraigadas no mundo. Há cem anos as crianças eram vistas
como indivíduos, eram tratadas como propriedades e eram colocadas para trabalhar assim
que fossem fisicamente capazes. Os adultos davam pouca atenção às suas necessidades
básicas. Mas hoje a criança precisa de cuidados e proteção, pois depende da ajuda dos
adultos, principalmente nos primeiros anos de vida. Não é suficiente para a criança a
concessão dos mesmos direitos humanos de liberdade do adulto.
1.3. DA CONSTRUÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS À CONSTRUÇÃO DO
INDIVÍDUO
Os direitos humanos para serem reconhecidos, conquistados e até mesmo adquiridos
necessitam de lutas sociais e políticas. Estes direitos são universais e naturais, eles estão
25
relacionados as pessoas na sua universalidade. Assim, são chamados de naturais, e são
chamados naturais, porque existem antes mesmo de qualquer lei.
Na sociedade jurídica a vontade se exprime através da lei. Para Kant: “ a sociedade
que precede o Estado é de direito natural ou privado” (Bobbio, 1986:350)
Neste sentido, a lei natural que prescreve os deveres mais fundamentais e em virtude da
qual toda lei obriga, é a mesma que prescreve os direitos fundamentais. Supõe-se aqui que
o homem faz parte de uma ordem universal; depende das leis e regulações do cosmo e da
natureza.
Mas a visão kantiana do homem num universo cosmopolita tem conotação burguesa. O
direito do homem, particularmente como “cidadão do Mundo”, é um princípio iluminista.
E, para Bobbio,
“O iluminismo se prende ao direito natural e acredita poder construir um
corpo de normas jurídicas universais e imutáveis. (id.,1986:606).
Entretanto, estas normas representam uma tentativa burguesa de evitar a violência na
sociedade pela ordenação jurídica das estruturas e das relações sociais. Elas decorrem da
necessidade de regulação do mundo humano por um iluminismo racional e crítico: a Razão
contra as formas de autoridade não comprometidas com o Poder do Estado.
Em virtude dos direitos naturais é que temos os direitos humanos e o direito positivo
que têm força de lei e se impõem à consciência. O direito do homem, à liberdade, à vida
moral é, portanto decorrente do direito natural.
Na concepção jusnaturalista, o homem é verdadeiramente livre quando pode fazer tudo
que lhe satisfaz. Na medida, em que o homem segue seus instintos, ele precisa não
encontrar obstáculos, e se os encontra, precisa da força do poder para coagir os outros.
26
Temos uma liberdade que implica na desigualdade. Se o liberalismo coincide com o poder,
quem o possui será mais livre. Este critério vai nortear toda a concepção liberal de Estado
onde a soberania do povo é delimitada, por leis acima e invioláveis. Gruppi (1996:16) cita
Kant ao afirmar que “os direitos ativos cabem somente aos proprietários”. Após ter
afirmado que a soberania é do povo, ao mesmo tempo nega o pleno exercício da soberania
popular, restringindo-o a uma parte do povo.
Direitos humanos aqui tem como marco temporal a modernidade, isto é, o período que
inicia com as grandes descobertas geográficas dos séculos XV/XVI e vai até a Declaração
Universal dos Direitos Humanos da ONU,em 1948. Este período corresponde à expansão
da civilização européia sobre o resto do mundo.
Assim, o âmbito histórico condiciona as análises das teorias e práticas que
contribuíram para a formação do corpus filosófico e jurídico dos direitos do homem. Estes,
nascidos no contexto da civilização européia, num momento específico da sua história,
foram desde o começo intimamente relacionados com todo o processo que fez da história
da Europa a história do mundo.
Sendo assim, a história dos direitos do homem, desde o princípio, tem caráter
complexo, ambíguo, dualista, ao mesmo tempo de emancipação e opressão, de inclusão e
de exclusão, eurocêntrico e cosmopolita, universal e particular. A reconstrução desta
história tem aspectos contraditórios, sendo uma visão puramente eurocêntrica da história
dos direitos do homem.
O caráter contraditório da afirmação histórica dos direitos humanos e a pretensa
universalidade dos direitos do homem escondem o seu caráter europeu e cristão, que faz
com que não possam ser estendidos ao resto do mundo, com tradições culturais e religiosas
próprias. A pessoa humana tem direitos, por isso mesmo é uma pessoa, um senhor de si
27
próprio e de seus atos. A dignidade humana significa que todos têm o direito de ser
respeitados, de ser sujeito de direitos, de possuir direitos.
Na tentativa de ultrapassar a dicotomia entre indivíduo e sociedade, o conceito de
Representação Social de Moscovici (1961), fundamenta-se na não-ruptura entre indivíduo e
sociedade. Nele, a noção do homem social é entendida na relação que se dá entre o
indivíduo e a sociedade. A Representação Social instaura-se como um processo de
interação. Esta teoria enfatiza a existência do indivíduo, mas este não é o único centro
passível de ser analisado. Colocar o homem na totalidade implica superar as dicotomias que
surgem na relação entre indivíduo e sociedade.
Moscovici (1961) formula a hipótese de que o universo social é composto de três
dimensões: a informação, que é o nível de conhecimento sobre o objeto de trabalho; o
campo de representação, que é a imagem social; e a atitude, que é a posição do indivíduo
dentro da sociedade.
As representações sociais permitem aos indivíduos a apreensão de uma visão do
mundo, dando sentido às suas vidas, compreendendo o contexto social em que estão
inseridos como possibilidades/impossibilidades. Entende-se assim, que o significado de
projetar a vida futura está implícito na relação indivíduo/sociedade. Os indivíduos
constroem sua identidade na relação indivíduo/sociedade.
Destaca-se ainda que o homem constrói seu projeto de vida (Catão & Coutinho,
1998) fazendo-se, construindo a sua identidade. É no horizonte destas relações com os
outros, com as coisas, com a natureza, com o passado e com o futuro, que o homem se
objetiva e se constitui numa identidade.
28
1.4. EXCLUSÃO SOCIAL E PROJETO DE VIDA.
Historicamente a exclusão social inicia-se, no Brasil, com a vinda da Companhia
de Jesus para prover e dirigir a religião e a educação, em 1549. Constrói-se assim uma das
marcas registradas da nossa sociedade, a exclusão e a partir daí generalizou-se uma
“cultura da exclusão”.
“Cultura que não é desse ou daquele colégio, desse ou daquele professor,
nem apenas do sistema escolar, mas das instituições sociais brasileiras,
geradas e mantidas, ao longo desse século republicano, para reforçar
uma sociedade desigual e excludente. Ela faz parte da lógica e da política
de exclusão que permeia todas as instituições sociais e políticas, o
Estado, os clubes, os hospitais, os partidos, as igrejas, as escolas...
política de exclusão que não é própria dos longos momentos de
administração autoritária e de regimes totalitários. Ela perpassa todas as
instituições, inclusive aqueles que trazem no seu sentido e função a
democratização de direitos constitucionalmente garantidos como a saúde
e a educação" (Arroyo, 1996:13).
Assim, “O termo ‘ excluídos’ vem ocupando, no discurso dos cientistas e também
dos políticos, o lugar anteriormente reservado aos pobres” (Campos, 2001:47). E a
quem se poderia chamar de excluídos? Na perspectiva neo-liberal mais radical, cabe ao
mercado regular o acesso aos benefícios sociais, como a aposentadoria, o cuidado com a
saúde, e até a escola; o papel do Estado como provedor desses benefícios desaparece.
Neste caso, os excluídos são os que não podem pagar pelos benefícios sociais que
deveriam ser garantidos pelo Estado.
