mulheres e suas questões na ciência – i biografias

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BIOGRAFIAS
MULHERES E SUAS QUESTÕES NA CIÊNCIA – I
M.M. Rebouças1, S. D’Agostini1, M.M. Braggio2,
N. Vitiello1, I.C. Simoni2, I. Koseki2, M.C.V. Bilynskyj2
Instituto Biológico, Centro de Comunicação e Transferência do Conhecimento, Museu/Centro
de Memória, Av. Cons. Rodrigues Alves, 1252, CEP 04014-002, São Paulo, SP, Brasil. E-mail:
[email protected]
2
Instituto Biológico, Centro de Pesquisa e Desenvolvimento de Sanidade Animal, São Paulo,
SP, Brasil.
1
“Toc toc... lá vêm elas com seus saltos,
a marcarem suas presenças nos corredores do IB.
Um piso de lei, na madeira, recebe seus sulcos eternos.
Elas são inteligentes e demonstram isso a todo o momento,
não deixando para trás, um minuto de perseverança e otimismo,
sendo elas, o contraponto de seus ideais.
Estavam mudas em um passado distante.
Aos poucos, em um passado mais próximo, foram se chegando,
e, em um presente constante, mostram-se cada vez mais potentes.
São elas, as mulheres de ontem, de hoje, e de um futuro que é amanhã.”
Márcia Maria Rebouças
RESUMO
As muitas mulheres que vivenciaram e vivenciam a ciência fazem parte de
um complexo, cujas ações lhes dão a essência do descobrir valores em todos
os momentos em que, sobre uma bancada e seus apetrechos, descobrem
um mundo sempre novo. A partir daí, são elas as detentoras de razões das
mais diversas.
PALAVRAS-CHAVE: Mulheres, ciência, biografia, pesquisa.
ABSTRACT
WOMEN AND THEIR ISSUES IN SACIENCE – I. The many women who experienced and experience science are part of a complex whose actions give
them the essence of discovering values at all times when on a bench and its
accoutrements, always discover a new world. From there, they are the holders of the most diverse reasons.
KEY WORDS: Women, science, biography, research.
O Instituto Biológico, em seu espaço de tempo, demonstrou que muitas mulheres deram,
para o desenvolver da ciência, várias pesquisas que, até os dias de hoje, permanecem em
cadeias do desenvolvimento científico nas mais variadas áreas do conhecimento.
Assim, no presente trabalho, apresentamos algumas daquelas que deixaram seus vincos
em laboratórios e em publicações, demonstrando a que vieram. Um resumo biográfico é apresentado neste primeiro momento. São elas: Ada Rogato, Ailema Backx Noronha, Ignez Kosek,
Josete Garcia Bersano, Magali D’Angelo, Mara Mercedes de Andrea, Maria Pereira de Castro,
Marilda Meirelles de Oliveira, Sylvia Oliveira Andrade de Ornellas, Veridiana Victória Rossetti
e Zuleide Alves Ramiro.
Páginas do Inst. Biol., São Paulo, v.9, n.2, p.34-57, jan./jun., 2013
ADA ROGATO
Ada Leda Rogato era o nome que utilizou desde sua entrada no Instituto Biológico, no
ano de 1940. Mais tarde, em 1954, solicitou que retirassem Leda, por não constar em sua
certidão de nascimento e passou a não utilizá-lo mais em suas assinaturas. Ada Rogato,
nascida em 22 de dezembro de 1920, em São Paulo, foi admitida em 9 de janeiro de 1940,
como datilógrafa, a título precário, substituindo a 1ª escriturária do IB, que havia solicitado
licença-prêmio por 6 meses. Sua efetivação ocorreu em dezembro desse mesmo ano. Contava
ela, então, com 29 anos e escolhera ser solteira. Em 1941, solicitou licença para participar
da “Semana da Asa” e, no ano seguinte, matriculou-se na Escola Livre da Sociedade de
Pilotagem de São Paulo. Foi, também, aluna do curso de Biblioteconomia. Ada foi aviadora
e paraquedista, a primeira paraquedista sul-americana e, também, ministrava cursos para
esse fim. Assim foi por três meses, quando foi afastada da Escola Técnica de Aviação do
Ministério da Aeronáutica.
De volta ao Instituto Biológico, assumiu suas funções no Serviço de Vendas, embora fosse
funcionária da Seção de Vigilância Sanitária Animal.
Como prestadora de serviço no IB, sendo pilota, executava serviços experimentais de combate
à broca do café. Em 11 de fevereiro de 1948, Ada sofreu um acidente na propriedade Agrícola
Chantebled, pertencente à Companhia Cafeeira do Rio Feio, em Cafelândia, SP, quando executava serviço de polvilhamento com o BHC (benzeno hexaclorado), da marca Gammexane.
Sobre o momentoso assunto, assim se manifestou o Jornal “Correio Paulistano”: “Foi, como
se recorda, nos dias de carnaval. Uma funcionária do Instituto Biológico, que por várias vezes
se impusera como pioneira em diversos setores da aviação, desejou mais uma vez acentuar
a sua vocação de pioneirismo, e ser o primeiro aviador brasileiro a empregar as excelências
da aviação a serviço da agricultura. Uma pequenina deficiência técnica - de fácil correção
aliás - ocasionou o acidente. E a aviadora deu entrada no hospital, onde, menos de um mês
depois, nas vésperas de sua alta, recebeu a reportagem para fornecer apontamentos das suas
observações”. O mesmo Jornal publicou, ainda, no dia 10 de março de 1948, em nova entrevista com Ada, a seguinte manchete: “A aviação na lavoura: Só o avião poderá dar combate
rápido e eficiente à broca do café. A acrobacia aérea foi transformada na mais terrível arma
contra os parasitas agrícolas – não há broca que resista a duas pulverizações com intervalo de
10 dias”.
Após sua recuperação, Ada utilizou, pela primeira vez, a aeronave “Paulistinha”, denominada “Gafanhoto” por Henrique da Rocha Lima, diretor do Instituto Biológico à época. Esse
avião fora doado por “Baby” Pignatari ao Instituto Biológico, a pedido de Carlos Alves Seixas,
pesquisador do IB, a fim de retomar as experiências de polvilhamento para combate aéreo
à broca do café, que foram iniciados por Ada. Brevetada há 12 anos, colaborava com Carlos
Alves Seixas no controle da broca do café. Foi a primeira mulher a obter brevê na América do
Sul, isso em 1935.
Em 1950, a pedido do Major Brigadeiro do Ar, Armando de Mello Araribóia, Ada afastou-se
do IB por dois anos. Nessa época, o Secretário da Agricultura era Antonio de Oliveira.
Em 1951, Ada realizou um voo em torno das três Américas, percorrendo 38.398 km por
236 horas, visitando 17 países.
Participou de uma prova de paraquedismo noturno e pilotou um avião Cessna por todo o
continente americano, avião esse, de sua propriedade.
Foi campeã paulista de paraquedismo e executou 105 saltos. Ainda, como aviadora, percorreu ao redor de 5.000 horas de voo e foi a primeira mulher a solar em planador, no Brasil.
Em 1956, viajou, pelo Governo do Estado de São Paulo, para todas as capitais do Brasil,
passando pela floresta amazônica, sem rádio, em um avião de pequeno porte.
Páginas do Inst. Biol., São Paulo, v.9, n.2, p.34-57, jan./jun., 2013
Ada Rogato, em diversas feiras agrícolas no Estado de São Paulo, saltava de aviões e helicópteros, executando saltos ornamentais.
Teve, como homenagem, o nome de uma cachaça: “Voadora”. Em São Paulo, na Lapa, uma
praça ostenta o seu nome e, em Ribeirão Preto, há a Rua Ada Rogato, no Loteamento Cândido
Portinari.
No ano de 2000, os Correios lançaram um carimbo postal e um selo comemorativo dos 50
anos do sobrevoo dos Andes por Ada, com o CAP-4 de 65HP PP-DBL, Brasileirinho, sob o tema
“Mulheres Aviadoras”. O carimbo postal apresenta os seguintes dizeres: Homenagem às Mulheres
Aviadoras Pioneiras da Aviação no Brasil – 1º dia de circulação: São Paulo – SP – 8.2.2000.
Ada recebeu vários títulos, como a Comenda Nacional de Mérito Aeronáutico, grau de cavalheiro (primeira mulher); Comenda Asas da Força Aérea Brasileira e o título da FAB de Piloto
Honoris Causa; condecoração Condor dos Andes, em 1952, em La Paz, quando pilotou seu
avião “Brasil”, indo sozinha para La Paz, a 4.071 m de altura. Recebeu, também, a condecoração das Asas da Força Aérea Boliviana. Dirigiu por algum tempo o Museu da Aeronáutica de
São Paulo na Oca, no parque do Ibirapuera.
Sempre modesta, deixou para trás todo o seu arquivo de condecorações.
