do artigo

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Hossri et al.
Teste Ergométrico em Portadores de DCEI
Artigo de Revisão
Artigo de
Revisão
Rev Bras Cardiol. 2014;27(3):217-227
maio/junho
Teste Ergométrico em Portadores de Dispositivos Cardíacos
Eletrônicos Implantáveis
Exercise Testing in Patients with Cardiac Implantable Electronic Devices
Carlos Alberto Cordeiro Hossri1,2, Sandro Pinelli Felicioni2, Uelra Rita Lourenço2, Paulo Christo Coutinho da Silva2,
Enrique Indalécio Pachón1, Susimeire Buglia1,2, Luiz Eduardo Mastrocolla2, Rica Dodo Buchler2
Hospital do Coração - Associação do Sanatório Sírio - São Paulo, SP - Brasil
Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia - São Paulo, SP - Brasil
1
2
Resumo
Abstract
O número de pacientes com dispositivos eletrônicos
vem crescendo substancialmente nos últimos anos.
Marca-passos com inúmeras programações e
desfibriladores com ou sem ressincronizadores, cada
vez mais comuns, apresentam-se com traçados
eletrocardiográficos confundidores. Assim, é
necessária a compreensão de princípios básicos e
técnicos pelos clínicos, além da integração entre estes
e os eletrofisiologistas. O conhecimento de tais
princípios básicos é fundamental na condução desses
pacientes, de modo que o ergometrista deve estar
ciente do tipo de dispositivo, programação, frequência
mínima e máxima de comando, presença de
desfibrilador, bem como suas frequências de terapias
e desfibrilação. Assim, promover-se-á maior segurança
durante provas funcionais (teste ergométrico e
ergoespirométrico) e programas de treinamento físico.
Este artigo de revisão tem por objetivo descrever
diversos pontos de interesse na realização do teste
ergométrico em portadores de dispositivos eletrônicos.
The number of patients fitted with cardiac implantable
electronic devices has grown substantially over the
past few years. Pacemakers with countless
programming options and defibrillators with or
without resynchronization devices are increasingly
more common, with confusing electrocardiographic
findings. Consequently, general practitioners must
understand their basic principles and techniques, in
addition to developing stronger links with electrophysiologists. Knowledge of these basic principles is
crucial for managing these patients, meaning that
people administering ergometric testing must be
aware of the type of device and its programming,
minimum and maximum command frequency and
defibrillator, as well as its treatment and defibrillation
frequencies. This will ensure greater safety during
ergometric and ergospyrometric exercise testing and
exercise programs. This paper describes several points
of interest in ergometric testing for patients fitted with
cardiac implantable electronic devices.
Palavras-chave: Desfibriladores implantáveis; Teste
de esforço; Reabilitação; Terapia de ressincronização
cardíaca; Marca-passo artificial
Keywords: Defibrillators, implantable; Rehabilitation;
Exercise test; Pacemaker, artificial; Cardiac
resynchronization therapy
Correspondência: Carlos Alberto Cordeiro Hossri
Rua Abílio Soares, 217 conj.121 - Paraíso - 04005-000 - São Paulo, SP - Brasil
E-mail: [email protected]
Recebido em: 19/11/2013 | Aceito em: 13/04/2014
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Introdução
A estimulação cardíaca artificial, cuja história tem
aproximadamente cinco décadas, foi uma das
conquistas terapêuticas mais notáveis do século XX e,
ainda assim, continua em constante evolução,
apresentando grande ampliação de suas indicações
clínicas1,2. Com a evolução dos sistemas de computação
e de armazenamento de dados foi possível digitalizar
os sinais eletrocardiográficos e monitorar em tempo
real os estímulos elétricos cardíacos do indivíduo, seja
durante suas atividades rotineiras seja quando
submetido a protocolos específicos de esforço físico
no laboratório de ergometria.
No Brasil, entre 1994 e 2010, foram realizadas cerca de
240 000 cirurgias para implante de marca-passo (MP)
definitivo, 8 000 cirurgias para implante de
cardiodesfibriladores implantáveis (CDI) e 5 000
cirurgias para implante de ressincronizadores
cardíacos (RC), conforme informações do Registro
Brasileiro de Marca-passos, realizado pelo Departamento
de Estimulação Cardíaca Artificial da Sociedade
Brasileira de Cirurgia Cardiovascular3. Nos EUA,
entretanto, nesse mesmo período, foram realizadas
impressionantes três milhões de cirurgias apenas para
implante de MP4. Esses números tornam inequívoca
a importância dessa opção terapêutica na Cardiologia
contemporânea, assim como também ressaltam a ideia
de que é necessário sempre manter esses dispositivos
em perfeito estado de funcionamento. Nesse sentido,
a ergometria e o sistema Holter representam
instrumentos de grande valia na avaliação do
funcionamento desses dispositivos, assim como
oferece auxílio adicional importante no refinamento
da sua programação.
