Modelos relações laborais - grhiscsp

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TRANSFORMAÇÕES SOCIOECONÓMICAS E RELAÇÕES LABORAIS
Maria da Conceição Cerdeira1
1. Introdução
É pacífica a ideia de que está as transformações socioeconómicas, em particular os
processos de globalização económica, o aumento da concorrência que induzem e que impõem
novos padrões de competitividade às empresas, promovem a erosão das formas jurídicas e
institucionais nascidas na sociedade industrial. Este acréscimo de competitividade pressiona o
abaixamento dos custos salariais do trabalho, sobretudo do menos qualificado, quer no interior
das fronteiras nacionais, quer pela deslocalização das empresas para países e regiões do
mundo com práticas salariais mais baixas e condições de trabalho menos reguladas. Ao mesmo
tempo, solicita qualificações mais elevadas para aproveitar ao máximo as potencialidades das
novas tecnologias e implementar eficazmente novas formas de organização de trabalho e de
produção.
Os efeitos da erosão das formas jurídicas e institucionais têm clara visibilidade em
fenómenos como o crescimento de formas flexíveis de emprego, o aumento das desigualdades
salariais, a crescente heterogeneidade de estatutos dos trabalhadores no seio das empresas e o
aumento do desequilíbrio das relações de poder entre o capital e o trabalho. Estes fenómenos
vão a par com a menor capacidade dos sindicatos em suscitarem a adesão massiva dos
assalariados e desenvolverem acções colectivas por um lado, e, por outro lado, com o
enfraquecimento e transformação dos sistemas de relações laborais tradicionais.
1.1 O enfraquecimento dos sindicatos e a destabilização dos sistemas de relações
laborais tradicionais
Durante o segundo e terceiro quartos do século XX, os sindicatos tornaram-se
organizações poderosas, muito representativas dos assalariados, e fortemente influentes do
curso do conteúdo e do progresso económico e social dos países industrializados do Ocidente,
com regimes políticos democráticos. Através da sua representação em órgãos de concertação
tripartida, e/ou negociando a regulação das condições de trabalho aos diferentes níveis
(intersectorial, sectorial, empresa, região, local de trabalho, etc.), promoveram a segurança no
emprego, a equidade e a justiça distributiva.
Os benefícios conquistados pelo movimento sindical a favor dos trabalhadores foram
integrados nos instrumentos e instituições dos sistemas de relações laborais nacionais que
regulavam o mercado de trabalho. Os aspectos mais salientes deste sistema nos países
industrializados são: 1) emprego a tempo integral, regulado por um contrato de trabalho com
hora fixa de entrada e saída; 2) negociação colectiva dos salários e de outras condições de
trabalho (condições de recrutamento e acesso à profissão, carreiras profissionais, etc.); 3)
benefícios sociais para os trabalhadores e para os seus dependentes, quer prestados pelo
Estado, quer assumidos pelas próprias empresas (pensões de reforma ou complementos de
reforma, subsídio de desemprego, serviços de saúde, etc.); 4) controlo e pagamento do tempo
de trabalho extra; 5) segurança de emprego para a generalidade dos trabalhadores.
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Professora Associada, ISCSP-UTL.
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Até aos anos 70, nas sociedades industrializadas, os sindicatos actuaram num quadro
económico e político que os beneficiava, estruturado pelas seguintes características mais
importantes: concentração dos trabalhadores em empresas de grande dimensão e fortemente
verticalizadas, relações de emprego estáveis, um importante sector empresarial do Estado
devido às nacionalizações do pós-guerra e predominância de valores colectivos partilhados por
todos os actores sociais (Estado, empregadores e trabalhadores). Este quadro altera-se
profundamente desde então, e, de uma forma mais intensa, a partir dos anos 80 do século
passado.
O aumento da concorrência e da competitividade induzido pela globalização, pela
difusão das TIC (tecnologias de informação e comunicação), e pela interdependência crescente
das economias nacionais, ao mesmo tempo que alteram os espaços geográficos da produção e
da repartição, ou seja, os espaços de regulação social e económica, enfraquecem as
possibilidades de êxito de uma acção sindical tradicionalmente desenvolvida em espaços
nacionais. Além disso, os sindicatos são afectados por grandes quebras de adesão e o número
de sindicalizados tem vindo a conhecer um declínio generalizado 2 . Enunciaremos algumas
explicações importantes para esse declínio.
A primeira explicação prende-se com o progresso tecnológico e com as mudanças na
composição do mercado de trabalho, por sector de actividade e por profissão. As mudanças
tecnológicas tornaram possível o desenvolvimento de novas formas de organização industrial e a
descentralização das unidades de produção. No passado, a maioria do emprego concentrava-se
em grandes unidades produtivas e era constituída pelos designados “colarinhos azuis”, ou seja,
por operários qualificados ou não qualificados da indústria transformadora, do sector primário
(sobretudo extractivo), e da construção civil. Hoje o emprego difunde-se por unidades de menor
dimensão, menos hierarquizadas, operando em rede, e é maioritariamente constituído por
“colarinhos brancos” do sector dos serviços, com estatutos e profissões muito diferenciadas.
A segunda explicação tem a ver com a difusão das políticas económicas neo-liberais que
conduzem à (re)privatização do sector público empresarial e incentivam o downsizing, a
subcontratação, o outsourcing e a crescente multiplicação de variadas formas de flexibilidade de
emprego e trabalho ( contratos a termo, recibos verdes e trabalhadores de empresas de trabalho
temporário (ETT), trabalho a tempo parcial, etc.) Os sindicatos manifestam bastante dificuldade
em ajustar as estruturas organizativas, os seus programas e as suas estratégias às novas
realidades sociais e económicas, particularmente mostrando-se incapazes de organizar
sindicalmente as mulheres, os jovens e os imigrantes, isto é, as camadas sociais mais afectadas
pelas formas flexíveis de emprego, mas também os trabalhadores altamente qualificados. Por
exemplo, um estudo desenvolvido em Portugal sobre trabalhadores ligados à nova economia de
serviços, ou seja, trabalhadores ligados às TIC (na sua maioria população jovem, feminina, a
exercer actividade em call centres do sector financeiro e nas telecomunicações e em grandes
superfícies do comércio), mostrou que mesmo em sectores com grande tradição de
sindicalização (caso do sector financeiro e telecomunicações), somente 7% estavam
sindicalizados e apenas igual percentagem admitia a possibilidade de se sindicalizar 3. Gera-se,
então, uma espécie de círculo vicioso: as mudanças na composição da força de trabalho e o
crescimento da flexibilidade laboral criam condições de fraca socialização e identificação
sindical; por seu lado, os sindicatos, não conseguem incluir, integrar e defender as categorias de
Segundo o estudo da OIT (da responsabilidade de Hansenne, Michel (1997), Le Travail dans le monde – Relations
professionnelles, démocratie et cohésion sociale, Genève, BIT de 70) de países estudados, apenas meia dúzia
registou acréscimos da taxa de sindicalização nos últimos dez anos, conhecendo a sua maioria quebras acima de
20%.
3 Kovács, Ilona (Org.) (2005), Flexibilidade de Emprego – Riscos e oportunidades, Oeiras, Celta Editora.
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assalariados com situações profissionais e interesses muito diversificados e desenvolver
negociações colectivas que protejam as situações de emprego dos mais vulneráveis.
A terceira explicação para o declínio sindical prende-se com as inovações na
organização do trabalho, entendendo-se aqui por inovações organizacionais a passagem de um
sistema vertical e hierárquico a estruturas mais horizontais, ou seja, marcadas pela
descentralização das responsabilidades e da tomada de decisões. O reforço da autonomia dos
trabalhadores põe em causa as funções tradicionais dos sindicatos e das instituições de
representação na empresa. Em alguns países de que são exemplo o Reino Unido e os EUA
(como iremos ver mais à frente), o alargamento do conteúdo das tarefas e a flexibilização da
organização do trabalho, associadas ao trabalho em equipa, destabilizaram um sindicalismo
centrado sobre o controlo das tarefas.
O enfraquecimento sindical tende a ocorrer de uma forma mais intensa, quando as
políticas de valorização dos recursos humanos incentivam a implicação dos assalariados por via
da participação e/ou do envolvimento, com vista a curto-circuitar os sindicatos. Estas situações
tendem a ocorrer nos casos em que o clima laboral é adversarial, ou seja, marcado pela
oposição e pelo conflito. As inovações na organização do trabalho (círculos de qualidade, gestão
da qualidade total, implicação e/ou envolvimento dos assalariados na melhoria contínua…), são,
assim, introduzidas com o objectivo não apenas de aumentar a produtividade, mas também para
enfraquecer as relações sociais de antagonismo e substituir a influência sindical por relações de
cooperação, controladas pela direcção. Esta tendência é particularmente observada quando os
sindicatos centram a sua acção sobre o posto de trabalho e o controlo das tarefas e recusam
negociar mudanças mais flexíveis de organização do trabalho.
1.2 Três tipos de estratégias sindicais bem diferentes relativamente modernização e às
reestruturações empresariais e sectoriais
É possível diferenciar três categorias de estratégias sindicais muito diferentes em
resposta aos desafios postos pelo actual contexto económico de grandes transformações
tecnológicas, económicas e sociais:
1) uma posição defensiva e de oposição;
2) uma posição de participação dependente e subordinada;
3) uma posição ofensiva, pró-activa ou propositiva4.
Cada uma dessas estratégias tem subjacente uma concepção particular do papel
sindical e uma lógica da empresa e da modernização.
Nos “30 anos gloriosos”, no decurso dos quais se desenvolveu a relação salarial fordista,
estabeleceu-se uma espécie de compromisso sobre a partilha de papéis entre sindicatos e
empregadores/gestores. Esse compromisso assumiu duas características mais importantes,
como sublinharam os teóricos da Escola Francesa da Regulação:
-
de um lado, a aceitação por parte dos sindicatos das prerrogativas patronais em
matéria de organização do trabalho e de definição da intensidade do trabalho, da
Lapointe, Paul-André et Paul R. Bélanger, «La participation du syndicalisme à la modernisation des entreprises »,
em Murray, Gregor, Marie-Laure Morin et Isabel da Costa (dir.) (1996), L’état des relations professionnelles –
Traditions et perspectives de recherche, Octares Editions, pp. 284-310.
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tecnologia e da política de produtos, em contrapartida de aumentos salariais, com
efeitos na melhoria das condições de vida dos trabalhadores;
-
de um outro lado, a negociação entre empregadores e sindicatos, com intervenção
ou não directa do Estado, ao nível da empresa, sector, região, país de convenções
colectivas de trabalho que codificavam as normas que presidiam à regulação
colectiva das relações do emprego, nomeadamente, os princípios gerais da
evolução dos salários5.
Assumindo alguma diversidade nacional, em consequência das especificidades da
estrutura económica, das tradições políticas e das práticas sociais próprias a cada país, esse
compromisso constituiu as bases de um círculo virtuoso fordiano, que articulou uma produção de
massas e um consumo de massas, como factores de aumento de produtividade e de
acumulação de capital.
Deste modo, ainda que o período que decorre entre a 2ª Grande Guerra Mundial e o
início dos anos 70 tenha sido palco de intensa conflitualidade laboral e de grande repressão
sindical e exploração, ao mesmo tempo, foi uma sociedade caracterizada por um forte
crescimento económico, acompanhado de uma progressiva integração social 6 . O EstadoProvidência, nos países europeus com regimes políticos democráticos, através das suas
políticas de regulação e de distribuição foi parte integrante do processo de coesão social,
assegurando quer a estabilidade quer a previsibilidade. O contrato de trabalho típico desta época
caracterizou-se por uma relação de subordinação do assalariado relativamente ao empregador,
por tempo indeterminado, horário de trabalho completo, um local de trabalho bem circunscrito,
uma concepção hierárquica e colectiva das relações de trabalho e uma formalização bem
definida da progressão na carreira profissional, grandemente baseada na aprendizagem no
posto de trabalho, isto é, na antiguidade7.
