1 1 CRIME E SEGREGAÇÃO SOCIOESPACIAL

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CRIME E SEGREGAÇÃO SOCIOESPACIAL: DILEMAS DAS REGIÕES
METROPOLITANAS
Robson Sávio Reis Souza1
RESUMO: discutiremos a questão da criminalidade nas regiões metropolitanas brasileiras, a partir
da associação de crimes violentos, notadamente os homicídios, com a segregação socioespacial,
produtora de uma série de desvantagens para os moradores das favelas. Defendemos que para
reverter os efeitos dessa perversa associação (responsável por grande vitimização nesses locais e
pela exclusão dos moradores de vários direitos de cidadania) o poder público deveria direcionar
investimentos considerando um rol de ações: políticas sociais, melhoria da infra-estrutura urbana,
aperfeiçoamento das agências do sistema da justiça criminal, entre outros.
PALAVRAS-CHAVE: criminalidade; segregação socioespacial; regiões metropolitanas.
1. INTRODUÇÃO
O problema da violência e da criminalidade é um fenômeno mundial. De acordo com a
Organização Mundial de Saúde, as mortes por causas externas correspondem a grande parcela de
óbitos em, praticamente, todos os países do mundo, ocupando, quase sempre, a segunda ou terceira
colocação (WHO, 2003).2 Porém a distribuição dos crimes quanto aos locais de concentração e ao
tipo de causa é diversa.
No Brasil, a violência e a criminalidade violenta3 cresceram muito a partir de meados da
década de 1980. A insegurança pública passou a se constituir um grande obstáculo ao exercício dos
direitos de cidadania, principalmente nas grandes metrópoles brasileiras.
Segundo a Síntese dos Indicadores Sociais do IBGE, de 2003,
Entre 1980 e 2000, no Brasil, foram vítimas de homicídios 598.367 pessoas; dois terços delas
(369.101) na década de 1990. Naqueles mesmos 20 anos, o Brasil registrou mais de dois milhões de
1
Doutorando do Programa de Pós-graduação em Ciências Sociais da PUC Minas; Pesquisador do Centro de Estudos de
Criminalidade e Segurança Pública da UFMG (Crisp). E-mail: [email protected].
2
―A violência é um dos eternos problemas da teoria social e da prática política e relacional da humanidade. Não se
conhece nenhuma sociedade onde a violência não tenha estado presente. Pelo contrário, a dialética do desenvolvimento
social traz à tona os problemas mais vitais e angustiantes do ser humano, levando filósofos, como Engels, a afirmar que
"a história é, talvez, a mais cruel das deusas que arrasta sua carruagem triunfal sobre montões de cadáveres, tanto
durante as guerras como em período de desenvolvimento pacífico" (Engels, 1981: 187).‖ (Minayo, M. C, 1994, p.07).
3 A classificação de crimes violentos que adotamos se refere aos seguintes delitos: homicídio, homicídio tentado,
estupro, roubo, roubo a mão armada, roubo de veículos, roubo de veículos a mão armada e seqüestro. Especificamente,
estamos preocupados com o impacto do aumento dos homicídios.
Número de ISBN: 978-85-61693-03-9
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mortes por causas externas e 82% delas foram de homens. Enquanto nos anos 80 os acidentes de
trânsito eram a principal causa externa dos óbitos masculinos, na década de 90, os homicídios
assumiram a liderança. Entre 1980 e 2000, a taxa de mortalidade por homicídios para ambos os sexos
no Brasil aumentou 130% (de 11,7 para 27 por 100 mil habitantes). As taxas mais altas, também por
100 mil habitantes, eram de PE (54), RJ (51), ES (46) e SP (42). De 1980 a 2000, as taxas masculinas
de mortalidade por homicídios saltaram de 21,2 para 49,7. Entre 1991 e 2000, no Brasil, aumentaram
em 95% as taxas de mortalidade por homicídios com uso de armas de fogo, entre homens de 15 a 24
anos. Em 2000, as maiores taxas eram de RJ (182), PE (180), ES (122), SP (115) e DF (113). Em
números absolutos, em 1991, foram vítimas de homicídio 5.220 homens nessa faixa de idade, com uso
de armas de fogo, e outros 12.233 foram mortos da mesma forma, em 2000. Os homens jovens, de 15
a 24 anos, são os mais afetados: em 2000, 95,6 a cada 100 mil homens dessa faixa de idade morreram
vítimas de homicídio, sendo 71,7 em cada 100 mil (ou seja, 75%) mortos com armas de fogo. Em
relação a 1991, cresceu 46% a taxa de homicídios de homens jovens (era de 65,5 a cada 100 mil) e
aumentou 95% a taxa dos realizados com armas de fogo (era de 36,8 por 100 mil, ou 56,2% do total).
Porém, o problema da violência não se limita aos homicídios. Milhares de pessoas perdem
suas vidas no Brasil por outras causas.
