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Ponto de Vista Histórico: Centros de Nefrologia das regiões centro-oeste e centrosudeste do Brasil
Marli C. Gregório
Um quarto de século tratando pacientes renais
(Serviço de Nefrologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da
Universidade Federal de Goiás e Instituto Goiano de Nefrologia, Goiânia).
Vinte e cinco anos. Esse é o tempo que passou desde a realização da primeira sessão
de hemodiálise no Centro-Oeste (Goiás, Distrito Federal, Mato Grosso e Triângulo
Mineiro). O procedimento aconteceu no Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina
da Universidade Federal de Goiás onde o doutor Dilson Antunes de Oliveira foi o
pioneiro. Atualmente em todo o Estado de Goiás estão em tratamento cerca de 500 renais
crônicos em hemodiálise.
Atualmente integrando o Instituto Goiano de Nefrologia e ainda como professor de
Nefrologia da FMUFG, o doutor Oliveira conta que foi o primeiro nefrologista a chegar
àquele Estado, em 1967, depois de estagiar dois anos no Hospital das Clínicas de São
Paulo. Ele lembra que a primeira hemodiálise foi feita em 1972, em uma paciente renal
aguda com um rim artificial Coil, adquirido pela UFG, cujo modelo estava instalado em
apenas algumas unidades de hemodiálise no País. Porém a diálise peritoneal já vinha
sendo realizada desde 1967 pelo doutor Rubens Ferreira de Moraes, cirurgião-geral do
HC. “O doutor Rubens merece homenagem da Medicina de Goiás, pois apesar de não ter o
conhecimento e o treinamento de um nefrologista fazia esse procedimento nos moldes do
serviço do HC de São Paulo”, diz o doutor Oliveira.
Ele observa que no ano de 1967 se “contava nos dedos os serviços de diálise no
País”. Cinco anos depois, quando foi instalado o rim artificial, que contou com todo o
apoio do professor Roland Saldanha, de São Paulo, foi uma “feliz coincidência, porque
surgiu a paciente com um quadro de insuficiência renal aguda, resultado de uma picada de
cobra e precisava da hemodiálise”. Tratamento concluído essa senhora ainda foi acompanhada por algum tempo e dez anos depois continuava bem.
Como um Serviço da disciplina de Nefrologia da FMUFG, portanto com uma
atuação de hospital-escola, atualmente são atendidos 40 pacientes, sendo 20 em
hemodiálise e 20 em CAPD. No entender do professor, o Serviço cresceu bem, dentro do
quadro da nefrologia goiana. Enquanto há 30 anos atrás apenas o doutor Oliveira e o
doutor Dezir Vêncio atuavam no Serviço do HC, hoje são em cinco nefrologistas. Segundo
ele, esta ainda é uma especialidade “pouco atrativa”, pelo menos em sua cidade, que para
uma população de 1 milhão de habitantes conta com apenas 15 nefrologistas, num
universo de 3 mil médicos. O fato de apenas 500 renais estarem em tratamento em todo o
Estado de Goiás, “significa que muita gente ainda vai a óbito” enfatiza o professor.
“O tratamento dos pacientes renais ficou mais facilitado com a instalação de uma
UTI e estamos caminhando para iniciar o transplante renal no HC da UFG”. O professor
conta que o maior “obstáculo” para isso era a falta de um laboratório de
histocompatibilidade na cidade. Até dez meses atrás o material para análise era enviado
para outros centros e os indicados para transplante continuam sendo encaminhados a
outros dois hospitais da cidade, que há 15 anos vem realizando esse procedimento. O
professor Oliveira faz parte da equipe de transplantes desses hospitais. “É lamentável que
até agora não tenhamos transplantados no HC”, ressalta ele.
Unidade-satélite
Atuando com uma unidade-satélite, o Instituto Goiano de Nefrologia foi criado há
10 anos pelo doutor Oliveira e outros cinco nefrologistas. Presta serviços à Santa Casa de
Goiânia e tem ramificações em outros quatro hospitais: São Francisco, Geral, Santa
Helena e Samaritano. No total oferece tratamento a 200 pacientes em hemodiálise e 70 em
CAPD, além de ter outros pacientes em DPI . Como a maioria dos profissionais que
mantém este tipo de serviço, o doutor Oliveira considera que “merece ganhar mais”, sem
contar os atrasos de pagamento por parte do SUS e até alguns abusos. Por outro lado,
apesar de estarmos num País pobre e desorganizado acho que o governo federal não tem
falhado com o renal crônico, pois tem arcado com todos os custos e alguns centros têm
oferecido serviço de Primeiro Mundo. Não é assim em outros países”, acentua ele.
