Resumos do VIII Congresso Brasileiro de Agroecologia – Porto Alegre/RS – 25 a 28/11/2013 13917 - Efeito do extrato de Pteridium aquilinum (Dennstaedtiaceae) sobre a preferência alimentar e biologia de Brevicoryne brassicae e Myzus persicae (Hemiptera: Aphididae) Effect of extract Pteridium aquilinum (Dennstaedtiaceae) on food preference and biology of Brevicoryne brassicae and Myzus persicae (Hemiptera: Aphididae) LOVATTO, Patrícia B.1; SCHIEDECK, Gustavo2; MAUCH, Carlos R.3 1 Pós-doutoranda FAPERGS/CAPES no PPG em Sistemas de Produção Agrícola Familiar, UFPEL, [email protected]; 2 Pesquisador da Estação Experimental Cascata - Embrapa Clima Temperado, [email protected]; 3 Professor do PPG em Sistemas de Produção Agrícola Familiar, UFPEL, [email protected] Resumo A samambaia P. aquilinum, é uma espécie espontânea que ocorre em diferentes regiões do planeta, onde é conhecida como planta invasora de pastagens e tóxica para ruminantes. Apesar disso, é utilizada na alimentação humana e na medicina popular, sendo importante na agricultura como indicadora de solos, alelopática e inseticida. Assim, no intuito de dialogar com o saber popular, ampliando o conhecimento sobre a ação da planta, buscou-se investigar o efeito dos extratos aquosos de folíolos de P. aquilinum sobre a preferência alimentar e biologia dos afídeos B. brassicae e M. persicae. Além do extrato bruto da planta seca (10% p/v), foram avaliadas as diluições 30 e 10%, juntamente com um produto a base de nim e a testemunha. Os resultados apontaram para a ação repelente e inseticida de todas as formulações da planta, ocasionando efeitos de não-preferência alimentar, redução da sobrevivência e prole. Palavras-chaves: samambaia-das-queimadas, afídeos, repelência, mortalidade Abstract: The bracken P. aquilinum, is a species that occurs spontaneously in different regions of the planet, which is known as a weed of pastures and toxic to ruminants. Nevertheless, it is used in food and in folk medicine, it is important in agriculture as an indicator of soil, allelopathic and insecticide. Thus, in order to dialogue with popular knowledge, increasing knowledge about the action of the plant, we sought to investigate the effect of aqueous extracts of leaves of P. aquilinum on food preference and biology of a B. brassicae and M. persicae. In addition to the crude extract of the plant (10% w/v), the dilutions were evaluated 30 and 10%, along with a neem based product and witness. The results pointed to the action repellent and insecticide all formulations of the plant, causing effects of non-preferred food, reducing survival and offspring. Key words: bracken, aphids, repellency, mortality Introdução A espécie Pteridium aquilinum (Dennstaedtiaceae) popularmente conhecida como samambaia-das-queimadas (LORENZI; MATOS, 2008), é uma planta perene, rizomatosa, herbácea, ereta e ramificada, medindo entre 50 e 180 cm de altura (MARÇAL, 2003). As folhas formam touceiras densas ou se estendem esparsamente ao longo dos rizomas que, por estarem profundamente enterrados, possibilitam resistência às queimadas (CRUZ; BRACARENSE, 2004). Com distribuição mundial (VETTER, 2009) é de grande importância no Sul do Brasil, onde sua ocorrência é relatada com freqüência nos estados do RS, SC e PR (ANJOS et al., 2008). É considerada uma das plantas mais tóxicas porque além de ser cosmopolita com extensa distribuição, causa diferentes tipos de intoxicação em diferentes espécies animais, (BARROS; ANDRADE, 1997). Ocorre em solos ácidos e arenosos, de baixa fertilidade, infestando pastagens, beira de