O Quadro 1 mostra as principais indicações do teste
ergométrico nos pacientes portadores de DCEI,
conforme as Diretrizes Brasileiras de dispositivos
cardíacos implantáveis5.
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A realização de teste ergométrico (TE) em portadores
de DCEI é segura, desde que seja realizado por médico
devidamente capacitado e que sejam seguidas as
recomendações do Departamento de Ergometria da
Sociedade Brasileira de Cardiologia para a realização
desses exames. Ressalta-se que é indispensável a
presença de material de Suporte Avançado de Vida
em Cardiologia no ambiente onde é feito o exame e
sugere-se que esses exames sejam feitos
preferencialmente em ambiente hospitalar.
Na prática, a escolha do protocolo para realização do
TE em portadores de DCEI obedece aos mesmos
critérios convencionais já consagrados em Ergometria,
objetivando-se 8-12 min de duração do exercício6. Não
há preferência pela realização do exame em esteira
rolante ou em cicloergômetro. Apesar de já terem sido
propostos dois protocolos para esse perfil de
pacientes7,8, as Diretrizes da Sociedade Brasileira de
Cardiologia5 e da Sociedade Europeia de Cardiologia9
não indicam que estes sejam superiores aos protocolos
convencionais em ergometria.
Conceitos Básicos do Funcionamento dos
DCEI
Os DCEI são compostos basicamente de duas
estruturas10:
• Gerador: conjunto de circuitos eletrônicos e bateria,
envoltos em uma cápsula metálica, geralmente
posicionada no subcutâneo do tórax ou abdome do
paciente.
• Sistema de cabos-eletrodos: em número variável,
conforme a quantidade de câmaras estimuladas
(p. ex.: marca-passo unicameral, marca-passo
bicameral) e conforme a quantidade de locais
estimulados dentro de cada câmara (p. ex.:
ressincronizador multissítio).
As principais diferenças entre cada tipo de DCEI são
mostradas no Quadro 2.
Quadro 1
Aplicações do teste ergométrico em portadores de DCEI
Avaliação da capacidade funcional aeróbica
Investigação de arritmias (avaliação da terapêutica farmacológica)
Avaliação pré-participação desportiva
Avaliação de possíveis disfunções dos DCEI
Avaliação/programação dos sensores dos DCEI
DCEI=dispositivos cardíacos eletrônicos implantáveis
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Quadro2
Características dos dispositivos cardíacos eletrônicos implantáveis
Capacidade principal
Função principal
Marca-passo
Estimulação/Sensibilidade no átrio/ventrículo
Terapêutica da bradiarritmia
CDI
Cardioversão/Desfibrilação
Terapêutica de FV/TV
Ressincronizador cardíaco
Estimulação multissítio (biventricular)
Ressincronização ventricular
CDI + RC
Cardioversão/Desfibrilação + Estimulação
multissítio (biventricular)
Terapêutica de FV/TV +
Ressincronização ventricular +
Terapêutica da bradiarritmia
CDI=cardiodesfibrilador implantável; RC=ressincronizador cardíaco
Noções de Eletrocardiografia nos Portadores
de Marca-passo
O eletrocardiograma convencional de 12 derivações
em portadores de MP apresenta uma característica
peculiar que é a presença da espícula, artefato elétrico
originado pelo estímulo do marca-passo. Com a
evolução da tecnologia desses aparelhos, atualmente
é frequente que as espículas sejam de amplitude muito
reduzida, de maneira que identificá-las pode se
mostrar como um desafio, contudo é preservada a
morfologia típica do QRS (ver adiante). A ausência de
espícula acompanhada de ausência de morfologia
típica do QRS denota ou condução fisiológica dos
estímulos elétricos ou condições patológicas graves, como
fratura completa de eletrodo ou falência total do gerador.
Felizmente a diferença entre o normal e o patológico
nesse caso é habitualmente de fácil identificação.
