Coisas que encabulam

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Coisas que encabulam
A economia dá sinais de estabilidade e de crescimento. Estava na
cara que só se chegaria a isso se o rumo inicial traçado pelo governo Lula
fosse mantido. Que as regras macroeconômicas, as mesmas do governo
passado, fossem obedecidas. Não existe mágica nesse assunto e os resultados
de austeridade não aparecem do dia para a noite.
O que encabulava era a quantidade de gente que pedia mudanças no
rumo da economia. A professora Maria da Conceição Tavares achava que o
mundo ia acabar. Um monte de economistas, incluindo muitos que escrevem
em jornais, batia na mesma tecla. O vice-presidente da República e o
presidente do partido dele, Valdemar Costa Neto, achavam que Antônio
Palloci e Henrique Meireles iam levar o Brasil para o fundo do poço. Gente do
PT fazia reunião e produzia documentos propondo mudanças na economia.
Ninguém nunca apresentou uma solução clara, só queria que
“mudasse”. Agora que a economia melhorou um pouco como é que fica esse
pessoal todo. Até se entende o posicionamento da classe política. Ela via a
próxima eleição e ficava preocupada com o resultado dela se a economia não
crescesse. Com a atual sinalização positiva da economia vão fazer de conta
que não disseram nada antes. É uma das maneiras de ser da classe política.
Mas os acadêmicos e jornalistas que defendiam as tais mudanças ficam sem
desculpas.
Fico encabulado também com a choraminga de um monte de
gente dizendo que está arrependida de ter votado no Lula, que ele prometeu
mudanças e que nada disso está ocorrendo. Que ele repete o governo passado.
Me encabula mais ainda as falas de alguns professores, gente com formação
acadêmica adequada e que acha que foram enganados.
Tudo indica que eles acreditavam mesmo que o Lula ao chegar ao
governo faria mudanças para não sei onde. Por esta coluna, bem antes da
eleição, me expus ao debate sobre isso. Argüia que não se podia inventar a
roda, que se o Lula tivesse algum plano já teria mostrado para a sociedade.
Dizia que não havia plano nenhum, que ele se ganhasse iria fazer o que o
governo FHC estava fazendo. Quase apanhei.
Uma de Mato Grosso e nessa quem acreditou fui eu. Alguém me
disse durante a campanha eleitoral de 2002 que se Blairo Maggi ganhasse o
governo, ele não faria qualquer aproximação com os países da América do
Sul. Achava que os fatos em torno dessa realidade iria levá-lo a tomar
posições positivas no nosso relacionamento com esta parte do mundo. Tudo
indica que errei.
Agora mesmo, como exemplo, o BNDES está emprestando 600
milhões de dólares para a Bolívia. Uma parte dele é para a rodovia que vai de
Santa Cruz de la Sierra a Corumbá. Nada contra, estava definida pelo governo
dali. O que encabula é como o nosso governo não mexeu uma palha para
tentar puxar uma pontinha daquele ou de qualquer outro dinheiro para a
estrada do nosso lado, que vai também para Santa Cruz. Podia até não
conseguir, porém, o que chama a atenção é a falta de boa vontade em pelo
menos tentar.
Lá na Bolívia tem uma corrente enorme de pessoas que defende
que o melhor caminho para o país seria uma saída pelo nosso lado. Acham que
a nossa produção no campo, maior que a do MS, é que poderia fomentar mais
alternativas econômicas. Não estaríamos sozinho, portanto. Também pensam
assim gente dos países andinos e dos portos do Peru e do Chile.
Eu estava errado, o governo Blairo mostra mesmo que não tem
nenhum interesse em aproximar-se dos países vizinhos. Talvez porque eles
não compram soja. É uma pena, a história vai cobrar isso.
Alfredo da
[email protected]
Julho de 2004
Mota
Menezes
escreve
em
A
Gazeta.
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