condenatório, liquidatório e executório Unificação dos processos

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MODERNIZAÇÃO DO DIREITO
Unificação dos
processos
condenatório, liquidatório
e executório
R. CEJ, Brasília, n. 13, p. 31-49, jan./abr. 2001
31
Domingos Franciulli Netto*
Painelista
RESUMO
Opina que não basta apenas a reforma, em matéria penal e civil, da legislação pátria, para desafogar o excesso de demandas nos tribunais superiores, mas há
necessidade, sobretudo, de vontade política. Em matéria penal, sugere reformulação do inquérito, das penas e do sistema penitenciário. Em matéria cível, sugere
reformas no processo de execução e no sistema recursal. Tece críticas à criação dos juizados especiais. Para desafogar os tribunais superiores, defende a valorização dos
juízos inferiores e a definição mais precisa de questões federais e constitucionais. No que tange à unificação dos processos, defende a proposta do Ministro Humberto
Gomes de Barros, que preconiza a prolação de sentença líquida e de plano exeqüível. Sugere, ainda, modificações na qualificação do domicílio para fins de citação; a
adoção do princípio da sanabilidade das nulidades; a modificação do conceito de decisão interlocutória; e a reforma no sistema de provas periciais no processo de
conhecimento. Aponta aspectos negativos da Emenda Constitucional n. 30, de 13/09/2000.
PALAVRAS-CHAVE
Reforma do Judiciário; processo de execução; recursos; processo de conhecimento; Código de Processo Penal; Código de Processo Civil; Direito Processual; Direito
material; sentença líquida.
O
próprio título deste Fórum de
Debate sugere o descompasso entre a concretização do
Direito e os anseios da sociedade,
que, de modo geral, se vê frustrada
com a operacionalização do sistema
judiciário.
A ninguém é dado ignorar que a
prestação jurisdicional brasileira ficou
superada e se apresenta anacrônica
para responder ao apelo de camadas
cada vez maiores da população cada
dia mais conscientes de seus direitos
individuais e sociais.
É paradoxal que tal ocorra justamente numa época em que se alardeia
a necessidade de um processo de
resultados e da própria efetividade do
processo.
O movimento renovador surgiu
no Brasil depois da vinda do ilustre
jurista italiano Enrico Tullio Liebman, no
início do decênio de 1940, período em
que se formou a chamada Escola Processual de São Paulo, da qual faziam
parte José Frederico Marques, Celso
Neves, Moacir Amaral Santos, Luiz
Eulálio Bueno Vidigal, Bruno Afonso de
André, Alfredo Buzaid e outros. Dos
representantes mais modernos, foram
meus diletos colegas até a Desembargadoria de São Paulo, mas, hoje
ilustres advogados, os preclaros juristas Cândido Rangel Dinamarco e
Kazuo Watanabe. Ambos insistem num
processo de resultados e na sua própria efetividade.
Não tenho muita ilusão, porque,
nos idos dos meus vinte anos, os processualistas me ensinaram, segundo a
origem etimológica da palavra, que
processo era um andar para frente. Ora,
o radical “cesso” pode redundar em
acesso e recesso, mas processo é andar para frente. Depois, qual a minha
decepção ao ver o que de ordinário
acontece. O processo anda praticamente para todos os lados, mas mui
vagarosamente para frente.
As causas do atual estado de
coisas são muitas, sem dúvida. Para
debelá-las, acenaram com a Reforma
do Poder Judiciário, ora em tramitação
no Congresso Nacional. A despeito de
pouquíssimos – perdoem a sinceridade
– aspectos positivos nela contidos, a
verdade é que, se passar como projetada, pouco contribuirá para uma
prestação jurisdicional moderna e mais
eficiente.
A continuar a situação presente,
dentro de pouco tempo, os tribunais
superiores de nossa pátria estarão total
e irremediavelmente inviabilizados.
Para se ter uma pálida idéia do
que vem acontecendo, basta atentar
para alguns dados estatísticos.
Ao excelso Supremo Tribunal
Federal, composto por onze ministros,
de janeiro a agosto de 2000, foram
distribuídos 46.883 recursos, dos quais
foram julgados 46.001; ao egrégio
Superior Tribunal de Justiça, com trinta
e três membros, trinta dos quais estão
na função jurisdicional, propriamente
dita, foram distribuídos, no mesmo
período de oito meses, 83.919 recursos,
dentre os quais foram julgados 81.273.
A última Corte, que é o vértice dos
tribunais do País em matéria infraconstitucional, apenas no mês de agosto de
2000, julgou 17.438 recursos, o que
representa a média de 581,2666
decisões colegiadas e monocráticas
para cada Ministro (17.438 ¸ 30), incluídos os julgamentos da Corte Especial. No mês de agosto de 2000, a
egrégia Primeira Seção do Superior
Tribunal de Justiça (Seção de Direito
Público), integrada por dez ministros,
incluído este expositor, julgou 10.061
recursos, o que significa a média de
1.006,1 decisões para cada ministro.
É verdade que, para atingir esse
número, vários ministros prejudicaram,
total ou parcialmente, suas férias (é
evidente que essa marca não seria
atingida se não existissem decisões
repetitivas, as do “FGTS da vida”).
Mesmo nas questões repetitivas, como não é dado ao juiz ou ao
Ministro assinar em cruz, sempre há
necessidade de conferência, ainda que
as matrizes estejam armazenadas nos
computadores. Desses feitos, mais de
2/3 (dois terços) envolvem entes públicos, por mais incrível que possa
parecer. A razão está presa ao endividamento cada vez mais insuportável
da União, dos Estados-membros e dos
Municípios, incluídas, em todos esses
graus, as autarquias.
O saudoso Prof. José Horácio
Meirelles Teixeira costumava prelecionar a seus alunos da Faculdade de
Direito da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo que à Administração
não era dado litigar por litigar: Na hierarquia dos princípios que devem nortear os atos administrativos, reservava
o ápice ao princípio da legalidade e ao
princípio da moralidade. Quanto ao
contencioso, não admitia que a Administração ingressasse com ação
temerária; ao contestar, deveria, com
fidelidade absoluta, relatar a matéria de
_________________________________________________________________________________________________________________
*
Texto revisado pelo autor, baseado em conferência proferida no Fórum de Debate sobre Modernização do Direito, promovido pelo Centro de
Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal, Associação dos Magistrados Catarinenses e Escola de Magistrados de Santa Catarina,
no Balneário Camboriú-SC, de 9 a 11 de novembro de 2000.
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fato; por fim, recorrer apenas nos casos
de dúvida razoável. Um Poder Público
não pode assoberbar o trabalho de outro,
finalizava, contra os princípios e o bem
comum1.
Para se ter idéia do peso moral
da lição supra transcrita, é suficiente
lembrar o episódio que passo a relatar:
o ilustre mestre lecionou Direito Constitucional na Faculdade de Direito da
Pontifícia Universidade Católica de São
Paulo, da segunda metade dos anos
quarenta até a Revolução de 1964.
Exatamente na primeira aula depois
dessa revolução, acompanhado de
todos os alunos, retirou-se da sala de
aula, sob o fundamento de que passara
anos a fio ensinando que a nossa
Constituição era rígida e que qualquer
reforma precisava atender a muitas
exigências; mas, a partir daquele dia,
um simples e puro Ato Institucional
havia acabado com tudo o que ele havia
ensinado. Em decorrência de sua
honestidade intelectual, portanto, ele
rematou dizendo que não tinha mais o
que fazer naquela faculdade. Pediu
licença para retirar-se de sua derradeira
aula e não mais retornou a lecionar até
o ano de 1972, quando faleceu na
plenitude de suas forças intelectuais,
aos 65 anos de idade.
Desafogar o Poder Judiciário
depende, e muito, de vontade política.
Basta a Administração Pública, direta
e indireta, de qualquer dos Poderes da
União, dos Estados, do Distrito Federal
e dos Municípios, cumprir os princípios
que se encontram insculpidos no caput
do art. 37 da Carta Política de 1988.
Todos os ensinamentos dos administrativistas, que eram apenas teóricos,
foram cristalizados e colocados no
caput desse dispositivo: legalidade,
moralidade etc.
A Administração não pode continuar pretendendo resolver ou procrastinar seus crônicos problemas de caixa
servindo-se do Poder Judiciário. Mas,
para isso, não basta apenas a ampla
reformulação, em matéria penal e civil,
de nossos códigos. Há, sobretudo,
necessidade de vontade política de
nossos homens públicos.
A matéria penal não é exatamente, no momento, assunto da minha
área. Já defendi anos a fio na minha
vida que na Justiça Penal, em minha
modesta ótica, tem de haver radical
modificação nas duas extremidades:
na ponta inicial o inquérito, hoje sem
dúvida obsoleto, precisa ser substituído, gradativamente, pelo juizado de
instrução; no lado final, faz-se necessário reformular as penas e o sistema
penitenciário. Quanto às primeiras, com
a ampliação das penas alternativas e
R. CEJ, Brasília, n. 13, p. 31-49, jan./abr. 2001
Desafogar o Poder
Judiciário depende, e
muito, de vontade política.
Basta a Administração
Pública, direta e indireta,
de qualquer dos Poderes da
União, dos Estados, do
Distrito Federal e dos
Municípios, cumprir os
princípios que se
encontram insculpidos no
caput do art. 37 da Carta
Política de 1988. (...)
A Administração não pode
continuar pretendendo
resolver ou procrastinar
seus crônicos problemas de
caixa servindo-se do Poder
Judiciário.
com a introdução de penas substitutivas das penas privativas de liberdade
para aqueles delitos em que a verdadeira punição deve exteriorizar-se no
esvaziamento patrimonial obtido, por
seus autores, de forma ilícita. Algumas
penas atuais deverão ser substituídas
por penas mais modernas que possam
ser realmente sentidas, mormente
pelos chamados criminosos de colarinho branco, os que causam desfalque
patrimonial: penas antes e acima de
tudo voltadas para o ressarcimento do
dano causado ao patrimônio público
ou particular.
Há de ser modernizado o sistema penitenciário para a reclusão dos
autores de crimes com violência contra
a pessoa, nesse aspecto incluída a
preparação técnica dos agentes penitenciários, a par da construção ou
remodelação dos presídios existentes.
Em relação à superlotação de
cadeias, relato uma experiência pessoal. Quando era juiz de Guaratinguetá,
nas funções de Corregedor da Polícia
e dos presídios, em 1970, fui fazer uma
visita correicional à cadeia pública
local e fiquei chocado com o número
de presos que se encontravam “enlatados” em cada cela. Depois de medir
a capacidade para colocação de
colchões, determinei a proibição da
permanência de mais de quatro presos
em cada cela. A superlotação devia-se
ao fato de que as comarcas circunvizinhas estavam com suas cadeias
interditadas, sob os mais amplos pretextos possíveis: por exemplo, em
Cunha, havia ocorrido uma crise de
hepatite; em Aparecida do Norte, a
cadeia poderia afugentar fiéis; em
Cruzeiro, as vidraças do presídio,
quebradas, não tinham sido repostas;
em Alhures, os esgotos da cadeia
estavam entupidos etc. Deus e minha
mulher Maria Thereza sabem as pressões que eu sofri: volta e meia, até de
madrugada, recebia telefonemas para
abrir exceções à Portaria ou ao Provimento que baixara, com pedidos de
transferência de presos. Embora se
tratasse de função precípua do Delegado Diretor da cadeia, só consegui
manter a decisão graças ao respaldo
que tive do saudoso desembargador,
depois Ministro do excelso Supremo
Tribunal Federal, Rodrigues de Alckimin, que então exercia as nobilitantes
funções de Corregedor-Geral de Justiça
do Estado de São Paulo. Menciono
esse episódio porque foi retratado pelos jornais da época.
Já que existe a pena de reclusão, tem-se de oferecer condições
mínimas de sobrevivência digna ao
presidiário, que nunca deixa de ser
uma pessoa humana, enfoque que não
pode ser levado ao extremo de se dar
regalias aos presos e, muito menos, o
controle das cadeias.
Em relação à matéria não-penal,
sem embargo de nosso excelente
Código de Processo Civil, do ponto de
vista doutrinário, a verdade é que, na
prática, ninguém mais agüenta o cipoal hirsuto a que levam suas normas,
principalmente no que diz respeito ao
processo de execução, hoje inteiramente obsoleto e complicado, e ao
sistema recursal, que precisa urgentemente de profunda racionalização.
Copiamos em boa parte o sistema italiano e ficamos atados ao romantismo lusitano, despercebidos de que,
no Brasil, dadas as suas peculiaridades e a explosão demográfica, não
poderiam na prática funcionar leis
que, em países de equilíbrio estável
entre o índice de natalidade e o de
mortalidade, já não se notabilizavam
pela agilidade pragmática da prestação jurisdicional.
O ilustre Ministro Francisco Peçanha Martins, em sua palestra neste
mesmo Simpósio, com a verve que o
notabiliza, disse que os processualistas construíram uma verdadeira catedral, por cujos portais não passam os
33
pobres. Eu diria que se parece igualmente com a casa-grande. Se não funciona nesta, que pelo menos funcione
nas senzalas. As senzalas, no caso, são
Juizados Especiais de Pequenas Causas e a pretora de medidas cautelares,
liminares e tutelas antecipadas.
Critiquei o primeiro projeto dos
juizados de pequenas causas, nos idos
de 1979 2. Entendi que não havia
sentido a criação de um juizado à parte,
pois o correto era apanhar as varas já
existentes e a elas atribuir a matéria do
juizado, ainda que com expediente em
horário diferente: por exemplo, das 18
às 22 horas e, quem sabe, aos sábados. Não havia razão em criar mais uma
estrutura dentro de outra obsoleta. Não
há culpar somente os processualistas.
O Judiciário ficou, durante dez anos,
com o poder de legislar em matéria de
organização judiciária e as nossas leis
de organização judiciária, não acompanham as leis processuais. O exemplo mais frisante desse fato é o seguinte: hoje há o julgamento antecipado. Casos de julgamento antecipado, não raro, são julgados antes do
processo sumário, que obriga haver
audiência; mas como as pautas estão,
de ordinário, assoberbadas, as audiências são marcadas para dali a três, quatro ou cinco meses. Por que então haver
sumário e ordinário em uma única unidade judiciária se, na prática, o ordinário, muitas vezes, é mais rápido que
o sumário? Não seria melhor a criação
de varas apenas para processos sumários, como defende o ilustre Ministro
Sálvio de Figueiredo Teixeira3 ?
