PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO HABEAS CORPUS 378662820104010000/PI Processo na Origem: 129436320104014000 RELATOR(A) IMPETRANTE IMPETRANTE IMPETRADO PACIENTE PACIENTE PACIENTE PACIENTE PACIENTE PACIENTE : : : : : : : : : : DESEMBARGADORA FEDERAL ASSUSETE MAGALHÃES ALESSANDRA VANESSA ALVES THIAGO CARVALHO BARRETO LEITE JUIZO FEDERAL DA 2A VARA - PI MARCIA BASSIT LAMEIRO DA COSTA MAZZOLI REINALDO FELIPPE NERI GUIMARAES ALBERTO BELTRAME GERSON PENA EDELBERTO LUIZ DA SILVA VAGNER DE SOUZA LUCIANO RELATÓRIO A EXMª SRª DESEMBARGADORA FEDERAL ASSUSETE MAGALHÃES (RELATORA): – Trata-se de habeas corpus preventivo, com pedido de liminar, impetrado em favor de MARCIA BASSIT LAMEIRO DA COSTA MAZZOLI E OUTROS, contra decisão proferida pelo ilustre Juízo Federal da 2ª Vara Seção Judiciária do Piauí, que, em antecipação de tutela, determinou o cumprimento de decisões judiciais – nos autos dos Procedimentos Ordinários 12943-63.2010.4.02.4000 e 12944-48.2010.4.01.4000 –, que impuseram à União, ao Estado do Piauí e ao Município de Teresina a obrigação de adotar, através do Sistema Único de Saúde – SUS, as providências atinentes ao fornecimento de medicamentos e à marcação de sessões de quimioterapia, em 5 (cinco) e 15 (quinze) dias, respectivamente, sob pena de prisão em flagrante das autoridades administrativas competentes, por crime de desobediência (fls. 45/47 e 49/50). Sustentam os impetrantes, em síntese, a atipicidade da conduta, uma vez que o sujeito ativo do crime de desobediência é o particular, e não o servidor público, no exercício de suas funções legais, bem como a ausência de dolo e a impossibilidade de prisão em flagrante em crime de menor potencial ofensivo Requerem, a final, a concessão da ordem, liminarmente, para determinar a expedição de salvo-conduto em favor dos pacientes. O pedido formulado em sede de liminar foi deferido pelo ilustre Desembargador Federal José Amílcar de Queiroz Machado, em plantão (fls. 65/67). As informações foram prestadas pelo Juízo impetrado (fls. 75/77). A PRR/1ª Região opinou pela concessão da ordem (fls. 80/85). É relatório. TRF 1ª REGIÃO/IMP.15-02-05 MAN FAPO D:\582832663.doc PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO fls.2 HABEAS CORPUS 378662820104010000/PI Processo na Origem: 129436320104014000 RELATOR(A) IMPETRANTE IMPETRANTE IMPETRADO PACIENTE PACIENTE PACIENTE PACIENTE PACIENTE PACIENTE : : : : : : : : : : DESEMBARGADORA FEDERAL ASSUSETE MAGALHÃES ALESSANDRA VANESSA ALVES THIAGO CARVALHO BARRETO LEITE JUIZO FEDERAL DA 2A VARA - PI MARCIA BASSIT LAMEIRO DA COSTA MAZZOLI REINALDO FELIPPE NERI GUIMARAES ALBERTO BELTRAME GERSON PENA EDELBERTO LUIZ DA SILVA VAGNER DE SOUZA LUCIANO VOTO A EXMª SRª DESEMBARGADORA FEDERAL ASSUSETE MAGALHÃES (RELATORA): – Como se viu do relatório, trata-se de habeas corpus preventivo, com pedido de liminar, impetrado em favor de MARCIA BASSIT LAMEIRO DA COSTA MAZZOLI E OUTROS, contra decisão proferida pelo ilustre Juízo Federal da 2ª Vara Seção Judiciária do Piauí, que, em antecipação de tutela, determinou o cumprimento de decisões judiciais – nos autos dos Procedimentos Ordinários 12943-63.2010.4.02.4000 e 12944-48.2010.4.01.4000 –, que impuseram à União, ao Estado do Piauí e ao Município de Teresina a obrigação de adotar, através do Sistema Único de Saúde – SUS, as providências atinentes ao fornecimento de medicamentos e à marcação de sessões de quimioterapia, em 5 (cinco) e 15 (quinze) dias, respectivamente, sob pena de prisão em flagrante das autoridades administrativas competentes, por crime de desobediência (fls. 45/47 e 49/50). As decisões impugnadas têm o seguinte teor: “Por estas considerações, com base no poder de cautela que me é concedido, defiro o pedido de antecipação dos efeitos da tutela para determinar que: a) a