A Portaria no 822/01 do Ministério da Saúde e as peculiaridades das hemoglobinopatias em saúde pública no Brasil Essa portaria inclui as hemoglobinopatias no Programa Nacional de Triagem Neonatal do Ministério da Saúde, dando um passo importante no reconhecimento da sua relevância em saúde pública no Brasil. No entanto, com exceção de alguns centros especializados, tal Portaria encontrou a maioria dos serviços públicos de saúde ainda despreparados para colocá-la em prática. Em uma fase inicial de implantação, é necessária, portanto, uma ampla divulgação das hemoglobinopatias entre os profissionais ligados à saúde pública, sobretudo entre aqueles que atuam na triagem neonatal. O artigo discute algumas das suas peculiaridades em relação aos demais distúrbios metabólicos incluídos no PNTN. Além disso, é proposta uma reflexão sobre alguns eventuais pontos de distorção que podem comprometer o êxito do programa. A Portaria representou, sem dúvida alguma, um passo importante no reconhecimento da relevância das hemoglobinopatias em saúde pública no Brasil. Com os devidos ajustes e precauções nessa fase de implantação, ela poderá ter, portanto, um impacto positivo na resolução de um problema de saúde muito antigo em nosso país. Hemoglobinas humanas – hipótese malária ou efeito materno? A relação entre as hemoglobinopatias e a malária, principalmente a anemia falciforme, sempre foi alvo de especulações. Vários estudos correlacionam a alta incidência das alterações hemoglobínicas em determinadas áreas do mundo, como, por exemplo, na África, com os locais endêmicos de malária, resultando num modelo evolutivo que indica a manutenção desses polimorfismos nas populações humanas. As hemoglobinopatias têm provido uma das poucas demonstrações convincentes da seleção, influenciando a frequência de único gene na população humana. A alta taxa de desordens, tais como a anemia falciforme e a beta-talassemia, ocorridas em áreas subtropicais ou tropicais dentro do cinturão da malária, levou Haldane a propor que a malária pode ser o agente seletivo responsável que balanceia a perda dos genes para a talassemia e a anemia falciforme, por morte prematura dos homozigotos a partir do aumento do valor adaptativo de heterozigotos no ambiente com malária. Mas uma nova proposta surgiu para explicar a manutenção deste polimorfismo, baseada na fertilidade diferencial ou efeito parental. Alguns autores observaram uma distorção favorecendo a transmissão de alelos mutantes em áreas não endêmicas de malária. Com base nestas observações, esses autores propuseram um efeito materno para explicar tais distorções. Este estudo tem como objetivo apresentar uma revisão destes mecanismos envolvidos na manutenção do polimorfismo de hemoglobinopatias, desde seu modelo clássico até hipóteses alternativas que surgiram recentemente na literatura. Apesar dos poucos dados literários sobre o efeito parental em humanos, principalmente no que concerne aos genes relacionados à proteção a malária, a hipótese baseada em uma eventual distorção no padrão mendeliano, que favoreça a transmissão do alelo mutante, é plausível, porém algumas considerações devem ser feitas. Primeiramente, deve-se levar em conta o efeito clínico que o traço falcêmico tem sobre as gestantes portadoras. O traço falcêmico causa uma série de distúrbios vaso-oclusivos, de infecções recorrentes e de seqüestros esplênicos, que são complicações adicionais durante o período gestacional, podendo assim aumentar os riscos durante a gravidez. Estes fatores, próprios do traço falcêmico, explicaria com maior clareza o grande número de abortos em mães gestantes portadoras do traço. Outro aspecto que deveria ser evidenciado é o do genótipo dos fetos abortados. Uma análise genotípica que confirme um maior número de fetos abortados pertencentes ao genótipo homozigoto (AA) reforçaria a hipótese do efeito materno. Porém, assumir que a quantidade de fetos abortados pertença ao genótipo AA, sem uma prévia análise, não possibilita reforçar tal hipótese, mas apenas demonstraria uma desvantagem nas gestações de mulheres falcêmicas. As interações gênicas, observadas em alguns trabalhos, também devem ser consideradas nas explicações das diferenças dos padrões mendelianos, tais como: epistasia, influências citoplasmáticas, interações entre genes e produtos gênicos primários. Entretanto, é preciso que outras explicações e hipóteses sejam debatidas antes de uma teorização definitiva, pois até mesmo os erros de amostragem devem ser considerados. Os mecanismos envolvidos na proteção à malária em populações onde a parasitemia é endêmica ainda são pouco compreendidos, mas certamente novos estudos surgirão para complementar e auxiliar a compreensão de tais mecanismos envolvidos nestas relações. HEMOGLOBINOPATIAS: UMA QUESTÃO DE SAÚDE PÚBLICA REVISÃO BIBLIOGRÁFICA Hemoglobinopatias são doenças