Em resumo, entre o fim da 2ª grande Guerra até ao início dos anos 70, à lógica da
competitividade dirigida pelas direcções das empresas, contrapôs-se uma lógica sindical de
protecção dos assalariados na base do «job control» na maior parte dos países, ou seja, do
controlo «do posto de trabalho» e de repartição da riqueza produzida. Esta lógica sindical foi
bem sucedida no quadro que caracterizou esse período: crescimento económico, baixas taxas
de desemprego, situações homogéneas de emprego e políticas estatais keynesianas.
Contudo, no actual contexto de reforço da competitividade, que põe a concorrer entre si
assalariados, equipas de trabalho, unidades fabris, empresas e países, e a promover a
flexibilidade e a precariedade, a persistência desta lógica sindical de oposição, esvaziada dos
apoios sociais e económicos que a tornaram bem sucedida no passado, demonstra-se pouco
adequada e mesmo ineficaz. Esta lógica, muito presente no sindicalismo português, traduz-se
em comportamentos pouco inovadores no domínio da participação ou da negociação, tendendo,
pelo contrário, a defender a preservação das normas fordistas de protecção do assalariado.
Estes comportamentos expressam-se em slogans do tipo “a defesa dos direitos adquiridos” ou
“nem um trabalhador para a rua”, por nós muito conhecidos.
Entre outros, Boyer, Robert (1990), A Teoria da Regulação: Uma análise critica, S. Paulo, Livraria Nobel (Do
original, La Théorie de la Régulation. Une analyse critique (1986), Paris, La Découverte); Boyer, Robert et JeanPierre Durand (1998), L’après-fordisme, Paris, Syros (Primeira edição, 1993).
6 Durand, Jean-Pierre, «Le compromis productif change de nature!», em Durand, Jean-Pierre (dir.) (1996), Le
Syndicalisme au futur, Paris, Syros, pp. 19-55.
7 Supiot, Alain (Coord.) (1999), Au-delà de l’emploi – Transformations du travail et devenir du droit du travail en
Europe, Paris, Flammarion.
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Alguns sindicatos, por seu lado, devido à sua fraqueza, são obrigados a abandonar a
lógica da protecção e da repartição, nas modalidades anteriormente referidas, e a seguir a lógica
da competitividade, fazendo concessões mais ou menos extensas, como forma de viabilizar a
sobrevivência das empresas e salvaguardar os empregos.
Outros sindicatos, sobretudo de países do Norte da Europa, desde há muito que
adoptaram uma lógica bem diferente de protecção dos assalariados. Os sindicatos em vez de
centrarem as suas acções de luta em defesa “do adquirido”, ou “das conquistas dos
trabalhadores no passado”, desenvolvem estratégias ofensivas apontando caminhos e propondo
soluções viáveis para os problemas que vão emergindo. Esta lógica de acção sindical
caracteriza-se pela participação sindical aos diferentes níveis, nomeadamente ao nível da
empresa (co-gestão) e por reivindicações menos centradas sobre a preservação das normas
jurídicas ou de postos de trabalho taylorizados do que pelo desenvolvimento de uma negociação
colectiva muito abrangente orientada para a protecção social do trabalhador, independentemente
da sua situação face ao trabalho.
Além disso, consideram que os problemas actuais de competitividade das empresas no
mercado mundial se prendem com baixos níveis de produtividade e deficiente falta de qualidade
dos produtos, resultantes de ineficiências das organizações tayloristas-fordistas. Ou seja, de
uma organização de trabalho, fragmentada, rejeitada pelos assalariados, sobretudo pelos mais
jovens e escolarizados, que, pelo contrário, aspiram exercer um trabalho profissionalmente
valorizado e em condições de maior autonomia e democracia. Assim, o problema da
sobrevivência das empresas e da estabilidade do emprego nas empresas, nas actuais condições
concorrenciais, podem surgir como uma oportunidade para deixar para trás o trabalho rotineiro e
fragmentado e as condições penosas em que é exercido. Deste modo, as organizações sindicais
têm vindo a participar a diferentes níveis e a promover a reorganização do trabalho nas
empresas, pressionando o desenvolvimento do trabalho em equipa e a redução da hierarquia.
Assim, como referimos atrás, em vez de encarem com fatalismo as transformações tecnológicas
e os imperativos do mercado mundial, aceitam-nos como desafios, procurando retirar delas
vantagens sociais a favor dos trabalhadores.
Por conseguinte, retomando o que referimos no início do texto, sendo verdade que, na
generalidade dos países, os movimentos sindicais e os sistemas de relações laborais estão a ser
fortemente pressionados pelos fenómenos da globalização económica e pelas transformações
tecnológicas, económicas e sociais em curso, o seu grau de afectação é muito desigual. Existem
diferenças muito significativas entre países a diversos níveis. Como iremos ver na parte final
estas diferenças encontram expressão, por exemplo, nos tipos de modelos de organização de
trabalho e de qualificações que são promovidos nas empresas e nas políticas activas de
emprego. Antes, porém, importa conhecer as principais características de alguns sistemas de
relações laborais de cada país e as suas principais diferenças.
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2. A diversidade dos sistemas nacionais de relações laborais8
Contrariamente às teses de alguns autores como Dunlop e Kerr9 (1960) que postulavam
uma evolução universal (convergente) dos sistemas nacionais de relações laborais, o movimento
de industrialização não produziu uma única configuração, mas várias configurações ou modelos.
As particularidades históricas, culturais e evolutivas do processo de industrialização, dos
modelos de gestão, das características da mão-de-obra, do papel do Estado, da organização e
ideologia dos actores sociais (sindicatos e associações de empregadores) foram (e são) factores
que a par de outros engendraram (e engendram) sistemas nacionais de relações laborais muito
diferentes, por exemplo, dentro dos países industrializados do Ocidente, e mesmo, dentro dos
países que integram a União Europeia.
A elaboração de tipologias é uma forma usual de os diferenciar e agrupar. Por exemplo,
alguns autores agrupam os sistemas europeus da Europa dos 15 países em três grandes
agrupamentos: o modelo nórdico, que integra a Dinamarca, a Suécia, a Finlândia, a Islândia e a
Noruega; o modelo anglo-saxónico, que compreende o Reino Unido e a Irlanda; e o modelo
continental, que abrange os restantes países do centro e do Sul da Europa. Outros autores
preferem incluir os países nórdicos num modelo a que chamam germânico, o qual agrupa, além
destes países, a Alemanha, a Áustria, a Holanda, a Bélgica e o Luxemburgo e agrupam, os
países do Sul da Europa, num modelo que designam de latino10.
Outros, ainda, diferenciam quatro modelos na Europa: 1) Corporativismo de Norte, 2)
Parceria social central, 3) Pluralismo anglo-saxónico e 4) Confrontação latina. Este agrupamento
destaca as suas diferenças relativamente ao grau de coordenação versus confrontação, o papel
do Estado, bem como o tipo de relações dominantes entre os parceiros sociais.
Pela minha parte, diferencio e agrupo os sistemas nacionais de relações laborais
levando em conta a filosofia sindical que alimenta as orientações e as práticas de cooperação
e/ou de conflito no seio da empresa e da sociedade. A hipótese de que parto é de que as
Relações profissionais, relações industriais (industrial relations), relações laborais, relações de emprego e relações
de trabalho, são expressões conceptualmente equivalentes utilizadas para designar as relações de trabalho que se
estabelecem entre os assalariados, os empregadores e o Estado numa empresa, numa actividade económica, num
sector, numa região ou numa economia. Essas relações expressam-se em regras que podem ser “individuais ou
colectivas, directamente estabelecidas pelos actores implicados na relação de trabalho ou pelos seus
representantes (organizações de empregadores, organizações sindicais), enraizarem-se nos costumes e tradições
ou dar lugar à produção de regras formais (acordos internos, convenções colectivas, regulamentações, leis, etc.)”
(Dion G. (1986), Dictionnaire canadien des relations du travail, Québec, PUL, 2.ª édition, citado por Lallement,
Michel (1996), Sociologie des Relations Professionnelles, Paris, Éditions La Découverte. Os termos enunciados
prendem-se quer com o seu significado semântico nos países em que apareceram, quer com as preocupações
dominantes de áreas disciplinares que a partir do século XIX aprofundaram temas do domínio da relação e
regulação social do trabalho. De uma forma breve, podemos inscrever o termo relações laborais no repertório
linguístico do Direito do Trabalho (labor), os termos relações profissionais (relations professionnelles) e relações de
trabalho (relations de travail) na tradição das reflexões de economistas e sociólogos franceses e o termo relações
industriais (industrial relations) na tradição linguística anglo-saxónica. Este último termo apareceu nos EUA, onde
“industry” significa sector de actividade o que integra naturalmente também os serviços. O sentido desta expressão
é, portanto, bastante mais amplo do que aquele que a tradução portuguesa - indústria - lhe confere. Pela nossa
parte, optamos por uma utilização indistinta, ainda que privilegiando a noção relações laborais que consideramos
mais abrangente.
9
Kerr, C.; J. T. Dunlop; F. Harbinson e C. A. Mayers (1960), Industrialism and Industrial Man,
Cambridge, Mass: Harvard University Press.
10 Slomp, Hans (2000), Les Relations Professionnelles en Europe, Paris, Éditions de L’Atelier/Éditions Ouvrières.
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estratégias e as ideologias sindicais dão um sentido às instituições das relações laborais11. Esta
tipologia tem a vantagem de permitir diferenciar países fora da UE. De qualquer forma, faz-se
notar que qualquer que seja o agrupamento que se faça é sempre redutor, não abarcando, por
conseguinte, a sua diferenciação interna e a sua própria transformação.
Efectivamente, verificam-se diferenças importantes entre os diversos sistemas nacionais
dentro de cada agrupamento por um lado, e podem existir aspectos, dentro de um modelo, que
são comuns aos outros. Importa ainda sublinhar que os sistemas não se mantêm estáticos: as
características dos sistemas vão-se alterando e os sistemas nacionais de relações laborais estão
em permanente evolução.
Por exemplo, por pressão dos empregadores constatou-se ao longo da década de 90
uma tendência mais ou menos generalizada para a descentralização da negociação colectiva
nos países onde a negociação intersectorial ou a negociação sectorial é predominante. Em
alguns países, como sejam a Áustria, a Dinamarca, a Finlândia, a Alemanha, a Itália, a Holanda,
a Noruega e a Suécia, os acordos negociados a um alto nível (nacional, intersectorial ou
sectorial) têm aberto possibilidades de negociação suplementar ao nível da empresa e/ ou têm
introduzido cláusulas no sentido de permitirem às empresas, em condições definidas, o não
cumprimento de algumas condições de emprego estabelecidas nesses acordos. Assim, em
muitos países, esse processo de descentralização organizado ou controlado tem vindo a
traduzir-se na emergência de sistemas de negociação a vários níveis, bastante diferenciados e
flexíveis12.
No que se refere à transformação dos sistemas nacionais, importa referir os casos da
Irlanda e da França. O primeiro tem vindo a afastar-se de um regime pluralista próximo do anglosaxónico, mais concorrencial, e a aproximar-se de um modelo do tipo parceria social. O mesmo
desenvolvimento é observado em França com a diferença que aqui o Estado continua a ter um
papel muito forte de intervenção na regulação do sistema. Além disso, a transposição das
directivas comunitárias sobre matéria social tem conduzido em alguns países da UE (países
nórdicos) a um incremento da intervenção do Estado quando antigamente tais matérias eram
quase exclusivamente reguladas por convenções colectivas13.
2.1 A pluralidade dos modelos históricos: o modelo social-democrata, o modelo
comunista e o modelo liberal
A tipologia a partir do qual organizo os sistemas de relações laborais valoriza a forma
diferenciada como o movimento sindical integrou historicamente nos diferentes contextos
nacionais a acção social e a acção política14, entendendo por:
Rehfeldt, Udo (1996), “Cultures syndicales et analyse comparative dês modeles sociaux” em Murray, Gregor,
Marie-Laure Morin et Isabel da Costa (dir., L’état des relations professionnelles – Traditions et perspectives de
recherche, Octares Editions, pp. 546-561.
12 Schulten, Thorsten (2005), Évolution des systèmes nationaux de négociation collective depuis 1990, European
Foundation for the Improvement of Living and Working Conditions.
