Universidade Estadual de Campinas. Claudio Qureshi, RA 137920 Instituto de Matemática, Estatı́stica e Computação Cientı́fica. Tarefas do dia 14 de Março. Curso de Curvas algébricas 2013. Neste trabalho vamos resolver as 4 tarefas do curso de curvas algébricas. Tarefa 1. Se f ∈ k[x1 , x2 , . . . , xn ] é um polinómio não nulo e k um corpo infinito então #(An \ Z(f )) = #k. Vamos começar provando um simples resultado em forma de lema. Lema 1. Se k é infinito e f ∈ k[x1 , . . . , xn ] verifica Z(f ) = An então f ≡ 0 (ou seja, se f se anula em todos os pontos então é o polinomio nulo). Prova. Faremos a prova por indução. Para n = 1 é claro, pois um polinómio não nulo em uma variável com coeficientes num corpo não pode ter mais raizes que seu grau. para n−1 e seja f ∈ k[x1 , . . . , xn ]. Podemos escrever f (x1 , . . . , xn ) = PNSuponhamos que vale k arbitrário a = (a1 , . . . , an−1 ) ∈ An−1 e o k=0 fk (x1 , . . . , xn−1 )xn . Consideremos um ponto PN polinómio em uma variável g(x) = f (a, x) = k=0 fk (a)xk . Por hipótese g(x) = 0 ∀x ∈ k e como vale o resultado para n = 1 temos que g debe ser o polinomio nulo. Ou seja que seus coeficientes fk (a) = 0 para k = 0, 1, . . . , N , mais como o a ∈ An−1 é arbitrário, aplicando a hipótese inductiva temos que fk são polinomios nulos para todo k, o qual implica que f ≡ 0 como queriamos provar. Observação: O Lema 1 é falso se k não for infinito, por exemplo, se k = Fq o corpo finito com q elementos então o polinomio f (x1 , . . . , xn ) = (xq1 − x1 )(xq2 − x2 ) . . . (xqn − xn ) verifica Z(f ) = An mais f não é o polinomio nulo. Podemos provar agora uma versão fraca da Tarefa 1. Versão fraca da tarefa 1. Se f ∈ k[x1 , x2 , . . . , xn ] é um polinómio não nulo e k um corpo infinito então An \ Z(f ) é um conjunto infinito. Prova. Suponhamos por absurdo que An \Z(f ) = {P1 , . . . , Ph } seja um conjunto finito. Seja Pi = (pi1 , . . . , pin ) para 1 ≤ i ≤ h e consideremos o polinomio g(x1 , . . . , xn ) = f (x1 , . . . , xn ) · h Y (X1 − pi1 ) . i=1 Temos que Z(g) = An e pelo Lema 1 resulta que g ≡ 0 o qual implica que f ≡ 0 como queriamos provar. Prova da versão original da Tarefa 1. Pela versão fraca temos que An \ Z(f ) é infinito, então podemos tomar P = (a1 , . . . , an ) ∈ An \ Z(f ) com P 6= (0, . . . , 0). Consideremos o polinomio em uma variável p(t) = f (a1 t, . . . , an t). Como p(1) = f (P ) 6= 0 então p não pode ser o polinomio nulo e portanto o seu conjunto de zeros Z(p) tem que ser finito. Observar agora que se t ∈ k \ Z(p) então f (tP ) = p(t) 6= 0 e portanto temos uma função bem definida: ϕ : k \ Z(p) → An \ Z(f ) t 7→ tP Esta função é injetiva pois P 6= (0, . . . , 0) e portanto #(An \ Z(f )) ≥ #(k \ Z(p)) (1) Como k é infinito e Z(p) finito é fácil de ver1 que #(k \ Z(p)) = #k, outro resultado mais clássico e menos trivial de aritmética transfinita e que #k = #k n = #An para k infinito. Com estas observações e utilizando (1) temos que #k = #An ≥ #(An \ Z(f )) ≥ #(k \ Z(p)) = #k Logo, pelo Teorema de Cantor-Bernstein-Schroeder (antisimetria de ≥) resulta que #(An \ Z(f )) = #k como queriamos provar. 1 Se Z(p) = {a1 , . . . , ah }, como k é infinito podemos completar Z(p) a um conjunto infinito numerável Z = {a1 , a2 , . . .