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1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS
A enfermagem, por mais de quarenta anos, vem atuando como conselheiros e
educadores na área de genética e, conseqüentemente, contribuindo para ampliar o
conhecimento dos profissionais em relação aos aspectos biológicos e psicossociais
do processo saúde-doença, transformando o modo de assistência da população
(NASCIMENTO; SANTOS, 2006).
Com a finalização do Projeto Genoma Humano, iniciou-se uma revolução no campo
da genética, adentrando-se em uma nova época denominada “Era Genômica”, a
nova fronteira para a ciência. Os mistérios do conhecimento do genoma humano
apenas começaram a ser revelados, porém, já se antecipam grandes avanços,
trazendo profundas modificações e implicações para os profissionais de saúde e
para o paradigma atual no qual esses profissionais não só tem sido educado, mas
também exercem sua profissão (NASCIMENTO; SANTOS, 2006).
Devido a isso, observamos a necessidade de aprimoramento técnico-científico no
atendimento ao paciente portador de Epidermólise Bolhosa1 e a necessidade da
abordagem dos cuidados de enfermagem personalizados as características
individuais de cada portador desta patologia que é classificada em tipos e subtipos
de acordo com o Código Internacional de Doenças (GURTLER; DINIZ; FILHO,
2005).
O enfermeiro por se tratar do elo que liga o paciente aos demais profissionais de
saúde, torna-se essencial para a orientação do cuidado continuado no ambiente
domiciliar, bem como para esclarecimento de demais dúvidas que possam surgir por
parte do paciente e muitas vezes de seus familiares, desempenhando assim seu
papel de educador e multiplicador da educação. A visão holística do enfermeiro o
torna capaz de desempenhar o papel como cuidador e principalmente como
visionário do prognóstico do paciente com Epidermólise Bolhosa de forma
psicossocial (WHALEY; WONG, 1999).
____________
1
A Epidermólise Bolhosa forma um grupo de desordens bolhosas hereditárias em que as bolhas
surgem espontaneamente ou desencadeadas por trauma.
10
Torna-se necessária então o aperfeiçoamento do enfermeiro diante desta patologia,
pois a prevalência da Epidermólise Bolhosa Distrófica Recessiva é de 1:300.000
nascimentos e a prevalência da Epidermólise Bolhosa Distrófica Dominante é de
1:50.000 nascimentos, logo as possibilidades de nos depararmos com um paciente
portador desta patologia, mesmo sendo rara, são grandes (PAULA et al., 2002).
Assim como a ciência passa por suas revoluções, nós como enfermeiros devemos
nos engajar para aprimoramos nossas técnicas pautados no conhecimento técnicocientífico, sendo capazes de acompanhar a evolução da mesma (NASCIMENTO;
SANTOS, 2006).
Saber como lidar com a Epidermólise Bolhosa, ou pelo menos reconhecê-la de
forma eficaz, nos disponibilizará ferramentas para evoluirmos com os avanços do
projeto genoma e dos estudos da genética de forma geral, e isto poderá impactar na
saúde daqueles clientes que chegarão até nós no futuro.
Para a enfermagem o diagnóstico médico diferencial assertivo da Epidermólise
Bolhosa é crucial para que os cuidados de enfermagem sejam rapidamente
implementados. Existem relatos na literatura que evidenciam esta importância desde
o berçário, logo o atraso no diagnóstico médico, a falta de preparo da equipe saúde,
pode trazer conseqüências impactantes no portador desta patologia. (BONIFAZI;
ANNICCHIARICO, 2006).
O Código Internacional de Doenças, que se encontra em sua décima edição, desde
sua sexta edição, em 1948, que não traz somente classificações que diziam a
respeito às causas de morte, mas suas finalidades se expandiram passando a incluir
também doenças não fatais. Da nona para a décima edição passou-se então de
dezessete capítulos para vinte e um capítulos. O Secretariado da Organização
Mundial de Saúde é o responsável pelo Código Internacional de Doenças e atua
como centro de referência para qualquer publicação (exceto as publicações das
estatísticas nacionais) ou para traduções a partir do Código Internacional de
Doenças (DATASUS, 1993).
11
A Organização Mundial de Saúde deve ser prontamente notificada sobre a intenção
de produzir traduções e adaptações ou qualquer outra classificação relacionada ao
Código Internacional de Doenças. Na preparação das propostas para a décima
edição, foram colocados em continuidade os capítulos XIV a XVII, que descreve
sobre malformações congênitas, deformidade e anomalias cromossômicas, trazendo
o diagnóstico médico da Epidermólise Bolhosa e suas subcategorias, de acordo com
o quadro 1 (DATASUS, 1993).