No Brasil tal perspectiva torna-se cada vez mais posta como diretriz para as
políticas públicas. Isso deve-se a que, no processo de modernização capitalista do Brasil,
predominam as opções de desenvolvimento econômico com exclusão social em
decorrência de sua formação social e de sua cultura política. É por isso que o fenômeno da
exclusão social marca a vida dos diferentes segmentos da classe trabalhadora brasileira,
29
em diferentes níveis de experiência social e adquire feições particulares nas diversas
regiões do país. (Revista Quadrimensional de Serviço Social, 1996:55).
O modo de sobrevivência dos que estão à margem social de produção é tratado
pela sociedade em práticas sociais e institucionais. Num contexto social e cultural de um
“Estado constitucional” conectado com a idéia de democracia, mas que, ao mesmo tempo a
restringe, estão as crianças e adolescentes do Projeto CRES/SER.
Constitui lugar comum a observação de que os limites etários que definem a
infância e a adolescência têm um caráter histórico-social eles mudam temporalmente e de
sociedade para sociedade. Devemos recordar que no Brasil o instrumento legal vigente
nesta matéria define como criança “a pessoa até doze anos de idade incompletos, e
adolescente entre doze e dezoito anos de idade” (Estatuto da Criança e do Adolescente, art.
2°). Mudam também os próprios conteúdos dessas categorias sociais para a infância têm
sido distintos em tempos e em sociedades diferentes. Existe bastante consenso em relação
ao fato de que lazer, brincadeiras e educação (socialização) são atividades próprias da
infância na sociedade atual.
No contexto social de crianças e adolescentes incluídos/excluídos, que são
cidadãos de direitos, torna-se necessário compreender como é suscitado por eles o Projeto
de Vida e seus direitos em uma cultura de exclusão e má distribuição de renda, geradora de
uma desigualdade social gritante. Neste contexto o trabalho/desemprego pode ser
considerado como indicador de uma forma de inserção social que ajuda a estruturar as
representações sociais no indivíduo e seu projeto de Vida, mas, que tem gerado problemas
psicossociais e aumento da pobreza.
Na análise de Catão e colaboradores,
30
“Entende-se trabalho como fenômeno político contraditório de:
construção/desconstrução e manutenção/transformação do indivíduo e da
sociedade ao ser compreendido na ótica do atendimento do modelo
produtivista como é imposta” (Catão, Coutinho & Moreira, 1998b:44).
Este quadro social dificulta o acesso das camadas populares aos bens e serviços e
ao trabalho digno e remunerado, que tornam-se assim privilégio de uma minoria
privilegiada da sociedade brasileira. Mas também dificulta o acesso dessas camadas
excluídas ao próprio sentimento de domínio ou controle de suas vidas, à possibilidade de
construção de seus Projetos de Vida. Como afirma Catão (2001:22),
“Da percepção de estar excluído para a certeza de ser excluído, o indivíduo
depara-se com uma ameaça. A exclusão não constitui apenas uma ameaça à
sua vida, mas associa-se, também, a um questionamento global do seu bemestar psicológico e social, da sua autonomia e da sua própria identidade”.
É nesse sentido que a necessidade de construção do Projeto de Vida do cidadão
excluído requer uma maior reflexão quanto às contradições sociais nas quais está inserido.
O Projeto de Vida, uma pretensão de vida futura não é uma garantia de resolução dos
problemas, mas que sua realização até mesmo planejamento aumentaria a possibilidade de
solucioná-lo.
Sendo assim,
“O Projeto de Vida, enquanto intenção de transformação do real, orientado
por uma representação social do sentido dessa transformação, considerando
as sua condições reais na relação presente/passado na perspectiva do futuro”.
(Idem, 2001:27)
Em decorrência, o Projeto de Vida constitui-se, enquanto objeto de estudo, no
campo das Representações Sociais. Como afirma Sá (1993:19),
“O termo Representações Sociais designa tanto um conjunto de fenômenos
quanto o conceito que os engloba e a teoria construída para explicá-los,
identificando um vasto campo de estudos psicossociológicos”.
31
E é neste campo que o presente estudo se situa. Procura-se aqui identificar os
elementos semânticos utilizados pelos participantes o Projeto Cres/Ser para o conhecimento
de um dos aspectos mais relevantes de seu cotidiano, os Direitos Humanos. Procurar o
significado dos Direitos Humanos numa população tão excluída quanto esta é, sem dúvida,
pela importância do tema para a vida cotidiana assim como futura dessas crianças e
adolescentes, identificar um dos aspectos mais implicados no planejamento e construção do
Projeto de Vida desses indivíduos. E tal procura torna-se mais adequada na perspectiva
teórica das Representações Sociais, pois, como afirma Sandra Jovchelovich,
“A teoria das Representações sociais é uma teoria sobre a produção dos
saberes sociais. Ela se centra sobre a análise da construção e transformação
do conhecimento social, e tenta elucidar como o saber e o pensar se interligam
na trama do tecido social. Saber aqui se refere a qualquer saber, mas a teoria
está especialmente dirigida aos saberes que se produzem no cotidiano, e que
pertencem ao mundo vivido”. (Jovchelovich, 1998:54-68).
Neste sentido, as representações sociais permitem conhecer o mundo social de uma
nova perspectiva, a de sua construção e transformação, ao mesmo tempo em que permitem
conhecer o modo como esse mundo é elaborado e conhecido pelos grupos sociais. Assim,
como afirma Rouquette,
“A noção de Representação Social corresponde a uma característica
fundamental da sociabilidade: a realidade é elaborada (e não simplesmente
apreendida) coletivamente no quadro das trocas e das práticas no seio de uma
situação histórica. Marcada pela herança cultural e pela alteridade das
relações intergrupais, a representação fornece a própria substância dos
julgamentos e dos engajamentos sociais; é ela que distribui ao mesmo tempo a
existência (o que não é representado não existe), a importância e coerência do
universo vivido, tal como ele parece em todas as formas de comunicação. É
ela ainda, pelas mesmas razões, que dá às atitudes o seu próprio objeto”.
(Rouquette.. 2001: 47).
32
CAPÍTULO II
PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
A pesquisa qualitativa é entendida como uma expressão genérica, isto significa que
ela compreende atividades de investigação que podem ser denominadas específicas e
caracterizadas por traços comuns. A pesquisa qualitativa tem suas raízes nas práticas
desenvolvidas pelos antropólogos, primeiro e, em seguida, pelos sociólogos em seus
estudos sobre a vida em comunidades.
Como alternativa metodológica, optou-se por um estudo descritivo, que procede
através da exploração de aspectos qualitativos e quantitativos, tendo como fundamento a
teoria das Representações Sociais,
o Projeto de Vida, a Exclusão Social e Direitos
Humanos. Este trabalho nutre-se da palavra e da linguagem através do discurso expresso
na entrevista.
A pesquisa foi realizada na cidade de João Pessoa, Paraíba, Nordeste do Brasil, no
Projeto Cres/ser-Fundac. Das 60 crianças e 45 adolescentes que se encontram na
instituição, fizeram parte desta investigação 30 crianças e adolescentes institucionalizados
distribuídos em dois grupos: Grupo A (15 crianças na faixa etária de 8 – 11 anos, com
escolaridade entre a 1ª - 3ª séries) e Grupo B (15 adolescentes na faixa etária de 12 – 18
anos, com escolaridade entre 2ª - 5ª séries). Estes foram selecionados conforme critérios
que podem ser observados no quadro a seguir ( Quadro 01).
33
Quadro 1 – Distribuição dos critérios de participação no estudo.