Novas atividades para ampliar o atendimento dialítico
(Clínica de Nefrologia e Hipertensão da Santa Casa de Misericórdia de Itajubá, MG)
A expectativa é de, num futuro próximo, iniciar os transplantes renais e participar dos
programas de captação de órgãos. A afirmação é do doutor José Raimundo Silva, da
Nefroclin (Clínica de Nefrologia e Hipertensão) que há dois anos vêm atuando na Santa
Casa de Misericórdia de Itajubá atendendo, no momento, 54 pacientes em programa de
hemodiálise. Como uma taxa de mortalidade de 9% ao ano, a Clínica vem se mantendo
dentro dos padrões desejados.
O doutor Silva conta que a Nefroclin foi criada em caráter de emergência para
“acudir” os 45 pacientes que deixavam de receber assistência no Hospital Escola da
Faculdade de Medicina de Itajubá, que fechou seu centro dialítico devido a problemas
administrativos. “Nossa história começou em 1982 quando esse Hospital recebeu, por
doação uma máquina hemodialisadora Travenol iniciando o Serviço de Nefrologia em
Itajubá” acentua ele.
Nos dois primeiros anos frequentavam o Serviço uma média de 10 pacientes em
programas de hemodiálise e diálise peritoneal. Em 1984 e 1987 esse número aumentou
para 40 e, a partir de 1993, essa média passou para 50 pacientes, que nessa época também
já eram atendidos em CAPD. “Foram 12 anos de grande luta e dificuldades”, observa o
doutor Silva.
O primeiro transplante do sul de Minas Gerais foi realizado em 1986, utilizando-se
rim de doador vivo. Esse procedimento serviu apenas como “experiência para a equipe
médica e de enfermagem. Não foram realizados outros transplantes devido à falta de
estrutura do Hospital, diz o doutor Silva. Depois dessa primeira experiência, todos os
pacientes foram e ainda continuam sendo encaminhados para serem transplantados em São
Paulo, na Faculdade de Medicina da USp ou na Universidade Federal de São Paulo/Escola
Paulista de Medicina (Unifesp/EPM), que são os centros mais próximos da região. Isso é
possível, segundo ele, “graças ao bom relacionamento entre as equipes”.
No decorrer desse período de existência do Serviço os problemas foram se avolumando e
as dificuldades financeiras acentuando-se com os equipamentos tornando-se precários,
além da escassez de materiais básicos e, principalmente, devido à falta de apoio da
administração do Hospital. No de final de 1994 decidiu-se pelo fechamento do Serviço,
então com 45 pacientes dialíticos.
Dois anos prestando assistência
Atendendo toda a região do sul de Minas Gerais, a Nefroclin, que foi criada em
novembro de 1994, conta com instalações novas. Porém “faltam verbas para sofisticá-la”,
observa o doutor Silva. As máquinas são do tipo convencional, duplas, com tanque e o
tratamento de água, apesar de novo, ainda não é por osmose reversa.
Para prestar assistência aos atuais 54 pacientes, sendo 49 com hemodiálise, três em
CAPD e dois provisoriamente em DPI, a Nefroclin conta com três médicos especialistas,
uma enfermeira (que atua na área há 14 anos) e uma equipe de dez funcionárias entre
técnicas e auxiliares de enfermagem, além de um técnico exclusivo treinado para a
manutenção dos equipamentos. Também integram o Serviço uma nutricionista e uma
psicóloga.
Um hospital exclusivo para as doenças renais
(Hospital do Rim e Hipertensão da Fundação Oswaldo Ramos, São Paulo, SP)
Os números são animadores: 10 mil diálises, mil procedimentos de investigação arterial,
assistência a 5 mil pacientes com pressão alta, 4 mil com litíase renal e 4.500 com
insuficiência renal crônica. Esta é a expectativa de atendimento do Hospital do Rim e
Hipertensão dirigido pela Fundação Oswaldo Ramos, quando os seus 120 leitos estiverem
funcionando plenamente. O hospital teve suas atividades iniciadas em junho do ano
passado, com a Unidade de diálise e o Ambulatório de insuficiência renal crônica.
Como primeiro hospital da América Latina dedicado ao tratamento, diagnóstico e
prevenção das doenças renais, o projeto é que para os próximos meses seja iniciado um
programa “mais ambicioso, com enfermarias de pacientes com transplante renal” assegura
o professor Artur Beltrame Ribeiro, da disciplina de Nefrologia da Universidade Federal
de São Paulo-Unifesp/Escola Paulista de Medicina-EPM, presidente da Fundação
Oswaldo Ramos.
Com 15 andares e 13 mil metros quadrados de área construída, nos próximos meses
no Hospital serão instaladas as unidades de transplante, hipertensão arterial, litíase e
métodos diagnósticos especializados. Para o doutor Artur Ribeiro, essa instituição nasceu
com a vocação primária de tratar as doenças renais e a hipertensão, além de ser um
hospital com características específicas. “Nosso desejo é de sermos auto-sustentável ou
seja, termos viabilidade econômica para que possamos oferecer um atendimento de bom
padrão, sofrendo menos com os recessos e as crises dos hospitais públicos”.
