Fair Value dos Derivativos e Gerenciamento de Resultados nos

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7º Encontro Brasileiro de Finanças
Fair Value dos Derivativos e Gerenciamento de Resultados
nos Bancos Brasileiros: Existe Manipulação?
ÁREA DE CONCENTRAÇÃO: Finanças Corporativas
Fernando Caio Galdi
Professor Assistente – Fucape Business School
Doutorando em Ciências Contábeis – Universidade de São Paulo, Brasil
Av. Fernando Ferrari, 1358 – Vitória – ES, Brasil . cep: 29075-010
(55 27) 4009-4433
[email protected]
Leonel Molero Pereira
Professor da Fundação Instituto de Administração (FIA)
Doutorando em Finanças – Universidade de São Paulo, Brasil
Rua Navarro de Andrade, 152 – São Paulo – SP, Brasil. cep: 05418-020
(11) 3061-9754
[email protected]
1028
7º Encontro Brasileiro de Finanças
1
Fair Value dos Derivativos e Gerenciamento de Resultados nos
Bancos Brasileiros: Existe Manipulação?
ABSTRACT
This paper examines if Brazilian banks use accounting for derivatives for earnings management
practices. We use a panel data approach and find evidences of significant but inverse
relationship between earnings before derivatives income and the effective derivatives income,
which is the expected result considering that financial institutions use derivatives essentially for
hedging activities. We also find an inverse relation between results from securities and
derivatives’ income/losses, indicating that the former are used to hedge the first. However we
could not find a significant relation between derivatives’ income/losses and the results from
loans for Brazilian banks. This is not the expected outcome due to the relevance of such an
asset to the banks. Additionally, according to our hypothesis evidences suggest that Brazilian
banks do not use income smoothing and/or big bath accounting related to the accounting
methodology for derivatives. Evidences also points out to a significant relation between the
changes in the balance sheet derivatives accounts and income/losses with derivatives. This
relation is consistent with the fair value accounting for derivatives methodology for Brazilian
financial institutions implemented by Brazilian Central Bank in 2002.
KEY WORDS: ACCOUNTING FOR DERIVATIVES, EARNINGS MANAGEMENT, FAIR VALUE,
FINANCIAL INSTITUTIONS, PANEL DATA ANALYSIS
RESUMO
O trabalho investiga se os bancos brasileiros utilizam a metodologia de contabilização de
derivativos como instrumento para o gerenciamento de resultados. Para isto, foi utilizada a
análise em painel para a estimação dos modelos. As evidências apontam existir um
relacionamento significativo e inverso entre o lucro antes do resultado com derivativos e o
resultado com derivativos, o que é o esperado considerando-se que as instituições utilizariam,
primordialmente, as operações com derivativos para finalidades de hedge. Também foi
encontrada uma relação significante e inversa entre o resultado com títulos e valores mobiliários
e o resultado com derivativos, indicando que estes são utilizados como instrumentos de hedge
para proteger a variação dos primeiros. Contudo, não se pode estabelecer uma relação
significante entre o resultado com derivativos e os resultados com intermediação financeira, que
também seriam itens importantes a serem objetos de hedge, dado sua relevância para os
bancos. Dentro das hipóteses levantadas, as evidências não indicam a utilização de suavização
dos resultados (income smoothing) e/ou de big bath accounting pelos bancos brasileiros a partir
da metodologia de contabilização de derivativos. Adicionalmente, as evidências apontam para
uma relação estatisticamente significante entre a variação das contas de ativo e passivo de
derivativos no balanço (que são avaliadas pelo fair value) e o resultado com derivativos. Esse
relacionamento é consistente com a metodologia de contabilização de derivativos pelo seu valor
de mercado (fair value), instituída pela Circular 3.082/2002 do Banco Central do Brasil.
PALAVRAS CHAVE: CONTABILIDADE DE DERIVATIVOS, GERENCIAMENTO DE
RESULTADOS, FAIR VALUE, INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS, ANÁLISE DE DADOS EM
PAINEL
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7º Encontro Brasileiro de Finanças
2
1. INTRODUÇÃO
Os resultados dos bancos no Brasil têm sido objeto de estudo acadêmico e de destaque
na mídia, devido aos crescentes lucros publicados pelas instituições financeiras que atuam no
sistema financeiro nacional. Os resultados dos bancos não são compostos exclusivamente de
receita de juros com operações de crédito, mas também de operações com valores mobiliários,
operações de câmbio, arrendamento mercantil e operações com instrumentos derivativos.
Além disso, os lucros dos bancos podem ser gerenciados pela administração para atingir
objetivos específicos, dentro das normas contábeis brasileiras. O gerenciamento dos resultados
é uma prática que permite ao administrador publicar resultados que sejam economicamente
mais interessantes para os acionistas, credores, analistas de mercado ou para si mesmos.
O tema do presente trabalho é a análise do impacto dos derivativos (e de sua
contabilização) no gerenciamento de resultados dos bancos. Para verificar essa relação, será
feito um estudo empírico utilizando dados em painel, pois se acredita haver variáveis não
observáveis que compõem os modelos analisados e pode haver correlação entre o efeito não
observável e as variáveis explicativas. As variáveis não observáveis podem estar relacionadas
às operações de especulação, arbitragem, ou mau uso dos instrumentos derivativos, que
dependem da habilidade dos operadores nas tesourarias dos bancos.
As informações utilizadas para a análise do resultado dos derivativos estão disponíveis
nas demonstrações contábeis reportadas pelas instituições financeiras e por isso é relevante
entender os procedimentos contábeis1 adotados para o registro desses instrumentos pelas
normas brasileiras de contabilidade.
