Coment´arios sobre a oficina “Abrindo problemas” 4 - DM

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Comentários sobre a oficina “Abrindo problemas”
4◦. Encontro da Revista do Professor de Matemática
IME/USP 29 e 30 de maio de 2009
Roberto Ribeiro Paterlini
Departamento de Matemática, UFSCar
Seguem duas páginas com tarefas apresentadas aos participantes
Introdução
Todos os que lidam com o ensino da Matemática certamente já ouviram ou leram a
expressão “problema fechado”. Parece que uma das caracterı́sticas desses problemas é que
já trazem no enunciado o que deve ser provado. Seguem dois exemplos de problemas que
entendo serem do tipo “fechado”:
1. Que lugar da progressão aritmética 1, 6, 11, ... ocupa o número 131?
2. Prove que 8 é divisor de n2 − 1 se e somente se n é ı́mpar, para todo inteiro n.
Os problemas fechados atendem objetivos como direcionar o trabalho do estudante para
compreender determinados aspectos da teoria ou poupar tempo para atingir certos resultados.
Mas a implementação da escola renovada pede também o aporte dos chamados “problemas
abertos”, em que o estudante tem mais autonomia na investigação.
Para o professor que está interessado em utilizar problemas abertos mas não os encontra com facilidade na literatura, sugerimos transformar em abertos alguns dos milhões de
problemas fechados disponı́veis.
Abrindo o problema 1
Uma possibilidade seria a seguinte:
Consideremos os números naturais dispostos, em sua sequência natural, em linhas com cinco
números em cada linha:
1
2
3
4 5
6
7
8
9 10
11 12 13 14 15
16 17 18 19 20
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Investigue regularidades nesse esquema (por exemplo, sobre a soma dos termos de cada
linha, ou sobre os números que compõe a n-ésima linha). Faça conjecturas e as demonstre.
Veja se seus resultados podem responder às seguintes perguntas: em que linha a soma dos
termos é 665, e quais são os números que fazem parte dessa linha? Em que linha está 131?
Abrindo o problema 2
Uma possibilidade seria a seguinte:
Divida por 8 os números 32 , 52 , 72 e 92 . Que regularidades você observa? Faça mais alguns testes para constatar se as regularidades permanecem com outros valores. Transforme
as regularidades em conjecturas gerais. Use algum método considerado válido pela Matemática para verificar se as conjecturas são verdadeiras ou falsas. Investigue as recı́procas
de suas conjecturas.
Atividades para essa oficina
Trabalhando em grupo (de preferência com três componentes, no máximo 4, se precisar) realize as tarefas propostas a seguir. Cada grupo deve ter um relator para descrever as
experiências e as conclusões do grupo. Solicitamos que o texto produzido seja entregue ao
Prof. Roberto. Faremos comentários gerais sobre essas tarefas que serão postados na internet
no endereço http://www2.dm.ufscar.br/ ptlini/ no prazo de aproximadamente um mês.
Tarefa 1
Resolva um dos problemas abertos propostos acima. Comente suas diferenças em relação
à versão fechada do problema. Outras sugestões de redação? Para quem fez o problema 1: o
que aconteceria se na redação do problema aberto não fosse dada nenhuma dica e não fosse
feita nenhuma pergunta especı́fica, mas apenas “Investigue regularidades nesse esquema”?
Tarefa 2
“Abra” alguns dos seguintes problemas:
3. Demonstre que n e n5 têm a mesma unidade para todo número natural n.
4. Prove que a soma dos ângulos internos de um polı́gono convexo de n lados é (n − 2)180◦ .
5. Demonstre que o segmento ligando os pontos médios de dois lados de um triângulo é
paralelo ao terceiro lado e tem a metade de seu comprimento.
6. Demonstre que, em um triângulo isósceles qualquer, o incentro, o circuncentro, o baricentro e o ortocentro estão em uma mesma reta.
7. Demonstre a relação de Stiffel
µ
¶ µ
¶ µ ¶
n−1
n−1
n
+
=
p−1
p
p
para 1 ≤ p ≤ n − 1
8. Na figura abaixo determine o valor de α + β + γ + δ .
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α
γ
δ
β
Tarefa 3
Esteja à vontade para fazer comentários adicionais. Você pensou em outros exemplos?
Acha importante o professor utilizar problemas abertos? Se for, em que tipo de situações?
Referências
[1] Barbosa, J. L. M., Geometria Euclidiana Plana. Coleção do Professor de Matemática.
Rio de Janeiro, Sociedade Brasileira de Matemática, 2006.
[2] http://www.mat.ucm.es/deptos/am/guzman/tratatalento/identif.
htm
Foi uma satisfação fazer esse trabalho. Grato a todos. Prof. Roberto.
Comentários sobre as tarefas
Não foi pedido, mas vamos ver as soluções dos problemas fechados
Problema 1. Que lugar da progressão aritmética 1, 6, 11, ... ocupa o número 131?
