PROCURADORIA GERAL DO ESTADO Procuradoria Judicial – PJ-4 EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR PRESIDENTE DO EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO Embargos de Declaração em Apelação Cível nº 990.10.246958-1/50000 Sala 315 A FAZENDA DO ESTADO DE SÃO PAULO, por seu procurador, nos autos da APELAÇÃO CÍVEL em epígrafe, onde figura como ré, sendo autores EDMEA DE AGOSTINI E OUTROS, vem, respeitosamente, perante Vossa Excelência, não se conformando, "data venia", com o v. acórdão de fls., interpor RECURSO ESPECIAL, para o Col. Superior Tribunal de Justiça, com fulcro no artigo 105, inciso III, alíneas "a" e "c" da Constituição Federal, por infringência ao artigo 1º-F da Lei nº 9.494/97, com redação dada pela Lei nº 11.960/09, além de interpretação divergente no tocante ao critério temporal para aplicação de regra sobre juros moratórios adotado de pelo Egrégio Superior Tribunal de Justiça, tudo nos termos das razões em anexo, cuja juntada se requer, bem como o regular processamento do recurso e oportuno envio ao Tribunal "ad quem". O subscritor declara a autenticidade da cópia do acórdão paradigma, ora anexada, obtidas nas páginas eletrônicas do Superior Tribunal de Justiça [www.stj.jus.br]. São Paulo, 30 de maio de 2017 CARLOS JOSÉ TEIXEIRA DE TOLEDO Procurador do Estado OAB/SP nº 114.625 PROCURADORIA GERAL DO ESTADO Procuradoria Judicial – PJ-4 Recorrente: FAZENDA DO ESTADO DE SÃO PAULO Recorridos: EDMEA DE AGOSTINI E OUTROS RAZÕES DE RECURSO ESPECIAL Colendo Superior Tribunal de Justiça, Trata-se de demanda de servidores públicos visando critério mais favorável no tocante ao cômputo de parcela remuneratória. A Instância a quo entendeu por bem condenar a Fazenda a pagar diferenças aos autores. O assunto que nos faz trazer a questão ao crivo desta E. Corte é o dispositivo do v. acórdão recorrido que determinou a aplicação do percentual de juros de 6% ao ano e rejeitou a aplicação do novo critério inaugurado pela Lei 11.960/09, que alterou a regra de acréscimos pecuniários (atualização e juros) nas condenações da Fazenda Pública. DO CABIMENTO DO RECURSO A análise do processo revela que o caso preenche todos os pressupostos para conhecimento do recurso especial. Trata-se da negativa de aplicação de lei federal – no caso, o artigo 1º-F da Lei nº 9.494/97, com redação dada pela Lei nº 11.960/09 – cumulado com a interpretação divergente em relação a orientação dada pelo Órgão Especial desta E. Corte ao julgar o REsp 1.111.117 (Recurso Repetitivo). Ademais, a matéria foi objeto de expresso prequestionamento pela Fazenda Estadual, em seus embargos declaratórios, sendo que o acórdão então proferido expressamente afastou a aplicação da norma invocada, conforme se vê do seguinte trecho: PROCURADORIA GERAL DO ESTADO Procuradoria Judicial – PJ-4 “a presente demanda foi ajuizada em 29 de agosto de 2008, antes das novas regras impostas pela Lei n° 11.960, de 29 de junho de 2009, sendo certo que as suas disposições somente incidem nas demandas promovidas após a sua edição, e não naquelas já em trâmite”. DAS RAZÕES DE REFORMA DO JULGADO PELA LETRA "A" DO INCISO III DO ARTIGO 105 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. DECISÃO "ULTRA PETITA" - VIOLAÇÃO ARTIGO 1º-F DA LEI Nº 9.494/97, COM REDAÇÃO DADA PELA LEI Nº 11.960/09. Ao afastar a aplicação da regra contida no artigo 1º-F da Lei nº 9.494/97, com redação dada pela Lei nº 11.960/09, o Tribunal de origem acabou por negar vigência ao aludido dispositivo legal, cuja redação é a seguinte: Art. 1º-F. Nas condenações impostas à Fazenda Pública, independentemente de sua natureza e para fins de atualização monetária, remuneração do capital e compensação da mora, haverá a incidência uma única vez, até o efetivo pagamento, dos índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança. Com efeito, tratando-se de condenação de ente público, o v. acórdão deveria ter assentado que, a partir de 30/06/2009, data da publicação da Lei nº 11.960, sobre o débito da recorrente incidem os índices e critérios nela definidos, passando a ser