Assim se expressou Ruy Flemming, piloto desde 1981, que foi da Esquadrilha da Fumaça
de 1992 a 1995 e que atua como diretor da Associação dos Pilotos de Helicópteros do Estado
de São Paulo (Aphesp), em “Lições que vêm de muito longe” em artigo publicado na Revista
“Isto É”, em 9/7/2003: “Há algumas semanas, levei meus filhos até o Parque do Ibirapuera
para visitar a exposição “Os Guerreiros de Xi’An e os Tesouros da Cidade Proibida”, montada
na Oca. Fantástica a cultura da China. Pudemos ver uma série de objetos que contam uma
história de alguns milhares de anos. Lembrei que, há muitos anos, fui à mesma Oca. Lá era
o Museu da Aeronáutica de São Paulo, onde, entre outras peças, havia um acervo de Alberto
Santos Dumont, certamente um dos mais consagrados gênios que o Brasil já produziu. Há
muito tempo não se pode mais visitar o museu. Com a morte da aviadora Ada Rogato, que o
dirigia, aquilo ficou às moscas.” Mais adiante expressou-se Ruy: “Histórias são contadas aqui
e ali, de iniciativas que tentaram, sem êxito, preservar o patrimônio aeronáutico que estava
na Oca. É uma pena que as peças não tenham sido destinadas ao museu, no Campo dos
Afonsos. Algumas pessoas ligadas à aviação indicaram o Museu do Comandante Rolim. Uma
briga política não permitiu. Mais de 800 mil pessoas já visitaram o museu chinês. Os guerreiros
chineses embarcam de volta para casa com a certeza de que cumpriram, milhares de anos
depois, o papel de preservar sua cultura e defender suas tradições” Continuando, o defensor
solitário afirmou em seu artigo: “Espero que jamais venham a saber a que era destinado o
espaço que ocuparam. Espero que não tenham a menor ideia de como tratamos os heróis
que escreveram parte da nossa história – ficariam indignados. Gostaria que a imagem gravada na retina dos guerreiros fosse a de olhares respeitosos de homens, mulheres e crianças
brasileiros reverenciando toda a história e cultura que estavam representando. Para trás fica
a Oca, que ao longo dos últimos anos foi se esvaziando e que não temos mais condições de
preenchê-la completamente. Maior que a tristeza da partida dos heróis chineses é a tristeza de
não podermos mais usar o espaço vazio da Oca com nossos próprios heróis. Provavelmente, a
Aeronáutica brasileira perderá o espaço, que de qualquer forma, nos últimos anos, não serviu
para nada além de brigas políticas que só destruíram o acervo. A principal cidade da América
Latina e uma das maiores do mundo não tem mais um museu público que preserve os grandes
nomes daqueles que escreveram as páginas da aviação brasileira. O incrível é que, apesar
de tudo isso, ensinamos aos nossos filhos que somos inventores do avião. Ficamos parados
observando outros países respeitarem seus antecessores. Crescem embalados por seus heróis
de verdade. E nós, infelizmente, assistimos a mais um episódio de descaso e desrespeito. Nós
só não podemos nos acostumar com isso. A comunidade aeronáutica brasileira reserva o dia
23 de outubro para reverenciar o feito de Santos Dumont. Há quase 100 anos ele decolou do
Campo de Bagatelle, na França, com um aparelho mais pesado que o ar. Em 2006, ano do
centenário, a comemoração mais justa seria a abertura de um museu, onde este feito pudesse
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ser lembrado todos os dias do ano, e não apenas no dia do aviador. Nós só não podemos nos
acostumar com isso”.
O “Jornal da Ciência”, de 17 de novembro de 2005, noticiou que o Museu da Aeronáutica foi
instalado em dois galpões do Centro Municipal de Campismo (CEMUCAM), na divisa entre SP
e Cotia. Lá estão, em processo de deterioração, relíquias como a touca, as luvas e os óculos
usados por Santos Dumont no primeiro voo, em 1906, réplicas do 14 Bis e do Demoiselle e
parte da biblioteca do inventor. O mesmo ocorreu com o avião Jahú, do pioneiro João Ribeiro
de Barros, utilizado em voos através do Atlântico, e outros aviões pilotados pela aviadora Ada
Rogato, entre outras importantes relíquias.
É pena, mas a nossa história é tênue para nós, brasileiros. Ela soçobra rapidamente, tal
qual uma nau sem rumo. Ada Rogato deixou-nos um legado histórico impar para a aviação
brasileira. Deixou, ainda, para o Instituto Biológico, a lembrança de uma mulher que soube,
como tantas outras, enobrecer esta Casa.
Mas agora, podemos apreciar, em uma exposição sediada no Museu da TAM, em São Carlos, um espaço a ela consagrado. O seu avião, com várias homenagens, é lá apresentado,
resguardando sua imagem de empreendedora, segundo Mário Carlos de Filipi, que enviou ao
Centro de Memória do IB, um e-mail, no mês 6 de 2012, com a foto apresentada a seguir:
Avião Cessna 140-A usado por Ada Rogato.
Ada Rogato junto ao avião Cessna 140,
conhecido como "Paulistinha".
Carimbo postal e selo comemorativo dos 50
anos do sobrevoo de Ada Rogato sobre os
andes.
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AILEMA BACKX NORONHA
Ailema de Carvalho Backx nasceu em 23 de agosto de 1937, no Bairro de Carlos Prates,
na Cidade de Belo Horizonte, MG, filha de Alda Martins Backx e Armando de Carvalho Backx.
Quando tinha 8 meses, sua família transferiu-se para o Rio de Janeiro. Antes de completar 15
meses de idade, Ailema perdeu sua mãe, tendo sido criada por sua avó paterna.
O curso primário foi completado na Escola Quintino Bocaiuva, o ginásio na Escola Secundária
Geral e Técnica Bento Ribeiro e o científico no Colégio Pedro II. O curso de Engenharia Agronômica
foi realizado na Universidade Rural do Brasil, hoje Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro,
no Km 47 da antiga Rio-São Paulo. O curso foi realizado com algumas interrupções, devido a
problemas de saúde, tendo sido concluído em dezembro de 1963.
Em janeiro de 1964, Ailema transferiu-se para São Paulo e passou a atuar no Instituto Biológico, como bolsista em um projeto sobre o trigo, com financiamento externo, trabalhando
com sementes cultivadas, sob a orientação de Karl Martim Silberschmidt, à época chefe da
Seção de Fisiologia Vegetal do Instituto Biológico. No início de 1966, foi nomeada para a
então Seção de Fisiologia Vegetal, sendo orientada por Marly de Felice Vicente, pesquisando
os efeitos da luz e da temperatura na germinação de sementes. Esses trabalhos tiveram repercussão internacional. No início da década de 1970, com a reestruturação do organograma
administrativo do Instituto Biológico, Ailema direcionou os seus estudos para a Fitovirologia,
fazendo parte da Seção de Virologia Fitopatológica e Fisiopatologia (SVFF). Em colaboração
com Marly de Felice Vicente, Marilda Meirelles de Oliveira e outros, caracterizou o inibidor de
infecção a fitovírus de Chenopodium amaranticolor e outras espécies da ordem Caryophyllales.
Também realizou pesquisas sobre o efeito inibidor de extratos foliares de plantas medicinais,
como maravilha (Mirabilis jalapa), carrapichinho (Alternanthera brasiliana), caruru-bravo
(Phytolacca thyrsiflora), iresine (Iresine herbstii) e primavera (Bougainvillea spectabilis), entre
outras, sobre a infecção causada por alguns fitovírus de importância econômica. Participou
como colaboradora de diversos projetos financiados pela EMBRAPA, FAPESP e FINEP, sendo
esta última, interinstitucional, visando a selecionar plantas medicinais ou não com atividade
antiviral para infecção causada por vírus de planta.
Ailema Backx Noronha
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Foi sócia-fundadora da Sociedade Botânica de São Paulo e da Sociedade Brasileira de Virologia. Na década de 1970, tornou-se membro da Associação de Agricultura Orgânica. Ailema
publicou cerca de 34 artigos científicos em revistas nacionais e internacionais e apresentou os
resultados de suas pesquisas em diversos eventos em todo o Brasil. No ano de 1989, recebeu
o prêmio “Instituto Biológico” pelo trabalho “Inibição da infecção sistêmica causada por Tomato spotted wilt virus” em tomateiro por extratos de Caryophyllales”, durante a 2a RAIB (2ª
Reunião Anual do Instituto Biológico). A apresentação de trabalhos sobre o controle alternativo
da doença “vira cabeça do tomateiro”, na 9ª Conferência Científica Internacional, promovida
pela “International Federation of Organic Agriculture Movements (IFOAM), propiciou a sua ida
à cidade de Marseille, na França, para proferir uma palestra sobre o assunto, em 1994.
Ailema foi chefe da SVFF de 1992 até a sua aposentadoria. Tinha, como uma de suas principais características, a generosidade. Assim, sempre que possível, ajudava todos os seus
funcionários, da mesma forma como fazia e faz até hoje, trabalhos voluntários com crianças
em uma comunidade carente. Em 1998, após dedicar grande parte de sua vida à pesquisa,
aposentou-se, deixando seus ensinamentos e a continuidade de suas pesquisas aos jovens
pesquisadores do laboratório.
IGNEZ KOSEKI
Ignez Koseki graduou-se no curso de História Natural da Faculdade de Filosofia, Ciências
e Letras da Universidade de São Paulo, obtendo os diplomas de Bacharel e Licenciatura, em
1961.