Solução Sejam an o n-ésimo termo da PA e r sua razão. Então, usando a fórmula an =
a1 + (n − 1)r temos 131 = 1 + (n − 1)5 ⇒ 130 = (n − 1)5 ⇒ n − 1 = 26 ⇒ n = 27. Portanto
131 é o 27◦. termo.
Problema 2. Prove que 8 é divisor de n2 − 1 se e somente se n é ı́mpar, para todo inteiro n.
Solução Suponhamos primeiro que 8 é divisor de n2 − 1. Podemos escrever n2 − 1 = 8t para
algum inteiro t. Mas então n2 = 2(4t) + 1, e n2 é ı́mpar. Logo n é ı́mpar.
Suponhamos agora que n seja ı́mpar. Escrevemos n = 2t + 1, com t inteiro. Então n2 −
1 = (2t + 1)2 − 1 = 4t 2 + 4t + 1 − 1 = 4t(t + 1). Como t ou t + 1 é par, então t(t + 1) é par,
digamos da forma 2s, e n2 − 1 = 4 · 2s = 8s é divisı́vel por 8.
Tarefa 1: comentários sobre os problemas abertos propostos
Problema 1.
Comentários dos grupos
Alguns grupos observaram que as somas das linhas são 15, 40, 65, ... e formam uma
PA de razão 25 e primeiro termo 15. Aplicando a fórmula an = a1 + (n − 1)r temos 665 =
15 + (n − 1)25 o que dá n = 27. Portanto a soma dos termos da linha 27 é 665.
Alguns grupos observaram que o número 131 está na primeira coluna e que esses números
formam uma PA de razão 5 e primeiro termo 1. Aplicando a fórmula an = a1 + (n − 1)r temos 131 = 1 + (n − 1)5 do que vem n = 27. Portanto 131 é o primeiro número da linha
27.
Um grupo observou que a linha n é formada pelos números 5n − 4, 5n − 3, 5n − 2,5n − 1 e
5n, e sua soma é 25n−10. Resolvendo 25n−10 = 665 vem n = 27. Resolvendo 5n−4 = 131
vem n = 27. Portanto 131 está na linha 27 e a soma dos termos dessa linha é 665.
Outro grupo observou que 130 = 26 × 5, logo 130 é o último termo da linha 26. Então
131 é o primeiro termo da linha 27.
Um grupo observou que se na redação do problema aberto 1 não fossem feitas perguntas mais especı́ficas, os estudantes fariam apenas observações básicas. As perguntas mais
especı́ficas ajudam a instigar a análise.
Outro grupo observou que o problema aberto 1 talvez seja uma boa estratégia para introduzir o assunto PA.
Comentários adicionais do professor responsável pela oficina
Começamos com uma solução indutiva. Somando os termos da primeira linha dá 15,
que dividido por 5 dá o termo central da linha. Somando os termos da segunda linha dá 40,
que dividido por 5 dá o termo central da linha. Induzimos que, em uma linha qualquer, se
dividirmos a soma dos termos por 5 obteremos o termo central. Portanto, se em uma linha a
soma é 665, o termo central é 665/5=133. Então os números da linha procurada são 131, 132,
133, 134, 135. Notemos, por outro lado, que o último termo da primeira linha dividido por
5 dá 1, e o último termo da segunda linha dividido por 5 dá 2. Induzimos que, em uma linha
qualquer, se dividirmos o último termo por 5 obtemos a ordem da linha. O último termo da
linha encontrada é 135, que dividido por 5 dá 27. Portanto a linha encontrada tem a posição
27.
Uma solução dedutiva:
Sejam n, n + 1, n + 2, n + 3 e n + 4 os números da linha procurada. Temos n + n + 1 +
n + 2 + n + 3 + n + 4 = 5n + 10. De 5n + 10 = 665 vem n = 131. Portanto a linha é
131, 132, 133, 134, 135
Para encontrar a ordem dessa linha, observamos que cada cinco números a partir de
1 formam uma linha, assim cada linha termina com um múltiplo de 5, sendo o fator de
multiplicidade a ordem da linha. Como 135/5 = 27, vemos que a ordem da linha acima é
27.
É possı́vel resolver o problema de várias maneiras, as mais comuns consistem em identificar progressões aritméticas.
Problema 2.
Comentários dos grupos
Apenas um grupo trabalhou com esse problema. Uma conjectura diferente que o grupo
fez foi a seguinte: tomando n = 3, 5, 7, 9 ... e dividindo n2 por 8, as diferenças entre dois
quocientes consecutivos formam a sequência 2, 3, 4, ... dos números naturais ≥ 2.
Comentários adicionais do professor responsável pela oficina
Examinando as regularidades de 32 = 9 = 1 · 8 + 1, 52 = 25 = 3 · 8 + 1, 72 = 49 = 6 · 8 + 1,
etc., vemos que: o resto da divisão por 8 do quadrado de qualquer número ı́mpar ≥ 3 é
sempre 1. Quanto aos quocientes, além da regularidade já observada, pode-se notar que eles
formam a sequência dos números triangulares.