Critérios de participação
Crianças *
Adolescentes **
Crianças/adolescentes do Projeto Cres/ser
X
X
Idade mínima 8 anos, idade máxima 18 anos
X
X
Educandos do Projeto Cres/ser
X
X
Regime aberto
X
X
Tempo de admissão, mínimo de um ano
X
X
Aceitar participar da pesquisa
X
X
Estar em condições de participar da pesquisa
X
X
Assiduidade às atividades do Projeto
X
X
Freqüência e pontualidade às atividades do Projeto
X
X
* Crianças em situação de exclusão social, admitidos no Projeto Cres/ser.
* * Adolescentes em situação de exclusão social, admitidos no Projeto Cres/ser.
34
Quadro 02 - Caracterização das crianças e adolescentes do Projeto Cres/ser-FUNDAC, por
variável Sócio-demográfica
CRIANÇAS
8 – 11 anos
VARIÁVEIS
ADOLESCENTES
12-18 anos
(f)
%
(f)
%
FAIXA ETÁRIA
MASC. 8 – 11 anos
12 – 18 anos
60
_____
100%
_____
45
100%
RESIDE COM:
PAIS
OUTROS PARENTES
ABRIGO
55
05
_____
91,6%
8,4%
_____
38
04
03
- 84%
9%
7%
RELIGIÃO
CATÓLICA
EVANG.
OUTRAS REL.
SEM RELIGIÃO
37
_____
03
20
61,6%
_____
5,0%
34,0%
36
01
02
06
80%
2%
4,4%
13,6%
21
39
____
35%
65%
____
08
37
____
18,0%
82,00%
____
60
____
100%
____
45
____
100%
____
05
35
20
____
8,0%
58,0%
34,0%
02
04
10
29
4%
-9%
22%
65%
60
____
100%
____
45
____
100%
____
ESCOLARIDADE
1ª e 2ª
3ª e 8ª
2° GRAU
ESTUDA ATUALMENTE
SIM
NÃO
TRABALHO TIPO
VENDEDOR AMBULANTE
OLHAR CARROS
OUTROS
ORIGEM
URBANA
RURAL
A caracterização dos sujeitos participantes do Projeto encontra-se apresentada no
Quadro 2, acima.
35
2.1. CARACTERIZAÇÃO DOS SUJEITOS
A clientela do Projeto Cres/ser-FUNDAC compreende crianças e adolescentes
violados em seus direitos por ação ou omissão da sociedade ou do Estado, dos pais ou
responsáveis e excluídos em razão de uma conduta ou de práticas de atos infracionais. São
105 crianças e adolescentes de ambos os sexos, vinculados as comunidades: Renascer, Cruz
das Armas, Taipa, Grotão, Funcionários I e II, José Américo, Mangabeira, Cristo, entre
outras. Estes educandos são oriundos de famílias excluídas em seus direitos, com poucas
condições sócio-econômicas de mantê-los em suas necessidades básicas no lar ou escola,
uma vez que a maioria das mães trabalha como domésticas, vendedoras ambulantes,
catadoras de lixo, ou mesmo pedintes. Estas estão ausentes do dia-dia dos filhos, que são
encaminhados ao Projeto por estarem nas ruas, evadidos da escola e, muitas vezes,
cometendo atos infracionais ou tentando sobreviver nas ruas, totalmente desagregados da
família e com baixa escolaridade.
Como se pode observar neste quadro, quanto às crianças, verifica-se um percentual
de 100% de crianças do gênero masculino; 91,6% residem com os pais, 8,4% com outros
parentes avós, tios, irmãos. Quanto à religião 61,6% são católicos, 5,0% ligados a outras
religiões e 34,0% sem religião. Deve-se observar que neste grupo não há evangélicos. Com
relação à escolaridade, 35% está entre a 1ª e 2ª séries, 65,% está cursando a 3ª e 8ª séries.
100% estuda atualmente.
No tocante ao trabalho realizado nas ruas, 58% tomam conta ou lavam carros nos
estacionamentos públicos; 34,0% realizam outras atividades, tais como catar nas ruas
material que possa ser reciclado, jardinagem, limpeza de terrenos; e 8,0% são vendedores
ambulantes. Todos são oriundos das zonas urbanas desta cidade.
No grupo de adolescentes de gênero masculino, verifica-se que 84,0% reside com os
pais, 4,0% com outros parentes – avós, tios, irmãos – e 7% vive na casa abrigo longe da
36
família. Quanto à religião, 80% são católicos, 2,0% são evangélicos, 4,46% são ligados a
outras religiões e 13,6% não têm religião. Com relação à escolaridade, 18% está entre a 1ª e
a 2ª séries do primeiro grau e 82% está cursando da 3ª à 8ª séries; não há nenhum
adolescente cursando o 2° grau. Todos estudam atualmente.
No tocante ao trabalho realizado nas ruas, 4% são engraxates, 9% vendedor
ambulante, 22% tomam conta ou lavam carros nos estacionamentos públicos e 65%
realizam outras atividades tais como catar nas ruas material que possa ser reciclado,
jardinagem, limpeza de terrenos, serviços de pedreiro. Todos são oriundos de zonas urbanas
desta cidade.
2.2. DEFINIÇÃO DO CAMPO DE ATUAÇÃO
Segundo o Estatuto da Criança e do Adolescente, no seu livro II, art.86, “A
política de atendimento dos direitos da criança e do adolescente far-se-á através de um
conjunto articulado de ações governamentais e não-governamentais, da União, dos Estados,
do Distrito Federal e dos Municípios”. Nesse contexto encontra-se a FUNDAC - Fundação
de Desenvolvimento da Criança e do Adolescente “Alice de Almeida”, órgão da
administração indireta do Governo do Estado da Paraíba vinculada à SETRAS- Secretaria
Estadual do Trabalho e Ação Social, que tem a peculiar missão de coordenar e executar a
Política de Proteção Especial e Garantias de Direitos, em cumprimento à Lei n° 8.069/90 –
Estatuto da Criança e do Adolescente. Em especial, destaca-se o PROJETO CRES/SER
unidade da FUNDAC, que foi fundado no dia 07 de fevereiro de 1992, funcionando
inicialmente na Rua Maximiniano de Figueiredo – 189 Centro. Em 08 de abril de 1998
passou a funcionar na antiga granja do IPEP, localizado na estrada para Gramame, Km3, no
37
conjunto Costa e Silva. A granja dispõe de 04 hectares de terra, com árvores frutíferas. A
estrutura física comporta: Administração, enfermaria, sala de aula, sala de artes, refeitório,
almoxarifado, um galpão coberto onde funciona, a oficina de capoeira, maculelê, eventos,
dispõe ainda, de um campo de futebol e um campo de volei, espiribol e conta com duas
piscinas para aulas de natação.
A comunidade vizinha à granja é composta de famílias de baixa renda, contendo
apenas um Mercadinho, 01 Posto Médico, 01 Grupo Escolar “Antenor Navarro, duas
igrejas ( Católica e Evangélica), e contando também com transporte urbano.
O Projeto Cres/ser, funciona de Segunda a Sexta, das sete às dezoito horas; após
este horário os educandos retornam para suas residências, alguns, e outros para a casaabrigo da Fundac. O programa desenvolvido é de natureza sócio-educativa em meio aberto,
fundamentado metodologicamente na Pedagogia da Presença de Antonio Carlos Gomes da
Costa, que preceitua:
“Fazer-se presente na vida do educando é o dado fundamental da ação
educativa dirigida a criança e ao adolescentes excluídos da sociedade. A
presença é o conceito central, o instrumento-chave e o objetivo maior
desta pedagogia. A orientação básica desta pedagogia é resgatar o que
há de positivo na conduta dos jovens em dificuldade, sem rotulá-los nem
classificá-los em categorias baseadas apenas nas suas deficiências”
(Costa: 1999:57-61).
