Jeitinho brasileiro: corrupção Pedro Henrique Freire Janzantti Resumo Neste ensaio, apresentaremos os maleficios da corrupção, primeiramente explicando o que é esse ato, exemplificando ele na esfera pública e dentro das empresas privadas. Nele, há a tentativa de mostrar a origem da corrupção, em seguida se desenvolve o por que da mentalidade individualista do abuso do poder para se conseguir o benefício privado. Em seguida, por meio de pronunciamentos sobre a necessidade da mudança de mentalidade da população e de depoimentos sobre casos recentes na política brasileira, analisamos o contexto atual que o Brasil vive e as medidas que são tomadas contra os crimes de corrupção. Além de mostrarmos por meio da opinição de personalidades públicas internacionais a necessidade da punição dos corruptos para que se possa tentar mudar a imagem das instituições e ter a confiança da população, demonstrando a seriedade do governo. Palavras chave: Corrupção, Instituição, Público, Privado, Brasil. Introdução Quando pensamos na corrupção como tema principal a ser abordado neste ensaio é quase inevitável ligar esse assunto ao tema política. Isto porque, a mídia tem veiculado constantemente, escândalos de corrupção no governo. Infelizmente, hoje, a corrupção é uma prática comum no meio público para se obter diversos tipos de vantagem, por exemplo, ganhar licitações para prestar serviços ou para gerenciar grandes obras. Porém, não se pode esquecer que corrupção é qualquer ato de suborno que adultera algo de modo a torná-lo ilegal visando benefícios: cargos, bonificações, absolvições, etc.. Nas empresas privadas, a corrupção não está vinculada, necessariamente, ao suborno, mas podem ocorrer acréscimos de valores nos produtos e comissões. Do ponto de vista da esfera pública coisas como essas são apenas características do mercado; porém, para a empresa, são atos de corrupção. Desenvolvimento O senso comum liga a corrupção, apenas ao poder, aos políticos e as elite econômicas, porém a definição de corrupção é muito ampla, visto que qualquer ação ou omissão que resulte num ato ilícito que gere uma vantagem indevida é corrupção. Para o teórico político C.J.Friedrich, corrupção é um padrão de comportamento que se desvia da norma predominante ou que se acredita predominar em determinado contexto, é um comportamento deformado, associado a uma motivação particular, a do ganho privado à custa do público. Entende-se então que a corrupção é o ato que desvia o interesse do público para o individual. O que se tem notícia em relação a esse interesse individual ultrapassando o coletivo no passado são consequências do abuso de poder, isto é, o poder centralizado que permitia aos donos do poder se sentir no direito de impor altos impostos, por exemplo. No feudalismo, em específico, os senhores feudais valorizavam a terra da maneira que queriam, assim como seus produtos. "O poder tende a corromper, e o poder absoluto corrompe absolutamente, de modo que os grandes homens são quase sempre homens maus." Lord Acton O historiador britânico Lord Acton disse que o poder naturalmente corrompe, mas sendo o poder absolutista, este corrompe mais ainda. No contexto da Idade Média, na qual, o absolutismo era o sistema político, tais atitudes autoritárias não eram consideradas corrupção por estarem amparadas pelos constumes da época. Só hoje percebemos como ocorreram explorações dos servos, visto que para a sociedade feudal, tratava-se de uma prática comum e de um direito do detentor das propriedades. O que se seguiu na história foi consequência dessa mentalidade abusiva por parte do segmento que detinha o poder. Assim, além das "causas naturais" (imperfeições da natureza humana), a cultura da época propiciava a corrupção, e pela história as chances de suas práticas foram crescendo. O filósofo David Hume foi o primeiro a afirmar o óbvio: a maioria das pessoas buscam, através dos seus atos, a satisfação dos seus próprios interesses, e não de um interesse público subjetivo. Assim, hoje, como causa da corrupção, além do individualismo, vemos as injustiças sociais, que não criam oportunidade aos desprovidos de capital, a intransparência administrativa, o autoritarismo, a exclusão social dos negócios públicos, a centralização do poder e outras atitudes antidemocráticas, que tornam a corrupção um recurso para ultrapassar essas barreiras e conseguir benefícios de forma mais rápida. Se nesse processo