k[X] - MAT-UnB

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Conjuntos algébricos afins
Seja k um corpo infinito. Observe que dar um polinômio P (X) ∈ k[X] é
a mesma coisa que dar uma função polinomial k → k, x 7→ P (x), pois pelo
fato de k ser infinito, se P e Q são polinômios que correspondem à mesma
função polinomial então P (x) = Q(x) para todo x ∈ k logo o polinômio
P (X) − Q(X) tem infinitas raizes, assim P (X) = Q(X). No caso dos corpos
finitos isso não vale mais, por exemplo se k tem q elementos então X q − X
visto como função polinomial é a função nula.
Vamos trabalhar com o anel de polinômios A = k[X1 , . . . , Xn ].
Definição. Seja S um subconjunto de A. O conjunto algebrico afim
correspondente a S é
V (S) = {x ∈ k n : f (x) = 0 ∀f ∈ S}.
Se S = {f1 , . . . , fr } é finito escrevemos V (S) = V (f1 , . . . , fr ).
Observe que se S ⊆ S 0 então V (S 0 ) ⊆ V (S). De fato se x ∈ V (S 0 ) então
f (x) = 0 para todo f ∈ S 0 , em particular para todo f ∈ S (pois S ⊆ S 0 ).
Dado S ⊆PA considere o ideal gerado por S, hSi. Os elementos de hSi
têm a forma ri=1 ai fi com ai ∈ A e fi ∈ S. Temos que V (S) = V (hSi). A
inclusão ⊇ vem da observação acima e do fato que S
hSi. Para mostrar
P⊆
r
⊆
i=1 ai fi logo f (x) =
Prtoma x ∈ V (S), assim se f ∈ hSi temos f =
a
(x)f
(x)
=
0
pois
f
(x)
=
0
para
todo
i
(pois
f
∈ S para todo i).
i
i
i
i
i=1
Alguns exemplos.
•
•
•
•
•
Se f ∈ A então V (f ) é o conjunto das raizes de f .
V (1) = ∅.
V (0) = k n .
Se n = 1 então V ((X − 1)(X − 2)) = {1, 2}.
Se n = 1 então um conjunto afim é exatamente um conjunto finito.
De fato se V (S) é um conjunto afim então os elementos de V (S)
são raizes comuns de uma famı́lia de polinômios, e todo polinômio
em uma variavel tem só um número finito de raizes. Por outro lado
se {a1 , . . . , an } é um subconjunto finito de k então ele é igual a
V ((X − a1 ) · · · (X − an )).
• Neste exemplo e nos próximos considere o caso n = 2 (o plano).
V ((X − 1)(X − 2)) é uma união de duas retas verticais (as retas de
equações x = 1 e x = 2).
• V ((X − 1)(Y − 1)) é uma união de uma reta horizontal (y = 1) e
uma reta vertical (x = 1).
• V ((X − Y )(X + Y )) é uma união de duas retas diagonais (y = x e
y = −x).
1
2
• V (X − a, Y − b) é o ponto {(a, b)}. Logo todo ponto do plano
é um conjunto afim. Mais em geral V (X1 − a1 , . . . , Xn − an ) =
{(a1 , . . . , an )} em k n .
• V (X − 1, (Y − 1)(Y + 1)) = {(1, 1), (1, −1)}.
• V ((X − 1)(X + 1), (Y − 1)(Y + 1), (X − 1)(Y − 1)) é o conjunto
finito {(1, 1), (1, −1), (−1, 1)}.
• V (Y − X 2 ) é a parabola de equação y = x2 .
• V (X 2 + Y 2 − 1) é o circulo de equação x2 + y 2 = 1.
• V ((Y − X 2 )(X 2 + Y 2 − 1)) é a união de uma parabola e um circulo.
Uma pergunta natural é se todo conjunto afim tem a forma V (f1 , . . . , fr ),
em outras palavras se para defini-lo basta uma famı́lia finita de polinômios.
Um anel (comutativo, unitário) A é dito Noetheriano se todo ideal de
A é finitamente gerado, em outras palavras para todo I E A (ideal) existem
f1 , . . . , fr ∈ I tais que
r
X
I = (f1 , . . . , fr ) = {
ai fi : ai ∈ A}.
i=1
Por exemplo k é um anel Noetheriano pois os únicos ideais de k são {0} e
k, que são gerados por um único elemento, de fato k = (1) e {0} = (0). O
fato seguinte é um resultado classico de álgebra comutativa.
Teorema (Hilbert). Se A é um anel Noetheriano então A[X] é um anel
Noetheriano.