A contabilidade de derivativos para instituições financeiras no Brasil segue o conceito de
fair value, ou seja, da valoração da carteira pelo que melhor representa o valor justo dessa
carteira. Se o valor de mercado desses instrumentos não estiver disponível, são utilizadas
informações de instrumentos correlatos, ou procedimentos alternativos (modelos de
precificação) para a valoração da carteira.
Dentro desse ínterim, o presente trabalho investiga se os bancos brasileiros utilizam o
conceito do fair value dos derivativos para a manipulação de resultados. Mais especificamente,
a questão de pesquisa é: Os bancos brasileiros utilizam a contabilização de derivativos
(com base no fair value) para gerenciamento de resultados?
Com esse objetivo, o artigo analisa a relação entre o resultado das operações com
derivativos e os lucros obtidos pelas instituições e está dividido da seguinte forma: na seção
seguinte, faz-se uma breve revisão da contabilização dos derivativos nos bancos brasileiros; a
terceira seção apresenta os principais conceitos sobre o gerenciamento de resultados;
1
Circulares 3.082 e 3.086 do Banco Central do Brasil.
1030
7º Encontro Brasileiro de Finanças
3
posteriormente, apresenta-se a metodologia e a descrição dos dados utilizados na pesquisa; na
quinta seção, são demonstrados os resultados da pesquisa; e, finalmente, a sexta seção
apresenta a conclusão do trabalho e sugestões para novas pesquisas.
2. CONTABILIZAÇÃO DE DERIVATIVOS E O CONCEITO DE FAIR VALUE
A contabilização de derivativos é um desafio não só pela grande alavancagem, velocidade
e complexidade das operações, mas também, pela utilização de um dos princípios básicos e
mais difundidos na Contabilidade: o custo histórico como base de valor.
O custo histórico como base de valor é uma métrica de mensuração inadequada, pelo
menos na visão dos órgãos reguladores (FASB2, IASB3 e BACEN4) para a representação
desses instrumentos financeiros nas demonstrações contábeis.
O Financial Accounting Standards Board - FASB (1997), no pronunciamento No. 107,
Disclosures about Fair Value of Financial Instruments (parágrafos 39-41)5, afirma que as
informações sobre o fair value dos instrumentos financeiros estão de acordo com o primeiro
objetivo das demonstrações contábeis, que é o de prover informações úteis para a tomada de
decisões a investidores atuais e potenciais, aos credores e a outros usuários das informações
contábeis.
Segundo Lopes e Martins (2005), esse pronunciamento é um exemplo clássico de
recomendação baseada na abordagem normativa. O fair value (ou valor justo) é definido pelo
FASB como sendo o montante pelo qual um ativo/passivo pode ser negociado em uma
transação entre partes não relacionadas quando nenhuma das duas está atuando sob pressão.
Segundo Delaney et al. (2001) o fair value é o preço aceito pelas partes em uma negociação,
pode ser mensurado pelo preço de mercado do instrumento financeiro ou pode ser calculado
pelo valor presente líquido dos fluxos de caixa futuros, dentre outras formas de mensuração.
2
Financial Accounting Standards Board, órgão que regulamenta as normas contábeis para empresas atuantes nos
Estados Unidos.
3
International Accounting Standards Board, órgão que regulamenta as normas contábeis internacionais.
4
Banco Central do Brasil, órgão que regulamenta as normas contábeis para instituições financeiras no Brasil.
5
“The Board concluded that information about fair value of financial instruments meets the first objective of financial
reporting stated in FASB Concepts Statement No 1, Objectives of Financial Reporting by Business Enterprises, that
is, to provide information that is useful to present and potential investors, creditors, and others users in making
rational investment, credit and similar decisions. Fair value of financial instruments depict the market’s assessment of
the present value of net future cash flows directly or indirectly embodied in them, discounted to reflect both current
interest rates and the market’s assessment of the risk that the cash flows will not occur. Investors and creditors are
interested in predicting the amount, timing, and uncertainty of future cash flows from the entity to them. Periodic
information about the fair value of an entity’s financial instruments under current conditions and expectations should
help those users both making their own predictions and in confirming or correcting their earlier expectations.
Information about fair values better enables investors, creditors, and other users to assess the consequences of an
entity’ investment and financing strategies, that is, to asses its performance. For example, information about fair value
shows the effects of a decision to borrow using fixed-rate rather than floating-rate financial instruments or of a
decision to invest on long-term rather than short-term instruments. Also, in a dynamic economy, information about fair
value permits continuous reassessment of earlier decisions in light of current circumstances.”
1031
7º Encontro Brasileiro de Finanças
4
O principal argumento do FASB para a adoção do fair value está baseado na utilidade da
informação para o usuário. Assim, o custo histórico de instrumentos financeiros (derivativos e
não derivativos) não seria uma informação relevante. Lopes e Martins (2005) argumentam que,
nesse caso, o FASB apresenta a perspectiva da informação como base para o pronunciamento,
mas, ao mesmo tempo, recomenda procedimentos extremamente normativos.
No cenário contábil nacional, uma abordagem bastante similar à utilizada pelo FASB, em
seu pronunciamento No. 115 (Accounting for certain investments in debt and equity securities),
que requer o fair value como base de mensuração para os instrumentos financeiros, foi adotada
pelo BACEN em sua Circular 3.068 emitida em novembro de 2001. Nesse normativo o BACEN
adota o fair value como medida de mensuração para os títulos e valores mobiliários ativos das
instituições financeiras6. Posteriormente, em janeiro de 2002, o BACEN emitiu a Circular 3.082
que trata da contabilização de derivativos e nela também adota como base de mensuração o
fair value.
