QUAL A RELAÇÃO ENTRE INTERSECCIONALIDADE E ESPACIALIDADE A PARTIR DE CADEIRANTES NO ESPAÇO URBANO DE PONTA GROSSA – PARANÁ? Lucélia SMAHA Paulo Sérgio MATOSO Rafael Arruda NOCÊRA – Orientador: Márcio José ORNAT [email protected] Resumo: Este trabalho foi elaborado como atividade da disciplina articuladora do curso de Licenciatura em Geografia da Universidade Estadual de Ponta Grossa. As relações sociais e o acesso e vivência de cadeirantes nesses espaços e com diferentes grupos sociais, são o objeto de estudo deste trabalho. Palavras-chave: Cadeirantes, interseccionalidade, espaço urbano. Introdução Vivemos em uma sociedade estruturada e pautada em regras e padrões, onde somos levados a entender e ver as pessoas como a sociedade ordena.É criada uma normalidade, uma padronização que na verdade não existe, ou pelo menos não deveria existir.Somos levados a olhar o diferente com um olhar excludente, com um olhar de espanto, de estranheza, como se essa pessoa nomeada como ‘diferente’ não fosse parte da sociedade, e como se não fosse como nós, ditos ‘normais’. Nesse contexto e na atual conjuntura que estamos tratando, diversos grupos poderiam ser classificados como ‘diferentes’ e são estes grupos que são vítimas da exclusão social promovida pelos definidos padrões, levando esses grupos a vivenciarem momentos e estados distintos, estando ora à margem da sociedade, e ora no centro dela. Semana de Geografia, 18., 2011. Geografias não mapeadas? Ponta Grossa: DEGEO/DAGLAS, 2011. ISSN 2176-6967 Na verdade acaba-se por criar grupos distintos, como se não fossemos todos iguais, como se ter um cérebro e polegares opositores não fossem mais utilizados como base de comparação para a definição do que seriam seres humanos, mas sim se utiliza um novo conceito para definir quem são os seres humanos ‘normais’, aqueles que atendem aos padrões corporais que a sociedade deseja, são apenas esses os considerados seres humanos normais. Um grupo dos considerados seres humanos ‘diferentes’ é o de cadeirantes, que sofre além do preconceito por parte da sociedade, com a exclusão causada pela falta de inclusão no contexto social, não somente por motivos ideológicos, mas também de infra-estrutura de acesso aos locais frequentados pelas pessoas consideradas ‘normais’. A relação que pretendemos estudar nesse trabalho é: a) como se dá a vivência desses grupos no contexto social que vivemos; b) como eles conseguem ter acesso a locais e até mesmo a outras pessoas diferentes delas mesmo, c) como se dá a relação interseccional de se adaptar a diferentes locais e diferentes pessoas e ideologias, estando posicionados ora à margem e ora no centro de seus grupos de vivência social e, como se dá essa relação com as perspectivas de futuro; d) os empecilhos encontrados nas mais variadas formas e percursos que queiram tomar na vida. Mais ainda, é perceber o modo como a condição econômica pode influenciar nessas relações, a partir da observação de integrantes de um mesmo grupo mas com situações econômicas distintas, que frequentam espaços que deveriam ser semelhantes na teoria (como o ambiente escolar público e privado), mas que na prática podem se revelar completamente distintos. Desenvolvimento As ideias de Oberhauser são importantes para a reflexão do tema abordado, pois ressalta a relevância de abordar a análise da vivencia de vários grupos presentes na sociedade: A crescente diversidade de vozes e de atenção para uma ampla gama de identidades de sexo/geografia feminista na intersecção com questões importantes sobre o desenvolvimento da tecnologia e as relações de poder que permitem que as pessoas à margem possam de falar de si Semana de Geografia, 18., 2011. Geografias não mapeadas? Ponta Grossa: DEGEO/DAGLAS, 2011. ISSN 2176-6967 mesmas. Este fenômeno levanta sérias questões sobre o papel do longo período dos geógrafos feminista como principais intérpretes ou canais do conhecimento. (OBERHAUSER, 2003, p. 42) Observamos a necessidade de abordar e dar voz aos grupos excluídos pela sociedade atual, como o caso dos cadeirantes, que são por vezes marginalizados e