Nos portadores de MP, a despolarização ventricular
é constituída por um complexo QRS geralmente
alargado (>120 ms) e sua morfologia e eixo elétrico
dependem da posição do eletrodo. Nos implantes em
ventrículo direito resulta em morfologia tipo bloqueio
de ramo esquerdo (a mais frequente) e nos implantes
em ventrículo esquerdo surge uma morfologia tipo
bloqueio de ramo direito.
A normatização para identificar os diferentes tipos de
marca-passos foi criada pela North American Society of
Pacing and Electrophysiology (NASPE) e pelo British
Pacing and Electrophysiology Group (BPEG)13,14. Assim,
esse consagrado código de letras sofreu algumas
modificações ao longo dos anos e atualmente é
utilizado da seguinte forma:
• Primeira letra: representa a câmara estimulada:
A (átrio), V (ventrículo), D (átrio e ventrículo) e
O (nenhuma).
• Segunda letra: identifica a câmara sentida: A, V,
D ou O.
• Terceira letra: indica a resposta do marca-passo à
detecção de um sinal natural: T (deflagração),
I (inibição), D (deflagração e inibição) e O (sem
resposta).
• Quarta letra: identifica as capacidades de
programação e de telemetria ou resposta de
frequência: P (programável), M (multiprogramável),
R (com resposta de frequência), C (telemetria) e
O (nenhuma).
• Quinta letra: identifica a presença ou não de
funções antitaquicardia: P (pacing), S (shock),
D (pacing + shock) e O (nenhuma).
Na maioria das vezes, o modo de funcionamento do MP
é identificado apenas pelas três primeiras letras. Os
modos mais frequentemente utilizados são os seguintes:
• AAI: marca-passo que sente o átrio, estimula
o átrio e se inibe em presença de uma onda
P espontânea (Figura 1);
• VVI: marca-passo que estimula o ventrículo, sente
o ventrículo e se inibe nessa eventualidade (em
presença de uma onda R) (Figura 1);
• DDD: marca-passo bicameral que estimula átrio
e ventrículo, sente átrio e ventrículo, deflagra em
ventrículo quando sente átrios e inibe o estímulo
nas duas câmaras quando sente o ventrículo,
sendo também chamado de marca-passo fisiológico
(Figura 1).
Alguns termos na área de estimulação cardíaca são
importantes e serão relembrados:
• Espícula: representação do estímulo elétrico
produzido pelo gerador do dispositivo. Pode
passar despercebida nos casos programados para
estimulação bipolar, pelo fato de ser de pequena
amplitude;
• Captura: despolarização tecidual cardíaca em
decorrência da estimulação artificial, surgindo
logo após uma espícula;
• Sensibilidade: capacidade de reconhecimento de
eventos cardíacos espontâneos (atriais ou
ventriculares);
• Frequência básica: frequência em que o marcapasso estimula o coração quando não há
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•
•
•
•
interferência de batimentos espontâneos e o
paciente está em repouso;
Limite máximo de frequência: frequência máxima
de estimulação. Pode ser alcançada através da
ativação dos sensores do marca-passo ou em
resposta à frequência atrial intrínseca;
Inibição normal: corresponde à ausência de
emissão da espícula quando o canal atrial ou
ventricular detecta um evento espontâneo;
Intervalo atrioventricular (IAV): intervalo entre
uma atividade atrial espontânea ou estimulada e
o estímulo ventricular;
Histerese: intervalo de tempo superior ao intervalo
gerado pela frequência básica programada, sendo
acionado pela presença de eventos espontâneos
do paciente. Esse parâmetro quando programado,
permite ao paciente ter frequências espontâneas
inferiores à frequência básica, desde que superiores
à frequência de histerese (Figura 1);
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Artigo de Revisão
• Período refratário atrial pós-evento ventricular
(PVARP): intervalo de tempo, contado no canal
atrial, em que o mesmo se torna refratário a
qualquer estímulo elétrico gerado após um
batimento ventricular (espontâneo ou estimulado).