O total de causas externas (que, além de homicídios, inclui também acidentes, suicídios e outras
causas não naturais) provocou no país cerca de dois milhões de mortes de 1980 a 2000 — o
equivalente à população de Brasília. Em 82,2% dos casos (1,7 milhões), as vítimas foram homens. Em
2000, as causas externas foram a segunda maior causa de morte no país (14,5% do total de mortes),
junto com as neoplasias malignas (14,9%). Na distribuição dos tipos de causas externas, os homicídios
vêm aumentando sua participação, enquanto a dos acidentes de trânsito vem caindo. Entre 1991 e
2000, a proporção de mortes por acidentes de transporte, no total de causas externas, caiu 10,4%,
passando a 25% do total, enquanto a de homicídios cresceu 27,2% e chegou a 38,3% do total. (Síntese
dos Indicadores Sociais, 2003 – IBGE).
Há que se registrar uma enormidade de violências, muitas delas não computadas pelas
estatísticas oficiais, mas que geram danos incalculáveis e muitas vezes irreparáveis às vidas das
pessoas e das comunidades. Isso sem contar os custos da criminalidade.4
Mesmo com tendência de queda nos últimos anos, poderíamos, a título de exemplo, apontar
a violência associada ao trânsito. Nas tabelas abaixo, observa-se o número de mortes no trânsito no
Brasil (18.700 pessoas, em 2006) e na região sudeste (16.900, no mesmo ano):
4
Pesquisas têm demonstrado que em alguns municípios como o Rio de Janeiro, São Paulo e Belo Horizonte se gasta
cerca de 5% do Produto Interno Bruto com o combate a criminalidade. O Rio de Janeiro é o município que,
proporcionalmente, mais gasta com violência: em 1995, foram R$ 2,5 bilhões. São Paulo gastou, em 1999, R$ 9,4
bilhões e Belo Horizonte, R$ 900 milhões (Andrade; Rondon, 2008). Os cálculos dos custos da criminalidade levam em
conta o que se perde com a morte prematura de pessoas, longos tratamentos de saúde, gastos com segurança pública e
privada e os gastos privados com seguros, além das perdas diretas. Não se contabilizam, geralmente, as perdas
simbólicas que podem ser muito maiores.
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Tabela I – Mortes no trânsito: Brasil e região sudeste (2006)
VÍTIMA
TOTAL
PEDESTRE
MOTOCICLETA
OCUPANTE
INDETERMINADO
BRASIL (*)
18,7
5,2
3,7
4,6
4,3
SUDESTE (*)
16,9
5,2
2,9
4,4
3,7
(*) Em milhares.
(Fonte: Jornal Hoje em Dia, Belo Horizonte, 07.11.08, p.23).
Com medo da violência urbana e não confiando nas instituições do poder público
encarregadas na implementação e execução das políticas de segurança, percebe-se uma evidente
diminuição da coesão social, o que implica, entre outros problemas, na diminuição do acesso dos
cidadãos aos espaços públicos; na criminalização da pobreza (à medida que setores da opinião
publica estigmatizam os moradores dos aglomerados urbanos das grandes cidades como os
responsáveis pela criminalidade e violência); na desconfiança generalizada entre as pessoas,
corroendo laços de reciprocidade e solidariedade social; na ampliação de um mercado paralelo de
segurança privada, dentre outros dilemas sociais.
Várias pesquisas têm demonstrado que o recrudescimento da violência e da criminalidade no
Brasil tomou contornos perigosos, com repercussões das mais diversas na sociedade. ―A violência
tem se tornado um flagelo para toda a sociedade, difundindo sofrimento, generalizando o medo e
produzindo danos profundos na economia‖ (Soares, 2004, p. 130).
Uma das conseqüências dessas rápidas transformações é que as agências encarregadas pela
aplicação da lei (especialmente o sistema de justiça criminal) não se prepararam para trabalhar essas
mudanças com relação à violência e especificamente com o recrudescimento da criminalidade,
principalmente aqueles crimes ligados ao tráfico de drogas, deixando a população entregue a
própria sorte. Com este quadro de insegurança vivido pela população, as pessoas e instituições
foram obrigadas a tomarem medidas de proteção individuais como construção de muros altos nas
residências, instalação de câmeras de vídeo, de detectores de metal e a contratação de segurança
particular na ilusão de estarem se prevenindo da violência. Os cidadãos trouxeram para o âmbito
privado um problema notadamente público.
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2. UM OLHAR RETROSPECTIVO
Três problemas podem ser apontados como variáveis importantes na relação entre
criminalidade, segregação socioespacial e a concentração dos crimes nas regiões metropolitanas: (a)
as deficiências do sistema de justiça criminal brasileiro; (b) o adensamento populacional das
metrópoles num curto espaço temporal; (c) o exponencial aumento do tráfico de drogas.
