serviço social e a teoria da complexidade: uma relação - cress-mg

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SERVIÇO SOCIAL E A TEOR SERVIÇO SOCIAL E A TEORIA DA
COMPLEXIDADE: UMA RELAÇÃO POSSÍVEL?
Naiara Gaspar de Holanda Lima1
Hudson Andrey Corera da Costa2
RESUMO
O artigo tem como objetivo principal, trazer a discussão acerca da teoria da
complexidade no Serviço Social, abordando suas principais contribuições, no intuito de
somar na formação profissional dos discentes. Será exposto na discussão da Gênese do
Serviço Social, Os fundamentos filosóficos do Serviço Social e uma breve contribuição
da teoria da complexidade no Serviço Social. A discussão torna-se pertinente, porque
em tempos em que as problemáticas sociais estão cada vez mais agravadas, é necessário
que o profissional tenha outras possibilidades de intervenção, a teoria deve estar sempre
relacionada a prática, o trabalho profissional do assistente social não deve ser executado
aquém da luz teórica, existe entre teoria e prática uma relação intrínseca. Desta forma,
será exposto de que maneira a teoria da complexidade soma ao serviço social, assim
como as demais teorias existentes no curso de serviço social e que são estudadas na
formação profissional, sendo parte do arcabouço teórico metodológico da formação.
PALAVRAS-CHAVES: Serviço Social, Teoria da Complexidade, Fundamentos
Filosóficos Serviço Social.
1
Bacharel em Serviço Social (ESBAM, 2014), Mestranda do Programa de Pós Graduação em Serviço social e
Sustentabilidade na Amazônia- PPGSS na Universidade Federal do Amazonas- UFAM.
2
Bacharel em Serviço social (Dom Bosco, 2006), Especialista em Gestão e Elaboração de Políticas Públicas
(UNINORTE, 2009), Mestrando do Programa de
Serviço Social e Sustentabilidade na Amazônia-PPGSS da
Universidade Federal do Amazonas- UFAM, Assistente Social no Projeto Ame a Vida- Manaus/Am.
1
INTRODUÇÃO
Analisando o contexto no qual se originou a categoria profissional Serviço
social, pode-se perceber o quanto a mesma no decorrer de sua construção, sofreu
influências de diversas vertentes teóricas, sendo as principais, o positivismo, a
fenomenologia e a que fundamenta a maior parte da prática dos assistentes sociais, o
marxismo. Essas vertentes são apresentadas e estudadas no decorrer da formação
profissional em Serviço Social, aos discentes, futuros assistentes sociais, sendo assim,
são parte do arcabouço teórico-metodológico do Serviço Social. O serviço Social é uma
profissão legalmente reconhecida pela Lei de Regulamentação nº 8662/93 e também
pelo seu código de Ética Profissional, cujo mesmo é a bússola que deve nortear a prática
profissional do assistente social, diante dos indivíduos sociais, do seu espaço sócio
ocupacional e das diversas demandas apresentadas em seu cotidiano profissional.
Diante dos vários cenários pelos quais a profissão já se deparou, o principal
propósito é a discussão acerca da teoria da complexidade como ferramenta que pode
contribuir para o Serviço Social, olhando por diversos pontos de vista acerca das
diversas problemáticas sociais, que cotidianamente são apresentadas aos assistentes
sociais em seus espaços sócio ocupacionais.
DESENVOLVIMENTO
1.1 A GÊNESE DO SERVIÇO SOCIAL
O Serviço Social surge em um contexto de emergência da questão social com a
chegada do capitalismo, a princípio pautado em ações de cunho assistencialista,
benemérito e filantrópico realizados principalmente pela Igreja Católica, que buscava
recuperar sua representatividade ao unir-se ao Estado e a Burguesia, para atender as
mais diversas expressões da questão social. Nesse momento a igreja católica teve
importante papel, principalmente no que se refere a um dos primeiros marcos filosóficos
do Serviço Social, o neotomismo, baseado nas doutrinas da igreja católica, doutrinas
que subsidiaram a prática profissional do assistente social na perspectiva
assistencialista, mas principalmente moralista, estabelecendo-se o processo de
recristianização da Igreja Católica (AGUIAR, 2011).