} onde an 6∈ {ai : i < n}, ∀n > 1. A função f : A → A \ Z(p) tais que f (x) = x se x ∈ A \ Z resulta uma biyeção entre ambos conjuntos. ai+h se x = ai A segunda tarefa é essencial na prova do Teorema * visto em aula, o qual a sua vez foi usado para probar o Nullstellensatz. Tarefa 2. Sejam f ∈ k[X, Y ] um polinómio de grau N ≥ 1 e Z = X − aY com a ∈ k. Probar que f pode ser escrito da forma f = c(a)Y N + h(Z, Y ) onde degY h < N determinando explı́citamente quem é c(a). PN Prova. Como deg(f ) = N , podemos escrever f (X, Y ) = i=0 Fi (X, Y ) onde os Fi (X, Y ) são polinomios homogéneos de grau i com FN (X, Y ) não nulo. P k N −k Seja FN (X, Y ) = N e consideremos o polinomio em uma variável c(t) = k=0 ak X Y PN k FN (t, 1) = k=0 ak t , como FN (X, Y ) é não nulo o mesmo acontece com c(t). Como o mapa (X, Y ) 7→ (Z, Y ) é um isomorfismo linear (onde Z = X − aY ) então o polinomio Fi (Z + aY, Y ) seguirá sendo homogéneo de grau i nas variáveis Z e Y , em particular seu grau em Y é menor que N para i < N e podemos escrever: f (Z + aY, Y ) = FN (Z + aY, Y ) + h0 (Y, Z) (2) com degY h0 < N . Como (Z + aY )k = ak Y k + térmos de menor grau em Y , então temos que: N N X X k N −k ak ak Y k Y N −k + h1 (Y, Z) (3) ak (Z + aY ) Y = FN (Z + aY, Y ) = k=0 k=0 onde degY h1 < N . Usando (2) e (3), e definindo h(Y, Z) = h1 (Y, Z) + h2 (Y, Z) que tem degY h < N (pois degY h1 < N e degY h2 < N ) temos que: f (Z + aY, Y ) = c(a)Y N + h(Y, Z) onde c(a) = PN k=0 ak ak . Corolário. Nas mesmas hipóteses da Tarefa 2, se k é infinito então existem infinitos valores de a ∈ k tais que c(a) 6= 0. Prova. Vimos que c(a) = FN (a, 1) onde FN é o polinómio homogeneo de maior grau em f e como FN e não nulo o mesmo acontece com c portanto só pode ter um número finito de raices. Logo se k é infinito o mesmo acontece com k \ Z(c). A tarefa 3 consiste em terminhar a prova do Teorema * a partir do resultado obtido na tarefa 2. Em aula probamos Nullstellensatz a partir do Teorema *, de esse jeito ficaria completada a prova do Nullstellensatz. Tarefa 3. Completar a prova para o caso n = 2 do Teorema *. Resumo do visto na aula: Teorema *. Se k é algébricamente fechado e J ( k[X1 , . . . , Xn ] ⇒ Z(J) 6= ∅. 1. Provamos que podemos supor que J = m / k[X1 , . . . , Xn ] é um ideal maximal (onde X1 , . . . , Xn são indeterminadas). 2. Consideramos el mapa composição k ,→ k[X1 , . . . , Xn ] k[X1 , . . . , Xn ] = k[x1 , . . . , xn ] =: L m onde xi = Xi + m, como m é maximal então L resulta um corpo. 3. Pelo fato anterior basta provar que k ,→ L é algébrica (pois usando logo que k é algébricamente fechado temos k = L o qual alcanza para concluir a prova do Teorema como vimos em aula). (a) Para n = 1: Probado completamente na aula. (b) Para n = 2: Consideramos a cadeia k ⊆ k[x] ⊆ L = k[x][y] onde x = X + m e y = Y +P m. Chegamos a provar que existe um polinomio em duas variáveis f (X, Y ) = di=0 ai (X)Y i com ad (x) 6= 0 tais que F (x, y) = ad (x)y d + . . . + a1 (x)y + a0 (x) = 0 Culminação do Teorema * para n = 2. Observar que k algébricamente fechado implica trivialmente k finito2 , logo pelo corolário da tarefa 2 aplicado ao polinomio f (X, Y ) existem a, a0 ∈ k distintos tais que c(a) 6= 0 e c(a0 ) 6= 0 onde f (Z + aY, Y ) = c(a)Y N + h(Z, Y ) (4) com degY h < N e Z = X − aY como na Tarefa 2. Como por um escalar P −1 multiplicar i não