Assistência Farmacêutica. Fornecimento de Medicamento

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NOTA TÉCNICA Nº 006/2012
Objeto: Promotoria de Justiça de Defesa da Saúde da Comarca de Contagem.
Componente Especializado da Assistência Farmacêutica (CEAF). Protocolos Clínicos e
Diretrizes Terapêuticas (PCDT). Prescrição. Médico especialista do SUS. Exigência do
Gestor SUS. Flexibilização. Decreto nº 7.508, de 2011. Portaria GM nº 2.981/2009.
1. Relatório
Cuida-se de consulta (via ofício nº 871/2012), elaborada pela
Promotoria de Justiça de Defesa da Saúde da Comarca de Contagem, cadastrada no
Sistema de Registro Único – SRU como Procedimento de Apoio a Atividade Fim – PAAF
sob o nº 0024.12.005861-5, versando sobre a regularidade de exigência, por parte do
Município de Contagem, de que o formulário de solicitação para fornecimento de
medicamentos especiais seja preenchido somente por médico especialista do Sistema
Único de Saúde (SUS), conforme disposição expressa do artigo 28, § 2º do Decreto nº
7.508, de 28 de junho de 2011.
2. Do Componente Especializado da Assistência Farmacêutica (CEAF)
O Componente Especializado da Assistência Farmacêutica (CEAF),
criado em 1982 como “Medicamentos de Dispensação Excepcional”, caracteriza-se
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como uma estratégia da Política de Assistência Farmacêutica, que tem por objetivo
disponibilizar medicamentos para o tratamento de doenças específicas.
Busca,
ainda,
a
garantia
da
integralidade
do
tratamento
medicamentoso, no nível ambulatorial, cujas linhas de cuidado estão definidas em
Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas (PCDT), publicados pelo Ministério da
Saúde.
A dispensação dos medicamentos ocorre por meio das farmácias das
Gerências Regionais de Saúde (GRS) ou Superintendências Regionais de Saúde (SRS)
em todo estado, sob a responsabilidade da Superintendência de Assistência
Farmacêutica da Secretaria de Estado de Saúde de Minas Gerais(SAF/SES/MG).
A Portaria GM nº 2.981, de 26 de novembro de 2009, regulamenta, no
âmbito do Sistema Único de Saúde, o Componente Especializado da Assistência
Farmacêutica, integrante do Bloco de Financiamento da Assistência Farmacêutica.
Os medicamentos do referido Componente estão divididos em grupos
com características, responsabilidades e formas de organização distintas, conforme
Portaria supracitada, a saber:
Grupo 1 - Medicamentos sob responsabilidade da União
Grupo 2 - Medicamentos sob responsabilidade dos Estados e Distrito Federal
Grupo 3 - Medicamentos sob responsabilidade dos Municípios e Distrito Federal
Os medicamentos do Grupo 1 devem ser dispensados somente para as
doenças (CID-10) contempladas no Componente e divide-se em: Grupo 1A -
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medicamentos com aquisição centralizada pelo Ministério da Saúde e Grupo 1B medicamentos adquiridos pelos estados com transferência de recursos financeiros pelo
Ministério da Saúde, na modalidade Fundo a Fundo. A responsabilidade pelo
armazenamento, distribuição e dispensação dos medicamentos do Grupo 1 (1A e 1B) é
das secretarias estaduais de saúde.
Considerando os medicamentos dos Grupos 1, 2 e 3, o CEAF é
composto por 150 fármacos em 310 apresentações farmacêuticas indicados para o
tratamento das diferentes fases evolutivas das doenças contempladas.
O financiamento para aquisição dos medicamentos do Componente
Especializado está diretamente relacionado ao Grupo de referência.
Os medicamentos pertencentes ao Grupo 1 são custeados pelo
Ministério da Saúde sob duas formas :
- Aquisição centralizada
- Transferência de recursos
A aquisição dos medicamentos do Grupo 1 A acontece de forma
centralizada pela União e são repassados à Secretaria Estadual de Saúde de Minas
Gerais (SES - MG) conforme programação realizada.