A trajetória do Serviço Social foi marcada por diversas mudanças na sua prática
profissional, mudanças essas que aconteceram quando a profissão aproximou-se de
2
diferentes vertentes teóricas, quais sejam: positivismo, fenomenologia, marxismo, estas
posteriores ao neotomismo, cujos princípios mostravam os primeiros distanciamento da
doutrina cristã predominante.
Na perspectiva da Igreja Católica e sob influência da Ação Católica foi
desenvolvido em 1932 um curso com a juventude católica feminina, com duração de
pouco mais de um mês, ministrado por Mademoiselle Cristine de Hemptine, presidente
da Juventude Católica Feminina, cujos conteúdos desse curso eram assuntos sobre a
doutrina social da igreja e sobre a Ação Católica. Em São Paulo, assim como no Rio de
Janeiro, a ação católica será também desenvolvida, e em 1932 nascerá o Centro de
Estudos e Ação Social- CEAS. Pode-se perceber toda a movimentação da igreja em
busca de uma organização para resgatar sua representatividade, e para a “cristianização
dos indivíduos, da família e da sociedade” (AGUIAR, P 35, 2011).
YAZBEK, contribui que:
É por demais conhecida a relação entre a profissão e o ideário católico
na gênese do Serviço Social brasileiro, no contexto de expansão e
secularização do mundo capitalista. Relação que vai imprimir a profissão
caráter de apostolado fundando em uma abordagem da “questão social” como
problema moral e religioso e numa intervenção que prioriza a formação da
família e do indivíduo para solução dos problemas e atendimentos de suas
necessidades materiais, morais e sociais (2009, p. 145).
Foi em 1936 que surge no Brasil a primeira Escola de Serviço Social em São
Paulo, com o incentivo dos grupos que faziam parte da CEAS, posterior a esse
momento na década de 1940 surgem diversas escolas de serviço social nas capitais do
Estado, quando começa a acontecer o processo de institucionalização do serviço social
no Brasil, sendo profissão devidamente reconhecida na relação da divisão social do
trabalho, estando vinculada a grandes instituições assistenciais, estatais, paraestatais ou
autárquicas (Iamamoto, 2006).
As várias fases do Serviço Social acarretaram um vasto arcabouço teórico,
contudo também determinada confusão entre os profissionais, que em busca de
cientificidade,
foram
moldando
suas
práticas
em
ações
funcionalistas
e
desenvolvimentistas, ações essas muito presentes nos diferentes Governos. (Aguiar,
2011).
A partir de 1960 no Brasil no que se refere ao Serviço Social, começa uma
ruptura com o neotomismo, começando a aparecer uma postura na visão dialética. Neste
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momento parte da América Latina e o Brasil passam a vivenciar um novo momento
tanto social quanto político, em face das demandas sociais cada vez mais expressas no
seio das sociedades capitalistas, a profissão de serviço social passa a questionar suas
intervenções ainda de cunho assistencialista filantrópico, e inicia uma busca pelo
rompimento com o conhecido “serviço social tradicional”.
Esse momento é marcado pelo que conhecemos de “Movimento de
Reconceituação”, nesta perspectiva contribui Bonneti (2001), acerca do movimento de
reconceituação, este marcou a primeira aproximação do serviço social com as teorias
marxistas, onde tal aproximação trouxe uma gama de entendimentos por meio de
práticas políticas de segmentos profissionais e estudantes. O serviço Social quando
entra nesse movimento de reconceituação, ele passa a ser questionado enquanto
profissão e os profissionais iniciam um processo de questionamento dos métodos,
instrumentos e técnicas, em que pesem as influências das principais vertentes
positivista, fenomenológica e marxista. Todavia, seja hoje a vertente marxista a
principal na qual se apoia a prática profissional, deve-se reconhecer a contribuição das
demais vertentes, principalmente no que se refere ao novo direcionamento hoje presenta
na categoria profissional.