Para desafogar os Tribunais
Superiores, de minha parte, como mero
artesão, aplicador do Direito (não tenho
curso de Mestrado nem de Doutorado,
somente a experiência do dia-a-dia,
beirando os 40 anos de atividade
forense, 33 dos quais como magistrado), penso que, entre as soluções
possíveis, evidencia-se aquela voltada
para a revalorização dos Juízos de
primeiro grau, dos Tribunais Estaduais
e dos Tribunais Regionais.
Não é possível persistir no atual
sistema, a possibilitar, em tese, na maior
parte das vezes, o pronunciamento do
Superior Tribunal de Justiça ou do Supremo Tribunal Federal, ou de ambos.
Não há razão plausível para confundir questão federal com questão
nacional. Continuadas embaralhadas
essas questões, permanecerão avolumando os serviços dos Tribunais
Superiores decisões que perfeitamente
poderiam morrer nos Tribunais locais.
Nada está a justificar que subam ao
Superior Tribunal de Justiça disputas
por quatro minhocas, decorrentes de
34
briga entre cachorros e papagaios ou
sobre permanência de cães e outros
animais domésticos em apartamentos.
Seja qual for a solução, essas
causas simples, ainda que ofendam a
legislação federal, não são causas de
interesse nacional.
Na verdade, copiou-se o sistema federativo dos Estados Unidos
da América na parte orgânica e política, mas se transportou para o nosso
meio jurídico o sistema europeucontinental.
De outra parte, deve-se conceituar o que de fato representa eventual ofensa à Constituição. Não vejo
porque achar, agora no que tange ao
excelso Supremo Tribunal Federal, que
em tudo há ofensa à Constituição. Tive
a oportunidade de enfrentar essa matéria no exame do FGTS. Penso que
uma coisa é haver infringência à Constituição da República e a princípio nela
consagrado. Outra coisa é aferir se foi
aplicado o direito, segundo a lei federal
vigente, ainda que, para tanto, seja
necessário levar em conta matéria albergada no Texto Maior. Na maior parte
das vezes, a questão pode e deve ser
conhecida unicamente sob o ângulo
infraconstitucional4. Perdoe-me a falta
de modéstia, porém tive a honra de ter
esse pensamento reproduzido no voto
do ilustre Ministro Celso de Mello,
quando, também, o Supremo apreciou
a questão do FGTS:
Afigura-se-me inteiramente procedente, neste ponto, a afirmação do
eminente Ministro Franciulli Netto, do
Superior Tribunal de Justiça (DJU de 11/
04/00, seção 1, p. 193), para quem “uma
coisa é haver infringência à Constituição
da República, a princípio nela consagrado, outra coisa é aferir se foi aplicado
o direito segundo a lei federal vigente”,
especialmente quando “a questão pode
e deve ser conhecida, unicamente, sob
o prisma estrito da legislação federal...”5.
Em nossa história, já tivemos um
Direito local, que era o Direito praticado
nos aldeamentos dos índios, com
regras próprias, que funcionava relativamente bem. No mesmo passo, tivemos também um Direito local nos
quilombos. Ninguém estudou a fundo
esses direitos que atenderam às necessidades de uns e de outros. Fomos
nos ater apenas às ordenações do
Reino para proibir o cidadão de entrar
com “barrigã” (amante) na Corte. O
direito nascido em nosso país foi
deixado de lado.
Antes de ingressar no tema da
unificação dos processos, não há como
olvidar outras medidas.
A simplificação dos recursos e
dos graus de jurisdição é tão ou mais
importante do que a informatização.
Esta é imprescindível nos dias que
correm, mormente em termos de comunicação e por diversas outras e
importantes razões, que extravasam os
limites desta palestra. Mas não é suficiente depositar todas as fichas apenas na informatização, na expectativa
de uma prestação jurisdicional mais
rápida e eficiente.
Não tenho nenhuma ojeriza ao
computador. Ao reverso, fui Coordenador de Informática do Tribunal de
Justiça do Estado de São Paulo, seguindo as trilhas e os nortes traçados
pelo saudoso Desembargador Dínio de
Santis Garcia, homem que viveu adiante de seu tempo.
Aliás, por falar em cibernética,
abro um parêntese para lembrar que
precisamos ultrapassar a fase da
“doença infantil” do uso do computador. Não há nenhuma justificativa válida para que se verta para o papel
quase tudo o que se encontra armazenado na memória do computador.
Brinquei outro dia asseverando que o
processador de texto nas mãos de um
tributarista é uma arma.
No contexto da unificação dos
processos, propriamente dita, entre as
sugestões que ultimamente têm sido
feitas, há de ser pensada e refletida a
de autoria do ilustre Ministro Humberto
Gomes de Barros, convertida em projeto de lei, a preconizar a prolação de
sentença líquida e de plano exeqüível,
o que se afigura perfeitamente viável.
Sob o prisma doutrinário, a ninguém é
dado ignorar a contribuição de Enrico
Tullio Liebman, seus discípulos e seguidores. A monografia do primeiro,
Processo de Execução6, é obra do mais
alto coturno. Na prática, contudo, a
exagerada autonomia do processo de
execução tem sido alvo das mais acerbas críticas, por ensejar, na verdade,
praticamente, uma nova ação, a começar pela necessidade de citação do
executado. Nas últimas reformas, chegou-se a verdadeiras preciosidades,
com a criação de atalhos que acabaram por comprometer a estrutura primeva do Código de Processo Civil.
Para citar apenas um aspecto,
por exemplo, esqueceram-se de que
tivemos inúmeros planos econômicos
e uma pletora de índices ou coeficientes de correção, sem falar na sucessiva supressão de zeros. O que os
processualistas modernos fizeram?
Pura e simplesmente acabaram com o
contador e ressuscitaram a memória de
cálculo. O que aconteceu? Os grandes
escritórios de advocacia servem-se de
assessorias altamente qualificadas e,
como tal, apresentam contas desdoR. CEJ, Brasília, n. 13, p. 31-49, jan./abr. 2001
bradas em itens e subitens, sempre
com emprego de índices e critérios que
lhes são favoráveis, enquanto a Fazenda nada diz ou, quando não, oferece
impugnação genérica e abstrata sem
especificar eventuais erros. O juiz, que
de ordinário, não pode ver aritmética
nem pintada, homologa o cálculo em
decisão estereotipada, (...) para que
produza seus devidos efeitos de direito.
Não estou, com essa observação, querendo justificar nada, é evidente, muito menos tecendo loas às
decisões lacônicas, genéricas e abstratas, tais como: Defiro a liminar porque presentes o fumus boni iuris e o
periculum in mora, severamente e com
razão criticadas pelo insigne processualista baiano Calmon de Passos7.
Por falar em liminar, há profusão
de decisões com total inversão dos
valores. Sobre o tema, bem criticou um
dia o Desembargador paulista Edgar
Aparecido de Souza, hoje aposentado,
uma liminar que suspendera uma importante partida de futebol do Campeonato Paulista, depois de agendada, quase em cima da hora e com muitos ingressos vendidos: por que não a
realizar e, depois, se fosse o caso, aplicar as cominações legais? – a um tempo perguntando e respondendo.
Em decorrência da demora na
prestação jurisdicional, nada recomenda a concessão de liminares, a
torto e a direito, a par do uso desmedido da tutela antecipada, que está
criando a esdrúxula figura do “autor
procrastinador”, até então inédita na
vida forense. O autor, em alguns casos,
agraciado com a tutela, passa a criar
inúmeras dificuldades na tramitação
do processo, temendo o resultado final
da demanda. Afinal de contas, ainda
que justificável em casos especialíssimos, não há perder de vista que
tal tutela vulnera em cheio o princípio
do contraditório.
A proposta do ilustre Ministro
Humberto Gomes de Barros, se vier a
ter êxito, redundará, praticamente, na
unificação dos processos de conhecimento, quando condenatório, liquidatório e executório. A meu sentir, é
um verdadeiro “ovo de Colombo”.
Ainda que o processo de conhecimento dure mais, a fim de ensejar a
prolação de sentença líqüida e exeqüível, sempre será melhor que a
tormentosa execução (a exigir nova
citação), precedida de, não raro, complicada liquidação, a par de ensejar
incidentes de toda sorte.
A unificação poderá ser gigantesco passo em direção da modernização do Direito. Tudo sem embargo
de se repensar acerca de alguns ponR. CEJ, Brasília, n. 13, p. 31-49, jan./abr. 2001
A unificação dos
processos condenatório,
liquidatório e executório,
é verdade, poderá
determinar um curso
maior no processo de
conhecimento, repitase, o que, todavia ficará
muito aquém da demora
acarretada pelo sistema
atual, maxime se forem
lembrados os recursos
que podem ser opostos
nas diversas fases hoje
existentes.
tos de estrangulamento do procedimento, tais como: a citação, as nulidades, as decisões interlocutórias e as perícias. Não contente com o excesso de
formalidades para a citação na fase de
conhecimento, exige-se nova citação
na de execução, o que se não compraz
com as necessidades hodiernas.
Parece que tudo foi engendrado
para obrigar o autor, o exeqüente, a
correr atrás do réu, do devedor.
Quanto à citação, há de se redesenhar o atual sistema para a realidade de há muito existente em nossa
sociedade. Até parece que o domicílio
e a residência das pessoas físicas não
fazem parte da correspectiva qualificação, como extensão dos atributos
de sua personalidade, se for levado em
conta o habitat predominantemente
fixo, certo e determinado de cada
pessoa, uma vez que nossa civilização
não é nômade. As pessoas têm residência estável. O homem moderno se
estabelece, seja para morar seja para
trabalhar, em determinado ponto
geográfico.
Nossa sociedade não é uma
sociedade de ciganos. De regra, todos
tem endereço e fixação certa. Até o
vaqueiro, segundo Câmara Cascudo,
é um homem “arruado”8.
O homem médio, o bonus pater
familias, ao transferir seu domicílio ou
sua residência, faz certo alarde disso,
pelo menos no círculo de suas relações.
Ora, com muito maior razão deve assim
proceder aquele que contraiu obrigações ainda pendentes, sob pena de
arcar com as conseqüências decorrentes de sua omissão.
Urge adotar, por outro lado, o
princípio da sanabilidade das nulidades. Todas, sem exceção, devem
precluir: pelo silêncio das partes; pela
efetiva consecução do escopo do ato,
não obstante a sua irregularidade; finalmente, pela aceitação, ainda que
tácita, dos efeitos do ato, a despeito
da eiva, como, aliás, consta da exposição de motivos do Ministro da Justiça ao apresentar o projeto que se
converteu no atual Código de Processo Penal9.
Conhecemos todos os malefícios que ocasionam as nulidades não
alcançadas pela preclusão e tantas
outras astuciosamente guardadas para
o “pulo do gato”.
O conceito de decisão interlocutória, igualmente, tal qual previsto
no art. 62, § 2o, do Código de Processo
Civil, a dar azo ao recurso de agravo,
nos termos do art. 522 do mesmo
estatuto processual, a meu sentir, deve
ser repensado, para obviar a enxurrada
de agravos. Decisão interlocutória deve
ser apenas aquela que causar efetivo e
irreversível prejuízo, se acobertada
pela preclusão.
Por derradeiro, quanto ao processo de conhecimento, outro terrível
obstáculo à celeridade dos atos processuais é a prova pericial, matéria que
estaria a exigir palestra à parte. Tomo,
a título de mera ilustração, o que se
passa com uma simples avaliação de
imóvel, cujos laudos mais parecem
páginas extraídas de compêndios de
matemática superior: fórmulas de
Berrini, fator testada, fator profundidade, fator esquina, fator elasticidade,
média ponderada dos paradigmas,
expurgo de elementos discrepantes e
o diabo a quatro. Pois bem: qualquer
corretor de imóvel experiente e idôneo,
com uma simples vistoria, fornece de
pronto o valor real de mercado desse
bem. Existem organizações que oferecem tais serviços.
Em matéria de avaliação de
automóveis, muitos juízes adotam
critérios práticos e úteis como a coleta
de valores oferecida por revistas ou
jornais especializados, com resultados
excelentes.
35
Do Direito Comparado, extraemse legislações que determinam a juntada de parecer técnico pelas partes,
ainda na fase postulatória. Esclarecida
a matéria na aferição da prova, tornase, muitas vezes, desnecessária a
nomeação de perito, o que obvia a demora do trâmite processual.
A unificação dos processos
condenatório, liquidatório e executório,
é verdade, poderá determinar um curso
maior no processo de conhecimento,
repita-se, o que, todavia ficará muito
aquém da demora acarretada pelo sistema atual, maxime se forem lembrados os recursos que podem ser opostos nas diversas fases hoje existentes.
Com o novo sistema, é evidente
que o autor empenhar-se-á, em busca
da sentença condenatória líquida e
exeqüível, em fornecer os dados que
forem necessários ao julgador para a
sentença líquida.
A unificação dos processos é
algo que se impõe até por uma questão
de logicidade. Não é de hoje que
muitos perceberam que não faz sentido
obrigar o credor, já portador de uma
sentença que lhe é favorável, a enfrentar a via crucis de um novo processo.
Tive um aluno, em 1972, que se chamava Rivero (não me lembro de seu
prenome). Tratava-se de um espanhol,
naturalizado brasileiro, que passou a
cursar Direito, depois de aposentado,
para realizar um sonho de sua juventude. Um dia pediu-me para que lhe
explicasse as fases do processo de
execução, o que penso ter conseguido,
sem grandes pretensões, uma vez que
minha cadeira lá na Faculdade de
Direito da Pontifícia Universidade de
Campinas era de Direito Civil: há necessidade de nova citação, penhora, embargos disso, embargos daquilo etc.
Rivero ouviu atentamente, fez algumas
indagações e depois, com a maior
naturalidade do mundo, concluiu: Isso
é tudo o que o devedor pediu a Deus.
Retruquei: Não ponha Deus nisso; Ele
criou o Direito material; o Direito Processual é coisa do diabo.
Todos conhecem a trilogia de
Descartes: penso, logo existo, duvido,
logo existo e sou enganado, logo existo.
Nenhum ser mortal, que tenha passado
pela agrura de ser exeqüente, com
certeza, duvida da última frase dessa
famosa trilogia.
De início, segundo programação original, eu deveria aqui me ocupar do tema sobre precatórios. Mas, o
ilustre Ministro Humberto Gomes de
Barros, usando seu sexto sentido,
substituiu-o pelo ora aqui desenvolvido. A providência divina quis pouparme, mercê de tão sábia alteração,
36
uma vez que, a persistir o tema anterior, provavelmente iria sair matéria que
não poderia ser publicada, tal a indignação que me causa a recente
Emenda Constitucional n. 30, com seu
abominável facilitário de dez anos,
previsto no art. 2º, que acresceu ao
Ato das Disposições Constitucionais
Transitórias (ADCT) o art. 78.
Combati, qual Dom Quixote, nos
limites de minhas singelas forças, o art.