No ano de 1964, Ignez iniciou um estágio no Instituto Biológico, como estagiária voluntária, no laboratório à época denominado Seção de Parasitologia Animal. A chefe era Maria
Pereira de Castro, uma das pioneiras, no Brasil, no cultivo in vitro de células somáticas de
animais e na obtenção de linhagens celulares visando à propagação de vírus causadores
de sérias doenças de importância para a pecuária. Como estagiária daquela Seção, Ignez participou ativamente do projeto sobre o desenvolvimento dessa biotecnologia, para
substituir a utilização do uso de epitélio lingual bovino na propagação do vírus da febre
aftosa, com o intuito de melhorar as condições de multiplicação desse vírus. Esse projeto
foi subvencionado pela Secretaria do Estado de São Paulo e pelo Departamento de Agricultura dos Estados Unidos.
Em 1965, foi nomeada Biologista-Assistente e, mais tarde, em 1975, ingressou na carreira
de Pesquisador Científico, chegando ao nível máximo, PqC-6.
Na pesquisa, realizou estudos sobre o cultivo de diferentes espécies de células de animais e
suas relações vírus-célula hospedeira visando a sua utilização em larga escala para a produção
de vacinas. Dessa forma, era imprescindível a identificação e a caracterização das linhagens
celulares iniciadas ou não no laboratório de Biologia Celular, por meio da análise do cariótipo
típico da espécie de origem, bem como das alterações decorrentes do subcultivo in vitro pela
identificação da presença ou não de marcadores típicos ou de outras alterações cromossômicas
utilizando, também, como parâmetro de caracterização, a sensibilidade das linhagens celulares
e seus clones ao vírus da febre aftosa. Esses trabalhos sempre foram realizados em equipe,
com colegas de laboratório, como Tauba Gitla Abuhab.
Em 1972, recebeu o título de Mestre em Biologia pelo Instituto de Biociências da USP e,
nesse mesmo ano, foi agraciada com uma bolsa no Instituto de Doenças Microbianas da Universidade de Osaka, no Japão, pela Overseas Technical Cooperation Agency (OTCA), onde
pesquisou fusão de células animais induzidas pelo vírus Sendai (HVJ), sob a orientação de
Yoshio Okada, renomado pesquisador, que descreveu pela primeira vez essa fusão.
No ano de 1977, recebeu o título de Doutor em Ciências, área de concentração Biologia,
pelo Instituto de Biociências da USP.
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Ainda na década de 70, colaborou com um projeto de pesquisa no convênio UNIÃO-ESTADOFAPESP e foi bolsista do CNPq nos períodos de 1971 a 1972 e de 1973 a 1978.
A partir de 1977, utilizando a reconhecida internacionalmente linhagem celular suína IBRS-2, participou da pesquisa que possibilitou o isolamento, pela primeira vez no Brasil, do
vírus da febre aftosa presente em búfalos indianos, animais estes, portadores sadios, e cuja
criação vinha sendo incentivada no Brasil.
No período de 1983 a 1984, colaborou no projeto “Obtenção de antígeno para anemia infecciosa equina através de culturas celulares”, parte do programa integrado EMBRAPA/SAA-IB.
Nessa mesma década, devido à expansão da pecuária paulista, surgiu interesse pelas propriedades biológicas de produtos naturais e plantas medicinais que pudessem ser utilizados
como fonte alternativa para a melhoria da saúde dos animais de produção. Assim, Ignez Koseki
iniciou pesquisa sobre a atividade antiviral de extratos de plantas em células de linhagem
animal pelo estudo da ação da olivacina, um alcaloide piridocarbazólico extraído da Aspidosperma olivaceum sobre a replicação do vírus da febre aftosa na linhagem IB-RS-2. No período
de 1986 a 1990 foi, também, responsável pelo subprojeto “Atividade antiviral-vírus animalextratos vegetais” desenvolvido dentro do projeto interinstitucional da FINEP, em conjunto com
a Seção de Virologia Fitopatológica e Fisiopatologia do Instituto Biológico, do Departamento
de Microbiologia e do Núcleo de Pesquisas de Produtos Naturais da Universidade Federal do
Rio de Janeiro e do Departamento de Microbiologia da Universidade Federal de Minas Gerais.
Foi testada a atividade antiviral de 21 extratos de plantas contra o vírus da febre aftosa, vírus
da doença de Aujeszky e vírus da diarreia bovina, nas linhagens suína IB-RS-2 e bovina GBK.
Em 2007, esses trabalhos foram reconhecidos e Ignez recebeu uma homenagem, após sua
aposentadoria, durante a VIII Jornada Paulista de Plantas Medicinais, pela sua importante
contribuição no estudo das espécies de plantas brasileiras com atividade antiviral.
No mesmo ano, recebeu uma outra homenagem, durante o 5º CICAM (5º Congresso de
Iniciação Científica em Ciências Agrárias, Biológicas e Ambientais), pela sua importante contribuição em pesquisas, ao longo de sua brilhante carreira.
Ignez publicou 35 artigos científicos em revistas nacionais e internacionais e apresentou
29 trabalhos em congressos. Participou de diversas reuniões científicas e comissões, proferiu conferências e palestras relacionadas a sua especialidade, ministradas para pessoal de
nível superior e em cursos de pós-graduação, bem como coordenou cursos e seminários. Fez
parte de bancas examinadoras de defesas de teses de mestrado e doutorado e de bancas de
concurso para admissão de pessoal de nível superior. Participou de atividades editoriais de
revistas técnico-científicas ou como revisora eventual. Também, prestou assessorias técnicocientíficas a outras instituições oficiais. Orientou 22 estagiários voluntários e 2 bolsistas de
iniciação científica da FAPESP, um na categoria de Aperfeiçoamento da FAPESP e 1 na categoria
de Aperfeiçoamento do CNPq.
Ignez Koseki
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No Instituto Biológico, a pesquisadora também exerceu funções de chefia, quando, a partir
de 1976, passou a ocupar a chefia da Seção de Biologia Celular e quando, entre 1987 a 1990,
atuou como diretora substituta da Divisão de Biologia Animal.
Em 1990, aposentou-se, com a certeza de ter dado uma importante colaboração para a
pesquisa científica do Instituto Biológico e de ter contribuído na formação de futuros cientistas.
JOSETE GARCIA BERSANO
Josete nasceu no Rio de Janeiro, tendo como pais José da Silva Garcia e Alair Bragança
Garcia. Em Nilópolis, nesse mesmo Estado, completou seus primeiros cursos.
Mais tarde, Josete, formou-se em Medicina Veterinária. Tinha, como meta primeira, a Medicina. No entanto, desistiu de seu intento, ao tornar-se uma das primeiras colocadas no curso
de Medicina Veterinária. “Estava escrito nas estrelas que teria de ser assim”, disse ela em uma
entrevista à bolsista do CNPq/PIBIC/IB, Juliana Souza Ferraz.
Antes de vir para o Instituto Biológico, trabalhou na Defesa Sanitária Animal, da Coordenadoria de Assistência Técnica Integral, em Ibitinga. Tinha seu trabalho distribuído entre várias
espécies animais, como bovinos, suínos, caprinos e equinos. Ia frequentemente ao campo,
para necropsiar animais ou colher material para a identificação de doenças que acometiam as
várias espécies animais. Sempre que colhia material para análise, ela o remetia para o Instituto
Biológico, local cujo sonho em trabalhar, tinha morada.
No ano de 1977, casou-se com Vicente Baptista Bersano. Nesse mesmo ano, soube que um
colega, pesquisador do Instituto Biológico, havia solicitado sua transferência para o interior.
Josete demonstrou seu interesse pela troca e, assim, veio para São Paulo, tendo, seu sonho,
lugar no IB. Seu filho Bruno Guilherme veio, em 1978, completar a sua existência.
Ao entrar para o IB, foi trabalhar no Laboratório de Virologia, que tinha, como chefe, Luiz
Conrado. Mas, Josete ainda não havia encontrado lá o seu destino. Quando foi apresentada para
Washington Sugay, chefe do Laboratório de Suínos, imaginou outras alternativas de trabalho.
Nessa época, o trabalho principal do Laboratório de Suínos era a peste suína clássica e, Dr.
Sugay necessitava de pesquisadores para atuar no laboratório, a fim de produzir soro hiperimune
e vacina ultravioleta contra a peste suína. Josete, então, vai ter aos suínos. Encontrou aí, o seu
ideal. E o concretizou, dizendo sempre que “se não trabalhasse com suinocultura, teria que
inventar o porco” e “os pesquisadores são como um batalhão de choque, que tem que estar à
frente das trincheiras, indo ao campo, procurando dar o retorno o mais imediato possível ao
proprietário”. Diz ainda que “o trabalho que realizamos é um trabalho de formiguinha, pois
quando se lida com doenças não se consegue resolver o problema todo de uma só vez. Mas,
só o fato de os criadores terem um boa visão do Instituto Biológico é ótimo. É um Instituto de
Pesquisa que presta atendimento, que está ao lado deles, e isso já valeu a pena. É um trabalho
de formiguinha, hoje, amanhã, depois de amanhã, é um trabalho contínuo”.
De 2003 a 2006, participou de um Projeto da FAPESP, um de seus orgulhos, sobre agricultura familiar. O projeto serviu como modelo para que os suinocultores familiares, da periferia
de cidades grandes, tivessem conhecimento para produzir suínos saudáveis.
