Febre e convulsões em lactentes Prof. Leonardo C. M. Savassi Universidade Federal de Ouro Preto Faculdade de Medicina Setor de Saúde Coletiva e Medicina de Família e Comunidade Objetivos de Hoje • Algumas definições • Abordagem da Crise Convulsiva • Avaliação do lactente com Convulsão e Febre • Tratamento da Convulsão Febril (...) sob a ótica da melhor evidência disponível Definições Convulsão/ Crise Convulsiva: “distúrbio cerebral caracterizado por descargas elétricas súbitas, excessivas e transitórias dos neurônios cerebrais que se manifestam clinicamente por distúrbios diversos” - Em geral início e fim abruptos; - Generalizada x parcial/focal Gianetti, JG; Oliveira, LR; Machado, CD. 2005 Definições Crises tônico-clônicas/grande mal são contrações TCG, caracterizadas por contração muscular (rigidez) + contrações rítmicas (clônus). Crises de ausência simples/típica ou pequeno mal: perda súbita de consciência, breves lapsos, + fenômenos motores breves. Crises generalizadas atônicas apresentam perda de tônus e da consciência. Crises focais (parciais) podem ser motoras, sensitivas ou complexas. - motoras referem-se à contração de um segmento do corpo. - sensitivas, o paciente apresenta distúrbios sensitivos localizados. - complexas por alterações da consciência, + alterações cognitivas ou afetivas. Crise mioclônica: contrações musculares não-rítmicas, como "choques", manifestando-se clinicamente como se corpo se projetasse ao chão Crise astática queda por perda da base sustentação, aspecto de "implosão". Guerreiro, M. 2002 Classificação das Convulsões (ILAE) A) Convulsões Generalizadas Tonico–clônicas (qualquer combinação) Ausência Típica Atípica Ausência com características especiais: Mioclônica, Miocl. palpebral Mioclônica Mioclônica atônica Mioclônica tônica Clonica Tonica Atônica B) Convulsões Focais C) Desconhecidas Berg et al, 2010. Definições Epilepsia: “síndrome clínica, crônica, que se manifesta por distúrbios epiléticos recorrentes e várias apresentações, dentre elas as crises convulsivas clássicas, que são somente uma de suas manifestações. Por definição, requer a repetição da crise epilética, na ausência de insultos agudos” Guerreiro, M. 2002 Definições Lactente: O termo "bebê" ou "lactente" inclui o período neonatal e se estende até 1 ano de idade (12 meses). SBP, s/d; Definições Febre: Febre é definida como “elevação anormal da temperatura corpórea”. Os níveis considerados anormais devem ser analisados levando em conta vários fatores, inclusive circadiano. Uma temperatura anormal seria maior que 37,8°C oral ou retal maior que 38,3°C (medida em 2 minutos) , correspondendo, portanto, a uma leitura axilar maior que 37,3°C (medida em 3-5 minutos) A despeito disto, consideramos, em termos práticos “subfebril” ou “estado febril” a Tax entre 37,3 e 37,8 oC Giglio, Marques e Yamamoto, 1982 Definições As síndromes/crises provocadas são aquelas relacionadas à resposta do cérebro normal a eventos externos, como febre, distúrbios hidro-eletrolíticos ou intoxicação, também chamados fatores deflagradores. Essas síndromes/ crises provocadas não atingem o cérebro diretamente, mas são efeitos da desorganização metabólica do corpo sobre o cérebro. Savassi, 2006 Definições As síndromes/crises não-provocadas são relacionadas a agressão ao parênquima. Mecanismos de produção da crise estão relacionados a doenças/ fatores que afetam diretamente o cérebro. Essas crises podem ser: • sintomáticas agudas: relacionadas a insultos agudos, como infecção intracraniana, TCE, neoplasia, AVC, drogas ou DHE locais; • sintomáticas remotas: associadas a lesões residuais de insultos, tais como processos hipóxico-isquêmicos, infecções ou TCE prévios; • idiopáticas: não há fator desencadeante, epilepsias com herança familiar, de caráter genético, com características específicas clínicas e EEG; • criptogênicas: sem padrão genético identificável. Savassi, 2006 Importante Em 80% dos casos não se pode observar clinicamente uma convulsão Em 25% das crises observadas