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Transmissão Inter e Transgeracional de Trauma –
Uma contextualização para o terapeuta
Os estudiosos da natureza humana vêm há anos debatendo-se com
questões relativas à replicação de características parentais nos filhos. Textos
não provenientes da área médica aludem ao fato de que pecados podem ter sido
transmitidos de pais para filhos. Entretanto, a primeira elaboração mais profunda
sobre o impacto da neurose dos pais sobre seus filhos surge no final do século
XIX, com a sistematização da psicanálise. As escolas subsequentes de
psicologia que investigam características do trauma mostravam preocupação
com o tratamento de traços neuróticos dos pacientes.
A partir da era do pós-Holocausto surge uma literatura consistente sobre os
efeitos intergeracionais dos traumas parentais. Logo após a descrição da
Síndrome do Holocausto por Niederland (1961), Rakoff (1966) relata a
transmissão dos efeitos do trauma do Holocausto na segunda geração. Desde
então, várias centenas de artigos sobre a transmissão intergeracional principalmente limitados a casos clínicos e a relatórios pessoais - têm sido
publicados, suscitando críticas sobre a falta de estudos empíricos sistemáticos
iniciais. Essa carência inicial de pesquisa sistemática deve-se parcialmente a
uma falta de consenso sobre que conteúdo se transmite, apesar de indícios
iniciais de sintomas complexos ou até mesmo patologias específicas em filhos
dos sobreviventes do Holocausto (Barocas and Barocas, 1973).
Enquanto isso, ao apontar a heterogeneidade desse grupo, Daniel (1981)
identifica cinco subtipos de famílias sobreviventes do Holocausto: famílias
vítimas, famílias em estado de entorpecimento, famílias lutadoras e famílias dos
que conseguiram. Em um estudo seminal, Solomon (1988) examina soldados
israelitas que desenvolvem transtorno de estresse pós-traumático durante a
guerra do Líbano. Descobre que os soldados descendentes dos sobreviventes
do Holocausto apresentam um processo de TEPT mais prolongado. A hipótese
de um fator de vulnerabilidade em crianças saudáveis dos sobreviventes
aumenta. Nader (1998) relata achados semelhantes em crianças cujos pais
passaram por traumas significativos em suas vidas. Essas crianças demonstram
maior probabilidade de desenvolver sintomas de TEPT depois de testemunhar
algum acidente violento.
A exposição recorrente a trauma pode alterar o nível de resposta do eixo
hipotálamo - pituitário – adrenocortical, antes mesmo do estabelecimento do
TEPT. Yehudi (1998) descobre que descendentes saudáveis de sobreviventes
do Holocausto são mais suscetíveis de desenvolver TEPT após eventos
traumáticos e relata diversos sintomas. Da mesma maneira, Novac e HuberSchneider (1998) relatam uma comorbidade acentuada em crianças filhos de
sobreviventes que estiveram em uma clínica psiquiátrica, devido à ansiedade e
depressão. Os autores especulam sobre os diferentes mecanismos de
transmissão de trauma. Outros estudos confirmam que os descendentes dos
sobreviventes do Holocausto são mais vulneráveis a transtornos psicológicos
depois de desenvolverem câncer de mama (Baider, 2000).
A importância desse tema também é reconhecida pela Sociedade
Internacional de Estudos de Estresse Traumático (ISTSS em inglês), com o
financiamento e manutenção de um grupo de área de interesse especial voltado
à Transmissão Interoperacional de Trauma e Resiliência. Nas reuniões da
ISTSS, há número cada vez maior de apresentações sobre transmissão
intergeracional. Há também progressivamente mais relatórios de psicopatologia
sobre a “terceira geração” (i.e. netos) dos sobreviventes do Holocausto.
Na
prática
frequentemente
clínica,
pacientes
descrevem
os
pais
com
pais
como
portadores
preocupados
de
e
TEPT
limitados
emocionalmente. Certos sintomas manifestados pelos pais, como vivências
recorrentes
de
experiências
traumáticas,
entorpecimento
emocional
e
fenômenos dissociativos não ajudam crianças a desenvolver um senso de
segurança razoável e previsibilidade em seu mundo. Esses pais também são
menos suscetíveis de reagir da melhor forma possível durante crises normais do
desenvolvimento e ajudar a criança protegendo-a do mundo em uma versão
hostil.