Josete, além dos inúmeros trabalhos que executa, também contribui com aulas no curso
de pós-graduação do Instituto Biológico. Publicou cerca de 60 trabalhos e participou de vários
congressos, dentro e fora do Estado de São Paulo.
Foi detentora, por duas vezes, do “Prêmio Veterinário do Ano”: Em 1997, entregue pela
SINDAN, Sindicato Nacional da Indústria de Produtos para a Saúde Animal e, em 2009, pela
Gessulli Agribusiness.
Páginas do Inst. Biol., São Paulo, v.9, n.2, p.34-57, jan./jun., 2013
Desde 2004, é Diretora do Centro de Pesquisa e Desenvolvimento de Sanidade Animal, não
deixando de atuar em sua área de conhecimento, a suinocultura.
Josete é um ser humano digno de ser seguido. Além de profissional íntegra, é possuidora de
uma bondade infinita e sabe distribuir essa bondade para os vários segmentos da sociedade.
Seu trabalho dignificou e dignifica a sua classe e a Instituição que tomou como berço.
Josete Garcia Bersano
MAGALI D’ANGELO
No ano de 1956, Mafalda Marcilha D’Angelo e Salvador D’Angelo tiveram, como filha, Magali
D’Angelo.
A vida profissional de Magali iniciou-se em 1978, no Instituto Biológico, na Seção de Biologia
Celular. À época, atuava como Técnica de Laboratório, tendo por chefe Ignez Koseki.
Por concurso, em 1983, já no cargo de Biologista, teve assento no Laboratório de Febre
Aftosa. Não ficou lá por muito tempo, pois sua veia de trabalho já havia se fixado na Seção de
Biologia Celular. Assim, no ano de 1984, Magali retornou para seu trabalho primeiro.
Sua perspicácia e vontade de vencer levaram-na, em 1986, já como Pesquisadora Científica,
a sua primeira participação em congresso, o “V Congresso Brasileiro de Biologia Celular”, no
Rio de Janeiro.
Sua trajetória institucional foi deveras ativa. Seu mestrado de Microbiologia Aplicada à
Medicina Veterinária/USP, em 1990 e seu doutorado em Sanidade Aplicada à Biotécnicas da
Reprodução Animal/USP, em 1999, abrilhantaram sua já promissora carreira.
Seu conjunto de ações científicas lhe deu o nível VI da Carreira de Pesquisador Científico,
com uma extensa bagagem de realizações.
Assim, Magali seguiu seu curso: a afinidade científica.
Com cerca de 150 trabalhos científicos publicados em revistas científicas e em congressos,
três livros publicados e, ainda, participação de bancas de mestrado e doutorado, tanto como
orientadora, como participante convidada, o seu perfil estava totalmente solidificado.
Tornou-se responsável pela Unidade de Biologia Celular do Centro de Pesquisa e Desenvolvimento de Sanidade Animal do Instituto Biológico, docente permanente do curso de pósPáginas do Inst. Biol., São Paulo, v.9, n.2, p.34-57, jan./jun., 2013
graduação do Instituto Biológico e do curso de pós-graduação Interunidades em Biotecnologia
da USP/Butantan/IPEN. Foi, também, coorientadora oficial em pós-graduação da Faculdade de
Ciências e Veterinárias de Jaboticabal e professora orientadora pontual de pós-graduação da
Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia/USP, na qual colaborou em diversos projetos
de pesquisa.
Com experiência na área de Microbiologia, com ênfase em Microbiologia Aplicada à Reprodução Animal, atuou, principalmente, nos estudos sobre a transmissão de patógenos via
técnicas conceptivas artificiais e avaliações de possíveis interações de patógenos e xenobióticos
no desenvolvimento de embriões in vitro.
Em 2013, Magali participou de sua última atividade científica, em um congresso em Hannover, na Alemanha.
Nesse mesmo ano, deixou-nos, prematuramente, aquela cujo sorriso fazia parte constante
de seu rosto. Deixou-nos de mansinho, para que a atenção de todos não estivesse presente
na sua despedida última. O que valeu, para ela, foi o que ficou. Era o dia 16 de maio de 2013.
Magali D'Angelo
MARA MERCEDES DE ANDREA
Nasceu na cidade de São Paulo, em 4 de outubro de 1950, filha de Aylton de Andrea e
Helena Collier de Andrea. Concluiu o curso de Ciências Biológicas, em 1973, no Instituto de
Biociências da Universidade de São Paulo. No ano de 1981, ingressou no cargo de Biologista
comissionada no Instituto Biológico. Em 1985, efetivou-se como Biologista, no Centro de Radioisótopos da Divisão de Biologia Animal do Instituto Biológico.
Antes do mestrado, realizou o curso de especialização em Análise de Resíduos de Pesticida,
na Universidad de Costa Rica. Em 1986, obteve seu mestrado em Ciências (Energia Nuclear
na Agricultura), pela Universidade de São Paulo, e, no ano de 1992, fez seu Doutorado em
Tecnologia Nuclear, pela Universidade de São Paulo.
Em 1989, ingressou na carreira de pesquisador científico. Durante a sua vida profissional,
publicou 64 artigos em periódicos especializados e apresentou 92 trabalhos em congressos
Páginas do Inst. Biol., São Paulo, v.9, n.2, p.34-57, jan./jun., 2013
e reuniões científicas nacionais e internacionais, além de coordenar e organizar cerca de 10
eventos científicos. Mara orientou 20 estudantes de iniciação científica, 2 trabalhos de conclusão de curso na área de Ecologia, 8 dissertações de mestrado e 2 teses de doutorado. Pelo
reconhecimento de seu trabalho recebeu, em 2006, vários prêmios e homenagens: destaque
do Jornal do Conselho Regional de Biologia (Ano XI - Nº 140), Conselho Regional de Biologia,
1ª Região (SP, MT, MS); Prêmio Mara Mercedes de Andrea (atribuído ao melhor trabalho do
4º CICAM - Congresso de Iniciação Científica em Ciências Agrárias, Biológicas e Ambientais),
Instituto Biológico; Homenagem por contribuição ao Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica - PIBIC/CNPq/IB, Instituto Biológico.
No período de 1990 a 2007, participou de 18 projetos de pesquisa, coordenando 17 deles.
Mara, quando entrevistada no ano de 2010, falou sobre a carreira de pesquisador científico
do Estado de São Paulo, e relatou que alcançou o nível VI, em 1998. Disse ela que alcançar o
mais alto grau dessa carreira significou que foi avaliada e reconhecida por seus pares e que
escreveu uma história científica. Mencionou que, a partir dessa data, a sua produção científica
aumentou significativamente, pois já tinha titulação, possibilidade de orientação e credenciamento na Universidade de São Paulo e, com isso, pode aprofundar o seu conhecimento científico.
Atuou na área de Ecologia, com ênfase em Ecologia de Solo Aplicada a Estudos de Dinâmica
de Pesticidas. Em suas atividades profissionais interagiu com 75 colaboradores em coautorias
de trabalhos científicos.
Foi membro do comitê de pós-graduação do Instituto Biológico, na área de Sanidade, Segurança Alimentar e Ambiental no Agronegócio e docente responsável pela disciplina Ecossistema
Edáfico e a Saúde do Ambiente. Ainda, em 2010, participou do processo de idealização, criação,
implantação e implementação do curso de pós-graduação do Instituto Biológico e participou,
também, do processo de criação do logotipo, da formatação da tese e do certificado do curso.
Mara deixou o Instituto Biológico, ao aposentar-se, em 2012. Sua bagagem de conhecimento
está contida no excelente legado que proporcionou aos seus pares e àqueles que perpetuam
os seus trabalhos, dignificando seu conteúdo de conhecimento.
Mara sempre esteve à mercê de ideais que se somam às questões da ciência.
Mara Mercedes de Andrea
MARIA PEREIRA DE CASTRO
Nascida na cidade de Mineiros, Estado de Goiás, em 2 de maio de 1921, sempre quis
dedicar-se às artes, tendo participado de vários cursos de pintura. Entretanto, com o correr
dos anos, optou pelas ciências.
Páginas do Inst. Biol., São Paulo, v.9, n.2, p.34-57, jan./jun., 2013
Em 1942, bacharelou-se em História Natural, pela Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras
da Universidade de São Paulo. Entre os anos 1942 e 1943, iniciou sua carreira científica no
Instituto Biológico, lotada na Seção de Parasitologia Animal, como estagiária voluntária, sob a
orientação de Clemente Pereira. Nos anos de 1944 a 1945 exerceu o cargo de parasitologista
e, em 1946, o cargo de biologista, até 1955.
Desenvolveu estudos sobre ácaros que parasitavam fossas nasais de aves (Rhinonyssidae)
introduzindo critérios de classificação válidos até os dias de hoje. Observou, pela primeira
vez, que larvas de carrapato, Boophilus microplus, alimentavam-se do produto da necrose
tissular decorrente da saliva do hospedeiro, e não do sangue, como era descrito. Descreveu,
também, a partenogênese arrenótoca no ácaro Macrocheles muscae domestica, que usava a
mosca doméstica como meio de transporte.