A adoção do fair value pode resultar no aumento da relevância da informação contábil,
mas aumenta também sua subjetividade, o que vai contra a convenção contábil da objetividade.
Lopes e Martins (2005, p.78) discorrem que:
[...] o custo histórico possui maior objetividade do que o conceito de fair value, sendo
verificado por intermédio de documentos comprobatórios, enquanto que o fair value
passa, necessariamente, por algum tipo de estimativa. Naturalmente, a visão mais
objetiva do custo histórico se adequa mais facilmente aos países que adotam o regime
de direito romano enquanto que o fair value está mais próximo das características do
direito consuetudinário. De uma forma geral, nos países de direito consuetudinário
tendem a predominar a essência sobre a forma no registro das transações.
A adoção do fair value pelo BACEN no Brasil, um país com características predominantes
de direito romano, diverge da abordagem tradicional7 que utiliza o custo histórico, onde há um
documento oficial comprobatório no qual a Contabilidade deveria se apoiar para a avaliação e
classificação do título. As normas atuais do BACEN têm como foco: i) a intenção da
administração para a classificação do instrumento financeiro/derivativo e ii) o fair value do título
para sua valoração.
O conceito de fair value é mais subjetivo que o custo histórico e implica na estimação dos
valores envolvidos. Segundo Lopes e Martins (2005), mesmo no caso mais simples, quando o
valor de mercado está disponível existe subjetividade, pois o valor de mercado pode ser o de
abertura, o de fechamento ou o médio. Nesse tipo de situação, onde o mercado de um ativo
existe de forma organizada e eficiente, o conceito de fair value se confunde com o de valor de
mercado. Em situações na qual o mercado não é suficientemente eficiente, ou quando não há
6
7
A exceção é para os títulos mantidos até o vencimento.
Inclusive a relativa à lei 6.404/76, que normatiza a Contabilidade das Sociedades Anônimas.
1032
7º Encontro Brasileiro de Finanças
5
mercado para determinado produto, a estimativa de seu fair value deve ser realizada através de
modelos de precificação8, o que aumenta ainda mais sua subjetividade.
O aumento da subjetividade da mensuração do valor a ser contabilizado é acompanhado
pelo aumento da discricionariedade da administração sobre os resultados. Nesse contexto, a
literatura tem investigado o gerenciamento de resultados contábeis, que consiste na
manipulação, dentro dos limites das normas, dos resultados contábeis a serem divulgados
pelas empresas com a intenção de se obter algum ganho privado (Schipper, 1989).
O Banco Central do Brasil (BCB), por intermédio da Circular No 3.082 de 30 de janeiro de
2002, emitiu orientações acerca da contabilização dos derivativos mantidos por instituições
financeiras e assemelhadas. Essa circular é fortemente baseada nos conceitos emanados pela
norma do FASB sobre contabilização de derivativos, o SFAS 133 (1998). Os principais aspectos
da Circular No 3.082 que regem as normas de contabilização dos derivativos se encontram em
anexo no presente artigo. Também em anexo está um exemplo de utilização de contabilização
de um derivativo através das normas brasileiras.
A seção seguinte trata da manipulação, ou gerenciamento, dos resultados dos bancos
pela sua administração com objetivos específicos.
3. GERENCIAMENTO DE RESULTADOS
Desde Ball e Brown (1968) e Beaver (1968), já existem evidências de que os lucros
contábeis têm conteúdo informativo. Uma informação tem conteúdo informativo quando altera
as expectativas dos agentes econômicos o que, no caso de empresas negociadas em bolsa,
representa impacto nos preços de suas ações. Para os bancos brasileiros não negociados em
Bolsa de Valores, o lucro contábil também tem conteúdo informativo, pois pode alterar as
expectativas do agente regulador e dos financiadores da instituição, influenciando, inclusive, em
seu custo de capital.
O resultado do processo contábil, o lucro ou prejuízo líquido do exercício, não é apenas
determinado pelo fluxo de caixa gerado no período. Há, também, ajustes adicionais decorrentes
do regime de competência9
que podem ser influenciados discricionariamente pela
administração da empresa. No caso dos derivativos, esses ajustes podem ser ainda mais
relevantes, considerando que o princípio contábil de avaliação pelo custo histórico é
abandonado e passa-se a utilizar o fair value.
Em um contexto de assimetria informacional, pode haver incentivos para que o
administrador gerencie os números contábeis no sentido de se beneficiarem. Healy e Whalen
8
Esses modelos devem ser embasados em teorias de finanças e economia.
O resultado contábil busca mensurar o desempenho de uma entidade em determinado período. Entretanto, o fluxo
de caixa gerado pela entidade não pode ser entendido como uma medida de desempenho isoladamente, pois é
muito imediatista. Por isso a Contabilidade utiliza o princípio da competência como um de seus alicerces.
9
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7º Encontro Brasileiro de Finanças
6
(1999) relatam que o gerenciamento de resultados ocorre quando os administradores utilizam o
julgamento na elaboração das demonstrações financeiras e na estruturação de operações com
o intuito de iludir alguns stakeholders sobre o desempenho econômico da empresa ou quando
visam influenciar resultados contratuais que dependem de números contábeis. Martinez (2001,
p.13) argumenta que:
[...] É crucial entender que gerenciamento de resultados não é fraude contábil. Ou seja,
opera-se dentro dos limites que prescreve a legislação contábil, entretanto nos pontos
em que as normas contábeis facultam certa discricionariedade para o gerente este
realiza suas escolhas não em função do que dita a realidade concreta dos negócios,
mas sim em função de outros incentivos, que o levam a desejar reportar um resultado
distinto.