1.2 OS
FUNDAMENTOS
FILOSÓFICOS
NO
SERVIÇO
SOCIAL
BRASILEIRO
Adentrando a discussão das vertentes teóricas que perpassam os fundamentos
filosóficos do Serviço Social em seus momentos iniciais, destaca-se o tomismo e o
neotomismo, ambos alicerçados na doutrina social da Igreja católica, tendo princípios
conservadores, de cunho moralistas, religioso, humanistas. A principal preocupação
deste postulado filosófico baseado no pensamento de São Tomás de Aquino eram:
noção de dignidade da pessoa humana; sua perfectibilidade; sua capacidade de
desenvolver suas potencialidades; a natural sociabilidade do homem ser social e
político; a compreensão da sociedade como união dos homens para realizar o bem
comum.
Este ideário filosófico da doutrina social da igreja católica, unificou-se ainda as
ações de racionalismo higienistas, fortemente presente em partes da América Latina, na
4
Argentina e Chile, partindo principalmente da medicina, que preocupava-se em
assegurar assistência pública aos indivíduos sociais. (AGUIAR, 2011).
O que percebemos no âmbito da formação profissional dos assistentes sociais
neste período, era a presença forte de postulados cristãos, bem como vocacional, tanto
que um dos requisitos para que se fosse docente do curso de Serviço Social, era que
assumisse a doutrina social católica, e que fossem católicos praticantes. Nesta
perspectiva religiosa e vocacional de quem gostaria de ingressar a profissão de Serviço
Social, a formação correspondia em 4 principais pontos, onde destacaremos dois: 1- A
formação científica, que se dava por meio de disciplinas como a Sociologia, Psicologia
e Biologia e também da Moral, e tinham como objetivo, propor o conhecimento exato
do homem e da sociedade, de todos os problemas que dele se originam e neles se
refletem. 2- A formação pessoal, nesta a escola devia preocupar-se com o desabrochar
da personalidade integral do aluno, dando ao aluno uma formação moral sólida nos
pilares cristãos. (AGUIAR, 2011).
Sobre o positivismo e sua influência no Serviço Social, sabe-se que está passou a
acontecer quando a profissão começa a questionar sua intervenção, nesse momento
surge a preocupação do “o que” fazer e o “como” fazer, o que levou o Serviço Social a
cair no metodismo, e na burocracia. A profissão passou a receber a influência do
positivismo quando as técnicas norte americanas passaram a serem utilizadas na
intervenção profissional, este momento marca a passagem do modelo franco belga para
o americano. Aguiar(2011) colabora que o Serviço social, começou importando as
técnicas do Serviço Social de caso, logo depois, Serviço Social de Grupo e
Comunidade. Isso ocorreu no momento em que os assistentes sociais foram estudar em
universidades americanas. Este momento é marcado ainda pelas influências da
Sociologia e da Psicologia. O mesmo autor assinala ainda que” Com a vinda do Serviço
Social Americano vem para o Serviço Social Brasileiro a perspectiva funcionalista. Essa
perspectiva marca preponderantemente o Serviço Social no Brasil” (AGUIAR, 2011, P.
83).
Há no positivismo o estudo dos fatos, em busca de estabelecer relações entre
eles, contudo não há o estudo das causas dos fatos, uma vez que essa corrente filosófica
acredita que os acontecimentos são regidos por leis invariáveis e mesmo pela própria
natureza. Vieira (1987), colabora que no Serviço Social Brasileiro, a matriz positivista
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ganha importante papel, principalmente para a sua legitimação, ampliando seus
referenciais técnicos, há neste momento uma junção das doutrinas humanistas cristãs,
do neotomismo, com o suporte técnico oferecido na teoria social positivista. Esse
momento Iamamoto (1998), assinala de “arranjo teórico-doutrinário. É dentro do
contexto da neutralidade, da imparcialidade entre o sujeito e o objeto preconizados pela
teoria social positivista, que o Serviço Social conforma-se com sua função social
atribuída pelo Estado e pelo empresariado de ajustamento social.
