0 UNIVERSIDADE REGIONAL DO NOROESTE DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL-UNIJUI CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU EM EDUCAÇÃO ESPECIAL: DEFICIÊNCIA MENTAL E TRANSTORNOS E DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM DHE- DEPARTAMENTO DE HUMANIDADES E EDUCAÇÃO A ESCOLA, A DIFERENÇA E OS SUJEITOS QUE NELA OPERAM IJUI 2012. 1 UNIVERSIDADE REGIONAL DO NOROESTE DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL-UNIJUI CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU EM EDUCAÇÃO ESPECIAL: DEFICIÊNCIA MENTAL E TRANSTORNOS E DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM DHE- DEPARTAMENTO DE HUMANIDADES E EDUCAÇÃO A ESCOLA, A DIFERENÇA E OS SUJEITOS QUE NELA OPERAM ROSENARA BEATRIZ DE OLIVEIRA PROFESSORA ORIENTADORA SONIA APARECIDA DA COSTA FENGLER IJUI 2012. 2 Rosenara Beatriz de Oliveira A ESCOLA, A DIFERENÇA E OS SUJEITOS QUE NELA OPERAM Monografia apresentada para obtenção do título de Especialista em Educação Especial:Deficiência Mental e Transtornos e Dificuldades de Aprendizagem junto ao DHE- Departamento de Humanidades e Educação da Universidade Regional do Noroeste do Rio Grande do Sul- UNIJUI Orientação: Professora Sonia Aparecida da Costa Fengler IJUI 2012. 3 Resumo - Embora sendo um estudo localizado, o presente trabalho tem como propósito a reflexão sobre aspectos considerados relevantes para viabilizar uma educação de fato inclusiva, bem como quais as condições pessoais / profissionais dos sujeitos da escola para uma atuação que acolha e respeite a diversidade. Para tanto, além de pesquisa bibliográfica, nos propomos a ouvir profissionais de uma escola regular, da rede privada do município de Santo Ângelo- RS, que atuam com sujeitos com necessidades especiais, mantendo constante interlocução com a literatura da área e a fala dos entrevistados. Para compreendermos a escola de hoje, torna-se necessário olharmos para o passado. Dessa forma, procuramos fazer um breve resgate histórico sobre as mudanças e avanços que ocorreram no mundo todo em relação à Educação Especial, em busca de uma educação inclusiva como forma de combater atitudes discriminatórias e garantir uma educação para todos. Palavras-chave: Inclusão – Escola- Diversidade - Educador – Identidade - Diferença 4 SUMÁRIO INTRODUÇÃO------------------------------------------------------------------------------------------5 1 CONHECENDO OS ASPECTOS HISTÓRICOS E LEGAIS DA EDUCAÇÃO ESPECIAL---------------------------------------------------------------------------------------------- 8 2 A ESCOLA, A DIFERENÇA E OS SUJEITOS QUE NELA OPERAM----------------18 2.1 A Escola ---------------------------------------------------------------------------------------------18 2.2. A Escola e a Diferença---------------------------------------------------------------------------23 2.3. A Escola e os Sujeitos que nela operam------------------------------------------------------25 CONSIDERAÇÕES FINAIS------------------------------------------------------------------------39 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS------------------------------------------------------------42 5 INTRODUÇÃO “A alma dos diferentes é feita de uma luz além. Sua estrela tem moradas deslumbrantes que eles guardam para os poucos capazes de os sentir e entender.Nessas moradas estão tesouros da ternura humana dos quais só os diferentes são capazes. Não mexa com o amor de um diferente. A menos que você seja suficientemente forte para suportá-lo depois”. (Arthur da Távola) Esta pesquisa reflete de certo modo a experiência de vinte e quatro anos como profissional da educação, com a oportunidade de experimentar tempos de gestão de sala de aula e também de gestão enquanto membro de uma equipe diretiva. Reconheço que tal experiência foi ao mesmo tempo gratificante e desafiadora, a ponto de concluir que todos os profissionais da educação deveriam ter a oportunidade de passar por essa vivência, uma vez que, ao ver-se “nos dois lados”, teriam maiores possibilidades de análise e reflexões sobre seu fazer docente e sobre a realidade da escola. Digo isso, porque ultimamente algumas antigas inquietações que tenho agora se tornam muito mais pertinentes com o desafio da inclusão em nossas escolas. Esta questão surge, porque assim como muitos, e ao contrário de outros, sempre acreditei que falar de inclusão na escola é reconhecer que a mesma não se refere somente a pessoas com necessidades educacionais especiais, mas sim a toda a educação, como direito legítimo de todos. São confrontos envolvendo o ensinar e o aprender, o dar conta de um currículo, são os métodos e o processo de avaliação, são os olhares diversos que surgem sobre o educando, os 6 “positivos e os negativos”, os que “condenam e os que compreendem”, os que “acolhem e os que ignoram”. Miguel Arroyo (2004), afirma que os confrontos sobre se olhamos e como olhamos os estudantes, refletem como nos olhamos. São olhares que nos perturbam e desacomodam, pois nos levam a perguntar como nos vemos, nos convidam a remexer na gaveta dos guardados, desencadeando sensações agradáveis e outras nem tanto. Assim, nasce o propósito de nosso trabalho, buscar refletir sobre quais aspectos são considerados relevantes para viabilizar uma educação de fato inclusiva, quais as condições pessoais / profissionais dos sujeitos da escola para uma atuação que acolha e respeite a diversidade. Para atingir esse objetivo, além da pesquisa bibliográfica, nos propomos a ouvir profissionais de uma escola regular da rede privada do município de Santo Ângelo que atuam com sujeitos da Educação Especial. Mesmo sendo um estudo localizado, procuramos manter constante interlocução com a literatura da área e a fala dos entrevistados, não com a intenção de buscar conclusões extensivas ao tema, mas para uma reflexão sobre o mesmo contribuindo com elementos teórico-práticos na discussão de dados relevantes para viabilizar uma educação de fato inclusiva no contexto escolar. Para compreendermos a escola de hoje, torna-se necessário olharmos para o passado e reconhecermos que as mudanças e progressos que ocorreram no mundo todo em relação à Educação Especial, principalmente ao longo das últimas décadas, são esforços em busca de uma educação inclusiva como forma de combater atitudes discriminatórias e garantir uma educação para todos. Dessa forma, ao fazermos um breve resgate histórico sobre a inclusão, torna-se perceptível a sua construção como um processo histórico-cultural, resultante da produção humana. Trata-se de um longo caminho traçado e marcado pela exclusão daqueles 7 considerados diferentes, perpassando as várias noções de deficiência ao longo da história, indo dos modelos ditos assistencialistas, a internação do sujeito defendida pelo modelo médico, até chegar à educação. As políticas públicas no tocante à educação especial denotam novos enfoques, que começaram a surgir com as primeiras experiências de integração escolar da criança com deficiência, tendo como ápice, o encontro internacional de Salamanca, em 1994 (Declaração de Salamanca) representando avanços globais quanto a projetos político-pedagógicos voltados para uma educação inclusiva. No Brasil, na