aplicada, para fins de atualização monetária, a Taxa Referencial (TR), e, para fins de remuneração do capital e compensação da mora, o percentual único de juros iguais aos de remuneração da poupança, atualmente equivalentes a 0,5% ao mês, nos termos da Lei nº 8.177/91. Como se vê, a nova regra disciplina aspectos acessórios (juros de mora e atualização monetária) e de trato sucessivo, que se protraem no tempo e se renovam constantemente, de modo que nada impede que o legislador altere o critério de apuração dos juros e da correção monetária, para aplicação imediata. A propósito do tema, a PROCURADORIA GERAL DO ESTADO Procuradoria Judicial – PJ-4 impecável lição de Carlos Maximiliano (Direito intertemporal ou teoria da retroatividade das leis, Freitas Bastos, 1946, pp. 206 e ss. – g.n.): Os juros legais, processuais ou delituais, são diariamente produzidos de novo; por isto, vigora a taxa nova, a partir do dia da lei nova. Se houve condenação anterior à vigência dos derradeiros postulados, cumpre-se de acordo com o Direito Positivo do tempo do veredictum, embora norma ulterior reduza o montante dos juros e ainda que o julgado não os fixe diretamente, se limite, por exemplo, a impor o pagamento dos juros legais. Em verdade, haveria retroatividade, se aplicassem disposições de qualquer espécie a algum caso já soberanamente julgado sob o império de norma pretérita. Tal entendimento decorre do fato de que o direito a juros moratórios não surge com o ajuizamento da ação ou com a condenação judicial, de modo que a definição legal do percentual aplicável deve observar o princípio de direito intertemporal segundo o qual tempus regit actum. Bem a propósito, para bem ilustrar a questão, a irretocável conclusão do Ministro Luiz Fux, colhida no acórdão proferido no Recurso Especial nº 1.109.303 (j. em 04/06/2009, DJe de 05/08/2009 – g.n.): Deveras, é cediço na Corte que o fato gerador do direito a juros moratórios não é o ajuizamento da ação, tampouco a condenação judicial, mas, sim, o inadimplemento da obrigação. Desta feita, tratando-se de fato gerador que se protrai no tempo, a definição legal dos juros de mora deve observância ao princípio do direito intertemporal segundo o qual tempus regit actum. Consectariamente, aplica-se à mora relativa ao período anterior à vigência do novo Código Civil as disposições insertas no revogado Código Civil PROCURADORIA GERAL DO ESTADO Procuradoria Judicial – PJ-4 de 1916, regendo-se o período posterior pelo diploma civil superveniente Tanto assim é que, destinando-se os juros de mora a reparar o dano causado pelo não cumprimento da dívida de dinheiro (cf. artigo 1.061 do Código Civil dos Estados Unidos do Brasil comentado por Clóvis Beviláqua, Editora Rio, 1976, p. 178), se o direito a percebê-los surgisse do ajuizamento da ação ou da condenação, não se admitiria, no direito brasileiro, a existência de pelo menos quatro termos iniciais distintos para sua incidência: Conforme prescreve o art. 15-B do Decreto-lei 3.365/41, introduzido pela Medida Provisória 1.997-34, de 13.01.2000, o termo inicial dos juros moratórios em desapropriações é o dia “1º de janeiro do exercício seguinte àquele em que o pagamento deveria ser feito, nos termos do art. 100 da Constituição”. É o que está assentado na jurisprudência da 1ª Seção do STJ, em orientação compatível com a firmada pelo STF, inclusive por súmula vinculante (Enunciado 17). Recurso Especial nº 1.118.103 (j. em 24/02/2010, DJe de 08/03/2010 – g.n.) Os juros de mora na indenização do seguro DPVAT fluem a partir da citação. Súmula 426 Os juros moratórios, na repetição do indébito tributário, são devidos a partir do trânsito em julgado da sentença. Súmula 188 Os juros moratórios, na desapropriação direta ou indireta, contam-se desde o trânsito em julgado da sentença. Súmula 70 PROCURADORIA GERAL DO ESTADO Procuradoria Judicial – PJ-4 Os juros moratórios fluem a partir do evento danoso, em caso de responsabilidade extracontratual. Súmula 54 Lembre-se, ademais, que de acordo com o artigo 6º da Lei de Introdução ao Código Civil, a lei em vigor terá