Decidiu montar um laboratório de cultura de tecidos na Seção de Parasitologia Animal, para
pesquisa de parasitas intracelulares, após ter estagiado no Laboratório do Serviço de Cultura de
Tecidos do Instituto de Biofísica da Universidade do Brasil, sob a orientação de Hertha Meyer,
pioneira no cultivo de tecidos no Brasil. Assim, após várias tentativas para a implantação dessa
nova tecnologia, obteve as culturas primárias de órgãos de diferentes animais domésticos e,
nessa mesma década de 50, fez estudos sobre os protozoários Toxoplasma gondii e Leishmania
enriettii em cultura de embrião de galinha e também observou a suscetibilidade de culturas
celulares de rim de cobaia ao vírus da febre aftosa.
Em 1956, foi nomeada encarregada da Seção de Parasitologia Animal, exercendo a atividade até 1961.
No ano de 1960, como bolsista do CNPq, fez estágio no Serviço de Cultura de Tecidos do
Departamento de Cirurgia do Hospital John Hopkins, no Departamento de Vírus da Universidade de Cornell e no Laboratório de Doenças de Animal de Plum Island, nos Estados Unidos.
No início da década de 60, devido aos resultados positivos já obtidos com cultura de tecidos
de animais, para a replicação do vírus da febre aftosa, coube a ela a responsabilidade, no Instituto Biológico, da execução do Plano S3-ADP-2 do Projeto “Studies on the Foot-and-Mouth
Disease Virus”, convênio assinado entre a Secretaria de Agricultura do Estado de São Paulo e
o Departamento da Agricultura dos Estados Unidos e subvencionado por este último, durante
os anos de 1961 a 1966.
O projeto foi um sucesso. Culturas celulares primárias, preparadas de diferentes órgãos de
animais domésticos no laboratório, mostraram-se sensíveis ao vírus da febre aftosa.
Concomitantemente ao emprego de culturas primárias, a obtenção de linhagens celulares
permanentes suscetíveis ao vírus da febre aftosa havia se tornado primordial, pois estas últimas,
além de formarem um monoestrato mais homogêneo, apresentariam um bom rendimento celular,
podendo ser caracterizadas cariotipicamente e permitiriam o controle de contaminantes. Assim,
após tentativas, esforços e persistência, Maria Pereira de Castro conseguiu obter a linhagem celular
suína IB-RS-2 (IB - Instituto Biológico; RS - rim suíno; 2 - 2ª tentativa). Essa linhagem celular
suína, bastante suscetível ao vírus da febre aftosa, foi utilizada como substrato para o levantamento dos tipos, subtipos e variedades desses vírus que ocorriam no Estado de São Paulo. Esses
dados foram apresentados no “Relatório de cinco anos de epizootiologia da febre aftosa no Estado
de São Paulo”. Essa linhagem celular é até hoje utilizada por diferentes laboratórios nacionais e
internacionais, tanto para a replicação do vírus da febre aftosa, como de outras amostras virais.
Doutorou-se, em 1969, pelo Departamento de Biologia da Faculdade de Filosofia, Ciências
e Letras da USP, com o tema “Variação clonal na linhagem celular suína IB-RS-2 em relação
à morfologia, cariótipo e suscetibilidade ao vírus da febre aftosa”.
Em 1971, após a reestruturação do Instituto Biológico, permaneceu como chefe da Seção
de Biologia Celular, antiga Seção de Parasitologia Animal.
Páginas do Inst. Biol., São Paulo, v.9, n.2, p.34-57, jan./jun., 2013
Direita para esquerda: Maria Pereira de Castro, Ignez Koseki (Assistente), Raquel G. Gonçalves Gallo
(Técnica de Laboratório), Tauba G. Abuhab (Assistente) e Maria Amélia La Regina Rodrigues (Assistente). Local: Seção de Biologia Celular, década de 70.
No período de 1974 a 1976, foi responsável pelo subprojeto “Pesquisas básicas sobre linhagens celulares sensíveis a vírus animais” do projeto VACINAS, convênio União/Estado/FAPESP,
demonstrando que, além da constituição cariotípica das células hospedeiras, fatores intrínsecos
e extrínsecos poderiam ou não modificar a relação vírus-células.
Publicou vários trabalhos sobre acarologia, linhagens celulares, clones celulares, cariótipos e
suscetibilidade ao vírus da febre aftosa. Orientou vários assistentes, estagiários e profissionais
sobre o cultivo de células animais. Organizou e ministrou o curso de pós-graduação “Inter-relação
vírus-célula”, no Instituto de Biociências da USP. Participou de várias bancas examinadoras de
teses, orientou Ignez Koseki (teses de mestrado e doutorado), Tauba Gitla Abuhab (tese de
mestrado) e coorientou a tese de doutorado de Maria Amélia La Regina Rodrigues, todas elas
suas assistentes. Participou de congressos nacionais e internacionais, apresentando trabalhos.
Em fins de 1976, aposentou-se do Instituto Biológico, certa de ter cumprido sua missão,
principalmente com a obtenção da linhagem celular IB-RS-2, reconhecida internacionalmente,
mostrando que no Brasil existem excelentes e sérios pesquisadores.
Maria Pereira de Castro
MARILDA MEIRELLES DE OLIVEIRA
Marilda nasceu em 20 de abril de 1924, na cidade paulista de Bonfim Paulista. No ano de
1948, fez seu bacharelado em Química, pela Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da Universidade de São Paulo.
Em 1959, ingressou na Seção de Bioquímica e Farmacodinâmica do Instituto Biológico, sob
a chefia de Sylvia Oliveira Andrade, com a qual teve os primeiros contatos com a investigação
de plantas tóxicas de interesse econômico. Foi nessa fase de sua carreira científica, em 1963,
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que Marilda detectou pela primeira vez, por técnica cromatográfica, a presença de ácido monofluoracético na “erva do rato” ou “café bravo” (Palicourea marcgravii A. St. Hil.), planta nativa
do Brasil, ocorrendo em praticamente todo o país. É uma das plantas mais tóxicas, sendo a
maior causadora de envenenamento do gado brasileiro, o que lhe confere certa importância
econômica e a torna fundamental no segmento da pecuária.
Em 1970, com a reestruturação administrativa do Instituto Biológico, tornou-se chefe da
recém-criada Seção de Farmacologia. Em colaboração com a pesquisadora Maria Regina P.
Sampaio, dedicou-se aos estudos das propriedades farmacológicas e terapêuticas de plantas,
principalmente as anticancerígenas, e desenvolveu trabalhos que interagiam com o seu conhecimento de Química e Farmacologia de Produtos Naturais.
Pesquisadora de personalidade forte e batalhadora aguerrida por seus ideais, conseguiu
formar o laboratório com muita tenacidade e perseverança, direcionado para o seu objetivo,
sempre tendo em vista a missão institucional, que tem como uma de suas prioridades a saúde
animal e vegetal de interesse na agropecuária.
Foram inegáveis os seus esforços em descobrir produtos com atividade antitumoral, por meio
de isolamento e pró-sínteses, tais como os alcaloides piridocarbazólicos elipticina e olivacina,
obtidos das espécies de Aspidosperma, e a naftoquinona, como o lapachol isolado do ipê roxo
(Tabebuia avelanedae), entre tantos outros.
Nesse período de suas pesquisas, teve a colaboração de grandes químicos, como Benjamin
Gilbert e Walter Mors, entre outros, tanto em suas pesquisas, como para o intercâmbio de
ideias científicas. Esses estudos estão fundamentados em publicações científicas nacionais e
internacionais, em mais de duas dezenas de trabalhos.
É, ainda, importante salientar que Marilda, ao lado dos seus ideais científicos, também
foi uma tenaz lutadora em prol da classe dos químicos, sendo sócia-fundadora da Sociedade
Brasileira de Química – SBQ, em 8 de julho de l977 e da Sociedade Brasileira para o Progresso
da Ciência – SBPC, que ocorreu na Pontifícia Universidade Católica (PUC) em São Paulo.
O espírito de luta em defesa da comunidade científica fez com que Marilda se empenhasse
na criação e regulamentação da carreira de pesquisador científico, tendo sido membro da
Comissão Permanente do Regime de Tempo Integral - CPRTI, no período de 1983 a 1985. À
época, juntamente com Alba A. de Campos Lavras e outros pesquisadores lutou pela regulamentação do ingresso e da mobilidade na carreira de pesquisador científico. Assim, graças à
luta desses membros, hoje, pode-se ter avaliações anuais dentro da carreira.
Marilda Meirelles de Oliveira
Páginas do Inst. Biol., São Paulo, v.9, n.2, p.34-57, jan./jun., 2013
Em 1990, Marilda pediu sua transferência para o Instituto Butantan, permanecendo até a
sua aposentadoria, dedicando toda a sua vida à pesquisa em Química de Produtos Naturais.
Além de profissional dedicada, Marilda era uma pessoa culta, conhecedora das artes, como
a música, e, acima de tudo, generosa e caridosa, sempre preocupada com os mais necessitados, auxiliando várias instituições filantrópicas.
SYLVIA OLIVEIRA ANDRADE DE ORNELLAS
Nasceu na Cidade de Campinas, SP, em 17 de abril de 1921. Após terminar os cursos fundamentais, ingressou na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da Universidade de São Paulo,
graduando-se em Química, no ano de 1941.
