1 Comunicação, fala e linguagem nas demências Fga. Dra

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Comunicação, fala e linguagem nas demências
Fga. Dra. Ana Paula M. Goyano Mac-Kay
CEFAC
2003
O desenvolvimento científico da Fonoaudiologia trouxe para os profissionais
da Saúde conhecimentos novos e importantes sobre os tipos de processamento da
linguagem oral e escrita, da fala e da comunicação. Tais estudos possibilitam
melhor gerenciamento do tratamento de pacientes lesionados cerebrais, quer seja
a lesão de etiologia focal e/ou difusa, lateral e/ou bilateral. Nos quadros onde
ocorre a síndrome da demência observa-se o quão este conhecimento torna-se
fundamental para pacientes e cuidadores.
Um dos sinais mais evidentes nas demências, principalmente na Demência
do Tipo de Alzheimer (DTA), é a deteriorização da qualidade das relações
comunicativas nas fases iniciais e, conforme a evolução do quadro, também das
relações lingüísticas. A comunicação de idéias é a base da comunicação intencional
e é justamente no âmbito das idéias que ocorre o processo degenerativo. Como
resultado, o paciente passa a experimentar dificuldades na habilidade
comunicativas e de realizar atividades de vida diária, especialmente aquelas que
dependem de funções corticais superiores (Bayles & Kazniak, 1987).
A incidência da ocorrência de distúrbios da comunicação é de 88-95% nas
demências e perto de 100% nas Demências Tipo Alzheimer;
Muitos podem estar se perguntando o por quê desta incidência tão alta
então, gostaríamos de lembrar que os pacientes com demência apresentam:
a) dissociação das análises fonológica e sintática da análise semântica;
b) dificuldades no âmbito das idéias, dos conceitos, das inferências e
referências e
c) dificuldades no âmbito da memória.
Assim, a linguagem, a fala e a comunicação sofrem alterações porque elas
expressam as inter-relações existentes entre (a), (b) e (c). É no entrelaçamento
das informações e dos conhecimentos que reside a formação de conceitos que
ficam locados na memória semântica. Logo, se houver problemas nesta área,
mesmo que preservada a PALAVRA, o conceito se dispersa com comprometimento
da comunicação.
Outras evidências de distúrbios da linguagem, fala e comunicação encontramse no âmbito das dificuldades em nomear objetos, em definir, em construir
sentidos novos e acessar antigos, em associar palavras por categoria e em
compreender pantomima e mímica facial. Por outro lado, e de uma forma bastante
interessante, observamos a preservação de comportamentos verbais como os de
repetição e de fluxo normal da fala espontânea (inclusive com correções de erros
sintáticos e fonético-fonológicos) mesmo quando não se verifica o processamento
do significado do que está sendo expresso.
Quanto aos aspectos pragmáticos e discursivos, mais especificamente, a análise
da avaliação de fala e linguagem muitas vezes sinaliza uma decrescente
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sensibilidade ao contexto comunicativo e às informações nele contidas. Isto ocorre
devido à perda gradual e progressiva na habilidade em lidar com particularidades
do discurso como: formar expectativas, antecipar estruturas lingüísticas, distinguir
informações pré-existentes das novas e traduzir idéias em símbolos lingüísticos.
Tais dificuldades se refletem na forma com que o paciente faz uso dos
elementos de coerência e coesão textuais, se relaciona com seu interlocutor. Neste
sentido, podemos sugerir que os distúrbios de comunicação nas demências
ocorrem primeiro na esfera pragmático-discursiva e, gradativamente, na esfera
mais especificamente lingüística (sintaxe, léxico, morfossintaxe, fonologia e
fonética). Deste modo, o perfil comunicativo deste paciente vai estar marcado por
dificuldades com a comunicação em contexto bem antes dos “formatos” ou
“formas” de construir lingüisticamente a mensagem.
Também como base para caracterização dos quadros de distúrbios da
comunicação nas demências, destacamos alguns aspectos fonoaudiológicos que se
apresentam preservados, principalmente nos estágios iniciais e moderados:
• narrativa com tendência ao relato de experiência pessoal;
• manutenção da linguagem automática (oral e escrita);
• manutenção da integridade motora da fala por períodos mais longos;
• manutenção da integridade da articulação dos sons da fala por períodos mais
longos;
• quando há apoio de terapia fonoaudiológica, manutenção da qualidade
comunicativa por períodos mais longos.
O diagnóstico diferencial, conforme preconiza Hedge (2001, 177-178) deveria
levar em conta:
1. onset gradual (os sinais dos problemas aparecem lenta e progressivamente);
2. o diagnóstico por imagem com lesão do tipo difusa e bilateral;
3. cognição comprometida (memória, atenção, julgamento e etc.);
4. problemas de memória em graus variados;
5. fluência de fala até o início do estado severo;
6. dificuldades de compreensão principalmente para detalhes com melhor
manutenção de idéias principais; melhor compreensão para idéias explicitas e
maior dificuldade para informações implícitas;
7. confusão mental e de espaço e tempo e etc.;
8. déficits de memória heterogêneos.
A avaliação de linguagem e fala deve levar em conta o critério de diagnóstico
das demências (DSM-IV) e porque o paciente pode apresentar distúrbios do tipo
afásico, dispráxico e agnósico. Os testes e protocolos utilizados são os de avaliação
de linguagem e fala nas afasias.ou seja: anamnese e/ou entrevista criteriosa,
provas de linguagem (repetição, nomeação, teste da narrativa, leitura, entre
outras), avaliação da comunicação funcional e/ou pragmática, avaliação motora da
fala, avaliação das praxias orofaciais e análise qualitativa do corpus.
A grande contribuição das pesquisas fonoaudiológicas está na clarificação dos
distúrbios pragmático-discursivos, que interferem nas relações comunicativas, nos
estudos de procedimentos e orientações para os casos com disfagia associada e na
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pesquisa de sinais de distúrbios de comunicação na fase inicial da demência visto
que a demência afeta primeiramente a competência comunicativa e, a seguir, a
competência lingüística!
O atendimento ao paciente com quadros demenciantes deve ser sempre
programado e exaustivamente explicado ‘a família e cuidadores, deve incluir a
orientação criteriosa sobre a qualidade e forma de comunicação em casa e ser
flexível para mudanças que acompanhem as necessidades do paciente.
BIBLIOGRAFIA:
HEDGE,M. Pocket-book of speech-language assessment. San Diego, Singular
Publishing Co., 2001.
LUBINSKI, R, HIGGINBOTHAM,D.J.,WELLAND, R.. Discourse comprehension test
performance of elders with dementia of the Alzheimer Type. Journal of
Speech,Language and Hearing Research, Vol.45, 1175-1187, Dec. 2002.
MAC-KAY, A. P., FERREIRA, V., FERRI-FERREIRA, T.. Afasia e demência:
avaliação e tratamento fonoaudiológicos. São Paulo,Santos, 2002.
MARCHESAN, I. Avaliação de praxias orofaciais (protocolo clínico). CEFAC –
Clínica, 2003.
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