Sobre a fenomenologia ciência que estuda as classificações e descrições dos
fenômenos, esta teve como principal autor Husserl (1859-1938), exercendo grande
influência na filosofia contemporânea, esta ciência se ocupa em estudar os fenômenos.
É uma corrente de pensamento que não se interessa em colocar a historicidade dos
fenômenos, considerada por muitos como a-histórica. A fenomenologia, não introduz
transformações a realidade, mantendo-se sempre no conservadorismo, estuda a
realidade, somente com o objetivo de descrevê-la ou apresenta-la tal como é, sem
mudanças. Não aborda os conflitos de classes e muito menos as mudanças estruturais e
conjunturais. (TONET, 1984).
No Serviço Social, já nos meados da década de 1970, no bojo do movimento de
reconceituação, percebe-se uma aproximação de parte dos assistentes sociais da época,
com a fenomenologia. Aguiar (2011), assinala que os sinais da fenomenologia já se
encontravam na postura do Serviço Social mesmo no momento marcado pelo
neotomismo e positivismo, contudo a partir de 70 a corrente passou a influenciar
sobremaneira no Serviço Social Brasileiro através da Pontífica Universidade Católica
(PUC) do Rio de Janeiro, que trazia através de Ana Augusta Almeida, uma postura
fenomenológica. No documento de Sumaré, resultado do III Seminário de Teorização
do Serviço Social Brasileiro, é explicitado pela primeira vez a presença da
fenomenologia no Serviço Social Brasileiro.
Tonet (1984), assinala que a fenomenologia introduz a visão existencial no
trabalho social, proporcionando a aplicação da teoria psicossocial. Na fenomenologia, o
Serviço Social se realiza através da intervenção social ou tratamento social. Como
principal contribuição para o Serviço Social a fenomenologia traz o processo de ajuda
psicossocial a partir dos princípios, diálogos, pessoa e transformação, finalidade
primordial da intervenção do profissional.
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Sobre o marxismo, foi a partir da década de 60 que o materialismo histórico
dialético passa a influenciar o Serviço Social. Assumindo uma postura crítica os
assistente sociais brasileiros passam a interpretar a sociedade com um novo olhar, um
olhar crítico, analisando as contradições sociais, reconhecendo a existência de duas
classes sociais antagônicas, burguesia e proletariado. É na efervescência do movimento
de reconceituação em 1970 que esta postura crítica ganha força unindo-se a diversos
movimentos sociais, que lutam por direitos dos mais diversos segmentos
(IAMAMOTO, 2007).
O movimento de reconceituação marca a primeira aproximação do Serviço
Social com a teoria marxista, trazendo para a profissão uma gama de entendimento por
meio de práticas políticas. Foi através da aproximação com o marxismo que os
profissionais começam um processo de ruptura com o Serviço Social tradicional,
levantando diversos questionamentos sobre sua prática e a quem os mesmos estavam
servindo. Este momento é importantíssimo para a categoria, marcando o primeiro
momento de estabelecimento de vínculos entre os profissionais e a classe trabalhadora.
Somando-se a isso, este momento é marcado pelo engajamento dos profissionais nas
lutas presentes nas duas classes sociais e sendo desencadeadas pelo entendimento de
que a sociedade não é harmônica, tal como se preconizava no neotomismo, positivismo
e mesmo na fenomenologia.