Esse intervalo foi criado para impedir que ocorram
taquicardias mediadas pelo próprio marca-passo;
• Intervalo de pulso: intervalo de tempo em
milissegundos (ms) entre duas espículas
consecutivas da mesma câmara sendo
inversamente proporcional à frequência de
estimulação. Calcula-se dividindo 60 000 ms
(1 minuto) pela frequência programada;
• Intervalo de escape: intervalo entre um batimento
natural sentido e a próxima espícula. Normalmente
esse intervalo é igual ao intervalo de pulso, no
entanto é maior quando o sistema está programado
com histerese positiva (Figura 1);
Figura 1
Nomenclatura para a programação dos marca-passos
Acima à esquerda: modo VVI; em A sem histerese e em B com histerese. A=intervalo de estimulação; B=intervalo de
estimulação após evento sentido (intervalo de escape).
Abaixo à esquerda: modo AAI; sem histerese (A=B). No modo AAI, o marca-passo sente e estimula apenas o átrio.
Acima à direita: modo DDD, em 1C o MP sente átrio e estimula VD após o intervalo AV; em 1D o MP estimula o AD e se
inibe no VD por ter ocorrido condução pelas vias normais; Na parte 1F o MP estimula tanto AD como VD após intervalo
AV (não há ritmo espontâneo do paciente). Na parte 2 o MP segue o ritmo atrial, estimulando o VD em momento de BAVT,
mantendo o sincronismo AV. Em 3G, uma extrassístole atrial é sentida e seguida pelo MP e na parte 3H o MP interrompe
uma pausa pós-extrassistólica. Em seguida o MP sente e se inibe por uma extrassístole ventricular. Abaixo à direita: diferentes
formas de apresentação do ECG diante da presença do MP.
E=espícula do MP; * marca alguns batimentos espontâneos
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• Sensor: dispositivo incorporado ao marca-passo,
capaz de produzir variações na frequência de
estimulação de forma autônoma e de acordo com
a necessidade metabólica do paciente.
Teste Ergométrico no Portador de MP
Avaliação da capacidade funcional cardiovascular
A grande vantagem do teste de esforço sobre outros
exames complementares é a avaliação objetiva da
capacidade funcional aeróbica, importante fator
prognóstico para saúde global do indivíduo11,12.
- Monitorização eletrocardiográfica contínua sob
esforço
Como no TE existe monitoração eletrocardiográfica
contínua, é possível analisar detalhadamente a
resposta cronotrópica do indivíduo submetido a
esforço padronizado, complementando assim a
telemetria convencional e permitindo identificar, por
exemplo, falhas de sense, falhas de comando e arritmias
relacionadas ao MP. Nesse aspecto, o sistema Holter
é também grande aliado, com reconhecida contribuição
para complementar a avaliação convencional por
telemetria no consultório15.
- Avaliação pré-liberação para atividade física
Considerando-se o número crescente de indivíduos
jovens e funcionalmente ativos submetidos a implante
de MP, a análise antes de iniciar prática desportiva
mostra-se imperativa, haja vista que ser portador de
MP não é impedimento para muitas práticas
desportivas recreacionais.
- Investigação de isquemia miocárdica
Devido à alteração no ECG causada pelo MP, a
utilização do TE com propósito de investigação de
doença arterial coronariana é considerada classe III
pela Diretriz Brasileira e pela Diretriz Americana5,16,
exceto quando o TE é associado a métodos de imagem,
como a cintilografia miocárdica, por exemplo.
- Avaliação dos sensores do MP
Os sensores (ou biossensores) são dispositivos
acoplados ao sistema cabo-eletrodo-gerador que
possibilitam o aumento da frequência básica de
estimulação em resposta a estímulos físicos ou
fisiológicos 5. Quando ativados, estarão sempre
representados pela letra R na quarta posição do código
de letras. Atualmente, biossensores estão presentes
em todos os modelos de marca-passo, podendo ou
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não ser ativados quando é realizada a programação
do dispositivo.
Os biossensores mais usados ajustam a frequência do
estímulo conforme a detecção de movimentos ou
vibrações corpóreas. São compostos por um sistema
de cristal piezoelétrico extremamente sensível às
vibrações produzidas por movimentos verticais (para
cima e para baixo) ou à aceleração dos movimentos
horizontais (para frente e para trás). Além desses,
ainda existem sensores que se baseiam nas oscilações
do pH sanguíneo, temperatura venosa central,
ventilação-minuto e volume sanguíneo do ventrículo
direito, assim como também já foram desenvolvidos
MP que possuem mais de um tipo de sensor17.
