Porto Alegre, 5 de agosto de 2013. De: AD VERITAS – Wanderley

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V E R A L Ú CI A F RI T S CH F EI JÓ
W A N DE RLE Y M AR CE LINO
ADVOGADOS
Porto Alegre, 5 de agosto de 2013.
De: AD VERITAS – Wanderley Marcelino e Vera Lúcia Fritsch Feijó
Para: SINDIREGIS
Assunto: Descontos pelo DETRAN-RS de supostos valores pagos a maior aos CRVAs.
I - DOS ANTECEDENTES FÁTICOS
O DETRAN-RS, através do Of. Nº DAF/23-13, datado de 13 de maio de 2013,
endereçado ao então Presidente do SINDIREGIS, Dr. Calixto Wenzel, informa que no
segundo semestre de 2012 o DETRAN foi objeto de auditoria de acompanhamento na
área de tecnologia da informação, realizada pela Contadoria e Auditoria-Geral do
Estado, na qual foi constatada, na ótica dessa auditoria, a existência de milhares de
processos que geraram remuneração a maior aos CRVAs.
No último parágrafo desse ofício resultou assentado que os valores a serem
devolvidos pelos CRVAs ascendem a R$ 1.761.934,91 relativamente ao período de
2007 a 2012. Esclarecem, esse ofício e o ofício circular DAF/21-13, este último
remetido a todos os CRVAs, que os processos se referem a solicitações de segunda via
de CRV/CRLV e constam como tendo a vistoria dispensada, visto já realizada e
remunerada em outro processo, mas que foram remuneradas como se o serviço
tivesse sido realizado, recomendando, o órgão de controle, que o DETRAN-RS
procedesse à correção do problema, apurando o que fora pago a maior nos últimos
cinco anos, para retorno aos cofres públicos mediante devolução por parte dos CRVAs.
A partir dessa constatação, unilateral, diga-se, o DETRAN-RS, também de forma
unilateral, iniciou a retenção de valores, mediante desconto na remuneração dos
credenciados, a partir do mês de competência julho de 2013, em parcelas mensais
que podem ir até 17, dependendo do montante a ser descontado.
II - CONSIDERAÇÕES TÉCNICAS
É assente na doutrina do direito administrativo a existência de três princípios
basilares: a) supremacia da Administração sobre os administrados; b) presunção de
legitimidade dos atos da administração e c) existência de poderes discricionários
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conferidos à Administração. Os três princípios acima identificados existem para
conferir à Administração Pública situação privilegiada em face dos administrados, com
a justificativa de que cabe a ela, Administração Pública, gerir os bens públicos, a
todos pertencentes, no sentido da realização do bem social, do bem comum.
Coexistindo com os princípios antes postos, devem ser considerados ainda outros:
legalidade, moralidade, impessoalidade, finalidade e publicidade, conforme o art. 37,
caput
da
Constituição
Federal.
Agregando-se,
também,
os
da:
eficiência,
razoabilidade, proporcionalidade, segurança jurídica, contraditório e ampla defesa,
estes conforme disposto no art. 2º da Lei 9.784/99.
Sublinhe-se a relevância e efetividade dos dois princípios vetores do Estado
Democrático de Direito, os do contraditório e da ampla defesa, que a par de
consagrados em todas as nações livres, foram erigidos à garantias constitucionais, e
vi legis do artigo 5º, inciso LV, da magna carta pátria: “aos litigantes, em processo
judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e
ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes”.
Advém dos princípios, os poderes que a Administração detém para o exercício de suas
atividades. Enumeram-se os seguintes poderes: a) poder vinculado – para a prática
de atos de sua competência, cujos elementos de formação estão determinados pela
lei; b) poder discricionário – para a prática de determinados atos administrativos
segundo sua conveniência e oportunidade, contudo, observada, sempre, a legalidade
quanto à forma, competência e finalidade; c) poder hierárquico – para distribuir e
escalonar funções; d) poder disciplinar - para punir os desvios de conduta que não
observarem os princípios pelos quais se devem se pautar os agentes públicos; e)
poder regulamentar – reservado aos chefes dos Executivos para explicitar a lei na
órbita de suas competências; f) poder de polícia – para condicionar e/ou restringir o
uso e gozo de determinados bens, atividades e direitos individuais, em benefício da
coletividade e do próprio Estado.
Os princípios e os poderes deles decorrentes direcionam a conduta da Administração
Pública e lhes servem de instrumento para que toda a atividade seja realizada em
função do melhor proveito social.
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Portanto, o exercício da fiscalização de seus próprios atos, com a possibilidade de
revogar aqueles que entender não mais oportunos ou inconvenientes e anular aqueles
em que verificar vícios de ilegalidade constitui o regular exercício do poder
hierárquico, em que os órgãos superiores ordenam, coordenam, orientam e corrigem
suas próprias atividades e dos órgãos que lhe são inferiores.
Depreende-se que o DETRAN-RS está se utilizando, no caso objeto deste parecer, da
fiscalização
hierárquica
(autotutela
administrativa),
na
medida
em
que
está
reapreciação o seu ato e tomando providências unilaterais.
Mesmo considerando os amplos poderes que os especiais princípios de direito
administrativo conferem à Administração, este exercício fiscalizador não é ilimitado,
considerando a existência dos princípios antes postos em destaque, os da ampla
defesa e do contraditório, que não se limitam aos casos levados ao judiciário, nem
à existência de um processo administrativo, bastando que haja interesses colidentes
entre o órgão fiscalizador e o agente fiscalizado para se ter a figura da litigância, em
sentido amplo, sem a instauração de uma lide em sentido estrito (processo judicial ou
administrativo). Basta que se afigurem as partes litigantes ainda que em processo
administrativo de fato.