13 Leitão, Josefina, “O sistema de relações de trabalho português no contexto europeu: Algumas pistas para o
aumento da sua funcionalidade”, em Neves, A. O. (Coord.) (2001), Trabalho e Relações Laborais, Lisboa,
DEPP/MTS. Celta, 2001, pp. 213-231.
14 Cerdeira, M. Conceição e M. Teresa Rosa, “Cap. 4 - Políticas Sindicais”, em Pires de Lima, Marinús et al. (1992),
A Acção Sindical e o Desenvolvimento, Lisboa, Salamandra, pp.79-100.
11
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-
Acção social: a acção expressiva da consciência social (ou consciência de classe) que
emerge nas relações de produção e dá conta da situação de dominação vivida pelos
trabalhadores no local de trabalho.
-
Acção política: o pensamento e a acção socialista que ataca a direcção capitalista da
economia e propõe um modelo alternativo de sociedade, a sociedade
socialista/comunista.
A diferente integração das dimensões anteriores, ou, mais simplesmente, as
características de inter-relacionamento (ou ausência de relacionamento) entre sindicatos e
partidos políticos modelou modelos sindicais históricos bastante diferentes, com grandes
implicações nas práticas sindicais, em concepções distintas de participação e intervenção nas
empresas e na sociedade, em suma, na moldagem de diferentes sistemas de relações laborais.
O modelo social-democrata
Com variantes mais ou menos importantes, este modelo tem subjacente uma cultura sindical que dá
prioridade à modificação das relações de trabalho em detrimento da mudança de propriedade.
Esta cultura enraizou-se num compromisso histórico caracterizado pela coexistência de duas lógicas: o
mercado e a justiça distributiva, ou, de uma outra forma, a estabilização do capitalismo e a extensão dos
poderes do movimento sindical.
Este modelo desenvolveu-se em países onde se estabeleceram laços estreitos entre um
sindicalismo unificado e poderoso e um partido socialista (ou social-democrata) com forte
representatividade nacional, com longas permanências na acção governativa.
Essa estreiteza de relações não impediu que se tenha definido uma separação clara entre
reivindicações profissionais e acção política, resultando desta separação de funções e dos laços
orgânicos que solidamente articularam sindicatos e partidos socialistas, uma boa inserção social e política
do movimento sindical e de uma boa institucionalização dos conflitos laborais.
Este modelo revela-se altamente consensual, baseado na cooperação e colaboração entre os parceiros
sociais a diferentes níveis (nacional, sectorial, empresa) e sobre os domínios económicos e sociais. Os
sindicatos prestam aos associados um conjunto muito amplo de serviços (segurança na doença,
segurança na reforma, segurança no desemprego, etc.) e contam com uma taxa de sindicalização muito
elevada.
O estado assume neste modelo um papel mediador e conciliador face aos conflitos colectivos não autoregulados pelos sindicatos e empregadores.
Alemanha, Dinamarca, Suécia, Bélgica, Noruega e Finlândia são países representativos de
variantes do modelo social-democrata.
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O modelo comunista
Este modelo caracteriza-se pela dominância de sindicatos de tipo comunista, ou seja, pela
existência de uma relação de dependência/ subordinação dos sindicatos e da acção sindical dos partidos
e ideologias políticas comunistas (estalinistas ou anarco-sindicalistas). No caso dos países do antigo
bloco comunista europeu (Polónia, Hungria, Bulgária, ex-URSS, etc.), que tipificam este modelo na sua
forma mais pura, esta subordinação reduziu os sindicatos a meros órgãos de enquadramento dos
trabalhadores e de porta-vozes das posições do Partido (Comunista).
Incluímos também nesta família países como Portugal, Itália, França e Espanha, ou seja, os
países pluralistas do Sul da Europa (mediterrânicos). Apesar das diferenças que os marcam e das
transformações que atravessam hoje os seus sistemas de relações laborais, ao longo dos tempos, o
sindicalismo mais representativo perfilhava uma cultura sindical revolucionária da acção sindical (anarcosindicalismo). Nesta perspectiva, os sindicatos eram o “braço armado” do partido (comunista) para
derrubar o capitalismo e construir a sociedade socialista/comunista. Ao sindicalismo cabia, por
conseguinte, um papel dependente e subordinado do Partido (Comunista).
As clivagens ideológicas e políticas entre aqueles que concebiam a via revolucionária para a
transformação económica e social da sociedade capitalista e outros que a percepcionavam de uma forma
mais reformista, ou seja, mais gradativa e negociada, gerou a divisão sindical. Assim, uma outra
característica dos países do Sul da Europa é a existência de fortes divisões sindicais (pluralidade sindical),
fundadas em projectos doutrinários de transformação social muito diferentes.
Contrariamente aos países da família do modelo social-democrata, a filosofia laboral dominante
nas relações que estabelecem no mundo do trabalho, baseia-se no princípio adversarial, ou seja, de
oposição e de conflito. Desta forma, a institucionalização dos conflitos laborais é mais precária do que
nos países do modelo social-democrata. Existe uma baixa participação dos trabalhadores ou dos seus
representantes nas empresas e frequentemente há desrespeito pelos compromissos assumidos, quer
acordados em concertação social na Comissão Permanente de Concertação Social quer por via da
negociação colectiva.
Neste modelo, a intervenção do Estado nas relações laborais é mais acentuada e tem um papel
primordialmente importante na definição dos mínimos salariais, na extensão dos acordos colectivos ou
nas questões litigiosas. Os sindicatos têm vindo neste modelo a registar um declínio bastante significativo
nas últimas duas décadas.
O modelo liberal
Este modelo define-se pela quase inexistência de relação entre o movimento sindical e os
partidos políticos. Encontra a sua melhor tipificação no sindicalismo americano tal como se desenvolveu
historicamente.
À semelhança do sindicalismo do Reino Unido, o sindicalismo americano tem uma atitude de
desconfiança relativamente à ingerência do Estado e dos Partidos políticos nas questões laborais.
O modelo liberal define-se pela aceitação do sistema capitalista sem nenhuma referência a um
projecto socialista de tipo europeu, por uma perspectiva muito economicista de defesa dos interesses dos
assalariados e por uma fraca capacidade de intervenção no sistema económico e social nacional.
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2.2
Algumas especificidades do sistema de relações laborais alemão
Vulgarmente referido como exemplo de um modelo “maduro” de relações laborais, o
sistema alemão é uma variante do modelo social-democrata, como referimos anteriormente. Este
sistema desenvolve-se no pós-2.ª Guerra Mundial, enquadrado por uma ideologia partidária
moderada e pelos esforços sociais colectivos de procura de consensos entre os actores sociais
como via para a reconstrução do país e para o desenvolvimento económico e social.
A manutenção da estabilidade social permitiu à Alemanha Ocidental um crescimento
económico quase contínuo, com moderadas taxas de crescimento dos preços e do desemprego.
O sistema de relações laborais reflecte essa estabilidade para a qual também contribuiu
fortemente.
a) Unidade organizativa e cooperação económica
Um elemento importante do sistema é a unidade organizativa tanto dos trabalhadores
como dos empregadores. Os trabalhadores estão organizados por sindicatos sectoriais. Cada
sindicato representa os trabalhadores das empresas de um sector de actividade, quaisquer que
sejam as suas profissões ou categorias profissionais, seguindo em geral o princípio de numa
mesma empresa não haver mais do que um único sindicato.
Os sindicatos de cada sector agrupam-se em federações, que a nível regional, formam
estruturas permanentes e profissionalizadas para que possam cooperar com os poderes locais e
com os empregadores na procura das melhores soluções para os problemas enfrentados pelos
diversos sectores de actividade. As federações agrupam-se em confederações.
Em correspondência com o princípio inscrito nos estatutos: “Só a unidade dos
trabalhadores pode contrabalançar o poder económico e político dos chefes de empresa e dos
empregadores”, a DGB (Deutscher Gewerkschaftsbund), confederação criada em 1949, agrega
mais de 80 % dos efectivos sindicais da Alemanha, o que corresponde a mais de 7 milhões de
aderentes. Estes aderentes repartem-se por um certo número de federações profissionais. A
federação mais importante e influente é a da metalurgia - I.G. Metall , seguindo-se-lhe a
federação da química - BGC.
Paralelamente à DGB, existem ainda outras organizações como a federação alemã dos
funcionários (DBB), o sindicato dos empregados (DAG), a pequena confederação dos sindicatos
cristãos (CGB). No entanto, o seu peso é muito marginal relativamente à DGB.
Este quase monopólio sindical é consolidado por um conjunto de serviços que a DGB
presta aos seus associados em todos os domínios da vida social: segurança na doença e
previdência, reforma, subsídio de desemprego, etc. A DGB possui, por outro lado, um importante
poder financeiro controlando numerosas empresas, designadamente, do sector bancário e obras
públicas. É por assumir estas importantes responsabilidades de gestão que, na opinião de
muitos analistas, a DGB não hesita em assumir responsabilidades em matéria económica, tanto
ao nível do país, como ao nível sectorial, como ao nível da empresa.
Ligado ao partido social-democrata alemão (SPD), a DGB, considera que a melhor forma
de defender os trabalhadores e os seus interesses é de participar na gestão ou seja de co-gerir,
já que só assim pode ter a certeza que as decisões tomadas correspondem aos interesses que
defende no médio ou no longo prazo.
10
b) Negociação colectiva e co-gestão
A contratação colectiva está muito regulamentada na Alemanha, razão pela qual o
sistema é designado de “legalista”. Não somente a forma de contratação, mas igualmente o
próprio conteúdo, os procedimentos e os actores da negociação.
As convenções colectivas concluídas entre as organizações sindicais e patronais
negoceiam-se de uma forma geral ao nível regional e por sector de actividade. Estas
convenções podem ser muito gerais, normalmente designadas de “Acordos-Quadro”
(plurianuais) sobre as condições gerais de trabalho ou visar unicamente, no caso de um acordo
“vulgar” (a maior parte das vezes anual), a evolução dos salários, a duração do tempo de
trabalho, as férias, etc. As convenções somente implicam as partes que procederam à sua
negociação e as subscreveram e abrangem unicamente os seus membros.
A forte vinculação dos actores sociais à ideia de paz social conduz à aplicação leal dos
acordos negociados e faz do conflito aberto, isto é, da greve um último recurso. Tal torna-se
possível porque tanto os trabalhadores como os empregadores se encontram bem organizados
em estruturas poderosas por sector de actividade. Aliás, nos termos da lei alemã, qualquer
ruptura do acordo, ou seja do seu não cumprimento, pode ser objecto de uma forte penalização.
Os acordos de nível inter-profissional são raros na Alemanha, mas importantes
relativamente às matérias que abordam.
O dispositivo muito elaborado de negociação colectiva sectorial é complementado pelo
sistema designado de co-gestão económica (ou co-determinação) ao nível das empresas.
A lei que regula a co-gestão obriga à existência nas empresas, com mais de 500
trabalhadores, de organismos de fiscalização (supervisão) da acção dos conselhos de gestão.
Estes organismos com funções de controlo da gestão das empresas podem tomar iniciativas de
propostas a serem submetidas aos órgãos de direcção15.
Para o caso dos sectores do carvão e do aço (primeiros sectores onde a co-gestão foi
introduzida) as leis de co-gestão vão ainda mais longe em matéria de representação dos
trabalhadores. Aqui, o controlo da gestão é confiado a dois organismos: o conselho de
fiscalização 16 e o colégio de direcção ao qual compete aplicar as decisões do conselho de
fiscalização17.
A lei permite a criação em todos os estabelecimentos com 5 ou mais trabalhadores de
um conselho de estabelecimento - o Betriebsrat (sinteticamente BR), equivalente à nossa
comissão de trabalhadores18. O papel do BR é extremamente importante. Não tendo o poder de
negociar convenções colectivas, domínio exclusivo dos sindicatos, o BR pode, todavia, negociar
A representatividade dos assalariados na composição dos organismos de fiscalização é definida pelas leis sobre
a co-gestão da seguinte forma: um terço nas empresas de 500 a 2000 assalariados e metade nas empresas com
mais de 2000, competindo, neste caso, a eleição do presidente aos accionistas.