efeito imediato e geral, respeitados o ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada. Não se tratando, nestes autos, de nenhuma destas hipóteses, não há óbice à aplicação imediata da Lei nº 11.960/2009, aos processos ajuizados antes de sua vigência. Com apoio no preciso conceito de José Eduardo Martins Cardozo (Da retroatividade da lei, RT, p. 332), para quem norma retroativa é toda norma legal que valorativamente invade e altera o período de tempo anterior ao início da sua própria vigência, seja por descrever na sua hipótese, isoladamente ou não, elemento fático realizado no passado, seja por definir preceito que implique modificação jurídica da realidade pretérita, é perfeitamente lícito concluir que nem de aplicação retroativa da Lei nº 11.960/2009 se pode cogitar, pois, o que busca a recorrente, não é a aplicação da nova redação do artigo 1º-F ao período anterior à vigência da lei, mas, justamente, a aplicação da nova redação somente a partir da vigência da lei, preservando-se a aplicação da lei pretérita, no período anterior. O que se busca evitar, ao contrário, é a ULTRATIVIDADE DE LEI REVOGADA o que acabou por ser a solução erroneamente adotada pela Corte a quo, com a devida vênia aos seus I. Prolatores. Deste modo, requer-se de Vossas Excelências o provimento do presente recurso, para determinar-se que, a partir de 30/06/2009, o débito da recorrente deve ser atualizado e acrescido de juros de acordo com a nova redação dada ao artigo 1º-F da Lei nº 9.494/97 pela Lei nº 11.960/2009. PROCURADORIA GERAL DO ESTADO Procuradoria Judicial – PJ-4 DAS RAZÕES DE REFORMA DO JULGADO PELA LETRA "C" DO INCISO III DO ART. 105 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL Demonstrou-se, no capítulo antecedente, que o v. acórdão recorrido acabou por violar o disposto no artigo 1º-F da Lei nº 9.494/97, com redação dada pela Lei nº 11.960/2009. Cabe observar também que a solução dada pela Corte a quo se afasta inteiramente do critério adotado de forma uniforme por este E. Tribunal Superior, no que tange ao tema de fundo dessa discussão, qual seja: - Qual o critério correto para aplicação dos juros no tempo nas demandas ajuizadas antes da alteração da norma regente? Essa pergunta resume a tormentosa questão que é debatida em nossos Tribunais há algum tempo, em vista da febre legislativa dos tempos atuais em que as normas que regem a aplicação de juros acabam por serem modificadas – às vezes mais de uma vez – no curso de uma demanda. Felizmente, a matéria foi pacificada por esta C. Corte, de forma magistral, no julgamento do Recurso Especial nº 1.111.117, no qual ficou consignado que até mesmo a sentença transitada em julgado deve sofrer a aplicação da lei nova, por ocasião da execução do título (j. em 02/06/2010, DJe de 02/09/2010 – g.n.): EXECUÇÃO DE SENTENÇA. TAXA DE JUROS. NOVO CÓDIGO CIVIL. VIOLAÇÃO À COISA JULGADA. INEXISTÊNCIA. ART. 406 DO NOVO CÓDIGO CIVIL. TAXA SELIC. 1. Não há violação à coisa julgada e à norma do art. 406 do novo Código Civil, quando o título judicial exequendo, exarado em momento anterior ao CC/2002, fixa os juros de mora em 0,5% ao mês e, na execução do julgado, determina-se a incidência de juros previstos nos termos da lei nova. 2. Atualmente, a taxa dos juros moratórios a que se refere o referido dispositivo [art. 406 do CC/2002] é a taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e PROCURADORIA GERAL DO ESTADO Procuradoria Judicial – PJ-4 Custódia - SELIC, por ser ela a que incide como juros moratórios dos tributos federais (arts. 13 da Lei 9.065/95, 84 da Lei 8.981/95, 39, § 4º, da Lei 9.250/95, 61, § 3º, da Lei 9.430/96 e 30 da Lei 10.522/02’ (EREsp 727.842, DJ de 20/11/08) (REsp 1.102.552/CE, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, sujeito ao regime do art. 543-C do CPC, pendente de publicação). Todavia, não houve recurso da parte interessada para prevalecer tal entendimento. 