Classificação da Epidermólise Bolhosa de acordo com o Código Internacional
de Doenças – Cid 10
Epidermólise Bolhosa
Q81
Epidermólise Bolhosa Adquirida
L12.3
Epidermólise Bolhosa Simples
Q81.0
Epidermólise Bolhosa Letal
Q81.1
Epidermólise Bolhosa Distrófica
Q81.2
Outras Epidermólises Bolhosas
Q81.8
Epidermólise Bolhosa não específicada
Q81.9
QUADRO1 – CLASSIFICAÇÃO DAS EPIDERMÓLISES BOLHOSAS
Fonte: Café, Ramos; (2002).
Uma das contribuições da enfermagem para a genética é a sua filosofia do holismo,
ou seja, o profissional de enfermagem deve ser capaz de quando necessário
incorporar a genética a toda sistematização da assistência de enfermagem para
clientes de diferentes idades e estágios, através do ciclo vital e em todos os
ambientes. A visão holística que caracteriza a enfermagem deve levar em
consideração o indivíduo como ser psicossocial, enquanto aborda as informações
genéticas, a testagem baseada no gene, diagnóstico e principalmente o tratamento
(BRUNNER; SUDDARTH, 2005).
Deste modo, para satisfazer os desafios da genética, a enfermagem precisa ser
capaz de compreender as novas tecnologias e tratamentos dos cuidados de saúde
baseados no gene, principalmente sendo sabedores que a enfermagem constitui
uma ligação vital entre os pacientes e os serviços de cuidados de saúde. Incorporar
a genética à enfermagem significa trazer um referencial para a sistematização da
12
assistência de enfermagem e aplicá-la de forma correta a estes pacientes
(CAPRARA; VERAS, 2005).
A enfermagem por ser um facilitador na comunicação entre família, paciente e
demais membros da equipe multidisciplinar de saúde, deverá ser capaz de oferecer
suporte a continuidade dos cuidados de enfermagem para as patologias de ordem
genética, e aqui descreveremos e relataremos a Epidermólise Bolhosa, seja no
ambiente hospitalar ou extra-hospitalar (BRUNNER; SUDDARTH, 2005).
A chave para o referencial genético para enfermagem é a capacidade de percepção
da consciência dos indivíduos envolvidos nas suas atitudes, experiências e
suposições de uma pessoa sobre os conceitos genéticos e como estes são
manifestados na própria prática da pessoa (SANTOS; NASCIMENTO, 2006).
Logo se torna fundamental a equipe de enfermagem ser capaz de reconhecer os
padrões de hereditariedade, quando obtém o histórico do paciente, e a compreender
quando é apropriado considerar os novos tratamentos a luz da genética (BRUNNER;
SUDDARTH, 2005).
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2 OBJETIVO

Levantar na literatura, através de pesquisa bibliográfica, artigos que abordem
cuidados de enfermagem na Epidermólise Bolhosa.

Despertar o interesse do profissional de enfermagem para capacitação no
atendimento de indivíduos portadores de Epidermólise Bolhosa.
14
3 REVISÃO DA LITERATURA
3.1 EPIDERMÓLISE BOLHOSA
Epidermólise Bolhosa (EB) representa um grupo heterogêneo de patologias
genéticas que causam bolhas espontaneamente ou em resposta ao mínimo trauma
mecânico na pele, com severidade clinica altamente variável, podendo apresentar
herança autossômica recessiva ou autossômica dominante (BARROS; RASKIN;
FERRARI, 2004).
Trata-se de uma dermatose hereditária, relativamente rara, que possui diversas
formas de manifestação clínica e caracteriza-se pela formação de bolhas na região
cutâneo-mucosa. Tais bolhas podem surgir após traumatismos ou irritações como
também podem ocorrer espontaneamente (DA SILVA et al., 2003)
Em 1870, a EB foi descrita por Von Hebra, como uma doença congênita rara que se
caracteriza primariamente pela formação de bolhas após traumatismos mínimos (DE
PAULA et al., 2002).
Em 1886, a denominação Epidermólise Bolhosa, foi sugerida por Koebner
(GURTLER; DINIZ; FILHO, 2005).
3.1.1 Tipos e Subtipos da Epidermólise Bolhosa
A EB é dividida em três grandes categorias de acordo com o nível de separação do
tecido dentro da zona da membrana basal (BMZ), as três categorias são:
Epidermólise Bolhosa Simples ou Simplex (EBS), Epidermólise Bolhosa Juncional
(EBJ) e a Epidermólise Bolhosa Distrófica (EBD), na forma dominante ou recessiva
(BARROS; RASKIN; FERRARI, 2004).
Na microscopia ótica e mediante a observação das bolhas na região subepidérmica,
observaram-se mais de 16 subtipos de EBs que se encontram dentro da três
categorias principais (GURTLER; DINIZ; FILHO, 2005).
