RELAÇÃO DE TRABALHO X RELAÇÃO DE CONSUMO Relação de trabalho pressupõe uma vinculação entre dois sujeitos tendo por objeto a prestação de um serviço; a relação de emprego envolve apenas o trabalho subordinado; e na relação de consumo, o Código de Defesa do Consumidor define consumidor como “toda pessoa física ou jurídica que utiliza o serviço (ou produto) na qualidade de destinatário final”. Define também o fornecedor como “toda pessoa física ou jurídica (...) que desenvolvem atividades de produção, montagem, criação, construção, transformação importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou de prestações de serviço”. Assim, existem relações de trabalho de natureza trabalhista e relações de trabalho inseridas nas relações de consumo. Primeiro critério de distinção é distinguir se o tomador do trabalho contrata o prestador de serviço para viabilizar a sua empresa (relação de trabalho) e oferecer o seu produto ou serviço ao consumidor ou o contrata para usufruir exclusivamente de seu serviço na qualidade de destinatário final (relação de consumo); o segundo critério é identificar se o contratado é um fornecedor de serviço ao público em geral ou de caráter personalíssimo e com dependência econômica para com o seu contratante. Não se deve trazer as relações de consumo pra a Justiça do Trabalho, eis que a lei faz essa distinção - Art. 3º, § 2º, do CDC; haverá dúvidas com relação ao sujeito tutelado, acarretando problemas como inversão do ônus da prova e aplicação do in dubio pro operário ou in dubio pro consumido e haverá desrespeito ao princípio da incindibilidade da competência material para examinar relações com idêntica natureza jurídica. Dentro do conceito de relação de consumo tem-se a prestação de serviço e a comercialização de produtos. Não se pode bipartir a competência jurisdicional para declarar que parte das relações de consumo são julgadas pela Justiça do trabalho (prestação de serviços) e parte pela Justiça Comum (comercialização de produtos). A recente publicação da Emenda Constitucional nº 45, de 31.12.2004, constitui um avanço, pois convolou a Justiça do Trabalho no juízo natural para o qual devem convergir todos os conflitos decorrentes do trabalho pessoal prestado a outrem, subordinado ou não, assim como diversas lides conexas decorrentes da execução de um contrato de emprego. A mais notável alteração repousa na competência material da Justiça do Trabalho para lides oriundas da relação de trabalho. Sobrevindo a EC n. 45/2004, não se vincula mais a competência material da Justiça do Trabalho estritamente à lide emanada da relação de emprego e entre os respectivos sujeitos. Vinca-se dita competência à lide advinda da relação de trabalho. A estrita vinculação do novel art. 114 inc. I da CF/88 às lides “oriundas da relação de trabalho” bastaria para ser o fator determinante em si do reconhecimento da competência material da Justiça do Trabalho para muito além do dissídio individual entre empregado e empregador. Daí o pertinente e abalizado escólio de Amauri Mascaro Nascimento:“Relação de trabalho é um gênero, do qual a relação de trabalho ou contrato de trabalho é uma das modalidades, aspecto de fácil compreensão diante das múltiplas formas de atividade humana e que o Direito procura regulamentar em setorizações diferentes. Pode-se, mesmo, falar em divisão jurídica do trabalho com implicações no problema da competência dos órgãos jurisdicionais.” Quando o texto constitucional, diz que incumbirá à Justiça do Trabalho equacionar dissídio oriundo da “relação de trabalho” (art. 114, inciso I), confiou-lhe conflitos trabalhistas emergentes de uma relação de emprego pois esta é uma espécie de relação de trabalho e também toda lide advinda dos contratos de atividade em geral, contanto que se cuide de prestação pessoal de serviço a outrem. A lide que envolva servidor público o Supremo Tribunal Federal decidiu que não se enquadra na competencia da justiça trabalhista. Situação peculiar é a do trabalhador eventual avulso: desenvolve trabalho subordinado não configurador de relação empregatícia. A Constituição Federal, contudo, assegura ao avulso direitos iguais aos do trabalhador com vínculo permanente (art. 7º, parágrafo único). Há, pois, relação de trabalho assimilada à do emprego regida pelo Direito do Trabalho. O labor prestado “sem subordinação”, objeto de uma relação de trabalho em sentido amplo, quer haja sido formalizada ou não, é o trabalho autônomo ou por conta própria. Muitos contratos de atividade, mediante os quais se exterioriza o trabalho humano autônomo ou por conta própria, podem provocar o surgimento de lide afeta à competência da Justiça do Trabalho. Daí se segue, por exemplo, que um contrato de empreitada entre pessoas jurídicas, ou mediante o qual uma pessoa jurídica obriga-se junto a uma pessoa física a executar determinada obra, sob certo preço, transcende da competência da Justiça do Trabalho, por não se tratar de serviço avençado e prestado diretamente por pessoa física. Diga-se o mesmo de um litígio que aflore em um contrato de prestação de serviços entre um plano de saúde e o cliente, ou entre um banco na qualidade de prestador de serviços e pessoa física (por exemplo, ao receber tributos mesmo de não cliente). Se, entretanto, a lide resulta de labor pessoal, embora autônomo, inscreve-se na competência material da Justiça do Trabalho, é entendido como relação de trabalho ante a inafastável incidência do art. 114, inc. I da CF/88. Como já citado, relação contratual de consumo pode ter por objeto a prestação pessoal de serviços e, assim, também constituir relação de trabalho em sentido amplo (art. 3°, § 2° do CDC). Há relação de consumo desde que presente uma relação jurídica em cujos pólos estejam as figuras do consumidor-fornecedor, tendo por objeto um produto ou um serviço. Cuida-se de uma relação de natureza bifronte: do ângulo do consumidor/destinatário do serviço, relação de consumo, regida e protegida pelo CDC; do ângulo do prestador do serviço (fornecedor) regulada pelas normas gerais do Direito Civil. A lide propriamente da relação de consumo, entre o consumidor, nesta condição, e o respectivo prestador do serviço, visando à aplicação do Código de Defesa do Consumidor, escapa à competência da Justiça do Trabalho, pois aí não aflora disputa emanada da relação de trabalho. É lide cujo objeto é a defesa de direitos do cidadão na condição de consumidor de um serviço e não como prestador de um serviço. Afora isso, em geral a relação de consumo traduz uma obrigação contratual de resultado, em que o que menos importa é o trabalho em si. Entretanto, sob o enfoque do prestador do serviço (fornecedor), é forçoso convir que firma ele uma relação jurídica de trabalho com o consumidor/destinatário do serviço: um se obriga a desenvolver determinada atividade ou serviço em proveito do outro mediante o pagamento de determinada retribuição ou preço. Se não se cuida de litígio que surge propriamente da relação de consumo, mas da relação de trabalho que nela se contém, regulada pelo Direito Civil, não descaracteriza-se a competência da Justiça do Trabalho. É o que se dá, por exemplo, na demanda da pessoa física prestadora de serviços em favor de outrem pelos honorários ou preço dos serviços contratados.