Sobre o marxismo Paula (1995), assinala que o pensamento filosófico de Marx e
Engels tornaram-se conhecidos em meados do século XIX, em meio a efervescência dos
movimentos operários pela libertação econômica e política. Este momento é marcado
pela forte luta do proletariado contra a exploração e opressão. O materialismo histórico
dialético, de Marx e Engels, surge como uma nova interpretação do mundo, voltado
para os interesses em defesa da classe trabalhadora. É o materialismo dialético, um
método que parte da análise da realidade, onde tudo se desenvolve e se transforma. É
contemplado por três leis básicas: lei da unidade e dos contrários; a lei da transição do
quantitativo para o qualitativo e a lei da negação da negação.
As influências desta corrente filosófica traz para o Serviço Social, de imediato, o
entendimento de que a sociedade não é estática e nem a-histórica. Contribui ainda para
que o Serviço social desenvolva sua dimensão crítica e política, não mais considerando
a sociedade como um todo harmônico.
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Netto (1995), assinala que o amadurecimento da profissão já na década de 80,
contribui para que o Serviço Social dialogue com as verdadeiras obras de Marx, não
mais interpretações, esse momento marca a apreensão do Serviço Social ao método
marxista, proporcionando aos profissionais uma visão totalitária da sociedade e de tudo
que dele faz parte, as contradições, a exploração, a alienação, a mais valia, que contribui
para acumulação capitalista, a propriedade privada e a luta de classes, oriunda de todos
esses processos.
1.3 BREVE CONTRIBUIÇÃO DA TEORIA DA COMPLEXIDADE NO
SERVIÇO SOCIAL.
Adentrar a discussão da teoria da complexidade não é tarefa fácil de se executar,
quiçá interrelacionar a mesma com o Serviço Social, profissão que categoricamente é
resultado de construções e reconstruções em torno de sua prática profissional,
interventiva hoje na perspectiva do direito principalmente daqueles que severamente são
atingidos pela questão social, deste mundo globalizado. A intenção agora é clarificar
como a teoria da complexidade de Edgar Morin, pode contribuir sobremaneira ao
Serviço Social, possibilitando uma visão de dentro pra fora e de fora pra dentro, do todo
e parte, do uno e do múltiplo.
Assim, Roberto (2008), assinala que o movimento da história configurado e
moldado, sobretudo, pelo modelo globalizante do neoliberalismo, traz à tona novos
paradigmas, que precisam ser estudados. A autora atribui que a abertura para um novo
pensar crítico é determinante para toda e qualquer profissão. A referida destaca que
dentro desta concepção de novas teorias no âmbito do Serviço Social, encontra-se a
Teoria da Complexidade, destacando-se as principais propostas de Anthony Giddens,
Hanna Arendt, Jurgen Habermas, Boaventura Souza Santos e Edgar Morin.
A principal questão ora reconhecida no pronunciar da autora citada é reconhecer
as configurações e reconfigurações da questão social, oriundas das profundas
transformações econômicas, Sociais e políticas, refletindo diretamente no Serviço
Social, exigindo dos profissionais novas análises e novas alternativas para as novas
demandas (ROBERTO, 2008).
Os assistentes sociais, profissionais que atuam diretamente com a questão social
e suas multifacetadas expressões, devem compreender que a diversidade humana é um
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fato concreto e a subjetividade interfere no desenrolar do tecido social. A complexidade
e diversidade étnica, racial, cultural, fazem parte do todo de uma sociedade. Para tanto,
exige-se do profissional, a busca incessante de alcançar o ser humano em sua totalidade.
Roberto (2008, p. 13) assinala, “Buscam-se hoje formas diferentes de intervenção que
consigam alcançar o ser humano em sua totalidade- racional, emocional e material”. A
relação com novos saberes possibilita a compreensão da totalidade que perpassa o ser
humano.
Do ponto de vista da complexidade, nada pode ser analisado isoladamente, a
teoria da complexidade estimula e requer de nós uma ruptura e/ou desprendimento do
cartesianismo, para adentrar na dinamicidade do todo e parte. Capra (1996) assinala que
havendo a extinção de um ser do sistema ecológico dinâmico e vivo, isso pode
significar um colapso de todo o ecossistema. Dessa forma compreendemos a
interligação e interrelação de todas as coisas.
