Ética e Prestação de Contas, Sempre Juntas Charles B. Holland, Contador, Sócio Diretor da Ernst & Young Muitos se julgam éticos. Outros entendem que prestam contas. É um fato incontestável que muitos se sentem incomodados com a expressão “sempre juntas”, pois ou prestam contas ou são éticos. Para alguns, juntar as ações das duas palavras de forma simultânea é exigir demais. Na vida pessoal e no mundo dos negócios, em sociedades e economias desenvolvidas, ética e prestação de contas sempre caminham juntas. Ética sem prestação de contas, ou prestação de contas sem ética, são atitudes que precisamos combater, para melhorar a nossa sociedade. Temos de reconhecer que o ano 2000 foi bom para a nossa sociedade, em termos de ética e de prestação de contas. Progredimos muito, no âmbito individual, e nas empresas e governos federal, estadual e municipal. Nunca houve tantas Comissões Parlamentares de Inquérito (CPIs), cassações de mandatos e prisão de personalidades famosas e importantes. Como exemplo de estímulo efetivo para prestação de contas, foi aprovada em 2000 a Lei de Responsabilidade Fiscal, que será uma âncora definitiva para o regime de administração responsável nos três níveis de governo. A lei determinou que qualquer aumento de despesa contínua, como salários, depende do aumento permanente de receitas, ou de corte equivalente em outras despesas. Também, como estímulo para ética e prestação de contas foi aprovada em 2000 a Lei de Quebra de Sigilo Bancário, pelo Congresso Nacional. Esta medidas vão ajudar a promover uma reforma tributária mais justa para todos no futuro. Atualmente, a carga tributária está muito elevada nas 40 mil empresas do País, que são obrigadas a ter contabilidade de contas em bases técnicas e auditáveis com encargos tributários bem acima da média mundial. Também, a carga tributária para o assalariado na economia formal é excessiva, enquanto é baixa para todos aqueles na economia informal. Segundo estudos divulgados pela Receita Federal, o índice de sonegação é elevadíssimo, decorrente da atual dificuldade da Receita Federal em confrontar dados com a movimentação bancária, devido à atual proteção do sigilo bancário. Democratizando e dividindo as obrigações entre todos os contribuintes de forma mais equânime, haverá condições necessárias para instituir uma reforma tributária mais justa e duradoura. Agora, temos estímulos mais efetivos para prestação de contas. Todavia, ética necessita mais reflexão e ensino formal. Existem muitas diferenças de interpretação de posturas 1 éticas. Logo, vamos recapitular o que é ética, para que todos possam fazer uma autoavaliação, bem como entender porque temos tantos dilemas éticos. Em primeiro lugar, não há maneira certa para se fazer algo errado, nem travesseiro tão macio quanto uma consciência tranqüila. Se quisermos mais ética e moral na condução dos negócios, precisamos dedicar tempo à consideração desse tema prioritário. Uma conduta ética e moral é ensinada de maneira mais eficiente na infância, quando os valores humanos estão sendo forjados. Antes da revolução industrial do país, em 1955, da expansão empresarial, na década de 70, e do retorno da democracia política, nos anos 80, a família, a Igreja, as associações e as escolas tinham papel preponderante na formação do indivíduo. Contudo, as novas instituições, que vêm crescendo gradativamente, estão ocupando espaços e influenciando cada vez mais o comportamento da nossa sociedade. Essas instituições estão representadas pelas grandes empresas, que sofrem enormes pressões para gerar lucros; pelo governo, que é pressionado pelo clientelismo; e pelos meios de comunicação, principalmente televisão, jornais e revistas. Preocupados em atender aos objetivos mais imediatos dessas novas forças, muitos indivíduos esquecem as regras elementares de comportamento ético e moral e se distanciam de seus fundamentos. Em função da ausência de regras estabelecidas de conduta ética nas empresas e no governo, alguns indivíduos tendem a formular suas próprias interpretações ao que seja ético e moral, variando de pessoa para pessoa, dependendo também de como são afetados por pressões externas. Atualmente, poucas empresas, com exceção de companhias abertas, mantêm em funcionamento códigos de ética. Aquele que os implantou certamente será muito beneficiado, pois as pessoas sentem necessidade de identificar-se cada vez mais com entidades reconhecidamente morais e éticas. Todas as associações de classe das áreas contábil, financeira e de controladoria deveriam insistir no retorno das aulas sobre conduta ética e moral nas escolas, em nível elementar, e na sua instituição, em nível universitário. Ao mesmo tempo, empresas e órgãos do governo deveriam ser devidamente pressionados para instituir programas formais de conduta ética. Todo problema pode ser solucionado se pararmos para pensar, buscar uma solução e agir de modo a atingir o que pretendemos. Gerenciar somente para o lucro é como jogar bola olhando para o placar, em vez de olhar para a bola. Para constatar se está procedendo de forma ética, o indivíduo deve basicamente fazer, a si próprio, algumas perguntas. O que estou fazendo é legal? Estou violando alguma lei ou política da empresa? Como minha decisão me fará sentir? Ficarei orgulhoso? Ficarei tranqüilo se minha decisão for divulgada pela imprensa? Como se sentirá minha família se souber de minha decisão? Tal questionamento indicará se o indivíduo está agindo com ética ou não. Mas isso só não basta. As empresas também têm de criar condições para que a ética seja seguida à risca pelos seus quadros de pessoal. Para isso, a primeira providência é estabelecer procedimentos de obediência a normas éticas e divulgá-las amplamente. Ao mesmo tempo, a empresa deve desenvolver e manter um bom sistema de controles internos. 2 Estabelecidos esses padrões e controles, a empresa deve assegurar-se de que seus diretores e executivos apóiam, de fato, as normas de conduta ética adotadas. Para inibir quaisquer tentações, basta manter política de penalidades severas aos violadores e alertar para o fato de que os desvios de conduta serão tornados públicos. Evitar problemas é sempre mais fácil do que solucioná-los. Por essa razão, a empresa deve realizar investigação profunda sobre a qualidade do pessoal em vias de ser contratado. Além disso, a companhia deve enfatizar menos os resultados a curto prazo, que podem criar a pressão para manipular resultados financeiros. Para tanto, o foco nos resultados a curto prazo deve ser harmonizado com o comportamento empresarial, divulgado no código de ética da empresa. Entendo que este é o momento certo para iniciarmos discussões objetivas para a implantação de códigos de ética, com o amplo apoio das entidades profissionais e órgãos governamentais, e dos meios de comunicação. Com esses códigos, amplamente difundidos e seguidos por todos, poderemos obter redução drástica da corrupção, do desvio de dinheiro e do desperdício de tempo e ainda atenuar consideravelmente os problemas do déficit financeiro. Prestação de contas com ética é essencial para o retorno de investimentos maciços e, consequentemente, para o aumento do número de empregos e melhor remuneração para todos. Concluindo, precisamos simultaneamente de mais ética e de prestação de contas, pois ambas só funcionam quando juntas. 3