É preciso considerar, ainda, que o sistema de justiça criminal brasileiro (judiciário, polícias,
sistema prisional) foi montado dentro de uma perspectiva punitiva e liberal que, historicamente, age
de forma autoritária, privilegiando o patrimônio das elites sociais e econômicas, criminalizando a
pobreza, limitando o acesso à Justiça de forma seletiva e excludente.
A sociedade brasileira é, historicamente, uma sociedade impotente, cimentada com uma cidadania
precária e de superfície. Sociologicamente, é nesses cenários que a violência se difunde. Não devemos
esquecer que esta sociedade foi edificada sobre a desigualdade profunda das três escravidões que
tivemos: a escravidão indígena, oficialmente extinta em meados do século 18; a escravidão negra,
oficialmente extinta em 1888; e a escravidão por dívida, ou peonagem, que nasceu e proliferou em
conexão com o fim da escravidão negra e que se arrasta até hoje (temos cerca de 20 mil escravos
reconhecidos). As escravidões, no nosso caso, foram possíveis unicamente através da violência física,
por meio da qual os cativos eram e são subjugados. A sociedade brasileira se dividiu historicamente
entre os que batiam e os que apanhavam. Na escravidão que ainda persiste tem havido casos
comprovados de coação física por meio da chibata, da tortura, da humilhação física e até da morte
exemplar para aterrorizar os demais trabalhadores. A violência no Brasil não é endêmica, é estrutural,
constitutiva. Não é uma doença. É uma anomalia histórica. Mesmo brasileiros que acham que não têm
nada com isso usam cotidianamente um vocabulário no trato pessoal que vem da cultura da violência e
do passado. Os mecanismos sociais que requerem elos sociais violentos sobrevivem do passado e se
atualizam. Todos, sem exceção, foram educados nessa cultura de minimização física do outro. Nossa
mentalidade nacional e nossa identidade estão impregnadas de violência. (Martins, 2007).
Entre as décadas de 1950 a 1980, houve uma radical inversão na estrutura social brasileira:
em 1950, 80% da população estava no campo e 20% nas cidades. Hoje, os indicadores apontam o
contrário. Em 1970 éramos ―90 milhões em ação‖. Hoje, somos 190 milhões de brasileiros. Esse
exponencial aumento da população, somado ao inchaço das cidades, principalmente das regiões
metropolitanas, causou uma evidente saturação da coesão social nos grandes centros urbanos,
facilmente visível quando observamos, por exemplo, a frágil estrutura do estado na execução das
políticas públicas e sociais nas periferias das metrópoles.
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A análise do espaço urbano, principalmente das grandes cidades, para Gomes (2005), requer
imediata consideração da questão da criminalidade, na medida em que o aumento desta se refletiu
na configuração espacial, transformando consideravelmente a paisagem urbana.
De acordo com Maricato (2000), um dos indicadores mais expressivos da piora nas
condições de vida urbana é o aumento da criminalidade a patamares antes nunca vividos no Brasil.
Ramão, referindo-se a Souza (2004), aponta que
as condições de conquista de uma maior autonomia individual e coletiva, pré-requisitos para um
desenvolvimento socioespacial autêntico, têm sido minadas pela violência, pelo crescente sentimento
de insegurança e por aquilo que é o vetor resultante disso tudo, que é a deterioração do clima social no
cotidiano, com a disseminação da desconfiança, do medo e de agressividade. As grandes disparidades
sociais e espaciais (concentração de renda, segregação e auto-segregação) ajudam a formar o caldo de
cultura da criminalidade urbana violenta, ainda que não a expliquem de modo simples e linear. A
associação entre exclusão e criminalidade com o processo de urbanização demonstram que esta gera a
impessoalidade das relações urbanas (Ramão, 2010, p. 211).
Em relação ao tráfico de drogas, ainda responsável por significativa vitimização nas grandes
cidades brasileiras, Zaluar (2007) resume bem o que aconteceu no Brasil, nos últimos anos:
A demanda por drogas seria decorrente de mudanças nos estilos de vida, que, por sua vez, teriam
modificado o "consumo de estilo", que é muito mais caro do que o consumo familiar, ou seja, as
despesas familiares relacionadas aos modelos seguros das famílias de trabalhadores e de classe média
(Sassen, 1991). O comércio de drogas pode ser considerado o setor ilegal da distribuição de bens e
serviços do que se denominou "consumo maciço de estilo". Isso favoreceu igualmente o aumento
impressionante verificado em certos crimes contra a propriedade (furtos e roubos) e contra a vida
(agressões e homicídios) (UNDCP, 1997). (...) De fato, uma revolução nos modelos de consumo
também chegou ao Brasil. Uma pletora de bens de consumo, estilos de consumo sempre renovados e
imensos centros de lazer e de consumo foi a principal mudança visível. Os valores culturais
acompanharam tais mudanças nas formações subjetivas: valores individualistas e mercantis selvagens
se disseminaram durante os anos 1970 e 1980, traduzidos pelas expressões corriqueiras "fazer
dinheiro fácil" e "tirar vantagem de tudo". Ou seja, a sociedade brasileira, pode-se dizer, foi
colonizada pelo mercado que passou a carecer dos limites morais usualmente fornecidos pelo social.