estradas, terrenos baldios e encostas de morro (COSTA, 2009). Em contrapartida, existem relatos Cadernos de Agroecologia – ISSN 2236-7934 – Vol 8, No. 2, Nov 2013 1 Resumos do VIII Congresso Brasileiro de Agroecologia – Porto Alegre/RS – 25 a 28/11/2013 sobre a sua utilização na alimentação humana e como medicinal, havendo referência do uso da samambaia na alimentação dos ingleses desde a 1ª Guerra Mundial. Segundo Alonso-Amelot e Avendano (2002), a Rússia, China, Japão, Canadá e EUA, possuem inclusive um comércio bem estruturado do broto de P. aquilinum para alimentação diária. Na agricultura, além de sua importância como planta tóxica aos ruminantes e infestante de pastagens, P. aquilinum é referida em trabalhos como planta alelopática de ervas espontâneas (GLIESSMANN; MULLER, 1978; DOLLING et al., 1994), recomendada para composição de biofertilizantes (GONÇALVES et al., 2004; SOUZA; REZENDE, 2006) ou empregada empiricamente para o manejo de insetos e ácaros (HERTWIG, 1986; TIDEI et al., 1986) sendo utilizada como estratégia repelente para forrar caixotes de hortaliças (SANTOS; SYLVESTRE, 2000) e sob a forma de extratos para o controle de pulgões e lagartas (BURG; MAYER, 1999). Utilizando como pressuposto a importância de dialogar com o conhecimento popular para desenvolver tecnologias adequadas aos sistemas de produção mais sustentáveis e com intuito de ampliar o entendimento sobre a ação de P. aquilinum sobre os insetos, o objetivo deste trabalho foi avaliar os efeitos dos extratos da planta sobre B. brassicae e M. persicae, afídeos com hábitos alimentares distintos e de importância econômica significativa para diversos cultivos. Metodologia A coleta e processamento de P. aquilinum, bem como os bioensaios foram realizados na Estação Experimental Cascata – EEC (31’37’S/052º31’W), Embrapa Clima Temperado, Pelotas, RS, Brasil, durante o mês de dezembro de 2011. Para manipulação da planta foram utilizadas luvas e máscara protetora para evitar intoxicações considerando o histórico de toxicidade. Os extratos foram elaborados a partir dos folíolos da planta, secos em estufa a 40ºC por 24h, posteriormente submetidos à técnica de infusão e armazenados em vidros âmbar. A partir do extrato bruto a 10% p/v foram obtidas as diluições 10% e 30% v/v, utilizadas nos bioensaios juntamente com um produto a base de nim, denominado xispa-praga a 5% v/v (CLARO, 2001) e a testemunha, água destilada. Para a avaliação dos extratos sobre os insetos foram realizados testes com chance de escolha, visando à obtenção de dados sobre a preferência alimentar e testes sem chance de escolha com intuito de observar a ação dos extratos sobre a biologia dos afídeos, sendo avaliada a mortalidade, sobrevivência e produção de ninfas. Os dois afídeos utilizados nos bioensaios foram provenientes de criações artificiais mantidas em BOD (±25ºC e 12h), sendo realizados ensaios distintos para cada espécie. Adotou-se o delineamento inteiramente casualizado, uma bateria para cada espécie de afídeo e cinco tratamentos. Como hospedeira foram utilizados discos de couve, cultivada organicamente em casa de vegetação. No ensaio com chance de escolha, os discos tratados, foram dispostos de forma circular e equidistante em placas de Petri de 14 cm, contendo 30 afídeos adultos, sendo realizadas seis repetições para cada espécie de afídeo avaliado. As avaliações constaram da contagem de insetos sob os tratamentos após 24 e 48h de acondicionamento em BOD. Nos testes sem chance de escolha os afídeos foram submetidos aos tratamentos individualizados em placas de Petri de 8,5 cm. O