No caso em tela, o DETRAN-RS está ofendendo a princípios basilares do direito
administrativo, destacadamente aos princípios da ampla defesa, contraditório e
segurança jurídica, na medida em que procede descontos sob a alegação de
pagamento irregular, sem a efetiva demonstração, caso a caso, do momento da
ocorrência do erro e seu valor. Num ato que desborda do princípio da razoabilidade, a
par da ofensa aos princípios vetores da ampla defesa e do contraditório, procede ao
desconto de valores na remuneração mensal dos registradores delegatários do serviço
público sem a demonstração efetiva do valor creditado a maior, operação que ensejou
o crédito, data e a que processo se refere e atualização monetária.
A Administração está fazendo desconto de valores dos credenciados com inegável
ofensa ao princípios da ampla defesa e do contraditório.
Certo que os atos administrativos gozam da presunção de legitimidade, contudo, tal
presunção não se afigura absoluta, do contrário, tais atos seriam absolutamente
intangíveis, permitindo perigosamente a arbitrariedade e a dificuldade de aferição,
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inclusive, pelo Poder Judiciário, o que se desgarra, sem dúvida, do Estado
Democrático de Direito tão arduamente conquistado pelas lutas da cidadania desde os
tempos da Revolução Francesa.
Ora, num raciocínio simples, se houve equívoco quando do pagamento, passível a
existência de equívoco agora, por ocasião, do coercitivo reembolso, sem que tal
questionamento possa ser tido como afronta indevida à presunção de legalidade e
legitimidade de que se revestem os atos administrativos.
Tem importante significado a orientação doutrinária de que na esfera administrativa
não pode haver privação de liberdade ou restrição patrimonial sem a consagração
legal do processo administrativo em sentido constitucional, de maneira a assegurar ao
cidadão a garantia da sua manifestação livre, aí entendida a ampla defesa e o
contraditório, direitos elevados à garantia constitucional.
O DETRAN-RS, ao fazer os descontos de forma unilateral e sem demonstração
específica e detalhada, deixa de assegurar ao credenciado direito ao contraditório e a
ampla defesa. Subtrai dele o direito de impugnar o ato, porquanto o DETRAN está
dando efetividade a um ato administrativo sem o devido processo legal.
Concordemente, está o credenciado totalmente desprovido de elementos para poder
concordar, discordar ou impugnar esses descontos, posto realizados de forma
arbitrária, unilateral e sem a observância do devido processo administrativo com
todos os seus princípios vetores, dentre os quais os já referidos princípios do
contraditório e da ampla defesa.
Deve-se levar em consideração aspectos relevantes na questão posta, quais sejam: o
credenciado não deu causa ao pagamento desses valores, se os recebeu os foi de
boa-fé por imperfeição da Administração na interpretação e prática de atos
administrativos. O credenciado não influiu nem interferiu no pagamento desses
valores, daí por que a figura do recebimento de boa-fé. Devem ser devolvidos?
Ademais disso, o credenciado não tem um histórico efetivo, com cabal demonstração,
da origem dos valores que estão sendo descontados. Não se lhe disponibilizou uma
documentação que retrate, com a efetividade necessária, a origem, a natureza, a
data, o serviço, o processo de vistoria e o valor que eventualmente lhe tenha sido
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repassado. Sobre o eventual capital repassado a maior existe alguma carga acessória,
como multa, juros e correção monetária? O credenciado não tem como objetar o
desconto porquanto dele foi subtraído o direito à ampla defesa, ao contraditório e à
transparência do ato administrativo.
Ainda nesse contexto técnico-jurídico surgem algumas indagações que poderão ser
investigadas num outro momento dentre as quais se o ato acoimado de ilegal é nulo
ou revogável. Se revogável, não teria o administrador legitimidade para modular os
seus efeitos, ou seja, dando eficácia ex nunc, ao invés de ex tunc? Em tal caso, os
efeitos do ato se irradiariam daqui para frente, sem retroagir ao passado. Ademais, na
premissa de que tais valores foram creditado sem que o delegatário tenha dado
causa, não estariam eles inseridos no princípio do recebimento de boa-fé e aí se
discutiria sem seriam repetíveis, ou seja, devolvidos?
III - O QUE FAZER?
(A) Âmbito Administrativo
Parece que
num primeiro momento o assunto
deva ser tratado na esfera
administrativa junto ao DETRAN-RS, através de manifestação escrita, postulando que
se suspenda o ato de retenção (leia-se, desconto) dos valores na remuneração dos
registradores delegatários dos CRVAs.
Obtida a suspensão, que o órgão de controle disponibilize ao DETRAN-RS e este aos
CRVAs todo o levantamento efetuado, de maneira a viabilizar uma análise acurada
dos dados e elementos dele constantes, com todas as variáveis possíveis que
permitam a efetiva identificação do repasse indevido ou não, e se os valores que
estão sendo retidos correspondem ao que foi indevidamente repassado.
(B) Via Judicial
Frustrada a solução pela via administrativa, aos credenciados assiste o direito de
buscar a tutela jurisdicional do Estado-Juiz, elegendo o caminho processual a ser
oportunamente avaliado e definido (mandado de segurança individual; mandado de
segurança coletivo, pela entidade legitimada para tanto; ação ordinária, pela via da
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substituição processual e através de entidade sindical a ela legitimada; ou de forma
individual, ou, ainda, pela via da ação plúrima).
A estratégia de atuação judicial ou extrajudicial, poderá ser definida a partir de
reunião dos interessados com seus consultores jurídicos, para o que os ora firmatários
deste parecer se colocam à disposição.
É o parecer.
Cordialmente,
W AND E RLEY MAR CE LI NO
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A DV OG A D O – O A B - R S 1 6 . 6 3 5
A D V O G A D A – OA B - R S 1 9. 8 4 5
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