16 O conselho de fiscalização tem uma constituição de 11 membros: 5 são eleitos pelos trabalhadores, 5 pelos
empresários e o restante designado pelas duas partes, com a condição de não poder trabalhar na empresa nem
tão-pouco possuir nela interesses financeiros.
17 O conselho de direcção é composto por três membros, sendo um director escolhido pelos cinco representantes
dos trabalhadores (normalmente o director dos recursos humanos) e dois pelos empresários. No caso das
sociedades anónimas, os três membros são indicados pelos accionistas, e no conselho de fiscalização os delegados
dos trabalhadores são apenas um terço.
15
O BR, eleito por 3 ou 4 anos e sem monopólio sindical de candidatura, é composto unicamente por assalariados.
Se uma empresa possui vários conselhos de empresa é criado um conselho central de empresa. Se a empresa é
um grupo, os diferentes conselhos centrais de empresa podem criar um conselho do grupo.
18
11
com o empregador e concluir acordos de empresa desde que se tratem de matérias não
reguladas nas negociações sectoriais19.
A lei reconhece ainda ao BR o direito de acompanhar os recrutamentos, os
despedimentos e as mudanças sobre as quais se pode opor em certas condições (direito de
veto). Em caso de desacordo, o diferendo é arbitrado por uma comissão de conciliação exterior à
empresa cuja sentença é obrigatoriamente aceite.
Este mecanismo de representação e co-gestão que assegura o consenso e amortece os
conflitos ao nível da empresa, é ainda complementado por um sistema de participação dos três
actores a nível nacional (Konzertiet Akion), o qual consiste em reuniões periódicas de
representantes dos organismos sindicais, empresariais e governo, com o objectivo de discutir
informalmente as grandes directrizes da política económica governativa.
Este sistema de participação visa mais uma vez encontrar consensos e comprometer
informalmente os actores sociais, responsabilizando-os, nas orientações da política económica
do governo.
O sistema contratual e institucionalizado que acabamos sinteticamente de descrever
facilitam de tal forma o compromisso e o consenso entre os actores que a greve só muito
raramente vem a ocorrer na Alemanha. Por exemplo, para poderem desencadear uma greve, os
sindicatos dos serviços públicos necessitam de autorização prévia dos sindicatos dos outros
sectores.
2.3
Os Casos da Dinamarca, Suécia, Noruega e Finlândia
Os sistemas de relações profissionais deste grupo de países escandinavos constituem
igualmente variantes do modelo social-democrata, assemelhando-se nos seus traços gerais ao
modelo alemão que acabamos de descrever. Distinguem-se deste em dois elementos principais:
pela grande importância dada à negociação nacional interprofissional e pela forte representação
dos sindicatos nos organismos estatais.
São países com um sindicalismo muito poderoso, onde as taxas de sindicalização se
têm mantido mais ou menos estáveis ao longo dos anos entre 70 a 80%. A taxa de taxa de
cobertura de assalariados abrangidos por contratação colectiva é também elevada (70 - 90%).
Na Dinamarca, a central sindical LO actua numa situação de quase monopólio.
Na Suécia, a confederação LO associa quase 90% dos trabalhadores da indústria. Mas,
neste país, os empregados do sector público e privado estão associados numa confederação
própria, o TCO. Existe, para além disso, um sindicato de quadros e profissões liberais, o SACO.
Este pluralismo sueco, de base categorial, não impede a cooperação, mas a grande fonte do
poder sindical concentra-se na LO.
Tal como a confederação alemã (DGB), o sindicalismo escandinavo possui um grande
poder financeiro e um grande número de empresas. Por exemplo, a LO sueca é uma associada
maioritária da mais importante empresa do país da construção civil, assim como possui uma das
maiores tipografias, uma agência de férias e turismo e um jornal diário com uma tiragem de 500
mil exemplares.
A lei reconhece ainda ao BR o direito de acompanhar os recrutamentos, os despedimentos e as mudanças sobre
as quais se pode opor em certas condições (direito de veto). Em caso de desacordo, o diferendo é arbitrado por
uma comissão de conciliação exterior à empresa cuja sentença é obrigatoriamente aceite.
19
12
Tanto na Dinamarca como na Noruega e Finlândia, as convenções colectivas e os
acordos são negociados ao nível nacional pelas duas poderosas confederações sindicais (LO) e
patronais (SAF, no caso da Suécia). Certamente que não são tratados, a nível confederal,
aspectos específicos de cada sector, cuja matéria de negociação é normalmente atribuída às
federações de sector. Todavia, nenhuma greve importante pode ser declarada por uma
federação sem o acordo da confederação. O dever de preservar a paz social é também nestes
países uma questão extremamente importante.
No caso da Suécia, a estreiteza de laços entre o movimento sindical e o Partido SocialDemocrata (frequentemente responsável pela governação do país), faz com que muitas das
medidas que visam a paz social sejam definidas e regulamentadas por lei. Tal é o caso, por
exemplo, da lei de 1972 que tornou obrigatório, a representação dos trabalhadores nos
conselhos de administração das empresas com mais de 100 pessoas ao serviço. Esta
participação faz-se por intermédio do sindicato que pode nomear dois representantes do
conselho.
2.4.
O caso do Reino Unido
O sistema de relações profissionais britânico é o mais antigo da Europa, na medida em
que foi aqui que a industrialização fez emergir os primeiros movimentos organizativos de
trabalhadores. Os trabalhadores agruparam-se por ofícios/profissões (craft unions), forma
organizativa ainda hoje prevalecente no Reino Unido e que se diferencia dos modelos
anteriormente analisados. Com efeito, nos países já descritos prevalece a organização dos
trabalhadores em sindicatos e federações inter-profissionais (de todas as profissões) por ramo
de actividade.
A grande central sindical do movimento sindical é a Trade Union Congress (TUC), criada
em 1868, e que representa cerca de 90% dos sindicalizados da Grã-Bretanha. Foi a TUC que no
final do século XIX criou o Partido Trabalhista (Labour Party) e, até aos anos 80, salvo indicação
em contrário, por escrito, o sindicalizado tornava-se simultaneamente membro do Partido
Trabalhista (Labour Party). Assim, uma parte da cotização sindical, retida pela entidade patronal
na fonte, ou seja sobre a folha de salário (o check off), era automaticamente canalizada para o
Partido Trabalhista (Labour Party).
Um outro regime abolido nos anos 80 durante a governação do Partido Conservador
liderada por M. Thatcher, fortemente influenciada pelo neo-liberalismo, foi o closed shop sistema de “adesão forçada”. Este regime permitia aos sindicatos acordar com os empregadores
cláusulas reservando ou dando preferência ao emprego aos seus filiados.
O sistema de relações profissionais britânico não é enquadrado por uma Constituição tal
como acontece na generalidade dos países europeus e o peso da lei e da regulamentação
estatal é muito reduzido. De facto, estamos perante um sistema caracterizado pela inexistência
de um esquema regulamentador rígido, sendo a intervenção do Estado vista, tanto pelos
empregadores como pelos sindicatos, de uma forma geral, como prejudicial ao bom
funcionamento do sistema.
A sua originalidade reside no desenvolvimento de um conjunto de leis avulsas e
sobretudo num vasto direito de usos e costumes (common law), isto é, leis tradicionais não
escritas e preceitos que adquiriram estatuto como usos e costumes. Este sistema denomina-se,
por isso de “voluntarista”.
Os acordos colectivos, concluídos entre um ou vários sindicatos e um ou vários
empregadores, constituídos ou não em associação patronal, não possuem geralmente força
13
obrigatória de aplicação, nem entre as próprias partes subscritoras da convenção.
Diferentemente do que acontece em Portugal, não existe, para além disso, procedimentos de
extensão dos acordos negociados.
Às negociações de tipo clássico, de empresa ou de ramo, juntam-se acordos
transversais por categorias profissionais ou profissões. Diferentemente do que acontece em
muitos países, designadamente em Portugal, não existem nas empresas da GB um canal de
representação duplo (isto é, comissões de trabalhadores e delegados sindicais). Os shop
stewards, únicos organismos existentes, são, ao mesmo tempo, representantes sindicais e dos
trabalhadores.
Uma empresa pode, se quiser, perfeitamente recusar toda e qualquer representação
colectiva nela. Pode, por outro lado, negociar, se quiser, acordos com várias organizações para
a mesma categoria profissional de assalariados. No caso de sectores não organizados e sem
força colectiva, como são os casos da agricultura, hotelaria e turismo e onde predominam as
empresas muito pequenas e dispersas, aí a lei intervém através da criação de conselhos de
rendimentos (Wages Councils) compostos por representantes dos dois actores e membros
independentes, a quem compete estabelecer os salários e outras condições de trabalho.
Para as situações de conflito relacionadas com o desenvolvimento da negociação,
existe, na GB, um sistema de conciliação e arbitragem público, mas autónomo relativamente ao
ministério da tutela do emprego (Ministério do Trabalho). O princípio é de só em último recurso
os actores recorrerem à arbitragem. Esta é voluntária e pode ser solicitada por qualquer das
partes.
2.5 O modelo americano
Pode ser considerado uma variante do sistema de relações profissionais da GrãBretanha, já que foi neste que se inspirou na fase da sua criação. O seu percurso histórico
adaptou-o naturalmente às particularidades do contexto em que se desenvolve para o
transformar num modelo já muito diferente daquele que encontramos na GB.
O sindicalismo americano começou por se organizar por imitação do da GB por
ofícios/profissões, que se agregaram na confederação AFL. No entanto, o desenvolvimento das
grandes empresas em articulação com a adopção dos princípios científicos tayloristas-fordistas
de organização do trabalho, fez emergir nas fábricas um grande grupo de trabalhadores na sua
maioria originários dos campos sem qualquer formação fabril.
Para enquadrar estes trabalhadores, a AFL criou em 1932 a CIO (Comissão para a
Organização Industrial), organizada segundo uma lógica de sindicatos de ramos de actividade. A
AFL-CIO passa a ser constituída por grupos profissionais e sociais muito heterogéneos, com
poucas afinidades, situação que levantou grandes problemas em termos de organização das
lutas sindicais.
Para muitos analistas, foram as dificuldades de coesão no desenvolvimento de acções
de luta colectivas comuns, a razão principal que fez emergir uma filosofia muito pragmática do
papel sindical na sociedade americana. Trata-se de um papel muito “economicista” assente na
ideia de que ao sindicalismo incumbe defender os trabalhadores e melhorar o seu poder de
compra na empresa, ao poder político governar e aos gestores o poder de administrar e gerir. Os
sindicatos recusam, assim, não só envolverem-se na esfera do político, como de partilharem a
gestão da empresa. Paralelamente, os sindicatos criam um conjunto de serviços de apoio aos
trabalhadores (subsídio de reforma e doença, agências de viagens, formação, etc.) como
estratégia indutora da sindicalização.
14
A organização do sistema de relações profissionais nos Estados Unidos baseia-se
actualmente numa lei publicada em 1937 (Lei de Wagner), modificada em 1947 pela Lei de TaftHartley.
Esta Lei determina que a negociação de qualquer nível (sector industrial, empresa,
estabelecimento, oficina, etc.) tem que ser desenvolvida pelo sindicato mais representativo
nesse nível. Desta forma, a Lei obriga à realização de uma eleição de certificação da
representatividade dos vários sindicatos presentes nesse nível. A obtenção da maioria torna o
sindicato no único interlocutor de negociação representativo dos trabalhadores, no nível a que
diz respeito. Esta certificação só pode ser posta em causa por uma outra eleição, por solicitação
do empregador.
Todos os assalariados, do nível em que foi feita a eleição, são obrigados a aderir ao
sindicato (union shop) e a sua cotização sindical é retida na fonte, isto é, pela empresa sobre a
folha de salário. Se na eleição a maioria dos trabalhadores se manifestar contrário à presença
sindical na empresa, esta não pode ter sindicatos.
Utilizando a possibilidade prevista pela própria Lei Taft-Hartley no sentido de qualquer
Estado da federação poder interditar as cláusulas de union shop, são já quase duas dezenas
(21) o número daqueles que as interditaram.