Dechow e Skinner (2000) constatam que pode haver gerenciamento de resultados que
envolvem decisões contábeis puras ou decisões onde há um impacto efetivo no fluxo de caixa
da empresa. De acordo com Martinez (2001, p. 42), o gerenciamento de resultados pode ser
classificado, segundo a motivação envolvida, entre as seguintes modalidades: Target Earnings,
Income Smoothing e Big Bath Accounting.
O lucro alvo (target earnings) se refere ao ajuste do resultado com o intuito de se atingir
metas de referência que podem ser acima ou abaixo do resultado do período. Assim, a
administração busca alcançar um resultado mínimo ou máximo esperado. O alisamento de
resultados (income smoothing) evita a excessiva flutuação do lucro, resultando na redução da
volatilidade dos lucros. A idéia básica por traz dessa motivação é a ausência de surpresas para
os stakeholders com o resultado publicado. O alisamento de uma série de lucros inclui medidas
para reduzir e estocar lucros durante os anos bons para usá-los durante os anos em que os
lucros estejam piores.
A big bath accounting visa reduzir os lucros correntes, dadas situações específicas que
incentivem tal prática, objetivando um aumento nos lucros futuros. Em certos anos em que
houve crises internacionais, nos quais grande parte das instituições financeiras reportou
prejuízos, poderia ser oportuno antecipar resultados negativos de algumas operações, e
concentrar os prejuízos nesse ano (big bath), permitindo uma realização de resultados positivos
nos períodos subseqüentes.
O gerenciamento de resultados pode ser feito através das posições em instrumentos
derivativos adotadas pelo banco. O conceito de posição é referente ao ativo ou passivo na
carteira de derivativos, ou utilizando os termos de mercado, a posição comprada ou vendida.
Para exemplificar: uma posição comprada incorrerá em ganho caso o preço do ativo-objeto
suba, uma posição vendida provoca uma perda caso o preço suba.
As estratégias com derivativos, segundo Hull (2006), podem ser classificadas em hedge,
especulação e arbitragem. Uma estratégia de hedge tem o intuito de proteção contra possíveis
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7º Encontro Brasileiro de Finanças
7
perdas, tem como objetivo a redução, ou neutralização, de riscos de mercado. Numa estratégia
de hedge, se o banco possui uma carteira de valores mobiliários ativa, ou seja, comprada, para
neutralizar os seus riscos, deverá adotar uma posição passiva – vendida – no mercado de
derivativos. Nesse caso, o resultado financeiro da carteira de derivativos deve ser exatamente o
inverso da carteira de ativos, se a carteira de ativo resultar em prejuízo, a carteira de passivo
em derivativos resultará em um lucro de mesmas proporções. O hedge é consistente com o
gerenciamento de resultados que tem como objetivo income smoothing, pois evita grandes
volatilidades nos resultados.
A estratégia de especulação consiste, para o banco, em assumir uma porção adicional de
risco para incrementar os lucros. Hull (2006) define os especuladores como aqueles que
apostam em uma direção de uma variável de mercado. O sucesso da operação de especulação
depende da habilidade do operador e do seu conhecimento da direção dos preços de mercado,
pode gerar perdas ou ganhos.
A estratégia de arbitragem consiste em aproveitar diferenças de preços de um mesmo
ativo ou derivativo em mercados diferentes, possibilitando um ganho certo, normalmente
pequeno, sem a necessidade de assumir uma porção adicional de risco.
Nas próximas duas seções é feito um estudo empírico utilizando dados em painel de
bancos brasileiros para tentar identificar relação dos resultados com derivativos com o
gerenciamento de resultados dos bancos.
4. DADOS E METODOLOGIA
O objetivo da metodologia do trabalho é conceder argumentos empíricos para a seguinte
questão de pesquisa: Os bancos brasileiros utilizam a contabilização de derivativos (com base
no fair value) para o gerenciamento de resultados?
Para a investigação do gerenciamento do resultado com o uso do fair value para a
contabilização de derivativos pelos bancos brasileiros é utilizada a técnica de análise de dados
em painel. Os dados em análise são provenientes de amostras anuais de bancos brasileiros,
durante um período de 3 anos, sendo os mesmos bancos em todos os anos, ou seja, a amostra
não varia com o tempo. O intuito do uso de dados em painel está motivado, segundo Woodridge
(1999), na tentativa de resolver o problema de variáveis não observadas. Neste caso, é
importante verificar se a variável não observada é correlacionada com as variáveis explicativas.
Supondo que a variável omitida ci seja constante no tempo, haveria o seguinte modelo em
painel:
yit = xit β + ci + u it
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7º Encontro Brasileiro de Finanças
8
E ( y it xit , c ) = xit β + ci
E (u it xit , c ) = 0
Em que: yit é a variável dependente referente ao banco i no ano t;
xit é um vetor (1xK) de variáveis explicativas que mudam entre os bancos i e o
ano t;
β é o vetor é de (k-1) coeficientes associados às variáveis explicativas;
ci representa os efeitos não observados em i;
uit são os termos de erro idiossincráticos (pois podem se alterar em i e em t)
De acordo com Wooldridge (2002), deve-se testar a presença de efeitos de variáveis não
observáveis no modelo, e a correlação desses efeitos com as variáveis dependentes. Caso
( )
E xt' c = 0 , os modelos Pooled Ordinary Least Squares (POLS) são consistentes e eficientes.
Se houver presença de heteroscedasticidade, pode-se utilizar a matriz de variância robusta
para o teste dos coeficientes da regressão POLS.
