As glicoproteínas, os glicolipídeos e os glicosaminoglicanos contêm resíduos de monossacarídeos. Alguns exemplos de glicoproteínas e glicolipídeos: Metabolismos do glicuronato, dos aminoaçúcares, da galactose e da frutose cerebrosídeo Porção oligossacarídica de uma glicoproteína N-linked C ou P [email protected] Departamento de Bioquímica da Faculdade de Medicina do Porto A ligação entre a N-acetil-glicosamina e o grupo amida da asparagina da proteína é glicosídica tipo N. Espaço extracitoplasmático C ou P = ceramida ou proteína da membrana. Nos exemplos, a ligação entre a glicose e o grupo hidroxilo 1-da ceramida (nos glicolipídeos) e 2-da treonina ou da serina da proteína (nas glicoproteínas O-linked) é glicosídica tipo O. As ligações entre as unidades glicídicas do oligossacarídeo componente das glicoproteínas e glicolipídeos são glicosídicas de tipo O. 2 Os glicosaminoglicanos (=mucopolissacarídeos) são cadeias lineares de unidades dissacarídicas que se repetem. As unidades glicídicas ligam-se umas à outras através de ligações glicosídicas de tipo O. Exemplos de glicosaminoglicanos (e de um proteoglicano): Nos glicolipídeos e nas glicoproteínas das membranas a cadeia oligossacarídica está sempre no espaço extra-citoplasmático. resíduos de ácido Nacetil-neuramínico C ou P C ou P Espaço citoplasmático 1- O ácido hialurónico contém milhares de unidades dissacarídicas (→ ácido glicurónico → N-acetil-glicosamina →) e não faz parte de proteoglicanos. Gangliosídeo resíduo de L-fucose 2- O sulfato de heparano contém dezenas de unidades dissacarídicas (ácido glicurónico ou L-idurónico → N-acetil-glicosamina ou N-sulfil-glicosamina). Alguns grupos hidroxilo estão esterificados com o sulfato. Alguns grupos sulfato formam ligações sulfamida com o grupo amina da glicosamina (N-sulfil-glicosamina). Glicoproteína transmembranar (N-linked) É sempre um componente de proteoglicanos. Glicoproteína transmembranar (O-linked) Os resíduos de ácido acetil-neuramínico e de L-fucose estão, tipicamente, nas extremidades que estão em posição distal relativamente à ceramida ou à cadeia polipeptídica. 3 A cadeia polissacarídica liga-se à parte proteica (resíduo de serina ou treonina) através de uma ponte trissacarídica (→ Gal → Gal → Xilose → hidroxilo de serina ou treonina). 4 Exemplos de substratos dadores de glicosil-transférases: UDP-N-acetil-glicosamina CMP-N-acetil-neuramínico Na síntese das glicoproteínas, glicolipídeos e glicosaminoglicanos participam glicosil-transférases (glycosyltransferases). “Glicosil-transférase” é um termo genérico... Possíveis substratos dadores de unidades glicídicas na atividade das glicosiltransférases: Substratos aceitadores UDP-glicose UDP-N-acetil-glicosamina UDP-galactose UDP-N-acetil-galactosamina UDP-glicurónico UDP-xilose GDP-manose GDP-fucose CMP-N-acetil-neuramínico proteínas ceramidas difosfato uridina monossacarídeo ligado à proteína ou à ceramida ou o oligossacarídeo em fase de elongação UDP ou GDP ou CMP (ribose + uracilo) glicose → aceitador N-acetil-glicosamina → aceitador galactose → aceitador N-acetil-galactosamina → aceitador glicurónico → aceitador xilose → aceitador manose → aceitador fucose → aceitador N-acetil-neuramínico → aceitador citidina (ribose + citosina) N-acetil-glicosamina fosfato GDP-fucose difosfato guanidina (ribose + guanina) L-fucose N-acetil-neuramínico As glicosil-transférases podem ter denominações um pouco mais específicas como, por exemplo, galactosil-transférases, glicuronil-transférases, xilosil-transférases, manosil-transférases, fucosiltransférases e sialil-transférases. 5 A ligação entre o resíduo glicídico e o fosfato é glicosídica de tipo O (envolve o carbono anomérico do açúcar que vai ser transferido). Na ação das glicosil-transférases rompe-se esta ligação para se formar outra ligação glicídica de tipo O com o substrato aceitador.6 Na síntese das cadeias glicídicas, o produto de uma glicosil-transférase é o substrato aceitador da glicosil-transférase que vai atuar a seguir. O UDP-glicurónico forma-se a partir da glicose via glicose → glicose-6-P → UDP- Sulfil-transférases atuam na cadeia em elongação transferindo sulfato para hidroxilos C4 ou C6 da N-acetil-galactosamina Exemplo do processo de síntese do sulfato de condroitina: 3-fosfoadenosil5-fosfosulfato