33 do ADCT, quanto à sua aplicabilidade em matéria de desapropriações,
uma vez que, no corpo permanente da
mesma Carta Política, encontrava-se
insculpido o princípio do preço justo e
prévio, para indenizações desse jaez.
O que então defendi foi a inaplicabilidade desse art. 33 às desapropriações, mas jamais disse que se
tratava de norma inconstitucional, por
saber de sobejo ser controvertida a
possibilidade de existência de inconstitucionalidade de normas constitucionais10. Meu modesto ponto de vista,
contudo, não prosperou.
É desolador ver o que disciplina
a recente Emenda Constitucional n. 30,
de 13/09/2000, ao inserir no Ato das
Disposições Constitucionais Transitórias, o art. 78, a possibilitar aos precatórios pendentes na data de sua promulgação e os que decorram de ações
iniciais ajuizadas até 31 de dezembro
de 1999, a sua liqüidação pelo seu valor
real, em moeda corrente, acrescido de
juros legais, em prestações anuais,
iguais e sucessivas, no prazo máximo
de dez anos.
É incrível que tal tenha ocorrido,
depois da malograda experiência do
art. 33 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, que possibilitou
a liqüidação dos débitos estatais no
prazo de até oito anos e de nada adiantou para a moralização da liqüidação
da dívida pública. Os problemas de
caixa dos entes públicos não foram
resolvidos, mas a situação dos credores, de certo, foi muito agravada.
Essa desastrada nova colher de
chá acabará por neutralizar, em boa
parte, alguns aspectos indiscutivelmente positivos contidos na referida
Emenda, entre os quais podem ser
evidenciados os seguintes: a) atualização dos valores dos precatórios,
apresentados até 1o de julho, na data
de seu pagamento, a ser feita até o final do exercício seguinte; b) enumeração taxativa dos créditos alimentícios,
disciplinados em dispositivo apartado;
c) consignação das dotações orçamentárias e dos créditos abertos diretamente ao Poder Judiciário, cabendo
ao Presidente do Tribunal que proferir
a decisão exeqüenda determinar o
pagamento segundo as possibilidades
do depósito, e autorizar, a requerimento do credor, e exclusivamente para o
caso de preterimento de seu direito de
precedência, o seqüestro da quantia
necessária à satisfação do débito.
Até a generosidade dessa
Emenda n. 30, ao reduzir o prazo de
dez para dois anos, nos casos de precatórios judiciais originários de desapropriação de imóvel residencial do
credor, desde que único à época da
imissão na posse, é de corar um frade
de pedra, se for lembrado que se
tratava de único imóvel a servir de
residência do credor.
Mas não ficou tal emenda apenas nisso. Veja-se a redação dada ao §
5º do art. 100 da Constituição Federal:
§ 5º – O Presidente do Tribunal
competente que, por ato comissivo ou
omissivo, retardar ou tentar frustrar a liqüidação regular de precatório, incorrerá em crime de responsabilidade.
Comparem essa redação definitiva com o que dizia o projeto:
O descumprimento das providências a que aludem os parágrafos
anteriores, pelo Presidente do Tribunal,
constituirá crime de responsabilidade,
em que também incorrerá o Chefe do
Poder Executivo que obstar ou tentar
frustrar, por qualquer meio de liqüidação regular do precatório, sem prejuízo
das sanções civis e penais cabíveis e
da intervenção nos Estados, no Distrito
Federal e nos Municípios.
Injustificadamente excluíram do
crime de responsabilidade o Chefe do
Poder Executivo.
Por fim, o descumprimento das
decisões judiciais, hoje em dia, não se
compraz com o Estado democrático de
Direito.
Em suma e para concluir, essas
são as singelas considerações que me
ocorreram apresentar, nesta oportunidade, sem quaisquer ressaibos de
academicismo. Foram aqui lançadas
como modesta contribuição para o
debate e para a maior reflexão sobre o
tema. Partiram de quem está absolutamente convicto de que a unificação
dos processos condenatório, liquidatório e executório em muito contribuirá
para maior eficiência da sempre almejada prestação jurisdicional justa.
Embora não podendo singrar a
matéria em maior profundidade, sumamente honrado com o convite para esta
palestra, procurei suprir minhas naturais deficiências com a vivência haurida
de meus anos vividos. Sou um sexagenário e posso entrar em qualquer
clube da terceira idade como sócio remido. Ainda que cada vez mais desencantado, procuro ser fiel ao meu ideal.
R. CEJ, Brasília, n. 13, p. 31-49, jan./abr. 2001
Aos colegas, nada tenho a ensinar nem
a dizer de muito proveitoso; aos estudantes que aqui se encontram, terminando por onde comecei, quero lembrar: Ouçam tudo o que seus mestres
lhes ensinaram, mas não acreditem em
tudo. Eu, um dia, acreditei que o processo era um andar para frente e deu
no que deu.
NOTAS BIBLIOGRÁFICAS
1 TEIXEIRA, José Horácio Meirelles. Apresentação. In: TEIXEIRA, José Horácio Meirelles. Curso de Direito Constitucional. Rio
de Janeiro: Forense Universitária, 1991. XXII,
785 p. (Biblioteca Jurídica) . XIII.
2 FRANCIULLI NETTO, Domingos. Parecer
sobre o Anteprojeto do Juizado Especial de
Pequenas Causas. Julgados dos Tribunais
de Alçada Civil de São Paulo. São Paulo, v.
77, 1983. p. 410-420.
3 TEIXEIRA, Sálvio de Figueiredo. Comentário
ao art. 281. In: TEIXEIRA, Sálvio de Figueiredo.
Código de Processo Civil Anotado. 6. ed. São
Paulo: Saraiva, 1996. p. 205.
4 Decisão proferida pelo subscritor, nos AG
n. 280.903, AG n. 278.538, AG n. 245.757,
AG n. 244.849 e AG n. 238.323, todos in
DJU de 11/04/00, seção 1.
5 RE n. 226.855-7/RS, fl. 1.029.
6 LIEBMAN, Enrico Tullio. Processo de Execução. 4. ed. Com notas de atualização do
Prof. Joaquim Munhoz de Mello. São Paulo:
Saraiva, 1980. 238 p.
7 PASSOS, Calmon de. Inovações no Código
de Processo Civil. 2. ed. Rio de Janeiro:
Forense, 1995. p. 66-67.
8 CASCUDO, Luis da Câmara. Vaqueiros e
cantadores – folclore poético do sertão de
Pernambuco, Paraíba, Rio Grande do Norte
e Ceará. S.l.: Ediouro, 2000. p. 378.
9 RIBEIRO, Antônio de Pádua. Reflexões Jurídicas: palestras, artigos e discursos. Brasília:
Brasília Jurídica, 2000. 683 p. p. 259.
10 FRANCIULLI NETTO, Domingos. Desapropriação – O aparente conflito entre o art. 33
das Disposições Transitórias e o art. 5º, inc.
XXIV, ambos da Constituição da República.
Revista de Jurisprudência do Tribunal de
Justiça do Estado de São Paulo, Lex, v. 24,
n. 126, p. 23-25, set./out.1990.
Humberto Gomes de Barros’s proposal which
recommends the utterance of feasible
settlement judgements. Further, it suggests
modifications to the legal definition of domicile
for citation purposes; the adoption of the
principle of reparation for annulments;
modification of the concept of interlocutory
order; reform of the expert specialist evidence
system in the discovery process. This paper
also looks at negative aspects of the
Constitutional Amendment n. 30, dated 13/09/
2000.
KEYWORDS – Judiciary Reform; the
execution proceeding; appeals; discovery
process; Penal Procedural Code; Civil
Procedural Code; procedural law; Judicial
norms; liquidation of any amounts involved in a
final judgement.
ABSTRACT
This paper considers that civil and penal
reform in the country’s legislation does not
suffice to reduce the pile up of cases in the
high courts. What is needed above all is the
political will. In terms of penal reform, it suggests
the reformulation of legal inquiries, penalties
and the penitentiary system. With respect to
civil issues, it proposes modifications to the
execution proceeding and appeal system. It
expresses critical reservations regarding the
creation of Special Small Claims Courts. In
order to ease up the high courts, it supports the
valuing of inferior court and a clearer defining
of federal and constitutional issues. As regards
the unification of procedures, it defends Minister
R. CEJ, Brasília, n. 13, p. 31-49, jan./abr. 2001
Domingos Franciulli Netto é Ministro do
Superior Tribunal de Justiça.
37
Honildo Amaral de Mello Castro*
Painelista
RESUMO
Sugere uma série de modificações de caráter processual voltadas à modernização do Direito brasileiro. Inicia com uma reflexão filosófica acerca dos conceitos de
Justiça, no entender de Platão, e de Lei, na visão de Locke e de Montesquieu. Em seguida, analisa as deficiências estruturais do Poder Judiciário. Apregoa que a
modernidade da prestação jurisdicional deve configurar-se sob tríplice aspecto: celeridade, segurança e exeqüibilidade. Propõe o aperfeiçoamento de três primados do
Direito: a federalização do acesso ao Judiciário, a supressão de recursos processuais e a federalização dos repasses financeiros.
PALAVRAS-CHAVE
Direito Processual Civil; reforma; processo condenatório; processo executório; processo liquidatório; condenação, execução, liquidação; unificação; Filosofia do Direito;
Platão; Locke; Montesquieu; federalização; recurso processual – supressão; recurso processual – contenção.
1 UM BREVE ESCORÇO
FILOSÓFICO DO CONCEITO DE
JUSTIÇA PARA PLATÃO E IDÉIA DE
LEI PARA LOCKE E MONTESQUIEU
El derecho es una proporción real
y personal, de hombre a hombre,
que cuando es observada protege
a la sociedad y cuando es
corrompida la corrompe 1.
S
anto Agostinho, ao fazer reflexão
sobre a humanidade, na sua origem, criou as cidades “terrena e
a celestial”, denominando-as de “meus
dois amores”, fundamentando-as no
pensamento de que (...) o amor próprio
levado ao desprezo a Deus, a terrena; o
amor a Deus, levado ao desprezo de si
próprio, a celestial2, afirmando que a
cidade de Deus é dogma, pois não há
essência alguma contrária a Deus,
certo de que ao ser somente se opõe o
não-ser.
Na justiça revelada na evolução
da cidade dos homens, aquela cuja
criação no Genesis é atribuída a Caim,
cuja essência conceitualmente consiste em dar a cada um aquilo que é
seu e a faculdade de julgar segundo o
direito e melhor consciência, cuidaremos de encontrar o melhor caminho a
ser trilhado na luta pela preservação
da paz e na realização dos desejos da
humanidade, segundo o Direito.
Concebe-se, assim, Justiça a
partir da existência de uma sociedade, sem a qual inexistiria, mas cujo
conceito, na indagação “o que é
justiça?”, o homem nunca encontrará
resposta definitiva, devendo, como
cidadão, apenas perguntar melhor e,
como magistrado, aplicá-la melhor,
pois somente em nome de uma justiça
perfeita que seria moral afirmar pereat
mundus, fiat iustitia.
Passando pela filosofia idealista de Platão,, quando o mestre na Antigüidade grega distinguia entre o mundo das verdades e das essências, chamando-as de “idéias” para então dizer
(...) que são imutáveis, objetivas e universais – objeto da ciência, e o mundo
das “aparências” – que são cambiantes,
subjetivas e incertas – objeto de opinião.
As primeiras formam o mundo inteligível; as segundas, o mundo sensível,
que se busca visualizar na “Alegoria da
Caverna” onde (...) o mundo caverna
representa o mundo dos sentidos, ao
passo que o mundo diurno ou exterior
representa o mundo inteligível. Ambos
possuem a respectiva fonte de luz, ou
seja, a caverna é iluminada por um fogo,
enquanto o dia o é pela luz do sol; o
fogo representa o sol visível e que ilumina nosso mundo sensível, quanto ao
sol da alegoria, o bem que ilumina o
mundo inteligível, segundo os dois
níveis de realidade: um nível inferior de
sombras, de reflexos; e um nível superior de realidades verdadeiras3.
O conceito, a busca de obter e
realizar a Justiça há de estar contida
no mundo do dia, pois este é mais claro
e mais real do que o mundo caverna,
certo de que o mundo inteligível, por
ser diurno, é mais concreto do que o
mundo sensível na idéia do bem, assim
exposta por Platão: (...) a idéia do Bem
é objeto da ciência mais alta e é dela
que a justiça e as outras virtudes extraem
sua utilidade ou sua vantagem (...) sem
a posse do Bem, é inútil a posse do que
quer que seja4 e, por outro lado, (...) o
Bem é a fonte da vida no mundo inteligível. É a idéia do Bem que faz com que
existam as outras idéias5.
Concebendo-se à época a crença no racionalismo e a idéia de que o
universo é governado por leis inteligíveis, Platão desenvolveu uma
filosofia idealista na qual a experiência
direta exercida nos nossos sentidos
nada mais era do que um mundo de
sombras, reflexo de realidade no domínio do absoluto com abrangência às
impressões sensoriais imediatas.
O conceito de Justiça, assim,
está vinculado à idéia do mundo inteligível e associado à idéia do bem como
fonte do mundo diurno, em um nível
superior de realidades verdadeiras,
que só pode ser plenamente realizada
num Estado ideal governado por reisfilósofos, em que (...) a Justiça, tal como
representada pelas leis de determinados Estados, pode equivaler, no máximo,
à pálida sombra da justiça real. É evidente, pois, que Platão se distanciou da
posição de seu antigo mestre, Sócrates,
com sua reverência pelas leis de sua
terra pátria. Entretanto, Platão não concebeu a idéia superior de justiça como
uma forma de lei decretada pela natureza, a qual estava subordinada à lei feita
pelo homem. (...) ademais, a concepção
estática de justiça de Platão, como a da
maioria dos utopistas, envolvia uma
concepção totalitária de lei e de governo
da mais rígida e inflexível espécie6.
Hans Kelsen, referindo-se ao
verdadeiro sentido da alegoria da caverna, afirma que, para Platão, na esfera
do concebível, a idéia do Bem só se
mostra como cognoscível no fim, e a
muito custo, e que não é da verdade ou
da ciência que se fala nessa alegoria, mas
sim da Justiça e dos tribunais ao dizer
(...) que é no diálogo sobre a justiça, que é
o verdadeiro sentido, o conteúdo essencial da idéia, o que unicamente, de fato
importa a Platão. Justiça, e não a verdade7.
__________________________________________________________________________________________________________________
*
Texto produzido pelo autor, baseado em conferência proferida no Fórum de Debate sobre Modernização do Direito, promovido pelo Centro de
Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal, Associação dos Magistrados Catarinenses e Escola de Magistrados de Santa Catarina,
no Balneário Camboriú-SC, de 9 a 11 de novembro de 2000.