altera o grau podemos escrever c(a)−1 · h(Z, Y ) = N b (X)Y com bi (X) ∈ k[X] i i=0 (onde bN −1 não é necessáriamente não nulo), tomando clases na equação (4) e definindo z := Z + m = (X + m) − am = x − ay temos a equação y N + bN −1 (z)y N −1 + . . . + b1 (z)y + b0 (z) = 0 2 Se k é finito então o polinómio Q a∈k (x − a) + 1 tem grau positivo e não tem raizes. o qual implica que y é um inteiro de k[z], como L = k[x, y] = k[z, y] = k[z][y] resulta que a extensão L|k[z] é inteira3 . Logo podemos utilizar o truque visto em aula, utilizar que L é um corpo e como z é não nulo4 podemos considerar o elemento z −1 ∈ L que deve ser inteiro e como vimos na aula esto implica que z é algébrico sobre k. O mesmo razonamento pegando a0 em lugar de a prova também que z 0 = x − a0 y é z−z 0 0 algébrico sobre k. Logo y = a−a 0 é algébrico sobre k (pois a − a é um escalar não nulo) e x = z − ay também é algébrico sobre k (pois z e y são algébricos sobre k e a um escalar). Como x e y são algébricos sobre k isto implica que a extensão k[x, y] também tem que ser algébrica sobre k como queriamos provar. A última tarefa surgiu da observação que para corpos k algébricamente fechados, se J1 , J2 / k[X1 , . . . , Xn ] são dois ideais radicais tais que Z(J1 ) = Z(J2 ) então J1 = J2 (conseqüencia direita do Nullstellensatz). A pregunta natural é que aconteçe quando o corpo k não é algébricamente fechado. Tarefa 4. Para k = Q, R, Fq e n = 1, 2 dar exemplos de ideais radicais J1 , J2 / k[x1 , . . . , xn ] distintos tais que Z(J1 ) = Z(J2 ). Exemplo em k = Q ou R e n = 1: Neste casso podemos tomar J1 = (x2 + 1)k[x] e J2 = k[x], claramente são ideais distintos (pois x2 + 1 não é invertı́vel em k[x]) e Z(J2 ) = ∅ pois 1 ∈ J2 e Z(J1 ) = ∅ pois x2 + 1 não tem raizes em k[x] para k = Q ou R. Só resta provar que são radicais, J2 é claro, para ver que J1 é radical basta observar que como x2 + 1 é irreductivel sobre k[x] (pois é de grau menor que 4 e não tem raizes) então J1 é um ideal primo e em particular radical. Observação. Se pegásemos o polinomio x2 − 2 em lugar de x2 + 1 então o argumento √ continua funcionando para o casso k = Q mais não para k = R pois x2 − 2 tem raices ± 2 em R. O primeiro exemplo não tem muita graça pois escencialmente foi discutido na aula. Vamos mostrar um exemplo diferente, onde o conjunto de zeros seja não vazio. Exemplo em k = Q ou R e n = 1 no casso em que o conjunto de zeros seja não vazio. Neste casso podemos considerar J1 = f (x)k[x] e J2 = g(x)k[x] onde 3 É conseqüencia de que os inteiros de k[z] contidos em L formam um anél. Aqui temos um detalhe, observar que se y = 0 então caimos no caso n = 1 que já foi provado em aula, de esse jeito podemos supor que y 6= 0. Como vimos no corolário da tarefa 2 temos infinitas escolhas para a e a0 então podemos escolher a e a0 tais que z = x − ay e z 0 = x − a0 y sejam ambos não nulos. 