Os encaminhamentos de menores ao Projeto Cres/ser ocorrem através do Juizado
da Infância e Juventude, Ministério Público e Conselhos Tutelares das Regiões Norte e Sul.
O Projeto Cres/ser, comungando com uma política de prevenção que favoreça a
socialização e a integração eficazes de todas a crianças e adolescentes, tem como prática
cotidiana dois referenciais, o técnico e o pedagógico. O trabalho técnico com Psicólogos
(3), Assistentes Sociais (02), Pedagoga (01), tem como objetivo principal realizar
38
programas especializados de Saúde, Educação, Assistência Social, Psicológica e
Pedagógica, com orientações e informações através de atendimento individual às crianças,
adolescentes e a suas famílias, e atendimento grupal, através das oficinas temáticas sobre
temas do cotidiano vivenciados por sua clientela, tais como violência, drogas, Dst´s/Aids e
outros. A principal preocupação situa-se no apoio da família, partindo do pressuposto
básico de assegurar ao educando o direito de permanecer no contexto familiar e
comunitário, através do resgate ou fortalecimento dos vínculos já assegurados. O trabalho
com as famílias oportuniza ainda o acesso, tanto destas como também dos filhos, aos
programas que assegurem o atendimento e manutenção de suas necessidades fundamentais
de Educação, Saúde, Trabalho e Habitação. As ações estão direcionadas, prioritariamente,
para o fortalecimento da estrutura familiar através de atividades que envolvem:
encaminhamento dos familiares para serviços essenciais e complementares, engajamento de
adolescentes e familiares em cursos profissionalizantes, e outros.
O trabalho das Oficinas pedagógicas (Capoeira, Palavra, Esporte, Saúde, Pensar,
Ecológica), por sua vez, destina-se a favorecer um melhor desenvolvimento da ação,
objetivando maior eficácia e eficiência nas atividades técnicas e pedagógicas.
As atividades da Oficina de Capoeira, têm como objetivo promover um processo
de integração e socialização dos educandos, incentivando-os ao interesse sócio-cultural
com a participação das crianças e adolescentes em eventos culturais realizados na cidade
assim como facilitar o desenvolvimento psicomotor e a vivência de fatores como disciplina,
organização e responsabilidade.
A Oficina da Palavra, objetiva reintegrar o educando ao ensino formal,
desenvolvendo a leitura e a escrita através do reforço escolar e alfabetização. Esta oficina
desenvolve atividades culturais que possibilitam o conhecimento da história da humanidade
39
e o exercício da cidadania. Porém, como estudar não faz parte do cotidiano destas crianças
e adolescentes antes de serem encaminhados e admitidos no Projeto Cres/ser, nota-se o
pouco interesse dos educandos por esta oficina tão importante para o desenvolvimento do
intelecto, sendo necessária a realização de um trabalho conscientizador com eles dentro da
unidade, estendido às famílias. Há também uma extensão deste trabalho às escolas públicas
que atendem nossa clientela, tanto municipais – Antenor Navarro, Pedra do Reino, Violeta
Formiga; Tarcilla Barbosa; Luis Mendes, Moema Tinoco Cunha Lima- como estaduais –
Presidente Costa e Silva, Indio Piragibe, Carmelita Pereira Gomes, Débora Duarte,
Capistrano de Abreu.
A Oficina de Esporte, que divide-se em atividades de natação, futebol, voleibol,
espiribol e recreação em geral, tem como objetivo favorecer o desenvolvimento físico e
psíquico dos educandos, visando manter o equilíbrio mental, social e cultural, incentivando
a prática desportiva e permitindo que os mesmos estabeleçam relações entre suas medidas
de crescimento e desenvolvimento. Esta oficina é responsável pela promoção e participação
dos educandos em eventos relacionados ao esporte e lazer, realizando um trabalho com
“gandulas” que participam de jogos realizados no estádio ALMEIDÃO com times da
cidade e convidados para amistosos de outros Estados. Esta oficina suscita muito interesse
entre os educandos, já que realiza trabalho recreativo dentro de práticas desportistas.
A Oficina de Artes (plásticas, Macramê e Tear), tem como objetivo principal
recuperar os valores culturais, através de um trabalho que faça os educandos entrarem em
contato como seu próprio corpo, com o universo natural e com sua cultura, utilizando a
criação de uma forma envolvente, fazendo com que, através de seus próprios sentimentos, o
participante questione e descubra uma visão de mundo crítica para melhor interagir com
ele. Os trabalhos realizados tais como: tapetes, cortinas de cordas e bambu, emborrachados,
40
caixas de presentes, são comercializados dentro e fora da unidade, e também são expostos
em eventos realizados pela FUNDAC.
A Oficina do Pensar destina-se a fazer Educador e Educando refletirem juntos a
razão do existir, do sentir, do agir, do ser. É um “que” fazer crítico que objetiva o aprender
a pensar, compreender, aceitar, transformar a experiência do viver. Nesta oficina
desenvolve-se com educadores grupos de estudo sobre temas específicos à criança e
adolescente, a exemplo da Pedagogia da Presença, ECA e etc.
A Oficina Ecológica (Hortas/ Mudas) trabalha a dimensão humana na sua relação
com a natureza, conscientizando o educando quanto à importância da terra. Ter a natureza
como parte integrante é fundamental no desenvolvimento pessoal e social do seu viver. Há
nesta oficina uma sintonia entre as crianças, adolescentes e a própria natureza, uma vez que
esta unidade dispõe de grande área verde com árvores frutíferas e plantios que são
utilizados por todos.
O trabalho da Oficina de Saúde é realizado por (02) enfermeiros, visando
administrar os problemas de saúde dos educandos, trabalhando a higienização,
acompanhando-os e encaminhando-os a médicos e hospitais, para exames laboratoriais de
rotina, tratamento odontológico e outros. Diante do aumento das DST´s/Aid´s, realiza
oficinas de prevenção e conhecimento do corpo. Em sua rotina, realiza a profilaxia das
doenças de pele e do corpo em geral. Esta oficina dispõe de uma pequena enfermaria dentro
da unidade, como também tem acesso aos serviços de atendimento oferecidos pelo Hospital
Universitário Dr. Lauro Wanderley, Hospital do Valentina de Figueiredo, Hospital Santa
Isabel, Centro de Atendimento Odontológico de Jaguaribe, PAM-Jaguaribe e Posto de
Saúde Antenor Navarro, que se localiza em frente ao projeto.
41
2.3. INSTRUMENTOS E PROCEDIMENTOS DA COLETA DE DADOS
A pesquisa realizada no PROJETO CRES/SER-FUNDAC, teve início a partir da
solicitação de autorização à direção desta unidade, na qual apresentavam as características e
os objetivos do trabalho a ser realizado. Uma fase de conhecimento da dinâmica
institucional não foi necessária, uma vez que a pesquisadora faz parte da equipe técnica
desta unidade, tendo livre acesso aos sujeitos da pesquisa. Em seguida, procedeu-se aos
esclarecimentos sobre a pesquisa aos educandos nela envolvidos.
Num quarto momento, aproveitando os intervalos das oficinas pedagógicas, foram
realizadas trinta entrevistas individuais, sendo quinze crianças e quinze adolescentes,
utilizando-se um gravador. Cada entrevista teve uma média de duração de 10 minutos.
Na entrevista, procurou-se enfatizar como as crianças e adolescentes em situação de
exclusão do Projeto Cres/ser apreendem e concebem os direitos humanos (nas práticas
cotidianas da instituição) e as Representações Sociais do Projeto de Vida.
