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“Os Lusíadas” de Luís Vaz de Camões
Análise temática e estilística do Canto V
Episódio: “O Adamastor”
OS LUSÍADAS
Canto V
Índice
I.
OS LUSÍADAS - CANTO V .............................................................................................................................2
II.
O Adamastor – Plano da Viagem (Episódio simbólico) ...................................................................................3
A. Divisão do episódio em partes: ...................................................................................................................6
1. Introdução ...............................................................................................................................................6
2. Desenvolvimento .....................................................................................................................................6
3. Conclusão ...............................................................................................................................................6
B. Esquematização do Episódio ......................................................................................................................7
C. Caracterização do Adamastor: ....................................................................................................................8
D. Principais contrastes no episódio: ...............................................................................................................9
E. Evolução dos comportamentos destas duas personagens .......................................................................10
F.
Significado / Simbolismo do episódio ........................................................................................................11
1. Geograficamente ...................................................................................................................................11
2. Mitologicamente ....................................................................................................................................11
3. Simbolicamente .....................................................................................................................................11
G. Figuras de estilo ........................................................................................................................................12
III.
Adamastor ....................................................................................................................................................13
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OS LUSÍADAS
Canto V
I.
OS LUSÍADAS - CANTO V
O canto anterior terminou com o Velho do Restelo a amaldiçoar a expansão para o Oriente, o que desde logo
sugere ao leitor que a viagem não será fácil.
Ora, terminada a narração da História de Portugal, Vasco da Gama vai contar ao rei de Melinde como
decorreu a sua viagem de Lisboa até ali. Mais uma vez, realidade e fantasia se misturam, pois a par da
indicação do percurso geográfico efetuado aparecem episódios fantásticos.
Nesta etapa da viagem, os navegadores enfrentam inúmeros perigos que reforçam a ousadia dos
Portugueses. Os fenómenos atmosféricos como o Fogo de Santelmo e a Tromba Marítima geraram nos
navegadores um grande receio, mas que estes conseguiram superar.
Surge-nos, mais adiante, um episódio cómico. Fernão Veloso, um marinheiro fanfarrão resolve arriscar-se
em terra, mas logo se arrepende e volta para o barco perseguido pelos africanos.
Um ponto crítico desta etapa da viagem era, sem dúvida, a passagem do Cabo das Tormentas, famoso pelos
inúmeros naufrágios aí ocorridos. O episódio do Gigante Adamastor representa de um modo simbólico a
desproporção de forças: por um lado, a fragilidade das naus e dos homens a bordo, por outro, a fúria do mar,
magnificamente personificada por este gigante aterrador.
Porém, os problemas dos Portugueses não terminariam aqui. Ultrapassadas as dificuldades de navegação,
surge uma doença mortal: o Escorbuto, provocado pela falta de ingestão de alimentos frescos.
Por fim, Vasco da Gama termina a sua longa narração iniciada no Canto III.
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OS LUSÍADAS
II.
Canto V
O ADAMASTOR – PLANO DA VIAGEM (EPISÓDIO SIMBÓLICO)
Estância 37: Tinham passado cinco dias de navegação com ventos favoráveis, desde que a armada partira
da baía de Santa Helena, quando, numa noite em que estavam de vigia à proa, viram formar-se sobre as
suas cabeças uma nuvem que escurecia os céus.
Estância 38: A nuvem era tão escura e carregada que inspirava um grande medo. Ouvia-se ao longe o
estrondo das vagas contra os rochedos. Vasco da Gama interpela Deus, questionando-o sobre a ameaça
que estava prestes a abater-se sobre eles e que parecia ser pior que um temporal.
Estância 39: Ainda Vasco da Gama não tinha acabado de dizer isto e já um vulto disforme e gigantesco se
erguia diante deles. O rosto era sombrio, a barba desgrenhada, os olhos encovados, a expressão medonha e
má, os cabelos cheios de terra, a boca negra e os dentes amarelos.
Estância 40: Era tão grande que podia ser considerado um segundo colosso de Rodes, que foi uma das sete
maravilhas do mundo. Falava com uma voz cavernosa, que parecia vir do fundo do mar. Arrepiavam-se as
carnes e os cabelos só de o ouvir e ver.