4 f (x) = (x2 + 1)(x − 1) e g(x) = x − 1. Temos que Z(J1 ) = Z(f (x)) = {1} pois x2 + 1 não tem raizes em k e Z(J2 ) = Z(g(x)) = {1} portanto Z(J1 ) = Z(J2 ). Também aqui J1 6= J2 pois f e g não são associados (pois x2 + 1 não é invertı́vel). Só resta ver que são ideais radicais. Com efeito, para J2 é claro, pois como g(x) é irreductivel então J2 é primo e em particular radical. Para J1 podemos razocinar do seguinte jeito, se p(x) ∈ k[x] é um polinomio tais que pn (x) ∈ J1 então pn (α) = 0 para α = 1, i, −i (considerando p(x) como polinómio nos complexos), o qual implica que p(α) = 0 para α = 1, i, −i e portanto existe um polinomio q(x) (com coeficientes complexos) tais que p(x) = (x2 + 1)(x − 1)q(x). Em k[x] temos divisão com resto, portanto fazendo a divisão com resto entre p(x) e o polinomio f (x) temos que p(x) = (x2 + 1)(x − 1)q 0 (x) + r(x) onde q 0 (x) e r(x) são polinomios em k[x] e deg r(x) < 3. Restando as duas igualdades que involucram p(x) e isolando r(x) temos que r(x) = (x2 + 1)(x − 1)(q(x) − q 0 (x)). Como deg r(x) < 3 isto só é possivel se q(x) = q 0 (x) o qual prova que q(x) ∈ k[x] e portanto p(x) ∈ J1 . Logo J1 é um ideal radical. Exemplo em k = Fq e n = 1 Consideremos o grupo multiplicativo formado pelos elementos não nulos (F∗q , ·), pelo Teorema de Lagrange xq−1 = 1 para todo x ∈ F∗q o qual implica xq = x. Claramente esta última igualdade também é certa para x = 0 e por tanto Z(X q − X) = k, também é verdade que Z(0) = k; logo podemos pegar J1 = (X q − X)Fq [X] e J2 = (0). Temos que Z(J1 ) = Z(J2 ) mais J1 6= J2 , só resta ver que são ideais radicais. O ideal J2 = (0) é radical Q pois k[X] é um dominio de integridade, em quanto a J1 observemos que X q − X = a∈Fq (X − a) (pois todo elemento de Fq é raiz de X q − X que são q elementos e deg(X q − X) = q). Logo se f ∈ k[X] verifica f n ∈ J1 para algúm n ≥ 1 temos que f n (a) = 0 ∀a ∈ Fq ⇒ f (a) = 0 ∀a ∈ Fq ⇒ (X q − X)|f (X) ⇒ f ∈ J1 ; portanto o ideal J1 também é radical. Exemplo para k = Q, R e n = 2. Para o casso n = 2 podemos considerar o polinômio em duas variaveis f (X, Y ) = X 2 + Y 2 + 1. Como x2 + y 2 + 1 > 0 para todo x, y ∈ k temos que Z(f ) = ∅, logo podemos pegar como ideais J1 = (X 2 + Y 2 + 1)k[X, Y ] e J2 = k[X, Y ] que são ideais distintos onde Z(J1 ) = Z(J2 ) = ∅. Agora vamos ver que são ideais radicais. Para o ideal J2 é claro, para o ideal J1 basta ver que f (X, Y ) seja irreductivel (pois nesse caso o ideal J1 será primo e portanto radical). Vamos ver então que f é irreductivel. Com efeito, suponhamos que f (X, Y ) = g(X, Y )h(X, Y ) com g e h polinomios não constantes em k[X, Y ]. Temos que degX g +degX h = degX f = 2, logo degX g = 0, 1 ou 2. Se degX g = 0 então g(X, Y ) = s(Y ) e h(X, Y ) = a(Y )X 2 + b(Y )X+c(Y ), logo comparando coeficientes de gh com f temos que s(Y )a(Y ) = 1, s(Y )b(Y ) = 0 e s(Y )c(Y ) = Y 2 + 1. Como Y 2 + 1 é irreductivel em k[Y ] e deg s = degY g > 0 (pois g é não constante) temos que s(Y )c(Y ) = Y 2 + 1 ⇒ s(Y ) = α(Y 2 + 1) e c(Y ) = β onde α, β ∈ k com αβ = 1. Mais a primeira equação s(Y )a(Y ) = 1 implica que s(Y ) = α(Y 2 +1) é invertivel em k[Y ] o qual é absurdo. Logo degX g = degX h = 1, e por um razonamente análogo degY g = degY h = 1 e podemos escrever g(X, Y ) = a1 X + b1 Y + c1 e h(X, Y ) = a2 X + b2 Y + c2 com ai , bi escalares não nulos e c1 e c2 escalares. Vamos Comparar novamente coeficientes de f (X, Y ) e g(X, Y )h(X, Y ), comparando os coeficientes de X 2 e o termo independente temos que a1 a2 = 1 e c1 c2 = 1 o qual implica que a1 , a2 , c1 e c2 são diferentes de zero, mais comparando o coeficiente em X temos que a1 c2 = 0 o qual é absurdo e portanto o polinômio f (X, Y ) será irreductivel como queriamos provar.