As questões basearam-se nos seguintes itens para os dois grupos (crianças e
adolescentes):
1) O que é ser criança/adolescente?
2) O que é o direito da criança/adolescente?
3) Qual o significado do Projeto Cres/ser para você?
42
Enfatiza-se a necessidade e importância do roteiro de entrevista, de forma a permitir
que a relação entrevistado/entrevistador flua, não se tratando, pois, de uma mera questão
técnica, mas de uma estratégia que passa inicialmente pelas relações interpessoais.
A participação das crianças e adolescentes no desenvolvimento da entrevista foi
significativa. Não houve reação de rejeição ou dificuldades nas respostas, houve boa
vontade e disponibilidade; entretanto ocorreram momentos de timidez e insegurança quanto
a responder com utilização de um gravador.
2.4.. PROCEDIMENTOS DE ANÁLISE
Objetivando a coerência entre a metodologia qualitativa e o modo mais coerente de
analisar as entrevistas semi-estruturadas, tornou-se necessário optar pela técnica de Análise
de Conteúdo para compreender e inferir novos conhecimentos a partir das respostas das
crianças e adolescentes do Projeto Cres/ser.
Triviños (1987, pág.160) cita Bardin ao
conceituar análise de conteúdo:
“um conjunto de técnicas de análise das comunicações, visando, por
procedimentos sistemáticos e objetivos, a descrição do conteúdo das
mensagens, e obter indicadores quantitativos ou não, que permitam a
inferência de conhecimentos relativos ás condições de produção/recepção
(variáveis inferidas) das mensagens”.
A análise de conteúdo proposta por Moscovici não se restringe a inventariar a
freqüência de temas mediante as respostas da população alvo, isoladamente, sem haver
inferência de estruturas inseridas em dinâmicas sociais e históricas. Ela é um meio para
43
estudar as “comunicações” entre os homens, dando ênfase ao conteúdo “das mensagens” a
discursos extremamente diversificados, e tendo como objetivo principal a compreensão
crítica destas "comunicações” entre os homens.
A análise de conteúdo, segundo Vala (1986:109), pressupõe as seguintes etapas: 1A definição dos objetivos e do quadro de referência teórico ou seja, o investigador ter em
vista os objetivos. 2 – A constituição do corpus, que é constituído pelo material a ser
analisado. 3- A definição das categorias, a classificação, a categorização, é uma tarefa no
quotidiano objetivando reduzir a complexidade do meio ambiente. 4- Definição das
unidades de análise, uma análise de conteúdo pressupõe a definição de três tipos de
unidade: Unidade de registro é o segmento determinado de conteúdo que se caracteriza
colocando-o numa dada categoria. Unidade de contexto é o seguimento mais largo de
conteúdo que o analista examina quando caracteriza uma unidade de registro. Unidade de
enumeração é a unidade em função da qual se procede à quantificação. 5- A quantificação e
a elaboração de um conjunto de procedimentos que permitam assegurar a fidedignidade e
validade da análise.
44
CAPÍTULO III
OS DIREITOS HUMANOS DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE
3.1. O SIGNIFICADO DOS DIREITOS HUMANOS PARA AS CRIANÇAS EM
EXCLUSÃO
No entendimento do significado dos direitos humanos neste estudo, procurou-se
uma articulação com as bases teóricas fundamentadas basicamente na Teoria das
Representações Sociais (Moscovici), e nos estudos sobre Projeto de Vida, Exclusão Social
e Direitos Humanos (Catão, Jodelet, Sawaia).
Sabe-se que a construção do significado de direitos humanos como fenômeno, não
se dá isoladamente no indivíduo, nem na sociedade. Ele é construído entre
indivíduo/sociedade, nas relações do indivíduo com o mundo e com os outros.
Apreender o significado de direitos humanos no senso comum é uma forma de
reconstruir a realidade social dos educandos do Projeto Cres/ser, a partir dos embasamentos
teóricos desta pesquisa, sendo ele o resultado das práticas sociais e profissionais das
relações mantidas, alienadas ou não, pela partilha grupal, onde são formadas as
representações sociais deste coletivo. É, portanto, na relação com o outro, com o passado,
com o futuro, que o indivíduo se objetiva orientado por sua identidade.
Pretende-se, neste capítulo, apresentar a construção do significado de direitos
humanos para as crianças e adolescentes do Projeto Cres/ser.
45
Evocam-se, a seguir as categorias de suas respectivas apreensões que emergiram das
falas deste coletivo em estudo: Direito humano (enquanto) brincar; direito humano ao
trabalho/família; direito humano ao estudo e projeto de vida; direito humano enquanto
cotidiano institucional.
a) Direito Humano a Bbrincar
Para as crianças o significado de direitos humanos enquanto necessidade de brincar
é apreendido nas respostas:
... Brincar, jogar bola, (...) ser criança é bom, porque é mais feliz, brincando,
correndo. (...) passear por ai com os pais, andar de bicicleta (...) Brincar de
casinha, brincar de carro, brincar de parque, ir pro circo, brincar de caminhão.
(...) jogar volei, natação, e (...) Ser criança é bom, porque é mais feliz,
brincando, correndo.(...) jogar futebol, jogar volei, jogar espiribol, (...) Um
bocado de coisa, brincar, andar se divertir.(...) Se divertir, brincar de bola no
colégio, outras coisas aqui na granja brincar de bola, (..) brincar, jogar bola,
fazer atividade que é preciso, Divertir brincar de bola, jogar volei.(...) Direito
de jogar, de brincar, direito de andar, direito de jogar (...) jogar volei, ir para a
capoeira, treinar de chuteira. (...)Direito da criança é a pessoa é ter harmonia,
direito da criança é estudar bem muito, brincar,passear por ai com os pais,
andar de bicicleta, ir para a praia, pra Fundac, brincar, jogar volei, espiribol. É,
um direito pode passear ir para o circo.(...) Esporte, natação, capoeira, é
esporte, lazer.(...) a mãe para andar de bicicleta, jogar bola no meio da rua
com um colega. Ir para a granja do meu tio, tomar banho de piscina.
Observarmos nesses depoimentos que o conteúdo das idéias de direitos humanos
dos entrevistados, crianças em situação de exclusão inseridas no Projeto Cres/ser, apresenta
a noção de brincar como, um direito primordial para suas próprias vidas .
Evidencia-se com isso, que a produção do sentido de direitos humanos tal como
“brincar” está bem presente no dia-a-dia destes meninos que vêem seus direitos violados ao
nascer, por serem oriundos de famílias sócio-economicamente carentes.
Há uma adjetivação comum a todos no ato de brincar.
46
b) Direitos humanos enquanto trabalho/família:
O significado de Direitos humanos ancorado no Trabalho/família é compreendido
como sentido de vida ou seja, qualidade de vida na qual a criança é a provedora da família.
Este aspecto é evidenciado nas respostas abaixo.
... Ser criança para mim é um bom trabalho, (...) Direito da criança é ajudar
o pai. (...) Direito de trabalhar. (...) Tenho direito de ganhar o salário do meu
pai que morreu. (...) Fazer um bocado de coisa, trabalhar, ajudar a mãe. (...) A
trabalhar, ajudar a mãe e o pai.. Isso que eu faço é um direito, ajudar o pai e a
mãe. (...) Trabalhar, ajudar o pai. (..) Em casa a mãe. (.. )ser trabalhador ajudar
a mãe nos trabalho. trabalhar, ajudar a mãe o pai ele trabalha num colégio.(...)