15
Na EBS ocorre clivagem intra-epidérmica na porção inferior, devido a alterações
citolíticas dos queratinócitos basais com defeitos nas citoqueratinas (CQ) 5 (gene
KRT5) e 14 (gene KRT14). Os subtipos são: Koebner, Weber-Cockaine, DowlingMeara e a variante de Ogna (GURTLER; DINIZ; FILHO, 2005).
Com o avanço na biologia molecular já se conhecem várias estruturas específicas
do queratinócito e da zona da membrana basal que estão mutadas individualmente,
sendo as mutações descritas no parágrafo acima exemplos disso (ALVES et al.,
2001).
Já na EBJ a clivagem se dá na lâmina lúcida ou região central da zona de
membrana basal, sendo o teto representado pela epiderme e o assoalho pela lâmina
densa. Ocorre devido a alterações na laminina2 5 (genes LAMA3, LAMB3, LAMC2),
integrina3 alfa 6 beta 4 (genes ITGA6 e ITGB4) e colágeno XVII transmembranoso
(gene COL17A1), sendo o mesmo antígeno do Penfigóide Bolhoso 4. Os subtipos
são: Herlitz, não Herlitz e atrófico generalizado (GURTLER; DINIZ; FILHO, 2005).
O subtipo mais grave de EBJ é o Herlitz, sendo este subtipo letal em 100% dos
casos ainda na infância. É transmitida por gene autossômico recessivo (DE PAULA
et al., 2002).
O comprometimento oral, periorificial, do couro cabeludo e das unhas é bem
característico, as bolhas têm sido descritas no esôfago, estômago, laringe, traquéia,
brônquios, bexiga, ducto pancreático, intestino e trato urinário. Podendo ocorrer na
fase intra-uterina ( ALMEIDA JR et al., 1996).
E a EBD a clivagem ocorre na sublâmina densa, sendo que a epiderme e a lâmina
lúcida representam o teto da bolha, e a derme o assoalho. A alteração é exclusiva
no gene COL7A1. Os subtipos são: Cockaine-Touraine, Pasini, Hallopeaou-Siemens
e a forma distrófica recessiva mitis (GURTLER; DINIZ; FILHO, 2005).
____________
2
3
4
Laminina é uma glicoproteina adesiva localizada quase que exclusivamente na membrana basal.
Integrina é uma glicoproteína que age como receptor da laminina.
Penfigóide Bolhoso é uma doença vesiculobolhosa auto imune, afeta predominantemente idosos.
16
A EBD Recessiva é doença rara e afeta normalmente, a pele e a mucosa
gastrintestinal, sendo o comprometimento anal ou esofagiano pouco referido na
literatura. Os indivíduos afetados por este tipo de EB desenvolvem bolhas,
geralmente iniciada precocemente no período perinatal. As superfícies epiteliais
apresentando resistência diminuída podem em resposta a pequenos traumas, dar
origem
a
vesículas,
bolhas
e
posteriormente
a
formação
de
cicatrizes.
Conseqüentemente esses indivíduos desenvolvem contraturas em superfícies
flexoras, sindactilias, distrofias ungueais, microstomias5 e estenose esofagiana. Na
região anal o mesmo processo se repete, podendo desencadear estenose do canal
anal (MACHADO et al., 1995).
A EBD, de caráter autossômico dominante, é rara e pode ser dividida em duas
formas clínica, segundo a presença ou ausência de lesões albopapulóides6: as
variantes de Pasini e Cockayne-Touraine, respectivamente. A EBD albopapulóide foi
primeiramente descrita em 1928 por Pasini, e o primeiro caso no Brasil foi observado
em 1937 por Cerruti, em São Paulo, e o segundo caso foi descrito na literatura
brasileira por Silva (SPINELLI et al., 2003).
Ainda pode ocorrer a Epidermólise Bolhosa Adquirida (EBA), que é uma doença
mediada por auto-anticorpos, depositado na lâmina e na sublâmina densas, de
surgimento na idade adulta, com aparecimento de bolhas em áreas de traumas, que
se curam com cicatrizes atróficas e mílio. Nesse tipo de EB, não ocorre mutação,
porém estudos de imunogenética demonstram ligação com HLA 7 DR2 (GURTLER;
DINIZ; FILHO, 2005).
Clinicamente a EBA pode manifestar-se em sua forma clássica caracterizada por
intensa fragilidade da pele causada pela alteração na junção dermoepidermica,
como doença não inflamatória. Pode apresentar alopecia cicatricial e algum grau de
comprometimento ungueal. O termo EBA foi utilizado pela primeira vez em 1904, por
Klabitz, para um adulto sem história familiar (REIS; TOLEDO, 1997).