Em maio de 1943, foi convidada pelo recém-nomeado chefe da Seção de Bioquímica e
Farmacodinâmica do Instituto Biológico, Maurício Rocha e Silva, para participar daquela Seção,
como assistente, pela sua inteligência e serenidade. Por meio dos ensinamentos transmitidos
pelo Pesquisador, Sylvia tornou-se uma promissora química em proteínas, sendo a primeira a
aplicar cromatografia em papel no Brasil.
Sylvia trabalhou arduamente na purificação do material bruto da bradicinina, (peptídeo,
um hormônio de tecido, descoberto no Instituto Biológico), empregando diversas técnicas
cromatográficas, as quais permitiram analisar quantidades mínimas de Bradicinina purificada,
chegando à conclusão de que pelos menos dez ou doze aminoácidos entram na sua composição.
Finalmente, em 1955, com o uso de uma resina de troca iônica, foi obtida a substância pura
e altamente ativa. Os resultados foram publicados, no ano de 1956, no Biochemical Journal,
revista de grande impacto internacional e referência no assunto. No laboratório do Instituto
Biológico, seguiam-se as mais modernas tendências dos estudos farmacológicos dos venenos
dos animais e das toxinas bacterianas. A partir de 1960, a história da bradicinina pôde entrar
em muitos livros e simpósios publicados por Maurício Rocha e Silva e seus colaboradores.
Outra abordagem científica da pesquisadora foi sobre o estudo da dicumarina, substância contida
nas espécies Melilotus alba e M. officinalis), popularmente conhecidas por “trevo doce”, responsáveis
por uma doença hemorrágica em bovinos. A utilização da substância era de grande importância
para a medicina veterinária, principalmente nos países onde se adotava a silagem de forragem. À
época, o princípio hemorrágico responsável, a dicumarina, era muito utilizado na medicina humana,
no tratamento preventivo e curativo de doenças tromboplásticas. Devido à importância para a medicina veterinária e para a terapêutica humana, as experiências com a dicumarina em animais de
laboratório foram realizadas imediatamente, sendo as primeiras feitas no Brasil.
Em 1957, Maurício Rocha e Silva assumiu a cátedra de Farmacologia na Faculdade de Medicina
de Ribeirão Preto, SP, e Sylvia passou a ser a chefe da Seção de Bioquímica e Farmacodinâmica.
Empenhou seus esforços para os estudos sobre as plantas tóxicas nocivas ao rebanho, realizando
levantamento da distribuição geográfica no Estado de São Paulo de algumas plantas tóxicas.
Estabeleceu a correlação entre a incidência de doenças hemorrágicas e de fotossensibilização
dos bovinos e a presença dessas plantas, principalmente nas pastagens recém-abertas pela
expansão da atividade pecuária, nas quais predominavam plantas nativas. O levantamento
das plantas nocivas à criação envolvia o estudo da literatura sobre plantas tóxicas, a verificação do material coletado por meio de teste de toxicidade, o isolamento e a identificação dos
princípios tóxicos, além do estudo farmacológico dos princípios tóxicos.
O avanço da pecuária para regiões de pastagens naturais trouxe a necessidade de se conhecerem os efeitos de diversas plantas nativas sobre os bovinos, em decorrência da frequência
de mortes por intoxicações do gado.
Na década de 1960, foi firmado um convênio entre a Secretaria da Agricultura do Estado de
São Paulo e o Departamento de Agricultura do Estados Unidos, por meio do qual os estudos
Páginas do Inst. Biol., São Paulo, v.9, n.2, p.34-57, jan./jun., 2013
realizados pelo Instituto Biológico sobre plantas tóxicas receberam financiamento por 5 anos,
de 1961 a 1966, para o desenvolvimento do projeto “Estudos das plantas tóxicas do Estado
de São Paulo para animais domésticos”.
Os resultados de seus trabalhos foram divulgados em eventos científicos e publicados em
revistas nacionais e internacionais, como Science e Nature, em 1945 e 1946, juntamente com
Maurício Rocha e Silva, demonstrando a sua dedicação à ciência.
Em 10 de março de 1979, Sylvia aposentou-se, deixando sua contribuição para a comunidade científica e à sociedade. Seus trabalhos de pesquisa com as plantas tóxicas, ao longo
de sua brilhante carreira, deram valiosa contribuição à pecuária paulista, e que até hoje é de
importância fundamental na pecuária brasileira.
Sylvia Oliveira Andrade de Ornellas
VERIDIANA VICTÓRIA ROSSETTI
Victória, um tom a mais
“E vem ela de cabelos aprumados, coloridos pelo branco, contando as suas contendas no
descobrir sobre as doenças dos citros. Questionada pelas bancadas de seu laboratório sobre
as laranjas, ela responde com seus estudos para chegar a sua história.
Viajou pelo mundo, vendo na terra brotar o fruto, e aprimorou seus encantos no despertar
de seu conhecimento. Viu que a história chegaria até hoje, sabendo que cada fruto contaria
o que ela queria ouvir.
Com passadas largas de conhecimento, juntou bem próximo dela um montão de estudantes
e profissionais, para adiantar o que sabia. Deu lições, escreveu, chamou para o trabalho que
aprendeu também com Bitancourt, seu mestre, como dizia.
Era ouvida por sua sabedoria e pelas línguas que falava. Saltava de um francês para um
italiano sem pestanejar. Sentia-se à vontade para falar sobre as bactérias, os vírus e não
deixava para lá os fungos também.
O corredor do quarto andar tem, marcado na madeira justa e bem formada, o fascínio de
que por lá passou. Passou Victória, não Veridiana, pois desse nome não gostava. Passou com
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ela sua equipe, para às sextas-feiras às 18h a caipirinha adotar. Vinham vários convidados e
entre eles fui também. Lá estava a nata da sanidade vegetal.
Mas é na laranja que encontrou o que de melhor trabalhou. Viu a praga e a doença e num
despertar fez o melhor, fazendo o que pôde para o agricultor contentar.
Gostava de um afeto e de um cumprimento a mais. Era vaidosa por querer e por poder.
Depois dos 70, em sua sala a escrever trabalhos e aprimorar seu currículo, vinha eu a
conversar sobre suas glórias. Ela desfiava elogios, principalmente ao Eduardo Feichtenberger,
que carinhosamente chamava de filho.
Era um bom tempo de escutar, era um bom tempo para conhecer uma alma que se orgulhava do que fez render para a agricultura. Contava de suas viagens e de tudo que fez.
A vitória de seu trabalho deu-lhe a resposta por sua inigualável perseverança. Era ela a
Victória, que Veridiana não queria ser”.
Márcia Maria Rebouças
Nascida em 15 de outubro de 1917, na fazenda Santa Veridiana, em Santa Cruz das Palmeiras, SP, a pesquisadora Veridiana Victória Rossetti sempre representou, como seu nome
já diz, a vitória. Sobretudo no trabalho árduo, muitas vezes, mas sempre compensador para
ela e para toda a comunidade científica.
Aprendeu as primeiras letras, quando cursou o Collégio S. Vincenzo di Paula, na cidade de
Alássio, na Riviera de Gênova, Itália, onde passou seus primeiros anos de vida. Após retornar
ao Brasil, Victória passou a residir na fazenda Paramirim, no Município de Limeira, SP, pertencente a sua família. Seus estudos foram feitos, inicialmente, no Colégio São José, também em
Limeira, onde cursou o primário. Em seguida, cursou o ginasial no Colégio Piracicabano, em
Piracicaba, e, posteriormente, agronomia, na Escola Superior de Agronomia “Luiz de Queiroz”
(ESALq), localizada na mesma cidade. Sua profissão foi exercida, também, por dois irmãos e
por vários outros membros de sua família. Como brilhante aluna, além da língua portuguesa,
dominava o francês, o alemão, o espanhol e o italiano.
Como estagiária atuou, no princípio de sua carreira, juntamente com Anderson Coelho de
Andrade, na Seção de Fitopatologia Geral, no Horto Florestal da Cantareira, à época pertencente
ao Instituto Biológico. Ao mesmo tempo, estudava para o concurso que lhe deu lugar naquela
Instituição. Foi concursada em 1941 e atuou no Instituto Biológico, como pesquisadora, até
2000, mesmo tendo sido aposentada em 1987, ocasião em que recebeu o título de “Servidor
Emérito”, outorgado pelo Governo do Estado de São Paulo. Desde o início de sua carreira,
dedicou-se ao estudo das doenças dos citros. Aprimorou seu conhecimento, segundo ela, com
o Dr. Agesilau Antonio Bitancourt, por ela considerado o mestre-maior.
Com os colegas Raul Drummond Gonçalves, Spencer Corrêa de Arruda, Mario Meneghini,
Sebastião Gonçalves da Silva e Karl Silberschmidt, do Instituto Biológico, e Sylvio Moreira,
Ody Rodrigues e Álvaro dos Santos Costa, do Instituto Agronômico de Campinas, e ainda
com Carlos M. Dornelles, de Taquari, Rio Grande do Sul, teve, nos primeiros momentos, o
conhecimento somado. Ela ainda teve inúmeros encontros com grandes mestres do porte de
George Zentmyer, Leo J. Klotz, E.C. Calavan e C. Roistacher, na Califórnia; Heinz Wutscher,
Stephan Garnsey, J.F.l. Childs, L.C. Knorr e J.O. Whiteside, na Flórida; Joseph M. Bové e sua
esposa, Collete Bové, e G. Morel, na França, além de outros grandes encontros com Gabriele
Goidanich, de Bologna e Osvaldo Lovisolo, de Torino, entre tantos outros.