UNIÃO FEDERAL, o ESTADO DO PIAUÍ e o MUNICÍPIO DE TERESINA que providenciem, através do Sistema Único de Saúde - SUS, todas as medidas necessárias e o repasse das verbas atinentes, para o fornecimento do medicamento FRESUBIN SOYA FIBRE 45L/MÊS – DIETA ENTERAL nos termos de receituário médico de fls. 22, no prazo máximo de 05 (cinco) dias; b) em caso de descumprimento da medida no prazo acima deferido, será imposta multa de R$ 1.000,00 por dia de descumprimento, até a realização integral do tratamento médico adequado. Fica, desde já, a Defensoria Pública da União intimada para, no prazo máximo de 10 (dez) dias, informar a este Juízo acerca do cumprimento da medida ora determinada. Caso seja noticiado pela Defensoria Pública o descumprimento da medida antecipatória, fica desde já autorizado o encaminhamento de oficial de justiça, com o auxílio da POLÍCIA FEDERAL, para efetuar a prisão, em flagrante delito, das autoridades administrativas competentes, por restar configurado o crime de desobediência (art. 330, CP), sem prejuízo da posterior aplicação de pena pecuniária.” (fls. 45/46v) “Ante o exposto, DEFIRO A ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA para determinar a realização das sessões de quimioterapia, NO PRAZO DE 15 (QUINZE) DIAS, consoante solicitado em relatório médico, bem TRF 1ª REGIÃO/IMP.15-02-05 FAPO D:\582832663.doc PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO fls.3 HABEAS CORPUS 378662820104010000/PI como a concessão do medicamento necessário (Rituximabe na dose de 375mg/m2 a cada três semanas, durante oito meses, associado a quimioterapia, dose total de 659mg – vide documento fl. 21) para o tratamento da autora, no HOSPITAL SÃO MARCOS, segundo as recomendações médicas próprias (vide fl. 21), devendo as despesas correrem, a princípio, por conta da UNIÃO, que deverá descontar o que for gasto dos repasses obrigatórios ao ESTADO DO MARANHÃO, conforme autorização do art. 160, parágrafo único, da Constituição Federal. Em caso de descumprimento da medida no prazo acima deferido, será imposta multa de R$ 1.000,00 por dia de descumprimento, até a realização integral do tratamento médico adequado. Fica, desde já, a Defensoria Pública da União intimada para no prazo máximo de 15 (quinze) dias, informar a este Juízo acerca do cumprimento da medida ora determinada. Caso seja noticiado pela Defensoria Pública o descumprimento da medida antecipatória, fica desde já autorizado o encaminhamento de oficial de justiça, com o auxílio da POLÍCIA FEDERAL, para efetuar a prisão, em flagrante delito, da autoridade administrativa competente, por restar configurado o crime de desobediência (art. 330, CP), sem prejuízo da posterior aplicação de pena pecuniária.” (fls. 49/50v) A pretensão da impetrante encontra amparo no entendimento jurisprudencial do egrégio STJ e deste Tribunal, segundo o qual “o não cumprimento da ordem judicial, por servidor público, configura, em tese, crime de prevaricação (CP, art. 319), mas não cabe ao juiz cível determinar a prisão. Se a ordem não é cumprida, só resta ao juiz remeter ao Ministério Público cópias das peças que demonstrem a desobediência” (HC 2006.01.00.015690-9/PI, Rel. Des. Federal Tourinho Neto, 3ª Turma, DJU de 07/07/2006, p. 26). Nesse sentido, confiram-se os seguintes precedentes: “PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS. DESCUMPRIMENTO DE ORDEM JUDICIAL. PRISÃO DETERMINADA PELO JUÍZ CÍVEL. O juízo cível não pode determinar a prisão em flagrante do recalcitrante em desobedecer a sua ordem, pois não tem competência para decretar a prisão de quem quer que seja, salvo no caso de descumprimento de pensão alimentícia. Não cumprindo os pacientes a ordem judicial, caberia ao juiz remeter cópias das peças demonstrativas da desobediência ao Ministério Público (CPP, art. 40)”. (TRF/1ª Região, HC 2009.01.00.028423-0/PA, Rel. Des. Federal Tourinho Neto, 3ª Turma, unânime, e-DJF1 de 26/06/2009, p.123) “PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS PREVENTIVO. CRIME DE DESOBEDIÊNCIA (CÓDIGO PENAL, ART. 330). PRISÃO POR DESCUMPRIMENTO DE ORDEM JUDICIAL. JUÍZO CÍVEL. INCOMPETÊNCIA. ORDEM CONCEDIDA. 