1 VII SEMEAD TRABALHO CIENTÍFICO MARKETING FIDELIZAÇÃO E VALOR: UMA INTERDEPENDÊNCIA INEQUÍVOCA AUTORES: BRAULIO ALEXANDRE CONTENTO DE OLIVEIRA Doutorando em Administração na FEA/USP. E-mail: [email protected] GERALDO LUCIANO TOLEDO Professor Titular do Departamento de Administração da FEA/USP. E-mail: [email protected] ANA AKEMI IKEDA Professora Livre-docente do Departamento de Administração da FEA/USP. E-mail: [email protected] RESUMO Em vista da competição acirrada, a alternativa que se coloca às empresas para o seu crescimento e desenvolvimento é o estabelecimento de relacionamentos de longo prazo com os seus clientes. Assim, a fidelização passa a ser uma condição sine qua non às empresas que pretendem sobreviver ao longo do tempo. Este ensaio, de caráter teórico, busca elucidar a importância da fidelização no atual contexto competitivo, e da organização de ofertas “de valor” como meio para que ela possa ser efetivada, em vista de ser esta a variável capaz de gerar satisfação aos clientes. Observa-se a existência de uma interdependência teórica entre os conceitos de “fidelização” e “valor”, o que indica caminhos a serem percorridos pelas empresa. São limitações do presente trabalho, que se colocam como sugestões para outros que abordem o seu tema, a ausência de pesquisa de campo que evidencie a aplicabilidade dos diversos modelos expostos. PALAVRAS-CHAVE: MARKETING; FIDELIZAÇÃO; VALOR 2 FIDELIZAÇÃO E VALOR: UMA INTERDEPENDÊNCIA INEQUÍVOCA Introdução e Objetivo Em mercados concorridos o relacionamento entre uma empresa e os seus clientes pode ser interpretado como a base para a melhoria do potencial competitivo dela. Essa assertiva decorre da própria conceituação de marketing, que ressalta que o alcance dos objetivos de uma organização subordina-se à satisfação proporcionada aos clientes, uma vez que o relacionamento pode deturpar-se quando eles se sentem insatisfeitos com ela. Kotler (1998, p. 27) concebe marketing a partir de uma perspectiva genérica, considerando-o um processo social e gerencial, mediante o qual as pessoas obtêm aquilo de que necessitam e o que desejam por meio da criação, oferta e troca de valor. Assim sendo, o papel do marketing vincula-se à criação de valor para o cliente. Também Churchill & Peter (2000, p. 10) consideram o marketing direcionado para o valor ao cliente "uma orientação para se alcançarem objetivos”. Desta forma, pode-se supor que o processo de criação de fidelidade do cliente se dá por intermédio da entrega contínua de valor para ele, pois, assim, tende a aumentar seu nível de satisfação. Este ensaio tem por objetivo apresentar uma discussão acerca da fidelização do cliente a partir da sua satisfação por meio da entrega de valor, com vistas à construção de um relacionamento duradouro, que possibilite à empresa obter benefícios no longo prazo. 2 – Fidelização Fidelidade em marketing significa um sentimento de afinidade em relação a produtos e marcas de uma empresa, que vai além da simples repetição de compra, embora este seja um indicador comumente utilizado como forma de se auferir a satisfação dos clientes - o qual, todavia, desconsidera fatores como conveniência, inércia e o grau de competitividade ou de concentração de um determinado mercado (Day, 1999, p. 146-147). Segundo Vavra (1992, p. 28), a conquista de novos clientes torna-se cada vez mais difícil em razão dos altos custos de "mídia" e da acirrada concorrência nos mais diversos mercados. Desta forma, embora a obtenção da fidelidade do cliente seja um processo oneroso e extenso, seus benefícios podem ser bastante duradouros, e se refletir na atração de novos clientes, pois eles passam a interagir com a empresa em forma de parceria, defendendo-a e proporcionando, além de resultados financeiros diretos, informações valiosas que, se bem trabalhadas, viabilizam a criação de importantes diferenciais em relação à concorrência. A Figura 2 ilustra a evolução do comportamento do cliente em relação à empresa, desde a situação de baixo comprometimento até o ponto em que desenvolve fidelidade (Day, 1999, p. 147). 