genéticas de caráter étnico onde mutações na estrutura molecular das globinas podem acarretar em modificações funcionais dessas moléculas. No Brasil, a entrada de imigrantes portadores de tais mutações trouxe para cá genes anormais e que devido à grande mistura racial, acabaram por se estabelecer na população brasileira. Atualmente, a anemia falciforme e as talassemias são consideradas as duas maiores responsáveis por essas hemoglobinopatias em nosso país, e atualmente, caracterizam-se como uma preocupação da saúde pública nacional. Considerando-se o problema e a relevância dessas doenças, o presente estudo tem por objetivo uma contextualização bibliográfica sobre as hemoglobinopatias e sua presença em território nacional. Atualmente, o Ministério da Saúde e outras entidades governamentais locais vem estimulando uma atenção e um cuidado maior a essas doenças que afligem considerável parcela da população. Diagnósticos precoces dos indivíduos portadores, através da Triagem Neonatal, vêm sendo realizada e visam à aplicação de tratamentos paliativos que proporcionem uma melhor qualidade de vida aos portadores, uma vez que essas doenças não têm cura. Urge um programa de aconselhamento genético para as famílias portadoras da HbS, esclarecendo as possíveis chance de se gerarem filhos portadores dessas doenças e suas implicações clínicas e sociais. Prenatal diagnosis of hemoglobin disorders: Present and future strategies O diagnóstico pré-natal para as hemoglobinopatias com base na análise molecular de trofoblasto ou amniócitos DNA acumulou cerca de 30 anos de experiência, após as primeiras aplicações na década de 1970. À medida que as primeiras doenças monogénicas são caracterizadas a nível molecular das desordens de síntese de hemoglobina (talassemias e hemoglobinopatias) têm sido utilizados como um protótipo para o desenvolvimento de várias técnicas de detecção de mutações, e, consequentemente, existe inúmeras técnicas baseadas em PCR descritas na literatura que podem ser usados para o diagnóstico pré-natal das mutações dos genes da globina. Esta revisão descreve os métodos atuais mais utilizados, bem como os métodos promissores mais recentes. Além disso, ele descreve a aplicação mais recente do diagnóstico genético pré-implantacional e o estado de progresso no campo em desenvolvimento de diagnóstico pré-natal não invasivo. TALASSEMIA: UMA REVISÃO BIBLIOGRÁFICA A hemoglobina é uma metaloproteína presente no sangue, e é a responsável pelo suprimento de oxigênio aos tecidos, sendo, portanto, um componente essencial para o bom funcionamento e sobrevivência das células. Podem ocorrer diversas alterações genéticas em sua estrutura, que pode se manifestar por doenças, e que variam de incidência de acordo com a raça. Na população brasileira há uma grande mistura de raças, o que pode levar a uma diversidade de alterações na estrutura da hemoglobina e consequentemente, a diferentes patologias, tornando o diagnóstico bastante diverso. Uma destas doenças é a talassemia, que é classificada em vários tipos, de acordo com a cadeia acometida e sua sintomatologia, sendo primeiramente dividida em dois tipos: alfa talassemia e beta talassemia. Ambas são também divididas. As alfa talassemias são classificadas em portador silencioso, caráter alfa talassêmico, doença da HbH e hidropisia fetal; e as beta talassemias são classificadas em talassemia menor, intermediaria e maior. Os sinais e sintomas podem ser bastante variados, e dependem do tipo de doença e gravidade. Eles podem ser: anemia, com cansaço, palidez, desânimo, fadiga, fraqueza; icterícia, esplenomegalia, hepatomegalia e cardiomegalia, ou ainda aparecer com sinais e sintomas de infecção, que é a causa mais comum de morte em crianças com talassemia. Nos dias atuais ainda não há como evitar a transmissão da talassemia dos pais para os filhos, o que pode ser feito é aconselhamento genético para os pais que são portadores de traço talassêmico, mas mesmo assim ainda há possibilidade de ocorrência. Estão sendo estudados medicamentos para o tratamento, bem como técnicas genéticas de inserção de genes que produzam a cadeia beta suprindo sua deficiência, mas ainda não são conclusivos. The genetics of blood disorders: hereditary hemoglobinopathies O objetivo desse artigo é resumir dados recentemente publicados sobre a fisiopatologia, diagnóstico e tratamento das doenças falciformes e β-talassemias, as hemoglobinopatias hereditárias mais relevantes na população global. Foram encontrados mais de 2.000 artigos; aqueles que fornecem as informações mais importantes e amplitude foram selecionados. Conclusões: morbidade e mortalidade das doenças falciformes e β-talassemia ainda são muito elevados e representam um desafio importante. Maior conhecimento dos mecanismos fisiopatológicos tem levado a melhorias significativas no tratamento e prevenção dessas doenças.