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5
6
7
Anomalia na qual a boca é inusitadamente pequena;
lesões com máculas hipocrômicas e atróficas.
Genes que codificam antígenos de histocompatibilidade nas superfícies das células humanas.
17
3.2 CITOQUERATINAS E A SUA IMPORTÂNCIA NA EPIDERMÓLISE BOLHOSA
As citoqueratinas (CQs) são constituintes do citoesqueleto das células epiteliais, por
isso também denominadas queratinas epiteliais ou queratinas moles, e devem ser
diferenciadas das tricoqueratinas, as chamadas queratinas duras, as quais formam a
haste do cabelo e a unha (JUNIOR; 2004).
Baseado nas propriedades físico-química das CQs são distinguidos 20 tipos
diversas
caracteristicamente
expressadas
por
células
epiteliais,
elas
são
subdivididas em CQs básicas ou de tipo II que são agrupadas do número 01 ao 08,
e as CQs ácidas ou do tipo I que são classificadas com números de 09 a 20
(POMPEI; BERNARDO; FORBICE, 2007).
A aplicação destes conhecimentos em imuno-histoquímica, é de grande importância
nas genodermatoses8 por mutações das CQs. Na medida em que elas são
expressas de forma localizada, a doença conseqüente desta mutação será
específica de determinadas células e de determinados segmentos epiteliais.
Geralmente estão relacionadas a citólise, pois a célula desaba por alteração do
citoesqueleto (JUNIOR; 2004).
As CQs compõem uma família de polipeptídeos com peso molecular variável, isto
ocorrerá de acordo com o tipo de tecido epitelial (MACHADO; FIGUEIREDO, 1996).
A alteração da camada basal por mutação seja da CQ5 seja da CQ14, leva à
degeneração da mesma e formação de bolhas na EBS, a primeira enfermidade na
qual foi demonstrada mutação de uma CQ. Nas formas disseminadas da doença as
mutações localizam-se nas extremidades do domínio helicoidal (JUNIOR, 2004).
As informações obtidas nas últimas duas décadas sobre as CQ trouxeram inúmeros
avanços na compreensão de diversas enfermidades cutâneas, demonstrando a
importância da pesquisa laboratorial e sua posterior aplicação (ALMEIDA JR, 2004).
____________
8
Genodermatoses constituem um grupo heterogêneo de doenças que afetam única ou
principalmente a pele com maior ou menor gravidade, sendo estas hereditárias.
18
3.3 DIAGNÓSTICO DA EPIDERMÓLISE BOLHOSA
O diagnóstico da EB é feito através da biópsia da pele, levando-se em consideração
a manifestação clínica do paciente (YUBERO et al., 2008).
As dermatoses bolhosas de forma geral são constituídas por defeitos adquiridos ou
natos da adesão intra-epidérmica, nas EBs, esses defeitos podem ser identificados
por seqüênciamento gênico, através da técnica da Reação em Cadeia da
Polimerase9 (PCR), o que traz maior compreensão à base molecular, complementa
o diagnóstico clínico-histológico e provavelmente a médio prazo modifique em parte
a classificação de determinadas dermatoses (ALMEIDA JR, 2002).
O imunomapeamento, técnica que foi descrita primeiramente por Hintner et al, em
1981, vem sido considerada vantajosa por ser mais rápida, menos onerosa e de fácil
interpretação. Trata-se de uma técnica de imunofluorescência indireta 10 realizada na
pele lesada e não no soro do paciente. Consiste na exposição de cortes de pele
lesada feito em criostato11 a anticorpos monoclonais12 específicos contra diferentes
estruturas da BMZ, correlaciona-se o local de formação da bolha da pele estudada
com a distribuição desses determinantes antigênicos permitindo a obtenção de um
diagnóstico preciso dos tipos e subtipos das EBs (ALVES et al., 2001).
O diagnóstico dos tipos e subtipos das EBs é de fundamental importância para
estabelecimento de cuidados adequados aos pacientes e crucial para o
Aconselhamento Genético, considerando as manifestações clínicas do paciente e a
biopsia da pele, utilizando uma das técnicas descritas acima que culminado no
diagnóstico assertivo e conseqüente adequação dos cuidados que virão a ser
implementados para este paciente.
_____________
9
Técnica de genética molecular utilizando a DNApolimerase para fazer múltiplas cópias de uma
seqüência curta de DNA ou RNA.
10
Instrumento de diagnóstico utilizando anticorpos marcados com fluorocromos e vistos através de
um microscópio de fluorescência.
11
Aparelho que mantém temperaturas baixas a fim de preservar por congelamento a morfologia,
composição química e estrutura de todos os elementos constituintes da amostra a ser analisada.