n UDP-glicurónico Repetição alternada que forma sequência de dissacarídeos (→GluA→GalNAc→)n n UDP-N-acetilgalactosamina glicose → UDP-glicurónico. A conversão UDP-glicose → UDP-glicurónico é catalisada por uma desidrogénase dependente do NAD+ (que envolve 4 eletrões). O UDP-glicurónico é substrato dador na ação de glicosil-transférases que atuam no processo de síntese de glicosaminoglicanos e na formação de glicuro-conjugados de excreção urinária ou biliar. UDP-N-acetilgalactosamina 2 NAD + UDP-glicose UDP-glicurónico UDP-galactose UDP-xilose UDP UDP UDP Pirofosforílase do UDPglicose 3-fosfoadenosil5-fosfato UDP-galactose UDP UDP ATP proteína ADP glicose UDP Glicuroniltransférases 2 NADH glicuronil-xenobiótico ou glicuronil-bilirrubina UDP-glicurónico Desidrogénase do UDP-glicose H2O PPi 2 Pi UTP glicose-1-P n UDP Na síntese do sulfato de condroitina também atuam sulfil-transférases que adicionam resíduos de sulfato ao heteropolissacarídeo oligossacarídeo de glicosaminoglicano (n+1 resíduos) oligossacarídeo de glicosaminoglicano (n resíduos) Mútase glicose-6-P Síntase do UDP-xilose CO2 UDP-xilose proteína de proteoglicano Xilosiltransférase xenobiótico ou bilirrubina UDP Xilose ligada a resíduo serina ou treonina da proteína de um proteoglicano Hexocínase O UDP-xilose forma-se por descarboxilação do UDP-glicurónico. A xilose é o monossacarídeo que se liga 7 diretamente à serina (ou treonina) da proteína de proteoglicanos: a transferência de xilose para a proteína aceitadora é o primeira reação no processo de síntese da maioria dos proteoglicanos. 8 O UDP-xilose é inibidor competitivo da desidrogénase de UDP-glicose. O UDP-N-acetil-glicosamina e o UDP-N-acetil-galactosamina formam-se a O CMP-N-acetil-neuramínico forma-se a partir da UDP-N-acetil-glicosamina. partir da frutose-6-fosfato. No processo consome-se fosfoenolpiruvato que é o dador de 3 dos carbonos constituintes do ácido N-acetil-neuramínico. A última etapa é a transferência de citidilato (CMP) H2O para o ácido N-acetil-neuramínico por ação de uma Ganglicosídeo ou pirofosforílase. Glicoproteína com ácido Aceitador (n+1 resíduos) O dador Glicosil-transférases UDP 1-do grupo amina é a glutamina, 2-do acetilo, o acetil-CoA UDP Aceitador (n resíduos) siálico numa extremidade da cadeia glicídica UDP-N-acetil-galactosamina Aceitador (n resíduos glicídicos) PPi Pirofosforílase UTP ATP N-acetil-neuramínico CTP Sialiltransférases Hexocínase N-acetil-glicosamina-1-P ATP Isomérase Mútase acetil-CoA glutamina frutose-6-P glicosamina-6-P Síntase da glicosamina-6-P glicose N-acetil-glicosamina-6-P ADP Hexocínase AcetilCoA transférase glutamato N-acetil-neuramínico-9-P fosforílase N-acetil-manosamina-6-P ADP cínase ATP N-acetil-manosamina hidrólase UDP H2O UDP-N-acetil-manosamina CMP-N-acetilneuramínico CMP glicose-6-P Pi Pirofosfosforílase PPi ADP glicose H2O Pi UDP-N-acetil-glicosamina 4-epimérase 3-e do uridilato, o UTP. Neuraminidases 2-epimérase glicose-6-P glutamina + acetil-CoA + UTP UDP-N-acetilglicosamina frutose-6-P glutamato + CoA + PPi A enzima “marca-passo” da via metabólica é a Síntase da glicosamina-6-fosfato que é inibida pela UDP-N-acetil-glicosamina. piruvato fosfoenolpiruvato 9 O GDP-manose e o GDP-fucose formam-se a partir da frutose-6-fosfato. Na conversão da frutose-6-fosfato em GDP-manose estão ADP ATP envolvidas duas isomérases e uma pirofosforílase. O substrato glicose glicose-6-P dador de guanilato (GMP) é o GTP. Isomérase Isomérase Mútase Na conversão da GDPmanose em GDP-fucose estão envolvidas uma desidrátase e uma redútase. GDP-manose H2O Glicogénio (n+1 resíduos) 3- Quando se ingere Manosiltransférases Desidrátase NADPH Aceitador (n resíduos) NADP+ Glicogénio (n resíduos) Aceitador (n+1 resíduos) GDP Uridil-transférase da galactose-1-fosfato ADP GTP L-fucose-1-P Pirofosforílase Tipicamente, o resíduo de L-fucose fica situado numa extremidade da cadeia oligossacarídica, quase sempre como resíduo único constituinte de uma ramificação. Aquando da ação de fucosídases liberta-se L-fucose 11 que pode ser reativada a GDP-fucose via cínase da L-fucose e de uma pirofosforílase. PPi UDP-galactose UTP Mútase ATP L-fucose Cínase da L-fucose Pirofosforílase do UDP-glicose glicose-1-P H2 O fucosídases PPi Síntase do glicogénio UDP-glicose 4-epimérase