3 Disposição de defender produtos e recomendar sua compra Intenção de repetir a compra Disposição de aguardar a resposta da empresa, quando os concorrentes lançam produtos superiores Resistência a opiniões adversas de especialistas Disposição de pagar um preço premium Baixo comprometimento Fidelidade Figura 2 - Comportamento do cliente, do baixo comprometimento à fidelidade FONTE: Adaptado de Day (1999, p. 147). Como forma de contribuir para a criação de fidelidade, organizações criam programas de ações específicos. Um dos principais objetivos dos chamados “programas de fidelização” é elevar o nível de retenção de clientes, pelo aumento das suas satisfações e do valor percebido - o que é factível de ocorrer, pois à medida que são oferecidos descontos progressivos ou benefícios adicionais aos clientes fiéis, eles se colocam como barreiras à troca de fornecedores. Faz-se importante observar que Schulz (1998, p. 11) questiona se a abordagem usual adotada (que considera fidelidade como a repetição de compra dos cliente) é adequada, pois acredita que muitos dos programas de fidelização não passam de programas promocionais isolados. Para o autor, tais programas pouco contribuem para a construção de fidelidade a longo prazo. Dois empecilhos seriam responsáveis por esta inadequação: o problema de definir o que é fidelidade e, a forma de mensurá-la. No entanto, com uma visão mais abrangente, Raider (1999, p. 14-15) entende que, enquanto os clientes percebem os programas de fidelização como uma forma de obterem descontos ou outros incentivos, os profissionais de marketing utilizam-no para coletar dados a seu respeito. O autor acredita que a maior precisão das ações de marketing, possibilitadas pelo maior conhecimento acerca dos clientes, contribui para a redução dos custos promocionais e aumenta os lucros. Para que se possam mensurar os resultados provenientes de programas de fidelização, é necessário definir objetivos e direcionar adequadamente os esforços para o seu alcance. Uma forma de se fazer isso é utilizar-se de grupos de controle, comparando-se os resultados obtidos pelo grupo exposto ao programa com aquele que não o está, buscando-se, com isso, identificar o ganho incremental (Hart, 2000, p. 44). De acordo Bolton et al. (2000, p. 95), para se verificar a eficácia de tais programas deve-se medir sua influência no comportamento de compra dos clientes e avaliar se os ganhos incrementais cobrem os investimentos necessários. No processo de mensuração dos resultados do programa, convém considerar os diversos fatores externos que podem afetá-los, como mudanças econômicas, ações da concorrência e outros. É recomendável o monitoramento do programa para que sejam feitas adaptações no mesmo, com vistas à sua otimização (Hart, 2000, p. 45). Embora diversas empresas adotem programas com o intuito de obter a fidelização do cliente, Shrake (1999, p. 14-15) relata uma pesquisa realizada pela Harte-Hanks Market Research, de New Jersey, em 1999, segundo a qual 70% dos entrevistados não percebem o benefício de se tornarem fiéis, apesar dos programas. De acordo com o gerente geral da empresa, Greg Diaz, isso pode ser decorrente da falta de estratégias adequadas que possibilitem a construção de relacionamentos duradouros. O mesmo estudo apurou, ainda, que 4 aproximadamente 20% dos entrevistados escolhem seus cartões de crédito com base em programas de recompensa de companhias aéreas e que o retorno de parte dos gastos efetuados é a vantagem preferida pela maioria dos clientes, ficando a contagem de milhas aéreas em segundo lugar. O estudo aponta, também, que a comunicação personalizada e a correspondência pessoal são significativas para a construção de fidelidade. Programas de fidelização bem concebidos e gerenciados podem proporcionar um retorno de 20% dos cliente. Para que um programa desse tipo obtenha sucesso, são necessários alguns requisitos (Building..., 1998): • O produto ofertado deve ter margem de contribuição suficiente; • As recompensas oferecidas devem estar associadas à percepção de alto valor; • A empresa patrocinadora deve ter um comprometimento de longo prazo; • programa deve ser simples. Pesquisas