efeito inseticida foi observado através da pulverização dos tratamentos sob 20 insetos 2 Cadernos de Agroecologia – ISSN 2236-7934 – Vol 8, No. 2, Nov 2013 Resumos do VIII Congresso Brasileiro de Agroecologia – Porto Alegre/RS – 25 a 28/11/2013 adultos, com três repetições para cada tratamento e mortalidade avaliada após 24 e 48h. No ensaio sobre a sobrevivência e produção de ninfas foram realizadas dez repetições, sendo que cada unidade experimental conteve uma ninfa com aproximadamente um dia de vida sob disco de couve tratado. As avaliações foram feitas a cada 24h durante 20 dias de acondicionamento em BOD. Os dados obtidos nos três bioensaios foram transformados em e submetidos à análise de variância, sendo as médias comparadas pelo teste Tukey (p<0,05), através do programa Sisvar® (FERREIRA, 2000) Resultados e discussão Os extratos, bruto e diluído a 30% de P. aquilinum, ocasionaram a não-preferência alimentar de B. brassicae, uma vez que, após 24h e 48h de exposição, foram observadas diferenças significativas quando comparados à testemunha. Para M. persicae apenas o extrato bruto da planta e o xispa-praga apresentaram efeito de repelência (Tabela 1). TABELA 1. Número médio de afídeos em discos de couve tratados com extratos de P. aquilinum, produto xispa-praga e testemunha, as 24 e 48h de exposição, em teste com chance de escolha. Embrapa Clima Temperado, Pelotas, RS, dez/2011. Tratamentos Xispa-praga Ext. Bruto Ext. Diluído 30% Ext. Diluído 10% Testemunha CV% Brevicoryne brassicae 24 horas 2.0 a 2.6 a 2.6 a 7.3 b 9.5 b 23.8 Nº médio de afídeos* Myzus persicae 48 horas 24 horas 2.6 ab 0.0 a 2.1 ab 2.4 ab 1.1 a 9.5 c 6.1 bc 5.8 bc 8.8 c 12.1 c 29.2 29.7 48 horas 0.1 a 1.2 a 10.3 b 7.0 b 11.0 b 30.6 *As médias seguidas da mesma letra na coluna, não diferem entre si pelo teste Tukey (p<0,05) Na totalidade de insetos mortos todos os tratamentos apresentaram médias de mortalidade superiores e estatisticamente diferentes da testemunha, nos ensaios com B. brassicae e M. persicae, demonstrando o efeito inseticida significativo dos extratos, nas distintas formulações, bem como do produto xispa-praga (Tabela 2). O mesmo pode ser observado com a sobrevivência dos insetos e produção de ninfas, onde os extratos da planta atuaram representativamente na diminuição da longevidade e geração da prole de B. brasssicae e M. persicae (Tabela 3). TABELA 2. Número médio de afídeos mortos após 24 e 48h da pulverização com extratos de P. aquilinum, produto xispa-praga e testemunha, em teste sem chance de escolha. Embrapa Clima Temperado, Pelotas, RS, dez/2011. Tratamentos Xispa-praga Ext. Bruto Ext. Diluído 30% Ext. Diluído 10% Testemunha CV% Nº médio de afídeos mortos* Brevicoryne brassicae Myzus persicae 24 horas 48 horas Total 24 horas 48 horas Total 11.0 a 6.0 ab 17.00 b 11,0 b 5.6 c 16.6 c 7.3 a 6.3 ab 13.6 b 7,3 b 6.3 c 13.6 c 5.0 a 10.6 b 15.6 b 5,0 a 10.6 d 15.6 c 4.6 a 8.3 ab 12.9 b 4,6 a 8.3 d 13.0 c 3.6 a 3.0 a 6.6 a 3.6 a 2.6 b 6.3 a 22.0 15.5 8.1 17.0 22.9 11.6 *As médias seguidas da mesma letra na coluna, não diferem entre si pelo teste Tukey (p<0,05) Cadernos de Agroecologia – ISSN 2236-7934 – Vol 8, No. 2, Nov 2013 3 Resumos do VIII Congresso Brasileiro de Agroecologia – Porto Alegre/RS – 25 a 28/11/2013 TABELA 3. Sobrevivência e produção média de ninfas expostas aos discos de couve tratados com extratos de P. aquilinum produto xispa-praga e testemunha. Embrapa Clima Temperado, Pelotas, RS, dez/2011. Tratamentos Xispa-praga Ext. Bruto Ext. Diluído 30% Ext. Diluído 10% Testemunha CV% Brevicoryne brassicae Sobrevivência Produção