No Brasil, Victória manteve uma grande amizade com Dalmo Giacometti, renomado cientista
no Brasil e no exterior. Na Itália, conheceu um grande botânico: o professor Massimo Sella.
Batalhadora e proficiente na área de pesquisas de doenças dos citros, Victória não escolheu
as oportunidades mais fáceis para compor seu conhecimento: foi à luta! Em 1946, nos Estados
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Unidos, realizou o curso de Estatística Experimental, na Universidade Estadual da Carolina do
Norte. Após esse curso, com bolsa da Fundação Guggenheim, realizou estudos sobre a Fisiologia
de Ficomicetos, na Universidade da Califórnia, em Berkeley, com o professor Ralph Emerson,
onde permaneceu de janeiro de 1951 a setembro de 1952. Com o professor J. Zentmyer, na
mesma época, em Riverside, estudou os fungos do gênero Phytophthora. Ainda, em 1969,
graças à Fundação Rockefeller, foi aos Estados Unidos para visitar as estações de pesquisa em
citros na Cidade de Lake Alfred, na Flórida e em Riverside, na Califórnia.
Na França, em 1961, no Institut National de la Recherche Agronomique, com J.M. Bové,
capacitou-se nas técnicas de diagnóstico de vírus transmissores por enxertia, visando ao Programa de Registros de Matrizes de citros livres de vírus.
Victória, em 1954, foi designada chefe da Seção de Fitopatologia Geral e, a partir de 1969,
exerceu a liderança na Divisão de Patologia Vegetal. Em 1977, concorreu à carreira de Pesquisador Científico e, por seus méritos brilhantes, obteve o nível maior, PqC VI.
Todo o seu conhecimento científico foi reconhecido e demonstrado quando de sua participação em diversas comissões científicas ou técnicas, nacionais e internacionais, tais como:
presidente da International Organization of Citrus Virologists (IOCV), de 1963 a 1966, ano em
que organizou a IV Conferência da IOCV, na Itália; coordenadora da Comissão Técnica do Programa de Registro de Matrizes de Citros do Estado de São Paulo, que teve grande êxito graças
ao sucesso alcançado no controle de viroses de citros no Estado de São Paulo; participação
no Comitê Executivo da Sociedade Internacional de Citricultura, representando o Brasil; no
Comitê Internacional dos Estudos sobre Phytophthora; na Comissão Nacional de Fruticultura e
na Comissão Nacional de Citricultura, entre outros. O número de eventos dos quais participou
é muito extenso. E sempre sobressaiu-se com grande brilhantismo.
Pelo reconhecimento de seus méritos científicos, como pesquisadora, conquistou mais de
60 prêmios e teve mais de 300 trabalhos publicados ou apresentados em congressos nacionais
e internacionais. Representando todos os prêmios, cita-se a medalha “Luiz de Queiroz”, que
recebeu em 2 de junho de 1999, outorgada por recomendação do professor Elliot Watanabe
Kitajima, da Escola Superior de Agronomia Luiz de Queiroz, de Piracicaba. Em seu discurso,
no momento da entrega do prêmio, Victória disse: “Faz hoje 98 anos que o benemérito genial
Luiz de Queiroz teve a visão brilhante de fundar uma escola de agronomia. Essa escola vinha
preencher o vazio resultante das necessidades de um país onde a agricultura tentava crescer,
faltando conhecimentos básicos. (...) Hoje recebo uma homenagem que tanto me honra e
enobrece, que agradeço e ofereço ao nosso fundador, no sesquicentenário de seu nascimento”.
Após sua aposentadoria, em 1987, continuou a frequentar o Instituto Biológico, atuando
com esmero na área que escolheu, também como bolsista do CNPq, em uma sala no 4º andar,
onde uma placa acima de sua porta a apresentava como “Victória Rossetti Funcionária Emérita
do Estado de São Paulo”, placa essa colocada, em 1997, por Zuleide Alves Ramiro, Diretora
Geral à época.
Sempre ativa e desejosa de novos conceitos, Victória sempre foi e será um ícone da Instituição.
Deixou-nos no dia 26 de dezembro de 2010, no entardecer de sua vida. Fixou sua imagem de amor pelo trabalho e sua inesquecível coragem para enfrentar as vicissitudes da vida
científica, na história da ciência nacional e internacional.
Exemplo de abnegação, levou o nome do Instituto Biológico como se fora o seu próprio sobrenome, fazendo-o crescer com suas pesquisas na área de sanidade vegetal, sendo o seu conhecimento a estrutura básica para o fortalecimento da pesquisa científica no Instituto Biológico.
A Clorose Variegada dos Citros (CVC), nome sugerido por Victória em substituição ao chamado
“amarelinho”, foi motivo de vários trabalhos sobre sua transmissão e resistência varietal à
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doença. Desenvolveu, inclusive, vários trabalhos a respeito da Xylella fastidiosa, com colegas
do Instituto Biológico, dos Estados Unidos e da França.
Em 1943, publicou seu primeiro trabalho, “Podridão Preta das Orquídeas”. A partir de 1954,
foi coautora de outras publicações referentes a doenças de diversas culturas: a da seringueira,
com Anna E. Jenkins (pesquisadora americana, que por muitos anos trabalhou no Instituto
Biológico), sobre a mancha da folha da seringueira; a do pessegueiro, com A.E. Maltese, em
1954, que apresenta o trabalho sobre o cancro dos ramos do pessegueiro; a do cafeeiro, com
Bitancourt, em 1959, que determina a ação deformante do 2-4D sobre suas folhas e com Edil
D. Pinheiro e Jorge Abrahão publicou o trabalho sobre estrangulamento de haste dessa cultura
e a reprodução experimental de um dos tipos dessa doença. Em 1973, estudou as pragas
e micro-organismos que prejudicam a cultura cafeeira. Com Eduardo Feichtenberger e M.I
Feitosa, em 1975, realizou uma revisão bibliográfica sobre a doença dos frutos dessa mesma
cultura, denominada Coffee Berry Disease (CBD); sobre a cultura da batata e a podridão das
raízes do abacateiro, com Benedicto P.B. Cruz e O.J. Book. Com O.C. Abreu, N.A. Bonilha e E.
Abramides publicou alguns ensaios para o controle do bicho-da-seda.
No período de 1945 a 1986, com as publicações sobre gomose de Phytophthora,,os citros
ganharam o seu tempo. Demonstrou-se que a gomose de Phytophthora afetava plantas cítricas em pleno desenvolvimento e não plantas definhadas por ação de outros patógenos, o que
obrigou Victória a estudar novas metodologias de controle. Esses patógenos dependiam da
presença de vitaminas e aminoácidos. A tiamina tinha efeito de multiplicação nuclear. Os íons
Cu e Ni agiam diferentemente em presença dos fatores de crescimento.
Victória e colaboradores também demonstraram que o ataque desses patógenos dependia
da combinação enxerto X porta-enxerto, pois a copa poderia modificar o comportamento do
porta-enxerto, com relação à doença. Os experimentos atuais consideram sempre a suscetibilidade das combinações e não só do porta-enxerto. Demonstraram, ainda, que o viroide
de exocorte, utilizando-se estirpe fraca, quando inoculado em plantas cítricas, reduz o seu
crescimento, sem produzir sintomas típicos da doença e que, nas plantas com crescimento
reduzido, inoculações experimentais com fungos do gênero Phytophthora desenvolvem-se
muito pouco. Essas características estão sendo utilizadas comercialmente na Austrália, em
pomares com plantio mais próximo, o que facilita os trabalhos. Nos últimos anos, 1984 a 1994,
Victória publicou que as doenças Declínio das Plantas Cítricas e Clorose Variegada dos Citros
(CVC) exigiram a maior atenção por parte dos fitopatologistas. Também, a Leprose dos Citros
recrudesceu de maneira alarmante nos pomares do Estado de São Paulo. Por esse motivo,
foi necessário retornar seriamente aos estudos sobre sua etiologia, transmissibilidade, epidemiologia e ultraestrutura dos tecidos afetados, destacando-se, sobre esse assunto, vários
trabalhos publicados.
O Declínio das Plantas Cítricas, doença em tudo semelhante ao Blight da Flórida, foi assunto
distinguido por Victória entre os anos 1984 a 1986. Disse ela: “... ainda não se sabe qual é a
causa. No Brasil, conseguiu-se transmitir pela enxertia de raízes, como foi feito na Flórida”.
Em CVC, Victória descreveu a primeira constatação da ocorrência de bactéria semelhante
à Xylella fastidiosa limitada ao xilema de plantas cítricas afetadas pela doença. Os outros
trabalhos citados foram importantes para o conhecimento da doença e de seu agente causal.