Estância 41: E disse: "Ó gente mais audaz que qualquer outra que tenha praticado grandes feitos! Tu, que
nunca repousas dos trabalhos e das guerras, pois te atreves a romper os limites e a navegar nos mares que
eu guardo, e nos quais nunca ninguém navegou:
Estância 42: … pois vens desvendar os segredos da natureza e do mar que nunca nenhum mortal
conheceu, ouve e fica sabendo os males que eu tenho preparados para castigar o teu atrevimento quer no
mar, quer na terra que, com dura guerra, virás a dominar.
Estância 43: Fica a saber que todas as naus que fizerem esta viagem terão como inimigo este lugar, com
ventos e tempestades terríveis. Na primeira armada que aqui passar eu farei subitamente um castigo
inesperado, mas destruidor.
Estância 44: Aqui espero vingar-me do primeiro que me descobriu. E não será esse o único castigo da
vossa ousadia; todos os anos vereis naufrágios, perdições e o menos doloroso dos males será ainda a
morte.
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Canto V
Estância 45: Do primeiro fidalgo que teve o título de Vice-rei, serei eterna sepultura. Aqui deixará os troféus
das suas vitórias sobre os turcos; aqui se vingarão dele as cidades de Quíola e Mombaça.
Estância 46: Também um outro homem ilustre, na companhia da formosa dama que o Amor lhe deu,
escapará ali vivo de um naufrágio, para encontrar em terra morte com maior sofrimento.
Estância 47: Depois de terem caminhado muito tempo pela areia ardente, verão morrer os filhos de fome,
verão os Cafres roubar à esposa os vestidos que a cobriam, até a deixarem exposta ao calor, ao frio, ao
vento, inteiramente nua.
Estância 48: E, os que escaparem, verão os míseros amantes morrer abraçados na mesma sepultura,
depois de lágrimas e lamentos que comoveriam as próprias pedras."
Estância 49: O monstro horrendo continuava a vociferar os destinos dos Portugueses quando Vasco da
Gama lhe perguntou: "Quem és tu?". Retorceu os olhos, deu um espantoso brado como se a pergunta lhe
tivesse doído, e respondeu:
Estância 50: "Eu sou aquele oculto e grande cabo que se estende em direção ao Polo Sul, onde termina a
costa africana, e a quem vós chamais Tormentório. Os grandes geógrafos da antiguidade não me
conheceram, e a vossa ousadia muito me ofende!
Estância 51: Fui um filho da Terra, do mesmo modo que o foram os Gigantes revoltados. Chamo-me
Adamastor, e estive na guerra contra Júpiter; não fui dos que colocaram monte sobre monte para chegar ao
céu, mas andei no mar, em guerra contra Neptuno.
Estância 52: Foram os amores da esposa de Peleu (Tétis) que me fizeram tomar tão grande empresa.
Desprezei outras deusas do céu para amar só a princesa das águas. Vi-a um vez, na companhia das
Nereidas, sair nua das águas, e logo senti um desejo que ainda agora dura.
Estância 53: Como me não era possível consegui-la, por ser tão feio de figura, resolvi conquistá-la à força, e
expus o assunto a Dóris. Esta, com medo, fala-lhe por mim, mas ela respondeu com um sorriso: "Qual será o
amor da Ninfa que aguente o dum gigante(?)...
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Estância 54: ...mas, para evitar a guerra no Oceano, procurarei uma forma de, respeitando a honra, evitar
prejuízos". Trouxe-me esta resposta Dóris. Eu não consegui compreender este engano. Como são cegos os
amantes! Fiquei cheio de desejo e de esperanças.
Estância 55: Já sem saber o que fazia, numa noite prometida por Dóris, vejo de longe o vulto de Tétis. Corro
para ela como louco, abraço-a e beijo-lhe os olhos, as faces, os cabelos.
Estância 56: Oh! Tenho até vergonha de o contar: julgando ter nos braços quem amava, encontrei-me
abraçado a um duro monte, e em vez de apertar um rosto angélico, tinha um penedo nas mãos. Eu próprio
me senti de pedra: era um penedo junto a outro penedo.