O procedimento para decidir em utilizar POLS ou um outro modelo para efeitos não
observados é feito pelo teste de Breusch-Pagan (1980), que é um teste do tipo LM que verifica
se a variância do efeito não observável é estatisticamente diferente de zero, caso a variância
seja igual a zero, o POLS será consistente e eficiente.
Além disso, é feito o teste de Baltagi e Li (1995) para autocorrelação serial de primeira
ordem dos erros idiossincráticos e o teste conjunto de Baltagi e Li, que testa conjuntamente se
a variância do componente não observável é igual a zero e se há autocorrelação serial de
primeira ordem nos resíduos. Se a utilização do modelo POLS for rejeitada estatisticamente,
será utilizado um modelo de dados em painel, com efeitos fixos (EF) ou efeitos aleatórios (EA).
A definição tradicional, segundo Wooldridge (2002), de EF e EA, está relacionada ao fato
de ci ser tratado como variável aleatória ou como um parâmetro a ser estimado. Porém o ponto
de interesse é identificar se ci é correlacionado com as variáveis explicativas xit. O modelo de
painel de efeitos aleatórios assume correlação zero entre ci e xit, o modelo de efeitos fixos
permite essa correlação, logo, é menos restritivo.
O teste de Hausman auxiliará na decisão de utilizar EF ou EA. O teste de Hausman testa
se os coeficientes de EF e EA são sistematicamente diferentes, uma vez que o estimador de
efeitos fixos é consistente, independentemente da correlação entre o componente não
observável e as variáveis explicativas, a diferença entre os coeficientes EF e EA é um indício
contra a utilização do estimador EA.
A análise dos dados parte de todos os conglomerados financeiros atuantes no Brasil que
obtiveram resultados com derivativos nos anos de 2002, 2003 ou 2004. Em seguida, foram
1036
7º Encontro Brasileiro de Finanças
9
excluídos os bancos que não realizaram operações com derivativos em dois dos três períodos
analisados, pois não haveria informação suficiente para a análise em painel.
As análises, portanto, são a partir das posições anuais de 2002 (início da norma de
contabilização de derivativos) a 2004, englobando os valores para o conceito de conglomerados
financeiros (que representa o consolidado menos a parte de empresas não financeiras
encampadas no conceito de conglomerado econômico). Os dados da pesquisa foram obtidos
junto à Divisão de Informações Cadastrais, Contábeis e Econômico-Financeiras (DINFO) e ao
Departamento de Informações do Sistema Financeiro (DEFIN), do BACEN. Sessenta e nove
bancos foram considerados no estudo e estão detalhados na tabela 1. O total dos ativos da
amostra em análise representava ao final de 2004 aproximadamente 98% do total dos ativos
das instituições financeiras atuantes no Brasil.
Tabela 1. Bancos que compõem a amostra
Instituições Financeiras Analisadas: informações de 2002 a 2004
ABC-BRASIL
DAIMLERCHRYSLER
PEBB
ABN AMRO
DEUTSCHE
PECUNIA
ALFA
DRESDNER
PINE
AMEX
EMBLEMA
PRIMUS
BANESTES
FIBRA
PROSPER
BANKBOSTON
FICSA
PSA FINANCE
BANRISUL
HONDA
RENDIMENTO
BB
HSBC
RURAL
BBM
INDUSTRIAL DO BRASIL
SAFRA
BEC
INDUSVAL
SANTANDER BANESPA
BES
ING
SANTINVEST
BGN
INTERCAP
SCHAHIN
BIC
ITAÚ
SOCIETE GENERALE
BMC
JOHN DEERE
SOCOPA
BRADESCO
JP MORGAN CHASE
SOFISA
BRASCAN
MARSAM/S K
SS
BRB
MATONE
STOCK
CACIQUE
MERCANTIL DO BRASIL
TENDENCIA
CITIBANK
MERRILL LYNCH
THECA
COINVALORES
MORGAN STANLEY
TOYOTA
CREDIT LYONNAIS
NOVAÇÃO
UBS
CREDIT SUISSE
OURINVEST
UNIBANCO
CRUZEIRO DO SUL
PACTUAL
VOTORANTIM
As variáveis analisadas são compostas pelos saldos/resultados das contas do Plano
Contábil das Instituições Financeiras do Sistema Financeiro Nacional (Cosif). Foram
consideradas as seguintes variáveis:
1037
7º Encontro Brasileiro de Finanças
10
• Rderivit = resultado com derivativos do banco i no ano t (conta 1011101016);
• LLit = lucro líquido do banco i no ano t (conta 1000000000);
• LLantesit = lucro líquido excluindo o resultado com derivativos do banco i no ano t;
• Derivativos_acit = saldo de derivativos no ativo circulante do banco i no ano t (conta
1013850000);
• Derivativos_rlp it = saldo de derivativos no ativo realizável a longo prazo do banco i no
ano t (conta 1023850000);
• Derivativos_pcit = saldo de derivativos no passivo circulante do banco i no ano t (conta
4019870000);
• Derivativos_elp it = saldo de derivativos no passivo exigível de longo prazo do banco i no
ano t (conta 4029870000);
• Posliqit = saldo (posição) líquido (ativo menos passivo) com derivativos do banco i no
ano t;
• Ajfvit = saldo no patrimônio líquido dos ajustes a fair value dos títulos disponíveis para
venda e dos hedges de fluxo de caixa (conta 4067000000);
• Rbifit = resultado bruto com intermediação financeira do banco i no ano t (conta
1011100000);
• Rtvmit = resultado de operações com títulos e valores mobiliários do banco i no ano t
(conta 1011101015);
• Rcambit = resultado de operações com câmbio do banco i no ano t (conta 1011101017);
• Ativo_totalit = ativo total do banco i no ano t.