Nos trabalhos publicados, foi determinada a transmissão da doença por inoculações com a
bactéria isolada e conseguiu-se fechar o ciclo dos postulados de Koch, ao mesmo tempo em
que colegas de Lake Alfred, na Flórida, faziam o mesmo, determinando que a bactéria Xylella
fastidiosa era o agente causal da CVC. Os trabalhos publicados de 1989 a 1993 sobre CVC
foram realizados com material colhido e enviado semanalmente do Brasil para a França, durante
o estágio de Victória no Institut National de la Recherche Agronomique – Inra, de Bordeaux.
Sobre Leprose dos Citros, em 1995, os trabalhos foram retomados por um grupo de técnicos
do Instituto Biológico, com a colaboração de Osvaldo Lovisolo, do Instituto di Fitovirologia di
Torino, Itália, e de E.W. Kitajima, na Universidade Nacional de Brasília. A Leprose tornou-se
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uma das doenças mais graves da citricultura, necessitando, segundo Victória, ser mais estudada. Conseguiu-se transmiti-la mecanicamente de citros para citros, em 20-30 dias e de
citros para plantas herbáceas em 4-5 dias. Também, foi provado ser a doença causada por um
vírus e não por toxina da saliva do ácaro, como alguns pensavam.
Assim, com cerca de 25 projetos aprovados pela Fapesp, entre os anos 1963 e 1995, e não
deixando de lado também a Fundecitrus e a Cargill, Victória teve aporte financeiro para a execução de seus trabalhos, devido a sua competência e habilidade nas conversações com essas
agências de fomento. O Instituto Biológico não deixou de participar de suas atividades, pois
sabia da importância dessa pesquisadora no desenvolvimento científico, quer para o Instituto,
quer para o Estado de São Paulo, quer para o Brasil, país que tanto amava.
Deixou, Victória, de nosso convívio. Mas a profundidade de seu conhecimento, a sua vontade
tenaz em trabalhar e deixar algo que fosse substancial para o conhecimento das doenças dos
citros, sua perspicácia e lucidez ao desenvolver sua ciência e a sempre deferência aos seus
discípulos dão a nota certa de um compasso por demais lúcido, antes que a cortina da vida
nos deixasse órfãos.
Sua ciência, seu lema; seu trabalho, sua vida.
Victória Rossetti em sua formatura
Arquivo – ESALQ
Victória Rossetti
Victória Rossetti
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ZULEIDE ALVES RAMIRO
Nasceu Zuleide Alves em Patos, na Paraíba, filha de Aurélio Alves, Engenheiro Agrônomo,
tal qual Zuleide viria a ser mais tarde. Sua mãe, Luiza Olindina da Silva Alves, com garras de
matriarca e força timoneira, levou sua família aos encantos da sabedoria, essa forte e singela
mulher. Zuleide, como professora primária da Secretaria da Educação do Estado do Rio de
Janeiro, apresentou o primeiro ato de sua formação. Lecionou no Grupo Escolar Presidente
Dutra, em Seropédica, Município de Itaguaí, Rio de Janeiro, até 1965.
Em 1964, formou-se na Universidade Rural do Brasil, Escola Nacional de Agronomia e, em
25 de dezembro desse mesmo ano, foi para o Departamento da Produção Vegetal da Secretaria
da Agricultura. À época, recebia um salário de NCr$ 169,85, como extranumerária-mensalista,
na Seção de Soja da Divisão de Assistência Técnica Especializada em Campinas. Mais tarde,
convicta de sua capacidade, formou-se em Engenharia Civil nas Faculdades Franciscanas.
Em 1967, Zuleide chegou ao Instituto Biológico, já casada com Cleufas Ramiro, também
Engenheiro Agrônomo, indo para a Seção de Entomologia Agrícola, na Fazenda Experimental “Mato Dentro”, em Campinas, pertencente ao Instituto Biológico. Aí, atuou com Geraldo
Calcagnolo, renomado cientista da Instituição.
Na Escola Superior “Luiz de Queiroz”, Piracicaba, Zuleide começou a frequentar um curso
de pós-graduação e, em 1968, defendeu o título de Mestre e, logo após, de Doutora.
Com Benedicto Pedro Bastos Cruz, mais tarde Diretor Geral do Instituto Biológico e Coordenador da Pesquisa Agropecuária da Secretaria de Agricultura, participou de reuniões na
Comissão de Horticultura do Ministério da Agricultura. Também fez parte, por dois anos, do
Departamento de Orientação Técnica da Coordenação de Assistência Técnica Integral.
Em 1969, nasceu seu primeiro filho, Daniel, em 1972, Davi, e, em 1974, Patrícia.
Em 1976, foi lotada na Seção de Plantas Industriais e, em seguida, assumiu a Chefia da
Seção de Controle Biológico das Pragas, substituindo o Eng. Agrônomo Walter O. Heinrich.
Em 1981, a pedido, deixou a chefia daquela Seção. Em 1993, exerceu a função de Diretor
Técnico de Divisão da Divisão de Parasitologia Vegetal, permanecendo até 1995, quando foi
indicada para a Diretoria Geral do Instituto Biológico. Em 1999, deixou o cargo de Diretora
Geral e voltou ao Laboratório de Pragas das Plantas Industriais. Aposentada, voltou às origens,
no Laboratório de Controle Biológico, na velha Fazenda “Mato Dentro”, então como estagiária.
Pesquisadora de fibra, foi pioneira no Estado de São Paulo, na introdução da técnica de
Manejo Integrado em culturas de soja, controle das cigarrinhas das pastagens, manejo de
pragas em culturas de algodão e, também, carro-chefe dos primeiros trabalhos, no Brasil,
relacionados com impacto na entomofauna em algodão transgênico.
Com mais de 100 trabalhos científicos publicados, capítulos de livros e apresentações em
Congressos, Zuleide demonstrou a que veio, participando efetivamente do contexto da pesquisa
científica do Estado de São Paulo, com reflexos em outros estados brasileiros.
Nas diversas comissões das quais participou, deixou sua marca de conhecimento, nos temas
como soja, algodão, cigarrinhas das pastagens e no desenvolvimento de metodologias para a
pesquisa de plantas transgênicas.
Marcou seu espaço, quando recebeu prêmios como Fitossanitarista do ano e Destaque
Profissional CATI, em reconhecimento pela sua habilidade na pesquisa científica, em busca da
resolução de problemas da agricultura brasileira.
Destemida, Zuleide soube tão bem defender o Instituto Biológico em 1995, quando a venda
desse patrimônio era iminente. Com toda a sua força e garra, lutou bravamente para a maPáginas do Inst. Biol., São Paulo, v.9, n.2, p.34-57, jan./jun., 2013
nutenção do espaço do IB, participando do abraço à Instituição, juntamente com a comunidade
científica de todo o Estado de São Paulo. Ainda, enfrentou seus superiores para a concretização
de evento sobre a “vaca louca”, quando acabara de aparecer em manchetes, o problema na
Inglaterra. O Instituto Biológico, por seu intermédio, fez valer sua competência nesse assunto,
enfocando o tema, dos mais contraditórios para a cultura brasileira.
Concretizou projetos junto à FAPESP, que valorizaram a Biblioteca do IB e vários Laboratórios, tanto da sede como da Fazenda “Mato Dentro”, em Campinas. Cedeu espaço para a
tão sonhada sede do Museu do Instituto Biológico, o Casarão, antiga residência dos diretores
gerais da Instituição.
Levou seu conhecimento, tal qual uma taxonomista que procura o impossível e o encontra
facilmente, por sua perspicácia. Zuleide deixou e ainda deixa formados vários e competentes
estagiários que, devido ao gosto pela forma da ciência, continuam suas lições, lutando por
ideais traçados pela sua astúcia científica.
Zuleide Alves Ramiro
O começo, a primeira, Veridiana Victória Rossetti.
Victória Rossetti aparece entre 19 homens
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Aparecem –Victória Rossetti entre Sylvia Oliveira Andrades de Ornellas abaixo e,
Maria Pereira de Castro acima, tendo ao seu lado direito, Laís P. Azevedo
Na segunda fileira ao centro, Victória Rossetti, tendo à sua direita Silvia Ornellas. Maria Pereira de Castro estava, nesse momento, nos Estados Unidos. Marilda Meirelles está na segunda fileira de cima para
baixo, de óculos gatinho. Vê-se que quantidade de mulheres aumenta - 20 mulheres e 59 homens.
Essas mulheres pioneiras nos deixaram legados importantes para a pesquisa científica,
tanto nacional como internacionalmente. Era uma no início, V. Victória Rossetti, mais tarde
já eram quatro: Lais P. Azevedo, Veridiana Victória Rossetti, Maria Pereira de Castro e Sylvia
Oliveira Andrade de Ornelas. Aos poucos, demonstrando as características que dominavam
seus interiores, outras mulheres foram chegando e, tal qual um arranjo floral, deixaram seus
perfumes de sabedoria, para que o processo do conhecimento científico se perpetue. São
elas as mulheres e suas questões nas ciências.
Agradecemos a colaboração de Carolina de Andrade Ramires, Eli Carvalho Rosa, José Aparecido Ribeiro da Rocha e Tânia Cristina Penido Paes Manso, do Centro de Comunicação e
Transferência do Conhecimento, do Instituto Biológico.
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