12
Anticorpo específico produzido por um clone in vitro de células B hibridizadas com células
cancerosas.
19
3.3.1 Diagnóstico pré-natal
O diagnóstico pré-natal está indicado para algumas genodermatoses graves, como
nas EBs. A biópsia da pele fetal foi introduzida em 1980, mas não pode ser realizada
antes da 15a. semana de gestação, já a análise do DNA fetal é um método preciso e
pode ser realizado mais precocemente na gestação, o DNA fetal pode ser obtido
pela biópsia da vilosidade coriônica ou amniocentese. O diagnóstico genético préimplantação tem surgido como alternativa que dispensa a interrupção da gestação
em países aonde a mesma não é permitida, trata-se de uma técnica que envolve
fertilização in vitro e teste genético do embrião (SAMPAIO; OLIVEIRA; MIGUELEZ,
2007).
O conhecimento das mutações moleculares é de fundamental importância para a
concretização do diagnóstico pré-natal a partir do DNA, e pode ser utilizada,
substituindo a biópsia de pele por fetoscopia13, as complicações neste caso ocorrem
em torno de 4% a 7% dos casos, enquanto que as complicações da análise do
material genético feito através da biópsia das vilosidades coriônicas ocorrerão em
cerca de 1% dos casos (ALMEIDA JR, 2004).
No diagnóstico genético pré-implantação será analisada uma única célula do
embrião, retirada do estágio de mórula, que é formado por aproximadamente 8
células. O DNA dessa célula é extraído e analisado após técnica de amplificação do
mesmo por PCR. Após análise, serão selecionados os embriões sadios a serem
implantados. Assim evita-se procedimentos invasivos durante a gestação, sendo que
a grande vantagem desta técnica constitui o fato de dispensar a interrupção da
gestação, o que a torna um método eticamente aceitável para muitos casais, além
de não ser ilegal no Brasil. Entre as desvantagens estão custo elevado,
possibilidade de falso negativo e o estresse emocional (SAMPAIO; OLIVEIRA;
MIGUELEZ, 2007).
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13
Exame endoscópico, terapia ou cirurgia do feto e cavidade amniótica por inserção abdominal ou
uterina.
20
3.4
CUIDADOS
DE ENFERMAGEM EM PACIENTES
PORTADORES
DE
EPIDERMÓLISE BOLHOSA
Antes mesmo de descrever a prática dos cuidados de enfermagem especializados
para o atendimento de pacientes portadores de EB é de crucial importância ressaltar
o aspecto emocional dos cuidadores familiares diretos, ou seja, daqueles que
continuarão os cuidados em casa e que na maioria das vezes será a mãe do
paciente.
Os profissionais de saúde que atuarão nos cuidados destes pacientes deverão
compreender que os pais dos mesmos precisarão mais do que condolências, eles
precisarão de profissionais preparados para superar problemas decorrentes do
cotidiano e de suporte psicológico (CAPRARA; VERAS, 2005).
Uma vez confirmado o diagnóstico da EB o tratamento do paciente será sintomático
e se baseará primariamente em cuidados tópicos paliativos (SPINELLI et al., 2003).
Os cuidados estão focados principalmente na prevenção do trauma, descompressão
das bolhas e tratamento das infecções secundárias. Deverá ser levado em conta
ainda o estado nutricional e gastrintestinal do paciente, além do estado psicológico
do mesmo (DENYER, 2005).
Há relatos de que as vitaminas A e E são responsáveis pela diminuição da
freqüência e severidade das bolhas, porém o mecanismo de ação é desconhecido.
Em regra geral a vitamina D está indicada a estes pacientes devido a diminuição da
atividade física e a impossibilidade de exposição solar, logo este pacientes
apresentam também um maior risco de osteoporose (YUBERO et al., 2008).
Na maioria dos pacientes há tendência das lesões piorarem durante o verão. Calor,
alta umidade e suor são fatores agravantes. Em alguns pacientes que entram na
puberdade é notada piora das lesões, bem como aumento marcante das lesões na
vida adulta (BRIGGS et al., 1995).
21
A residência destes pacientes deverá ser arejada e fresca, o fator higiene é
primordial para que se evite contaminações, bem como é contra-indicada a presença
de animais de estimação como cães, gatos ou qualquer outro que possa carrear
microorganismos e causar possíveis contaminações aos pacientes, como opção de
animal de estimação fica a sugestão da presença de um aquário com peixe, uma
vez que este animal não entra em contato direto com o paciente.
A indicação da utilização de lágrimas artificiais é recomendada com o intuito de
evitar possível ulceração da córnea. Em caso de necessidade de uso de nebulizador
se faz necessário não se encostar à pele do paciente uma vez que o toque na pele
poderá desencadear a formação de bolhas (YUBERO et al., 2008).