desenvolvidas por Bolton (2000, p. 96) revelam a existência de uma relação positiva entre o nível de satisfação dos clientes e a fidelidade em relação às empresas. Porém, os programas de fidelização causam impactos positivos no longo prazo apenas se as experiências que os clientes tiverem com as empresas forem satisfatórias. Assim sendo, é indispensável que haja envolvimento e comprometimento de todas as esferas da empresa com o programa de fidelização, pois em razão de os clientes aumentarem a duração dos relacionamentos e os níveis de uso do produto, eles ficam mais expostos à empresa patrocinadora (Bolton et al., 2000, p. 95). Um estudo realizado por (Bolton et al., 2000) com 405 usuários de cartões de crédito em três países europeus, indica que: • As decisões de recompra são baseadas nas intenções ou comportamentos anteriores de compra, tendo em vista os níveis de satisfação obtidos anteriormente em relação à empresa e suas concorrentes; • Os clientes vinculados a programas de fidelização são menos sensíveis à qualidade e aos preços praticados pela concorrência. O mesmo autor acredita que há duas abordagens possíveis acerca do impacto de programas de fidelização sobre os clientes: (a) são uma forma de "customização" em massa e reforçam a percepção de valor; e (b) encorajam clientes a demandarem cada vez mais benefícios relativos à produtos e preços. Johnson & Leger (1999, p. 36) argumentam que para que se possa obter retornos positivos com as estratégias de fidelização, elas devem incluir quatro etapas: • Selecionar clientes adequados: diz respeito a definir o público-alvo da estratégia de fidelização, por exemplo aqueles mais rentáveis à empresa, e compreender as variáveis por ele valorizadas; • Entregar valor adicional: consiste em se utilizar de informações acerca das variáveis valorizadas pelos clientes e lhes proporcionar acesso a elas de maneira diferenciada, de forma que atraia a sua participação; • Fomentar continuamente o relacionamento: consiste em buscar contato freqüente com os clientes por meio de ofertas e comunicações apropriadas, de forma que ele se sinta tutorado nas suas decisões; • Percorrer o caminho correto: consiste em avaliar e promover ajustes nas ações realizadas, de forma que o resultado seja potencializado. 5 Não obstante o uso de técnicas para a criação de fidelidade, Day (1999, p. 151) afirma que ela é criada de forma virtuosa a partir de uma série de variáveis, como se pode observar na Figura 3. Entrega de valor superior Investimento em capacidades distintivas Aumento da satisfação do cliente Demonstração de confiança Aumento da fidelidade Estreitamento do relacionamento Figura 3 - O processo de criação de fidelidade FONTE: Day (1999, p. 151). Conforme exposto, a criação de fidelização depende sobremaneira do estabelecimento de adequado e duradouro relacionamento entre a empresa e o consumidor. Assim, tem-se a construção do relacionamento como elemento precursor da fidelização, o que se dá por meio da oferta de valor, de forma que o consumidor obtenha satisfação com a relação. 5 - Valor e Satisfação 5.1 - Valor Segundo Porter (1985, p. 7-8), o valor que uma empresa consegue criar é a sua base de sustentação desde que os seus clientes o percebam e estejam dispostos a pagar por ele. O autor supõe que o ponto de partida para o crescimento sustentável de uma empresa é satisfazer seus cliente e conseguir que estes paguem pelos produtos oferecidos mais do que os custos que a empresa teve com ele. Porém, é o cliente quem decide quanto vale um determinado atributo ou benefício proporcionado por um produto, o que é determinado muitas vezes com base apenas em sua percepção. Em virtude da dificuldade de avaliar o valor de um determinado produto, mesmo após o seu uso, para inferirem o valor de uma determinada oferta, os compradores utilizam-se de alguns indicadores como propaganda, reputação da marca/empresa, embalagem, profissionalismo e aparência dos empregados da empresa, atratividade das instalações e as informações fornecidas nas apresentações de venda (Porter, 1989, p. 128). Em seu trabalho acerca do valor para o consumidor, Woodruff (1997) reforça a idéia de que a vantagem competitiva pode se dar por meio dele. Hamel & Prahalad (1995, p. 235-236) recomendam que uma empresa deve se concentrar em suas competências específicas, aquelas que realmente fazem diferença para os clientes. Juntas, elas se convertem em competências essenciais, devendo possibilitar a criação de valores perceptíveis pelos clientes. 