acabam por se situar à margem dos grupos sociais já definidos. Vivendo numa sociedade onde cada vez mais são cultuados padrões estéticos e corporais, onde é criado então certo padrão, um estereótipo de ‘normalidade’ onde cada vez mais se aumenta a exclusão do diferente. A diferenciação de ser humano normal deixou de ser feita pela constatação da presença ou não de polegares opositores e de cérebros desenvolvidos, para dar lugar e abrir espaço aos padrões culturais e históricos, já estabelecidos. Ao nascer, o indivíduo já está pré-determinado ao julgamento e ao seu enquadramento em um grupo social, porém existem situações que se enquadram em exceções, é o caso do cadeirante. O problema não levado em consideração, é que a inclusão desses cadeirantes em espaços antes não utilizados, acaba por ocasionar um maior distanciamento entre os cadeirantes e as demais pessoas ditas como ‘normais’, se caracterizando um típico exemplo de momento onde o cadeirante será margem no seu novo grupo, como resultado do engessamento cultural a que a sociedade impõe à seus integrantes, de rejeitar aquilo que lhe parece diferente, que não se identifica com os padrões já preestabelecidos. As ideias de Rose mostram que: A intersecção entre a casa e o espaço do centro permite uma nova política de resistência. O falar da margem exige, portanto, o seu próprio espaço paradoxal, quando teorizar é basear se em um sentimento histórico geográfico. (ROSE, 1993, p. 11). O cadeirante acaba sendo levado a criar o seu próprio espaço paradoxal, onde se adapta à situação e as pessoas que frequentam cada local por ele utilizado, criando assim uma relação de interseccionalidade com o espaço em que está. Enquanto está com um grupo de cadeirantes, este se coloca como centro, porém, em outro momento e espaço, onde está em meio à pessoas consideradas ‘normais’, ele é tratado como diferente, ficando à margem novamente, mostrando assim que a Semana de Geografia, 18., 2011. Geografias não mapeadas? Ponta Grossa: DEGEO/DAGLAS, 2011. ISSN 2176-6967 realidade é percebida de maneira diferente de acordo com cada indivíduo e sua sensibilidade. Essa relação de interseccionalidade é percebida nas relações sociais dos indivíduos, onde os grupos classificados como ‘diferentes’ necessitam se relacionar com indivíduos de grupos classificados como ‘normais’, em sua maioria eles acabam por criar esta relação para simplesmente cumprir as regras do contrato social já préestabelecido e considerado como imutável, engessado, colocando-se como verdade absoluta. Nesse contexto, a inclusão se coloca apenas como teoria, mas apresentandose distante da prática na realidade atual, onde nem mesmo lugares comuns e importantes estão aptos para realizar a inclusão, barrando através da infra-estrutura de acesso, a chegada e o acolhimento dessas pessoas e suas diferenças, afastando o cadeirante da possibilidade de viver em espaços onde se possa compartilhar uma vivencia com outros grupos. Notamos que o distanciamento do cadeirante em sua vivência, se apóia em barreiras físicas, sócias, históricas e culturais, que não conseguem estabelecer uma ponte para sua inclusão, tornando necessário o uso de espaços paradoxais, numa relação interseccional. A geografia feminista não faz uma clara distinção entre "pesquisador e pesquisados", reconhecendo que os próprios investigadores fazem parte da estrutura social do projeto. (ROSE, 1997, p 7). Assim como na geografia feminista, trabalhada por Rose, somos enquadrados na pesquisa, como investigadores integrantes, pois fazemos parte do grupo de pessoas classificadas como ‘normais’ pelos padrões impostos pela sociedade, onde percebemos e vivenciamos o mundo pelo viés de outra realidade da encontrada pelos cadeirantes. Então enquanto investigadores estaremos tratando também da nossa espacialidade e de nossa relação de interseccionalidade, porém, de forma a dar voz à um grupo excluído do contexto social, que passa despercebido no cotidiano e nas relações sociais. Até mesmo o poder público não dá voz à esses grupos excluídos. A análise se dará através do levantamento