curso integral de direito do trabalho para aft questão 2

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CURSO INTEGRAL DE DIREITO DO TRABALHO PARA AFT
Prof. Ricardo Resende | Estudos Jurídicos Aplicados
SEMANA 2 – QUESTÕES DISCURSIVAS – FECHAMENTO
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QUESTÃO 2
Entre o forte e o fraco, entre o rico e o pobre, entre o patrão e o operário, é a
liberdade que oprime e a lei que liberta.
Abade Lacordaire
O direito do trabalho tem sua origem intrinsecamente ligada ao direito civil e, em
especial, ao segmento obrigacional deste ramo jurídico. No âmbito do direito civil
prevalece o princípio da autonomia da vontade ou princípio da autonomia privada,
pelo qual as partes podem, grosso modo, ajustar o que melhor atenda a seus
interesses, com elevado grau de liberdade. Tal matriz principiológica aplica-se também
na seara trabalhista?
Ao responder à indagação acima, disserte sobre os princípios aplicáveis no âmbito do
Direito do Trabalho, mencionando, obrigatoriamente, desdobramentos destes
princípios na regência da relação de emprego, bem como a importância do Auditor
Fiscal do Trabalho neste contexto.
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Direcionamento:
→ a ampla autonomia da vontade se converte em injustiça diante da desigualdade
entre as partes da relação de emprego
→ em busca da igualdade substancial, formou-se o direito do trabalho, com princípios
próprios visando à tutela do trabalhador
→ o direito do trabalho se estabelece a partir da intervenção estatal → legislação e
fiscalização das relações de emprego
→ o princípio da proteção visa estabelecer o equilíbrio jurídico entre as partes que, de
fato, estão em franca posição de desigualdade. O trabalhador hipossuficiente é
tutelado pelo Estado
→ subdivisões do princípio da proteção (norma mais favorável, condição mais benéfica
e in dubio pro operario). Exemplo: art. 620 da CLT (CCT x ACT); aplicabilidade das
alterações do regulamento de empresa, conforme entendimento jurisprudencial
consolidado.
→ princípio da primazia da realidade → fundamental para afastar as fraudes
trabalhistas. Mencionar a positivação (art. 9º da CLT).
→ princípio da irrenunciabilidade → impede o despojamento de direitos por quem não
teria como resistir ao assédio do empregador → Exemplo: aviso prévio devido pelo
empregador, conforme entendimento jurisprudencial consolidado.
→ princípio da continuidade → estabelece a presunção de que o contrato de trabalho
foi pactuado por prazo indeterminado, conforme entendimento consolidado do TST
→ princípio da inalterabilidade contratual lesiva → impede a alteração prejudicial do
contrato de trabalho → está positivado no art. 468 da CLT
→ princípio da dignidade humana → aplicável ao longo de todo o contrato de trabalho,
notadamente como limitação ao poder diretivo do empregador, bem como em
questões ligadas ao meio ambiente de trabalho.
→ o Auditor Fiscal do Trabalho é importante na concretização dos princípios que
informam o direito do trabalho, pois, ao exercer o poder de polícia em nome do
Estado, verifica o cumprimento da legislação protetiva do trabalhador e, em última
análise, tem a prerrogativa de conferir eficácia a este arcabouço protetivo.
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Correção individual (redação de aluno selecionado1):
Os princípios civilistas [trata-se de um único princípio; a denominação clássica é a
primeira, ao passo que a segunda surgiu no contexto do direito civil-constitucional, já
no sistema constitucional vigente, a partir da noção de função social do contrato] da
autonomia da vontade ou da autonomia privada são aplicáveis à seara trabalhista de
forma mitigada. De fato, ao passo que há ampla margem de negociação entre capital e
trabalho, há, inegavelmente, princípios e normas cogentes que balizam essa
negociação.
Será que há, de fato, ampla margem de negociação entre capital e trabalho? Em
sentido oposto, muitos doutrinadores chegam a defender que o contrato de trabalho
seria espécie de contrato de adesão, justamente porque o trabalhador, parte
notoriamente hipossuficiente na relação de emprego, não teria como interferir
efetivamente, como regra, na estipulação das cláusulas contratuais.
A existência de princípios e normas especiais que limitam a autonomia privada no
âmbito trabalhista se deve justamente ao desequilíbrio natural entre capital e
trabalho, o qual inviabiliza a livre negociação, sob pena do aniquilamento dos
direitos do trabalhador.
Dessa forma, segundo reiteradas decisões do Tribunal Superior do Trabalho (TST), no
direito negociado justrabalhista, a ação estatal intervém nas relações de trabalho para
garantir o que Godinho Delgado denomina “patamar civilizatório mínimo”, entendido
como os limites que asseguram a dignidade do trabalhador em face da necessária
adaptação da empresa frente aos riscos da atividade econômica. Exemplo disso é a
redução salarial mediante negociação coletiva.
