RESENHAS Homem Comum Um método perigoso Philip Roth (A dangerous method) Título Original: Everyman Tradução: Paulo Henriques Britto Companhia da Letras 2007 1ª Ed. 131 pg. Ano: 2011 (Ing., França, Alemanha, Canadá e Suiça) Direção: David Cronenberg Com: Keyra Knightley, Viggo Mortensen, Michael Fassbender Duração: 111 min As exéquias do personagem principal são o ponto de partida para a história da vida de um homem comum, contada em flashback, desde a sua infância. O enredo é conduzido com ênfase na história médica, nas cirurgias às quais o personagem foi submetido e no seu comportamento afetivo e sexual. Desde a cirurgia de hérnia, na infância, até os procedimentos aos quais se submeteu quando adulto, seus sentimentos, temores e aflições passam pelo convívio com os tratamentos médicos. Com uma carreira profissional de sucesso, bem remunerado, bem sucedido com as mulheres, só as doenças são capazes lhe trazer problemas. Com o tempo, passa pela constituição da família, separações, e os problemas de relacionamento com namoradas, ex-esposas e filhos. Surgem amantes e relações amorosas casuais, o embate entre o certo e o errado, os conflitos conseqüentes à negação de sua formação familiar judaica. O personagem, judeu, como o autor, questiona a existência de Deus, da religião e o sentido de sua própria existência. Ao envelhecer, inicia a busca ao passado, passa a rever sua vida e procurar algo que possa ajudá-lo a enfrentar a decadência física e intelectual. Repassa as lembranças da infância, as relações familiares, amizades, casamentos. Todavia, a vida que construiu lhe reserva, na velhice, solidão e a sensação de impotência, de estar sendo massacrado por uma força invencível. Enfim, uma vida que muitos leitores poderão identificar no comportamento de algum conhecido seu. Philip Roth é hoje considerado o maior escritor norte-americano vivo, ganhador de diversos prêmios. Autor de grandes obras, como a “Trilogia Americana”, formada pelas novelas “Pastoral Americana” (1997), “Casei com um comunista” (1998) e “A Mancha Humana” (2000). Também bastante conhecidos são “Adeus Columbus” (1959), “O Complexo de Portnoy” (1969), e os recentes “Indignação” (2008) e “A Humilhação” (2009). Mantendo a coerência, dentro da característica principal de sua obra, traz questões psicológicas relacionadas à auto-identificação social, o papel do desejo sexual e atualmente o envelhecimento. “O Homem Comum” é questionador mas não é moralista. Deixa perguntas para as quais o leitor não precisa procurar a resposta, mas refletir sobre a sua própria condição. Uma jovem com diagnóstico de doença mental é internada em um hospital da Suíça, aos cuidados do também jovem Dr. Carl Gustav Jung, que começa a utilizar um método de tratamento pouco convencional para a época. A paciente, Sabine S., é submetida a sessões de análise, até obter melhora; ela passa pelo tratamento proposto, faz o curso de Medicina e mais tarde torna-se também psiquiatra. O interesse nas doenças da mente e nas novas possibilidades terapêuticas leva Jung a procurar o médico austríaco Sigmund Freud em Viena. Na casa deste, ambos mantém uma conversa inicial que dura cerca de treze horas ininterruptas. A partir de então passam trocar experiências e a indicar pacientes mutuamente, mantendo correspondência durante vários anos. O filme enfoca o tratamento inicial e a relação que acaba se estabelecendo entre o médico e a jovem paciente, terminando por desafiar os limites do que seria desejado e ético. A relação médico-paciente desenvolve-se de maneira conturbada, e surgem vários questionamentos que interferem na relação profissional entre os dois pioneiros da psicanálise. Além do envolvimento emocional do médico Jung com a paciente Sabine S., a situação financeira diversa entre o rico Jung e um Freud com recursos financeiros limitados, as sérias divergências entre os dois psiquiatras foram alimentadas por Freud, apegado ao rigor científico, opondo-se a Jung, atraído pelo misticismo e pela alquimia, chegando ao rompimento definitivo entre eles. É também interessante reparar na reconstituição de época e na fotografia, em que as belas e luminosas imagens do filme contrastam com a densidade do tema e da trama. Neste filme, o diretor canadense David Cronenberg volta a abordar um tema psiquiátrico, como fez anteriormente no soturno e também interessante “Spider”. Conhecido principalmente por filmes de suspense e terror, como “A mosca”, “Gêmeos, mórbida semelhança”, e “Crash”, Cronenberg imprime sempre um forte caráter psicológico aos seus trabalhos e, apesar disso, não deixa de ser um diretor versátil e original. Rodrigo Bertoncini Rodrigo Bertoncini 18 REVISTA CREMESC