3. Recurso Especial não provido. Ressalte-se que tal recurso foi alçado à Corte Especial deste Superior Tribunal de Justiça e julgado sob o regime do art. 543-C do Código de Processo Civil. Ou seja, com ele ocorreu a uniformização da jurisprudência no STJ acerca da questão nele discutida – o regime temporal de aplicação de juros às demandas em curso e até àquelas já transitadas em julgado. Façamos o cotejo com a solução adotada na decisão recorrida (acórdão dos embargos declaratórios): PROCURADORIA GERAL DO ESTADO Procuradoria Judicial – PJ-4 Fazendo a demonstração analítica da divergência, fica evidente a discrepância em relação à orientação desta E. Corte Superior: Questão de fundo comum aos acórdãos: como deve ser aplicada lei que altera o critério de juros na condenação, em relação a demandas propostas anteriormente ao advento da nova norma: Acórdão paradigma: “A pretensão de recebimento de juros moratórios renova-se mês a mês, tendo em vista que se trata de efeitos futuros continuados de ato pretérito (coisa julgada). Trata-se de um corolário do princípio da aplicação geral e imediata das leis, conforme o art. 6º da Lei de Introdução ao Código Civil. Na verdade, seria inadmissível a aplicação ultra-ativa do Código Civil revogado. Ora, os juros de mora representam uma remuneração devida em razão do atraso no cumprimento de uma obrigação. Assim, não caracteriza violação à coisa julgada o entendimento firmado pelo Tribunal de origem no sentido de que é possível a fixação, em execução de sentença, do percentual previsto no novo Código Civil, alterando, desse modo, especificamente, o percentual de 6% ao ano determinado pela sentença transitada em julgado e proferida quando vigente o Código Civil de 1916” (Voto Condutor – Min. Mauro Campbell Marques). “Sr. Presidente, estamos diante de uma sentença que, no que diz respeito a juros de mora, trata de uma relação jurídica que tem efeitos futuros. Toda questão, assim, está em saber qual é a eficácia temporal futura dessa sentença. Temos decidido, não só em casos de juros, mas em casos de correção monetária, que todas as sentenças têm embutida uma cláusula rebus sic stantibus, ou seja, a sentença tem eficácia futura desde que mantida a situação de fato e de direito na época em que ela foi proferida. Quando o juiz fixou os juros de mora na taxa legal, que no caso era de 6% (seis por cento) ao ano, ele certamente considerou a lei vigente na data da sentença. Isso não significa que, se ele tivesse julgado em outra época, não tivesse aplicado juros de mora do Código Civil” (Voto do Min. Teori Albino Zavascki, acompanhando voto condutor) PROCURADORIA GERAL DO ESTADO Procuradoria Judicial – PJ-4 Acórdão recorrido: “Ainda que tivesse sido objeto de insurgência, não haveria qualquer modificação na r.sentença. Isso porque, a presente demanda foi ajuizada em 29 de agosto de 2008, antes das novas regras impostas pela Lei n° 11.960, de 29 de junho de 2009, sendo certo que as suas disposições somente incidem nas demandas promovidas após a sua edição, e não naquelas já em trâmite”. Embora muito sucinto o acórdão recorrido, no que tange à questão objeto deste recurso, fica evidenciada a divergência de critérios em relação à atual jurisprudência pacificada do Superior Tribunal de Justiça. Resumindo a divergência: O STJ entende que a nova norma de juros se aplica no período posterior à sua vigência, mesmo em relação às demandas já ajuizadas ou mesmo transitadas em julgado. A Instância a quo, no acórdão recorrido entende que a nova norma de juros NÃO SE APLICA às demandas já ajuizadas. Evidenciada a discrepância de orientações, impõe-se a acolhida deste recurso, também pela alínea “c”, com conseqüente reforma do aresto recorrido. Diante do exposto, requer o Estado de São Paulo seja dado provimento ao presente recurso especial, para que seja reformado o v. acórdão recorrido, de forma a adequá-lo ao critério de cômputo de juros constante do artigo 1º-F da Lei nº 9.494/97, com redação dada pela Lei nº 11.960/09, aplicando-se destarte a orientação deste E. Tribunal Superior, no que tange à aplicação imediata da nova norma sobre juros às demandas em curso. São Paulo, 30 de maio de 2017 CARLOS JOSÉ TEIXEIRA DE TOLEDO Procurador do Estado OAB/SP nº 114.625