Estas afirmações podem ser verificadas algebricamente, uma parte disso foi feito mais
acima. A afirmação sobre os números triangulares pode ser verificada lembrando que essa
sequência é dada por tn = n(n + 1)/2. Fica difı́cil perceber as recı́procas dessas afirmações
apenas pelo exame de regularidades. Aqui entra o ensinamento: sempre que examinar uma
afirmação, examine também a sua recı́proca. Que tal acostumarmos os nossos estudantes
com isso?
Problema 3.
Sugestão de problema aberto correspondente (composição de sugestões dos grupos)
Considere os seguintes eventos:
5
1 =1
25 = 32
35 = 243
45 = 1024
Que regularidades você observa? Faça mais alguns testes para constatar se as regularidades permanecem com outros valores. Transforme as regularidades em conjecturas gerais.
Use algum método considerado válido pela Matemática para verificar se as conjecturas são
verdadeiras ou falsas.
Observações Uma conjectura que pode aparecer é que a quantidade de dı́gitos de n5 é n.
Mas isso já falha com 55 = 3125. Outra é que n e n5 têm a mesma unidade. Esta vale.
Escrevamos n = b10 + a0 , sendo a0 as unidades de n e b a quantidade de dezenas de n.
Temos n5 = c10 + a50 , portanto a unidade de n5 é a mesma de a50 . O resultado segue então
dos seguintes cálculos:
a0 = 0 ⇒ a50 = 05 = 0 portanto a unidade de n5 é 0;
a0 = 1 ⇒ a50 = 15 = 1 portanto a unidade de n5 é 1;
a0 = 2 ⇒ a50 = 25 = 32 portanto a unidade de n5 é 2;
a0 = 3 ⇒ a50 = 35 = 243 portanto a unidade de n5 é 3;
a0 = 4 ⇒ a50 = 45 = 1024 portanto a unidade de n5 é 4;
a0 = 5 ⇒ a50 = 55 = 3125 portanto a unidade de n5 é 5;
a0 = 6 ⇒ a50 = 65 = 7776 portanto a unidade de n5 é 6;
a0 = 7 ⇒ a50 = 75 = 16807 portanto a unidade de n5 é 7;
a0 = 8 ⇒ a50 = 85 = 32768 portanto a unidade de n5 é 8;
a0 = 9 ⇒ a50 = 95 = 59049 portanto a unidade de n5 é 9;
Outra solução: Como n e n5 têm a mesma paridade, então 2 divide n5 − n. Pelo Pequeno
Teorema de Fermat, 5 divide n5 − n. Como 2 e 5 são relativamente primos, 2 · 5 = 10 divide
n5 − n.
Problema 4
Sugestão de problema aberto correspondente (composição de sugestões dos grupos)
As figuras mostram a soma dos ângulos internos de alguns polı́gonos convexos:
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180◦
360◦
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540◦
Investigue se existe algum padrão. Faça uma conjectura e justifique. O que ocorre com
polı́gonos não convexos? E quanto à soma dos ângulos externos?
Problema 5
Sugestão de problema aberto correspondente
Desenhe vários triângulos e ligue, em cada um deles, os pontos médios de dois dos lados.
Estude as regularidades.
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Problema 6
Sugestão de problema aberto correspondente
Desenhe vários triângulos, de diversos tipos (equilátero, isósceles, escaleno acutângulo,
escaleno obtusângulo, retângulo), e, em cada um, desenhe os pontos notáveis (incentro,
circuncentro, baricentro e ortocentro). Estude as regularidades. Alguma demonstração?
Problema 7
Sugestão de problema aberto correspondente
Vemos a seguir os números binomiais colocados em um arranjo especial, chamado
triângulo de Pascal. À esquerda os números estão na forma binomial, e à direita, com seus
valores correspondentes. Procure regularidades. Escreva essas regularidades no formato
de fórmulas gerais. Alguma demonstração?
¡0¢
1
0
¡1¢ ¡1¢
0
1
¡2¢ ¡2¢ ¡2¢
0
1
2
¡3¢ ¡3¢ ¡3¢ ¡3¢
0
1
2
3
¡4¢ ¡4¢ ¡4¢ ¡4¢ ¡4¢
0
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3
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2
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Problema 8
Sugestão de problema aberto correspondente
Na figura abaixo, encontre propriedades dos ângulos.
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Tarefa 3: comentários adicionais dos grupos
Comentário de um grupo: É importante apresentar problemas abertos no inı́cio de um
tema. Achamos interessante fazer um problema aberto com PA ou PG, pois esses problemas
necessitam de investigação e total empenho dos alunos.
Comentário de outro grupo: Os problemas abertos (quando) sugeridos em aula levam o
aluno a uma maior exploração das situações, a elaborar conjecturas, tirar conclusões. O
professor deve utilizá-los eventualmente, pensando na melhor estratégia: introdução de um
assunto? fechamento de um assunto?
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