Estância 57: Ó formosa ninfa! Já que a minha presença te não agradava, que te custaria manter-me nesta
ilusão, fosse ela monte, nuvem, sonho ou nada? E fujo, quase louco, do desgosto e do vexame ali sofridos, a
procurar outro mundo onde ninguém da minha dor se risse.
Estância 58: Já então meus irmãos tinham sido vencidos na sua guerra, para que deuses vãos se sentissem
mais seguros, alguns estavam sepultados sob vários montes. E como contra o céu não há defesa, comecei a
sentir o castigo dos meus atrevimentos.
Estância 59: A carne é agora terra dura; os ossos fizeram-se penedos. Estes membros que aqui vês, e esta
figura estendem-se pelo mar. Enfim, transformei-me neste cabo. E, para ainda mais me magoar, cerca-me
Tétis nestas águas.
Estância 60: E, dizendo isto, com um medonho choro, o Adamastor desapareceu dos nossos olhos. Desfezse a nuvem negra e o mar soou muito longe. Eu pedi a Deus que removesse as trágicas profecias do
Adamastor.
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A. DIVISÃO DO EPISÓDIO EM PARTES:
1. Introdução
Aparecimento e descrição do Adamastor: estâncias 37 a 40.
2. Desenvolvimento
Discurso do Gigante num tom de voz ameaçador (ameaças e profecias); história do Adamastor: estâncias 41
a 59.
3. Conclusão
Desaparecimento do Adamastor e agradecimento de Vasco da Gama: estância 60.
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B. ESQUEMATIZAÇÃO DO EPISÓDIO
Estrofes 37 e 38
Estrofes 39 e 40
Localização das naus
Preparação do ambiente para o aparecimento do Gigante
Caracterização da figura do Adamastor : aspetos físicos e morais
Discurso do Adamastor:
 referência à ousadia dos portugueses;
 profecias do gigante sobre o futuro dos Portugueses: de carácterprofético e
Estrofes 41 a 48
ameaçador o discurso é efetuado num tom de voz horrendo e grosso, anuncia os
castigos e os danos por si reservados para aquela "gente ousada", que invadira os
seus domínios. Promete-lhe castigos como a morte de algumas pessoas que lá vão
passar: Bartolomeu Dias; D. Francisco de Almeida e a família Sepúlveda.
Interrupção do discurso por Vasco da Gama "Quem és tu?": incomodado com as profecias,
Estrofe 49
Vasco da Gama interroga o monstro sobre a sua identidade. É essa questão tão simples que
promove a profunda viragem do seu discurso, fazendo-o recordar a frustração amorosa
passada e meditar na sua atual condição de solitário e petrificado.
Estrofes 50 a 59
Na segunda parte do discurso do Gigante, o assunto é de carácter autobiográfico: explicação
da sua génese; referência ao seu drama amoroso; referência à sua metamorfose.
 Súbito desaparecimento do Adamastor
Estrofe 60
 Pedido de Vasco da Gama a Deus para que as profecias do Gigante não se
realizassem.
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C. CARACTERIZAÇÃO DO ADAMASTOR:
 aspeto aterrador;
 grande e disforme;
 pernas e braços imensos;
 olhos encovados;
 cabelos crespos e sujos;
 boca negra;
 dentes amarelos;
 ar medonho;
 rosto sombrio;
 postura agressiva;
 voz horrenda e grossa;
 sensível;
 apaixonado;
 solitário;
 triste.
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D. PRINCIPAIS CONTRASTES NO EPISÓDIO:
 Prosperamente os ventos sopravam # uma nuvem carregada e assustadora;
 Aspeto gigantesco do Adamastor # pequenez dos marinheiros;
 Tom de voz horrendo e grosso # voz pesada e amarga;
 Ameaças e profecias trágicas # história do amor não correspondido;
 O Gigante que ameaça e assusta # O Gigante que ama e chora;
 Força brutal do Gigante # Fragilidade da ninfa Tétis.