38
R. CEJ, Brasília, n. 13, p. 31-49, jan./abr. 2001
Ainda segundo Kelsen, a República começa e termina com o mito de
retribuição no além, o qual se transforma numa moldura reunindo e determinando tudo o mais que é dito sobre
a justiça, o que nos faz ver no diálogo
que Sócrates mantém com o velho
Céfalo e no qual, por assim dizer, soa o
acorde fundamental de toda a obra:
O que te parece ser o maior dos
bens cuja fruição te proporcionou a
posse de tua grande fortuna?, pergunta
Sócrates.
E, da resposta de Céfalo, concluise que se trata da virtude da Justiça, e
que sua lei objetiva é a paga no além.
Na opinião de Céfalo, a riqueza nos permite, em grande medida, não iludir ou
enganar pessoa alguma, e assim chegar
ao Além sem nada dever aos homens
ou aos deuses; que, porém, o que
importa é justamente como se chega
ao Além; disso as pessoas só tomam
conhecimento na velhice8.
1.1 IDÉIA DE LEI PARA
LOCKE E MONTESQUIEU
O conceito de lei para John
Locke tem um papel importante no
exame da moralidade e da sociedade
política com sentido positivo, não restritivo, significando na essência não só
a limitação, mas a direção de agente
livre e inteligente para o seu próprio
interesse, e não prescreve mais do que
importa no bem geral quantos estão
sob essa lei (T2, § 57), pois a finalidade
da lei não consiste em abolir ou restringir,
mas em preservar a liberdade, pressupondo recompensas, punições e
noções de obrigação e dever, ao assim
se expressar: (...) de modo que, por mais
que possa ser mal interpretado, o fim da
lei não é abolir ou restringir, mas conservar e ampliar a liberdade, pois, em
todos os estados de seres criados
capazes de lei, onde não há lei, não há
liberdade. A liberdade consiste em estar
livre de restrições e violência por parte
de outros, o que não pode existir onde
não existe lei. Mas não é, como já nos
foi dito, liberdade para que cada um faça
o que bem quiser, (pois quem poderia
ser livre quando o capricho de qualquer
outro homem pode dominá-lo?), mas,
uma liberdade para dispor e ordenar
como se quiser a própria pessoa, ações,
posses e toda a sua propriedade, dentro
dos limites das leis às quais se está
submetido; e, portanto, não estar sujeito
à vontade arbitrária de outrem, mas
seguir livremente a sua própria 9.
Sustenta, também, que as características do conceito de uma lei são
encontradas na lei da natureza, pois,
em primeiro lugar, é o decreto de uma
R. CEJ, Brasília, n. 13, p. 31-49, jan./abr. 2001
vontade superior, que é no que parece
consistir a causa formal de uma lei; de
que maneira, porém, isso pode tornarse conhecido da humanidade é uma
questão a ser, talvez, discutida mais
tarde. Em segundo lugar, estabelece o
que pode e o que não pode ser feito, o
que constitui a função própria de uma
lei. Em terceiro lugar, vincula os homens, porquanto contém em si tudo o
que é requerido para criar uma obrigação10.
Argumenta ainda o filósofo, que
antes que uma pessoa possa entender
que esteja submetido a uma lei, deve a
pessoa saber que existe um legislador
superior a ela, ao qual está legitimamente sujeita e lhe impõe uma vontade, razão por que Locke discute as leis
que governam as ações humanas em
sociedade, no estado de natureza, a
sociedade pré-civil, entre Deus e o homem, entre pais e filhos, com o alcance
da lei divina, lei civil e a lei de opinião
ou reputação.
Em sua obra Dois Tratados Sobre o Governo, ressalta a importância
da lei civil e da administração pública
alicerçada em lei conhecida ao afirmar
que (...) pois quando os homens, ao
entrarem em sociedade e no governo
civil, excluíram a força e introduziram
as leis para a conservação da propriedade, da paz e da unidade entre eles,
aqueles que novamente estabeleceram
a força em oposição às leis são os que
rebellant, ou seja, que promovem
novamente o estado de guerra e são
propriamente rebeldes 11.
Pode-se, assim, afirmar que para Locke as leis civis – as leis estabelecidas por governo civil – consubstanciam os costumes gerais e os precedentes históricos embutidos nas leis
e práticas da humanidade, mas as leis
civis têm de harmonizarem-se com as
leis da natureza, que são leis de Deus.
Por seu lado, Montesquieu assevera que (...) as leis, no seu sentido
mais amplo, são relações necessárias
que derivam da natureza das coisas e,
nesse sentido, todos os seres têm suas
leis; a divindade possui suas leis; o
mundo material possui suas leis; as
inteligências superiores ao homem
possuem suas leis; os animais possuem
suas leis; o homem possui suas leis12 e
que os seres particulares inteligentes
podem possuir leis feitas por eles, mas
possuem também as que não fizeram.
Antes da existência de seres inteligentes, esses eram possíveis; tinham,
portanto, relações possíveis e, conseqüentemente, leis possíveis. Antes
de haver leis feitas, existiam relações
de justiça possíveis. Dizer que não há
nada de justo nem de injusto senão o
que as leis positivas ordenam ou
proíbem é dizer que antes de ser
traçado o círculo, todos os seus raios
não eram iguais13.
O ser humano viola as leis de
Deus e as que cria; razão, certamente,
que levou Montesquieu a visualizar o
seu espírito nas multivariadas formas
de governos e nas infindáveis mutações
da sociedade humana.
Dessa obra, incomparável, na
linha traçada deste trabalho, penso
deva ser destacado o capítulo Das Leis
Divinas e das Leis Humanas que enfeixam toda uma vicissitude comportamental da sociedade humana pois
(...) os homens são governados por
diversas espécies de leis: pelo direito
natural; pelo direito divino, que é o da
religião; pelo direito eclesiástico, igualmente chamado canônico, que é o da
polícia da religião, pelo direito das gentes, que se pode reputar como o direito
civil do universo, no sentido de que cada
povo é um cidadão seu; pelo direito
político geral, que versa sobre esta sabedoria humana em que se estribam
todas as sociedades; pelo direito político
particular que diz respeito a cada
sociedade; pelo direito de conquista,
fundamentado em que um povo quis,
pôde e teve de fazer violências a outro;
pelo direito civil de cada sociedade, segundo o qual todo cidadão pode defender seus bens e sua vida contra qualquer
outro cidadão; e, finalmente, pelo direito
doméstico, que deriva do fato de uma
sociedade achar-se dividida em diversas famílias que têm necessidade de
um governo particular. Há, portanto, diferentes ordens de leis; e a sublimidade
da razão humana consiste em saber justamente com qual dessas ordens se
relacionam, principalmente, as coisas
sobre as quais se deve estatuir, e em
não introduzir confusão nos princípios
que devem governar os homens14.
De relevo, ainda, os ensinamentos de que não se deve de modo
algum estatuir pelas leis divinas o que
deve sê-lo pelas leis humanas, nem
regulamentar pelas leis humanas o que
deve ser feito pelas leis divinas, pois
essas divergem em sua origem, em seu
objeto e em sua natureza, certo de que
a convivência em sociedade constitui
uma lei natural.
Assim, Lei, havida como Direito, portanto, seja de origem divina
ou humana, não se dissocia do costume, porque tanto aquela quanto esta
são a expressão da vontade do grupo
social, diferenciando-se apenas porque
o costume é espontâneo e inconsciente, enquanto a lei emana de um órgão
especializado, entendida como fonte
do Direito seja ela de origem divina ou
39
natural, razão porque o filósofo alemão
Gustav Radbruch após considerar que
o (...) conceito de direito é um conceito
cultural, isto é, de uma realidade referida
a valores, ou ainda, de uma realidade
cujo sentido é achar-se ao serviço de
certos valores, assim o define: Direito é,
pois, a realidade que possui o sentido
de estar a serviço do valor jurídico, da
idéia de Direito. O conceito de Direito
acha-se assim dependente da idéia
de Direito. “La notion de droit est...
essentiellement liée à l’idée de Justice.
Le droit est toujours un éssai en vue de
réaliser la justice“ 15. A idéia de Direito,
porém, não pode ser diferente da idéia
de justiça (justiça, e não o fim a atingir, é
que constitui a idéia do Direito)16. (...) e
assim acha-se perfeitamente justificado
que nos detenhamos um momento
perante a idéia de justiça, como o
verdadeiro ponto de partida para a
determinação do conceito de direito, visto o “justo” ser, assim como o bem, o
belo e a verdade, um valor absoluto que
não se pode derivar de nenhum outro 17.
A idéia de Direito, porém, não
pode ser diferente da idéia de justiça,
razão pela qual vê Radbruch aquela
(idéia de Direito) constituída por três
elementos distintos e heterogêneos:
(...) a idéia de justiça, a do fim último
para que o Direito é meio, e a segurança ou paz social e também de que
ele é instrumento. O primeiro corresponde ao momento mais formal e, portanto, mais universal do Direito; o segundo, ao seu momento material ou de
conteúdo ético e político; o terceiro,
enfim, ao seu momento positivo como
Direito estável e certo18.
Embora intrinsecamente interligados, o segundo elemento – o fim
último para que ele é meio – é o que
mais sobressai o relativismo decorrente de uma interpretação pessoal e
absolutamente subjetiva.
Certamente diante dessas digressões conceituais e históricas, Lloyd
verbera que na mais simples forma de
sociedade, seja ela primitiva ou complexa, faz-se necessário algum sistema
de regras que estipulem as condições
em que homens e mulheres possam se
acasalar e viver juntos; que governem
as relações de família; que fixem as
condições em que devam ser organizadas as atividades econômicas, de
caça, de coletas de alimentos; que
determinem a exclusão dos atos considerados contrários ao bem-estar da
família ou de grupos maiores, pois uma
sociedade sem ordem é a própria negação dela mesma19.
Como instrumento de regulação
do grupo social, a lei não é apenas
necessária, porém indispensável,
40
porque a sociedade não pode ficar ao
arbítrio das diferentes opiniões dos
indivíduos, mas é garantidora de uma
determinada ordem social, colocada
acima dessas diversidades de opiniões, estabelecendo a certeza e a
segurança da paz social.
1.2 SÍNTESE CONCLUSIVA
Socorro-me, em apertada síntese conclusiva, quanto ao conceito
de Justiça e a idéia de lei, do entendimento de que está no Direito – ius –
visto como objeto da justiça que materializa a lei abstrata fazendo-a ter vida, na aplicação ao caso concreto,
pois assim é que a sociedade de seres
humanos como expressão de protesto ante uma experiência de maustratos causada por outrem, seja por
lesão ou dano físico, moral ou financeiro, busca no Direito o clamor de
justiça, como no aforismo latino Ubi
non est justitia, ibi non potest essere jus
(Onde não existe justiça, não pode
haver o Direito), o que nos conduz a
admitir que a idéia de Direito não pode
ser outra senão que justiça.
A função vital da
justiça, vista como a
materialização do
Direito, que
naturalmente
antecede a lei, na
pacificação e
segurança da vida
em sociedade, pode
ser compreendida
como a busca pela
igualdade de
tratamento,
associando-a ao
processo judicial.
O Prof. Juan M. Farina, invocando os ensinamentos de Alasdair
Macintyre, ao formular a indagação “o
que é a justiça?”, nos responde: (...) se
vislumbra originalmente como a simples exigência de uma definição, mas
de imediato se converte na intenção de
caracterizar tanto uma virtude que pode
manifestar-se nas vidas individuais
como uma forma de vida política (em
sociedade) na qual os homens virtuosos
tenham a possibilidade de realizar as
suas virtudes, na medida em que podem
fazê-lo no mundo de trocas e os seres
humanos sejam respeitados como em
suas tais condições20. Pensamos que
esta seja a base essencial do sentido
de justiça: uma forma de vida política
(em comunidade) onde todos os seres
humanos sejam respeitados nas suas
condições. Isso, enfocado desde o
ângulo da atividade judicial, significa
que os juízes devam superar a concepção lógico-racionalista-matematizante de resolver recorrendo a abstratos silogismos jurídicos, para entenderem que se estão julgando as
condutas, os atos de comportamentos de seres humanos reais aos quais
devem considerar em suas condições
como tais. Um aforismo latino pretendeu há 2000 anos de modo bastante
ambíguo sintetizar assim a idéia alterum
non laedere, suum cuique tribuere – não
causar dano a outrem: dar a cada um o
seu (direito)21. O qual foi completado
com este outro fundamentum justitiae
est fides, id est constantiaet veritas – O
fundamento da justiça é a boa-fé, isto é,
a equanimidade e a verdade22.
Pode-se, assim, entender a justiça como um valor moral, ou o objetivo
do homem na busca da vida adequada em sociedade e, desde os romanos,
os seus fundamentos podem ser vistos
na boa-fé e eqüidade, portanto, na obtenção da igualdade ou, no dizer de
Kelsen, conforme citação supra, o suum
cuicque assinala o lugar de cada um
na sociedade.
A função vital da justiça, vista
como a materialização do Direito, que
naturalmente antecede a lei, na pacificação e segurança da vida em sociedade, pode ser compreendida como a
busca pela igualdade de tratamento,
associando-a ao processo judicial.
Para se fazer justiça, supõese que a lei seja aplicada igualmente em todas as situações e a todas
as pessoas com as quais se relaciona, sem medo nem favor, a rico ou
a pobres, a poderosos e humildes
sem distinção, como nos ensinou o
imortal Rui Barbosa na Oração aos
Moços, ao exortar jovens bacharéis
ao labor profissional com justiça:
R. CEJ, Brasília, n. 13, p. 31-49, jan./abr. 2001
(...) com o advogado, justiça militante; Justiça imperante, no magistrado.
2 A DISFUNÇÃO,
E NÃO CRISE, POR QUE
PASSA O PODER JUDICIÁRIO
Preambularmente é preciso
consignar que a crise, ou como prefiro,
a disfunção, não é do Poder Judiciário
isoladamente, mas do Estado brasileiro, porque, embora grave, não é,
ainda, de caráter institucional.