de Ninfas* (dias)* 3.3 a 0.0 a 3.8 a 0.2 a 4.2 a 0.3 a 8.4 a 2.3 a 16.4 b 77.4 b 25.6 71.8 Myzus persicae Sobrevivência Produção de Ninfas* (dias)* 3.0 a 0.0 a 3.8 a 0.3 a 4.2 a 0.2 a 8.4 b 2.3 a 15,1 c 49.4 c 31.2 57.6 *As médias seguidas da mesma letra na coluna, não diferem entre si pelo teste Tukey (p<0,05) Não foram encontradas referências experimentais sobre a bioatividade de P. aquilinum sobre insetos nas fontes de busca consultadas que justifiquem os resultados obtidos com os afídeos. Entretanto, Neves et al. (2010), avaliando atividades nematostáticas de produtos sobre juvenis de Meloidogyne javanica e M. incognita verificaram que os extratos de P. aquilinum a 10% p/v, causaram a redução da eclosão em 80,7% e 90,4% dos nematóides, respectivamente. A margem da escassez acadêmi ca sobre atividade da espécie sobre insetos, a planta é recomendada pelo saber po pular (HERTWIG, 1986; TIDEI et al., 1986; BURG; MAYER, 1999; SANTOS; SYLVESTRE, 2000), sendo citada por agricultores de base ecológica como um recurso viável e eficiente para este propósito (LOVATTO, 2012). É provável que a complexidade química de P. aquilinum compreendida, pela quercitina, ácido chiquímico, prunasina, tanino, ptaquilosídeo, canferol e aquilídeo (COSTA, 2009), seja responsável pela sua bioatividade. Alguns destes compostos, porém, podem ocasionar intoxicações agudas e crônicas aos seres humanos sugerindo restrições e cautela na sua utilização. Os folíolos da planta, utilizados neste trabalho, no entanto, possuem bai xos teores destas substâncias, mais concentradas nos brotos e rizomas (MARÇAL, 2003). Além disso, estes compostos são instáveis quando em solução aquosa na presença de ácido, base ou calor, degradando-se muito rapidamente em pterosina B e D-(+) glicose devido a eliminação da D-(+) glicose seguida por uma aromatização em soluções ácidas fracas (CRUZ; BRACARENSE, 2004). Conclusões Diante dos resultados obtidos, é prudente que novos trabalhos avaliem a toxicidade e a residualidade dos extratos de P. aquilinum no agroecossistema como um todo, definindo, se for o caso, períodos de carência que possibilitem a utilização mais adequada da planta. Além disso, o processamento deverá seguir critérios de segurança desde a colheita até a manipulação dos extratos, evitando o máximo possível o contato humano e animal, permitindo que a utilização cautelosa da espécie seja mais segura do ponto de vista ambiental, social e econômico do que a aplicação dos produtos químicos sintéticos ou aqueles oriundos do mercado verde. Agradecimentos À sabedoria popular e as plantas. Ao CNPq, FAPERGS e CAPES pelas bolsas e apoio financeiro. Referências ANJOS B.L., et al. Intoxicação aguda por Pteridium aquilinum em bovinos na Região Central do Rio Grande do Sul. Pesq. Vet. Bras. 28: 501-507, 2008. 4 Cadernos de Agroecologia – ISSN 2236-7934 – Vol 8, No. 2, Nov 2013 Resumos do VIII Congresso Brasileiro de Agroecologia – Porto Alegre/RS – 25 a 28/11/2013 ALONSO-AMELOT, M.E.; AVENDANO, M. Human carcinogenesis and bracken fern: a review of the evidence. Cur. Med. Chem. v. 9, p. 675–686, 2002. BARROS, I.C.L.; ANDRADE, L.H.C. Pteridófitas medicinais (samambaias, avencas e plantas afins). Recife, Ed. Universitária da Universidade Federal de Pernambuco, 1997. BURG, I.C.; MAYER, P.H. (Org.) Manual de alternativas ecológicas para prevenção e controle de pragas e doenças: (caldas, biofertilizantes, fitoterapia animal, formicidas e defensivos naturais). 7. ed. Francisco Beltrão: ASSESOAR/COOPERIGUAÇU, 1999. CLARO, S. A. 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