década de 1990, essas ideias foram ganhando espaço até chegar a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB, de 1996, definindo como prioridade o atendimento educacional de sujeitos com deficiências ou com necessidades educacionais especiais no sistema regular de ensino. Com certeza, os avanços são muitos, principalmente com as conquistas legais. Porém, o processo de inclusão ainda enfrenta muitos desafios no contexto escolar, afinal, trabalhar com a diferença não significa negá-la, ao contrário, procura-se encontrar maneiras de ensinar que saiam do foco da limitação do sujeito e que respeite e considere suas possibilidades e especialmente sua singularidade. Isso implica dizer que a organização escolar como um todo precisa ser repensada, assim como nossas crenças e atitudes em relação à educação, frente a um novo cenário que se descortina no século XXI. Pois, ao falarmos de inclusão, falamos da consideração com o outro como um ser único, respeitando seus interesses, capacidades, diferenças, fortalecendo a identidade desse sujeito ainda em construção e colaborando para a superação de entraves que se apresentam no contexto escolar e social. 8 1 CONHECENDO OS ASPECTOS HISTORICOS E LEGAIS DA EDUCACAO ESPECIAL Nos variados períodos históricos da humanidade, a segregação das pessoas com algum tipo de deficiência, marcou o processo de exclusão das mesmas. Com a chegada do novo milênio, uma nova visão sobre inclusão surge para as pessoas com deficiência. Estamos falando de uma educação inclusiva. O assumir a diversidade na escola e na sociedade, supõe, além de um processo integrativo, o reconhecimento dos direitos iguais para todos os indivíduos e a possibilidade de um enriquecimento educativo e social. O surgimento de terminologias ligadas à Educação Especial entre elas a integração, a normalização, a inclusão, a diversidade, e outras tantas, refletem a sobrecarga que carrega todo aquele que é diferente, que não se encaixa a modelos pré-estabelecidos que o levem a fazer parte de grupos homogêneos, que se autodeterminam ser iguais perante outros considerados diferentes. Silva aponta a identidade e diferença como resultado de atos de criação, ou seja, somos nós que as produzimos no contexto das relações culturais e sociais. Ambas são instituídas como tais, por meio de atos da fala, ou seja, é o resultado de criação lingüística e estão sujeitas a relações de poder (SILVA apud JULIANI, 2010, p.4). Ainda, conforme esse autor, afirmar a identidade significa demarcar fronteiras, significa fazer distinções entre o que fica dentro e o que fica fora. Essa demarcação de fronteiras, essa separação e distinção supõem e, ao mesmo tempo, afirma e reafirma relações de poder. Tais relações, também estão exemplificadas nos atos de incluir e excluir, classificar e normalizar. Normalizar significa “eleger- arbitrariamente- uma identidade específica como parâmetro, em relação a qual as outras identidades são avaliadas e hierarquizadas” (SILVA apud JULIANI, 2010, p. 5). 9 Isto aponta que, ao se atribuir a uma identidade específica, todas as características positivas possíveis, sendo que as demais são avaliadas de forma negativa, institui-se a normalização. Se nossos comportamentos e ações são regulados tendo como modelo as identidades socialmente aceitas e valorizadas, podemos afirmar que nos situamos no mundo a partir da normalidade instituída pela sociedade moderna. Por outro lado, como vimos anteriormente, essa linguagem comum instituída, permite aos indivíduos delimitar quem são os normais e os anormais, e isso varia, conforme épocas e espaços. Se de um lado, a norma nega, suprime aquelas identidades ditas negativas e patológicas manifestadas em corpos deficientes, por outro lado surgem normas com a denominação de educação especial para atendê-los. Porém, ainda se percebe, no campo da Educação Especial, a separação dos sujeitos em polos contrários, e uma forma de entendimento que fala e os remete, com suas múltiplas deficiências, a grupos homogêneos, sobre os quais se pensa a partir de seus traços faltantes. Como consequência, “investe-se cada vez mais em práticas de normalização aliadas agora a áreas tecnológicas e suas promessas de cura definitiva” (THOMA apud JULIANI, 2010, p. 6). Contudo, já se observam manifestações de grupos organizados de pessoas com deficiência que buscam maior espaço de participação na sociedade. Talvez, seja o momento de repensarmos o entendimento sobre deficiência numa determinada ótica, alargando horizontes, de forma a [...] compreender o discurso da deficiência, para logo revelar que o objeto desse discurso não é a pessoa que está em uma cadeira de rodas ou que usa um aparelho auditivo ou o que não aprende segundo o ritmo e a forma como a norma espera, senão os processos sociais, históricos, econômicos e culturais que regulam e controlam a forma acerca de como são pensados e inventados os corpos e as mentes dos outros (SCLIAR apud JULIANI, 2010, p. 7). Procuramos fazer um pequeno resgate histórico buscando compreender a função dos indivíduos no cenário histórico da nossa civilização. Isso implica em desfazer-se do arraigado entendimento que temos, de que a organização e as respectivas ações que constituem a sociedade, se dão de forma espontânea e natural, para compreendê-las enquanto produtos e 10 escolhas do homem, numa determinada época. Porém, conforme Gugel (2012) ao se buscar dados sobre o tipo de tratamento dispensado às pessoas com deficiência ao longo da história, descobre-se que muito pouco se sabe, a se começar pelos primeiros grupos de humanos na Terra. Segundo pesquisadores, a preocupação maior dos grupos ao se formarem, era manter a segurança e sobrevivência dos seus integrantes. Dessa forma, supõe-se que uma pessoa com deficiência se tornasse um fardo para o grupo, sem contar que só os mais fortes sobreviviam diante da precariedade das condições de sobrevivência, tais como a dificuldade com abrigos, o clima e a obtenção de alimentos. No Egito Antigo, tanto evidências arqueológicas, quanto a arte egípcia, nos levam a concluir que o indivíduo deficiente era integrado nas diferentes classes sociais, seja do faraó, nobres, artesãos, até escravos, desenvolvendo entre as ocupações, as de dançarinos e músicos. Papiros encontrados, contendo ensinamentos morais no Antigo Egito, salientam a necessidade de se respeitar as pessoas com nanismo e com outras deficiências. Na Grécia, as crianças nascidas com deficiência eram eliminadas, seja por abandono ou atiradas em cadeia de montanhas. Assim como em Roma, onde aos pais era permitido matar as crianças por afogamento, embora muitos não o fizessem, abandonando-os em lugares considerados sagrados. Os que sobreviviam, desempenhavam ocupações, como bobo ou palhaço, para diversão dos mais abastados. Com o surgimento do cristianismo na Idade Média, a situação se modificou, pois todos passaram a ser considerados filhos de Deus, merecedores do respeito à vida e a um tratamento caridoso. As condições tanto de vida quanto de saúde eram precárias, o nascimento de indivíduos com deficiência era tido por alguns, como punição divina, enquanto para outros, como poder sobrenatural, feitiçaria ou bruxaria. Na Bíblia podemos encontrar referências ao leproso, ao manco e ao cego como pedintes, rejeitados pelos demais, ou pelo medo da doença ou tendo-os como fonte da punição divina, segundo Aranha (2008). 