Ajudar a mãe, trabalhar. (...) Ter um bom trabalho, trabalhar, ajudar a mãe e o
pai. (...) Ajudar a fazer as contas que minha mãe e meu pai não sabe de
matemática. Isso que eu faço é um direito, ajudar o pai e a mãe. (...) Ajudar o
pai. (...) Direito da criança é trabalhar, trabalhar ajudar o pai, a mãe em casa.
A criança, ao verbalizar a importância do trabalho, para poder ajudar os pais na
realização de alguma atividade lucrativa, no sentido de valor de vida e no nível concreto na
manutenção da família. Diverge do Estatuto da Criança e do adolescente que reza em seu
Art. 60: É proibido qualquer trabalho a menores de quatorze anos de idade, salvo na
condição de aprendiz. O Estado proíbe o trabalho infantil mas não dá condições às famílias
de baixa renda para ter acesso a bens através do trabalho digno para manutenção dos filhos,
o que, certamente suscita nas falas das crianças a necessidade do trabalho infantil.
“Na sociedade antiga o trabalho não ocupava tanto o tempo do dia, nem tinha tanta
importância na opinião comum, não tinha o valor existencial que lhe atribuímos há pouco
mais de um século. Mal podemos dizer que tivesse o mesmo sentido”. (Àries,1981:94). O
sentido do trabalho, certamente, começou a ser aguçado com o valor atribuído ao capital.
Observa-se, que não é comum o trabalho ser assunto preocupante das crianças que têm seus
47
direitos assegurados, onde os pais são os provedores. Mas, emerge nas respostas destas
crianças que, desde o nascer, têm seus direitos básicos violados por uma sociedade desigual
globalizada, onde a família dispõe de poucos recursos para sobreviver.
c) Direitos humanos enquanto estudo/projeto de vida
Este significado emergiu das seguintes respostas das crianças:
...Quero ser doutor. (...) Estudar, aprender a ler. (.. )Quando eu crescer, quero
trabalhar de médico. (...) Crescer para ajudar minha mãe, estudar, me formar,
arrumar um emprego. Eu quero fazer medicina. (...) Quero ser médico. (..)
Quero ser doutor, para cuidar de gente. (...) Jogador, jogar num time grande,
Flamengo. (...) Quero ser jogador de futebol. (...) Eu quero ter um trabalho de
jogador de futebol, jogar no vasco.(...) Trabalhar no futebol também. (...)
Quero ser um doutor policial. (...) Quero ser um policial.
As aspirações profissionais futuras são uma resultante das práticas institucionais e
das relações mantidas espontaneamente, pelas partilhas grupais nas quais os coletivos
transformam suas representações sociais. Neste estudo, permite-se conhecer como as
crianças excluídas sociais pensam sobre suas vidas e história. Observamos, que a satisfação
e realização profissional alcançado através do estudo, na esperança de possuir a riqueza
para usufruto seu, e da família constituída futuramente fluiu naturalmente nas falas. A
profissão que está mais presente como projeto de vida futura, centra-se na esperança de ser
médico; em seguida, aparecem as demais profissões, tais como policial, jogador de futebol.
d) Direitos humanos enquanto cotidiano institucional:
A apreensão dos direitos humanos das crianças no contexto institucional, emergiu
das respostas:
48
... Pra não ficar na rua sozinho, pra fazer reforço, pra fazer arte, tapete,
capoeira, comida, graninha, presente, lanche, dá roupa, oficina de esporte, ir
para a palavra escrever, estudar, fazer tarefa da escola. Quando crescer ter um
a profissão boa, trabalhar. (...) É, estudar, para a palavra, capoeira, jogar bola.
A bolsa, aprender, faz curativo na minha ferida, oferece comer. Significado de
paz, harmonia, amor, carinho, e carecendo muito do pessoal daqui. (..)
Trabalho, ajuda à ser educador, estudar e servir o exército, oferece só ajuda, se
a pessoa tiver doente é só explicar. (...) O projeto ajuda. Não ficar mais
bagunçando, cheirando cola com outros, ficar aqui é bom, é um direito bom
para a pessoa aprender a se educar. (...) Bom, para não ficar na rua,
vagabundando. Não arrumar confusão na rua. (...) Porque, aqui a gente vai pra
frente, treino volei e futebol e tear também. É, bom, é um direito. Minha mãe
me colocou aqui pra não ficar na rua. (...) Ensina as coisas que a pessoa deve
fazer, não deve usar drogas. (...) estudo, trabalho. É, um direito porque é
melhor que ficar na rua. (...) Uma coisa boa, porque, é para a gente brincar,
participar de oficinas, fazer tapetes, na rua eu só fazia brincar e brigar. (...)
Direito dela vim pro projeto cres/ser, para a escola, porque é um direito dela,
pra não ficar no meio da rua. (...) Projeto cres/ser, é uma escola, porque os
meninos da rua vem pra cá, os meninos tem atividades. Oferece um monte de
coisas, como trabalhar em padaria.
Observamos no discurso das crianças que o projeto Cres/ser, enquanto instituição,
trabalha com meninos distanciados da família, recolhidos das ruas, em extrema exclusão
social, são totalmente marginalizados pela sociedade que procura manter distância deste
contigente de pessoas. Ele proporciona uma formação humana necessária para alcançar a
cidadania. Isto é, existe um acolhimento, que cumpre uma “função” específica no seio da
sociedade. Ele “proporciona” ao educando que recebe passivamente de fora uma “formação
necessária”.
O Projeto Cres/ser também representa a fuga das ruas, a acolhida do sub-mundo
das drogas e da marginalidade. Nota-se, em seus discursos, ao serem indagados nas
entrevistas, a noção de transmissão de conhecimento, ajuda e acompanhamento. O projeto
de vida com base nas práticas do Cres/ser, de acordo com as representações sociais dos
educandos, é articulado às suas aspirações futuras. A instituição representa um veículo
49
norteador de formação que está articulado às representações sociais do projeto de vida,
promovendo a oportunidade de planejar o futuro deste contigente excluído.
3.2. O SIGNIFICADO DOS DIREITOS HUMANOS PARA OS ADOLESCENTES EM
EXCLUSÃO:
Neste coletivo de adolescentes emergiram também as categorias Direitos humanos
enquanto brincar; direitos humanos enquanto trabalho/família; direitos humanos enquanto
estudo e projeto de vida; direitos humanos enquanto práticas institucionais)
a) Direitos humanos enquanto necessidade de brincar
Este significado apreendeu-se nas seguintes respostas dos adolescentes:
... Juventude, brincar, jogar futebol, pra mim é negócio de criança, não fazer
nada de errado, volei, jogar capoeira, fazer natação.(...) Ter lazer, saber dividir
as coisas com os amigos, não querer brigar, discutir com seus pais.(...)
Adolescente é viver a vida, e curtir a vida.(...) É uma fase boa, porque nos
podemos curtir mais a vida, é só curtir a vida. (...) Adolescente é poder
aproveitar a vida.(...) Viver a vida na paz, minha família com saúde e eu
também. (...) Muito bom, é uma coisa boa, tem direito de brincar, ter direito a
muita coisa para brincar. (...) Brincar, jogar futebol, se quiser dar coisas,
presente para a namorada. (...) adolescente, brincar, É muito bom, adolescente
tem o dinheiro da gente. (...) Eu gosto de ser adolescente, tenho meus colegas,
brinco de bola. (...) Ser pequeno, jogar bola, Brincar, jogar bola. Ser
adolescente é ser amigo. (...) Adolescente é, poder aproveitar a vida.