O exemplo ficou vago, ao passo que a redução salarial é justamente uma das
exceções à regra da indisponibilidade dos direitos trabalhistas. Se a intenção era
abordar a exigência de contrapartida para pactuação da redução salarial mediante
negociação coletiva, faltou mencioná-lo. Caso contrário, pareceu-me que a afirmação
não foi bem ilustrada pelo exemplo escolhido. Seria bom exemplo do quanto
afirmado, entre muitos outros, a impossibilidade de supressão dos descansos
trabalhistas.
Por outro lado, embora o enunciado não tenha sido expresso neste sentido, há certo
direcionamento do candidato para o direito individual do trabalho (na citação do
Abade Lacordaire, por exemplo), pelo que não me pareceu que a abordagem da
questão negociado x legislado tenha sido a melhor escolha. Não está errado o
argumento, entretanto, nem configura, em minha opinião, qualquer tipo de fuga ao
tema.
1
Veja sobre o sorteio e sobre a seleção no fórum de discursivas.
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O papel do Auditor-Fiscal do Trabalho (AFT) na proteção do trabalhador na relação de
emprego é o de garantir administrativamente o equilíbrio da autonomia da vontade
entre as partes em face da legislação. [Parece-me que o equilíbrio da autonomia da
vontade se alcança apenas pela coletivização das questões pertinentes à relação de
emprego. Na relação individual, há, na prática, franco desequilíbrio (o empregado
não tem, de fato, grande autonomia para pactuar), o qual é compensado
juridicamente pela intervenção estatal.] Assim, a maior ferramenta para consecução
desse propósito é a aplicação do princípio da primazia da realidade, previsto no art. 9º
da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Por tal, o AFT afastará os ajustes
meramente formais que tentam burlar as regras cogentes.
No mesmo caminhar, o TST, em recente julgado, reconheceu a competência dos AFTs
para decidir qual norma é mais vantajosa para o empregado. Tal decisão ampliou o
poder de polícia do auditor para reconhecer o princípio da norma mais favorável,
aplicada nas situações em que há mais de uma norma possível [seria melhor utilizar,
por exemplo, aplicável] nas relações trabalhistas.
De todos os princípios a serem observados na mitigação da autonomia da vontade,
certamente o da dignidade humana desponta dentre os mais importantes. De fato,
Godinho Delgado afirma ser derivado da Constituição Federal, a qual consagra o ser
humano como um fim, não podendo ser utilizado como coisa para atingir determinado
objetivo pelo poder diretivo do empregador.
Não obstante seja apenas uma recomendação, vejo com reservas a citação de
doutrinadores, mesmo em se tratando de figura amplamente reconhecida e
festejada, como o Min. Godinho Delgado. Sempre há o risco de ter na banca alguém
que não gosta daquele autor (sem entrar no mérito acerca de quem costuma corrigir
as provas, pois isso pode ser livremente decidido pela banca e, portanto, alterado a
qualquer momento). Entendo que é desnecessário correr o risco.
No caso, por exemplo, tal definição do princípio da dignidade humana é
compartilhada pela quase totalidade da doutrina, com pequenas variações. Não há
qualquer problema em simplesmente mencionar “a doutrina”, ao invés de citar o
nome de um autor.
Por sua vez, o princípio da continuidade autoriza a presunção de que os contratos são
celebrados por prazo indeterminado, o que relativiza, uma vez mais, a autonomia
privada. O próprio TST possui súmula a esse respeito, a qual impõe o ônus de provar o
término do contrato de trabalho ao empregador.
O princípio da inalterabilidade contratual lesiva, por seu turno, garante ao empregado,
segundo a CLT, que as alterações no contrato de trabalho sejam feitas por mútuo
consentimento, mas, ainda assim, desde que não firam direitos já assegurados ao
empregado, ou seja, que não lhe tragam prejuízos.
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Finalmente, o princípio da irrenunciabilidade é um dos mais importantes, porque de
nada adiantariam os princípios anteriores se fosse dado ao trabalhador o direito de
renunciar ao que lhe é garantido por lei. Dessa forma, Godinho Delgado assevera que,
no direito do trabalho brasileiro, somente os direitos de indisponibilidade relativa são
passíveis de flexibilização, como os dispostos em regulamento de empresa. Os direitos
de indisponibilidade absoluta, por outro lado, não admitem tal negociação, porque são
normas cogentes do direito legislado, tais como a imperatividade [aqui há
redundância, pois imperativo é sinônimo de cogente] das normas que visam à
garantia da saúde e da segurança no ambiente laboral.
De forma geral, a resposta está adequada e bem fundamentada. Curiosamente, o
candidato seguiu rumo bastante diverso daquele que imaginei ao redigir a questão,
porém foi dada abertura para tal, então não existe propriamente um gabarito que
deveria ser seguido. O importante, no caso, era que o candidato conseguisse
demonstrar conhecimento a respeito do assunto tratado, do que se desincumbiu
satisfatoriamente o aluno.