6 Lambin (2000, p. 93) observa a necessidade de descobrir quais são os valores procurados pelos compradores e como transformá-los em produtos que satisfaçam as suas expectativas. Machado (1999, p. 81) esclarece que o valor para o cliente pode ser decomposto em dois subsistemas: • Criação: realizada pelo desenvolvimento e criação que geram expectativas prévias; • Entrega: realizada pela transferência de benefícios que sejam condizentes com as suas expectativas. De acordo com Churchill & Peter (2000, p. 10), o marketing voltado para o valor deve se apoiar em seis princípios, descritos a seguir: • Concentrar-se em atividades que criam e fornecem valor para o cliente; • Oferecer aos clientes um valor superior em relação aos concorrentes; • Mudar o ambiente competitivo para aumentar as chances de sucesso; • Utilizar equipes inter-funcionais para melhorar a eficiência e a eficácia das atividades; • Melhorar continuamente o planejamento, a implementação e o controle; • Considerar os impactos das atividades sobre os diversos públicos interessados na empresa (stakeholders). De acordo com Woodruff (1997, p. 148), as organizações devem reconhecer as barreiras existentes e enfrentá-las para que possam competir na arena da entrega de valor para o consumidor. Segundo o mesmo autor elas são de natureza cultural, procedimental e de aprendizado (Woodruff, 147-148). Segundo Kotler (1998, p. 29), valor é a estimativa da capacidade do produto de satisfazer necessidades do cliente potencial. Assim, cada produto apresenta um determinado valor, o qual é percebido pelo cliente e utilizado para ordenar as opções que possui para satisfazer uma determinada necessidade. Para o autor "o valor total para o cliente é o conjunto de benefícios esperados por determinado produto ou serviço" (Kotler, 1998, p. 51). Afirma, ainda, que os clientes são maximizadores de valor, ou seja, buscam o maior valor que lhes é possível obter, condicionados aos custos, conhecimento, mobilidade e renda. Zeithaml (1988, p. 14) afirma que valor é toda avaliação sobre a utilidade do produto, feita pelo cliente, baseada na percepção do que é recebido em relação ao que é dado. Rust, Zeithaml & Lemon (2001, p. 64-113) entendem que, o valor do cliente é definido por três outros valores, os quais podem atuar em conjunto ou isoladamente: • Valor patrimonial do valor: diz respeito à percepção do valor de utilidade de um produto, sendo avaliado pelo cliente, basicamente, em três dimensões – qualidade percebida, preço e conveniência; • Valor da marca: consiste na consciência, na atitude e na percepção de ética acerca de uma marca, pelo cliente; • Valor de retenção: consiste em programas de lealdade, de afinidade, de reconhecimento e tratamento especial proporcionado aos clientes e percebido por eles. 7 Valor Patrimonial do Valor Valor do Cliente Valor da Marca Valor de Retenção Figura 5 – Os determinantes do valor do cliente FONTE: Rust, Zeithaml & Lemon (2001, p. 64). Baseando-se numa análise do conceito de valor para o consumidor para diversos autores, Woodruff (1997, p. 141) reconhece a diversidade de significados e, considerando os pontos em comum e os pontos divergentes, formulou a seguinte conceituação: preferência percebida pelo consumidor em relação a um produto, proveniente da sua avaliação acerca dos seus atributos, da sua performance e das suas conseqüências em termos de facilitação dos seus objetivos na situação de uso. Goldstein & Toledo (2001, p. 2) afirmam que a palavra valor muitas vezes é associada à sua percepção, emergindo daí a expressão “valor percebido”, a qual é interpretada de maneiras diferentes pelos diversos autores que tratam do assunto. Também Machado (1999, p. 83-84) chama a atenção