11 Na Idade Moderna, ainda conforme Gugel (2012), deu-se o período de grandes transformações nas artes, música e ciência, assim como avanços e invenções que visavam beneficiar pessoas surdas. Entre elas: Código para ensinar pessoas surdas a ler e escrever, de Girolamo Cardano, 1501-1576; Método voltado para pessoas com deficiência auditiva utilizando-se de sinais, criado por Pedro Ponce de León, 1520-1584; Ambroise Paié, 15101590, traz grande contribuição na criação de próteses, aperfeiçoando métodos cirúrgicos para ligar as artérias, enquanto buscava a cura para ferimentos de guerra que causavam amputações; Em 1620, surgem os escritos de Juan Pablo Bonet sobre as causas das deficiências auditivas e problemas de comunicação. Surge o alfabeto na língua de sinais; John Bulmer, 1600-1650, cria um método para ensinar aos surdos a leitura labial; Louis Braille, 1809-1852,cria um sistema de escrita padrão – o Braille, usado até os dias de hoje. No final do século XVIII e início do século XIX, a sociedade, finalmente, começa darse conta da necessidade de atender essas pessoas com deficiências, porém, o faz num caráter mais assistencial que educativo. Enquanto instituições se organizam para estudar os problemas da deficiência, grupos de pessoas se voltam para a reabilitação de feridos para o trabalho. Nessa mesma época, surge com Napoleão Bonaparte a ideia de que ex-soldados poderiam ser reabilitados, sendo ainda úteis ao exército. Começam a ser criadas as chamadas escolas especiais, cuja política era separar e isolar as crianças do restante da sociedade, buscando evidenciar certo empenho na solução de problemas. Tem-se aí, um período de segregação. Os primeiros institutos de educação especial foram criados por meio de asilos e manicômios. Os deficientes visuais eram tirados do convívio social e isolados do restante da sociedade nas poucas instituições criadas. O que se percebe é que, embora as primeiras instituições de educação especial não atendessem as reais necessidades da sociedade, as mesmas foram se expandindo a partir dos anos trinta e quarenta. No Brasil, o marco da educação especial foi a criação do Imperial Instituto dos Meninos Cegos, em 1854, e do Instituto dos Meninos Mudos, em 1857, na cidade do Rio de 12 Janeiro, concretizados por Dom Pedro II, 1840-1889, sem uma preocupação direta com a aprendizagem, somente com cunho assistencial. Paralelamente, em 1855, também no Rio de Janeiro, surge o primeiro hospital para doentes mentais, o Hospício de Pedro II, marcando o início da psiquiatria no Brasil. Ainda no século XIX, conforme Mosquera et al (2006), as pessoas com necessidades especiais passam a ser objeto de estudo da medicina, tendo nos estudos de Jean Itard, 17751838, na França, o primeiro esforço e estudo sistemático visando a reabilitação de uma criança diferente, a partir de Vítor, o Menino Lobo, portador de deficiência mental profunda. Também como esse autor, outros estudos surgem sobre o tratamento de pessoas com deficiência, com destaque para Philippe Pinel, que por volta de 1800 escreve sobre os atrasados mentais, Esquirol, 1780-1820, com o estabelecimento da diferenciação entre idiotia e demência e Seguin, 1840-1870, com a elaboração do método fisiológico voltado à educação de crianças com atraso mental. De 1914 a 1918, o mundo vive a Primeira Grande Guerra Mundial. Foram anos difíceis com muita carestia. Em 1919, é consolidada a paz, e é criada a OIT – Organização Internacional do Trabalho, com o objetivo de reabilitar as pessoas para o trabalho no mundo, inclusive aquelas com deficiência. No mundo ocidental, surge a criação de programas escolares, a abertura, aos poucos, das instituições e a ampliação e diversificação de serviços especiais – no Brasil, em 1926, é fundado o Instituto Pestalozzi, especializado no trabalho com portadores de deficiência mental e tem início a educação escolar voltada para o deficiente mental, fosse ela leve ou moderada. Surge nas escolas, alunos com necessidades educacionais especiais, os ANEEs, ou então chamados “excepcionais”, fato que se deu no Brasil até a década de 50. Em 1954 é fundada a primeira Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais- APAE. Surge o ensino especial como opção à escola regular. Até 1956, grande parte das iniciativas, 13 voltadas para o atendimento de pessoas com deficiências se deram a nível privado ou de forma isolada por pessoas que se dedicavam a defender os direitos dos mesmos. Assim, ao longo do século XX, outras organizações governamentais e civis foram surgindo com a preocupação de melhorar os serviços de reabilitação, tendo em vista os problemas sociais vividos. Não podemos deixar de citar que entre 1939 e 1945, o mundo vive a Segunda Guerra Mundial e as atrocidades nela cometidas chocaram a humanidade. Com o Holocausto, milhares de pessoas, entre elas judeus e pessoas com deficiência, foram eliminadas em nome da política da raça ariana pura, sem contar os outros milhares de mortos e sequelas deixadas pelas bombas nucleares lançadas sobre Hiroshima e Nagasaki. O que restou foram cidades a serem reconstruídas, crianças órfãs, e adultos sobreviventes com sequelas. Para a busca de solução para os problemas deixados, é criada em 1945, em Londres, a ONU – Organização das Nações Unidas, assim como também as agências ENABLE – Organização das Nações Unidas para Pessoas com Deficiência; UNESCO – Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura; UNICEF – Fundo das Nações Unidas para a Infância, e a OMS – Organização Mundial da Saúde. Em 1948, em reunião na ONU, a comunidade internacional declara em documento todos os direitos de cada pessoa em todo lugar e tempo. É a Declaração Universal dos Direitos Humanos, que apresente em seu artigo primeiro: “Todas as pessoas nascem livres e iguais em dignidade e direitos. São dotadas de razão e consciência e devem agir em relação umas às outras com espírito de fraternidade”. Neste período se consolidam nos países aquelas instituições voltadas para pessoas com deficiência. Assim, como resultado dos diversos acontecimentos e movimentos políticos, sociais e econômicos, no Brasil, em 1961, é promulgada a Lei de diretrizes e Bases da Educação- LDB, que garante o direito da criança com deficiência à educação, de preferência na escola regularLDBEN nº 4024/61. 