O financiamento dos medicamentos do Grupo 1B é realizado com base
na emissão e aprovação da Autorização de Procedimento de Alto Custo (APAC) emitida
pela SES-MG, vinculada à efetiva dispensação dos medicamentos. Trimestralmente, o
Ministério da Saúde publica portaria com os valores a serem ressarcidos à SES-MG
apurados com base na média das APAC emitidas e aprovadas, conforme critérios e
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valores de referência. Sua aquisição e distribuição é de competência da Secretaria
Estadual de Saúde.
Com relação aos medicamentos do Grupo 2, a responsabilidade pela
programação, aquisição, armazenamento e distribuição é das Secretarias Estaduais de
Saúde, assim como as Secretarias Municipais de Saúde assumem a responsabilidade
pelos medicamentos do Grupo 3 desde a sua aquisição até a distribuição, estabelecida
em ato normativo específico que regulamenta o Componente Básico da Assistência
Farmacêutica.
3. Do fluxo para aquisição do medicamento.
O acesso aos medicamentos do CEAF envolve as etapas de solicitação,
avaliação, autorização, dispensação dos medicamentos e renovação da continuidade do
tratamento, devidamente elencados pela Portaria GM nº 2.981/2009.
3.1. Da solicitação
A solicitação é caracterizada pela requisição do medicamento pelo
paciente ou seu responsável na Unidade de Saúde designada pelo gestor estadual,
exigindo-se obrigatoriamente os seguintes documentos do paciente:
I - cópia do Cartão Nacional de Saúde (CNS);
II - cópia de documento de identidade – caberá ao responsável pelo
recebimento da solicitação atestar a autenticidade de acordo com o documento
original;
III - Laudo para Solicitação, Avaliação e Autorização de Medicamentos do
Componente
Especializado
adequadamente preenchido;
da
Assistência
Farmacêutica
(LME),
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IV - prescrição médica devidamente preenchida;
V - documentos exigidos nos Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas
publicados na versão final pelo Ministério da Saúde, conforme a doença e o
medicamento solicitado; e
VI - cópia do comprovante de residência.
3.2. Da Avaliação e Autorização
A avaliação da documentação supracitada deverá ser realizada por
profissional de saúde com ensino superior completo, registrado em seu devido
conselho de classe e designado pelo gestor estadual, e que seja familiarizado com as
regras do Componente Especializado da Assistência Farmacêutica, e que conheça as
recomendações dos Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas publicados pelo
Ministério da Saúde.
Nesse sentido, o autorizador deverá ser um profissional de nível
superior completo, preferencialmente da área da saúde, designado pelo gestor
estadual. Referido profissional deverá realizar a autorização do Laudo Médico (LME)
somente após o deferimento da avaliação mencionada anteriormente.
3.4. Da dispensação
Conforme legislação existente, a dispensação do medicamento deverá
ser efetivada somente após a autorização do processo. No ato da dispensação deverá
ser emitido o Recibo de Medicamentos (RME) devidamente preenchido e assinado. Os
RME e os documentos necessários para a solicitação dos medicamentos no âmbito do
SUS devem ser mantidos em arquivo para fins de possíveis auditorias.
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A dispensação do medicamento poderá ser realizada para mais de um
mês de tratamento, considerando a peculiaridade de cada estado e estrutura da
Assistência Farmacêutica local, dentro do limite de vigência da APAC (três
competências) e respeitadas as exigências legais existentes.
3.5. Da Renovação
A renovação é a etapa necessária para a continuidade do tratamento do
paciente, sendo exigida a seguinte documentação:
I - Laudo para Solicitação, Avaliação e Autorização de Medicamentos do
Componente
Especializado
da
Assistência
Farmacêutica
(LME),
adequadamente preenchido, de acordo com as instruções apresentadas no
Anexo V desta Portaria;
II - prescrição médica contendo as informações exigidas na legislação vigente;
e
III - todos os documentos para monitoramento do tratamento estabelecidos nos
Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas publicados na versão final pelo
Ministério da Saúde, conforme a doença e o medicamento solicitado.
O período para realização de referida renovação pelo paciente ou
responsável será de três competências, quando se tratar de doença crônica com
necessidade de tratamento contínuo.
Da mesma forma, a documentação apresentada deve ser avaliada
tecnicamente, para posterior autorização e dispensação.