de informações a partir da Semana de Geografia, 18., 2011. Geografias não mapeadas? Ponta Grossa: DEGEO/DAGLAS, 2011. ISSN 2176-6967 realização de entrevista semi-estruturada com dois adolescentes, cadeirantes, estudantes, moradores do espaço urbano da cidade de Ponta Grossa, que frequentam espaços distintos, ora por sua realidade social e por sua situação econômica, onde os investigados ambos em idade escolar, apresentam diferentes classes sociais e espacialidades. O recorte espacial se dá no centro urbano de Ponta Grossa, em dois ambientes escolares distintos, um estabelecimento de ensino privado e outro estabelecimento de ensino público. Dentro desse recorte espacial poderemos analisar se as diferenças encontradas nos espaços influenciam, ou não, em como se desenvolvem as relações de interseccionalidade em ambos os investigados. Destacando o fato de que as pessoas não criam interseccionalidade, elas são constituídas por interseccionalidades, dialogam com as interccionalidades. Na sociedade, nosso trabalho analisará, recortando as escolas como espaço principal e também outros ambientes que são freqüentados pelos cadeirantes, enfatizando quais as dificuldades que os mesmos encontram ao entrarem em contato com esses espaços. No decorrer do trabalho outros aspectos deverão ser analisados, como o que ocorre em outros espaços freqüentados pelos cadeirantes, lugares fora do espaço escolar onde se desenvolvem outras espacialidades. Onde, mais uma vez será levada em consideração a realidade dos cadeirantes e de como eles se relacionam dentro de outros espaços de convivência. Temos que analisar e identificar como os nossos dois indivíduos criam e transformam o espaço a sua volta. Indivíduos que possuem, ao mesmo tempo limitações físicas iguais e situações de vida e convivência social diferentes. Produzindo assim relacionamentos e sensações diferentes em ambientes muitas vezes iguais, onde a influência da condição econômica de um e de outro pode ser determinante para estabelecer que nível de contato eles vão manter nesses espaços.Sendo assim ambos podem desenvolver maneiras diferentes de estabelecer interseccionalidade com o mundo em que vivem. Considerações Finais A espacialidade também esta amarrada às condições de acesso físico dos Semana de Geografia, 18., 2011. Geografias não mapeadas? Ponta Grossa: DEGEO/DAGLAS, 2011. ISSN 2176-6967 lugares frequentados por esses cadeirantes, como se fossem reféns , não de seu limite físico, mas sim do mundo em que vivem. Sendo praticamente obrigados a criar maneiras de viver. As duas principais fontes que atenderam as questões abordadas, serão dois adolescentes do ensino regular, estudantes respectivamente um que freqüenta o ensino público e outro em rede privada da cidade de Ponta Grossa, Paraná. Serão realizadas entrevistas com dois cadeirantes, procurando enfatizar quais são os ambientes que os mesmos freqüentam, que dificuldades são encontradas nesses locais e quais são os meios que o auxiliam a utilizar desse espaço. Através da análise da história de vida de cada um deles, correlacionando os processos pelos quais estes passaram com as relações sociais por eles mantidas. Encontrar semelhanças e diferenças no cotidiano e nas relações espaciais e sócias estabelecidas por ambos, levando em conta o ambiente e a situação socioeconômica de cada um deles, relacionando suas vivências com as relações entre espacialidade e interseccionalidade existentes são os objetivos desse trabalho. Referencias OBERHAUSER, Ann M.; RUBINOFF, Donna; BRES, Karen D.; MAINS, Susan; POPE, Cindy. Geographic Perspective on Woman. In: GAILE, Gary L.; WILLMOTT, Cort J. (Orgs). Geography in America at the Dawn of the 21st Century. Oxford: Oxford University Press,2003, 820 p. ROSE, Gillian. Feminism & Geography. The limits of Geographical Knowledge. Cambridge:Polity Press, 1993, p. 137143/ 150 160. _____. Situating Knowledges, positionality, reflexivities and other tactics. Progress in Human Geography, 1997. Semana de Geografia, 18., 2011. Geografias não mapeadas? Ponta Grossa: DEGEO/DAGLAS, 2011. ISSN 2176-6967