1. Em se tratando de uma prisão de natureza criminal, tem-se que não poderá ela ser decretada por um Juiz Federal no exercício da jurisdição civil. Precedentes do egrégio Superior Tribunal de Justiça e deste Tribunal Regional Federal. 2. Faltando competência ao MM. Juízo Federal impetrado para, investido de jurisdição cível, decretar a prisão do ora paciente pela eventual prática do crime de desobediência, afigura-se ser hipótese de concessão da ordem postulada na inicial. TRF 1ª REGIÃO/IMP.15-02-05 FAPO D:\582832663.doc PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO fls.4 HABEAS CORPUS 378662820104010000/PI 3. Ordem de habeas corpus concedida”. (TRF/1ª Região, HC 2008.01.00.065644-2/AP, Rel. Desembargador Federal I'talo Fioravanti Sabo Mendes, 4ª Turma, unânime, e-DJF1 de 13/03/2009, p. 65) “CRIMINAL. HC. DESOBEDIÊNCIA À ORDEM JUDICIAL. AMEAÇA CONCRETA DE PRISÃO EM FLAGRANTE. CABIMENTO DO WRIT. ANÁLISE DO TIPO DE DELITO QUE SE CONFIGURARIA E DISCUSSÃO DE MÉRITO DO MANDADO DE SEGURANÇA ORIGINÁRIO. IMPROPRIEDADE DO MEIO ELEITO. CONHECIMENTO DA IRRESIGNAÇÃO RESTRITO À AMEAÇA DE PRISÃO. ILEGALIDADE EVIDENCIADA. JUÍZO CÍVEL EM HIPÓTESE QUE NÃO DIZ RESPEITO A DEPOSITÁRIO INFIEL OU DEVEDOR DE ALIMENTOS. SALVOCONDUTO CONCEDIDO EM DEFINITIVO. WRIT CONHECIDO EM PARTE. ORDEM CONCEDIDA. Não se tratando de mera advertência genérica, mas, sim, de uma efetiva ameaça de prisão em flagrante por descumprimento de ordem judicial, cabível o habeas corpus. Impropriedade do meio eleito para a análise acerca do tipo de delito que se configuraria, em decorrência de tal descumprimento – se crime de responsabilidade ou prevaricação – tendo em vista a vedada análise de fatos e provas, que se faria necessária. Descabimento do writ para a discussão de mérito do mandado de segurança originário, pois deve o interessado valer-se dos recursos processuais de lei. Irresignação conhecida somente quanto à ameaça de prisão. Sobressai a ilegalidade da ameaça concreta de prisão, pois emanada de juízo no exercício da jurisdição cível, fora das hipóteses de depositário infiel ou de devedor de alimentos. Salvo-conduto concedido em definitivo, em relação à ordem de prisão em caso de descumprimento da determinação de pagamento dos meses de maio a agosto de 2001, em favor da Clínica de Reabilitação S/C Ltda., nos autos do Mandado de Segurança nº 2001.02.01.030971-8/RJ. Writ parcialmente conhecido e ordem concedida para, confirmando a liminar deferida, determinar, em definitivo, a expedição de salvoconduto em favor dos pacientes, nos termos do voto do Relator”. (STJ, HC 18610/RJ, Rel. Ministro Gilson Dipp, 5ª Turma, unânime, julgado em 27/08/2002, DJU de 04/11/2002, p. 219) De fato, as decisões impugnadas de fls. 45/47 e 49/50 evidenciam a ilegalidade da ameaça concreta de prisão, sob pena de crime de desobediência, nos termos do art. 330 do Código Penal, perpetrada por Juiz, no exercício da jurisdição cível, fora da hipótese de devedor de alimentos. Com razão, assevera a PRR/1ª Região: “O art. 5º, LXI, da Constituição Federal determina que ninguém será preso, senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente. No caso do Juiz cível, essa competência limita-se às hipósteses de prisão civil (art. 5º, LVII), que segundo interpretação recente do Supremo Tribunal Federal1, restringe-se ao caso de inadimplemento voluntário e inescusável de pensão alimentícia. 