Ao apreender-se o significado de direitos humanos do adolescente no senso
comum, percebe-se a presença da curtição, da brincadeira, no sentido de “qualidade de
vida” ancorado no lazer e no “bem estar social”. Está presente nas falas uma forma de
construção da vida na adolescência divergente da realidade social destes meninos. Pois,
50
vivem em um contexto de estrema pobreza e negação ao lazer; pouco tempo há para
brincadeiras, sabemos que nos finais de semana ao invés de estarem “curtindo” a vida,
estão certamente, realizando alguma atividade rentável, tornando-se provedores de suas
famílias que pouco tem a lhes oferecer no que se refere ao lazer.
b) Direitos Humanos enquanto trabalho/família
Na apreensão do trabalho como propiciador de melhoria de vida, emergiu:
...Ter responsabilidade de sustentar a família. (...) Muitas coisas, trabalhar,
construir alguma coisa. (...) Ter uma família.(...) Direito do adolescente, direito
a receber dinheiro, a trabalhar. Trabalhar, para ajudar meu pai, ajudar minha
mãe a pagar a luz. (...)ajudar a mãe o pai ele trabalha num colégio. (...) Ajudar
e obedecer a mãe o pai, obedecer.(...) Ter um bom trabalho. (...) Trabalhar
para, ajudar a irmã.(...) Muitas coisas, (...) trabalhar, construir alguma coisa na
vida, ter uma família. (...) A gente *gandula, ajuda a pagar o aluguel. Ter uma
família, ter mais responsabilidade, não deixar eles fazer nada de errado.
É oportuno observar, que estes meninos percebem a exclusão, quando afirmam ser o
trabalho uma necessidade básica em suas vidas. Percebe-se que se suas famílias,
dispusessem dos bens e serviços sociais necessários a todo ser humano, certamente, não
apresentariam como necessidade básica o prover familiar. Esta apreensão de direito condiz
com a realidade destes que, logo cedo, são afastados do convívio social e inseridos nas
instituições de amparo a criança e adolescente em situação de exclusão social. A apreensão
da exclusão facilita uma maior noção de mundo do grupo de pertença e de apreensão dos
direitos humanos. Ser “gandula” é uma atividade rentável, onde os meninos do Cres/ser,
são escalados para participarem de jogos de futebol, realizados em Estádios recolhendo as
bolas chutadas fora do campo.
51
A partir da apreensão de seus direitos, a percepção de si e do mundo
expressa a realidade do processo de exclusão/inserção social, já que o processo de exclusão
os afasta cada vez mais das possibilidades de terem seus direitos respeitados.
O trabalho emerge como possibilitador da mudança de vida. A representação
social dos direitos humanos ancorada no trabalho, segundo Catão (2001:137), “não é
específica da população de excluídos, porém a ela une-se uma maior impossibilidade na
possibilidade de aquisição de emprego, forjada nas contradições sociais”. Dessa forma, o
trabalho é a base de representação social do direito humano do adolescente do Projeto
Cres/ser.
c) Direitos humanos enquanto estudo/projeto de vida
O projeto de vida futura ancorado no estudo como sentido de valor de vida,
expressa-se nas respostas:
(...) Quero estudar e ser alguém, doutor, médico para cuidar de gente. (...)
Quero ser um médico. (...) Quando crescer trabalhar, ir para a faculdade,
aprender para ser um doutor. (...) Penso ser um doutor, para ajudar gente
doente. (...) A participar de cursos, ver se tem algum futuro pela frente.
(...)Estudar, aprender a ler.(...) Estudar, ir para a escola, estudar. (...)colégio.
(...) Ter 2° grau. (...) A escola também é um direito que toda criança deveria
Ter. (...) No futuro for procurar algum trabalho vão exigir cursos, que hoje dia
até para ser gari, coveiro tem que ter certificado, tem que ter o primeiro ano,
tem que ter escola o projeto oferece ter direito a educação.(...) Eu tenho uma
força muito grande e se Deus quiser eu vou conseguir vencer.(..) Estudar, ir
para escola. (...) O estudo, ensina tudo que a pessoa quer, um emprego hoje
tem que ter 2° grau. para ir ao colégio, toda vez os meninos tem que
desenvolver mais no colégio, cada vez mais vai aprendendo, desenvolver.(...)
A educação, é um bocado de coisa. (...) Ser um profissional, no futebol subir
em vários clubes profissionais, Palmeiras, Corinthians, Grêmios. (...) Quero ser
um jogador de futebol, tô trabalhando para isso. Em janeiro vou para São
Paulo, fazer um teste par o CSP. (...) Eu quero ser um grande jogador de
futebol. (...) Eu quero ser um advogado, me formar em advocacia. (...) (...)
Ser um profissional, no futebol subir em vários clubes profissionais, Palmeiras,
Corinthians, Grêmios. (...) Quero ser um jogador de futebol, tô trabalhando
para isso. Em janeiro vou para São Paulo, fazer um teste par o CSP. (...) Eu
52
quero ser um grande jogador de futebol. (...) Eu quero ser um advogado, me
formar em advocacia. (...) Quero estudar, ser uma pessoa na vida. Quero ter
uma profissão boa, Advogado.
É na relação com o passado e com o futuro que estes adolescentes objetivam seus
projetos de vida. “O Projeto de Vida, enquanto intenção de transformação do real
orientado por uma representação social do sentido dessa transformação, considerando as
suas condições reais na relação presente/passado na perspectiva do futuro”. (Catão,
2001:27).
O projeto de vida, como fenômeno em constante movimento no mundo, é
apreendido aqui numa elaboração socialmente construída. Sobre a escolha de vida, é
evidente a ascensão social através do estudo. Mesmo sabendo das dificuldades, estes
adolescentes mantém uma visão positiva do estudo para conseguir ser um doutor. O ato de
planejar um futuro melhor, faz parte do ser humano, mesmo inconscientes manifestam a
necessidade de projetar suas vidas. Sendo isto uma forma de sair da realidade social
excludente em que se inserem.
As falas revelam o pensar sobre o futuro, a falta, a carência, o que virá, as escolhas
profissionais ancoradas na visão representada pelo mundo que os cerca, ou seja, um mundo
que exclui, num processo sócio-econômico desigual e injusto.
A escolha do projeto de vida com aspirações futuras pode vir com uma conotação
deslocada ou idealizada, onde este discurso pode ser desconhecido do mundo deles.
Entretanto, ao apresentar o estudo como alternativa de melhoria futura, nota-se que há uma
condição proposta para o desenvolvimento humano, com fins produtivos.
No processo de exclusão/inserção social o trabalho aparece como mediador entre si
e o mundo, entre o presente e o futuro almejado, havendo a necessidade de auto-ajuda e da
53
família com suporte. Por tratar-se, de meninos excluídos, o projeto de vida dentro do
contexto social desigual torna-se um impedimento para o indivíduo ou aceitação do mesmo.
Há uma aposta no estudo para haver uma mudança de história de vida futura.
d) Direitos humanos enquanto cotidiano institucional:
A apreensão do significado dos direitos humanos dos adolescentes no contexto
institucional, emergiu das respostas:
(...)Projeto cres/ser, pra mim é uma escola, tá ensinando tudo de bom,
ensinando a ler, escrever, tudo direito, dá colégio, dá alimentação, dá estudo,
dá roupa, dá tudo de bom, aprende nas oficinas, eu faço a palavra e o esporte.
(...) Jogar bola, estudo, participo das oficinas, vou para a palavra, faço tapete,
vou fazer oficina de cordão, colares. Isso tem a ver com direito, porque criança
pobre tem pouco lazer, aquelas crianças que vivem no meio da rua, não tem.