14 Já no ano de 1971, vemos um retrocesso jurídico com a criação da Lei nº 5692, que determina “tratamento especial” para crianças com deficiência, reforçando as escolas especiais. Surge nos países da Europa e das Américas, um amplo movimento que pregava uma atenção maior aos serviços de educação especial, buscando a garantia e o desenvolvimento de um processo educativo que se adaptasse às necessidades individuais desses indivíduos. Com o Decreto nº 72425/73, é criado o Centro Nacional de Educação EspecialCENESP, com o objetivo de gerenciar a educação especial no Brasil. Porém, não se vê ações que garantam o acesso universal à educação, ao contrário, o que temos mais uma vez é a segregação dos indivíduos, uma vez que a perspectiva das ações era de integração somente daqueles que conseguiam acompanhar a escola regular, sem contar com apoio de um atendimento especializado. Surge uma nova perspectiva para a educação especial, com a Constituição Federal de 1988, que traz como um dos seus objetivos fundamentais “promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e qualquer outra forma de discriminação” (art. 3º, inciso IV). Define, no artigo 205, a educação como direito de todos, garantindo o pleno desenvolvimento da pessoa, o exercício da cidadania e a qualificação para o trabalho. No seu artigo 206, inciso I, estabelece “igualdade de condições de acesso e permanência na escola” como um dos princípios para o ensino e garante como dever do Estado, a oferta do atendimento educacional especializado, preferencialmente na rede regular de ensino (art. 208). Em1989 é aprovada a Lei nº 7853 que criminaliza o preconceito. No entanto, a presente lei só é regulamentada em 1999, ou seja, dez anos depois. No ano de 1990, o país aprova o Estatuto da Criança e do Adolescente, que, conforme Lei 8069/90, dá aos pais ou responsáveis a obrigação de matricular os filhos na rede regular de ensino, garantindo também no artigo 54, o atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino. No caso, ainda voltado somente aos que possuem altas habilidades. 15 Também nos anos 90, realiza-se a Conferência Mundial de Educação, numa parceria da UNESCO e o governo espanhol, com o objetivo de discutir com especialistas a forma de atuação do sistema educacional que tende a excluir os considerados diferentes. Documentos como a declaração de Salamanca (1994) passam a ter influência na formulação das políticas públicas de educação inclusiva, passando de uma escola integrativa para uma escola inclusiva. No documento, representantes de 92 países e 25 organizações internacionais reafirmam [...] o nosso compromisso para com a Educação de Todos, reconhecendo a necessidade e a urgência de ser o ensino ministrado, no sistema comum de educação, a todas as crianças, jovens e adultos com necessidades educacionais especiais, e apoiamos, além disso, a Linha de Ação para as Necessidades na Educação Especial, cujo espírito, refletido em suas disposições e recomendações, deve orientar organizações e governos (BRASÍLIA, 2006, p. 15). O documenta afirma ainda que: 1. Todas as crianças, de ambos os sexos, têm direito fundamental à educação, e que a elas deve ser dada a oportunidade de obter e manter um nível aceitável de conhecimentos. 2. Cada criança tem características, interesses, capacidades e necessidades de aprendizagem que lhe são próprios. 3. Os sistemas educacionais devem ser projetados e os programas aplicados de modo que tenha em vista toda a gama dessas diferentes características e necessidades; 4. As pessoas com necessidades educacionais especiais devem ter acesso às escolas comuns que deverão integrá-las numa pedagogia centralizada na criança, capaz de atender a essas necessidades. 5. As escolas comuns, com essa orientação integradora, representam o meio mais eficaz de combater atitudes discriminatórias, de criar comunidades acolhedoras, construir uma sociedade inclusiva e dar educação para todos; além disso, proporcionam uma educação efetiva à maioria das crianças e melhoram a eficiência e, certamente, a relação custo- benefício de todo o sistema educacional. (UNESCO, 1994). Além disso, orienta sobre o apoio suplementar aos alunos com necessidades educativas especiais, buscando assegurar uma educação eficaz e considera a convivência na Educação Inclusiva de alunos especiais e os ditos normais num rico espaço para o desenvolvimento da solidariedade. No entanto, nesse período, a Política Nacional de Educação Especial (1994) determina “a integração institucional” e ainda condiciona o acesso ao ensino regular àqueles que possuem condições de acompanhar “os alunos ditos normais”, deixando claro, a tentativa de manter um padrão homogêneo no contexto educacional. 16 Em 1999, acontece a Convenção da Guatemala promulgada no Brasil pelo Decreto nº 3956/2001, que assegura às pessoas com deficiência, os mesmos direitos humanos e liberdades fundamentais que as demais pessoas, definindo como discriminação com base na deficiência toda diferenciação ou exclusão que possa impedir ou anular o exercício dos direitos humanos e de ter as liberdades fundamentais. Com o decreto, tornou-se necessário uma reinterpretação da educação especial, buscando promover a eliminação das barreiras que impedem o acesso à escolarização, o que é reforçado com o documento lançado em 2004 pelo Ministério Público Federal, intitulado O Acesso de Alunos com Deficiência a Escolas e Classes Comuns da Rede Regular. Tal documento tem como objetivo disseminar os conceitos e diretrizes mundiais para a inclusão, reafirmando o direito e os benefícios da escolarização de alunos com e sem deficiência nas turmas comuns do ensino regular. (MOSQUERA et al, 2006) As Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na Educação Básica, Resolução CNE/CCB nº 2/2001, traz em seu artigo 2º Os sistemas de ensino devem matricular todos os alunos, cabendo às escolas organizarem-se para o atendimento aos educandos com necessidades educacionais especiais, assegurando as condições necessárias para uma educação de qualidade para todos. (BRASIL, 2001, p.1) Assim, o atendimento especializado assume papel complementar à escolarização. No ano de 2002 a Resolução CNE/CP1 define que a universidade deve formar professores para atender alunos com necessidades especiais. No mesmo ano, a Lei nº 10.436/02 reconhece a língua brasileira de sinais como meio legal de comunicação e expressão, assim como a Portaria nº 2678 aprova normas para o uso, o ensino, a produção e a difusão do braile em todas as modalidades de educação. No ano seguinte, o MEC cria o Programa Educação Inclusiva: direito à diversidade, que forma professores para atuar na disseminação da Educação Inclusiva. Já em 2007, é lançado o PDE- Plano de Desenvolvimento da Educação, apresentando como eixos a formação de professores para a educação especial, a acessibilidade arquitetônica dos prédios escolares, a implantação de sala de recursos multifuncionais, acesso e a permanência das 17 pessoas com deficiência na educação superior, bem como o monitoramento do acesso à escola dos favorecidos pelo BPC- Benefício de Prestação Continuada. Para a implementação do mesmo, é publicado o Decreto nº 6094/2007, estabelecendo nas diretrizes do Compromisso Todos pela Educação, a garantia de acesso e permanência no ensino regular e o atendimento às necessidades educacionais especiais dos alunos, fortalecendo seu ingresso nas escolas públicas. Finalmente, após anos de debates, é elaborada a Política Nacional de Educação Especial, na Perspectiva da Educação Inclusiva, que acaba com a escolha entre ensino regular e ensino especial. Ela surge com o objetivo de garantir [...] o acesso, a participação e a aprendizagem dos alunos com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades/superdotação nas escolas regulares, orientando os sistemas de ensino para promover respostas às necessidades educacionais especiais, garantindo: transversalidade da educação especial desde a educação infantil até a educação superior; atendimento educacional especializado; continuidade da escolarização nos níveis mais elevados de ensino; formação de professores para o atendimento educacional especializado e demais profissionais da educação para a inclusão escolar; participação da família e da comunidade; acessibilidade urbanística, arquitetônica, nos mobiliários e equipamentos, nos transportes, na comunicação e informação; e articulação interssetorial na implementação de políticas públicas (MEC/SEESP, 2007, p.8). Com a nova política, se percebe uma definição clara de como deve ser oferecida a educação para todos os que possuem deficiência. Concomitante, vemos pela primeira vez no cenário educacional, conforme dados levantados pelo Censo Escolar/2006, um maior número de alunos com necessidades especiais matriculados no ensino regular comparado ao número de alunos matriculados nas escolas e classes especiais, entre os anos 1998 e 2006 (INEPCenso Escolar, 2006). Com esse pequeno resgate, fica claro que não podemos ignorar o longo processo histórico em que foi produzida a inclusão, com a luta constante de diferentes minorias, na árdua busca pela defesa e garantia de seus direitos enquanto seres humanos e cidadãos. E no contexto escolar, que aspectos são considerados relevantes para viabilizar uma educação de fato inclusiva? Somente os aspectos legalistas garantem a inclusão? E se garantem como o fazem? Quais as condições pessoais / profissionais dos envolvidos no 18 contexto/comunidade escolar para uma atuação na educação inclusiva? É o que procuraremos responder no capítulo seguinte. 19 2 A ESCOLA, A DIFERENÇA E OS SUJEITOS QUE NELA OPERAM 2.1. A Escola Nesse momento as escolas, mais por força legal que por convicção, estão a receber alunos com deficiência, levando professores, direções e toda a comunidade educativa a uma reflexão mais séria sobre a concepção de escola e das práticas pedagógicas nela desenvolvidas. Nessa perspectiva, torna-se urgente uma mudança de olhar a escola não somente com a tarefa de transmitir conhecimentos, mas mais do que nunca, como um espaço que reconhece e acredita no outro, em todas as suas dimensões, no qual as diferenças são vistas de forma natural, sem constrangimentos, barreiras ou empecilhos para aquele que não se enquadra nos padrões ditados pela sociedade. No entanto, é importante lembrar que, como vimos anteriormente, a visão de deficiência é historicamente construída e a visão que temos hoje sobre a mesma, é resultado de todo esse processo de construção e, portanto, distinta dos primórdios dessa discussão. Foi com o início da Idade Moderna, quando a deficiência passa a ser vista como doença, que surge o pensamento de uma educação voltada para os indivíduos com deficiência, e, como se sabe, de lá pra cá, tímidos avanços começam a surgir. Resistimos à inclusão escolar porque ela nos faz lembrar que temos uma dívida a saldar em relação aos alunos que excluímos, por motivos muitas vezes banais e inconsistentes, apoiados por uma organização pedagógica escolar que se destina a alunos ideais, padronizados por uma concepção de normalidade e de deficiência arbitrariamente definida. (MANTOAN et al, 2011, p.78). Há bem pouco tempo começamos a ouvir e falar sobre Educação Inclusiva. Ela nos remete a uma escola que aceita, que acolhe e convive com a diversidade de alunos e que sabe como incluí-los. Quando falamos de inclusão escolar, também falamos daqueles ditos “normais” a quem a escola exclui, entre eles, os que não aprendem, os que reprovam, os pobres, os que trabalham, os hiperativos e tantos outros. A cartilha publicada pela Promotoria Federal dos Direitos do Cidadão reitera nossa reflexão ao afirmar que 20 [...] a inclusão é um desafio que, ao ser devidamente enfrentado pela escola comum, provoca a melhoria da qualidade da educação Básica e Superior, pois, para que os alunos com e sem deficiência possam exercer o direito à educação em sua plenitude, é indispensável que essa escola aprimore suas práticas a fim de atender às diferenças. Esse aprimoramento é necessário, sob pena de os alunos passarem pela experiência educacional sem tirar dela proveito desejável, tendo comprometido um tempo que é valioso e irreversível em sua vida: o momento do desenvolvimento. A transformação da escola não é, portanto, uma mera exigência da inclusão escolar da pessoa com deficiência e/ou dificuldades de aprendizado. Assim sendo, ela deve ser encarada como um compromisso inadiável das escolas, que terá a inclusão como consequência. (BRASIL, 2004, p.30) Pode-se perceber que o perfil da escola de qualidade voltada para todos os tipos de aluno, tem as mesmas características necessárias para uma escola inclusiva e que o modelo da escola atual está longe de preenchê-lo. Mas afinal, por que isso ainda acontece? Segundo Santos (2006) talvez isso ocorra porque a escola ainda teima em não enxergar as diferenças ao continuar trabalhando com um padrão único. Ao adotar essa postura, continua sendo de alguns e não de todos, como se vê ao longo da história da educação apresentada no pequeno resgate que segue. A partir dos escritos de Aranha (2006), na Antiguidade Oriental, temos uma educação tradicional e com um dualismo escolar, que destina um tipo de ensino para o povo e outro para os filhos dos funcionários, sendo a grande massa excluída da escola e restringida à educação familiar informal. Na Antiguidade Grega, a educação era centrada constantemente na formação integral do corpo e espírito. Quando ainda não existia a escrita, a educação era ministrada pela própria família, seguindo a tradição religiosa. Com o advento das póleis começam a surgir as primeiras escolas. Já na Idade Média temos a formação do homem pela fé, pois os parâmetros da educação se fundavam na concepção do mesmo, como criatura divina. Quanto às técnicas de ensinar, a maneira de pensar rigorosa e formal, determinava o trabalho escolar. Com o Renascimento surgem os colégios, do século XVI até XVIII, e a função da escola, além da transmissão do conhecimento, também se dá com a preocupação com a formação moral, numa sociedade que se mantém fortemente hierarquizada, excluindo da 21 escola a maioria da população, com exceção dos reformadores protestantes, com interesses religiosos. Enquanto isso no Brasil, com os missionários, a educação assume papel de agente colonizador. Com a Idade Moderna, temos a pedagogia realista com as escolas ainda ministrando um ensino conservador e grande parte com orientação jesuítica. Aqui começa a escola tradicional. Desde o século XVII, nota-se a falta de interesse pela educação básica, tendo grande parte da população iletrada, fato que pode ser justificado pelo tipo de sociedade da época, agrária e escravista. Com o Iluminismo, percebe-se um esforço para tornar a escola leiga e como função do Estado. Embora houvesse projetos de estender a educação a todos os cidadãos, prevalecia uma escola para o povo e outra para a burguesia, fato aceito sem o temor de ferir o preceito de igualdade, pois para a doutrina liberal, talento e capacidade, assim como a riqueza, não são iguais entre os indivíduos. Já não seriam indícios da