Especificamente em relação ao
Poder Judiciário, filio-me ao entendimento do Prof. Zaffaroni, quando sustenta que (...) preferimos deixar de lado
a questão da “crise”, para centralizarmo-nos na sensação de suas causas23,
salientando que um dos fatores mais
importantes é a crescente demanda de
protagonismo dirigido aos judiciários
latino-americanos, fazendo uma análise
no sentido de que (...) a incorporação
dos direitos chamados “sociais” e suas
contradições regionais, com a seqüela
de marginalização e exclusão, isto é, de
disparidade gravíssima entre o discurso
jurídico e a planificação econômica,
provoca também uma “explosão de litigiosidade” com características próprias; o aumento da burocracia estatal
(e sua pretendida redução por força de
cortes orçamentários) e a produção
legislativa impulsionada unicamente
pelo clientelismo político provocam um
maior protagonismo político dos juízes,
com o conseqüente aumento de suas
faculdades discricionárias, ao que se
agrega que, em geral, o público parece
tender a expressar-se mais violentamente diante dos erros – reais ou supostos – da justiça do que diante dos
erros de outros órgãos estatais, para
então concluir::
Em síntese, preferimos desdramatizar a situação, prescindindo do
difuso conceito de “crise judicial”, para
caracterizar a situação como produto
de vários fatores que, no fundo, não
fazem mais – nem menos – do que
aumentar a distância entre as funções
manifestas e latentes, mas que, ademais, têm a virtude de colocá-las de
manifesto.
Inexiste ruptura institucional entre Poderes. Há, na verdade, pretensão
de alguns poucos – que ainda não
deve ser vista como crise institucional,
mas como mera disfunção – em minimizar a magnitude do Poder Judiciário
em um Estado democrático de Direito,
segundo as verdadeiras palavras do
Prof. Zaffaroni,, para quem (...) não há
dúvida de que há “má vontade para a
democratização deste ramo do Estado”.
Pode-se afirmar que os sucessivos
R. CEJ, Brasília, n. 13, p. 31-49, jan./abr. 2001
stablishments latino-americanos têm
procurado valer-se politicamente dos
poderes judiciários ou, pelo menos, de
neutralizá-los para que não perturbem
o seu exercício de poder. Qualquer tentativa de independência real dos poderes judiciários foi desacreditada como
ato de ingerência política particularmente, quando se traduzia em defesa
de direitos individuais e sociais. Não se
vacilou em apelar à própria destruição
física de seus operadores, como no triste
caso do Palácio da Justiça de Bogotá.
Em todas as Constituições, proclamase a independência do Poder Judiciário,
mas nenhum dos stablishments se
preocupou de realizá-la24.
São alguns aspectos dessas
deficiências estruturais que geram a
disfunção, ou, como querem muitos, a
“crise” do Poder Judiciário, que ora se
analisará.
3 UNIFICAÇÃO DOS
PROCESSOS CONDENATÓRIO,
LIQUIDATÓRIO E EXECUTÓRIO
No limiar do novo milênio, é
inconcebível que não haja um esforço
comum para a “modernização do
Direito” na busca da materialização da
Justiça, mas não para se atender uma
solicitação do FMI, que (...) quer o
enfraquecimento do Judiciário latinoamericano,, como afirma documento
expedido pelo Banco Mundial intitulado O Setor Judiciário na América
Latina e no Caribe, divulgado pelo exDeputado Federal e Professor de Direito Constitucional, Jarbas Lima, no XVI
Congresso Brasileiro de Magistrados,
classificando-o de obra de destruição
do Estado, nos seguintes termos:
A reforma do Judiciário não pode
se restringir a embates técnico-jurídicos,
pois a questão é essencialmente política. Ele afirmou não ter (...) a menor dúvida de que o Judiciário está atrapalhando os avanços do neoliberalismo25.
Por outro lado, o Prof. Dalmo
Dallari já havia afirmado:
O FMI exigiu do Poder Executivo
uma reforma que enfraquecesse o Judiciário, para evitar que a Justiça invalide as medidas do governo federal
que atendem aos interesses do mercado financeiro internacional26.
São afirmações contundentes e
preocupantes, merecendo o repúdio
de todos os cidadãos brasileiros, em
especial da magistratura brasileira.
No aspecto, lato sensu, da modernidade do Direito, comporta, ainda
que em breve análise, a questão da
morosidade que se atribui ao Poder
Judiciário e que deve ser vista sob
duplo aspecto: causas antecedentes,
genéricas, políticas e sociais e causas
conseqüentes, pontuais em decorrência de deficiências estruturais,
sejam de ordem legislativa, de meios e
funcionais.
Assinalo como causas antecedentes, dentre outras, a transformação
do sistema político da humanidade,
com a derrubada do ancien régime
absolutista, nas conturbadas ideologias que levaram às conflagrações
mundiais, com a queda do Muro de
Berlim, com o surgimento de ideais liberais para todo o mundo que se caracteriza pelo primado da sociedade
sobre o Estado, do cidadão individualmente protegido para o cidadão
coletiva e difusamente protegido, fenômenos esses que repercutem fundamentalmente sobre a prestação da
função jurisdicional do Estado moderno, que passa a receber demanda para
as quais não se preparou convenientemente, sendo bastante relevante
destacar o pensamento do Prof. Diogo
Figueiredo: (...) notadamente pela introdução da noção geral de competência, não só como idéia de atribuição,
como a de limites de ação, pois o Estado
de Direito é basicamente um conceito
formal logicamente articulado sobre o
primado da lei, a expressão da vontade
emitida pelo Estado, que submete a todos, inclusive a ele próprio. Assim, os
indivíduos devem encontrar na lei o limite de agir e, excepcionalmente, uma
norma de ação, ao passo que o Estado
tem na lei a única e necessária fonte de
validade de sua ação: o governo de lei,
não de homens, como se lê na Declaração de Direitos de Massachussetts, de
178027, hoje com prevalência do Direito
Constitucional por meio do controle de
constitucionalidade e o controle da
legalidade, stricto sensu.
Admitindo o conceito primoroso
de Hannah Arendt para quem (...) cidadania é o direito a ter direitos, tenho visto em minhas reflexões e votos, estes
quando possível, que a modernidade
da prestação jurisdicional há de estar
configurada sob um tríplice aspecto:
celeridade, segurança e exeqüibilidade, e que pode ser construída neste
pensamento: decisão desmotivada,
insegura, não é justa; se motivada com
segurança, mas tardia, é como inexistente; se motivada com segurança,
prestada com celeridade, mas sem
efetividade na concreção do direito, é
um nada.
Faltando qualquer um desses
pressupostos, a prestação jurisdicional
não se aperfeiçoará como deseja a
sociedade brasileira neste novo milênio, razão por que tem sido a modernização do Direito bandeira do Ministro
41
Humberto Gomes de Barros e que se
traduz no subtema deste Fórum de
Debate, ou seja, a unificação dos processos condenatório, liqüidatório e
executório.
Não se pode pensar, permissa
venia, em modernidade do Direito
sem se questionar, se aperfeiçoar três
primados fundamentais: a federalização do acesso ao Judiciário, a supressão de recursos processuais e a federalização dos repasses financeiros.
A FEDERALIZAÇÃO DO
ACESSO AO JUDICIÁRIO
A partir do pensamento de
Hannah Arendt para quem (...) cidadania é o direito a ter direitos, a reflexão
sobre esse tema não tem por escopo
nem fará ressurgir a questão da dualidade de Justiça Federal, nestas incluídas as especializadas, e Estadual, embora formem o Poder Judiciário nacional, ainda que pessoalmente concorde com a opinião de Oliveira Filho,
transcrita pelo Exmo. Sr. Ministro Carlos
Mário da Silva Velloso: (...) sou pela unidade da magistratura. Nenhum argumento encontro que me convença da
necessidade da conservação do regime
atual da dualidade da Justiça, sejam
quais forem as modificações propostas
para remediar-lhe os inconvenientes28,
tecendo as seguintes considerações:
“É que, para Oliveira Viana, as
liberdades civis estariam muito mais
garantidas por autoridades vindas de
fora – de origem carismática, cuja
investidura não poderá provir senão de
uma fonte nacional, num regime de
“descentralização desconcentrada” –
e não de “descentralização federalizada”, como a que temos29. (...) Oliveira
Viana, defensor da unidade da magistratura, bateu-se, então, pela federalização dos Judiciários estaduais, opinião que é adotada, comumente, pelas
magistraturas de Estados-membros
que não remuneram condignamente os
seus juízes30.
Não vislumbro a questão sob a
ótica da remuneração, mera particularização. Vejo-a mais profunda, sob a
visão da estrutura do Poder Judiciário
na sua unidade nacional, que não será
objeto de abordagem nesta oportunidade, deixando o desenvolvimento do
tema para outras reflexões.
Um dos maiores pecados que
se atribui injustamente ao magistrado
consiste na afirmação de seu “encastelamento em redoma”, postura que dificulta o acesso do cidadão à Justiça.
Embora pontual, reconhece-se
que alguns pouquíssimos magistrados
tomam posturas de semideuses, la-
42
mentavelmente, o que vem sendo
combatido por todos aqueles que têm
visão de vanguarda e se dedicam aos
estudos da Deontologia forense. Mas
isso ocorre, como se sabe, pontualmente e por uma pequeníssima minoria, portanto não significativa como
disciplinadora de postura institucional
do Poder Judiciário. Ao contrário, o que
se vê hoje é um Judiciário aberto, a
começar pelos tribunais superiores, da
grande maioria dos tribunais de Justiça
e dos tribunais regionais onde as portas
estão sempre abertas à sociedade, aos
cidadãos.
Em trabalho publicado sob o
nome “A Justiça e Judiciário”31, tive a
oportunidade de referenciar-me nos
ensinamentos do eminente advogado
Dalmo de Abreu Dallari, o qual sustenta
que: (...) os três Poderes que compõem
o aparato governamental dos Estados
contemporâneos, sejam ou não definidos como poderes, estão inadequados
para a realidade social e política de
nosso tempo. Isso pode ser facilmente
explicado pelo fato de que eles foram
concebidos no século dezoito, para
realidades diferentes, quando, entre
outras coisas, imaginava-se o “Estado
mínimo”, pouco solicitado, mesmo por-
O acesso ao Poder
Judiciário deve ser
direito, e não favor ou
concessão
jurisprudencial,
legalmente assegurado
ao cidadão, a empresas,
sindicatos, associações,
partidos políticos etc.,
individual, coletiva ou de
forma difusa como
essência dos
fundamentos
norteadores a um Estado
democrático de Direito.
que só uma pequena parte das populações tinha a garantia de seus direitos
e a possibilidade de exigir que eles fossem respeitados32.
E continua:: O Poder Judiciário
tem situação peculiar, pois ou por temor
reverencial ou por falta de reconhecimento de sua importância social e
política, o Legislativo e o Executivo nunca deram a devida atenção aos problemas relacionados com a organização
judiciária e o acesso do povo aos juízes.
Poucos percebem que isso tem muita
importância num sistema político que
pretende ser democrático. Enquanto
Legislativo e Executivo dialogam permanentemente, muitas vezes exigindo
a satisfação de seus respectivos interesses como condição para apoiar ou
realizar um objetivo de interesse público, o Judiciário tem sido mantido à margem, num honroso isolamento. Embora
se tenha criado a aparência de maior
respeito pelo Judiciário, que não dialoga
com os demais Poderes mas também
não se envolve em disputas com eles, o
fato é que, aceitando passivamente tal
situação, a magistratura, na prática,
ficou imobilizada, voltada para si própria,
incapaz de perceber que, em alguma
medida, os outros procuravam adaptarse ao dinamismo da sociedade enquanto ela estagnava. Isso ocorreu no Brasil
e em grande parte do mundo33.
Essa é uma verdadeira realidade, razão por que comungo quase
totalmente com o eminente professor,
dissentindo, contudo, quando afirma
que a magistratura ficou voltada para
si própria, estagnada.
O comportamento do magistrado, como agente de um dos Poderes
da República, há de ser necessário e
absolutamente voltado para si, porque
assim exige a sua postura perante a
sociedade que nele procura apenas ver
um cidadão imparcial, isento e desvinculado das paixões políticas ou
ideológicas.
Lembro-me de quando freqüentei a Escola Judicial Des. Edésio Fernandes do Tribunal de Justiça de Minas
Gerais: em palestra sobre Deontologia
forense falou-se das dificuldades do
exercício da judicatura nas comarcas
do interior. Nela não podia o juiz, como
qualquer cidadão, sentar-se à uma
mesa e tomar uma cerveja. Era inaceitável. Era-lhe vedado participar de um
churrasco em casa do prefeito, do
presidente da Câmara de Vereadores,
porque, como juiz eleitoral, era visto
pelos adversários daquele outro no
mínimo como simpatizante, portanto,
suspeito e, como juiz de Direito, era
visto como comprometido, situação
que obrigava ao recolhimento.
R. CEJ, Brasília, n. 13, p. 31-49, jan./abr. 2001
Esses fatos, embora reflitam
pequena amostragem, evidenciam a
necessidade de um comportamento
diferenciado, de um afastamento absolutamente necessário, mas que não o
de um isolamento, fato que induz o
cidadão comum ou o mal-intencionado ao pensamento de que o juiz é um
“ente superior que se guarda em uma
redoma”. Entretanto, essa mentalidade está evoluindo e permitindo que o
magistrado tenha uma vivência maior
na comunidade em que exerce a sua
judicatura, dentro dos limites da normalidade e sem questionamentos que
não influem em suas decisões, submetidas a controle das partes, a manifestações do Ministério Público, a recursos oficiais, quando proferida contra Ente Público ou voluntário, ante a
iniciativa do interessado, embora muitos continuem a afirmar, todas as vezes
que se vêem contrariados, que o “juiz
somente deve falar no processo”,
portanto sem aceitar ou separar o
cidadão do magistrado.
As tradições, o respeito às formalidades e ao uso das vestes talares, que
muitos repudiam, são necessários
como forma de exteriorizar o respeito
reverencial à função e não à pessoa de
quem a exerce, de um Poder que não
possui arma nem detém a chave do
cofre, senão a respeitabilidade, confiança e credibilidade de seus membros perante a sociedade.
No limiar deste novo século,
deve procurar o ser humano a evolução e o aperfeiçoamento das instituições judiciárias, que continuam sendo
tratadas com desprezo pelos Poderes
Executivo e Legislativo: aquele, quando lhe cerceia os meios necessários ao
seu desenvolvimento, sempre reduzindo as verbas necessárias a implantações lícitas de suas necessidades,
tais como: novos fóruns, máquinas,
equipamentos, computadores, cadeias públicas, concursos para preenchimento dos cargos da Defensoria
Pública e da Advocacia do Estado, delegados, promotores de Justiça, servidores, enfim para todos aqueles que
compõem o sistema judicial; esse,
quando lhe nega aprovação de seus
projetos de lei, impede o aumento do
quantitativo dos juízes, ou quando, propositadamente, ignorando os princípios constitucionais, se arvora como
legitimado na iniciativa de leis de competência exclusiva do Poder Judiciário.
Nas reflexões acerca dessas
realidades, preocupa-me sobremaneira a tentativa de se retirar a independência do Poder Judiciário, submetendo-o ao controle político, esquecendo-se, como afirma o Prof. Dallari, (...)