cumulativo de causas forem incluídas distorções no ordenamento jurídico, como penas inadequadas, lentidão nas investigações, congestionamento da Justiça, ineficácia dos controles e impunidade que dificultem a punição dos corruptos, sem dúvida, a corrupção torna-se-á endêmica e imune aos meios de controle. No Brasil, o comportamento de querer “tirar vantagem em tudo” está enraizado na cultura pressupondo que os sujeitos querem o máximo possível de benefícios, visando exclusivamente o beneficio próprio. Esse tipo de comportamento, contudo, se adapta perfeitamente ao “espírito capitalista” no qual vivemos, já que esse sistema economico sustenta-se na apropriação da mais valia. Adam Smith, pai da economia moderna e do liberalismo economico, caracterizava como a melhor forma de contribuir com o progresso social, a busca do benefício próprio, visto que o homem agindo pelo próprio interesse beneficiaria a sociedade como um todo. O Brasil viveu 20 anos de Regime Ditatorial Militar, com problemas economicos causados pelos empréstimos ao Fundo Monetário Internacional e com diversos escândalos envolvendo perseguições políticas, com a justificativa de estar moralizando a sociedade brasileira, esperavasse uma situação atual diferente. Além de ter sido um período de totalitarismo que permitia o abuso do poder, o poder judiciário da época expedia mandatos incoerentes, formando assim um ambiente propício a corrupção. Por isso, os governos subsequentes ao Regime deveriam ser exemplos da democracia, dando transparência ao seu funcionamento e seguindo as vias legais, visto que foram por tanto tempo excluídos do governo. Entretanto, sabemos que não foi isso que ocorreu, os anos seguintes ocorreram diversos casos de corrupção. Fernando Collor de Mello, foi o exemplo de um ícone que ganhou uma eleição com a campanha de ser o condenador dos que se enriqueciam ilicitamente (caçador de marajós), e foi vítima de sua própria campanha, foi corrupto e sofreu o impeachment. O Brasil não aprendeu, viveu 20 anos com um governo centralizado que agia de forma ilícita e colocou no governo outro governante que seguiu com condutas antipopulares. E hoje, também sabemos, que todos os governos que assim seguiram tiveram escândalos. Esse crescente mal que existe saiu do círculo da esfera pública local e tornou-se um problema que abala o mundo (sociedades e economias) em geral. O escândalo da empresa Enron, em 2003 mostrou como a economia globalizada conseguiu mascarar a situação da empresa e ter diversas vítimas para investir seu dinheiro numa empresa falida. Por esse e diversos outros casos de corrupção, em 2003, a Organização das Nações Unidas (ONU) promulgou a Convenção Internacional Contra a Corrupção, que ocorreu com o intuito de prevenir a corrupção e lutar contra ela. Tal Convenção ressalta a importância da prevenção, por isso, a necessidade da transparência nas decisões. Como pena para o crime de corrupção, determina a recuperação dos ativos, que seria possível por meio da ação policial e jurídica para rastrear desvios e poder devolver os valores roubados. Além da Convenção, a Legislação Nacional tem que criminalizar esse ato, mesmo que seja um fato comum em sua história, já que o dinheiro desviado deveria ter outro destino, em geral, melhorias. Percebe-se então que a corrupção prejudica a economia, pois torna-se uma barreira aos investimentos. O ex-ministro da Defesa e advogado, Waldir Pires, em 2003, afirmou com a notícia da criação da Convenção, que o dinheiro ilícito é um inimigo da construção da democracia, visto que ameaça a coesão social e destrói a política e a economia. Hoje, dez anos depois da Convençao, o ministro do Supremo Tribunal Federal, Luis Roberto Barroso, disse que a corrupção não deve ser politizada, já que ela existe em qualquer atitude que descumpra a regra, e que para ser resolvida na política é necessária uma reforma para previnir e punir. A punição deve ocorrer para que se possa contornar a situação e fazer com que os culpados paguem pelo crime. O ex-governador do Goiás, Maguito Villela (PMDB), disse no programa Roda Viva, em 1997, da Tv Cultura, da necessidade de uma reforma política para “varrer” e mandar para a cadeia os políticos corruptos. Entretanto, só agora em 2013, a lei 12.846, Lei Anticorrupção foi criada com esse intuito de punir. A narrativa de Jean Cruet em sua obra “A vida do direito e a inutilidade das leis” se mostra apropriada