3.4.1 Vestimentas
Tanto crianças como adultos deverão vestir-se com roupas que tenham costura com
dupla face, este tipo de costura evita que a junção dos tecidos costurados entrem
em contato com a pele do paciente, evitando assim o atrito e possíveis lesões.
Deve-se também evitar botões e tecidos ásperos. Caso não seja possível a
obtenção de roupas com costura dupla face recomenda-se vesti-las pelo avesso
(DENYER, 2005).
É importante considerar que os pacientes portadores de EBs possuem os pés
assimétricos, logo no momento de comprar sapatos estes deverão ser provados em
ambos os pés, deverão ser sapatos de couro, com o mínimo possível de costuras e
largos (YUBERO et al., 2008).
3.4.2 Nutrição e Distúrbios Gastrintestinais
Em alguns tipos de EBs podem ocorrer problemas de absorção a nível de trato
gastrintestinal (TGI), alguns casos de lesão esofagiana e lesão no canal anal tem
sido referida na literatura sendo que o comprometimento esofagiano constituí-se em
complicação séria das EBs . O tratamento desta complicação ainda não está
completamente estabelecido. Na fase aguda é direcionado para amenizar a
formação de bolhas e evitar a aspiração de secreções e alimentos, estando a
22
endoscopia contra-indicada. A nutrição parenteral poderá ser usada nos casos mais
graves (MACHADO et al., 1995).
Deve-se evitar o uso de sondas de qualquer tipo. Se for necessária a utilização de
alimentação por sonda nasoentérica (SNE) utilizar preferencialmente sondas de
silicone, sendo a fixação da mesma feita com adesivo de silicone com aderência
suave e fixação segura sem trauma e sem dor quando retirado, este tipo de adesivo
é particularmente indicado para peles frágeis e sensíveis (YUBERO et al., 2008).
O comprometimento anal tem sido pouco relatado. Na fase aguda, as bolhas,
erosões e cicatrizes, podem levar a desconforto importante resultando em
constipação e encoprese14. Nesta fase, poderiam ser utilizadas preparações ricas
em fibras, e na região anal, cremes anestésicos tópicos. Estenoses severas no canal
anal, com disfunções graves não tem sido referidas na literatura (MACHADO et al.,
1995).
3.4.3 Prevenção e Higiene Dentária
Algumas formas de EB apresentam manifestações como bolhas no palato, língua,
assoalho bucal, lábios, além de displasias dentárias e microstomias15. Nos dentes,
as alterações vêm sendo descritas como deformidades, defeitos congênitos e
formação anormal de esmalte. Dentes impactados e supranumerários também são
muito comuns. Cáries extensas, escarificação dos tecidos periodontais e abscessos
vêm sido relatados. O osso alveolar reabsorve, e o palato e o assoalho se tornam
contínuos com o vestíbulo bucal. Freqüentemente o movimento da língua é afetado
como resultado das cicatrizes (DA SILVA et al., 2003).
A higiene bucal é de fundamental importância, será feita com escova dental com
cerdas macias e curtas respectivamente para minimizar o trauma nas mucosas bucal
e jugal, e devido ao fato de abertura bucal reduzida. Utilizar creme dental e
enxaguante bucal com flúor e que não contenham álcool (YUBERO et al., 2008).
____________
14
15
Evacuação intestinal parcial ou total repetidas vezes e em locais inadequados.
Anomalia congênita na qual a boca é inusitadamente pequena.
23
São várias as limitações que o cirurgião-dentista possui ao lidar com um paciente
portador de EB, no entanto não será impedimento para que o mesmo receba
tratamento tomando-se alguns cuidados (DA SILVA et al., 2003).
No momento do exame odontológico deve-se lubrificar os lábios do paciente com
vaselina e também todo instrumental necessário para o exame, o examinador
deverá utilizar como apoio somente o dente do paciente a ser examinado, de
maneira nenhuma apoiará no paciente. No caso de se fazer necessária à utilização
de anestésicos os cuidados estarão voltados para o momento da punção que não
poderá ser tão superficial para evitar a formação de bolhas. Ao final da realização do
tratamento deverá ser verificada a formação de bolhas, estas deverão ser
perfuradas com agulha estéril para evitar que venham a crescer posteriormente
(YUBERO et al., 2008).
3.4.4 Prevenção e Cuidados com as bolhas
No tratamento da Epidermólise Bolhosa, o mais importante é a prevenção, com
orientação para impedir a formação de bolhas e sindactilia 16, além de medidas
fisioterápicas para evitar contraturas, pois não há cura para esta doença. A
terapêutica é controversa, porém alguns resultados são obtidos com hidantoína,
corticóides, vitaminas D e E (FALLOPA, 1996).