R. CEJ, Brasília, n. 13, p. 31-49, jan./abr. 2001
do importante papel da magistratura no
mundo contemporâneo, para a implantação e preservação de sistemas democráticos, concluindo: (...) em sentido
contrário, deve-se opor firme resistência
aos que, usando os argumentos da
modernização e dinamização, ignoram
que o Judiciário deve ser um serviço
para todo o povo e querem que prevaleçam cúpulas dóceis e submissas que
procuram neutralizar os juízes, a fim de
que eles não se oponham às investidas
injustas dos poderes político e econômico34, o que não se alcançará com o
chamado “controle externo”.
A proposta de federalização
contida neste subtema visa a uma
estratégia, um aperfeiçoamento para
melhor facilitar o acesso do cidadão à
Justiça, excluídos os conceitos demagógicos e as ilações desfundamentadas, procurando, enfim, permitir as
reflexões que possam levar ao afastamento das deficiências estruturais,
porque nenhuma modernidade terá
qualquer sentido sem acesso pleno do
cidadão ao Poder Judiciário.
Ação, na abrangência do conceito da iniciativa, constitui pressuposto processual objetivo, sem o qual
não se instaura validamente a relação
processual, a formulação de uma demanda ao juiz, mas pelo aspecto do
impulso, a tendência do Estado moderno, organizado hoje, mais do que
ontem, sobre bases publicistas, desenvolve-se no sentido de reduzir as limitações impostas ao juiz ao poder de
ordenar o impulso do processo, porque
ordenamento jurídico tem interesse, e
não só as partes, na pacificação que
se dá mediante a atuação de seus preceitos substanciais.
O Estado, ao avocar para si o
direito de resolver os conflitos de interesses decorrentes da vida em sociedade, proibindo, assim, que cada
cidadão o faça pessoalmente, assumiu
o dever de prestar um serviço público
que é a jurisdição, hoje prevista no art.
5º, inc. XXXV, da Constituição Federal,
elevada ao cânone de princípio de direito e garantia individual, como cláusula pétrea, ao disciplinar que (...) a lei
não excluirá da apreciação do Poder
Judiciário lesão ou ameaça de direito.
O cidadão, como titular de um
direito, está submetido ao chamado
“custo do processo” que se paga ao
Estado para utilizar-se dessa jurisdição
monopolizada, segundo estabelece o
art. 19 do Código de Processo Civil.
Entretanto, não raras vezes, para os
mais desfavorecidos pela sorte, tornase óbice intransponível para se ter o
acesso à Justiça, mesmo assegurandose, nos termos do art. 5º, inc. LXXIV, da
CF, a assistência jurídica integral e gratuita aos necessitados.
O Prof. Cândido Dinamarco35
nos ensina que, sendo a ação integrante de um sistema que é instrumental por excelência, seu valor reside
na aptidão que tenha de propiciar
meios de acesso à Justiça, para a efetiva tutela jurisdicional e remoção dos
conflitos interindividuais que turvam a
paz social e constituem causa de infelicidade pessoal,, para, então, assim
se posicionar:
Concebida assim nesses termos
tão amplos, a ação é uma faculdade
inerente à própria personalidade, ela não
se prende a condição alguma; é esse o
primeiro sentido da garantia contida no
preceito programático do art. 5º, inc.
XXXV, da Constituição brasileira. Tratase do princípio da inafastabilidade do
controle jurisdicional, em sua acepção
mais lata e menos profunda, o qual será
violado sempre que se pretenda impedir
a alguém o exercício da faculdade de
se fazer ouvir pela Justiça36.
A questão envolve, no âmbito do
Poder Público do Estado, a concretude
da assistência jurídica integral e gratuita, seja para orientação extrajudicial,
seja para a representação judicial nas
modalidades autorizadas pela Lei n.
1.060, de 1950, cujo fulcro fundamental
é isentar o necessitado, ou seja, não ao
miserável apenas, mas a todo aquele
que não possa dispor dos recursos
necessários ao exercício desse direito
de cidadania, senão com prejuízo à sua
manutenção e a de sua família.
Vejo, assim, no mínimo uma
dicotomia quanto à assistência gratuita e que dificulta o acesso do cidadão
à Justiça: a primeira, de uma orientação judiciária, não necessariamente
vinculada a um procedimento judicial,
mas seletiva aos absolutamente necessitados, e a segunda, de uma efetiva representação judicial e processual
a esses, quando necessárias.
São, portanto, deveres do Estado que neste desvairio globalizante não
podem ser terceirizados a entidades
não-estatais, em razão de duvidosa
constitucionalidade, pela ausência de
uma Defensoria Pública efetivamente
organizada, por se constituir em uma
função estatal, portanto própria, exclusiva e indelegável.
Vejo na questão de acesso à
Justiça maior dimensão do que a simples isenção de pagamento de custas,
mas a própria essência da efetividade
jurisdicional enquanto poder estatal,
que se deve buscar no limiar deste
novo século.
Quanto à primeira, sabidamente, além da ausência de meios, o
43
acesso à Justiça também é obstaculizado, e muito, pelo valor elevado das
custas processuais e emolumentos que
devem ser pagos previamente, ou seja, no momento do ajuizamento da
ação, tendo como beneficiários nacionais e estrangeiros residentes no País,
afastado que foi o elemento discriminatório do Código de 1939, que
limitava o benefício ao estrangeiro que
possuísse filho brasileiro.
Não raros casos têm sido suscitados, principalmente nas Justiças Estaduais, da impossibilidade de prévio
pagamento das custas e emolumentos
para o exercício de um direito, gerando
não apenas desconforto de se procurar
uma Defensoria Pública que, quando
existente e estruturada, não aceita o
patrocínio porque a situação extravasa
os limites conceituais de salário mínimo, não obstante a impossibilidade
material de efetuar o pagamento por
razões multivariadas.
Na Justiça Estadual do Amapá,
além do redutor de 75% dessas despesas, muitas vezes têm sido levados
recursos à Corte de Justiça para dirimir
o direito concedido pelo juiz à parte
necessitada ou incapaz de realizar, de
pronto, aquelas despesas, para o recolhimento posterior das custas e despesas processuais. Há casos em que
até mesmo a parte interessada na causa pede a decretação da deserção,
procurando, via elitização financeira,
retirar da apreciação do Judiciário a
lesão de direito discutida em face dela
própria. O acesso ao Judiciário não
pode ser elitizado financeiramente.
Embora a concessão venha
sendo atendida por construção jurisprudencial, penso que em uma estrutura
maior deva ser exercida como reconhecimento de um direito e não de
concessão ou favor jurisprudencial,
razão pela qual não se deve impedir o
acesso ao Judiciário pela situação
econômico-financeira, até mesmo por
pessoas jurídicas, porque essa restrição
é um absurdo, considerando os princípios constitucionais da igualdade perante a lei, que (...) não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou
ameaça a direito, embora não se ignore
que as garantias de direitos individuais
já prevêem as isenções em algumas
situações, como, por exemplo, a gratuidade das ações de habeas-corpus e
habeas-data, conforme norma do inc.
LXXVII do art. 5º da Constituição Federal.
O caminho que vejo como perseguir é a federalização do acesso à
Justiça, ônus do Estado brasileiro que
avoca a si a legitimidade do direito de
punir, de compor os litígios e de realizar
a pacificação social.
44
O pagamento das custas e emolumentos, que hoje são prévios e elevados, não devem ser condição restritiva ao exercício do direito de ação, de
um direito de cidadania que não pode
ficar vinculado à condição ou possibilidade financeira do interessado, mas
que seja imposto coativamente como
um dos efeitos de condenação.
O ajuizamento de qualquer
ação estaria desobrigado de pagamento de custas ou emolumento prévios – competindo ao Estado prover
todos os recursos necessários ao pleno
desenvolvimento de uma prestação
jurisdicional moderna – e na sentença
o magistrado, no exame do caso concreto, após análise objetiva do comportamento processual de litigante de
má-fé ou não, da possibilidade econômica e financeira – inclusive concedendo a assistência judiciária aos necessitados ou carentes, desmistificada a questão de limite de salário mínimo –, imporia na condenação o pagamento dessas custas, despesas e
emolumentos processuais em todas as
fases recursais.
A partir de então, já como efeito
condenatório da reclamada prestação
(...) para aperfeiçoamento
do sistema, necessária
seria legislação processual
adequada admitindo a
imposição de condenação
em honorários ou multas
todas as vezes em que se
constatar ser o recurso
meramente protelatório, ou
verificada a existência ou
não de pertinência temática
ou jurisprudencial na sua
fundamentação, à exceção
do duplo grau de cognição
em face do princípio da
segurança, mas
abrangendo os incidentes
processuais meramente
protelatórios e/ou de
comprovada litigância de
má-fé, seja do cidadão,
seja do Estado.
jurisdicional e não como elemento inibidor e elitista para se ter acesso à Justiça, é que seriam pagas dentro do prazo recursal, provendo-se ao ordenamento jurídico dessa condenação os
meios jurídicos para coercibilidade
executória mais concreta e célere, destinando-se os valores recolhidos a um
fundo especial a três fontes, administradas pelo Conselho Nacional de Magistratura, pelo Conselho Superior do
Ministério Público e pelo Conselho Superior da Defensoria Pública com finalidades específicas e vinculadas de
aperfeiçoamento e modernização do
Poder Judiciário e das duas instituições.
Essa federalização teria o objetivo não apenas de prover a assistência judiciária constitucional, processual ou orientativa, de preservar o
munus público da jurisdição, como
também e, em especial, reduzir o número de recursos decorrentes das
questões processuais, porque o reexame da ampla defesa estaria inserido
na própria sentença.
Em verdade, sabe-se da existência sempre crescente de recursos,
de incidentes processuais – agravos,
embargos etc. – acerca da concessão
ou negativa da assistência judiciária,
seja levando-se em consideração a
renda da pessoa, (...) porque as causas
podem ser vultuosíssimas e sem recursos para elas o interessado37, seja em
razão do patrimônio em discussão, seja
porque o beneficiário possua um imóvel e tenha renda superior a um salário
mínimo, o que não lhes retira o direito
ao benefício se insuficientes os rendimentos para arcar com as despesas,
custas e honorários processuais.
Outrossim, as dificuldades econômicas dessa nova era têm afetado
pessoas jurídicas, cooperativas e associações, filantrópicas ou não, hoje
excluídas da assistência, o que deve
ser revisto porque podem não estar em
condições de custear os encargos
processuais, sendo portanto necessitadas dentro de um conceito objetivo
lato sensu. Destarte, a extensão do amparo legal tem embasamento constitucional, porque as pessoas jurídicas
não foram excluídas pelo Constituinte
de 1988, seja pelo princípio maior de
que a lei não excluirá da apreciação
do Poder Judiciário lesão ou ameaça
a direito, seja ante o princípio – inc.
LXXIV do art. 5º da Constituição
Federal – de que (...) o Estado prestará
assistência jurídica integral e gratuita
aos que comprovarem insuficiência de
recursos, inadmitida analogia para
restringir direito.
Além do que, a política desenvolvimentista do Estado moderno, que
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se busca em uma dimensão mínima e
necessária para a sua atividade, não pode prescindir das gerações de empregos, mal do final do século, principalmente por associações e cooperativas – art. 5º, incs. XVII e XIX, da Constituição Federal – que até mesmo limita a
sua dissolução à decisão judicial, em
razão de uma política de pensamento
retrógrado, portanto, não evolutista.
Hoje a construção jurisprudencial do colendo Superior Tribunal de
Justiça – REsp. n. 38.124-0- RS, relator
Ministro Sálvio de Figueiredo, RJSTJ 6
(57) 412 – admite a presunção juris
tantum da mera declaração da parte, o
que não suprime os eternos recursos
levados aos tribunais, inclusive ao Superior Tribunal de Justiça.
O conceito a ser examinado há
de ser visto pela ótica da necessidade
e pela inexistência de recursos financeiros de pessoa física, jurídica, cooperativa ou associação, por meio de avaliação objetiva fundada em provas a ser
realizada no processo e declarada na
sentença pelo magistrado, evitando
distorções, injustiças e, ou privilégios
indevidos, eliminando recursos desnecessários, suprimindo discussões
processuais – se o recurso seria apelação ou agravo, se teria ou não efeito
suspensivo – (...) cabe apelação para
enfrentar decisão relacionada com o
pedido de assistência judiciária. O
agravo de instrumento apenas é oportuno quando a decisão decide de plano,
nos autos do processo principal, o
pedido de assistência. (STJ, 1ª Turma,
REsp. n. 28.769-1– RJ, Relator Ministro
Gomes de Barros) – que levam ao
retardamento do julgamento de mérito da prestação jurisdicional reclamada, dirimindo-se uma possível controvérsia em uma única sentença.
O acesso ao Poder Judiciário
deve ser direito, e não favor ou concessão jurisprudencial, legalmente
assegurado ao cidadão, a empresas,
sindicatos, associações, partidos
políticos etc., individual, coletiva ou de
forma difusa como essência dos fundamentos norteadores a um Estado democrático de Direito.
O Poder Judiciário somente
existe para servir ao jurisdicionado.
Sem acesso pleno ou que venha ser
limitado pelo poder econômico, elitista,
perde a razão de ser.
O ACESSO À JUSTIÇA. SUPRESSÃO
DE RECURSOS PROCESSUAIS
Outro aspecto relevante, que
vejo como estratégia ao aperfeiçoamento da magistratura, refere-se à
sucessividade de recursos judiciais,
R. CEJ, Brasília, n. 13, p. 31-49, jan./abr. 2001
muitos deles, sem sombra de dúvidas,
meramente protelatórios.
Não posso vislumbrar como
constitucional e legal, a pretexto de
desafogar o Poder Judiciário do excesso de processos, a supressão de recursos, que, no mínimo, importa restrição de uma proteção eficaz, aliás prevista no art. 8º da Declaração Universal
de Direitos Humanos, de que (...) toda
pessoa tem direito a um recurso efetivo,
ante os tribunais nacionais competentes,
que a ampare contra atos que violem
seus direitos fundamentais reconhecidos
pela constituição ou pela lei, da qual o
Brasil é signatário, tendo, por isso
mesmo, força de norma constitucional.
O festejado prof. J. J. Gomes
Canotilho preleciona que (...) a exigência de um direito sem dilações indevidas, ou seja, de uma proteção judicial
em tempo adequado, não significa necessariamente “justiça acelerada”. A
“aceleração” da proteção jurídica que
se traduza em diminuição de garantias
processuais e materiais (prazos de recursos, supressão de instâncias) pode
conduzir a uma justiça pronta, mas
materialmente injusta. Noutros casos,
a existência de processos céleres, expeditos e eficazes – de especial importância no âmbito do Direito Penal,
mas extensiva a outros domínios – é
condição indispensável de uma proteção jurídica adequada38.