Como uma atividade ilegal e invisível, que favorece isso, o comércio de drogas faz parte desse novo
ambiente social, econômico e cultural. (...) As conseqüências do florescimento de tais negócios ilegais
no Brasil, assim como os estilos que aqui adquiriram não são explicados apenas pelas modificações
havidas no consumo nem pela pobreza. Visto que as desigualdades nos planos social, econômico e
institucional continuam, essas novas formas mundiais de atividades econômicas ilegais e violentas não
podem ser consideradas estratégias de sobrevivência para os jovens que morrem antes de ter 25 anos.
Os efeitos combinados da pobreza e da urbanização acelerada, sem que houvesse um
desenvolvimento econômico necessário para oferecer emprego urbano aos migrantes e aos
trabalhadores pobres, não são suficientes para compreender os conflitos armados que matam homens
jovens (p.34 – 35 – grifo nosso).
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3. AS METRÓPOLES E SUAS REGIÕES METROPOLITANAS
Uma pesquisa5, elaborada pelo Centro de Estudos de Criminalidade e Segurança Pública da
UFMG (CRISP), com dados do SIM, do Ministério da Saúde, focaliza o crescimento das taxas de
homicídios em todo o Brasil, entre os anos de 1993 e 2002.6
Dos 5.505 municípios brasileiros pesquisados, em 294 municípios, a taxa de homicídios era
muito alta, variando entre 32,42 a 107,48 homicídios para cada grupo de 100 mil habitantes. Em
918 municípios, a referida taxa era considerada médio-alta, variando entre 15,94 a 32,42 homicídios
por 100 mil habitantes. Em 1910 municípios a variação da taxa situava-se entre 8,02 e 15,95
homicídios para 100 mil habitantes, podendo ser considerada médio-baixa. E em 2.383 municípios a
taxa era baixa, situando-se na faixa entre 0,42 a 8,02 homicídios por 100 mil habitantes. Portanto,
numa primeira análise é óbvia a constatação de que as grandes taxas de homicídios concentravamse em somente 5,3% dos municípios brasileiros (aqui estão incluídas as regiões metropolitanas e as
grandes cidades brasileiras que concentram a maioria da população).
Outro estudo, da Secretaria Nacional de Segurança Pública do Ministério da Justiça
(SENASP), divulgado no final de 2004, analisa a ocorrência dos homicídios, entre 1998 e 2002,
também utilizando os dados do SIM/Ministério da Saúde7. O relatório parte do princípio de que a
―dinâmica itinerante da criminalidade impõe o desafio de que os governos devem desenvolver
políticas de segurança pública que não selecionem o seu público alvo em função dos limites
geográficos impostos pelas áreas de municípios ou estados, dado que diversos fatores determinantes
dos eventos criminais são dispersos e itinerantes, ultrapassando as fronteiras estabelecidas pelos
limites legais entre as unidades geográficas‖. Deste modo, os técnicos da SENASP optaram em ter
como público-alvo das políticas de segurança pública as regiões metropolitanas, para a confecção
do trabalho.
O relatório procurava investigar e estabelecer as relações existentes nas regiões
metropolitanas entre o perfil dos eventos criminais e suas características urbanas e populacionais.
5
Trata-se do ―Projeto Homicídios Brasil‖. Outras informações podem ser obtidas no site: <http://www.crisp.ufmg.br> .
O programa utilizado para os cálculos nessa pesquisa foi o MapInfo, através do algoritmo de Quebra Natural, descrito
por Jenks e Caspall, em seu artigo ―Erros em Mapas Coropléticos: Definição, Medida, Redução‖, dos Anais dos
Geógrafos Americanos, Junho, 1971. Agradeço a colaboração do estatístico da UFOP, Ricardo Tavares.
7
Mais informações sobre a pesquisa da SENASP podem ser obtidas no site <www.mj.gov.br>.
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7
Considerava a segurança pública como um fenômeno social e, portanto, relacionada com outros
fenômenos sociais como a educação, a saúde, a infra-estrutura urbana etc.
Os pesquisadores da SENASP perceberam, na elaboração do trabalho, que é fundamental
para o planejamento de uma política de segurança pública, no Brasil, ―a elaboração de um
diagnóstico que busque analisar os padrões da incidência dos homicídios entre as regiões
metropolitanas brasileiras, enfatizando a relação entre estes padrões e as características
populacionais e urbanas destas regiões‖. 8
Nas Regiões Metropolitanas analisadas, observou-se um número aproximado de
30.000 vítimas anuais de homicídio entre 1998 e 2002, sendo que 21 mil dessas vítimas foram
mortas por armas de fogo. Um aumento, no período, da ordem de 28,4%.