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E. EVOLUÇÃO DOS COMPORTAMENTOS DESTAS DUAS PERSONAGENS
... do Gigante
1) mostra-se rancoroso, vingativo, ameaçador;
... de Vasco da Gama
1) amedrontado: "arrepiam-se as carnes e o cabelo";
2) dor profunda, raiva, desespero; humaniza-se, 2) sem medo, de cabeça erguida (Alçado), num tom
chora, reconhece a sua derrota;
3) desaparecimento
de igual para igual, quase de desafio;
3) atitude de fé: no momento em que o Gigante, a
chorar, desaparece, o Gama pede a Deus que
"removesse os duros/Casos que Adamastor
contou futuros."

Repara que a evolução dos comportamentos é oposta.
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F. SIGNIFICADO / SIMBOLISMO DO EPISÓDIO
1. Geograficamente
Simboliza o Cabo das Tormentas, posteriormente chamado da Boa Esperança.
2. Mitologicamente
O Gigante apaixonado pela deusa Tétis, transformado em promontório pelos deuses, que não toleram
ousadias; símbolo da frustração amorosa.
3. Simbolicamente
Remete para os perigos e dificuldades que os Portugueses tiveram de enfrentar e vencer. No dizer de Amélia
Pinto Pais, este episódio "é uma espécie de abóbada arquitetónica do Poema, em que vêm concentrar-se as
grandes linhas da epopeia: o real-maravilhoso (...); a existência de profecias (...); é igualmente um episódio
lírico (...); por outro lado, é igualmente um episódio trágico (...). É sobretudo um episódio épico, em que se
consolida a vitória do homem, "bicho da terra", sobre uma natureza poderosa."
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Canto V
G. FIGURAS DE ESTILO
Estrofe
Nome da figura de Estilo
38
Aliteração
“Bramindo, o negro mar de longe brada”
39
Dupla adjetivação
“Se nos mostra no mar, robusta e válida”
40
Comparação
41
Apóstrofe
“Ó gente ousada”
45
Perífrase
“De quem me descobriu suma vingança”
48
Eufemismo
“… as almas soltarão”/ “Da fermosa e misérrima prisão”
57
Hipérbole
“Ó Ninfa, a mais bela fermosa do Oceano”
57
Gradação
“Ou fosse monte, nuvem, sonho ou nada?”
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Exemplo
“ Ó gente ousada, mais que quantas/ No mundo
cometeram grandes cousas”
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III.
ADAMASTOR
O Adamastor de Os Lusíadas, poema épico de Camões, recupera a figura mitológica de um dos titãs que se
revoltaram contra Zeus e foram, por este, castigados e transformados em rochedos, ilhas e promontórios.
Inicialmente, o seu aspecto é o de uma figura descomunal, estranha e medonha. A aparência horrenda do
gigante é sugerida ainda antes de ele surgir, quando, nas estrofes 37 e 38 do canto V, se forma uma
«temerosa nuvem negra», acompanhada dos bramidos do mar irado. Este aspeto negro e carregado do céu
e do mar funciona como uma espécie de presságio, anunciando qualquer coisa de temível, que vem a
corporizar-se no Adamastor.
A sua imagem traduz as dificuldades sentidas pelos navegadores na passagem do oceano Atlântico para o
oceano Índico, ao dobrarem o cabo das Tormentas, mais tarde da Boa Esperança. É mais um processo de
enaltecimento, ao encarnar a vingança dos elementos naturais face à audácia dos navegadores portugueses,
que se atreviam a penetrar em espaços até então inacessíveis ao homem.
Na primeira parte do seu discurso, o Adamastor apresenta-se como senhor do mar desconhecido,
ameaçando os portugueses, que queriam devassar os seus domínios secretos, e profetizando para eles
duros castigos futuros. Na segunda parte do seu discurso, o Adamastor, identificando-se com o cabo
Tormentório e elogiando-se por ter conseguido o domínio dos mares, logo se abre em confidências,
revelando os acontecimentos que o levaram até àquele estado. A sua paixão por Tétis mereceu o castigo
dos deuses, que converteram o seu gigantesco corpo no cabo das Tormentas.
O Adamastor surge, no poema de Camões, como uma criação maravilhosa, a corporizar e simbolizar a
quase intransponível força do mar. O gigante é, pois, o símbolo das forças cósmicas que continuamente
limitam o homem. A vitória sobre o obstáculo que este gigante constitui significa o completo domínio dos
mares pelos portugueses
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