para a análise da Lei Anticorrupção, pois, dizia o autor: “Se vê todos os dias a sociedade reformar a lei, nunca se viu a lei reformar a sociedade”. Assim é complexo afirmar que a corrupção nasceu na sociedade e como se alastra sendo um desvalor social, porém mais difícil é compreender como uma lei terá o poder de alterar esse (des)valor social. De qualquer forma, com essa Lei, o poder judiciário tem legislação específica para punir os indivíduos que recebem propina e a entidade que pagou por ela. Nunca antes houve legislação brasileira que favorecesse quem quisesse punir malandros corporativos. Visto que o processo criminal, em que se pede indenização, pode levar muitos anos até ser decidido. Além de que durante esse trâmite jurídico, os corruptos podem mover um processo alegando ter sofrido danos morais. Em geral, o que acontecia era que as empresas privadas se sentiam sem saída e demitia o corruptos sem falar em justa causa, já o governo torna-se vítima da imprensa que denucia de forma sensacionalista, tendenciosa a oposição. Assim, a corrupção é um crime muito complexo, na esfera pública por envolver governos e na esfera privada por estar diante da disputa do mercado. E por isso, existem divergências doutrinárias quanto à definição do objeto violado nos crimes de corrupção. Alguns consideram ser uma ofensa à ordem econômica, à livre iniciativa, à concorrência leal, à propriedade privada ou, ainda, à integridade do sistema normativo, enquanto outros, na perspectiva jurídica, julgam não haver uma vítima determinada, pois os interesses atingidos são supra-individuais, indetermináveis em um primeiro momento, que assumem consequências de forma difusa na sociedade. A cooperação e a fiscalização é a ferramente que temos para poder não ter nosso patrimônio abalado por corruptos. Existem diversas entidades internacionais que desenvolvem estudos sobre as causas da corrupção, além dos países mais sucetíveis a esses escândalos. A Organização Não Governamental americana, Transparency International promove anualmente ferramentas para a identificação da corrupçãp e assim, sugere medidas preventivas para o mundo corporativo e para o setor público. Embora, o jornalista francês Bernard Cassen do Le Monde, já tenha dito que diversas ONGs americanas servem de cortina de fumaça para esconder a corrupção americana e moralizar o resto do mundo, hoje, os Índices por eles desenvolvidos nos auxiliam em estudos sobre esse mal hábito da corrupção. FIGURA 1: Mapa temático do Índice de Percepção da Corrupção das Américas – 2013. FONTE: ONG TRANSPARENCY INTERNATIONAL Por meio de pesquisas, a Transparency Internacional consegue medir um Índice de Percepção da Corrupção de cada país, no qual por meio de dados da mídia e da justiça, calculam escândalos e a quantidade de processos que são resolvidos com punição aos corruptos para saber se o país é complacente com a corrupção, ou criminaliza e toma medidas para acabar com ela. O Brasil está no Ranking Mundial em 72º/144 lugar com 42/100 pontos nesse Índice, o que demonstra que ainda não conseguiu resolver os problemas existentes. Cassen também desenvolve um pensamento sobre a necessidade de alguém que denuncie a fraude política, porém insiste na condenação da luta contra a corrupção pelo neoliberalismo que os Estados Unidos querem impor ao resto do mundo, sem que eles próprios o façam. O economista Gary S. Becker afirma que as possibilidades de estudos das ciências sociais ampliam-se dramaticamente com a abordagem econômica do comportamento humano, visto que a corrupção, por exemplo, influencia diretamente os investimentos e a economia. O economista, Max Weber, analisando a burocracia como uma forma de racionalizar a administração, a viu como uma forma de aumentar a confiabilidade, que nessa condição, profissionalizaria o trabalho, favorecendo a moralidade econônomica e dificultando a corrupção. Entretanto, hoje, vemos a burocracia como um impecilho para o dinamismo econômico, e não como uma ferramenta para exigir legalidade. Hoje existe certo consenso sobre os efeitos negativos da corrupção na economia, por ela a desestabilizar, por aumentar o risco da atividade econômica e elevar os custos de produção, refletindo numa diminuição do investimento e, consequentemente, diminuição do crescimento de uma economia. “É um grande empecilho ao crescimento. Inibe ações de investimento, o empreendedorismo, a inovação, a iniciativa