- Sinais de disfunção dos marca-passos cardíacos
definitivos
Trata-se de um tema bastante complexo e amplo da
estimulação cardíaca, o qual não será abordado em
detalhes neste artigo. Alguns tópicos, entretanto, são
de extrema importância e devem ser reconhecidos na
sala de ergometria:
• Perda de captura ou de comando: consiste na
incapacidade de uma espícula de marca-passo,
sob condições eletrofisiológicas favoráveis,
provocar despolarização do átrio ou do ventrículo.
Pode ser causada por aumento do limiar de
estimulação, disfunção do cabo-eletrodo (fratura
ou deslocamento), disfunção do gerador ou
programação inadequada (energia insuficiente);
• Falhas de sensibilidade: podem ocorrer por
sensibilidade exagerada ou oversensing, e também
por sensibilidade diminuída ou undersensing. Ambas
podem ocorrer tanto nos canais atrial ou ventricular.
O oversensing é caracterizado pela sensibilidade
exagerada dos canais atrial ou ventricular (oversensing
atrial ou ventricular), de modo que na presença de
interferências magnéticas ou mesmo despolarizações
espontâneas do paciente ocorrerá reset do contador
de tempo, determinando intervalos de estimulação
superiores ao de escape (Figura 2). Outro mecanismo
específico de oversensing ocorre pela inadequada
sensibilidade da onda T de um batimento próprio
ou de uma captura ventricular, a qual é “vista” pelo
marca-passo como se fosse uma onda R, denominado
oversensing de T. O undersensing consiste na
incapacidade de reconhecimento de uma
despolarização espontânea (atrial ou ventricular), e
o que se observa no traçado são espículas deflagradas
em intervalos que não respeitam uma onda P ou R
(ou seja, atividades atrial ou ventricular não
“sentidas”) (Figura 2A).
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Figura 2
Disfunção do marca-passo (oversensing)
Em A: paciente portador de marca-passo apresenta inibições por miopotenciais (ruídos musculares), gerando pausas inapropriadas.
Em B: mesmo paciente, caminhando, cujo aumento da frequência sinusal é acompanhado por bloqueio AV imediatamente
corrigido pelo marca-passo.
Figura 2A
Disfunção do marca-passo (undersensing)
Falha total de sensibilidade de um marca-passo ventricular
(undersensing). A estimulação sobre o período vulnerável do
ventrículo (sobre a onda T) promove o aparecimento de
arritmia ventricular grave.
• Taquicardia induzida pelo marca-passo: são
alterações da sensibilidade ou interferências
eletromagnéticas induzindo arritmias.
Frequentemente ocorre pela detecção de
interferências pelo canal atrial os quais são
seguidos pelo canal ventricular determinando
aumento inadequado da frequência de estimulação.
Esse fenômeno é também chamado de deflagrações
222
sincrônicas, por estarem sincronizadas com a
interferência atrial;
• Taquicardia mediada pelo marca-passo:
taquicardia restrita aos sistemas de estimulação
atrioventricular caracterizada pela deflagração
ventricular a partir de uma onda P retrógrada.
Trata-se, portanto, de uma arritmia por movimento
circular em que o marca-passo faz o papel de
componente anterógrado do circuito e cuja alça
retrógrada é fisiológica (sistema de condução). O
marca-passo se comporta como se fosse um feixe
anômalo e a taquicardia pode ser resolvida por
programação alterando-se o PVARP. Pode ocorrer
mesmo em pacientes com bloqueio AV total,
desde que apresente condução ventrículo-atrial.