A segurança não pode ficar
comprometida pela supressão de instâncias recursais, porque nada mais
repulsa ao homem comum que o conhecimento de um erro judiciário, visto
e compreendido como injustiça estatal e, portanto, contrário ao princípio
universal de direito natural, embora se
reconheça que o duplo grau de jurisdição não é um direito fundamental,
mas regra que não pode ser subvertida nem suprimida pelo legislador.
Duas outras medidas, de natureza legislativa de procedimento ordinário, portanto, de lei comum, se levadas a efeito, trariam celeridade aos
julgamentos e ajudariam a descongestionar o Poder Judiciário.
A primeira consistiria na extinção da chamada remessa “de ofício”,
que não é um recurso, por falta de
previsão legal, mas tem procedimento
semelhante.
A Constituição Federal não garante, em momento algum, o chamado
duplo grau de jurisdição – expressão
tecnicamente incorreta, porque
jurisdição é uma projeção da soberania, porquanto não há mais de
uma39, restando apenas previsto no art.
475, do Código Unitário, que disciplina
as hipóteses de sua interposição,
independentemente da vontade da
parte recorrer ou não.
Inaceitável, sob a ótica constitucional da igualdade de direitos que
se continue a privilegiar o Estado em
detrimento do cidadão, se o ato de
vontade de recorrer, que é voluntário,
não venha a ser exercido pelo seu
procurador. Maior desigualdade ocorre,
ainda, quando se disciplina que na
chamada “remessa de ofício” não se
pode agravar a condenação. Se presente o duplo grau de “cognição e julgamento”, haveria de se consumar o
princípio da devolução integral do
conhecimento da matéria julgada, até
mesmo para agravar uma possível
condenação na busca da realização da
justiça, ao contrário, permissa venia, do
que é disciplinado na Súmula n. 45 do
Superior Tribunal de Justiça: (...) no
reexame necessário é defeso ao tribunal
agravar a condenação imposta à Fazenda Pública.
Injustificável a continuidade
desse posicionamento, porque o Estado e seus entes estão representados
judicialmente, competindo-lhes a diligência do recurso tempestivo ou a
busca de nova decisão judicial, por
várias razões: porque compete aos
procuradores o exercício do direito de
recurso; porque cessaria a falta de
confiança presumida na decisão de
primeiro grau contra a Fazenda Pública; porque não desestimularia o magistrado de primeiro grau nem abalaria
a sua independência ao se partir da
premissa que sua sentença não é
confiável e, finalmente, porque a finalidade do Poder Judiciário é declarar
relação jurídica e não suprir omissões
ou ausência de recurso de quem quer
que seja, notadamente do Estado
onipotente e omisso.
Extinguir-se-ia, assim, o paternalismo processual em favor do Estado e o colocaria, como mandam os
princípios constitucionais, no verdadeiro plano das igualdades de todos
perante a lei, enquanto as suas omissões ou falhas funcionais resolver-seiam interna corporis e segundo regras
próprias.
A segunda, de natureza processual, consistiria na redução dos prazos
judiciais – em dobro e em quádruplo –
em favor do Estado e seus entes,
ajustando-o aos mesmos princípios
constitucionais das partes. Alguns tratamentos diferenciados não se justificam: por que a intimação pessoal do
representante da Fazenda Pública na
execução fiscal, ou por ocasião dos
embargos a ela opostos, quando o
patrono do particular é intimado pela
imprensa? (art. 25 da Lei n. 6.830/80);
45
qual a razão legal de se permitir, antes
da sentença, caso haja o cancelamento
da inscrição da dívida ativa, que seja a
execução fiscal extinta, sem pagamento de honorários ou ônus processuais, procedimento esse que viola
princípio constitucional de que o Estado tem o dever de ressarcir os danos
causados por seus funcionários no
exercício de suas atribuições?; por que
continuar privilegiando a Fazenda Pública na execução da obrigação de
fazer, sem fixar multa pelo não-cumprimento, o que retira a efetividade da
prestação jurisdicional, mas submete
o Poder Judiciário às críticas de ineficiência, de injustiça ou mesmo de inércia em face do ente Estatal poderoso?
A propósito, o prof. Cândido Dinamarco preleciona que (...) um estudo
na história recente do processo civil
brasileiro, que neste capítulo se esboça
com toda a possível singeleza, revela a
tomada de consciência, que antes foi
da doutrina vanguardeira e agora é
também do legislador, de três premissas
fundamentais: a abertura do processo
aos influxos metajurídicos que a ele
chegam pela via do direito material, a
transmigração do individual para o
coletivo (Barbosa Moreira) e a necessidade de operacionalizar-se o sistema,
desburocratizá-lo ou desformalizá-lo
tanto quanto possível, com vistas a
facilitar a obtenção dos resultados justos
que dele é lícito esperar40, e, digo eu,
não devendo confundir-se formalidade
com formalismo, este repudiado pela
doutrina e jurisprudência 41.
São medidas simples como essas e outras que se fizerem necessárias, que proverão o Poder Judiciário
com os meios instrumentais necessários à sua função constitucional, agilizando-se a celeridade da prestação
jurisdicional, além, repita-se, do dever
de melhorar o ensino do bacharel para
viabilizar, por meio de concursos públicos, os preenchimentos das vagas
no Judiciário e nas carreiras jurídicas.
Além dessas medidas, meramente legislativas, há outras que aperfeiçoariam o sistema judicial. Uma delas seria a criação de um sistema processual compatível e adequado de
imposições de condenações a cada
recurso, após o recurso do duplo
grau de cognição, e nas hipóteses
de recursos incidentais destituídos
de embasamentos legais ou de
conteúdos meramente protelatórios.
Estrategicamente, para aperfeiçoamento do sistema, necessária seria
legislação processual adequada admitindo a imposição de condenação em
honorários ou multas todas as vezes em
que se constatar ser o recurso mera-
46
mente protelatório, ou verificada a existência ou não de pertinência temática
ou jurisprudencial na sua fundamentação, à exceção do duplo grau de cognição em face do princípio da segurança, mas abrangendo os incidentes
processuais meramente protelatórios
e/ou de comprovada litigância de máfé, seja do cidadão, seja do Estado.
Na verdade, ressente o vigente
estatuto processual adjetivo de moderna atualização, eis que o valor da
causa atribuído segundo critérios formais e materiais na petição inicial fixa,
initio litis, um valor que obriga, não apenas ao magistrado de primeiro grau,
mas a todos os tribunais, inclusive aos
superiores, pouco importando que
hajam ao curso da demanda inúmeros
e inúmeros recursos, válidos ou não.
Tem-se conhecimento da existência, nos tribunais superiores, de embargos de declaração manifestados
em agravo regimental, de agravo de
instrumento interposto contra decisão
que inadmitiu seguimento de recurso,
sem maiores pertinências temáticas
que não a postergação ao longo do
tempo de uma decisão já pacificada,
Longe de ser um privilégio
para os juízes, a
independência da
magistratura é necessária
para o povo, que precisa
de juízes imparciais para
harmonização pacífica e
justa dos conflitos de
direitos. A rigor, pode-se
afirmar que os juízes têm
obrigação de defender sua
independência, pois sem
esta a atividade
jurisdicional pode,
facilmente, ser reduzida a
uma farsa, uma fachada
nobre para ocultar do povo
a realidade das
discriminações e das
injustiças.
congestionando e reduzindo a celeridade do exame de um processo, ou,
como tem afirmado o Ministro Humberto Gomes de Barros, usando o
Poder Judiciário para a rolagem de
dívidas, públicas ou privadas.
As atualizações dos arts. 17 e 18
do Código de Processo Civil, recentemente promulgadas, são acanhadas
e não satisfazem a um melhor aperfeiçoamento. É necessário viabilizar que
o tribunal possa, no exame criterioso
de cada caso concreto, ao constatar o
abuso, a procrastinação ou qualquer
método de retardamento injustificado,
de impor sanção pecuniária que
represente, realmente, desestímulo a
essa prática repudiada e contrária à
ordem social, porque o ofendido nessa
situação é o próprio Estado-juiz.
Não se deseja com esse pensamento estabelecer-se um terrorismo
de multas cerceadoras ao exercício
constitucional da ampla defesa, do
direito de se ver uma questão esgotar
as instâncias recursais. Contrariu sensu,
reconhecida a pertinência temática e
a seriedade recursal, nenhum gravame
se imporia para não se elitizar o sistema recursal aos economicamente bem
abastados. Portanto, a sanção seria
exceção, e não regra de natureza
processual.
Luís Roberto Barroso,, emérito
professor do Rio de Janeiro, afirma que
(...) o Direito existe para realizar-se42,
razão pela qual não basta que se estabeleçam esses princípios processuais,
se não houver por parte dos demais
Poderes o sentimento do dever – aí
sim, sob sanção grave ao servidor renitente – de cumprir e fazer cumprir a
decisão que reconheceu um direito,
determinou uma obrigação, dando-lhe
o caráter de efetividade plena, após
o seu trânsito em julgado, sob o
absolutamente indispensável tríplice
aspecto: da celeridade, da segurança e da efetividade. Isso porque
se uma justiça tardia é negação do
direito, a justiça sem segurança é
inaceitável e a justiça sem efetividade
é um nada jurídico.
Sobremaneira relevante que se
transcreva o pensamento do prof.
Dalmo de Abreu Dallari, de notória
respeitabilidade, acerca da independência da magistratura: Para que o
Poder Judiciário garanta os direitos e
realize a justiça, é necessário que ele
seja materialmente bem aparelhado,
mas isso apenas não é suficiente, sendo
extremamente relevante que os juízes
tenham preparo adequado e sejam
conscientes de suas responsabilidades.
Mas além disso tudo e como requisito
prévio e essencial, é indispensável que
R. CEJ, Brasília, n. 13, p. 31-49, jan./abr. 2001
a magistratura seja independente. O
reconhecimento formal da independência dos juízes como requisito necessário para a democracia e a paz foi
feito pela Organização das Nações
Unidas, por meio de importante decisão
no início de 1994. Com efeito, mediante
Resolução n. 1994/41, aprovada em
sessão de 4 de março de 2000, a Comissão de Direitos Humanos da ONU
decidiu recomendar a criação do cargo
de Relator Especial sobre a independência do Poder Judiciário. Nessa oportunidade, a Comissão reconheceu a
necessidade de se criar “um mecanismo de controle encarregado de acompanhar a questão da independência e
imparcialidade do Poder Judiciário,
especialmente no que respeita aos
juízes e advogados e ao pessoal e
auxiliares da Justiça, assim como a
natureza dos problemas que podem
menoscabar essa independência e
imparcialidade”. Acolhendo e confirmando essa recomendação, o Conselho
Econômico e Social da ONU decidiu
criar o cargo de Relator Especial, com
as seguintes funções: (...)43.
Destaco, em síntese, três dessas
funções:: a primeira, de investigar toda
denúncia que seja transmitida ao
Relator e informar suas conclusões; a
segunda, de identificar e registrar os
atentados à independência do Poder
Judiciário e advogados e do pessoal
auxiliar e os progressos realizados para
essa proteção; a terceira, de estudar,
por sua atualidade e importância, visando à formulação de propostas para
proteger e assegurar a sua independência.
Consigno, entretanto, as seguintes considerações:
Longe de ser um privilégio para
os juízes, a independência da magistratura é necessária para o povo, que
precisa de juízes imparciais para harmonização pacífica e justa dos conflitos
de direitos. A rigor, pode-se afirmar que
os juízes têm obrigação de defender
sua independência, pois sem esta a
atividade jurisdicional pode, facilmente, ser reduzida a uma farsa, uma fachada nobre para ocultar do povo a
realidade das discriminações e das
injustiças. Essa conjugação de perspectivas, que tem sido pouco ressaltada, torna conveniente e oportuna
uma reflexão sobre esse ponto, não só
para que fiquem claros os motivos pelos quais é necessária a magistratura
independente, mas também para que
a alegação de falta de independência
não seja usada como pretexto para
isentar o Poder Judiciário de toda a
responsabilidade de suas próprias
deficiências.
R. CEJ, Brasília, n. 13, p. 31-49, jan./abr. 2001
A discussão sobre a independência da magistratura aparece com
freqüência ligada às questões da liberdade, da justiça social e da democracia. Isso faz pressupor a existência
de um papel político da magistratura e
torna importante uma reflexão sobre
sua independência, as razões pelas
quais se deseja que ela seja independente e para que objetivos ela deve
utilizar a independência que lhe fora
assegurada. A par disso, é igualmente
importante não perder de vista as
circunstâncias sociais e políticas que
caracterizam este momento da história
brasileira e latino-americana em especial, porque neste contexto existem
peculiaridades de extrema importância, que devem ser consideradas no
exame das exigências de independência da magistratura e das dificuldades que aí estão implicadas. Além
disso, é importante identificar e enfatizar os obstáculos à independência da
magistratura: quem se opõe a ela,
como e por quê?
Existem casos em que os inimigos da magistratura independente
agem abertamente contra ela, mas há
situações em que a destruição dessa
independência é feita com disfarces
mais ou menos sofisticados, podendo
até assumir a aparência de homenagens a juízes e tribunais. E ocorrem
situações em que os próprios magistrados, por ingenuidade ou leviandade, assumem a condição de cúmplices dos que promovem a desmoralização da magistratura, associandose a demagogos e corruptos, acobertando ilegalidades de governantes
em troca de vantagens pessoais que
nada têm a ver com a melhoria das
condições de trabalho dos juízes e
tribunais. Nesses casos, os juízes é que
são os principais inimigos da independência da magistratura44.
E acrescenta o eminente professor::
A magistratura deve ser independente para que se possa orientar no
sentido da justiça, decidindo com
eqüidade os conflitos de interesses. O
juiz não pode sofrer qualquer espécie
de violência, de ameaça ou de constrangimento material, moral ou psicológico. Ele necessita da independência
para poder desempenhar plenamente
as suas funções, decidindo com serenidade e imparcialidade, cumprindo verdadeira missão no interesse da sociedade. Assim, pois, segundo essa visão
ideal do juiz, mais do que este, individualmente, é a sociedade quem
precisa dessa independência, o que,
em última análise, faz o próprio magistrado incluir-se entre os que devem
zelar pela existência da magistratura
independente45.