Apesar de indicadores recentes apresentarem uma tendência de queda dos homicídios nas
regiões metropolitanas, as taxas (de homicídios) nessas regiões são elevadíssimas9, conforme
gráfico a seguir:
(Fonte:
Mapa
da
Violência
2010.
Disponível
www.institutosangari.org.br/mapadaviolencia/MapaViolencia2010.pdf)
em:
8
―O que surge de novo no panorama da violência brasileira é que está ocorrendo um processo, uma disseminação dos
homicídios para outros municípios das regiões metropolitanas e do interior dos Estados que, na maioria das vezes, está
associado ao tráfico de drogas e outras mercadorias ilícitas, mas também se faz presente em áreas de ocupação e
desenvolvimento recente.‖ (SOUZA, Edinilsa Ramos de; LIMA, Maria Luiza Carvalho de, p. 1220).
9
Se considerarmos que baixas taxas de homicídio devem ser inferiores a 10 assassinatos por 100 mil habitantes
(conforme indicativos, por exemplo, da ONU), nenhuma das dez regiões metropolitanas acima estaria nessa
classificação. A título de ilustração, de acordo com o FBI’s Uniform Crime Reporting (UCR) Program, em 2007 houve
14.831 homicídios nos Estados Unidos – cerca de 5 mortes a cada 100 mil habitantes. Em 2008, foram 14.180, caindo
para 4,7 mortes a cada 100 mil habitantes.
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8
Analisando os problemas das metrópoles brasileiras, Ribeiro (2004) nos alerta que,
(as metrópoles) estão concentrando hoje a questão social, cujo aspecto mais evidente e dramático é a
exacerbação da violência. Há dez anos, a violência nas periferias era outra. Havia cerca de 30
homicídios por 100 mil habitantes. Hoje, nas áreas mais violentas, o número de homicídios já atinge
índices similares aos verificados em países em guerra. O aumento da violência nas metrópoles guarda
fortes relações com o processo de segmentação sócio-territorial em curso – que separam as classes e
os grupos sociais em espaços da abundância e da integração e em espaços da concentração da
população vivendo múltiplas situações de exclusão social – e acaba por constituir-se hoje em
desvantagens locacionais de algumas metrópoles, ao produzir condições econômicas e institucionais
que bloqueiam sua capacidade produtiva, com impactos no emprego e na renda. Estima-se, por
exemplo, que a violência gera um custo anual de 13,4 bilhões de reais nas cidades do Rio de Janeiro,
São Paulo e Belo Horizonte, o que representa aproximadamente 6% do PIB dos respectivos estados
(p. 9-10).
Ao destacar o adensamento populacional das metrópoles brasileiras estamos simplificando
um problema que parece ser comum nos grandes centros urbanos de países em desenvolvimento.
Segundo reportagem da Revista Época10, ―as cidades não param de crescer – e as que mais crescem
são as do Terceiro Mundo. De acordo com projeções da agência Habitat, órgão da ONU que estuda
as questões de habitação, das dez maiores metrópoles do mundo em 2010, apenas duas – Tóquio e
Nova York – estão situadas em países desenvolvidos. (...) Em todo o planeta, aproximadamente um
bilhão de pessoas vivem hoje em barracos sem água potável e saneamento básico nos subúrbios das
grandes cidades – desse total, cerca de 200 milhões tornaram-se favelados há menos de dez anos.
Em 2030, serão dois bilhões de pessoas vivendo em bolsões de pobreza‖.
Ribeiro (2006) aponta as metrópoles brasileiras como o locus da exacerbação da violência,
destacando que ―a média da taxa de vítimas de homicídio por 100 mil habitantes entre as regiões
metropolitanas, entre 1998 e 2002, foi de 46,7 vítimas por 100 mil habitantes. Esse valor está bem
acima da média da taxa nacional de vítimas de homicídio, que nesse mesmo período que foi de 28,6
vítimas por 100 mil habitantes‖ (p. 223). Para este autor, que corrobora com outros estudos
realizados sobre as variáveis que podem determinar a desordem social causadora dos problemas
sociais e criminais nas Regiões Metropolitanas, deve-se levar em conta ainda
(...) fatores de desordem social relacionados ao crescimento urbano acelerado na ausência da expansão
dos serviços sociais, pobreza, falta de controle social e anonimato, desigualdade, ausência de
oportunidades para a juventude etc. (Cano; Santos, 2001). Para outros autores trata-se da conseqüência
da crise do padrão integrativo construído historicamente na sociedade brasileira, baseado no par
hierarquia–favor, sem a reposição de outro fundado no avanço dos valores individualistas e no
10
Revista Época, nº 339, de 15 de novembro de 2004, páginas 62 - 63.