Roberto (2008), assinala que não se pode ignorar a intrínseca relação entre todo
e parte, uno e múltiplo, unidade e diversidade. Seguindo a linha de raciocínio de Capra
(1996), Roberto(2008), nos conduz ao desprendimento da análise cartesiana das coisas,
em que tudo deve ser estudado separadamente. Na complexidade a um
redimensionamento na análise para macro, sem extinguir ou desprezar a micro.
Trazendo as contribuições ora assinaladas, pode-se assim dizer que o homem é
um ser cuja atitude unitária, atinge e compromete todos os demais homens, sendo assim
não somos um ser cuja atitude, prejudique somente a nós mesmos. Ao refletirmos sobre
a questão social percebemos que a mesma é fruto de um sistema excludente e desigual,
que parte da ganância de outros homens, que ao monopolizarem os meios de produção,
o poder e a riqueza produzida coletivamente, prejudicam e comprometem outras
pessoas, ou seja, o tecido social sofre.
A prática profissional do assistente social é regido por uma lei de
regulamentação 8662/93, pelo código de Ética Profissional, que estabelece os princípios
norteadores da sua prática sendo a bússola que orienta e subsidia os assistentes sociais
em seus espaços sócio ocupacionais. Dentro deste contexto, soma-se ainda o projeto
ético- político da profissão, cujo mesmo é regido majoritariamente pela teoria marxista,
possibilitando um posicionamento crítico, ético, comprometido e em defesa da classe
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trabalhadora. Existem as demais vertentes já mencionadas, que formam o pluralismo do
Serviço Social.
Ressalta-se que a prática profissional do assistente social, não é e nem deve ser
vista como estática, ainda que as expressões da questão social sejam as mesmas
vivenciadas pelos indivíduos em outras localidades, a especificidade dessa vivência é
diferenciada, ou seja, as expressões da questão social são vividas, experimentadas de
maneira diferente por cada indivíduo e isso nos faz refletir a complexidade da mesma.
Rodrigues (1998) contribui que a prática profissional representa o agir
profissional na complexidade exposta na realidade do tecido social. Há na prática do
assistente social uma heterogeneidade de relações- indivíduo- profissional, situações,
valores e significados diferentes. Esta heterogeneidade do objeto do Serviço Socialquestão social e do sujeito- indivíduo social, explicita que não é possível tratar nenhuma
situação sob olhares óbvios, como se fossem semelhantes. Podemos perceber que a
complexidade está presente no Serviço Social em dois fortes momentos, sua relação
com o objeto- questão social, e sua relação com o sujeito, inseridas em um contexto
social de amplas contradições.
Na complexidade de Edgar Morin, este parte principalmente de um princípio
fundamental, não há mais verdade absoluta, esta vem se dissolvendo em meios as
transformações societárias. O referido parte do princípio de que não há como pensar o
cenário atual somente na sua objetividade, mas considerando a subjetividade das
pessoas, cultura, religião, ética, princípios morais, escolhas. Edgar Morin, se coloca
como crítico ferrenho de tudo que se impõem como certo e único.
Os principais conceitos inerentes a teoria da complexidade de Edgar Morin,
estabelecem-se em: ordem, desordem.
ordem extrapola as idéias de estabilidade, rigidez, repetição e
regularidade, unindo-se à idéia de interação, e imprescinde,
recursivamente, da desordem, que comporta dois pólos: um objetivo e
outro subjetivo. O objetivo é o pólo das agitações, dispersões,
colisões, irregularidades e instabilidades, em suma, os ruídos e os
erros. O pólo subjetivo é “... o da impredictibilidade ou da relativa
indeterminabilidade. A desordem, para o espírito, traduz-se pela
incerteza” (MORIN, 2000, p. 200).
