TEMPO, INFORMAÇÃO, PODER E PERCEPÇÃO Eugenio do Carvalhal * Artigo publicado na revista CONJUNTURA ECONÔMICA - COLUNA NEGOCIAÇÃO - PÁG. 34 em 1/5/2003 Os episódios que estamos acompanhando: no âmbito mundial - a invasão do Iraque, e no Brasil - a busca da inclusão social, têm repercussões nas relações multilaterais e interorganizacionais, afetando as relações entre grupos e pessoas. Bush determina a responsabilidade norte-americana de "livrar" o mundo da ameaça do terrorismo. Sob o pretexto das armas de destruição em massa pressiona os países do "eixo do mal". Por isso asseverou a urgência em "libertar" os iraquianos da opressão, pediu a benção divina sobre a América e ordenou a invasão do Iraque. Lula busca compartilhar a responsabilidade de todos num pacto social, afirma que quem tem fome tem pressa, e pede a Deus sabedoria para governar com um coração do tamanho do Brasil para se sentir unido a cada cidadão e cidadã. No contexto das relações entre pessoas, equipes, organizações e países, a disponibilidade de tempo, o acesso às informações, o apoio de bases de poder e o nível de percepção estão distribuídos de forma heterogênea. Desequilíbrios favorecem a manipulação, e a manipulação quando exercida no seu sentido mais negativo gera ressentimentos. Ressentimentos agravados estão entre as causas primárias geradoras de retaliações. O contexto das retaliações nunca é explicitado. Nas negociações, de forma direta ou indireta, tempo, informação e poder sempre são utilizados e é fundamental verificar como são percebidos e apropriados pelas partes envolvidas. Nas guerras a diplomacia atua e a prática da negociação tem um amplo espaço... antes, durante e depois. Os dirigentes se apropriam desses quatro recursos fundamentais para orientar seus critérios de tomada de decisões e implementação de ações. Dependendo das orientações estratégicas decorrentes dos interesses das partes envolvidas, o uso do tempo, da informação e do poder poderá ser diferente. A qualidade das intervenções dos líderes e negociadores dependerá de como a percepção das origens, usos e implicações de cada um desses fatores comporá o quadro geral. Quais são as implicações para as ações de recomposição (ou não) das alianças no pósguerra do Iraque, quando o tempo para deliberar nas Nações Unidas foi atropelado pela urgência dos dirigentes norte-americanos em decidir a questão? O governo Bush não tem tido restrições em usar o poder econômico, político e militar para assegurar a hegemonia de seu país nas próximas décadas. Qual será o próximo alvo, Coréia, Irã ou Síria? A guerra de informações, o uso de sofismas, a censura não explícita, a retórica e as ações orientadas para induzir e condicionar as populações têm impactos diferentes. Os níveis de adesão interna têm sido relevantes e as vitórias recebidas com euforia pela massa conservadora americana que vibra, têm fortalecido o ego nacionalista. Por outro lado, a rejeição externa é manifestada por grupos que percebem as consequências das mudanças nas regras do jogo, que até então apontavam para o multilateralismo e a busca da integração. Quais são as implicações sobre a qualidade e a eficácia das ações de mudança que precisam ser implementas pelo governo Lula, quando seus negociadores dedicam um tempo expressivo para deliberar e conhecer as demandas de inúmeros conselheiros econômicos e sociais? A continuidade de sua permanência no poder dependerá de como as ações de gestão de seus executivos serão implementadas nos próximos dois anos e meio, e da sua repercussão nos doze meses finais do mandato. As informações sobre a natureza e a velocidade da mudança, e a distância entre o discurso e a ação, têm sido percebidas de forma ambígua pelos formadores de opinião e pela população. Uma grande parcela considera a lentidão uma consequência do excesso de conversa entre dezenas de ministros, secretários e conselheiros para sugerir que alguém tome uma decisão e a implemente. Lula poderia otimizar o uso do tempo, imprimir um ritmo mais ágil e implementar ações concretas para não frustrar os mais apressados e angariar a adesão dos renitentes. Seu governo poderia ser menos parcimonioso e usar a delegação de poder de forma assertiva, enquanto a sua sustentação pública é elevada. Seus comunicadores poderiam tratar a informação divulgando as realizações feitas para demonstrar que reformas estão ocorrendo - a jornada estaria sendo percorrida. Os brasileiros estariam mais distantes da origem e mais próximos do destino esperado. Os negociadores de Lula seriam pressionados, pelo exemplo dele, a atuarem de forma similar. A população, cuja percepção coletiva é aguçada, não ficaria influenciada pelas contradições decorrentes da distância entre o discurso e a prática. (*) Coordenador do Curso de Formação de Negociadores da FGV/IBRE e EBAPE