1 Súmula Vinculante 25: É ilícita a prisão civil de depositário infiel, qualquer que seja a modalidade do depósito. TRF 1ª REGIÃO/IMP.15-02-05 FAPO D:\582832663.doc PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO fls.5 HABEAS CORPUS 378662820104010000/PI Assim, em caso de eventual crime verificado no exercício da jurisdição cível, as cópias das peças informativas devem ser remetidas ao Ministério Público, para a formação da opinio delicti (art. 40, CPP)2. É nesse sentido o entendimento do Superior Tribunal de Justiça: “(...) Não se tratando de mera advertência genérica, mas, sim, de uma efetiva ameaça de prisão em flagrante por descumprimento de ordem judicial, cabível o habeas corpus. Impropriedade do meio eleito para a análise acerca do tipo de delito que se configuraria, em decorrência de tal descumprimento – se crime de responsabilidade ou prevaricação – tendo em vista a vedada análise de fatos e provas, que se faria necessária. Descabimento do writ para a discussão de mérito do mandado de segurança originário, pois deve o interessado valer-se dos recursos processuais de lei. Irresignação conhecida somente quanto à ameaça de prisão. Sobressai a ilegalidade da ameaça concreta de prisão, pois emanada de juízo no exercício da jurisdição cível, fora das hipóteses de depositário infiel ou de devedor de alimentos. Salvoconduto concedido em definitivo, em relação à ordem de prisão em caso de descumprimento da determinação de pagamento dos meses de maio a agosto de 2001, em favor da Clínica de Reabilitação S/C Ltda., nos autos do Mandado de Segurança n° 2001.02.01.0309718/RJ. Writ parcialmente conhecido e ordem concedida para, confirmando a liminar deferida, determinar, em definitivo, a expedição de salvo-conduto em favor dos pacientes, nos termos do voto do Relator.”(STJ, HC 200101172078, GILSON DIPP, STJ - QUINTA TURMA, 04/11/2002) “(...)1. A decisão proferida por Juízo Cível, no sentido de que se efetue a prisão em flagrante da pessoa responsável pela agência bancária, caso ainda persista o descumprimento da determinação judicial relativa à restituição de valores depositados em fundos de investimentos, por crime de desobediência, constitui constrangimento ilegal. 2. Essa modalidade prisional – prisão em flagrante – é incompatível com a prévia determinação por escrito da autoridade judicial. Inteligência dos arts. 301 e 304 do CPP e art. 5º, inc. LXII, da CF. 3. Embora compreensível a vontade do magistrado, no exercício da jurisdição cível, de querer ver satisfeita em sua plenitude a prestação jurisdicional, a ameaça efetiva de prisão, quando não se tratar das hipóteses de depositário infiel é devedor de alimentos, configura ilegalidade, por ausência de previsão legal. 4. Ordem concedida”. (STJ, HC 200500513243, ARNALDO ESTEVES LIMA, STJ - QUINTA TURMA, 22/08/2005) Ademais, a prisão a ser decretada por eventual descumprimento de ordem judicial teria natureza de flagrante delito, o que se mostra inteiramente incompatível com a hipótese dos autos, a reclamar apurada investigação acerca das razões do descumprimento. Cumpre frisar, ainda, que o servidor, nas circunstâncias descritas, não comete crime de desobediência e, sim, se for o caso, prevaricação, cuja configuração exige o exame de outras elementares” (fls. 83/85). 2 Art. 40. Quando, em autos ou papéis de que conhecerem, os juízes ou tribunais verificarem a existência de crime de ação pública, remeterão ao Ministério Público as cópias e os documentos necessários ao oferecimento da denúncia. TRF 1ª REGIÃO/IMP.15-02-05 FAPO D:\582832663.doc PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO fls.6 HABEAS CORPUS 378662820104010000/PI Ante o exposto, concedo a ordem impetrada, ratificando a liminar, para determinar a expedição de salvo-conduto em favor dos pacientes. É o voto. TRF 1ª REGIÃO/IMP.15-02-05 FAPO D:\582832663.doc