para o fato de que a fronteira entre o valor real e o valor percebido é difusa, pois o real advém da empresa, incorporado de elementos intangíveis e, o subjetivo advém do consumidor, formado pelas expectativas e o desempenho do produto. Um grande complicador do processo é o fato de que muitas vezes, a percepção que uma organização possui acerca de uma oferta destinada a um público-alvo não é consistente com a percepção que este possui da mesma, as quais Goldstein & Toledo (2001, p. 5) denominam "visão interna" e "visão externa", respectivamente. Isto se deve a uma abordagem voltada para a configuração, a sinergia e as capacidades internas da empresa, sem, muitas vezes, um conhecimento adequado prévio do público que a empresa se propõe atender. Zeithaml (1988, p. 4) confirma que esta consideração ao afirmar que “a visão dos gerentes pode ser consideravelmente diferente da visão dos consumidores ou usuários”. Woodruff (1997, p. 143) esclarece que o desenvolvimento e a entrega de valor para o consumidor é uma estratégia essencial que depende do aprendizado e discussão do conceito de valor para o consumidor. Para tanto, o autor propõe um modelo para se determinar o valor do consumidor, conforme exposto na Figura 6 (Woodruff, 1997, p. 144). 8 Quem são os consumidores relevantes para a empresa? Quais são as dimensões valorizadas por eles? O que o consumidor valorizará no futuro? Quanto a organização entrega o que o consumidor valoriza? Por que a organização entrega dessa maneira? Figura 6 – Processo de determinação do valor para o consumidor FONTE: Adaptado de Woodruff (1997, p. 144). Também Goldstein & Toledo (2001, p. 8-10) apresentam uma proposta de sistematização das atividades que a empresa deve empreender para avaliar o valor percebido, segundo a ótica do cliente, como forma de contribuir para a sua competitividade: 1. Selecionar os clientes a serem avaliados; 2. Averiguar o que os clientes selecionados valorizam; 3. Verificar o que clientes selecionados priorizam; 4. Auferir o quão bem a empresa entrega valor para seus clientes; 5. Analisar os resultados obtidos; 6. Propor soluções para melhorar o valor entregue; 7. Implementação e acompanhamento de ações e monitoramento do mercado. Com base nas considerações supra-apresentadas acerca do valor, conclui-se que ele é o complexo que desencadeia a possibilidade de satisfação e, conseqüentemente, de fidelização, sendo imperativo que as organizações o conheçam profundamente. 5.2 – Satisfação A satisfação do cliente está no âmago do processo de marketing, obrigando as empresas a medi-la sistematicamente (Lambin, 2000, p. 216). Vavra (1992, p. 28) lembra que os clientes insatisfeitos apresentam um alto poder destrutivo, pois, segundo estimativas por ele citadas, transmitem sua insatisfação a cerca de outros nove clientes potenciais. O autor acredita, ainda, que cerca de 90% dos clientes insatisfeitos não realizam reclamações, mas passam a consumir de outras empresas. Lambin (2000, p. 217) apresenta os seguintes dados provenientes de estudos concernentes ao comportamento de clientes insatisfeitos: 9 • • • Apenas 3% das transações dão origem a reclamações; Cerca de 15% das transações ocorrem por via indireta (amigos, vizinhos e vendedores das empresas); Embora 30% das transações proporcionam problemas aos clientes, elas não são comunicadas às empresas. Observa-se, assim, que, apesar de 48% das transações estudadas proporcionarem algum tipo de insatisfação, a maioria não é comunicada formalmente às respectivas organizações. O estabelecimento de relacionamento duradouro depende da entrega de valor ao cliente, de forma que ele sinta-se satisfeito, criando-se um círculo virtuoso, conforme exposto na Figura 7 (Machado, 1999, p. 67). Entrega de Valor Relacionamento Satisfação Figura 7 – Círculo virtuoso do relacionamento FONTE: Representação figurativa proposta pelos autores. Embora Schulz (1998, p. 11) afirme que o fato de o cliente estar satisfeito não implica necessariamente existência de fidelidade, necessariamente, pode-se acreditar que à medida que o valor percebido pelo cliente condiz com as suas próprias expectativas acerca de um determinado produto e, o mesmo ficou satisfeito, a probabilidade dele voltar a adquirir o mesmo produto aumenta, pois, desde que o mercado não tenha característica de monopólio, quando insatisfeito, o cliente adquirirá outra oferta para satisfazer uma necessidade ou desejo não supridos adequadamente e, assim o fará, até que suas expectativas sejam atendidas, conforme ilustrado na Figura 8. 