Creio, como magistrado, nesses
postulados, herdados de meu pai,
brilhante advogado, Dr. Noraldino de
Mello Castro, mas creio, também, em
uma outra visão, como advogado militante que fui por muitos anos e como
magistrado que sou, que cabe ao
profissional do Direito, antes de tudo,
pugnar pela independência e majestade da Justiça e pela preservação da
instituição de um tribunal, como preleciona Piero Calamandrei:
Quem entra no tribunal levando
em sua pasta, em vez de boas e honestas razões, secretas ingerências,
ocultas solicitações, suspeitas sobre a
corruptibilidade dos juízes e esperanças
sobre sua parcialidade, não se admire
se perceber que se encontra, não no
severo templo da justiça, mas numa
alucinante barraca de feira em que espelhos suspensos em todas as paredes
refletirão multiplicadas e deformadas,
suas intrigas. Para encontrar a pureza
no tribunal, é preciso entrar nele com a
alma pura. Também aqui adverte o padre
Cristóvão: omnia munda mundis46.
São medidas como essas, cujos
temas são trazidos para reflexão e
discussão de aperfeiçoamento, que
realmente implementarão um novo
Poder Judiciário, mas não para afrontálo ou pretender vergá-lo submisso ao
Poder Político, mas aquele Judiciário
que todos nós buscamos: independente, que promova uma justiça célere,
mas com segurança e com plena
efetividade executória, para assegurar
não apenas a pacificação social de uma
sociedade civilizada, mas o Estado
democrático de Direito, sem o qual o
sistema perecerá.
A FEDERALIZAÇÃO DOS
RECURSOS FINANCEIROS
Afirma-se, no art. 2o da Constituição Federal, que os Poderes da
República são (...) harmônicos e independentes entre si, preceito que ainda
não se consagrou, porque, na realidade, existe uma dependência financeira do Poder Judiciário em face do
Poder Executivo no chamado “repasse
financeiro”.
O Sistema Tributário brasileiro
atribui à União a arrecadação dos tributos que, posteriormente, são repassados aos Estados por meio do chamado “Fundo de Participação do Estados – FPE”, cujo procedimento operacional faz com que esses recursos
sejam enviados ao Poder Executivo,
que os repassa aos Poderes Legislativo e Judiciário, observadas as
47
quotas-partes de cada um, segundo
disciplina o art. 168 da Constituição
Federal, in verbis:
Art. 168 – Os recursos correspondentes às dotações orçamentárias,
compreendidos os créditos suplementares e especiais, destinados aos órgãos
dos Poderes Legislativo e Judiciário e
do Ministério Público, ser-lhes-ão entregues até o dia 20 de cada mês, na
forma da lei complementar a que se
refere o art. 165, § 9o.
Em verdade, em muitos Estados
Federados – desconhecendo-se conduta semelhante no âmbito federal –
esse sistema operativo fragiliza os outros dois poderes, submetendo-os aos
caprichos e vontades do Poder Executivo, cuja atribuição nesse caso é de
ser um mero agente depositário, mas
que, via de regra, a cada mês, pode
utilizar-se dessa situação para pressionar e coagir politicamente os Tribunais de Justiça, interferindo, até mesmo,
em sua função judicante.
Na sistemática vigente, os presidentes de tribunais ficam reféns do
Poder Executivo e, como é de conhecimento de todos, não são raros os
casos já submetidos ao Supremo Tribunal Federal objetivando fazer com
que o Poder Executivo do EstadoMembro cumpra o seu dever.
Nesse momento, quando se fala
em “reforma do Poder Judiciário” é
preciso que os deputados e senadores
– que são políticos, governadores e exgovernadores – conscientizem-se da
magnitude desse processo legislativo,
que não violem as limitações constitucionais disciplinadas no art. 60, § 4º,
da Constituição Federal às quais estão
subordinados e também percebam a
necessidade de se “alforriar” o Poder
Judiciário, libertando-o dessas pressões, para que se concretize a sua
independência financeira institucionalmente decantada, mas ainda não criada efetivamente.
O processo legislativo-constitucional para essa libertação consistiria
na reforma do citado art. 168 da Constituição Federal para atribuir-se à Assembléia Legislativa de cada EstadoMembro a missão de informar à Secretaria da Fazenda Nacional o percentual que caberia a cada um na distribuição do FPE, e essa faria o repasse
via ordem bancária naturalmente, resguardando-se ainda que cada Poder
Executivo continue a repassar, até o dia
20 de cada mês, a quota-parte de cada um obtida na chamada arrecadação própria ou mediante excesso de
arrecadação.
Chegar-se-ia, por meio dessa
proposta de reforma, a uma teórica
48
independência financeira, mas efetivamente mais concreta, extinguindose a via de pressão que ocorre sistematicamente, fonte de inúmeras ações
perante o Supremo Tribunal Federal,
resguardando-se a sua independência
judicante para a segurança jurídica
que dele se espera e onde as pressões
devem ser feitas apenas na busca do
direito, da doutrina e das pretensões
recursais, certo de que (...) a segurança
jurídica unicamente funcionará de maneira eficiente, onde a jurisdição se exerça por meio de uma magistratura imparcial, nos limites das instituições que
consagrem a independência absoluta
do Poder Judiciário, garantida por postulados objetivamente estabelecidos e
religiosamente observados47.
A única perda seria a do poder
político, que creio não deva se constituir em vaidade e nem seja colocado
acima do arcabouço do sistema democrático de Direito em que se deseja
esteja situado o Brasil.
NOTAS BIBLIOGRÁFICAS
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11
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DANTE ALIGHIERI. Da Monarquia. Tradução e estudo introdutivo de João Penteado E. Stevenson. Rio de Janeiro: Brasil,
1967. art. 2. cap. V.
AGOSTINHO, Santo. A Cidade de Deus
contra os Pagãos. Petrópolis: Vozes, 1990.
parte II, livro XIV, cap. XXVIII, p. 169.
(Coleção Pensamento Humano).
PLATÃO. A República. Comentários de
Bernard Piettre. Prefácio de Pierre Aubenque. Tradução de Elza Moreira Marcelina. Revisão de Celestino Pires. 2. ed.
Brasília: UnB, 1996. Livro VI (505- d) Livro
VII. p. 51. nota 20.
Ibidem, p. 40.
Ibidem, p. 35.
LLOYD, Dennis. A idéia de lei. Tradução
de Álvaro Cabral. São Paulo: Martins
Fontes, 1998. p. 85-86.
KELSEN, Hans. A ilusão da Justiça. São
Paulo: Martins Fontes, 1998. p. 424.
Ibidem, p. 310.
LOCKE, John. Dois tratados sobre o
governo. São Paulo: Martins Fontes, 1998.
p. 433-434. (a nota 5 traz o ensinamento
de ELRINGTON, 1798, que usa a afirmação acerca da lei e da liberdade para
sustentar que os homens são livres se
governados por leis justas, ainda que não
tenham sido consultados quando de sua
elaboração, e cita Platão para criticar (...)
as incertas fantasias dos teóricos modernos).
LOCKE, John. Ensaios. p. 111-113.
LOCKE, Jonh. Dois tratados sobre o
governo, São Paulo: Martins Fontes, 1998.
§ 226. p. 584.
MONTESQUIEU. O Espírito das Leis.. Tradução de Fernando Henrique Cardoso e
outros. 2. ed. Brasília: UnB, 1995. p. 3.
Idem.
Ibidem, p. 355.
15 RADBRUCH, Gustav. Filosofia do Direito.
Tradução e prefácios do Prof. L. Cabral de
Moncada. 6. ed. Coimbra: Armênio Amado, 1997. p. 86. (GURWITCH. L’idée du
droit social. 1931. nota 1. fls. 86. apud
RADBRUCH, 1997. Tradução: a noção de
Direito está essencialmente ligada à idéia
de justiça. O Direito é sempre ensaio em
vista de realizar a justiça).
16 Idem. nota n. 2. Justiça, e não o fim a
atingir, é que constitui a idéia do direito.
Conforme discurso do Bispo Conrad
Groeber em 1940, contra a doutrina que
sustentava ser direito tudo o que for útil ao
povo.
17 Ibidem, p. 87.
18 Ibidem, p. 29.
19 LLOYD, op. cit., p. 19.
20 MACINTYRE, Alasdair. Historia de la Ética.
5. ed. Barcelona: Paidós, 1994. p. 58. Apud
FARINA, Juan M. Justicia Ficción y
realidad. Buenos Aires: Abeledo-Perrot,
1997. p. 144.
21 FARINA, 1997. p. 144. Dar a cada cual lo
suyo implica dar a cada uno su derecho.
Expresa CESARES, Tomás D. La Justicia
y el Derecho. 3. ed. Buenos Aires: AbeledoPerrot, 1974. p. 15. Apud: FARINA, 1997:
(...) tem razão Kelsen quando afirma que el
suum cuique é uma tautologia, se se entender que expressa o ideal, essência ou
formalidade próprias do verdadeiro Direito,
posto que toda norma de convivência,
ainda que mais inócua, é um suum cuique,
é mostrar o lugar de cada um na coletividade (...) Trocando o suum cuique recupera
todo seu sentido quando se depara no que
é a definição daquilo que poderíamos
chamar a alma de um bom direito, sem
formular de uma virtude o correto modo da
conduta humana. Tradução livre do original,
em espanhol, pelo autor deste artigo.
22 FARINA, 1997. p. 144. Tradução livre do
original, em espanhol, pelo autor deste
artigo.
23 ZAFFARONI, Eugênio Raúl. Poder Judiciário, Crise, Acertos e Desacertos. Tradução de Juarez Tavares. São Paulo: Revista
dos Tribunais, 1995. 216 p. p. 23: (...) a
crise política argentina é uma crise de
autenticidade, quando não de insuficiência
das instituições legisladoras, para fazer
frente às condições sociais e econômicas
que nos tempos da organização nacional
não podiam ser previstas. (AFTALIÓN,
Enrique R. La Constitución formal y los
factores reales de poder. Apud MENDONZA, Efrain I. Quevedo Apud: ZAFFARONI, 1995. p. 23).
24 ZAFFARONI, op. cit., p. 27.
25 LIMA, Jarbas. XVI Congresso Brasileiro de
Magistrados. Jornal do Magistrado, set./out.
1999. p. 5.
26 DALLARI, Dalmo de Abreu. O poder dos
juízes. São Paulo: Saraiva, 1996. p. 5.
27 FIGUEIREDO, Diogo de. Sistema Judiciário. Rio de Janeiro: Instituto Liberal, 1996.
p.14.
28 SALAZAR, Alcino. Poder Judiciário - bases
para reorganização. Rio de Janeiro: Forense, 1975. Apud. VELLOSO, Carlos Mário
da Silva. O Poder Judiciário na Constituição: uma proposta de reforma. In:
VELLOSO, Carlos Mário da Silva. Temas
de Direito Público. 1. ed. Belo Horizonte:
Del Rey, 1997. 558 p. il. p. 37.
R. CEJ, Brasília, n. 13, p. 31-49, jan./abr. 2001
29 VIANA, Oliveira. Instituições políticas brasileiras. 2. ed. Rio de Janeiro: José Olímpio,
1985. v. 2. p. 635. Apud: SALAZAR, 1975.
Apud: VELLOSO, 1997.
30 Ibidem. p. 37.
31 CASTRO, Honildo Amaral de Mello. A
Justiça e Judiciário. In: CASTRO, Honildo
Amaral de Mello. Coletânea de Estudos
Jurídicos. Temas Variados. Araras:
Bestbook, 1988. 201 p.
32 DALLARI, op. cit., p. 1.
33 Ibidem, p. 5.
34 Ibidem, p. 7.
35 DINAMARCO, Cândido Rangel. Execução
Civil. 4. ed. São Paulo: Malheiros, 1994.
585 p. p. 364.
36 Idem. Cfr. WATANABE, Kazuo. Controle
jurisdicional. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 1980. 192 p. passim. nota n. 50.
37 MIRANDA, Pontes de. Comentários ao
Código de Processo Civil. 2. ed. Rio de
Janeiro: Forense, 1958-1962. 15 v. v. 1. p.
288.
38 CANOTILHO, J. J. Gomes. Direito Constitucional. Coimbra: Almedina, 1993. p. 652653.
39 CINTRA, Antônio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini e DINAMARCO,
Cândido Rangel. Teoria Geral do Processo.
13. ed. São Paulo: Malheiros, 1997. p. 141,
ao defenderem que (...) o termo correto
seria duplo grau de cognição e julgamento,
pois temos pluralidade de instâncias e não
de graus de jurisdição..
40 DINAMARCO, Cândido Rangel. A Instrumentalidade do Processo. 4. ed. São Paulo:
Malheiros, 1994. 341 p.
41 CASTRO, Honildo Amaral de Mello. Nulidades. Princípios Constitucionais e Processuais. Revista de Doutrina e Jurisprudência do Tribunal de Justiça do Amapá,
n.15. p. 19. e Revista dos Tribunais, São
Paulo, v. 88, n. 761, p. 45-63, mar. 1999.
42 BARROSO, Luís Roberto. O Direito Constitucional e a efetividade de suas normas.
Rio de Janeiro: Renovar, 1990. p. 78.
43 DALLARI, op. cit., p. 44.
44 Ibidem, p. 45.
45 Ibidem, p. 46-47.
46 CALAMANDREI, Piero. Eles, os juízes,
vistos por um advogado. Introdução de
Paolo Barile. Tradução de Eduardo Brandão. São Paulo: Martins Fontes, 1998. p.
4; BACHOF, Otto. Jueces y Constitución.
Tradução de Rodrigo Bercovitz RodríguezCano. Madrid: Civitas, 1985. p. 54;
ZAFFARONI, op. cit., p. 38 nota a nota.
47 VILLEGAS, Hector B. Apud PRUDENTE,
Antônio de Souza. Medida Provisória e
Segurança Jurídica. Brasília: Senado Federal, n. 138, ano 35, abr./jun. 1998.
the Law’s three bases: the federalisation of
access to the Judiciary, the suppression of
appeal proceedings and the federalisation of
financial benefits.
KEYWORDS – Civil Procedural Law;
reform; sentencing proceedings; enforcement
proceedings; settlement proceedings;
judgement against; enforcement, settlement,
unification; legal philosophy; Plato; Locke;
Montesquieu;
federalisation;
appeal
proceedings – suppression; appeal proceedings
– containment.
ABSTRACT
This paper presents a series of
procedural modifications geared towards the
modernisation of Brazilian Law. It begins with a
philosophical reflection on the concepts of
Justice based upon Plato, and the Law, in the
visions of Locke and Montesquieu. It then looks
at the deficiencies in the Judiciary. It proposes
that judicial service modernity should be based
upon a tripod of celerity, security and
enforceability. It proposes the improvement of
R. CEJ, Brasília, n. 13, p. 31-49, jan./abr. 2001
Honildo Amaral de Mello Castro é desembargador do Tribunal de Justiça do Estado do
Amapá e Membro do Instituto Brasileiro de
Direito Constitucional - IBDC.
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