exclusão na escola? No cenário brasileiro, durante o período do Brasil Colônia, tem-se agravado o ensino já precário assim como o analfabetismo com a expulsão dos jesuítas e a reforma pombalina. Com a chegada do século XIX, nota-se uma preocupação maior do Estado na busca de estabelecer uma escola gratuita, obrigatória e leiga. Ocorre a associação educação/progresso, resultando no grande interesse pelo ensino técnico e a expansão das disciplinas científicas. Nomes de grandes pedagogos se destacam no cenário educacional, entre eles Pestalozzi, Froebel e Herbart. A pedagogia do século XX acentua ainda mais a necessidade da inclusão da cultura científica no conteúdo a ser estudado nas escolas. A teoria da educação deixa de ser feita somente com uma visão filosófica, sofrendo influência, a partir de então, da sociologia, com destaque para Durkheim, da psicologia com Watson e Skinner, Gestalt, Dewey com a visão da escola progressista. Além desses, também temos representantes da escola nova com grandes contribuições para educação, entre os quais Gramsci, Snyders, Carl Rogers, até chegarmos às 22 teorias construtivistas, com pensadores que ainda hoje embasam a prática pedagógica de educadores, com destaque para Piaget e Vygotsky. No contexto do Brasil do século XX, surge o pensamento liberal democrático, que defende a escola pública para todos, como possibilidade de se ter uma sociedade igualitária, sem privilégios. Paulo Freire surge, defendendo uma relação dialógica na educação como caminho para se superar uma escola excludente, a repetência e a evasão escolar, uma vez que ainda persiste a grande defasagem entre a educação brasileira e a dos países desenvolvidos, com um ensino fundamental que deixa a desejar em termos de qualidade. Assim, adentramos no terceiro milênio, com uma avalanche tecnológica que invade todos os espaços, inclusive o escolar e que impõe a necessidade de uma educação permanente e de qualidade, com acesso ao grande fluxo de informações. Então, diante desse contexto, ficamos a nos perguntar- o que pode e deve a escola fazer, para não mais perpetuar a definição de aluno ideal e assim garantir o acesso de todos a esse novo cenário, sem discriminação? As políticas oficiais em nosso país reconhecem o processo de inclusão como uma ação educacional que tem por meta possibilitar o ensino de acordo com as necessidades do indivíduo, assim como documentos como o relatório criado pela Comissão Internacional de Educação e apresentado pela Unesco (2003), cujo objetivo maior é estabelecer metas para o século XXI, aponta para a importância das quatro diretrizes, ou seja, os pilares - aprender a conhecer, aprender a fazer, aprender a viver juntos e aprender a ser, como metas a serem desenvolvidas pela educação. Os quatro pilares da educação deveriam obter igual atenção no contexto escolar, porém, o que se percebe é um ensino focado no aprender a conhecer e aprender a fazer. O aprender a conhecer objetiva não só a aquisição de conhecimentos, mas também a mobilização de instrumentos para sua obtenção, enquanto o aprender a fazer não pode ser visto como algo a parte do conhecer. Trata-se de o aluno colocar em prática o que aprendeu, o que se torna tarefa difícil ao professor, quando o mesmo depara-se em sala de aula, com alunos com deficiência, pois não teve uma formação que o preparasse para lidar com a diversidade. 23 Delors (2003) aponta para o grande desafio das escolas referente aos dois últimos pilares, aprender a viver juntos e conviver com a diversidade. Segundo o autor, aprender a ser está relacionado a poder desenvolver plenamente sua personalidade, a agir com autonomia, discernimento e responsabilidade. Diante desse grande desafio, torna-se interessante relembrar o que aponta os Parâmetros Curriculares Nacionais – PCN, em relação à ação educativa e à diversidade. Respeitar as diferenças e não convertê-las em desigualdades deve ser o propósito da escola. As diferenças não estabelecem obstáculos para o cumprimento da ação educativa: podem e devem ser fator de enriquecimento. Trata-se de garantir um equilíbrio entre a diversidade dos alunos e o cumprimento do currículo, diversificando a intervenção pedagógica, estabelecendo medidas que atendam as necessidades individuais, de modo a criar condições adequadas ao processo de todos os alunos. (PCN, 1996, p.13) Como vemos, é a escola que deve se adequar ao aluno e não o contrário. Visto dessa maneira, a atenção à diversidade precisa estar focalizada no direito de acesso à escola, na melhoria da qualidade de ensino e aprendizagem para todos, irrestritamente, bem como as perspectivas de desenvolvimento e socialização. Torna-se necessário a tomada de medidas que levem em conta não só as capacidades intelectuais e os conhecimentos dos alunos, mas também seus interesses e motivações, tal como a realização de adequações curriculares que possam atender as necessidades particulares de aprendizagem dos alunos. Trata-se, portanto, de se constituir uma real escola para todos, que dê conta das especificidades, tendo o projeto pedagógico como ponto de referência para definir a prática escolar e orientar a operacionalização do currículo, em busca do desenvolvimento dos alunos, levando em consideração os seguintes aspectos: (BRASÍLIA, 2006, p. 60) 1. A atitude favorável da escola para diversificar e flexibilizar o processo de ensino – aprendizagem, de modo a atender às diferenças individuais dos alunos. 2. A identificação das necessidades educacionais especiais para justificar a priorização de recursos e meios favoráveis à sua educação. 3. A adoção de currículos abertos e propostas curriculares diversificadas, em lugar de uma concepção uniforme e homogeneizadora de currículo. 4. A flexibilidade quanto à organização e ao funcionamento da escola, para atender à demanda diversificada dos alunos. 5. A possibilidade de incluir professores especializados, serviços de apoio e outros, não convencionais, para favorecer o processo educacional. 24 As adequações curriculares passam a ser consideradas, então, possibilidades educacionais de atuação frente às dificuldades de aprendizagem dos alunos. Não se trata de um novo currículo, como muitos ainda pensam, mas um currículo dinâmico, possível de ampliação apropriado às peculiaridades de cada aluno e que se dá nas relações. Para os pensadores humanistas “o ser aprende por um processo de troca permanente mediado pelas relações que respeitam o seu tempo de maturação, o seu desenvolvimento e as suas possibilidades de aprendizagem” (SANCHES, 2005, p.75). Como se vê, estamos num momento que exige uma reconstrução do retrato da escola, ressignificação do ensino, da aprendizagem, da formação de professores, dos processos avaliativos, das promoções, dos currículos. Como afirma Sanches (2005), essa reconstrução do retrato é o mergulho na proposta de mudança da escola, algo possível de tornar-se sonho e, quando sonhada coletivamente, tem grande possibilidade de tornar-se realidade. 