Face às características do sistema que acabámos de enunciar, as negociações
colectivas desenvolvem-se predominantemente ao nível da empresa e, não raras vezes, ao nível
do estabelecimento ou mesmo oficina.
2. 6
O modelo Japonês
Ao contrário dos países ocidentais onde prevalecem, como vimos, os sindicatos de
profissão ou ramo e a empresa não são senão o ponto de aplicação local da organização
sindical, no Japão, o sindicato estrutura-se predominantemente sobre a empresa. É ao nível do
sindicato de empresa que se efectua a adesão individual.
Num segundo nível, os sindicatos de empresa agrupam-se em federações de ramo ou
em uniões locais e, num terceiro, numa confederação nacional - a Shin-Rengo, resultante da
junção do conselho geral dos sindicatos (Sohyo) e confederação japonesa de sindicatos
(Rengo), nos anos oitenta.
De uma forma geral só existe um sindicato por empresa. Este representa todas as
categorias profissionais com excepção dos quadros superiores. Normalmente os sindicatos de
empresa são muito autónomos e beneficiam de uma cláusula de closed-shop (adesão
obrigatória).
Teoricamente existem três níveis possíveis de negociação (nacional, ramo e empresa).
Na prática é ao nível da empresa que quase sempre as negociações de desenvolvem.
Os sindicatos são na empresa privada japonesa uns contribuintes importantes para a
forte integração das relações sociais que as caracterizam. A boa qualidade das relações sociais
nas empresas japonesas é frequentemente apontada como um elemento central da sua forte
competitividade económica.
De facto, a integração completa das relações sociais na empresa apresenta aspectos
particularmente positivos: a participação sindical é reconhecida e profissionalmente apreciada,
as regras do jogo tornam-se claras e aceites por todos.
15
Por outro lado, a autonomia de que os sindicatos de empresa dispõem permite que
desenvolvam uma acção sindical flexível e adaptável às realidades micro-sociais ou económicas
muito diferenciadas, onde se integram.
Estas relações sociais são efectivamente muito positivas e eficazes nas empresas onde
elas existem, isto é, nas grandes empresas modernas. No entanto, uma parte importante dos
assalariados trabalha numa situação pouco estabilizada e protegida, ou seja, em pequenas e
médias empresas (subcontratadas das grandes empresas) onde a presença sindical é muito
fraca.
Ora, como, por um lado, no Japão, não existem mecanismos de extensão das condições
sociais vigentes nas grandes empresas aos trabalhadores das empresas subcontratadas, como,
por outro lado, o sindicalismo japonês não dispõe de força e apoio político que lhe permita agir
no quadro legislativo ou regulamentar, a situação social no Japão é marcada por uma grande
fractura no seio do mundo do trabalho. Assim, à medida que desce a escala da subcontratação,
desce igualmente a escala dos níveis de protecção social dos trabalhadores. O que conduz ao
seguinte paradoxo: quanto pior e precária é a situação sócio-económica dos trabalhadores, mais
fraca é a sua protecção sindical.
2.7
O modelo mediterrânico: Itália, França e Espanha
O modelo mediterrânico de relações laborais integra quatro variantes que são os casos
italiano, francês, espanhol e português. Como traços marcantes comuns destes sistemas, realço
a existência de pluralismo sindical, estruturado em torno de ideologias políticas (comunismo e
socialismo mais ou menos moderado) e religiosas (inspiração cristã); a maior representatividade
dos sindicatos com uma ideologia comunista e, consequentemente, a predominância de relações
sociais entre os actores baseadas no princípio de “oposição e conflito”, em vez do princípio de
colaboração e participação (conflitual), presente no modelo escandinavo.
O pluralismo manifesta-se na existência de várias estruturas representativas dos
mesmos trabalhadores. Não raras vezes estas estruturas entram em conflito no decorrer de
processos negociais. Assim, no plano confederal, encontramos por ordem decrescente de
importância:
Em Itália: a CLIL, maioritariamente ex-comunista, a CISL de sensibilidade democrata
cristã e a UIL de maioria socialista.
Em Espanha: a UGT próxima historicamente do partido socialista e as comissões
operárias (CO) que estão na direcção do partido comunista.
Em França: a CGT (Confederação Geral do Trabalho) de influência comunista, a CFDT
(Confederação Francesa Democrática do Trabalho) de sensibilidade maioritariamente socialista
com orientações autogestionárias, a FO (Confederação Geral do Trabalho - Força Operária) de
ideologia revolucionária, a CFTC (Confederação Francesa dos Trabalhadores Cristãos) como o
nome indica de inspiração cristã e, por último, a CFE-CGC (Confederação Francesa do
Enquadramento - Confederação Geral de Quadros), confederação específica de quadros
técnicos e superiores.
As consequências deste pluralismo são bastante negativas em termos de eficácia e de
poder do movimento sindical. Periodicamente, sobretudo em conjunturas de crise, os
movimentos sindicais têm procurado desenvolver formas de unidade de acção.
No interior das empresas italianas a “unidade” é gerida pelo Conselho de Empresa,
único canal de representação dos trabalhadores aí existente. Constituído por trabalhadores
16
eleitos, o Conselho de Empresa, representa o elo de ligação entre os interesses dos sindicatos
nas empresas e os interesses dos trabalhadores perante os empresários. Muitos analistas
consideram ser no âmbito deste organismo que se tem desenvolvido melhor a “unidade
orgânica”, apesar de integrar delegados sindicais pertencentes aos diferentes sindicatos.
A negociação colectiva desenvolve-se de uma forma «articulada» a vários níveis: nível
interprofissional ou interconfederal, nível de sector ou de ramo e nível de empresa. Nenhum
destes níveis é dotado de competências específicas mas é sobretudo escolhido segundo uma
tradição relativamente estável.
Há contratos nacionais de categoria, que são os contratos fundamentais e que regulam e
são na prática a fonte das relações profissionais. São eles que estabelecem os mínimos de
remuneração e o principal clausulado que afecta a massa salarial. Esses contratos nacionais são
articulados com os contratos ao nível de empresa, ou seja, adaptam as grandes linhas do
contrato nacional à especificidade da empresa, regulamentando questões como prémios de
produtividade, avaliação do desempenho, horários, etc.
O nível de contratação inter-profissional ou interconfederal abrange todos os sectores da
economia e regula matérias de interesse geral, como seja, a escala móvel que indexa
automaticamente os aumentos salariais aos aumentos dos preços, os salários mínimos
nacionais, as regras sobre despedimentos colectivos, reestruturações económicas, etc.
O nível de empresa privilegia a organização do tempo de trabalho, sobretudo por
ocasião da introdução de novas tecnologias.
A hierarquia dos contratos não é estrita: as convenções colectivas não são susceptíveis
de serem alargadas pelo Estado; um acordo de empresa pode desvirtuar uma convenção
nacional e pode ser alargada a sua aplicação aos não sindicalizados. Uma mesma matéria pode
ser negociada no conjunto dos níveis negociais e sem que nenhum destes prevaleça claramente.
O sistema espanhol e o sistema francês são bastante semelhantes ao italiano. Importa,
no entanto, assinalar duas diferenças maiores.
A primeira diz respeito ao facto de tanto em França como em Espanha existirem dois
órgãos de representação dos trabalhadores na empresa: sindical, que é feita pelos delegados
sindicais os quais constituem as secções sindicais das empresas; e comités de empresa
(França) ou delegados de pessoal (Espanha), eleitos democraticamente pelos trabalhadores. A
tendência em Espanha é para os delegados de pessoal serem simultaneamente delegados
sindicais.
A segunda relaciona-se com os níveis em que se desenvolve a negociação. Tanto no
sistema espanhol como no francês existem vários níveis possíveis de desenvolvimento da
negociação colectiva: empresa ou estabelecimento; ramo de actividade mais ou menos amplo;
território nacional, no qual intervém fortemente o Estado; comunidades geográficas autónomas,
quadro dito funcional em Espanha.
Mas, num e noutro país, existe um princípio de ordem: prioridade à lei sobre o acordo
colectivo; o acordo inter-profissional sobre o profissional; o acordo nacional sobre o local; o
acordo de ramo sobre o acordo de empresa; proibição de qualquer cláusula desfavorável ao
trabalhador no acordo de âmbito mais restrito relativamente a outro considerado juridicamente
superior.
17
3 O sistema de relações laborais português
Quando se analisa a história das relações laborais em Portugal é necessário distinguir
três grandes períodos marcadamente distintos: antes de 1993, entre 1933 e 1974 e após a
Revolução de Abril de 1974. O que separa as diferentes fases é a instauração do Estado
Corporativo e, mais concretamente, a publicação do Estatuto de Trabalho Nacional em 26 de
Setembro de 1933.
3.1
A fase Pré-Corporativa: o início do associativismo sindical e patronal
Um pouco à semelhança do que acontece nos outros países europeus, as primeiras
associações sindicais e patronais são criadas ainda na primeira metade do século XIX. No
entanto, nesta época, a industrialização portuguesa era ainda muito incipiente e as primeiras
associações operárias assumiram sobretudo funções mutualistas de protecção e apoio social,
Associações de Socorros Mútuos, já que com a instauração do Liberalismo se haviam extinto os
organismos corporativos com funções similares (as Corporações de Ofícios).
Um marco importante desse movimento associativo foi a fundação do Centro Promotor
dos Melhoramentos das Classes Laboriosas em 1852. Este centro dinamizou o associativismo
operário durante a 2.ª metade do século XIX.
Data também desse período a criação de algumas associações empresariais/patronais
hoje existentes como seja a Associação Industrial Portuguesa, a Associação Industrial
Portuense, a Associação Comercial de Lisboa e a Associação Comercial do Porto. Porém, se no
caso das classes laboriosas o associativismo nasce da necessidade de protecção social, no
caso da organização patronal o objectivo foi a constituição de forças de pressão política, como
forma de influenciarem as decisões governamentais em matéria de taxas alfandegárias,
cambiais e outras medidas de apoio económico.
Com a progressão do processo de industrialização aumenta o número de operários e a
sua concentração fabril. Estes factos, conjugados com as más condições de trabalho nas
fábricas (o horário de trabalho chegava a ultrapassar catorze horas diárias) geraram um forte
sentimento de exploração que conduziu à organização de greves, tumultos, etc.
O despertar para a "questão social" conduz à intervenção do Estado na regulação das
condições de trabalho, à semelhança do que aconteceu noutros países. Pelo Decreto de 14 de
Agosto de 1889 (regulamentado por três Decretos de 19 de Março de 1891) são criados os
Tribunais de Árbitros Avindores20. O trabalho de menores e algumas normas de protecção da
maternidade da mulher trabalhadora, ainda que restrito à indústria, são regulamentadas pela
normalmente considerada primeira Lei Social - Decreto de 10 de Fevereiro de 189021. A jornada
de 8 horas para os manipuladores de tabacos representa a primeira intervenção legislativa sobre
duração de trabalho e foi publicada em 23 de Março de 189122.
Eram órgãos de composição tripartida (Presidente e Vice-Presidente escolhidos pelo Governo de entre sete
nomes designados pela Câmara Municipal da área do tribunal; vogais patronais e trabalhadores, em número igual,
eleitos por sufrágio directo de colégios de eleitores patrões e trabalhadores, separadamente, da respectiva área.
21 Rectificado pela Lei de 7 de Agosto de 1890. Só virá a ser regulamentado pelo Decreto de 14/4/91,
complementado pelo Regulamento de 16/3/1893.
22 Surgirão mais tarde intervenções legislativas, com carácter mais genérico, no horário e duração de trabalho:
Decreto de 3/8/1909 - descanso semanal obrigatório de 24 horas consecutivas; Leis nºs 295 e 296 de 22/1/1915 20
18
Do conjunto de diplomas saídos desta primeira intervenção governamental no mundo do
trabalho, salientamos o Decreto-Lei de 9 de Maio de 189123 que, pela primeira vez, autoriza e
regulamenta a constituição de associações profissionais. Neste enquadramento, as sociedades
compostas de mais de vinte indivíduos, da mesma profissão ou profissões correlativas, tendo por
fim o estudo e a defesa dos interesses económicos, industriais, comerciais ou agrícolas,
deveriam adicionar a designação de associação de classe.