15 anos depois um sonho realizado
Da época que professores e jovens doutores começaram a sonhar com um serviço
que não só prestasse assistência, mas que estivesse baseado no tripé: ensino, pesquisa e
assistência já se passaram 15 anos. “O sonho de fundar um hospital voltado às doenças
renais começou em 1980, mas só depois de 10 anos a construção foi iniciada. A idéia que
toda a equipe sempre teve era de que se deveria criar uma instituição voltada para a
especialidade, mas que também tivesse a vocação pública de atender os serviços de saúde
federal e estadual”. A vocação pública está sendo cumprida, pois são atendidos
basicamente pacientes do SUS, mas segundo o doutor Artur Ribeiro a proposta é abrir a
instituição para convênios e pacientes particulares.
O professor assinala que dentro desse tripé a instituição estará capacitada a
desenvolver mais pesquisa clínica da disciplina. Isso porque será implantada uma área
específica para internação de doentes que não precisarão de um tratamento, mas que
estarão participando de programas para pesquisar novos medicamentos e novos
procedimentos.
Tratamentos e diagnósticos de última geração. Estes são os serviços oferecidos
dentro da assistência que não se restringe aos pacientes do Estado de São Paulo, mas de
todas as regiões brasileiras e de países vizinhos da América do Sul. Nos programas de
diálise peritoneal o Hospital está capacitado para atender 100 pacientes por mês e no de
hemodiálise estão cadastrados 200. O serviço conta com um duplo sistema de tratamento
de água por osmose reversa. Este processo faz parte de um programa continuo de controle
de qualidade em diálise que foi implantado na nova instituição.
Outra meta da equipe do Hospital é evitar que o paciente entre em diálise. Esse
desafio está a cargo do Ambulatório de Tratamento Conservador de Insuficiência Renal
Crônica, integrado por nefrologistas, cirurgiões vasculares, nutricionistas e enfermeiras.
Sua capacidade de atendimento é de 600 pacientes por mês. Outro setor que deve crescer
bastante nos próximos anos é o de transplante renal que hoje realiza cerca de 180 por ano.
Esse número poderá chegar a 400, pois haverá disponibilidade de centro cirúrgico, de
terapia intensiva e de enfermaria.
Mas os desafios são muitos. Para isso equipes de professores e pós-graduandos
estão preparados para atacar outras doenças renais. Faz parte da proposta desses
profissionais tratar a insuficiência renal, a hipertensão, a litíase e a infecção urinária que
atingem milhões de brasileiros. Ainda na área da assistência, modernos e sofisticados
laboratórios completam a estrutura oferecendo aos pacientes os diversos tipos de exames
necessários.
Para desvendar os mecanismos das doenças renais
A parte do tripé relativa à pesquisa, prossegue acelerada no novo Hospital, reunindo
mais de 200 profissionais entre professores, pesquisadores, pós-graduandos e técnicos,
procurando acompanhar as conquistas científicas do Primeiro Mundo. Até o momento, três
laboratórios estão utilizando as técnicas de biologia molecular para pesquisar imunologia
do transplante, hipertensão e fisiopatologia renal.
Para desvendar os mecanismos que provocam as doenças renais 20 unidades de
pesquisa clínica e experimental do complexo de Nefrologia da EPM/ Fundação Oswaldo
Ramos desenvolvem os mais variados experimentos. Nesse processo estão os laboratórios
de imunologia de transplantes e de doenças auto-imunes, que procuram entender mais o
mecanismo de rejeição dos órgãos. O de biologia molecular em hipertensão, voltado para
os receptores adrenérgicos e outro também de biologia molecular que estuda a fisiologia e
fisiopatologia renal.
Várias outras linhas de pesquisa estão sendo desenvolvidas no Hospital. O grupo de
pesquisadores de insuficiência renal crônica caracterizou a doença óssea adinâmica antes
mesmo de o paciente entrar em diálise. Outro grupo vem estudando as glomerulonefrites e
o Laboratório Experimental de Hipertensão vem analisando o impacto de novos agentes
farmacológicos sobre o processo hipertensivo.
Para completar o tripé, na área do ensino, foram formados 84 mestres e 74 doutores,
até dezembro de 1995. Foram cerca de 700 artigos publicados, mais de 2 mil conferências
e 71 prêmios por pesquisas. Além da formação de graduandos e pós-graduandos
brasileiros, são treinados especialistas da América Latina e, no novo Hospital, poderá se
aprofundar ainda mais essa vocação educacional.
O processo de instalação e implementação do Hospital está apenas no começo.
Como diz o doutor Artur Ribeiro “tudo vai depender da evolução neste ano. No momento
nosso compromisso é ativar o programa de transplante renal e estamos nos preparando
para isso. Porém no que se refere aos equipamentos e outras instalações ainda estamos
num processo”.
Quanto às perspectivas Artur Ribeiro enfatiza que “ainda é cedo para previsões”. No
decorrer deste ano, o Hospital do Rim e Hipertensão (que funciona na rua Borges Lagoa,
960 - São Paulo) estará bastante ativado e ele espera que continue “funcionando muito
bem”.
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