5. ANÁLISE DOS RESULTADOS
Importante salientar que, para a realização dos testes, todas as variáveis foram divididas
pelo ativo total do período. Esse procedimento é sugerido para se evitar o problema do efeito
escala detectado por Brown, Lo, Lys (1999). Assim, por exemplo, quando houver referência
(deste ponto em diante) no texto sobre a variável Rderivit, entende-se que é o resultado com
derivativos escalonado pelos ativos totais do banco i no período t. Após a divisão pelo ativo
total, resultaram estatísticas descritivas das variáveis em análise. A tabela 2 apresenta os
resultados.
Pela análise da tabela 2 percebe-se que a média e a mediana do resultado com
derivativos dos bancos brasileiros é bastante reduzida em relação ao resultado bruto com
intermediação financeira e em relação ao resultado de operações com títulos e valores
mobiliários.
1038
7º Encontro Brasileiro de Finanças
11
Tabela 2. Estatísticas Descritivas.
Ajfv
Média
Mediana
Desvio Padrão
Observações
0,00120
0,00000
0,02168
207
Derivativos_ac
0,02122
0,00212
0,04232
207
Derivativos_elp
0,00754
0,00000
0,02634
207
Derivativos_pc
0,02274
0,00236
0,06885
207
Derivativos_rlp
0,01273
0,00000
0,07198
207
LL
0,02382
0,02011
0,03923
207
LLantes
0,02245
0,01888
0,05717
207
Posliq
0,00368
0,00001
0,02874
207
Rbif
0,08694
0,07403
0,14211
207
Rderiv
0,00137
-0,00018
0,04230
207
Rtvm
0,08239
0,06264
0,08098
207
Para embasar as hipóteses testadas adiante, são analisados os histogramas das variáveis
LLantes, LL e Rderiv (Figuras 1, 2 e 3 respectivamente). Embora essa análise não represente
um resultado formal, ela ajuda a entender o comportamento das variáveis e a identificar
padrões a serem testados empiricamente.
Figura 1. Distribuição do lucro líquido dos bancos brasileiros antes da contabilização do resultado com
derivativos (dividido pelos ativos totais).
70
Freqüência Absoluta
60
Mean = 0,0224504
Std. Dev. = 0,05717367
N = 207
50
40
30
20
10
0
-0,40000 -0,30000 -0,20000 -0,10000
0,00000
0,10000
0,20000
0,30000
LLantes
Analisando a figura acima, percebe-se grande concentração de resultados positivos e um
forte salto no número de bancos que apresentam pequenos prejuízos para bancos que
1039
7º Encontro Brasileiro de Finanças
12
apresentam pequenos lucros. O comportamento mais esperado seria uma distribuição mais
suavizada nesse ponto.
Figura 2. Distribuição do lucro líquido dos bancos brasileiros
(dividido pelos ativos totais).
70
Freqüência Absoluta
60
Mean = 0,0238234
Std. Dev. = 0,0392325
N = 207
50
40
30
20
10
0
-0,30000
-0,20000
-0,10000
0,00000
0,10000
0,20000
LL
Pode-se perceber que, quando é considerado o resultado com derivativos, há uma
suavização da distribuição com relação à figura anterior. Um maior número de bancos aparece
com resultado negativo, entretanto não se percebe alterações consideráveis na distribuição de
bancos com resultados positivos.
Figura 3. Distribuição do resultado com derivativos dos bancos brasileiros
(divididos pelos ativos totais).
80
Mean = 0,0013731
Std. Dev. = 0,0422986
N = 207
Freqüência Absoluta
60
40
20
0
-0,20000 -0,10000
0,00000
0,10000
0,20000
0,30000
Rderiv
1040
0,40000
0,50000
7º Encontro Brasileiro de Finanças
13
Nesta figura percebe-se grande concentração em resultados pequenos negativos ou
positivos. Indica, também, pelo tamanho dos resultados em relação ao ativo, que os bancos
brasileiros são conservadores na utilização desses instrumentos.
Dentro do contexto apresentado, os dados serão analisados para identificação de relação
entre os resultados com derivativos com outros resultados dos bancos e o lucros, com o intuído
de tentar relacionar com algumas das estratégias de gerenciamento, ou manipulação de
resultados.
Para isso são realizados testes para identificar a presença de efeitos não observáveis,
contudo, acredita-se que existam variáveis não observáveis resultantes da habilidade e da
intenção dos operadores dos bancos, variáveis não disponíveis, nem mesmo em forma de
proxy, nos demonstrativos contábeis dos bancos.
Para isso foram elaboradas as seguintes hipóteses a serem testadas e os seus
respectivos modelos na forma reduzida disponível:
H1 – A primeira hipótese tem um intuito mais genérico, pois tenta verificar se a
contabilização do resultado com derivativos, nos bancos analisados da amostra, está coerente
com o conceito de fair value. Essa hipótese parte da premissa simplista de que, quando houver
resultados negativos com derivativos, este provocará uma conseqüente redução dos ativos em
derivativos ou um aumento no saldo da conta de passivo em derivativos. Parte-se da premissa,
portanto, que o resultado com derivativos dos bancos brasileiros é explicado pela variação das
posições ativas e passivas em derivativos:
Modelo (1):
Rderivit
=
β0i
+
β1∆Derivativo_acit
+
β2∆Derivativo_pcit+
β3∆Derivativo_rlpit+
β4∆Derivativo_elpit+εit
As hipóteses seguintes, após a verificação do uso do conceito de fair value na
contabilização de derivativo, têm o objetivo de investigar a relação dos resultados com
derivativos no gerenciamento de resultados:
H2 – Este modelo quer testar a hipótese de que existe relação dos resultados com
derivativos com o lucro (ou prejuízo) líquido dos bancos (expurgando o resultado com
derivativos). Este modelo pretende identificar a estratégia de hedge por parte dos bancos.