O ato de tocar um adulto, ou pegar um bebê no colo com EB requer medidas de
segurança, tais como retirar jóias, alianças, roupas com botões ou zíperes que
possam inadvertidamente machucar estes pacientes, no caso de bebês ou crianças
os brinquedos deverão ser apropriados de maneira que sejam macios, sem pontas
ou plástico duro que possa vir a desencadear a formação de bolhas (CAPRARA;
VERAS, 2005).
____________
16
Anomalia congênita da mão ou pé, caracterizada pela presença de uma membrana entre os dedos
adjacentes. As sindactilias são classificadas, como completas ou incompletas de acordo com o grau
de ligação entre os dedos.
24
As rupturas das bolhas deverão ser feitas logo no surgimento das mesmas com
duas punturas na base, usando-se agulha estéril 25/7, aplicando-se uma delicada
pressão para retirada do fluído, evitando-se assim, o crescimento da bolha e
deixando como cobertura à própria pele formando um curativo biológico
(SCHACHNER; FEINER; CAMISULLI, 2005).
No momento dos cuidados com as bolhas deve-se considerar a princípio os
objetivos tradicionais para cuidados com feridas, como manter ambiente úmido para
que facilite a epitelização. No caso de dor local poderá ser utilizado um analgésico
de forma a proporcionar um maior conforto ao paciente no momento do curativo,
sugere-se o uso de curativo em tela de poliamida com silicone, estrutura porosa que
permita a remoção do excesso de exsudato para o curativo secundário, não
aderente ao leito da ferida, atraumático e que não provoque dor na retirada do
mesmo. O curativo secundário deverá ser avaliado diariamente, pois a presença de
exsudato nem sempre ocorrerá sendo mais comum em feridas infectadas, de
qualquer forma deverá ser trocado diariamente e o primário a cada 4 ou 7 dias de
acordo com a necessidade (DENYER, 2005).
3.4.5 Cuidados especiais na Punção Venosa no portador de EB
Para obtenção de acesso venoso periférico somente se deve comprimir a pele
protegida com atadura, o garroteamento pode ocorrer manualmente para isso é
necessário dois profissionais, sendo que uma pressionará o membro do paciente e o
outro fará a punção. Na disponibilidade de somente um profissional para punção,
usar um elástico largo com velcro sobre a região protegida com atadura. Jamais se
deve utilizar garrote de látex (YUBERO et al., 2008).
É ideal deixar a via venosa com dispositivo de vinil transparente de duas ou quatro
vias, para facilitar a manipulação. Não utilizar nenhum tipo de material adesivo sobre
a pele, para fixação da via venosa utilizar atadura semielástica sobre o ponto de
entrada da cânula e vedar toda a extremidade de modo a imobilizar a via venosa,
finalmente usa-se uma fita adesiva sobre a fixação (YUBERO et al., 2008).
25
3.4.6 Primeiros Cuidados com portador de EB no berçário
Por não ser uma doença freqüente passam-se dias ou até mesmo semanas sem
que o recém nascido comece a receber um atento programa de prevenção dos
traumas, este atraso no diagnóstico não é privado de conseqüências no andamento
da doença, a formação de bolhas torna mais frágil a região facilitando assim a
formação de novas bolhas (BONIFAZI; ANNICCHIARICO, 2006).
Primeiramente deve-se evitar o uso de pinça na clampagem do cordão umbilical,
assim como pulseiras de identificação em plástico ou qualquer outro material que
possa desencadear a formação de bolhas, assegurar-se de que cada indivíduo que
manipule a criança saiba exatamente como se portar diante da doença, jamais
utilizar qualquer tipo de adesivo diretamente sobre a pele, supositórios e clisteres
devem ser evitados, mesmo após o banho não friccionar a pele, deve-se somente
tocar delicadamente, proteger os pontos de pressão tais como região occipital,
sacral, cubital e enfaixar os membros superiores e inferiores para diminuir os
impactos (DENYER, 2005).
É fundamental manter a amamentação exclusiva apesar de causar lesões peri e
intraoral, pois a lactação aumenta o vínculo mãe-filho e a absorção gastrintestinal é
melhor, porém se não for possível solicitar que a mãe ordenhe o seu próprio leite e
ofereça ao recém-nascido, bem como usar leites modificados se necessário para
manutenção do estado nutricional, as mamadeiras especiais, do tipo utilizado para
bebês com lábios fissurados, serão usadas neste caso. (YUBERO et al., 2008).
A técnica para pegar o bebê adequadamente nos braços consiste em girar
lateralmente e apoiar uma mão sobre a nuca e girá-lo novamente para o outro lado e
apoiando a outra mão na região glútea e elevá-lo. Jamais pegar o bebê pelas axilas
(DENYER, 2005).