10 Satisfação Atende expectativas Aquisição do bem Aquisição do mesmo bem Efetivação do consumo (uso) Não atende expectativas Aquisição de outro bem Insatisfação Figura 8 - Processo de repetição de compra FONTE: Representação figurativa proposta pelos autores. Na concepção de Kotler (1998, p. 53-54), satisfação "é o sentimento de prazer ou de desapontamento resultante da comparação do desempenho esperado pelo produto (ou resultado) em relação às expectativas da pessoa". Essas expectativas são formadas e influenciadas por experiência anterior de compra, recomendações de amigos, informações, e promessas da empresa. Assim, o autor sugere quatro diferentes fontes para se rastrear e mensurar a satisfação do cliente: • Sistemas de reclamações e sugestões: consiste em a empresa tornar disponíveis formas de contato direto com o cliente por meio de, por exemplo, questionários ou linha telefônica; • Levantamento dos níveis de satisfação do cliente: consiste na realização periódica de pesquisa para auferir de forma direta o nível de satisfação do cliente; • Compra fantasma: consiste na contratação de pessoas para que realizem compra na empresa ou entrem em contato com ele para efetuar alguma reclamação, com o objetivo de se verificar a reação e a forma de resolução dos problemas apresentados; • Análise de clientes perdidos: consiste na busca de informações, junto aos ex-clientes, que possibilitem a aferição dos pontos negativos da empresa. De acordo com Whiteley (1992), os consumidores não trocam de empresa por estarem descontentes com o produto oferecido, mas sim com o relacionamento pessoal proporcionado. Uma pesquisa realizada pela sua empresa com consumidores que trocaram de empresa auferiu que 15% deles o fizeram em razão de terem encontrado produtos melhores, outros 15% por terem encontrado produtos equivalentes a preços mais baixos, e 69% em razão de atendimento ou atenção fornecida de baixa qualidade. Assim conclui que ambas as dimensões são significativas para o estabelecimento de relacionamento: qualidade em produto e qualidade em serviço. Embora abordem especificamente a gestão de serviços, Berry & Parasuraman (1991, p. 58) esclarecem que os consumidores possuem dois níveis de expectativas: o nível desejado e o nível adequado. O primeiro diz respeito ao que ele gostaria de receber; o segundo reflete o que é aceitável receber. Ressalte-se que entre estes níveis, existe uma zona de tolerância, conforme apresentado na Figura 9. 11 Nível Desejado Zona de Tolerância Nível Adequado Figura 9 – Níveis de expectativa FONTE: Berry & Parasuraman (1991, p. 58). Os autores esclarecem que a zona de tolerância varia de consumidor para consumidor, e de transação para transação de um mesmo consumidor, pois o nível de expectativa é dinâmico e depende de diversos fatores, tais como necessidades individuais e experiências anteriores. (Berry & Parasuraman, 1991, p. 59-63). Woodruff (1997, p. 142) ressalta o forte relacionamento entre o valor para o consumidor e a sua satisfação, pois à medida que o produto é percebido como sendo “de valor” e, portanto, alcança os seus objetivos, a satisfação é uma conseqüência natural. Assim, o fator crítico para que os clientes comprem repetidas vezes um mesmo bem e, assim, percorram o caminho até a fidelidade, é a satisfação que eles obtêm com o seu uso. Note-se que a empresa que oferece um determinado produto é responsável pela satisfação ou não do público que pretende atender em razão das expectativas que são criadas, muito embora algumas variáveis que influenciam o processo não possam ser controladas. Isto significa que, mesmo que um produto atenda adequadamente uma determinada necessidade, o cliente pode ficar