Modelo (2):
Rderivit = β0i + β1LLantes it+ εit
H3 – Este modelo tem o intuito de testar a hipótese de que os resultados com
derivativos dos bancos brasileiros é influenciado pelo resultado bruto com intermediação
financeira (expurgando o resultado com derivativos). O resultado bruto com intermediação
financeira é composto do resultado com operações de crédito, arrendamento mercantil,
operações com títulos e valores mobiliários e de câmbio:
1041
7º Encontro Brasileiro de Finanças
14
Modelo (3):
Rderivit = β0i + β1Rbif it+ εit
H4 – Este é o modelo mais conciso, pois analisa exclusivamente a relação do resultado
com derivativos dos bancos brasileiros com o resultado de operações com títulos e valores
mobiliários. Este modelo possui maior probabilidade de efeito de variável não observável e/ou
variável omitida:
Modelo (4):
Rderivit = β0i + β1Rtvm it+ εit
H5 – Este modelo consiste na inclusão de mais variáveis de resultado, inclusive
resultado com câmbio, para analisar a relação com o resultado com derivativos, na tentativa de
não omitir variáveis, que seria uma falta mais grave do que acrescentar variáveis
desnecessárias no modelo:
Modelo (5):
Rderivit = β0i + β1Rbif it+ β2Rtvm it + β3Rcamb it +εit
A tabela 3 apresenta os coeficientes estimados por POLS com matriz de variância robusta
e as estatísticas para cada um dos modelos formulados:
Tabela 3. Modelo estimados por POLS com variância robusta.
Modelo (1)
Modelo (2)
Modelo (3)
Modelo (4)
Modelo (5)
Coeficientes
Estatística t
p – valor
∆Derivativo_acit
0,3343408
2,440
0,0160
∆Derivativo_pcit
-0,3622609
-2,730
0,0070
∆Derivativo_rlpit
0,3055803
2,720
0,0070
∆Derivativo_elpit
-0,3075267
-2,040
0,0440
Constante
-0,0025669
-1,120
0,2640
LLantes it
-0,5382372
-3,920
0,0000
Constante
0,0134567
3,100
0,0020
Rbif it
-0,0847288
-1,480
0,1420
Constante
0,0086229
1,260
0,2100
Rtvm it
-0,0734179
-1,120
0,2620
Constante
0,0074219
1,040
0,3000
Rbif it
-0,0797256
-1,490
0,1370
Rtvm it
-0,0488918
-0,810
0,4200
Rcamb it
0,0238757
0,420
0,6720
Constante
0,0119109
1,300
0,1960
Os testes de Breusch-Pagan e Baltagi e Li (tabela 4) avaliam se a variância do componente
não observável é igual a zero e se há autocorrelação serial de primeira ordem nos resíduos,
1042
7º Encontro Brasileiro de Finanças
15
respectivamente. O resultado dos testes indicam que apenas para os modelos (1) e (2) rejeitouse que a hipótese nula de que a variância do componente observável é igual a zero, nos outros
modelos essa hipótese não foi rejeitada. Porém, o teste de Breusch-Pagan exige a ausência de
autocorrelação serial nos resíduos. Nos modelos (3) e (5) não se rejeita autocorrelação serial
dos resíduos, logo o teste de Breusch-Pagan não é válido, além disso, o teste conjunto de
Baltagi e Li para o Modelo (4) rejeita que a variância do componente não observável é igual a
zero, ao mesmo tempo em que rejeita que não há autocorrelação serial de primeira ordem nos
resíduos, portanto o uso de dados em painel é recomendável para todos os modelos, pois não é
possível afirmar que a estimação por POLS é consistente e eficiente.
Tabela 4. Testes de Breusch-Pagan e Baltagi e Li (p-valores)
Breusch-Pagan
Baltagi e Li
bicaudal
conjunto
Baltagi e Li
Modelo (1)
0,0009
0,0009
0,0000
Modelo (2)
0,0295
0,0000
0,0000
Modelo (3)
0,9029
0,3475
0,1965
Modelo (4)
0,9027
0,0223
0,0008
Modelo (5)
0,8391
0,5432
0,3990
De acordo com o teste de Hausman, disponível na tabela seguinte, o qual testa se os
coeficientes de EF e EA são sistematicamente diferentes, apenas para os Modelos (1) e (2)
pode-se rejeitar a hipótese nula, ou seja, pode-se considerar que os estimadores EA e EF são
diferentes.
Tabela 5. Teste de Hausman (EA vs. EF).