Podendo ser compostas exclusivamente de patrões (comerciantes, industriais ou
lavradores), exclusivamente de empregados, operários ou trabalhadores rurais ou mistos, a
constituição formal passava pela aprovação governamental dos seus estatutos 24 . Depois da
regulamentação das associações de classe, o movimento associativo operário progrediu
consideravelmente. O número de associações de carácter sindical evoluiria de 24 em 1876 para
135 em 1903.
O movimento sindical desenvolveu-se com uma certa amplitude também a níveis
organizativos superiores. Formam-se federações, constitui-se a União das Associações de
Classe de Lisboa (Casa Sindical), depois a União Operária nacional (U.O.N.), a seguir a
Confederação Geral do Trabalho (C.G.T.). A legalização desta evolução vem a ser feita através
do Decreto n.º 10415, de 27 de Dezembro de 1924. Permite não apenas a reunião das
associações de classe em federações ou uniões, independentemente de autorização
governamental e mediante simples depósito dos estatutos no Ministério do Trabalho, como dota
essas organizações, assim como os sindicatos, de personalidade jurídica para todos os efeitos
legais, designadamente, para celebrar contratos colectivos de trabalho.
A publicação da Lei de 9 de Maio traz também um novo fôlego ao associativismo
patronal. Ao nível global assinalamos a constituição de 113 associações patronais e 17 de
composição mista entre 1892 e 1910, 131 associações do primeiro tipo e 21 do segundo entre
1911-1925 e, pela mesma ordem, 79 e 8 entre 1926-193325.
Na opinião de alguns autores, Portugal possuía, no final dos anos vinte, um conjunto de
leis sociais das mais avançadas da Europa. No entanto, uma certa progressão “normal” das
relações laborais foi interrompida com o derrube da I República, pelo movimento de Maio de
1926 e implantação do Estado Corporativo. Uma das primeiras medidas que marcaram essa
interrupção foi a proibição da greve (Decreto-Lei n.º 13 138, de 15 de Fevereiro de 1927) e a sua
punição (Decreto-Lei n.º 23870, de 18 de Maio de 1934).
Jornada de 10 horas por dia no comércio e na indústria; Decreto nº 5616 de 7/5/1919 - 8 horas por dia e 48 por
semana de duração de trabalho na função pública, comércio e indústria.
23 Publicado no Diário do Governo nº 106, de 14 de Maio 1891.
24 Mais exactamente pelo MOP, que simultaneamente procedia à sua inscrição num registo especial nele criado para
esse efeito (§ 2, art. 3º Decreto de 9 de Maio de 1891).
25 Cerdeira, M. Conceição (1997), O movimento associativo patronal de 1834 a 1994, MTS, (Estudos, Série C Trabalho).
19
3.2
A fase do Estado Corporativo
Os alicerces jurídicos do sistema corporativo foram a Constituição Política de 1933 e
seis diplomas legais26, publicados em 23 de Setembro desse mesmo ano. Desse conjunto de
decretos, o primeiro (o Decreto-Lei nº 23 048) foi destinado à publicação do Estatuto do Trabalho
Nacional (ETN), ocupando-se os dois números seguintes (Decretos-Leis nºs 23049 e 23050),
respectivamente, dos grémios (designação agora dada às organizações patronais primárias ou
de base) e dos sindicatos nacionais. A estruturação do ordenamento laboral corporativo fez-se
sob o impulso das seguintes ideias-força:
a) De paz social, expressa no princípio da solidariedade entre a propriedade, o capital e o
trabalho;
b) Do primado da protecção legal da situação individual do trabalhador, em contraponto
com o condicionamento e a contenção das formas de acção colectiva laboral (controlo
administrativo das convenções colectivas, proibição da greve e do lock-out)27;
c) Ajustamento de contratos colectivos de trabalho entre sindicatos nacionais e grémios,
que se agrupam em Federações e em Uniões, elementos intermédios da Corporação,
que constitui a organização unitária das forças de produção;
d) Obrigação de cumprimento por parte dos patrões e trabalhadores da mesma indústria,
comércio ou profissão, quer estejam ou não inscritos nos grémios e sindicatos nacionais
respectivos, dos contratos colectivos de trabalho por estes ajustados, uma vez
sancionados pelos organismos corporativos superiores e aprovados pelo Governo;
e) Tribunais de Trabalho com funções conciliatórias e arbitrais de conflitos.
f) De acordo com os princípios sinteticamente enunciados, verifica-se, que é o Estado que
define as relações profissionais. Para além disso, o Estado supervisiona ainda a
organização dos actores sociais, definindo a sua estruturação, limitando a acção sindical
e a organização dos trabalhadores a um apertado controlo governamental.
Assim, os sindicatos e os grémios constituíam o nível primário da estrutura
representativa que era unificada no topo pelas Corporações (Corporação da Indústria,
Corporação do Comércio, Corporação da Agricultura, etc.).
Os sindicatos eram de uma forma geral organizados cumulativamente por profissões e
por distrito (por exemplo, Escritórios de Lisboa, Escritórios de Setúbal, Tanoeiros da Guarda,
Tanoeiros do Porto) do que resultou uma grande pulverização da organização sindical, ou seja,
um grande número de sindicatos (mais de três centenas) com um número reduzido de
sindicalizados e de quotizantes28.
Para o exercício de controlo dos sindicatos, o Governo instituiu alguns mecanismos de
que se salienta a necessidade destes submeterem os seus estatutos à aprovação do governo,
assim como os seus dirigentes.
Para a organização dos empregadores, o ETN, previu a constituição de grémios.
Agrupando as empresas que exerciam o mesmo ramo de actividade no comércio, na indústria e
na agricultura, os grémios podiam ser obrigatórios e facultativos. Os primeiros eram criados pelo
Decretos-lei nºs 23048 a 23053.
Fernandes, António Monteiro (1994), Direito do Trabalho, Almedina, Coimbra, 9.ª Edição, p.29.
28 A lei não obrigava os trabalhadores a sindicalizarem-se, mas todos os trabalhadores tinham que pagar quotas aos
sindicatos. Estas quotas eram descontadas automaticamente na folha mensal de salários do trabalhador pela
empresa.
26
27
20
Governo, resultando a criação dos segundos à livre iniciativa dos empregadores. Tal como os
sindicatos, estavam também sujeitos ao controle governamental.
Deste enquadramento e controle governativo resulta uma grande desvalorização do
conteúdo dos contratos colectivos. Estes careciam igualmente de serem sancionados pelos
organismos corporativos superiores e aprovados pelo governo.
Após a morte de António Salazar (1.º Ministro de 1933-69) e já na fase final do
Corporativismo, houve um período de abertura e adaptação, vulgarmente designado por
Primavera Marcelista, em que foram publicadas um conjunto de leis do trabalho, no sentido de
conferir à negociação colectiva um papel mais activo29. Embora os passos dados em termos
legislativos tenham sido tímidos, eles traduzem, no entanto, uma mudança de filosofia que sem
possibilitarem ainda o direito dos sindicatos poderem recorrer à greve, reconhecem a existência
de conflitos de interesses de classe.
Este período de transição, embora não tenha modificado no essencial o modelo
corporativo de relações laborais, permitiu o crescimento do papel dos sindicatos, o aumento das
acções reivindicativas e a criação, ainda que clandestinamente, da Confederação Geral dos
Trabalhadores Portugueses - Intersindical Nacional (CGTP-IN).
3.3
Características importantes do modelo de relações laborais na actualidade
Depois da Revolução de Abril (1974) e após uma fase inicial de alguma conturbação, o
antigo sistema corporativo vai-se progressivamente democratizando, para se aproximar dos
sistemas vigentes na Europa Ocidental. Os trabalhadores e os empregadores ganham o direito
de se associar e negociar livremente sobre um número de matérias muito extenso, nos níveis
que entenderem (nacional, regional, sector, empresa, etc.). Contudo, o desenvolvimento do
sistema vai ser fortemente constrangido por vários factores, destacando-se a crise económica,
as exigências de cumprimento de metas macroeconómicas (controlo da inflação e dos salários)
por efeito da nossa adesão à UE e à moeda única por um lado, e a divisão sindical por outro
lado.
A Revolução de Abril ocorre pouco depois da 1.ª crise petrolífera, ou seja, quando a
estabilidade económica da generalidade dos países ocidentais e a relação salarial fordista neles
instituída durante os “30 anos gloriosos” indiciam já sintomas de esgotamento e crise. Ora, é
justamente neste período que em Portugal se difundem as políticas sociais que hoje
conhecemos (entre outras, generalização da pensão de reforma, rendimento social mínimo
garantido, acesso generalizado à educação e à saúde), acarretando um aumento muito
significativo dos encargos sociais do Estado. Além disso, enquanto nos países democráticos
ocidentais, a relação salarial fordista foi construída na base de negociações progressivas entre
os actores sociais, ao longo dos anos, articulando a criação de riqueza e a sua repartição, em
Portugal, tal não aconteceu. A sua introdução é fruto não de processos de negociação
progressivos, sustentados economicamente, mas por motivações de ordem política, num quadro
económico bastante desfavorável.
Essa particularidade conferiu ao Estado um papel muito importante na gestão pública
das políticas sociais e na regulação do próprio sistema de relações laborais. A criação de um
Pela sua maior importância, destacam-se o Decreto-lei n.º 49058, de 14 de Junho de 1969 e o Decreto-lei n.º
49212, de 28 de Agosto de 1969. O primeiro vem conferir aos sindicatos um funcionamento mais autónomo, quer
através da supressão da homologação ministerial dos corpos directivos, quer atribuindo aos próprios associados,
em assembleia-geral, o direito exclusivo de decidir a dissolução dos sindicatos. O segundo, criando procedimentos
conciliatórios e de arbitragem, que asseguravam o desenvolvimento da negociação entre os parceiros sociais.
29
21
sector público empresarial do Estado com as nacionalizações dos grandes grupos económicos
em 1975, a necessidade de cumprir metas macroeconómicas (controlo da inflação e do défice)
estabelecidas pela UE como requisito à nossa integração e nossa adesão ao Euro, bem como a
necessidade de transpor para a legislação portuguesa as Directivas Comunitárias no domínio
laboral, reforçaram até hoje essa forte presença do Estado na regulação das relações laborais.
O segundo factor prende-se com a divisão ideológica e política em torno do tipo de
socialismo que se pretendia para Portugal. Enquanto o PCP pretendia construir um modelo
social e político próximo do existente na antiga URSS, o Partido Socialista e os restantes
partidos à sua direita pretendiam um modelo socialista democrático idêntico aos dos países da
Ocidente Europeu. Esta clivagem que atravessou a sociedade portuguesa vai afectar e dividir de
uma forma profunda o movimento sindical, divisão a que não é imune também a organização dos
empregadores.
3.3.1 A divisão e o enfraquecimento sindical
A informação colectada nos registos da DGERT30 dá conta da existência, com sede no
Continente, de 421 associações sindicais, para representação e defesa dos interesses dos cerca
de 2 milhões e 300 mil trabalhadores assalariados. Destas associações, 348 são organizações
de base (sindicatos), existindo, por conseguinte, em média, 1 sindicato por cerca de 6 mil e 800
trabalhadores; 66 são estruturas de nível intermédio (27 federações de actividade económica e
39 uniões locais e 7 são estruturas de topo. Das sete confederações, apenas três desenvolvem
actividade com alguma relevância e destas, apenas duas – a CGTP-IN e a UGT – estão
representadas no Conselho Económico e Social (CES) e na Comissão Permanente de
Concertação Social (CPCS).
Mesmo que 54 sindicatos e 3 federações possam não ser contabilizadas (atendendo ao
facto de não terem celebrado convenções colectivas nem tão-pouco comunicaram ao Ministério
responsável pela área laboral eleições de corpos gerentes para mandatos depois de 1997), são
características proeminentes da organização sindical portuguesa a sua pluralidade e atomização,
espelhando várias fracturas sucessivas dentro do movimento sindical, bem como do declínio da
sindicalização.