2.2 A escola e a diferença Quando falamos de igualdade na escola, estamos falando do direito de todos à educação, bem como nas modificações de funcionamento da mesma para a inclusão de todos os alunos, independente de seu talento, origem socioeconômica, cultural e deficiência. Isso demanda revisão de conceitos e a adoção de outros, tão necessários para que a inclusão não seja vista como mais um “modismo” ou uma exigência legal para as escolas. Estamos falando do acolhimento às diferenças! Afinal, vivemos numa mesma sociedade, “temos tantas coisas em comum, particularidades e diferenças. Todos, sem distinção, nos aproximamos em alguns aspectos e nos distanciamos em outros” (BEYER, 2010, p.35) e, “em geral, a posição socialmente aceita e pedagogicamente recomendada é de respeito e tolerância para com a diversidade e a diferença” (SILVA apud JULIANI, 2010, p. 3). Porém, segundo o mesmo autor, não podemos falar de diferença sem mencionar a identidade, pois ambas são inseparáveis, estando em uma relação de estreita dependência. As afirmações sobre diferença só fazem sentido se compreendidas em sua relação com as 25 afirmações sobre a identidade e vice-versa. Isso se confirma na nossa tendência a tomar aquilo que somos como sendo a norma pela qual descrevemos ou avaliamos aquilo que não somos. Identidade e diferença são criações sociais e culturais assim como são o resultado de criações linguísticas, pois é apenas por meio de atos de fala que as instituímos como tais. Como uma relação social, identidade e diferença têm sua definição tanto discursiva como linguística, sujeitas a relações de poder, que se manifesta em atos como incluir/excluir, classificar, normalizar, entre outros tantos que adotamos no dia a dia. O processo de classificação é central na vida social. Ele pode ser entendido como um ato de significação pela qual dividimos e ordenamos o mundo social em grupos, em classes. A identidade e a diferença estão estreitamente relacionadas à forma pelas quais a sociedade produz e utiliza classificações. As classificações são sempre feitas a partir do ponto de vista da identidade. Isto é, as classes nas quais o mundo social é dividido não são simples agrupamentos simétricos. Dividir e classificar significa, neste caso, também hierarquizar. Deter o privilégio de classificar significa também de deter o privilégio de atribuir diferentes valores aos grupos assim classificados (SILVA apud JULIANI, 2010, p.5). Ao fixar uma determinada identidade como norma, as demais serão avaliadas e hierarquizadas tendo esta, como parâmetro. Numa sociedade em que a identidade torna-se cada vez mais descentrada, descobrindo a diferença e o outro, passamos a ter um problema não só social, mas ao mesmo tempo pedagógico e curricular, uma vez que a convivência com o diferente é inevitável e muitas vezes, quando ignorado ou reprimido, surge em meio a conflitos e hostilidades. Este outro está (se manifesta) no gênero, na cor diferente, na opção sexual, na outra nacionalidade, no corpo diferente. Segundo Silva, os alunos deveriam ser estimulados pela escola, a questionar o contexto em que se dão as diferenças, afirmando que [...] uma política pedagógica e curricular da identidade e da diferença tem a obrigação de ir além das benevolentes declarações de boa vontade para com a diferença. “Ela tem que colocar no seu centro uma teoria que permita não simplesmente reconhecer e celebrar a diferença e a identidade, mas questioná-las” (apud JULIANI, 2010, p. 10). Quando há respeito à diferença, abre-se a possibilidade para que o outro seja como eu não sou, para que o outro possa ser si mesmo. No contexto escolar, mais do que nunca, [...] educar significa introduzir a cunha da diferença em um mundo que sem ela se limitaria a reproduzir o mesmo e o idêntico, um mundo parado, um mundo morto. É nessa possibilidade de abertura para um outro mundo que podemos pensar na pedagogia como diferença (SILVA, apud JULIANI, 2010, p. 10). 26 É possível trilhar nossos caminhos para uma nova escola, se contarmos com uma educação humanizadora. Trata-se de um novo olhar sobre o ensinar e o aprender, que se traduz na responsabilidade de fazer parte da construção do indivíduo a partir do respeito, do exercício da razão, da conquista de espaços sociais, evoluindo com a construção de um novo modelo de homem, considerando os valores éticos, morais e sociais como necessidades vitais. Visto assim, antes de apontar as dificuldades de aprendizagem, torna-se necessário ao educador conhecer o contexto e os processos de desenvolvimento do ser humano e as interferências na sua história de vida, uma vez que a história de formação do educador brasileiro se deu a partir da reprodução de modelos, sem espaço para a reflexão e a criticidade sobre o seu fazer. Quando esta reflexão acontece, percebe-se a escola como um espaço humanizante onde o educador, com respeito e ética, buscará novas formas para reverter as dificuldades de aprendizagem do educando, inovando com projetos, métodos, avaliações e didáticas adequadas e que produzam significado ao ato de aprender, contemplando as distintas capacidades e a individualização dos sujeitos, suas necessidades e possibilidades. Contudo, não podemos ter uma visão ingênua, afinal, não é uma imposição legal que garantirá que as experiências de inclusão escolar tenham sucesso. Para que isso aconteça, deve haver uma tomada de consciência e a participação no processo, de todos os sujeitos envolvidos, pais, crianças, educadores, equipe diretiva. Agindo assim, “o educador não será um obstáculo no caminho do educando, mas a solução” (SANCHES, 2005, p. 20). 2.3 A escola e os sujeitos que nela operam Esta sequência do trabalho está organizada levando em consideração os dados levantados das entrevistas com educadores de uma escola particular conforme citado anteriormente. Gostaríamos de salientar que nossa opção em relação aos educadores entrevistados, constando de regentes, monitor e coordenador pedagógico com atuação junto à alunos da Educação Infantil e Ensino Fundamental, entre estes, os que possuem deficiências, se deve ao 27 fato de acreditarmos que todos, independentemente da função que desempenham carregam uma história feita de caminhos e objetivos comuns ao mesmo ofício. A partir das histórias de vida desses educadores, temos a oportunidade de nos aproximar de seus imaginários e assim, conhecer os significados e sentidos construídos sobre docência, suas escolhas e sua formação. Trata-se de um espaço para manifesto de suas inquietações e incertezas. Elaboramos então, uma entrevista semi-estruturada formada pelas perguntas abaixo relacionadas, tomando como embasamento a pesquisa realizada pelo GEPEI- Grupo de Estudos e Pesquisa em Integração/Inclusão Escolar, UFRGS, no ano de 2003: Quem sou eu? Como se deu minha escolha profissional? Qual foi meu primeiro contato com a ideia de educação inclusiva? Como reagi? Como avalio minha condição pessoal/profissional (experiência, formação,...) para uma atuação na educação inclusiva? Quais aspectos aponto como necessários para viabilizar a educação inclusiva no contexto da escola? Torna-se um exercício interessante perceber a reação dos sujeitos quando desafiados a mergulhar em seus imaginários1 e falar de si próprios. Muitos manifestam ser algo difícil de fazê-lo. Talvez possamos encontrar uma possível resposta para tal reação, pois [...] o que pensamos que nos tornamos e o que pensamos saber sobre nós mesmos são perguntas que movimentam imaginários amorosos, sociais, culturais e políticos que habitam nossos projetos (PERES, 2010 p. 105). Ainda conforme a autora é desses lugares que fluem os conteúdos fermentadores de imaginários que vão definindo os contornos identitários da pessoa e do profissional. Seguem tópicos das respostas dos educadores às questões feitas, e logo após, uma análise à luz de referencial bibliográfico. Questão 1. Quem sou eu? 1 Na perspectiva da antropologia do imaginário, preconizada por Gastón Bachelard e Gilbert Durand, especialmente, pode-se dizer que o imaginário advém das intimações de toda ordem do vivido, sejam elas culturais, sociais, psíquicas ou de outros tipos. (Machado da Silva apud PERES, p.106, 2009) 28 uma pessoa que busca sempre alcançar os objetivos que se propõe e aprender a partir das vivências.