A vacinação não é contra-indicada, porém dá-se preferência as vacinas acelulares
usados para pessoas portadoras de condições especiais (YUBERO et al., 2008).
26
3.5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Epidermólise Bolhosa é uma doença crônica, até o momento incurável, mas não
transmissível. Como qualquer desordem genética necessita de aconselhamento
genético.
A importância da caracterização molecular completa, ou seja, triagem das mutações,
se faz necessária tanto para definir a correlação genótipo/fenótipo, como para
possibilitar um aconselhamento genético e um prognóstico mais acurado (BARROS;
RASKIN; FERRARI, 2004).
Os resultados obtidos com emprego de fármacos como talidomida, corticosteróide,
ciclosporina, são pouco animadores (SOUZA et al., 2005).
Em alguns casos de deformidades incapacitantes se emprega o tratamento
cirúrgico, como em perda da função associada à deterioração progressiva da
aparência como forma de amenizar os efeitos devastadores no desenvolvimento
psicossocial destes indivíduos (DE PAULA et al., 2002).
Na Epidermólise Bolhosa Distrófica Recessiva devemos levar em consideração que
com a melhoria de cuidados e conseqüente aumento de sobrevida, estes pacientes
deverão ter uma maior atenção devido ao fato do aumento da incidência de
transformação carcinomatosa das lesões cutâneas (GURTLER; DINIZ; FILHO,
2005).
Pesquisadores já utilizaram a terapia genética capaz de corrigir o gene defeituoso,
retirando um pequeno pedaço de pele da palma da mão do paciente, corrigindo o
gene da laminina 5 e transplantando ao mesmo paciente, obtendo assim bons
resultados com esta técnica, este paciente em questão é portador de Epidermólise
Bolhosa Juncional, o próximo passo é estender esta técnica a outros pacientes com
outros tipos de EBs (MAVILIO et al., 2006).
Concluímos enfim que o tratamento das EBs deverá ser focado para a prevenção de
formação de novas bolhas, prevenção e tratamento de infecções, suporte nutricional,
27
suporte psicológico não só ao paciente como também aos demais membros da
família. A enfermagem desempenha um papel fundamental baseado na sua própria
essência do cuidar e na filosofia do holismo no atendimento a estes pacientes
(SCHACHNER; FEINER; CAMISULLI, 2005).
28
4 METODOLOGIA
O estudo foi desenvolvido adotando a pesquisa bibliográfica, envolvendo as
atividades de identificação, compilação e fichamento dos artigos localizados através
de consulta na base de dados da Sociedade Brasileira de Dermatologia, Biblioteca
Virtual em Saúde, European Journal of Pediatric Dermatology, Dystrophic
Epidermolysis Bullosa Research Association (DEBRA International), MedScape
Nurse, levando-se em consideração que o tema proposto para o desenvolvimento do
trabalho apresenta escassez de literatura.
Essa tipologia de pesquisa atende tanto os objetivos do aluno na sua formação
acadêmica como gesta a construção de trabalhos inéditos daqueles que pretendem
rever, reanalisar, interpretar e criticar considerações teóricas, paradigmas e mesmo
criar novas proposições e compreensão dos fenômenos das mais diferentes áreas
do conhecimento (BARROS; LEHFELD, 2002).
A pesquisa tem caráter exploratório e descritivo; refere-se a primeira aproximação
com o tema criando uma familiaridade em relação ao fato ou fenômeno a ser
explorado, e este a descrição ao fato ou fenômeno, feito na forma na forma de
observação sistemática do fenômeno escolhido (SANTOS, 2002).
Pesquisar é incorporar-se ao desconhecido, domesticar a ignorância, não é
encontrar
as
respostas,
mas
melhorar
as
perguntas,
pois
nos
grandes
descobrimentos foram respostas a perguntas que os motivou. A ciência não avança
com respostas, mas com perguntas (TOBAR; YALOUR, 2003).
Foram pesquisadas e selecionadas as referências bibliográficas dos últimos 13 anos
e utilizados um total de 24 artigos.
Com o material literário em mãos iniciamos uma leitura exploratória para
identificarmos tudo aquilo que atendesse ao nosso objetivo proposto, com o máximo
de objetividade e imparcialidade, procurando mostrar através da bibliografia
existente o que já se sabe sobre o tema, as lacunas existentes e os principais
entraves teóricos (QUINTELLA; BOGADO, 2004).
29
Ressaltamos que após a organização dos conteúdos analisados, sintetizamos e
descrevemos as abordagens mais comumente apresentadas pelos autores
envolvidos nesta revisão bibliográfica.
30
5 REFERÊNCIAS
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