- Sinais que mimetizam disfunções do MP
Existem algumas situações que, se não forem conhecidas,
podem ser interpretadas erroneamente como sinais de
disfunção do MP. Tratam-se, simplesmente, de
programações normais do dispositivo e algumas podem
ser observadas com relativa frequência:
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• Bloqueio AV eletrônico: mecanismo presente na
programação dos marca-passos que, ao atingir o
limite máximo de frequência, o dispositivo
automaticamente bloqueia a passagem de alguns
estímulos supraventriculares. Pode ocorrer numa
periodicidade do tipo 2:1, ou simulando um
bloqueio AV tipo Wenckebach, rotineiramente
chamado de “Wenckebach eletrônico”. Na
programação de fábrica, esse mecanismo será
ativado quando a frequência supraventricular
estiver entre 120-130 pulsos/min;
• Regularizador de frequência cardíaca (ou rate
smoothing): função programável, presente em apenas
alguns modelos de marca-passos. Tem por objetivo
evitar variações súbitas do intervalo de estimulação
como consequência de arritmias paroxísticas atriais
e/ou ventriculares. Quando acionado, pode fazer
com que o marca-passo não acompanhe uma
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extrassístole supraventricular simulando falha de
sensibilidade atrial, por exemplo;
• Mudança automática de modo de estimulação (ou
automatic mode switching - AMS): algoritmo que tem
por objetivo a proteção contra as elevações bruscas
da frequência cardíaca consequente às taquiarritmias
supraventriculares paroxísticas (Figura 3). Promove,
após a detecção da arritmia, a mudança automática
de um modo de estimulação sincronizado à onda
P para um modo não sincronizado (por exemplo,
DDD para VVI ou para DDI). Mesmo que o paciente
tenha boa resposta cronotrópica em ritmo sinusal,
essa programação deve incluir o sensor (VVIR ou
DDIR) evitando que, durante o esforço e devido a
uma arritmia atrial nesse momento, ocorra uma
queda abrupta da frequência de estimulação devido
à mudança automática de modo;
Figura 3
Diferentes apresentações da estimulação cardíaca no ECG
Acima, ritmo próprio do paciente e MP totalmente inibido. No segundo traçado observa-se a pseudofusão. As setas mostram
as espículas do MP, porém, elas não deformam a morfologia do QRS. No terceiro traçado, ocorre uma “fusão” entre o batimento
espontâneo e o QRS estimulado. No quarto traçado (inferior) o marca-passo promove uma captura completa, gerando um
QRS totalmente alargado. Todos os traçados são do mesmo paciente e todos são na derivação D2.
• Fusão e pseudofusão: fusão é a ativação artificial
do tecido cardíaco simultânea à espontânea e que
provoca complexos híbridos (Figura 4), ou seja,
no caso de eventos ventriculares, uma espícula é
acompanhada por um QRS cujas características
morfológicas são intermediárias entre as do QRS
capturado e as do espontâneo. No caso da
pseudofusão, ocorre a ativação espontânea do
miocárdio de modo simultâneo à emissão da
espícula, gerando um QRS ou onda P idênticos
aos batimentos espontâneos. Esses fenômenos,
apesar de não representarem disfunções do
marca-passo, devem ser identificados e notificados
no laudo do exame para que, sempre que possível,
sejam corrigidos no ambulatório de marca-passo;
• Taquicardia conduzida pelo marca-passo:
caracterizada pela presença de uma taquiarritmia
supraventricular espontânea que, sentida pelo canal
atrial, deflagra capturas ventriculares em
frequências elevadas. Há vários algoritmos para
evitar que o marca-passo acompanhe essas arritmias
atriais, sendo que o médico que programa o
dispositivo deve ativá-los de acordo com o perfil
clínico de cada paciente. Essa condição deve sempre
ser observada durante o teste ergométrico e descrita
no laudo para eventuais correções na programação.
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Figura 4
Traçado de Holter mostrando a mudança automática de modo (AMS)
Observe que o paciente está em ritmo sinusal e subitamente ocorre uma extrassístole supraventricular (seta preta) iniciando
fibrilação atrial. O marca-passo detecta imediatamente a arritmia supraventricular e deixa de seguir a atividade atrial, sem
alterar a frequência ventricular. O paciente permaneceu assintomático durante esse episódio.
Teste Ergométrico no Portador de CDI
Além das várias funções já descritas anteriormente, o
TE destaca-se por proporcionar avaliação da eficácia
da terapia farmacológica antiarrítmica, presente na
imensa maioria desses pacientes.
Alguns estudos já foram publicados abordando a
questão da segurança da realização de TE em
portadores de CDI18-20. A maior parte deles revela a
mesma metodologia utilizada no Instituto Dante
Pazzanese de Cardiologia: interromper o exercício
quando for alcançada FC correspondente a
10 batimentos menor que a VT1, mesmo que o
paciente não tenha atingido a exaustão ou outros
critérios de interrupção do exame. VT1 é a primeira
zona de diagnóstico do CDI e faz menção ao termo
taquicardia ventricular 1, contudo, habitualmente
nessa faixa de FC determinada pelo programador
ocorre apenas “observação” do CDI em relação ao
ritmo apresentado pelo paciente e não terapia
elétrica propriamente dita.