A primeira fractura ocorreu no período que se seguiu ao 25 de Abril de 1974 e teve
motivações de natureza ideológica e política, além de concepções diferentes de democracia
sindical: unicidade versus unidade. Esta fractura teve expressão no Movimento da Carta Aberta
e desembocou na criação da UGT em 1978. Ao longo dos anos, esta divisão manifestou-se em
graves conflitos em torno da representatividade sindical e em diferenças significativas no plano
das estratégias e políticas sindicais. Enquanto a UGT se mostrou mais moderada e aberta à
participação e à negociação de novos conteúdos de negociação, nomeadamente da flexibilidade
normas, a CGTP-IN cristalizou durante muito tempo as suas posições em torno da defesa das
normas fordistas de protecção dos trabalhadores. De qualquer forma, o espaço sindical de uma
e de outra não são totalmente coincidentes, com a CGTP-IN a dominar no sector fabril do
secundário e a UGT nas áreas administrativas do secundário e nos sectores bancário e
segurador.
Direcção Geral do Emprego e das Relações de Trabalho. É esta instituição que faz o registo e envia para
publicação no Boletim do Trabalho e Emprego (BTE) das associações sindicais e de empregadores. Este registo,
bem como a eleição dos seus corpos directivos e a sua publicação no BTE, é uma exigência legal ao seu
reconhecimento como actores de negociação colectiva.
30
22
A segunda clivagem teve início no final dos anos 70, associada a motivações de
natureza corporatista 31 , mais propriamente de defesa dos interesses do pessoal altamente
qualificado (quadros técnicos de nível superior), numa reacção de protesto contra o “basismo”
então dominante nas práticas salariais e na homogeneização das mesmas condições de trabalho
nas empresas, retirando algumas “regalias” aos quadros técnicos. Esta fractura que opôs o
“sindicalismo de classe” versus sindicalismo “corporatista” esteve na origem da constituição de
vários sindicatos de quadros técnicos e da FENSIQ, mais tarde transformada na CNSQ/FENSIQ
– Confederação Nacional de Sindicatos de Quadros (1992). O movimento “corporatista”, numa
clara estratégia de defesa de grupos profissionais com posição estratégica dentro das empresas
(pilotos da aviação civil, maquinistas da CP, etc.), desenvolveu-se no final dos anos 80 e ao
longo da década de 90.
Além de motivações relacionados com protagonismo pessoal, a terceira fractura que se
entrecruza com o movimento «corporatista» nas suas formas mais recentes e que encontra
expressão naquilo que os seus mentores designam de “movimento independente”, esteve
associada à rejeição de uma “filosofia dirigista e de dependência partidária” de que acusam a
UGT e a CGTP-IN. Propondo-se agregar, embora sem qualquer sucesso, os sindicatos fora das
áreas sindicais da UGT e da CGTP-IN e representá-los no CPCS, o movimento do sindicalismo
independente tem vindo a promover a constituição de sindicatos em áreas cobertas por outros
sindicatos da UGT e da CGTP-IN. Este movimento, ele próprio com fracturas, sustentou a
criação de três novas confederações: a Convenção Sindical Independente em 1990, a
Confederação Nacional de Sindicatos de Quadros (FENSIQ) em 1992, a União de Sindicatos
Independentes em 2001 e a Confederação Geral de Sindicatos Independentes também em
2001. Para identificar as 7 confederações existentes falta referir a Confederação Portuguesa de
Quadros Técnicos e Científicos, constituída em 1988 por sindicatos da área de influência da
CGTP-IN, numa estratégia de evitar a saída destes grupos profissionais da sua área de acção.
Em consequência do que se acabou de escrever, a evolução do número de estruturas
sindicais revela-se ao longo dos anos bastante dinâmica, havendo a registar, depois de 1989, a
extinção de 93 sindicatos e11 Federações, que são compensadas pela criação de 100 novos
sindicatos e igual número de federações. Assim, pese embora, a grande vaga de fusões e
concentração de estruturas (sindicatos e federações) desencadeado pela CGTP-IN nos anos
90 32 , em resposta às mudanças económicas e sociais dos últimos anos, ao declínio da
sindicalização e às dificuldades financeiras enfrentadas pelos sindicatos, o número de sindicatos
é hoje igual ao de 1995 e muito superior a 1985 (ver quadro 2), quando o número de
sindicalizados e a taxa de sindicalização se situava em níveis bastante mais elevados.
Referimo-nos à constituição de sindicatos autónomos por parte de alguns grupos profissionais com maiores
recursos de poder e, por conseguinte, maior capacidade reivindicativa do que os restantes trabalhadores. Estes
recursos de poder têm origem cumulativamente ou isoladamente na qualificação elevada, na posição estratégica
nas empresas ou actividades e/ou em identidades profissionais.
32 Ao nível intermédio, é representativo deste movimento a constituição da Federação Intersindical da Metalurgia,
Metalomecânica, Minas, Farmacêutica, Petróleo e Gás (BTE N.º 24 de 30/12/96), por fusão de duas federações
sindicais: Metalomecânica, Metalurgia e Minas de Portugal e Química, Farmacêutica, Petróleo e Gás. Ao nível de
base, salienta-se, por exemplo, a constituição do Sindicato dos Trabalhadores da Química, Farmacêutica, Petróleo e
Gás do Norte (BTE N.º 10 de 30/5/96), por fusão entre o Sindicato dos Trabalhadores das Indústrias Químicas,
Petróleo e Gás do Norte e o Sindicato dos Trabalhadores da Indústria e Comércio Farmacêuticos, neste caso, na
parte relativa aos distritos abrangidos pelo sindicato agora constituído.
31
23
Quadro 1: Associações sindicais registadas em diferentes anos (no continente)
Tipo de estrutura
1980
1985
1990
1995
2000
2002
2004
2006
2006*
Organizações sindicais
de base (Sindicatos)
328
312
321
348
325
332
343
348
294
Federações
22
26
26
29
25
28
27
27
24
Uniões
38
40
41
43
39
39
39
39
39
Confederações
2
2
2
5
5
7
7
7
7
390
380
390
425
394
406
416
421
364
Total
Fonte: Base de dados da DGERT, MTSS; * Associações activas.
É controverso o número de sindicalizados e a densidade sindical em Portugal na
actualidade. Apesar disso, estamos certos que a criação das novas confederações e novos
sindicatos não trouxeram acréscimos globais do número de sindicalizados e da densidade
sindical. Com efeito, por razões diversas (tradição de sindicalização e/ou de quotização
obrigatória do período corporativo, conquista do direito à sindicalização depois da Revolução de
Abril por parte dos assalariados da função pública, clima social e político favorável, concorrência
sindical entre UGT e CGTP-IN, os efectivos sindicais e a sindicalização atingiram níveis
relativamente elevados nos anos setenta e primeira metade dos anos 80.
Em estudos anteriores estimamos a sindicalização média à volta de 1 milhão e meio de
trabalhadores entre 1974-78 e 1 milhão e 700 mil em 1979-84, correspondentes a uma taxa de
sindicalização próxima de 52% e 59%33. Desde então, esses valores têm vindo a decrescer de
uma forma significativa. Ainda que a UGT e a CGTP-IN reivindiquem em conjunto, em 1996, a
representação de perto de 1 milhão e trezentos mil trabalhadores 34 , os mesmos estudos
posicionam o número global de sindicalizados de todos os sindicatos (e não apenas dos
sindicatos destas duas confederações) à volta de 1 milhão e 100 mil na primeira metade dos
anos noventa, registando, por conseguinte, uma quebra de cerca de 30% entre as primeiras
metades dos anos 80 e 90.
Estimativas mais recentes avançadas pelo EIRO (Observatório Europeu das Relações
Industriais) atribuem aos sindicatos portugueses uma representação de 1 milhão e 165 mil
sindicalizados, de acordo com a seguinte distribuição: 652 mil - CGTP-IN, 400 mil - UGT e 113
mil – outras organizações sindicais. Bastante mais realistas parecem ser os dados avançados
por J. Visser35 que situa a densidade sindical portuguesa inferior à média dos países da UE15:
31,7% em 1990, 25,4% em 1995 e 24,3% em 1997, com um comportamento de evolução
decrescente, próxima da registada pela média dos países da UE15, como mostra o quadro 3.
Cerdeira, Maria Conceição (1997), A evolução da sindicalização portuguesa de 1974 a 1995, Lisboa, MESS.SICT
(Estudos, Série C – Trabalho).
34 Lobato, Serafim, Semanário “O Independente” de 26/05/1996.
35 Visser, Jelle (2004), “Patterns and variations in European industrial relations”, em European Commission,
Industrial Relations in Europe 2004, Employment and Social Affairs DG, Brussels (capítulo 1), pp. 11-57. O autor
baseou-se nas estatísticas recolhidas pelo Institut des Sciences du Travail of the Université Catholique de Louvain
(2003), Monographs on the situation of social partners in the candidate countries, Brussels, December.
33
24
Quadro 2: Taxa de sindicalização na UE15
Países
1990
1995
1997
2002
Suécia
Dinamarca
Finlândia
Bélgica
Irlanda
Áustria
Itália
Luxemburgo
Reino Unido
Grécia
Portugal
Alemanha
Holanda
Espanha
França
Média da EU15
Fonte: Visser, Jelle (2004), p.19.
80.0
75.3
72.2
53.9
51.0
46.9
38.8
44.8
39.3
32.4
31.7
31.2
25.5
14.7
10.1
32.8
83.1
77.0
78.0
55.7
47.1
40.7
38.1
38.7
34.1
29.6
25.4
29.2
25.7
16.3
9.8
31.0
82.2
75.6
76.1
56.0
44.4
38.9
36.2
38.1
32.1
28.6
24.3
27.0
25.1
15.7
9.8
29.5
78.0
35.4
34.0
30.4
23.2
22.1
-
Evolução 1995-2002 ou
1997
-0.7
-0,5
-1.1
0.0
-1.9
-0.8
-0.6
-0.9
-0.5
-0.7
-0.5
-0.9
-0.5
-0.4
0.0
-0.6
Outro elemento importante que importa reter diz respeito à mudança da composição
sociológica da sindicalização. No passado, os “colarinhos azuis” do sector secundário
constituíam a maioria das bases sindicais. Actualmente, a maior representatividade cabe aos
empregados do sector dos serviços, com grande relevo dos funcionários da administração
pública e local.
Por último, vários estudos36 revelam a existência de uma forte clivagem no que se refere
à adesão sindical entre emprego jovem e não jovem, emprego protegido e não protegido. A
tendência que se regista é para o afastamento da vida sindical dos trabalhadores mais jovens e
sem uma relação laboral permanente, ou seja, aqueles que paradoxalmente mais carecem de
uma boa organização sindical que os defenda colectivamente contra as situações de
precariedade.
As características de atomização do movimento sindical têm consequências nefastas
sobre a capacidade de desenvolver as quatro funções fundamentais inerentes a um sindicalismo
responsável e eficaz, ou seja, função reivindicativa, função proposicional, função de negociação
e prestação de apoio/serviços. Assim, se levarmos em conta que uma das fontes de recurso do
poder sindical tem origem na sua capacidade de agregação e mobilização colectivas em torno
das reivindicações que desencadeiam os processos de negociação colectiva, a concorrência
sindical, além de enfraquecer a capacidade de mobilização sindical e o seu poder de
negociação, torna o processo de negociação mais oneroso em termos materiais e humanos e
leva à produção de duas e mais convenções colectivas com aplicação nas mesmas empresas.
Até anos recentes, de uma forma geral, a concorrência tendia apenas a confrontar duas frentes
negociadoras, UGT e CGTP-IN, aliando-se à primeira frente a Fensiq, quando se tratava de
negociações específicas de quadros. Porém, nos últimos anos, além das anteriores frentes
sindicais, as mesmas unidades de negociação, contam, por vezes, com outros sindicatos,
sobretudo da esfera de influência da Convenção Sindical Independente.
Ainda, o fraco nível de enquadramento das organizações de base pelas organizações
de nível superior (federação e confederação) tem duas implicações maiores, estreitamente
Nomeadamente Kovács, Ilona (Org.) (2005), Flexibilidade de Emprego – Riscos e oportunidades, Oeiras, Celta
Editora.