Assim como k é Noetheriano, aplicando o teorema muitas vezes obtemos que k[X1 ] é Noetheriano, logo k[X1 ][X2 ] = k[X1 , X2 ] é Noetheriano,
e assim diante. Isso mostra que k[X1 , . . . , Xn ] é Noetheriano para todo n.
Observe que é importante ter um número finito de variaveis. O anel de polinômios em infinitas variaveis k[X1 , X2 , X3 , . . .] não é Noetheriano (o ideal
(X1 , X2 , X3 , . . .) não é finitamente gerado).
A tradução geometrica desse fato é que todo conjunto afim tem a forma
V (f1 , . . . , fr ) (de fato, ele tem a forma V (I) para algum ideal I de A =
k[X1 , . . . , Xn ] e basta escolher {f1 , . . . , fr } como sendo um conjunto gerador
finito de I). Observe também que V (f1 , . . . , fr ) = V (f1 )∩V (f2 )∩. . .∩V (fr )
(obvio). Geralmente um conjunto afim do tipo V (f ) é chamado de “hipersuperficie”. Assim todo conjunto afim é uma interseção finita de hipersuperficies.
Observe que V (X) = V (X 2 ) = . . . = V (X k ) = . . .. Se trata da reta de
equação x = 0. Isso mostra que ideais diferentes podem definir o mesmo
conjunto afim.
Observe que se a = (a1 , . . . , an ) ∈ k n então {a} = V (X1 − a1 , . . . , Xn −
an ). Na verdade o ideal escolhido não é um ideal qualquer:
3
Proposição. O ideal I = (X1 − a1 , . . . , Xn − an ) é um ideal maximal
de A = k[X1 , . . . , Xn ].
Demonstração. O que vamos mostrar é que A/I é um corpo (isso
implica que I é maximal, como você sabe). Considere ϕ : A → k, o
homomorfismo de substituição ϕ(f ) := f (a) onde a = (a1 , . . . , an ). É
claro que Xi − ai ∈ ker(ϕ) para todo i, assim I ⊆ ker(ϕ). Mostraremos que ker(ϕ) ⊆ I. Seja então f ∈ ker(ϕ), assim f (a) = 0. Como
o polinômio Xn − an é mônico, podemos efetuar a divisão com resto de
f (X) por Xn − an com respeito à variavel Xn , obtendo f (X) = (Xn −
an )Q(X) + R(X) e o grau de R(X) com respeito a Xn é 0, em outras
palavras R(X) ∈ k[X1 , . . . , Xn−1 ]. Se n = 1 então R(X) é uma constante e substituindo X1 = a1 obtemos 0 = f (a1 ) = 0 + R(a1 ) = R logo
f (X1 ) = (X1 − a1 )Q(X1 ) ∈ (X1 − a1 ) = I. Agora supomos n > 1 e mostramos o resultado por indução sobre n. Como R(X) ∈ k[X1 , . . . , Xn−1 ]
e R(a) = 0, por indução R(X) ∈ (X1 − a1 , . . . , Xn−1 − an−1 ) ⊆ I logo
R(X) ∈ I. Assim f (X) = (Xn − an )Q(X) + R(X) ∈ I pois Xn − an ∈ I.
Isso mostra que I = ker(ϕ). Observe que ϕ é sobrejetiva (pois se t ∈
k então considerando t como elemento de k[X1 , . . . , Xn ] temos t = ϕ(t)).
Assim pelo teorema de isomorfismo A/I ∼
= k é um corpo.
Isso mostra que todo ponto de k n corresponde a um ideal maximal de
A. Por outro lado o vice-versa não vale em geral: por exemplo se k = R e
n = 1 então V (X 2 + 1) = ∅ pois o polinômio X 2 + 1 não possui raizes reais.
Para ter uma teoria interessante temos que considerar corpos algebricamente
fechados.
Na próxima aula vamos observar que os conjuntos algebricos afins podem
ser vistos como os conjuntos fechados de uma topologia (a topologia de
Zariski).
Exercı́cios.
(1) Dados quatro pontos Pi = (ai , bi ) em k 2 com i = 1, 2, 3, 4 escreva
geradores de um ideal I tal que V (I) = {P1 , P2 , P3 , P4 }.
(2) Seja P = (a, b) um ponto de C2 . Mostre que não existe nenhum polinômio f ∈ C[X, Y ] tal que {P } = V (f ). Isso permanece verdade
com R no lugar de C?
(3) Faça um desenho de
• V (XY − X + Y − 1) em R2 ,
• V (Y 2 − (X − 1)(X + 1)) em R2 ,
• V (XZ, Y Z) em R3 .
(4) Mostre que se V é um conjunto afim de R2 então R2 − V é denso
com respeito à topologia usual de R2 .
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