Considera-se ainda importante na realização de TE
nesses pacientes o uso de luvas de material isolante
(p. ex. látex) durante todo o exame, evitando ser
atingido por eventuais terapias elétricas e ter
disponível um ímã na sala de exame, caso ocorram
terapias inapropriadas do CDI. Nesse caso o ímã deve
224
ser de tamanho semelhante ao tamanho do CDI e com
boa capacidade magnética, já que os CDI geralmente
são implantados no plano submuscular, ficando mais
profundos que os MP e, portanto, menos sensíveis aos
ímãs colocados sobre a pele.
Antes de realizar TE em portador de CDI, é fundamental
ter conhecimento das zonas de FC determinadas pelo
cardiologista que programou o dispositivo para que
o exame transcorra de maneira segura. Se a proposta
do TE é atingir níveis de FC mais elevada (acima de
VT1) é necessária a presença do cardiologista assistente
responsável pela programação do dispositivo na sala
de exame.
- Conduta no caso da ocorrência de terapia durante
o TE: Caso o ergometrista presencie uma terapia
inadvertida durante a realização do TE em portador
de CDI, o médico deverá interromper imediatamente
o exame, posicionar o paciente deitado e atuar
conforme protocolos de cuidados específicos, como o
ACLS ou TECA. Caso sejam terapias elétricas
inapropriadas, o médico deverá colocar o ímã sobre o
CDI durante cerca de 1 minuto. Nessa condição o CDI
interrompe as terapias e passa a se comportar como um
marca-passo convencional. Se houver dúvida se as
terapias são apropriadas ou não, indica-se não usar o
ímã. Se ocorrer terapia elétrica durante o TE, é importante
solicitar telemetria do dispositivo em caráter de urgência.
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Teste Ergométrico no Portador de RC
O TE nos portadores de RC tem sua grande importância
na avaliação da capacidade funcional aeróbica desses
pacientes, haja vista o perfil clínico dos pacientes que
utilizam esse dispositivo, praticamente na totalidade
portadores de insuficiência cardíaca crônica com
sintomas exuberantes.
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Apesar de existir reduzido número de estudos sobre
este tema na literatura, acredita-se também ser segura
a realização do TE, desde que respeitadas as normas
de segurança anteriormente descritas.
A morfologia do QRS merece atenção especial durante
o exercício, pois o exame permite identificar sérios
eventos nesses pacientes (Figuras 5 e 6).
A
B
Figura 5
Mudança de morfologia do QRS durante o TE
Em A: taquicardia sinusal em portador de MP com BAVT durante teste ergométrico. A frequência sinusal ultrapassa a
frequência máxima do MP ocorrendo bloqueio AV de grau variável do tipo Wenckenbach. O ritmo ventricular se torna
discretamente irregular, mas a frequência não ultrapassa o limite imposto pela programação do MP.
Em B: traçado durante teste ergométrico em portador de ressincronizador ocorrendo perda de comando de um dos eletrodos
de forma intermitente no esforço.
A
B
Figura 6
Terapia elétrica apropriada pelo CDI durante TE
Em A: exemplo de paciente portador de miocardiopatia dilatada com marca-passo + CDI e ressincronização durante o teste
ergoespirométrico para prescrição do treinamento físico, onde o dispositivo eletrônico assume o comando durante o esforço
(observe a mudança de morfologia do QRS com o aumento da frequência cardíaca).
Em B: registro da telemetria do dispositivo do mesmo paciente flagrando uma taquicardia ventricular sendo revertida com
sucesso e de forma automática pelo aparelho com um único choque sincronizado de 22 Joules.
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Teste Ergométrico X Teste Cardiopulmonar
(TCP)
O teste cardiopulmonar (TCP) acrescenta análise das
trocas gasosas (O2 e CO2) e a medida do volume de ar
utilizado pelo paciente durante o exercício, permitindo
maior precisão na avaliação da capacidade funcional
aeróbica do indivíduo portador de DCEI. Contudo, o
número reduzido de publicações comparando TE x TCP
para essa população específica assim como o custo
menor do TE faz deste o método atualmente mais
utilizado quando se tenta avaliar o paciente portador
de DCEI sob esforço induzido.
Hossri et al.
Teste Ergométrico em Portadores de DCEI
Artigo de Revisão
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7.
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9.
Potencial Conflito de Interesses
Declaro não haver conflitos de interesses pertinentes.
Fontes de Financiamento
O presente estudo não teve fontes de financiamento externas.
Vinculação Acadêmica
O presente estudo não está vinculado a qualquer programa
de pós-graduação.
10.
11.
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