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9
contrato social. Nas grandes metrópoles a crise integrativa tem contundentes impactos corrosivos nas
relações de reciprocidade entre os grupos e classes sociais em razão do modelo de segregação
residencial explicitar de maneira intensa as enormes desigualdades sociais (Velho, 1996). (p. 224)
Enquanto a criminalidade violenta, principalmente aquela associada ao incremento do
tráfico de drogas nas favelas das grandes cidades, não atingiu os segmentos médios e abastados, o
problema não repercutia na agenda pública das prioridades governamentais. Na segunda metade da
década de 1990, com o transbordamento dos homicídios das áreas periféricas atingindo outros
estratos sociais, segmentos mais abastados da sociedade brasileira começaram a vocalizar por
melhoria nas condições objetivas da segurança, possibilitando uma maior inserção da temática da
segurança pública na agenda política.
Beato, Silva e Tavares (2008) apontam que o crescimento dos crimes nas grandes cidades
tem sido obstáculo para o desenvolvimento dessas regiões:
As cifras relativas à criminalidade e à violência nos grandes centros urbanos apontam para a
emergência de crimes predatórios. Não obstante o fenômeno do "crime organizado", o que parece
estar ocorrendo é o crescimento do crime desorganizado, manifesto nas mais variadas expressões da
violência urbana. Esse fenômeno é o pano de fundo da concentração dos crimes violentos nas grandes
regiões metropolitanas do país: apenas as regiões metropolitanas de São Paulo e do Rio de Janeiro
concentram 40% dos homicídios no Brasil, embora tenham 18% da população (IBGE, 2004; DataSus,
2007). Inseparável desse fenômeno está o contexto urbano no qual os crimes ocorrem e que, em boa
medida, é responsável por esse crescimento. Cerca de 20% das mortes violentas acontecem em menos
de 2% da área geográfica dos centros urbanos (Crisp, 2000). Nesse sentido, a violência tem se tornado
um dos principais obstáculos ao planejamento e ao desenvolvimento dos grandes centros. (p. 687-688)
Estudo recente produzido pela Confederação Nacional dos Municípios11, publicado em julho
de 2010, aponta que a concentração de altas de taxas de crimes em grandes centros urbanos está
começando a seguir uma dinâmica diferenciada, a qual alguns autores caracterizam como
interiorização da violência.
Segundo esta fonte, em 1999, 69% das mortes violentas do país ocorreram em regiões
metropolitanas. Seguindo uma regressão anual, em 2008, esses grandes centros registraram 57% das
mortes (12% a menos). Segundo algumas pesquisas, este fenômeno está ocorrendo, principalmente,
devido ao percurso do tráfico de drogas em municípios do interior de vários Estados brasileiros,
sendo alguns produtores e outros corredores para o seu transporte.
11
Pode ser acessado no endereço: http://portal.cnm.org.br/sites/5700/5770/16072010_Estudo_Armas_de_Fogo.pdf .
Acessado em 20/07/10.
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Não obstante, em 2008, 57% dos homicídios estariam concentrados nas regiões
metropolitanas brasileiras, sendo que utilização de armas de fogo para o cometimento desses
crimes, nessas regiões, teria aumentado.
Enquanto a proporção de homicídios praticados em regiões metropolitanas vem caindo, a proporção
de uso de armas nos crimes que ocorrem nesses espaços está aumentando a cada ano. Além disso, se
compararmos o percentual de crimes praticados com armas no Brasil com o percentual de uso das
regiões metropolitanas, vemos que as armas são muito mais usadas nesse segundo tipo de espaço
social. A comparação mostra que nessas regiões de maiores aglomerações o uso de armas sempre foi
mais intenso. Enquanto no Brasil 72% dos homicídios praticados em 2007 foram com o uso de armas
de fogo, nas regiões metropolitanas esse percentual sobe para 79%. Esses números mostram
claramente a presença mais incisiva do tráfico de armas ilegais nessas regiões. (Confederação
Nacional
dos
Municípios.
Relatório
disponível
em:
http://portal.cnm.org.br/sites/5700/5770/16072010_Estudo_Armas_de_Fogo.pdf ).
Registre-se, porém, que a criminalidade violenta, ainda concentrada nas regiões
metropolitanas brasileiras, não se encontra espraiada uniformemente em todas as áreas urbanas das
metrópoles. Há uma evidente concentração espacial. Alguns crimes, principalmente os homicídios,
tendem a se agrupar em poucas áreas, sobretudo nos aglomerados urbanos, locais de alta segregação
socioespacial e exclusão social.
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Mapa 1 – Concentração de Homicídios em Belo Horizonte (Período: 1998 a 2001)
Fonte: Crisp/DCCV – Polícia Civil (2004)
O exemplo acima, da cidade de Belo Horizonte12, ilustra bem essa concentração. Nas favelas, há uma
série de indicadores sociais ruins: o acabamento das residências, o número médio de anos de estudo, a taxa
de ocupação no mercado de trabalho, entre outros, são inferiores ao da média das outras regiões das
respectivas cidades. (Beato e Souza, 2003, p. 57).