Somente em relação à primeira parte do comando do enunciado, qual seja a aplicação
(mitigada) do princípio da autonomia privada no âmbito laboral, senti falta de um
aceno mais efetivo do autor do texto. No primeiro parágrafo, um pouco confuso
tecnicamente, não se conseguiu tal intento, e nos demais a questão foi abordada
apenas pontualmente.
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Sugestão de resposta:
A diretriz civil da ampla autonomia privada é incompatível com a relação de emprego,
dada a flagrante desigualdade entre empregador e empregado. Sendo assim, diante da
hipossuficiência do empregado frente ao empregador foi necessário criar princípios
próprios em busca do reequilíbrio, pela via jurídica, da relação capital/trabalho.
A mitigação da autonomia da vontade no âmbito trabalhista ocorre por meio da
intervenção do Estado, seja pela via legislativa, ao criar direitos e limites à liberdade
dos contratantes, ou, ainda, por meio do exercício do poder de polícia estatal, através
da fiscalização do cumprimento da legislação laboral.
O princípio da proteção estabelece a tutela do trabalhador hipossuficiente, podendo
ser desdobrado em três subprincípios: norma mais favorável, condição mais benéfica e
“in dubio pro misero”. Pelo princípio da norma mais favorável, diante da existência de
duas ou mais normas aplicáveis ao caso concreto, deve ser aplicada aquela que seja
mais favorável ao trabalhador, independentemente da hierarquia normativa
tradicional vigente no âmbito do direito comum.
O princípio da condição mais benéfica, por sua vez, impõe que as condições mais
benéficas previstas em cláusulas contratuais, aí incluídos os regulamentos, os quais
aderem ao contrato de trabalho, deverão prevalecer em face de alterações
posteriores, revestindo-se do caráter de direito adquirido. Por fim, o princípio “in
dubio pro misero” aponta para a interpretação mais favorável ao empregado sempre
que houver duas interpretações possíveis, salvo no campo processual, em matéria de
prova.
Como corolário do princípio protetivo, a primazia da realidade afasta, inclusive com
fundamento em disposição expressa do art. 9º da Consolidação das Leis do Trabalho
(CLT), os atos que constituem fraude à aplicação dos direitos trabalhistas. Em outras
palavras, informa tal princípio que os fatos devem se sobrepor aos ajustes formais no
âmbito laboral.
Ainda no mesmo sentido da proteção do trabalhador, veda-se, em regra, a renúncia a
direitos trabalhistas (princípio da irrenunciabilidade), bem como a alteração prejudicial
do contrato de trabalho (princípio da inalterabilidade contratual lesiva). São exemplos
do quanto mencionado, respectivamente, a irrenunciabilidade do aviso prévio devido
pelo empregador e a ilicitude do rebaixamento da função do empregado, salvo em
caso de reversão.
Por fim, o princípio da continuidade estabelece, conforme jurisprudência consolidada
do Tribunal Superior do Trabalho, a presunção de que o contrato de trabalho foi
firmado por prazo indeterminado.
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Dentre os vários princípios gerais do direito aplicáveis ao direito do trabalho destacase o princípio da dignidade humana, segundo o qual a pessoa humana e, no caso, o
trabalhador, é um fim em si mesmo, não podendo ser utilizado como meio para
consecução de determinado fim. Neste diapasão, referido princípio atua
principalmente limitando o exercício do poder diretivo pelo empregador e
estabelecendo o mínimo existencial em relação às condições de meio ambiente de
trabalho.
Neste contexto, é fundamental o papel do Auditor Fiscal do Trabalho, que, ao exercer
o poder de polícia em nome do Estado, verifica o cumprimento da legislação protetiva
do trabalhador e, em última análise, tem a prerrogativa de conferir eficácia a este
arcabouço protetivo laboral.
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Comentários finais sobre a questão proposta:
A questão foi proposta de forma bastante aberta, o que, por um lado, facilita a vida do
candidato, que tem maior margem de liberdade para escolher seus argumentos. Por
outro lado, as questões mais abertas propiciam maior espaço às divagações e à fuga ao
tema, normalmente levando insegurança ao candidato.
O desafio, aqui, era demonstrar o que se sabe sobre princípios do direito do trabalho,
sobre a relação do direito do trabalho com o direito civil e, finalmente, conseguir
relacionar de alguma forma a temática à atuação do Auditor Fiscal do Trabalho.
Ao contrário da primeira questão, cujo enunciado limitou naturalmente as opções do
aluno, esta segunda questão buscou incomodá-lo com o excesso de liberdade.
Treinaremos mais ou menos desta forma ao longo do curso, percorrendo todos os
temas estudados e apresentando os mais diversos desafios para a redação.
Observação final
Caso persistam (ou surjam) dúvidas sobre os temas estudados, e/ou sobre esta
atividade de fechamento da Semana 2, postem-nas no fórum respectivo, por favor.
Forte abraço e bons estudos!
Ricardo Resende
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