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Em diligência realizada junto à Secretaria Estadual de Saúde de Minas
Gerais, foi informado a este Centro de Apoio que a gestão do CEAF é de
responsabilidade da Superintendência de Assistência Farmacêutica (SAF), Diretoria de
Medicamentos de Alto Custo (DMAC) e que a dispensação dos medicamentos do
Componente Especializado ocorre nas Farmácias das 28 (vinte e oito) Regionais de
Saúde (GRS/SRS), em todo Estado.
Informa, ainda, que a dispensação dos medicamentos, no caso dos
municípios, obedece ao fluxo definido pela Superintendência/Gerência Regional de
Saúde (SRS/GRS)
de referência, que detém sob sua responsabilidade todos os
documentos e informações referentes aos processos administrativos de solicitação de
medicamento de alto custo, bem como os recibos das referidas dispensações.
De acordo com a divisão de responsabilidades supramencionada, a
Superintendência Regional de Saúde (SRS) Belo Horizonte recebe as solicitações de
medicamentos do CEAF oriundas do município de Contagem e encaminha toda a
documentação reunida para a Superintendência de Assistência Farmacêutica da
SES/MG para a realização das etapas de avaliação e autorização dos processos
administrativos.
Assim, a dispensação dos medicamentos do CEAF efetuada pela SRS
Belo Horizonte aos usuários do Sistema Único de Saúde do município de Contagem,
será realizada somente mediante avaliação e autorização pela SAF/SES-MG das
solicitações e documentações devidamente encaminhadas.
4. Da prescrição por profissional médico especialista.
A respeito dos protocolos clínicos e diretrizes terapêuticas, temos que:
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Os Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas têm o objetivo de
estabelecer claramente os critérios de diagnóstico de cada doença, o
algoritmo de tratamento das doenças com as respectivas doses adequadas e os
mecanismos para o monitoramento clínico em relação à efetividade do
tratamento e a supervisão de possíveis efeitos adversos. Observando ética e
tecnicamente a prescrição médica, os PCDT, também, objetivam criar
mecanismos para a garantia da prescrição segura e eficaz. Portanto, no
âmbito do CEAF, os medicamentos devem ser dispensados para os pacientes
que se enquadrarem nos critérios estabelecidos no respectivo Protocolo
Clínico e Diretriz Terapêutica.” 1
Nesse sentido, importante trazer à colação trecho do livro “Da
excepcionalidade às linhas de cuidado: o Componente Especializado da Assistência
Farmacêutica/MS/2010”, a saber:
A Portaria GM/MS nº 2.577/2006 estabelecia em seu Art. 14 que a
autorização do fornecimento de medicamentos pelo gestor estadual deveria
ocorrer somente mediante apresentação do LME preenchido e assinado por
profissional médico com especialidade compatível e reconhecida no referido
órgão de classe. Além disso, em seu Art. 15 descrevia que havia a
possibilidade de fornecimento de mais de um medicamento por LME, desde
que prescritos pelo mesmo médico assistente especialista ou, nos casos em
que o paciente estivesse em acompanhamento por mais de um médico
assistente especialista, poderia haver a emissão de mais de um laudo.
Apesar de o Componente possuir medicamentos para tratamento de doenças
com baixa prevalência ou com uma linha de cuidado complexa, também tem
padronizados medicamentos para doenças altamente prevalentes, como
1
Extraído do site do Ministério da Saúde: www.saude.gov.br
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osteoporose, dislipidemias, entre outras, cujo diagnóstico também ocorre no
nível da atenção primária à saúde.
Assim, no momento da construção do CEAF houve o cuidado de não
restringir o acesso a medicamentos somente pela prescrição por médicos
especialistas. O referencial teórico que deve ser utilizado para designar a
especialidade médica deve ser embasado, tão somente, nos casos de
obrigatoriedade declarada no PCDT da doença em questão. (grifo nosso)
Assim, nos Protocolos, foram definidos termos importantes que devem ser
atentados, entre eles “recomendação”, “deve” e “exige”. “Recomendação”
não significa obrigação, mas sim preferência; ao contrário da terminologia
“deve” ou “exige”, que significa exigência. No momento da revisão e
elaboração
de
novos
PCDT,
ao
descrever
especialistas,
serviços
especializados, polos de aplicação ou centros de referência, o Ministério da
Saúde atentou-se para o fato de determinar a obrigatoriedade de especialistas
somente nos casos de doenças cujo diagnóstico ou terapêutica exigem,
necessariamente, nível de atenção secundário à saúde, como por exemplo, no
tratamento da esclerose lateral amiotrófica.