(...) Significado de seguir um caminho melhor, e que a Fundac já é uma
influência para a pessoa não entrar no caminho das drogas. O projeto cres/ser,
fica numa parte boa da vida da pessoa, porque a pessoa cresce aqui dentro, sem
aprender nada de errado na rua. (...) O que a gente tem aqui ajuda o direito de
todo adolescente. É, uma aprendizagem de não viver no mundo das drogas,
fazer nada de errado, roubar, cheirar cola. Isso, é um direito do adolescente,
pensar antes de fazer. (...) O significado do projeto cres/ser, é crescer e evoluir
mais ainda que somos na nossa adolescência. Só por isso, o governo do Estado
botou esse estatuto e registrou e batizou com este nome Projeto cres/ser, que o
próprio nome já diz crescer, podemos ter cursos, como os que tem aqui no
projeto oficina de reciclagem, palavra, macramê, artes, tear, capoeira. Se
souber aproveitar o que o projeto oferece que a gente chega naquele ponto,
mais alto. (...) É bom, melhor que ficar na rua passando o dia todinho. Aqui eu
tô fazendo esporte, aprendendo, muita coisa à ser educado. (...) Tem tudo a
ver, esse negócio é para a criança não ficar na rua. É um direito para a criança
não ficar na rua fazendo o que não presta. (...) Oferece uma chance, tá dando
uma chance aqui eu tô treinando, tô me educando. (...) Fazer o certo, as
oficinas também, ter amigos.( ..) Ensina boas maneiras.
Observamos nos adolescentes, que o projeto Cres/ser trabalha com meninos
distanciados da família, recolhidos das ruas, em extrema exclusão social, totalmente
marginalizados pela sociedade que procura manter distância deste contigente de pessoas.
54
Para eles esta instituição, proporciona uma formação humana necessária para alcançar a
cidadania. Isto é, existe um acolhimento, que cumpre uma “função” específica no seio da
sociedade. Ele “proporciona” ao educando que recebe passivamente de fora uma “formação
necessária”. Sem dúvida, tenta formar cidadãos para a sociedade e para eles próprios.
Nota-se, em seus discursos, ao serem indagados nas entrevistas a noção de
transmissão de conhecimento, ajuda e acompanhamento. A instituição, com uma estrutura
de grupos ou indivíduos, reunidos em inter-relações com ações, concretizando cada um sua
função junto a clientela atendida. No projeto de vida com base nas práticas do Cres/ser
articuladas às representações sociais dos educandos, é significativa a apreensão de práticas
institucionais articuladas às suas aspirações futuras. As práticas da instituição representam
um veículo norteador de formação de representações sociais. Estão articuladas as
representações sociais do projeto de vida promovendo a oportunidade de planejar o futuro,
proporcionando como eles falam “estudo”, “aprendizagem”.
Diante do exposto, comparar as semelhanças e diferenças na apreensão do
significado dos direitos humanos da criança e adolescente do projeto cres/ser torna-se
pertinente.
No que tange a este contingente estudado apreendeu-se as seguintes semelhanças
nas falas, quanto ao que seja direito humano enquanto brincar. A criança e o adolescente
quando se referem ao ato de brincar como direito humano, enfatizam o aspecto lúdico do
brincar. Dentro da categoria brincar a diversão, a brincadeira e o lazer estão presentes no
senso comum dos dois grupos. As crianças, ao se referirem a brincar, enfatizam a
importância de “ passear com os pais”; “andar de bicicleta”; “ir para o circo”. E, os
adolescentes afirmaram que direito humano enquanto brincar, é “Jogar futebol, Capoeira,
volei”.
55
Direito humano enquanto trabalho/família, suscitou semelhança na preocupação em
serem provedores da família. Apreendeu-se esta categoria, a partir do momento em que as
crianças, afirmam que querem
“ajudar o pai e a mãe”; e o adolescente
“ter
responsabilidade de sustentar à família”.
Quanto a categoria estudo/projeto de vida futura ambos almejam ser doutor, ter um
nível superior. O estudo apresenta-se como, um meio de ascensão de vida. As crianças ,
dão importância ao estudo quando afirmam: “quero estudar, e me formar”. O adolescente
pensa em estudo no sentido de “fazer faculdade”. Aprendeu-se nos dois grupos que, a
profissão mais almejada é ser jogador de futebol, jogar em um grande clube.
O Projeto Cres/ser, é uma forma de aquisição de direitos que a sociedade os negou.
Ele representa uma fuga das ruas e das drogas. Tal como, apreendeu-se nas crianças “pra
não ficar na rua sozinho”; “Não ficar cheirando cola com os outros”. E, nos adolescentes
“É bom, melhor que ficar na rua passando o dia todinho” . Tanto para as crianças como
para os adolescente é um meio de garantir direitos humanos primordiais tais como: à
alimentação, escola, esporte e lazer. É, uma forma de alcançar a cidadania.
Quanto as diferenças individuais apreendidas, na categoria direito humano enquanto
estudo/projeto de vida, as crianças inserem-se profissionalmente na importância de “ser
doutor para cuidar de gente”,” ser policia” e também “servir ao exército”. Os adolescentes
pensam o estudo no sentido de ir para faculdade; “ter 2º grau” e ser “advogado”.
56
3.3.CONSIDERAÇÕES FINAIS:
Resgatando, o conceito de Representação Social de Moscovici (1961), onde o
homem social passa a ser entendido na sociedade no contexto da relação
indivíduo/sociedade.
A construção do homem dar-se no seio da sociedade, assim cada indivíduo cria sua
visão de mundo individualmente, coerente com sua realidade social. È, pertinente afirmar
que a partir do momento em que estes indivíduos passam à partilhar o mesmo ambiente
“habitat social”, tendem à construir uma apreensão de mundo que os cerca. O que,
Moscovici conceituou de teoria do senso comum das representações sociais. A
externalidade, é construída das influências sociais ou seja, surge da construção social do
externo pelo interno sem divisões.
Os direitos humanos são aqui vistos como um fenômeno social apreendido no
cotidiano institucional articuladas às representações sociais. È pertinente afirmar que as
representações sociais dos coletivos participantes deste estudo apresentam significados
semelhantes de direitos humanos da criança, que para eles significa “Brincar” e
“Trabalhar”. A brincadeira na visão da criança e do adolescente, ganha significado
porque, brincadeira é coisa séria. Enquanto brincam, os educandos do Cres/ser partilham e
resolvem seus conflitos coletivamente. O brincar é uma linguagem lúdica formadora de
significado e da personalidade capaz de superar os desafios do cotidiano. Esta semelhança
define-se como, um fenômeno social gerada da partilha vivenciada no cotidiano
institucional.
57
O
trabalho
ganha
significado,
por
remontar
à
origem
de
classe
trabalhadora(empregado, sub-empregados, excluídos). O trabalho é visto como à redenção
das vidas das crianças e adolescentes analisados. Enquanto que nesta fase da vida deveriam
está preocupados em estudar, participar dos programas sociais, desenvolvendo-se como
pessoas. São herdeiros de uma cultura de trabalho-exploração do homem pelo homem.
Assim, observa-se uma preocupação constante em ser provedor da família.
O Projeto Cres/ser, enquanto instituição é representado como algo positivo de forma
à assegurar os direitos humano fundamentais tal como: direito ao esporte, à educação, à
cultura, dando suporte par inserção social na sociedade, já que as famílias não dispõem da
estrutura necessária para prover os direitos negados. Evidencia-se uma positividade na
relação com o espaço institucional, e suas práticas articuladas às representações sociais do
projeto de vida dos educandos, pela presença de práticas pedagógicas que promovam a
construção desse projeto de futuro, fora do contexto “rua”.
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