pessoal, porque você fica a mercê de propinas, de desvios para obter facilidades”, Moreira Franco O político brasileira Moreira Franco analisa a corrupção como uma forma de “deprimir” o país que deveria ter condutas lícitas. Além disso, convicto de que a corrupção tem um custo financeiro e político muito alto, destaca a perda da credibilidade do Estado. A recuperação de ativos é uma questão particularmente importante para os países em desenvolvimento, como o Brasil, onde a corrupção de alto nível tem saqueado a riqueza nacional e onde os recursos são extremamente necessários para a reconstrução e a reabilitação das sociedades. A condenação dessa prática ao invés da valorização de “quem tira vantagem” é a primeira conduta, pois com isso é possível a aliança dos governos, comunidade empresarial, sociedade civil e meios de comunicação para acabar com a corrupção, assim formando uma cultura de prevenção e integridade. "Sem a corrupção e suborno, milhões de mulheres, crianças e homens não seriam traficados como escravos, milhares de armas de pequeno porte não chegariam aos seus destinos violentos e toneladas de drogas ilícitas não alcançariam os seus consumidores" Yuri Fedotov O diplomata russo, Yuri Fedotov, afirma que a corrupção desvia recursos de outros setores que precisam de investimentos, além de que o crime, hoje, não é punido, pois as autoridades são corrompidas. Assim, conclui-se que a prevenção da corrupção resolve diversos crimes e possibilita o investimento do dinheiro desviado. O evento Rio+20, que ocorreu em junho deste ano, teve como mensagem central em sua abertura a necessidade do fim da corrupção para que a tentativa de desenvolvimento sustentável e economia verde ocorram de verdade. Em torno de toda essa discussão, e do conhecimento do malefícios da corrupção, a principal controvérsia ainda se encontra na análise de suas causas, as quais devem ser o foco das políticas governamentais que visem a combater essa prática em nossas sociedades. De qualquer forma, a mudança da mentalidade e a condenação dessa prática é essencial. Conclusão Procuramos mostrar neste ensaio que a corrupção é uma forma ilegal de desviar recursos para indivíduos, desmoralizando instituições públicas e privadas, vítimas de pessoas corruptas. Esta desmoralização também se deve ao fato de as investigações e as condenações serem excessivamente morosas, uma vez que envolvem o levantamento de muitas provas e depoimentos, o que pode demorar anos. Quando se trata de instituições públicas, a bem da verdade, a corrupção corrompe a própria democracia, trai a sociedade e a justiça, causa prejuízos ao bom funcionamento do Estado e, como consequência, decepciona o povo que passa a desacreditar nos políticos e nas instituições. Na iniciativa privada, a corrupção gera prejuízos de grande monta que podem afetar o funcionamento e a gestão da empresa, causando direta ou indiretamente danos a toda a sociedade. Sejam brasileiros ou não, todos os economistas e políticos que estão envolvidos com o estudo dos malefícios da corrupção, destacam a necessidade de combatê-la por meio da prevenção, da mudança de mentalidade das pessoas, visto que a condenação dos corruptos e a recuperação dos ativos são essenciais para reconquistar a confiança nas instituições e nas pessoas, bem como reinvestir a verba desviada em prol de iniciativas realmente idôneas e eficazes. Percebemos que a economia brasileira, hoje, é estável mesmo com escândalos de corrupção, porém, devemos destacar que existe a perda da confiança nos órgãos públicos, mesmo que não estejam atrelados a diminuição dos investimentos. Isto é, a economia segue crescente mesmo com problemas administrativos, que, caso, superados, demonstrariam mais seriedade nos trabalhos e destacariam mais o nosso país, possibilitando haver mais propaganda da nossa economia para receber mais investimentos. Bibliografia REZENDE, Antonio Muniz de. “Crise Cultural e Subdesenvolvimento Brasileiro”. Campinas: Papirus, 1982. Coleção Krisis. ROLDAN, Roldan. “A revolta dos 20 centavos”. Correio Popular. Campinas, 2 jul. 2013. Caderno Principal p. A2. CASSEN, Bernard. "Transparência Internacional" ou cortina de fumaça? Le Monde Diplomatique. Brasil, 1 mai. 2001. Disponível em: < http://www.diplomatique.org.br/acervo.php?id=306>. Acesso em: 3 dez. 2013. STARLING, Heloisa Maria Murgel. “Moralismo capenga”. 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