Aqui, vale introduzir o conceito de segregação socioespacial, que investiga a relação entre as
posições que os agrupamentos humanos ocupam no espaço social e sua localização no espaço físico
das cidades. O conceito articula os estudos sobre desigualdades socioeconômicas e sua relação com
12
―A evolução dos homicídios na cidade de Belo Horizonte e principais aglomerados urbanos para o período de 1998 a
2002 apresentou um crescimento de 67% no número de ocorrências neste período, passando de 494 homicídios em
1998 para 825 mortes em 2002. O crescimento percentual nas favelas, para o mesmo período foi de mais de 80%. Os
anos de 1998 a 2002, 19,7% destas mortes ocorreram em apenas seis aglomerados urbanos, confirmando a alta
concentração de crimes em poucas áreas da cidade‖ (CRISP, 2004).
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a distribuição das pessoas no espaço urbano. Os estudos sobre segregação socioespacial têm
apontado as desigualdades como fator que diminui as oportunidades de mobilidade social, acesso ao
emprego, estreitamento dos horizontes de oportunidades para os pobres e o aumento da violência
urbana. Portanto, o estudo do tema é de grande utilidade para o planejamento e implementação de
políticas públicas que atuariam na distribuição de renda, no provimento de moradias populares em
diferentes áreas das cidades, com políticas focalizadas para os grupos mais vulneráveis que, por
exemplo, legalizem os espaços urbanos das favelas com melhorias de infraestrutura e provimento de
equipamentos públicos, entre outras ações.
4. ANALISANDO ALGUMAS RESPOSTAS DO PODER PÚBLICO
Para enfrentar o problema da criminalidade violenta, concentrada nas regiões
metropolitanas, alguns governos estaduais (São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, por exemplo)
têm investido, nos últimos anos, em políticas que: (1) privilegiam o aperfeiçoamento da gestão da
segurança pública e (2) políticas de caráter mais estrutural, que atuam tanto na dimensão da
segregação socioespacial, como a melhoria da infraestrutura urbana, como em ações nas áreas da
educação, saúde, assistência social, focalizadas nas regiões segregadas das metrópoles.
Especificamente em relação às políticas de segurança pública o foco tem sido nos
investimentos em políticas de aprimoramento, transparência e controle das agências do sistema de
justiça criminal visando extirpar dessas organizações os focos coniventes com o crime organizado,
restabelecendo a credibilidade de seus agentes e possibilitando a participação da sociedade como
parceira na resolução de seus dilemas. Por outro, ainda há pouco investimento na implementação de
mecanismos participativos e de auto-gestão de resolução de conflitos e a implantação de programas
de prevenção à criminalidade, possibilitando aos cidadãos ações pacíficas e democráticas e
promovendo a reconstrução de vínculos sociais que a exclusão social e econômica estão,
gradualmente, deteriorando.
É desejável que as várias agências encarregadas na prevenção e no combate ao crime se
articulem: planejamento, execução e avaliação das ações de forma conjunta potencializam o poder
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do Estado. Diferentemente, as disputas políticas só servem para enfraquecer o poder do Estado no
combate ao crime.13
A participação de todos no enfrentamento dos dilemas da segurança pública é crucial.
Afinal,
o poder público tem a sua imensa parcela de responsabilidade pela degradação da situação social que
redunda em cotidianização da violência. Mas a sociedade tem também uma responsabilidade imensa.
As entidades sociais, as devotadas ao tema dos direitos humanos, as igrejas também têm grande
responsabilidade, sobretudo porque ficaram cegas em busca de responsáveis e culpados e nada
fizeram para saber quais são as causas, conjunturais e estruturais da violência. É no plano das causas
que a violência deve ser combatida e não no plano das acusações inquisitoriais. (Martins, 2007).
Pensando em políticas estruturais, que interfiram nas dinâmicas da criminalidade associadas
à segregação e exclusão social, segundo Torres e outros (2003, p. 21) ―é muito importante entender
que, se a segregação pode ser gerada por ações governamentais, também é verdade que o Estado
tem condições de mitigar esse efeito, criando políticas públicas de integração social e espacial.‖
Estes autores apresentam dois grupos de ações governamentais que podem se constituir como
estratégias de intervenção sobre o espaço urbano. São elas:
(a) políticas governamentais relativas ao espaço construído (regulação urbana, investimento
em infraestrutura urbana nas partes da cidade habitadas pelos pobres). Essas políticas podem
incentivar processos de mobilidade espacial que operam na direção oposta dos padrões de segregação,
misturando as pessoas; também podem dirigir as futuras ações governamentais para determinadas
regiões da cidade que são consideradas prioridades sociais, melhorando as condições das periferias,
favelas e cortiços e, assim, reduzindo a diferença entre os grupos sociais (Fernandes, 1998; apud
Torres e outros, 2003, p. 21).