36
25
ligadas: défice de representação das organizações existentes nas instituições onde só as
confederações têm representação; fraco nível de adesão e de implicação das organizações de
base às decisões tomadas pelas confederações em níveis mais elevados de negociação.
3.3.2 As comissões de trabalhadores, os representantes dos trabalhadores para as
comissões de higiene e segurança no trabalho e os conselhos de empresa europeus
O regime jurídico português prevê quatro estruturas de representação dos trabalhadores
na empresa. Assim, para defesa e prossecução colectivas dos seus direitos e interesses, os
trabalhadores, podem constituir, além de associações sindicais37, comissões de trabalhadores
(às quais se podem associar subcomissões e comissões coordenadoras) 38, representantes dos
trabalhadores para a segurança, higiene e saúde no trabalho e, em empresas e grupos de
empresas de dimensão comunitária, conselhos de empresas europeus.
As comissões de trabalhadores (CT) são eleitas pelos trabalhadores das empresas, por
voto directo e secreto, segundo o princípio de representação proporcional. As CT têm,
nomeadamente os seguintes direitos:
a) Informação e consulta sobre aspectos económicos e sociais da actividade da
empresa (entre outros, a organização da produção e suas implicações no grau de
utilização da mão-de-obra e do equipamento, a gestão de pessoal e estabelecimento
dos seus critérios básicos, montante da massa salarial e sua distribuição pelos
diferentes escalões profissionais, regalias sociais, mínimos de produtividade e grau
de absentismo; projectos de alteração do capital social e de reconversão da
actividade produtiva);
b) Controlo de gestão na empresa, competindo-lhe, entre outras competências, apreciar
e emitir parecer sobre os orçamentos e planos económicos da empresa, em particular
os da produção, e respectivas alterações, bem como acompanhar e fiscalizar a sua
correcta execução; promover a adequada utilização dos recursos técnicos, humanos
e financeiros.
c) Participação nos processos de reestruturação da empresa, exercido através da
correspondente comissão coordenadora, quando se trate da reestruturação de
empresas do sector.
As CT conheceram uma grande difusão e dinâmica nos anos sequentes à Revolução de
Abril. Nesse período, estavam presentes na generalidade das empresas de média e grande
dimensão. Na actualidade, com referência a Janeiro de 2006, estavam constituídas e com
mandatos em vigência 192 comissões de trabalhadores, 14 subcomissões e 6 comissões
coordenadoras. Algumas empresas (de que a Autoeuropa é o caso mais conhecido) têm
preferido negociar as condições de trabalho com as comissões de trabalhadores, desvalorizando
o papel dos sindicatos na empresa.
Em cada empresa, os trabalhadores, podem também eleger representantes para a
saúde, segurança e higiene no trabalho, por voto directo e secreto, segundo o princípio da
representação proporcional. Estes representantes dos trabalhadores têm direitos de informação
e consulta sobre aspectos muito importantes da prevenção de riscos profissionais nas empresas.
As associações sindicais estão representadas nas empresas por delegados sindicais os quais podem constituir
comissões sindicais de delegados e comissões intersindicais de associações sindicais.
38 No caso das empresas possuírem estabelecimentos geograficamente dispersos, os respectivos trabalhadores
podem eleger subcomissões de trabalhadores de acordo com a seguinte norma: estabelecimentos com menos de
20 trabalhadores – 1 membro; estabelecimentos de 20 a 200 trabalhadores – 3 membros; estabelecimentos com
mais de 200 trabalhadores – 5 membros.
37
26
No entanto, é reduzido o número de empresas com comissões de higiene e segurança: 195
empresas, onde foram eleitos 628 representantes efectivos e 263 suplentes.
Por último, em empresas e grupos de empresas de dimensão comunitária, os
trabalhadores têm ainda direito a informação e consulta transnacionais, que deve ser
assegurado pela administração das empresas ou grupos. Para o efeito considera-se empresa de
dimensão comunitária a que empregar, pelo menos, 1000 trabalhadores nos Estados membros e
tenha duas empresas em dois Estados-membros com, pelo menos, 150 trabalhadores cada.
A informação e consulta têm por objecto questões relativas ao conjunto da empresa ou
do grupo, ou pelo menos a dois estabelecimentos ou a duas empresas do grupo, situados em
Estados-membros diferentes, bem como factos ocorridos num único Estado-membro se as suas
causas ou os seus efeitos envolverem estabelecimentos ou empresas situados em pelo menos
dois Estados-membros.
Para exercer o direito a informação e consulta os trabalhadores podem instituir um
conselho de empresa europeu ou um procedimento de informação e consulta. Em Portugal, até
final de 2005:
-
foram eleitos 12 membros de conselhos de empresa europeus em estabelecimentos ou
empresas respeitantes a empresas ou grupos de empresas de dimensão comunitária
com sede noutros Estados-membros:
-
foi instituído 1 procedimento de informação e consulta num grupo de empresas de
dimensão comunitária com sede em Portugal39.
3.3.3 Os instrumentos de regulamentação colectiva negociais
Os instrumentos de regulamentação colectiva negociais são a convenção colectiva
(conclusão positiva de um processo negocial entre empregadores e representantes sindicais), o
acordo de adesão (quando um ou vários actores decidem aderir a um acordo negociado por
outros) e a decisão de arbitragem voluntária (quando as partes recorrem a esta via para
acordarem um contrato40).
As convenções colectivas podem ser:
-
Contrato colectivo (CC): convenção celebrada entre a associação sindical e
associação de empregadores.
-
Acordo colectivo (AC): convenção celebrada entre a associação sindical e uma
pluralidade de empregadores para diferentes empresas.
-
Acordo de empresa (AE): convenção celebrada entre a associação sindical e um
empregador para uma empresa ou estabelecimento.
Ainda que a lei não restrinja a possibilidade das confederações puderem negociar
convenções colectivas41, a prática social instituída ao longo dos anos é a contratação colectiva
Seguimos em todo este capítulo de perto Dornelas, António (Coord.) (2006), Livro Verde sobre as Relações
Laborais, MTS.
40 A arbitragem é realizada por 3 árbitros, um nomeado por cada uma das partes e o terceiro escolhido por ambas. A
decisão arbitral produz os efeitos da convenção colectiva.
41 Em contrapartida, estas confederações, têm vindo a desenvolver negociações tripartidas (com representantes do
Estado), celebrando acordos que contribuem para a definição da política de rendimentos e preços, de emprego e
formação profissional na Comissão Permanente de Concertação Social, uma das comissões do Conselho
Económico e Social. Estes acordos têm a particularidade de não serem fonte de direito, ou seja, não têm aplicação
39
27
se fazer pelos sindicatos de base e pelas federações, no que se refere ao actor sindical e, no
que respeita aos empregadores, pelas associações de empregadores de base e pelos próprios
empregadores.
No que se refere aos níveis da estrutura de negociação, a prática social implementada
inclui apenas dois níveis, que se desenvolvem de uma forma independente: o nível sectorial e o
nível de empresa. Quer isto dizer que não tem havido qualquer tipo de hierarquia de níveis de
negociação, no sentido de obrigar os acordos de empresa (AE) ou os acordos colectivos de
trabalho (AC) a respeitar as condições de trabalho estabelecidas nos contratos de trabalho em
sectores abrangidos por contratos colectivos de trabalho (CC)42.
As convenções colectivas negociadas só se aplicam às relações de trabalho entre
trabalhadores e empregadores (empresas) filiadas, respectivamente, que subscreveram ou
negociaram a convenção. Contudo, a lei disponibiliza instrumentos cujo recurso tem permitido
alargar as normas colectivas a outras entidades que não aquelas que a negociaram.
Assim, através de um acordo de adesão (AA), as associações sindicais, as associações
de empregadores e os empregadores podem aderir a convenções colectivas ou decisões
arbitrais em vigor. Por seu lado, de acordo com o referido no final do ponto anterior, a
Administração, desde que justificado social e economicamente, por portaria de extensão (PE),
pode determinar a extensão, total ou parcial, de convenções colectivas ou decisões arbitrais:
a) A empregadores do mesmo sector de actividade e a trabalhadores da mesma
profissão ou profissão análoga, desde que exerçam a sua actividade na área geográfica e no
âmbito sectorial e profissional fixados naqueles instrumentos;
b) A empregadores e a trabalhadores do mesmo âmbito sectorial e profissional, desde
que exerçam a sua actividade em área geográfica diversa daquela em que os instrumentos se
aplicam, quando não existam associações sindicais ou de empregadores e se verifique
identidade ou semelhança económica e social.
Nestes casos, trata-se de um acto administrativo e não de uma negociação. Além do
regulamento de extensão, de acordo com o referido, a lei prevê, com carácter excepcional, outra
forma administrativa de regulamentação colectiva de trabalho que é a emissão de regulamentos
de condições mínimas (PRT). Estes instrumentos, a que falta acrescentar a decisão arbitral (DA),
que têm base convencional (arbitragem voluntária) ou base administrativa (arbitragem
obrigatória), designam-se, globalmente, de instrumentos de regulamentação do trabalho
(IRCT)43.
obrigatória. Com efeito, trata-se de compromissos orientados para a constituição de instrumentos importantes da
política económica e social e que têm pretendido, sobretudo, até agora, induzir alterações legislativas, e/ou criar
quadros de referência para a negociação colectiva.
Contudo, a lei (artigos 535 e 536 do Código do Trabalho) estabelece os princípios a seguir em caso de existir
concorrência entre os instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho negociais, nos seguintes termos: a) O
IRC negocial de um sector de actividade afasta a aplicação de um instrumento da mesma natureza cujo âmbito se
define por profissão ou profissões relativamente àquele sector de actividade; b) O AE afasta a aplicação do acordo
colectivo e do contrato colectivo; c) O AC afasta a aplicação do contrato colectivo; d) Os critérios de preferência do
AE e do AC relativamente ao CC podem ser afastados por IRC negocial, designadamente através da previsão de
cláusulas de articulação entre convenções colectivas de diferente nível; e) Em todos os outros casos, cabe aos
trabalhadores da empresa em relação aos quais se verifique concorrência, escolher, por maioria, no prazo de 30
dias, o IRC aplicável. Desta escolha devem informar o empregador e a Administração, responsável pela área laboral;
f) Na ausência de escolha pelos trabalhadores, é aplicável o IRC mais recente.
43 O princípio de prevalência dos IRC não negociais, em caso de existir concorrência entre eles é a seguinte: a
decisão de arbitragem obrigatória afasta a aplicação dos outros instrumentos e o regulamento de extensão afasta a
aplicação do regulamento de condições mínimas.
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Em Portugal, a boa adequação da negociação de ramo a uma estrutura empresarial
caracterizada por um elevado peso das empresas com menos de 50 pessoas ao serviço
(representa 97,5% do universo das empresas 44 ) terá favorecido que as organizações de
empregadores e sindicais a tenham privilegiado relativamente a qualquer outro nível.
Ainda que apresente o inconveniente de existir um grande afastamento entre o nível de
definição das normas e o nível da sua aplicação, a negociação de ramo ou de sector de
actividade tem aspectos positivos tanto para as organizações de empregadores como para as
organizações de trabalhadores. Para os empregadores, tem a vantagem de permitir exercer
algum controlo sobre a harmonização das condições sociais da concorrência entre empresas.
Para os sindicatos, a negociação de ramo permite uma maior homogeneização das condições
dos salários e do emprego e a garantia de «de um mínimo» para o conjunto dos trabalhadores
abrangidos.
A negociação de empresa tendeu apenas a desenvolver-se nas grandes empresas,
sobretudo nas empresas públicas, onde não existia negociação sectorial (nomeadamente porque
a empresa por vezes cobria o próprio sector, de que foi exemplo a EDP), e/ou onde as condições
económicas e a força sindical permitia negociar condições bastantes mais favoráveis aos
trabalhadores do que as definidas pela regulamentação colectiva de sector. Em qualquer dos
casos, trata-se de níveis de negociação autónomos, não existindo qualquer tipo de articulação
entre os dois níveis de negociação das normas (ramo e empresa), situação que se manterá ao
longo dos anos até à actualidade.
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