Fucosiltransférases GDP-fucose UDP ADP Pirofosforílase galactose-1-fosfato GDP-4-ceto-6-desoxi-manose Redútase A ação da 4-epimérase permite que a UDP-galactose formada na ação da uridil-transférase da galactose-1fosfato se converta em UDP-glicose. No processo de formação de glicose-1-fosfato a partir de galactose, o par UDP-galactose /UDP-glicose tem um papel “pseudo-catalítico”. ATP Cínase da galactose GTP PPi 10 Maioritariamente no fígado, a galactose da dieta converte-se em glicose-1fosfato via ação da cínase da galactose e da uridil-transférase da galactose-1-fosfato. galactose manose-1-P manose-6-P frutose-6-P Os resíduos de ácido N-acetil-neuramínico estão, quase sempre, nas extremidades das cadeias oligossacarídicas. piruvato glicose-6-P glicose H2O Pi Glicose-6-fosfátase galactose, a massa de glicogénio aumenta porque parte da glicose-1fosfato se converte em UDP-glicose que é dador de glicose na ação da síntase do glicogénio. 1-Quando se ingere galactose, a glicemia aumenta (ligeiramente) porque parte da glicose-1-fosfato se converte em glicose-6-fosfato que, por sua vez, no fígado, sofre a ação da glicose-6-fosfátase, libertando glicose. 2-Uma parte da glicose-6-fosfato segue a via glicolítica e o lactato plasmático aumenta… lactato, CO2 12 A galactose é, a par com a glicose e outras oses, um importante constituinte de glicolipídeos, glicoproteínas e proteoglicanos. Alguns exemplos: No entanto, a galactose não é um nutriente essencial porque o UDP-galactose (um substrato da galactosil-transférases) é sintetizado a partir da glicose. Na verdade, mesmo quando se ingere galactose, os resíduos de galactose dos gliconjugados que contêm galactose provêm da glicose do sangue que entra nas células e se converte em UDP-galactose (o dador de galactose na ação das galactosil-transférases). Globosídeo Aceitador (n+1 resíduos) Glicoproteína Aceitador (n resíduos) UDP-glicose Pirofosforílase do UDP-glicose 4-epimérase Porção glicídica (glicosaminoglicano) de proteoglicanos PPi UDP A galactose faz parte da ponte trissacarídica que, na maioria dos proteoglicanos, liga a “cadeia de unidades dissacarídicas” repetitivas à proteína. 13 Glicose-6-fosfátase glicose As enzimas que catalisam a conversão da frutose em frutose1-P (cínase da frutose), a cisão desta em dihidroxiacetona-P e gliceraldeído (aldólase B) e a fosforilação deste em gliceraldeído3-P (cínase do gliceraldeído) só existem no fígado, rim e enterócitos. ATP frutose Pi ADP Glicogénio glicose-1-P glicose-6-P Isomérase das hexoses-P H2O ATP ADP hexocínase dissacarídica repetitiva no sulfato de queratano (um glicosaminoglicano). UDP-glicose Mútase Síntase da lactose A galactose faz parte da unidade A ingestão de frutose leva ao aumento (modesto) da glicemia. Outros destinos da frutose da dieta são a (1) formação de lactato, (2) oxidação a CO2 e (3.1) a síntese de glicogénio e (3.2) de ácidos gordos. UTP glicose-1-P glicose-6-P Após o nascimento do bebé produz-se na mama da mãe uma proteína (lactalbumina) que se liga à galactosil-transférase e que lhe modifica a especificidade: o substrato aceitador passa a ser a glicose e começa a formar-se lactose. Ao contrário da glicose e da galactose (que podem fazer parte de glicoconjugados) o papel biológico da frutose é exclusivamente energético. A frutose existe no sémen porque nas vesículas seminais existe uma via metabólica que, via sorbitol, converte glicose em frutose. 14 Glut5 NADH Desidrogénase do sorbitol NAD+ frutose-6-P Hexocínases ATP Pi ADP frutose-1-P frutose Redútase das aldoses H2O frutose-1,6-bisfosfato NADPH Aldólases A e B Aldólase B sorbitol (é um poliálcool) dihidroxiacetona-P Isomérase das trioses-P gliceraldeído NADP+ Frutose-1,6-bisfosfátase Cínase da frutose gliceraldeído-3-P Cínase do gliceraldeído ATP ADP glicose piruvato acetil-CoA ácidos gordos CO2 lactato O facto de os espermatozoides consumirem frutose e de o líquido seminal conter este açúcar dá aos gâmetas masculinos uma vantagem competitiva sobre outras células (nomeadamente fungos e bactérias) que povoam a vagina normal contribuindo para a sua sobrevivência (e para a sobrevivência dos genes neles contidos). 16 Bibliografia consultada Murray, R. K., Granner, D. K., Mayes, P. A. & Rodwell, V. W. 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