Deste modo, caso o PCDT não faça restrição de diagnóstico ou
acompanhamento do paciente por especialistas, o preenchimento do
LME e a prescrição da receita médica poderão ser realizados por
médicos que atuem em qualquer nível de atenção, desde que
devidamente registrados em seu Conselho de Classe.” (grifo nosso)
Ademais, segundo Ministério da Saúde, o objetivo majoritário do CEAF é
garantir tratamento em todas as fases evolutivas das doenças contempladas e, para
isso, fez-se necessário uma avaliação sobre o tratamento de tais doenças, com base
nos Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas. Este olhar foi construído, também,
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levando-se em consideração a abordagem terapêutica na atenção básica, visto que
muitas doenças contempladas no CEAF requerem, inicialmente, uma abordagem em
nível básico da assistência.
Portanto, fica clara a flexibilização por parte do Ministério da Saúde, da
realização de prescrição de medicamentos do Componente Especializado, respeitados
os Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas existentes, tanto por médicos
especialistas quanto por médicos não especialistas que atuem no Sistema Único de
Saúde em qualquer nível de atenção à saúde.
Nesse contexto, interessante mencionar a Portaria GM nº 2.928, de 12
de dezembro de 2011, que dispõe sobre os §§ 1º e 2º do artigo 28 do Decreto nº
7.508/2011, permitindo, ainda, a realização da prescrição de medicamentos por
médicos do setor privado da saúde.
Desta forma, doravante, poderão ser aceitas documentações oriundas
de serviços privados de saúde no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS), desde
que respeitadas as regulamentações dos Componentes da Assistência Farmacêutica
definidas pelo SUS e as pactuações realizadas nas Comissões Intergestores Tripartite
(CIT) e Bipartite (CIB).
Nesta seara, em Minas Gerais, por ocasião do Fórum Permanente de
Direito à Saúde, na sua 4ª edição, foi aprovado o Enunciado nº 26, anterior à edição
da supracitada Portaria, abordando a temática em questão, a saber:
ENUNCIADO 26 – Os incisos I, II e IV do artigo 28 do Decreto nº 7.508,
de 28 de junho de 2011, devem ser interpretados com ponderação e respeito
ao princípio da universalidade e integralidade, de forma que a prescrição de
medicamentos, por profissional de saúde que não esteja credenciado ao
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SUS, poderá ser admitida, observando preferencialmente os Protocolos
Clínicos e Diretrizes Terapêuticas. (FORUM PERMANENTE DE
DIREITO À SAÚDE – MINAS GERAIS – 4º Curso de Direito à Saúde,
28/11/2011).
No que tange à solicitação sobre existência de norma federal que
trate do disposto no art. 28, § 2º do Decreto nº 7.508/2011, em diligência realizada
junto ao Ministério da Saúde, foi informado a este Centro de Apoio sobre a existência
da supracitada Portaria GM nº 2.928/2011.
Por último, importante ressaltar o princípio constitucional da
universalização de acesso às ações e serviços de saúde e a aceitação, pelo mesmo
Ministério da Saúde, de prescrições privadas no tocante ao Programa Farmácia
Popular, o que reforça o entendimento de eventual ilegalidade do artigo 28 do
supracitado Decreto nº 7.508, de 2011.
5. Conclusão
Ante o exposto, tendo em vista os argumentos técnico-jurídicos acima
esposados, este Centro de Apoio Operacional (CAO-SAUDE) sugere a expedição de
RECOMENDAÇÃO, pelo Ministério Publico Estadual, ao Secretário Municipal de Saúde
de Contagem, para que providencie, respeitados os PCDT existentes, a adequação no
que se refere à prescrição de medicamentos do Componente Especializado da
Assistência Farmacêutica, podendo ser feita, também, por profissionais médicos
especialistas da saúde local, conforme regramento apontado.
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É a presente Nota Técnica.
Belo Horizonte, 28 de agosto de 2012.
Cláudia Luiza S. Felício
Analista MP (Saúde Pública)
MAMP 4336
GILMAR DE ASSIS
Promotor de Justiça
Coordenador do CAO-Saúde
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