Os pais portadores de TEPT também têm dificuldade de desenvolver um
senso saudável de identidade e autonomia, mecanismos adequados de
autotranquilização e de regulação do afeto, bem como de manter uma
perspectiva equilibrada quando surgem mudanças de vida. Em vez disso, podem
esboçar
reações
dissociativas.
Os
catastróficas
níveis
ou
elevados
inadequadamente
de
ansiedade
significativamente no desenvolvimento infantil.
entorpecidas
parental
e
interferem
A autoimagem da criança e a relação com os objetos são também
afetados pela imagem que fazem de seus pais. O sucesso dos pais em
administrar suas vidas, e em demonstrar resiliência, determina se a criança pode
sentir-se orgulhosa, envergonhada ou confusa sobre seus pais.
Resumos de Casos
Caso 1 - Uma mulher perto dos 40 anos foi encaminhada para tratamento de
transtorno obsessivo compulsivo, depressão, consumo excessivo de drogas no
passado e caos generalizado. Os sintomas mais marcantes eram ansiedade
extrema, apreensão e confusão face a tarefas interpessoais que pareciam
simples para alguém tão inteligente e articulada. Ela não havia respondido à
terapia com vários psiquiatras no passado. No levantamento da história clínica
inicial, ela declarou ter sido estuprada no final da adolescência, mas negou que
isso tivesse acarretado efeitos duradouros. Após vários meses de terapia, ela
revelou que - antes de ter nascido - sua mãe e seu avô tinham testemunhado o
assassinato da avó. A mãe e o avô tinham ambos ficado com depressão crônica,
ansiedade, temerosos e preocupados com a possibilidade de reviver a
experiência desde que o crime ocorreu. Ficou claro que o TOC da paciente era
uma tentativa parcial de criar algum sentido de previsibilidade e de segurança.
Avanços significativos na estabilização da paciente foram obtidos com
combinação de antidepressivos, terapia de família, terapia individual e educação
psicológica sobre os efeitos traumáticos em cada geração.
Caso 2 - Um jovem profissional de vinte e tantos ano foi encaminhado para
tratamento devido a bulimia, depressão e a vários transtornos de ansiedade. No
levantamento da história clínica, negou ter histórico de trauma. Com o progresso
da terapia, mencionou que os avós paternos eram sobreviventes do Holocausto
e tiveram um papel importante em sua criação. Eles eram afetuosos e
superprotetores, mas também ansiosos e altamente críticos. O processo
terapêutico deixou claro que a atitude de crítica visava garantir que tudo fosse
perfeito, de forma a evitar nova catástrofe indefinida. A bulimia do paciente deviase à tentativa de adquirir o corpo perfeito e, dessa forma, evitar coisas ruins.
Quando atendido em sessão de terapia de família, o pai do rapaz demonstrou
claramente ter problemas de segunda geração e aceitou indicação para terapia.
O tratamento do pai ajudou bastante o paciente. O pai tornou-se um modelo para
o rapaz de como superar dificuldades da vida de maneira calma e razoável. A
terapia individual, o uso de antidepressivos e a melhora do pai resultaram em
uma recuperação quase completa.
Direcionamentos futuros
A transmissão intergeracional do trauma parece ser significativa em filhos
de pais com histórico de trauma e subsequente TEPT. O fenômeno não se limita
a sobreviventes de perseguição. Os filhos de pais que sofrem de TEPT são mais
tendentes a desenvolver uma vulnerabilidade específica por toda a vida ao
estresse pós-traumático, bem como a co-morbidades.
Estudos futuros devem esclarecer mais sobre os diferentes tipos de
transmissão e seu impacto na qualidade de vida das gerações futuras. Por
exemplo, não se sabe se a transmissão de trauma em famílias do Holocausto é
semelhante ao ciclo de violência visto em famílias com outros tipos de trauma,
considerada a violência uma tentativa frustrada de expressão de conflitos
internos.