insatisfeito por ter sido criada uma expectativa superior – por exemplo, pelos meios de comunicação – não contemplada na realidade. Machado (1999, p. 83) acrescenta que a atribuição de valor é um processo de julgamento do atendimento das suas necessidades e desejos em termos perceptuais pela aquisição ou uso de um produto, comparado com os custos para a sua obtenção. Para determinar os diferentes graus de satisfação do cliente, pode-se usar o seguinte modelo: Grau de Satisfação = Valor Percebido - Valor Esperado Figura 10 - Modelo para a mensuração da satisfação do cliente FONTE: Adaptado de Kotler (1998, p. 53). De acordo com o modelo, se o valor recebido por um determinado cliente for menor que o valor que esperava receber, ele fica insatisfeito com o produto e, portanto, a probabilidade de ele repetir a compra tende a diminuir. As informações necessárias para mensurar o grau de satisfação do cliente podem ser obtidas mediante questões indicadoras que sejam relevantes para cada tipo de produto. Assim, por exemplo, para saber qual é o nível de satisfação de um determinado público acerca de um novo veículo, pode-se realizar uma pesquisa para se auferir quais são suas expectativas em relação a alguns atributos importantes desse produto, tais como segurança, conforto, desempenho e outros. Após o veículo ter sido adquirido é oportuno realizar outra pesquisa, com base nas mesmas variáveis para, então, avaliar o nível de satisfação. 12 Na visão dos autores, duas questões são críticas para o processo de construção de relacionamento duradouro: a satisfação do consumidor, o que se dá pela entrega de valor e, a próatividade do estabelecimento e manutenção da relação empresa-consumidor, o que pode ser operacionalizado por meio de tecnologia de informação. 6 - Considerações finais A busca da fidelização dos clientes é um caminho essencial a ser percorrido para que as organizações se desenvolvam em mercados concorridos. Para tanto, satisfação deve ser proporcionada, com base no atendimento de expectativas por meio da entrega de valor. O fornecimento de uma oferta de valor para o cliente é uma forma de satisfazê-lo, o que aumenta a probabilidade de que ele continue consumindo o mesmo produto/marca e mantenha-se fiel à empresa. No entanto, especial atenção deve ser dada ao fato de que o valor percebido pelo cliente acerca de um bem não é o mesmo que o percebido por outro, nem tampouco pela empresa ofertante. Isto significa que as diferenças individuais devem ser levadas em consideração quando da realização de uma oferta. Assim, as empresas devem-se conhecer os seus públicos-alvo, a fim de que possam fazer uso das suas expectativas e anseios para o desenvolvimento e a apresentação de uma oferta de valor a eles. Embora a real contribuição dos programas de fidelização possa ser questionada, o que está em jogo é uma estratégia que parece ser consensual, tanto por parte dos profissionais, como por parte dos autores e acadêmicos consultados: a necessidade de um estreito relacionamento empresa-cliente, como forma de sustentar e de aumentar os resultados das empresas. O foco de um programa de fidelização deve ser a criação de valor para o cliente, o que ocorre mediante a utilização das informações provenientes de um adequado database marketing – o qual deve transformar os dados recebidos de diversas fontes em bases de sustentação para a tomada de decisão do processo de marketing. Porém, é conveniente atentar para a criação de fidelidade à marca ou à empresa, e não aos benefícios oferecidos pelos programas. Ressalte-se que toda a organização deve estar comprometida com a criação e entrega de valor, e retenção dos clientes escolhidos para integrarem a parceria inerente ao marketing de relacionamento. Como sugestão para futuros estudos relativos ao tema abordado neste ensaio, indica-se a realização de pesquisas empíricas que envolvam comparações dos resultados de empresas anteriormente e posteriormente à adoção de programas de relacionamento e de fidelização de clientes, bem como a validação dos modelos apresentados. 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