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Em recente artigo publicado no Jornal do Brasil (15/07/2010, p. A 12), o cientista político Gláucio Soares aponta a
queda dos homicídios em quatro estados: São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro e Pernambuco. ―Em quase todo o
Brasil, particularmente no Sudeste e, dentro dele, em São Paulo e Minas Gerais, 2003 é o ponto de inflexão, de
mudança radial na tendência altista que caracterizava a violência homicida no Brasil‖. Dois fatores são apontados como
responsáveis pela tendência de queda: o estatuto do desarmamento (―os estados cujas polícias o usaram bem reduziram
as mortes‖) e a adoção de ―políticas inteligentes‖ de segurança pública nesses estados. Ao contrário, em estados que não
adotaram tais estratégias, ―vemos que se caracterizam por baixos níveis de cultura política e de cultura cívica (...)
marcados por uma política tradicional‖. Esse tradicionalismo, ―afeta as questões de segurança, começando pela
nomeação de delegados, feitas com critérios políticos, e do próprio secretário de Segurança Pública‖. Porém, mesmo
com uma tendência de queda, as taxas de homicídios nas capitais desses estados e nas suas regiões metropolitanas são
muito altas: algumas superiores a 30 homicídios por 100 mil habitantes, como em Belo Horizonte (2008). A exceção é
São Paulo, que tem uma taxa pouco superior a 10 assassinatos por 100 mil (2008).
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(b) políticas sociais ―espacialmente organizadas‖- incluem um conjunto de políticas públicas
(educação, saúde, assistência social, esportes, cultura e lazer), ―criando e transformando o espaço
social, pois a localização de seus equipamentos (e suas diferentes características de inserções no
espaço) definem as condições de acesso dos vários grupos sociais que habitam na cidade‖ (Torres e
outros, 2003, p. 22).
Kaztman (2001), num estudo sobre recentes transformações na estrutura social de países
latinoamericanos, aponta para a questão do isolamento social dos pobres urbanos. Para este autor, o
resultado dessas transformações
debilitam os vínculos dos pobres urbanos com o mercado de trabalho e se estreitam os âmbitos de
sociabilidade informal com pessoas de outras classes sociais, o que conduziria a seu progressivo
isolamento (Kaztman, 2001, p. 171, tradução nossa).
Este autor afirma que ―a pobreza urbana socialmente isolada se constitui no caso
paradigmático da exclusão social‖. Há um tripé que propicia o isolamento social dos pobres
urbanos: segregação residencial, do trabalho e educacional. A exclusão dos pobres fica patente na
segmentação do trabalho (precarização do emprego); segmentação educativa: ―se os ricos vão aos
colégios dos ricos, se a classe média vai aos colégios da classe média e os pobres aos colégios dos
pobres, parece claro que o sistema educativo pouco pode fazer para promover a integração social e
evitar a marginalidade, pese os seus esforços para melhorar as oportunidades educativas dos que
têm menos recursos‖ (p. 177). Ademais, ―crer unicamente que os méritos vão ajudar a mobilidade
social é um ficção que só se cumpre em situações extraordinárias‖ (p. 177). Há, ainda, a segregação
residencial ―que se refere ao processo pelo qual a população das cidades vão se localizando em
espaços de composição homogênea‖, com verificável ―concentração dos pobres em determinados
bairros das cidades‖ (p. 178).
Assim, o Estado tem o poder de intervir no espaço urbano com obras públicas como
investimentos na construção e melhoria das habitações populares o que poderia atuar fortemente
sobre a formação de guetos urbanos (tanto os condomínios que segregam os ricos, quanto as
favelas, que segregam e marginalizam os pobres).
O Estado também pode incentivar ou não incentivar a universalidade no uso de serviços básicos como
o transporte, a segurança pública, a saúde e a educação, fazendo maiores ou menores esforços para
manter sua qualidade e deixando mais ou menos liberado ao jogo da oferta e da demanda a
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possibilidade de adquirir esses serviços no mercado, opções que têm óbvias implicações sobre a
probabilidade de deserção das classes médias e altas do âmbito público (Kaztman, 2001, p. 183).
Este autor apresenta como conclusão de suas investigações um rol de experiências bem
sucedidas que podem intervir na tendência segregacionista das grandes cidades. São iniciativas de
integração social, desenhadas para este fim com elaboração de políticas públicas setoriais que
afetam as medidas do ordenamento urbano, a seleção de beneficiários de conjuntos habitacionais
subsidiados, a defesa da qualidade dos serviços públicos e a promoção de espaços que estimulem os
contatos informais entre as classes. Seu exame minucioso permitirá selecionar aquelas que melhor se
ajustem aos recursos e as características singulares de cada sociedade (Kaztman, 2001, p. 188).
Assim, fica claro que os investimentos das políticas públicos voltados para o enfrentamento
da questão da violência associada à segregação socioespacial nas regiões metropolitanas brasileiras
deveria considerar um rol de ações (projetos e programas) que enfrentem os dilemas da exclusão
socioespacial dos pobres, atentando, também, para o aperfeiçoamento das agências do sistema da
justiça criminal. Ou seja, políticas públicas de segurança e políticas sociais conjugadas com
intervenções nos espaços urbanos segregados das grandes metrópoles.
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