De modo semelhante, a associação entre esses fatores de vulnerabilidade
e a resiliência social, vista em decendentes de sobreviventes de trauma, tem que
ser mais explorada. É necessária a sistematização de mais pesquisa e melhor
compreensão dos traços genéticos que fazem com que alguns indivíduos
traumatizados sejam mais sujeitos a desenvolver TEPT. Isso levaria a melhores
teorias sobre o que pode ser epigeneticamente transmitido à segunda e à
terceira gerações, o que poderia influenciar nas respostas de proteção e defesa,
bem como a conexões entre dificuldades individuais e a psicopatologia dos pais.
Mais informações em:
http://www.psychiatrictimes.com/articles/intergenerational-transmission-traumaintroduction-clinician/page/0/2#sthash.5Gl4UWFV.dpuf
Principais Conteúdos abordados neste módulo:
Exercício prático para participantes e posteriormente pacientes disporem de
possibilidade de mudança de estado – equivalente a um processo de
meditação e tranquilização;
Estudo sobre Eventos Adversos de Infância (Adverse Childhood Events – ACE)
e as consequências em prejuízo emocional e físico em adultos. Teste e
estatísticas.
Conceituações de pacientes portadores de trauma simples e trauma complexo;
Genograma familiar;
Introjetos Culturais, Familiares e Transgeracionais: Impactos nas dimensões
Social e Intrapsíquica;
Epigenética conductual.
Protocolos específicos:




Nome próprio e raízes familiares;
Carta de retratamento de pendências familiares;
Linha da Vida e Configuração atual;
Pareamento entre passado e presente
Data: 12 a 14 de agosto de 2106
Local: Oitis Hotel – Goiânia-Go
Treinador: André Maurício Monteiro
Público Alvo: Terapeutas, Psicoterapeutas, Médicos, Estudantes e
Terapeutas em EMDR (concluído ou em formação).
Carga. Horária: 16 horas
Facilitador
Dr. André Maurício Monteiro – Psicólogo (UnB) (CRP 01/3832);
Mestre e Doutor em Psicologia (UnB). Docente Supervisor em Psicodrama.
Pós-doutorado em arte-terapia com pacientes borderline no Psychiatrische
Dienste Thurgau (2006 - Suíça); com pacientes portadores de trauma
emocional múltiplo na Rhein-Klinik (2008 - Alemanha); no hospital dia da Klinik
für Psychiatrie und Psychotherapie, Charité Campus Mitte Berlin (2010 –
Alemanha).
Supervisor de Brainspotting;
Facilitador e Trainer of Trainers em EMDR (EMDR® Institute - EUA);
Supervisor credenciado pelo EMDR Ibero-América;
Treinador credenciado pelo EMDR-Europe, ministrando treinamento em EMDR
em várias cidades do Brasil e em Portugal;
Presidente da Associação de EMDR Brasil (2009-2012);
Ministra ainda cursos de
Teoria e Psicoterapia dos Transtornos Dissociativos (Estados de Ego),
Intensivo de Aprimoramento do Terapeuta de EMDR
Transmissão Transgeracional de Trauma, e Atualizações em Neurobiologia
Interpessoal.
Livros publicados:
Monteiro, A. M., Merengue, D e Brito, V. (2006). Pesquisa qualitativa e
psicodrama. São Paulo: Editora Ágora.
Monteiro, A. M. e Carvalho, E. R. S. (2008). Sociodrama e sociometria:
Aplicações clínicas. São Paulo: Editora Ágora.
Monteiro, A. M. (Ed.) (2012). Conquistas na Psicoterapia: Estudos de Caso
com EMDR. Brasília: Associação Brasileira de EMDR.
Monteiro, A. M. (Org.) (2015). Conquistas na Psicoterapia II: Mais estudos
de caso com EMDR. Brasília: Associação Brasileira de EMDR.
Contato: [email protected] ou [email protected]
(005561) 3443-4141
Site: www.espacodamente.com.br
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