Pensar o Serviço Social dentro deste contexto, é refletir sobre as diversas
expressões da questão social, sobre as mais variáveis problemáticas nas quais lidam os
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assistentes sociais em seus espaços de trabalho cotidianamente. Não é uma tarefa fácil,
mas é um convite em analisar os fenômenos a partir de um outro ponto de vista, ordem
e desordem das coisas, a relação intrínseca das coisas, do todo, da parte, do uno e do
múltiplo, nada está solto, tudo tem sua variável de contribuição, a objetividade e
subjetividade perpassam o coletivo de uma sociedade. Uma questão polêmica que pode
ser questionada, arrisco-me a dizer a situação dos adolescentes em conflito com a lei:
Como explicar o envolvimento de um adolescente cuja família lhe oferece todo o
conforto possível, escola, alimentação, moradia, bem estar, afeto e ainda assim o
adolescente envolve-se com as drogas? Escolhe ainda ser autor de atos infracionais
colocando em risco sua vida e de outras pessoas que ficam à mercê numa situação de
assalto? Categoricamente parte-se do princípio de que o sistema capitalista é opressor, é
explorador, de fato, há uma significativa concordância com esse fator gritante em nossa
sociedade, mas não podemos culpabilizar o sistema por tudo, ainda que este possua
parcela significativa nas problemáticas sociais.
Penso que neste enunciado posto como ilustração de um questionamento meu, e
arrisco-me a dizer de outras pessoas também, está presente fatores externos, diga-se
assim o capitalismo e sua lógica consumista-individualista, mas soma-se muito os
fatores internos do indivíduo, sua subjetividade, os fatores que o levam a se envolver
em tal situação, ainda que esteja sendo provido de todas as suas necessidades básicas e
direitos pela sua família.
Rodrigues(2002) assinala que, a prática profissional é complexa. Essa
complexidade é política, organizativa, interventiva. Abarca dificuldade, limites e o fato
de que certas situações, contextos, circunstâncias, realidades não são confortáveis,
conformáveis, domáveis, como geralmente gostaríamos que fossem. Dessa forma, a
compreensão de que a prática profissional do assistente social é complexa implica
aceitar colocar-se cotidianamente diante de desafios que não são simples de serem
enfrentados.
Assim, a autora acima citada cita Morin (1991).
"pode-se dizer que há complexidade onde quer que se produza um
emaranhamento de ações, de interações, de retroações (idem, p.77).
Ao mesmo tempo, confrontamo-nos com proposições conflitantes,
diferentes, que em princípio se excluem, portanto complexas, mas que
precisam ser conjugadas. A complexidade está onde não se pode
vencer uma contradição. Complexidade é "(...) um tecido (...) de
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constituintes heterogêneos inseparavelmente associados (...)" e, deste
ponto de vista, envolve a relação entre uno e múltiplo; é ainda, "o
tecido de acontecimentos, ações interações, retroações, determinações,
acasos, que constituem o nosso mundo fenomenal" e, deste ponto de
vista, envolve a relação com a incerteza, a desordem, o acaso.
(MORIN, 1991, P. idem, p.17-18).
Como pensar o Serviço Social na complexidade? Para tanto assinala Roberto
(2008, p.65)” O serviço social é uma profissão complexa, trabalha com uma diversidade
de situações, com a perspectiva de um sujeito pluridimensional e são tantos os
desdobramentos da questão social que é difícil contar com uma concepção que reúna a
extensividade de sua prática.” Dessa forma o assistente social tem sua prática pautada
na objetividade e subjetividade, trabalhando com a contraditoriedade permanente. O
serviço Social é assim profissão que é parte e expressão do tecido social, do movimento
da sociedade.