não se consegue caracterizar o tipo da convulsão Neurologistas tem concordância de 84% (kappa=0,58) quanto ao diagnóstico de ser ou não uma crise convulsiva Guerreiro, M. 2002; van Donselaar, CA et al. 1989; Importante Pródromos: Preditores para a crise que está por vir: • irritabilidade, • alterações do humor, • cefaléia, • distúrbios de personalidade Gianetti, JG; Oliveira, LR; Machado, CD. 2005 Importante Aura: Eventos iniciais (componente). Geralmente o último evento do qual o paciente recorda-se: • • • • distúrbios sensoriais, parestesias ou disestesias, alucinações visuais ou sonoras, “sensações” e outras dependendo da área cerebral afetada. Gianetti, JG; Oliveira, LR; Machado, CD. 2005 Importante Fenômenos pós-críticos • hemiplegia, • monoplegia (paralisia de Todd), • alterações de comportamento, • cefaléia Gianetti, JG; Oliveira, LR; Machado, CD. 2005 Caso 01 Paciente 11 meses, sexo feminino, chega em crise convulsiva, generalizada, auxiliar de enfermagem a conduz para a sala de emergência. Pais, ACS, enfermeira e você estão assustados com o quadro, iniciado minutos antes, na sala do Acolhimento. Caso 01 O que fazer? Como fazer? E quando fazer? MEDIDAS GERAIS (Afastar Crises não convulsivas) Caso 01 SIM Acesso Venoso Lorazepan (0,1 mg/kg) EV lento Diazepan (0,2-0,5 mg/kg) EV lento Repetir 2x ou até dose máxima Midazolam (0,05-0,2mg/kg) EV/IM/IN (opção: Hidantal (18-20 mg/kg) EV FNB (10-20mg/kg/dose de ataque) EV (opção Ác. valpróico (20mg/kg) VR 1:1 salina NÃO Midazolam IM/IN/VO Diazepan (0,5 mg/kg) VR (opção) Repetir 2x ou dose máxima FNB IM (opção Ác. Valpróico VR) Adaptado de Savassi, 2012 Caso 01 A enfermeira, que fazia acolhimento, relata coriza e tosse produtiva. A mãe chora e diz que isto nunca ocorreu antes. O pai está nervoso e quer encaminhamento para o serviço de urgência para o neurologista avaliar. A temperatura é 38,5o C. Caso 01 Qual o próximo passo? Qual o diagnóstico? E qual será a nossa conduta? Caso 01 Se a convulsão não cedeu.... crise convulsiva >30 minutos = Status epilético = UTI. Caso 01 Após o controle da crise, chega a hora de avaliar qual seria a propedêutica necessária para a paciente de 11 meses. Caso 01 O que fazer? Quando fazer? E porque fazer? Caso 01 TODA CF em menor de 12 meses pode ser MNG. PL imediata! Leucograma, PCR, VHS, EEG e outros NÃO confirmam nem afastam MNG. Caso 01 Indicações de PL em pacientes com febre + convulsão - < 12 meses; - S&S meníngeos; - Letargia, acometimento do est. clínico geral; - Ausência de etiologia definida para a febre; - Petéquias ou em 12-18 meses: considerar PL! Caso 02 O paciente retorna seis meses depois com a terceira crise convulsiva febril. O pai está mais nervoso ainda e questiona porque a criança dele ainda não foi ao neurologista. A mãe pergunta se ele vai ter que tomar gardenal para sempre. Caso 02 Há necessidade de tratamento? Há necessidade de especialista? Caso 02 CF não causa déficits neurológicos e o tratamento não altera o prognóstico. Por outro lado o “risco” de convulsão altera a QV e vida social da criança e da família. Caso 02 E então? Caso 02 A AAP recomenda não tratar a CF. Orientar os pais. Apenas na absoluta recusa dos pais em mantê-la sem tratamento a principal opção é o tratamento intermitente (BZD): DZP (0,2-0,5 mg/kg/dia 8/8h ou 12/12h) Antipiréticos não tem qualquer papel no controle da CF. AAP; 2008 Educação em saúde É fundamental educar a família quanto a: - Benignidade ou malignidade da crise - Risco de recorrência - Uso da medicação - Riscos da doença - Qualidade de vida - Crenças e mitos É fundamental educar a comunidade (via escola p.e.) Conclusões CF ≠ convulsão não provocada ≠ Síndrome epilética. O MFC deve estar preparado para: - tirar o paciente da crise, - abordar a família, - aproveitar a comunidade (escola, por exemplo), - exercer o seu cuidado longitudinal e integral de acordo com a melhor evidência disponível. Caso 03... Obrigado! Leonardo C M Savassi [email protected] http://sites.google.com/site/leosavassi