Hausman
p-valor
Modelo (1)
0,0045
Modelo (2)
0,0000
Modelo (3)
0,0739
Modelo (4)
0,0648
Modelo (5)
0,1476
Neste contexto, realiza-se a regressão robusta com efeitos fixos. A tabela 6 contém os
resultados da regressão em painel com EF robusta:
1043
7º Encontro Brasileiro de Finanças
16
Tabela 6. Modelos estimados por Painel Efeitos Fixos (regressão robusta)
10
Modelo (1)
11
Modelo (2)
Modelo (3)
Modelo (4)
Modelo (5)
Coeficientes
Estatística t
p – valor
∆Derivativo_acit
0,2129272
3,570
0,0010
∆Derivativo_pcit
-0,1955941
-2,580
0,0120
∆Derivativo_rlpit
0,1606225
2,530
0,0140
∆Derivativo_elpit
Constante
-0,1305907
-0,005585
-1,210
-1,010
0,2300
0,3170
LLantes it
Constante
-0,7445243
0,0372989
-5,630
1,180
0,0000
0,2410
Rbif it
-0,1191775
-1,560
0,1210
Constante
-0,0618897
-1,350
0,1800
Rtvm it
-0,1776362
-2,650
0,0090
Constante
0,0357351
1,080
0,2830
Rbif it
-0,1127182
-1,610
0,1090
Rtvm it
-0,1180927
-0,980
0,3310
Rcamb it
0,0786871
-0,0495896
1,080
-1,190
0,2810
0,235
Constante
O modelo (1) demonstra a relação esperada entre o resultado com derivativos e a
variação das contas de ativo e passivo de derivativos. Isso ocorre por conta da utilização do fair
value na contabilização dos derivativos. Todos os coeficientes foram significantes a um nível de
5%, com exceção do β4 que é o coeficiente dos passivos exigíveis de longo prazo. Esse fato
pode ter ocorrido dado o reduzido número desse tipo de operação nos bancos atuantes no
Brasil. Entretanto, esse modelo demonstra haver consistência entre o resultado com derivativos
apurados pelos bancos e suas respectivas contas de ativo e passivo que estão avaliadas pelo
fair value.
O modelo (2) demonstra existir um relacionamento inverso entre o resultado com
derivativos e o lucro líquido antes do resultado com derivativos dos bancos brasileiros. Uma
conjectura sobre essa situação é a de que os bancos utilizam as operações com derivativos
para proteger seus resultados (hedge), o que explicaria o sinal negativo e significante do
coeficiente β1 do modelo (2).
O modelo (3) apresenta uma relação que não é estatisticamente significante entre o
resultado com derivativos e o resultado bruto com intermediação financeira. Apesar do sinal do
coeficiente ter resultado no sinal esperado, não se pode dizer que há relação entre as variáveis.
O modelo (4) relaciona o resultado com derivativos com o resultado com títulos e valores
mobiliários. Importante ressaltar que como esses títulos também são avaliados (Disponíveis
para Venda e Títulos para Negociação) pelo fair value e era esperada uma relação significante
10
Realizamos, mas não reportamos a regressão robusta com efeitos aleatórios (suportada pelo teste de Hausman)
pois as conclusões não se alteram.
11
Realizamos, mas não reportamos a regressão robusta com efeitos aleatórios (suportada pelo teste de Hausman)
pois as conclusões não se alteram.
1044
7º Encontro Brasileiro de Finanças
17
entre as variáveis. O valor negativo esperado aparece dentro do contexto que os bancos
utilizam derivativos, em grande parte, para operações de hedge.
Finalmente, o modelo (5) apresenta uma relação interessante dos resultados com
derivativos e as variáveis explicativas, apesar dos coeficientes não serem estatisticamente
significantes, o coeficiente do resultado com as operações de câmbio possui sinal positivo, que
pode indicar que os bancos não estão realizando o hedge das posições de câmbio com
instrumentos derivativos, ficando expostos ao risco de mercado.
6. CONCLUSÕES E SUGESTÕES PARA NOVAS PESQUISAS
O trabalho investigou de maneira empírica se os bancos brasileiros utilizam a
contabilização de derivativos como instrumento para o gerenciamento de resultados. Nesse
sentido, utilizou-se a análise em painel para a estimação dos modelos. As evidências apontam
existir um relacionamento significativo e inverso entre o lucro antes do resultado com derivativos
e o resultado com derivativos, o que é o esperado considerando-se que as instituições
utilizariam, primordialmente, as operações com derivativos para finalidades de hedge. Também
foi encontrada uma relação significante e inversa entre o resultado com títulos e valores
mobiliários e o resultado com derivativos, indicando que estes são utilizados como instrumentos
de hedge para proteger a variação dos primeiros. Contudo, não se pode estabelecer uma
relação significante entre o resultado com derivativos e os resultados com intermediação
financeira, que também seriam itens bastante importantes a serem objetos de hedge.
Adicionalmente, a distribuição empírica do lucro líquido dos bancos brasileiros demonstra que,
quando é considerado o resultado com derivativos, há uma suavização da distribuição com
relação ao lucro antes dos derivativos, demonstrando novamente um possível efeito da
utilização de derivativos com finalidade para o hedge. Essas evidências não sugerem a
utilização de suavização dos resultados (income smoothing) e/ou de big bath accounting pelos
bancos brasileiros a partir da metodologia de contabilização de derivativos. Adicionalmente, as
evidências apontam para uma relação estatisticamente significante entre a variação das contas
de ativo e passivo de derivativos no balanço (que são avaliadas pelo fair value) e o resultado
com derivativos. Esse relacionamento é consistente com a metodologia de contabilização de
derivativos pelo seu valor de mercado (fair value), instituída pela Circular 3.082/2002 do Banco
Central do Brasil. Estudos posteriores podem investigar mais profundamente o tratamento das
operações de fair value hedge (hedge de risco mercado) e das operações de cash flow hedge
(hedge de fluxo de caixa). Para isso, seria necessário obter um detalhamento maior da conta de
patrimônio líquido (APE) onde são contabilizadas partes dessas operações. Outra análise a ser
implementada é a consideração dos impactos tributários nas operações com derivativos. O
1045
7º Encontro Brasileiro de Finanças
18
incentivo para gerenciamento de resultados e os impactos tributários das operações possuem
ligação estreita e há um amplo campo de estudo neste caminho.
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