Percebe-se determinada relação entre o marxismo e a teoria da complexidade,
uma vez que o primeiro estabelece e leva em consideração uma análise não só
quantitativa, mas também qualitativa dos fatos, levando em considerações o contexto e
o cenário em que estão inseridos as pessoas. A segunda estabelece a interrelação de
tudo, homem, natureza, sociedade, todos fazem parte do tecido social e principalmente o
homem deve ser entendido em suas objetividades e subjetividades. Edgar Morin apesar
de apreciador da teoria marxista, tece uma crítica não a Karl Marx, mas aos que se
denominam marxistas ortodoxos, que colocam o marxismo como verdade absoluta,
desprezando as demais teorias e suas contribuições e ferindo o princípio da ciência.
Roberto (2008).
Acredita-se que a principal contribuição da teoria da complexidade para o
Serviço Social é para além de convidar os profissionais a saírem de suas zonas de
conforto e adentrar a novos saberes, é também trabalhar com interdisciplinaridade,
conversando com novas teorias, com novas ciências, para possibilitar uma leitura não
mais cartesiana das coisas, de que cada um deve atuar dentro do seu quadrado. A
intenção da teoria da complexidade não é substituir qualquer que seja a vertente teórica,
ou fazê-la obsoleta, não, a contribuição é mesmo um convite para uma práxis, que leve
em considerações os efeitos do capitalismo sobre o indivíduo, mas também a
subjetividade de cada pessoa, no âmbitos de suas escolhas, de tudo quanto o faz um ser
humano complexo.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS.
. Elucidou-se em primeiro momento sobre a gênese do Serviço Social, suas
primeiras aparições na sociedade brasileira, não sendo possível abarcar todos os
momentos que marcaram o Serviço Social Brasileiro.
Posteriormente, adentrou-se aos fundamentos filosóficos do Serviço Social que
perpassam ainda a categoria, sendo: neotomismo, positivismo, fenomenologia e
marxismo. Buscou-se neste momento descrever sobre estas vertentes teóricas e suas
contribuições na categoria, suas principais influências que teceram no decorrer da
caminhada da categoria, o que ela é hoje. Por fim apresentou-se a teoria da
complexidade e sua contribuição para o Serviço Social, no âmbito do ser “complexus”
do qual fala Edgar Morin, ser dotado de subjetividades, ser de relação intrínseca com a
natureza, com a sociedade, com o meio no qual está inserido e ser que é o sujeito da
intervenção do assistente social.
É dentro desta totalidade, apontada por Edgar Morin, emocional, racional e
material que está composto o ser humano, e que está inserido o assistente social no
âmbito da intervenção na garantia dos direitos sociais, no âmbito das expressões da
questão social, o que impossibilita um olhar de obviedade, de semelhanças de uma
vivência e outra, pois cada ser é um universo diferente. São essas diferenças ou
diversidades que formam a complexidade da prática do assistente social .No âmbito da
formação profissional há um tabu quanto a teoria da complexidade, tabu esse que
deveria ser quebrado, pois como diz Varela “ o caminhar faz a trilha” e caminhar por
novos saberes, não é cair no ecletismo tão temido na categoria profissional, é somar
para a categoria profissional, possibilitando o fortalecimento ainda mais da sua
criticidade, a partir da leitura macro e microssocial, englobando o sujeito em sua
totalidade, sem tornar obsoleto a vertente teórica marxista, principal utilizada na
categoria.
Entendendo a complexidade, pode-se dizer que sua principal contribuição para o
Serviço Social é para além de convidar os profissionais a saírem de suas zonas de
conforto e adentrar a novos saberes, é também trabalhar com interdisciplinaridade,
conversando com novas teorias, com novas ciências, para possibilitar uma leitura não
mais cartesiana das coisas, de que cada um deve atuar dentro do seu quadrado. A
intenção da teoria da complexidade não é substituir qualquer que seja a vertente teórica,
13
ou fazê-la obsoleta, não, a contribuição é mesmo um convite para uma práxis, que leve
em considerações os efeitos do capitalismo sobre o indivíduo, mas também a
subjetividade de cada pessoa, no âmbitos de suas escolhas, de tudo quanto o faz um ser
humano complexo.
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