(PROFESSORA, B) se define como alguém alegre, extrovertida e sentimental; valoriza muito a amizade, a família e a sinceridade.( PROFESSORA, M) cursando terceiro semestre de Pedagogia, pessoa tranquila e aberta à novas propostas e ideias.(MONITORA, C) Essas afirmativas apontam, na medida da vivência desses profissionais, o atravessamento de suas subjetividades e isto se reforça quando se acredita que a educação é permeada pelos valores/emoções de quem educa e é a partir do significado que é atribuído a essas experiências e da forma como o educador interioriza e compartilha esses significados ao longo de sua vida pessoal e profissional, que vai se constituindo sua identidade. Assim, enquanto narra sua história de vida, esse profissional tem a possibilidade de ir estabelecendo uma conexão coerente entre suas experiências e os acontecimentos que considera marcos importantes em sua vida. Ou seja, a partir de um conjunto de percepções, interesses, dúvidas e circunstâncias que influenciaram de forma significativa, o modo de ser e agir desse indivíduo. É preciso ver os professores não como seres abstratos ou essencialmente intelectuais, mas como seres emocionalmente sociais, com suas identidades pessoais e profissionais imersos numa vida grupal na qual partilham uma cultura, derivando seus conhecimentos, valores e atitudes dessas relações, com base nas representações constituídas nesses processos que é, ao mesmo tempo, social e intersubjetiva (GATTI apud SCOZ, 2011, p.47). Na educação isso se traduz na parte afetiva do ensino, à dimensão pessoal e subjetiva da profissão ligada à vida da sala de aula, à convivência com os colegas, e também aos momentos em que se encontra sozinho com reflexões sobre planejamento, metodologias, avaliações, e tudo o mais que envolve seu ofício. Assim, aos poucos poderão perceber que ao transmitir um currículo, eles próprios são fruto do currículo do curso da vida e dessa forma, explorar esses acontecimentos 29 estabelecendo relações entre sua vida pessoal e profissional, num eterno processo de formação. Questão 2. Como se deu minha escolha profissional? sempre gostou muito de criança, ainda mais em se tratando de alguém “diferente”; conta que em sua adolescência, gostava de conversar com um vizinho que possuía “algumas questões diferenciadas”. (PROFESSORA, M) menciona o seu desejo de conhecer e aprender; considera relevante na trajetória de vida o papel de quem ensina e aprende, aprende e ensina; sempre foi cobrada pelo pai para que aprendesse e, como não dispunha de tantos livros e cadernos, seu pai lhe dava “tabuinhas e latinhas” para que se alfabetizasse. (COORDENADORA, J) seu processo de escolha se deu ainda menina a partir de um desejo interior, quando brincava de ser professora; a cada aperfeiçoamento escolar, esse desejo ia sendo reforçado. (PROFESSORA, B) Esses relatos dos educadores, alguns mais emocionados, nos fazem perceber o quanto remexer as gavetas dos guardados pode desencadear lembranças agradáveis e outras nem tanto, uma vez que podemos nos defrontar com sentimentos, emoções, sensibilidades, valores, visão de mundo e de ser humano que pulsam dentro de nós e que foram nos constituindo como vimos, a partir de imaginários e do reservatório do vivido. O imaginário como reservatório/motor, ao afirmar que [...] é reservatório porque agrega imagens, sentimentos, lembranças, fatos marcantes. É motor por impulsionar indivíduos e grupos a estruturar modos de viver ajustando os limites e as possibilidades para realização dos sonhos (MACHADO DA SILVA apud PERES, 2009, p. 104). Quando esse imaginário apresenta-se e representa-se à consciência, traz à tona imagens do vivido nas interações entre sujeito e meio, bem como os sistemas simbólicos de leitura construídos nessas interações. E, através de um mecanismo individual/ grupal, 30 sedimenta um modo de ver, de ser, de agir, de sentir aos estar no mundo. Além disso, possibilita o aprender e o ressignificar nosso mundo exterior, ilustrado no relato de educadores que desde sua infância, mesmo sem perceber, já sonhavam com a educação. Dessa forma podemos afirmar que se é através da imaginação que idealizamos o real, também é através deste que reinventamos o real. Sobre a relação da felicidade com uma existência significativa [...] a busca de significado reflete a presença de quatro necessidades principais: a existência de um projeto futuro que pretende ser alcançado, a presença de valores que orientam as decisões, a necessidade de um sentimento de eficácia pessoal e o desejo de auto-valorização. As pessoas que têm essas necessidades satisfeitas irão manifestar, provavelmente, um sentido em suas vidas e, previsivelmente, também irão sentir-se mais felizes que aquelas que não têm satisfeitas algumas necessidades (BAUMEISTER apud MARCHESI, p. 152, 2008). Dessa forma, um professor só poderá sentir-se bem e feliz em seu trabalho se gostar dele, se estiver satisfeito com ele, se encontrar sentido na educação dos estudantes. Ainda atenta às falas, dava-me conta da pluralidade de significados que a vivência escolar pode ter na vida de alguns educadores. Ir à escola pode estar envolto de expectativas e aspirações dos pais, podendo significar a experimentação do sucesso e do orgulho, ou até mesmo do fracasso, enfim, uma pluralidade de sentimentos. Da escola também carregamos valores, emoções, posturas e convicções. São marcas deixadas e que muitas vezes passam a ser determinantes no ser e fazer diário desses profissionais, assim como nas suas formas de aprender , ensinar, conhecer e conceber a educação. Por fim, trata-se de, ao realizar a escolha pela profissão docente, perceber o significado da educação. Educar é acreditar na possibilidade da perfeição humana, na capacidade inata de aprender e no desejo de saber que a anima; acreditar que há coisas (símbolos, técnicas, valores, memórias, fatos,...) que podem e merecem ser conhecidos, que nós homens podemos melhorar uns aos outros por meio do conhecimento. De todas essas crenças otimistas a gente pode muito descrer em privado, mas quando se tenta educar ou entender em que consiste a educação, não há outro remédio que aceitá-las. Com verdadeiro pessimismo é possível escrever contra a educação, mas o otimismo é imprescindível para estudá-la... e para exercê-la (SAVATER apud MARCHESI, 2008, p. 152). 31 Tornar-se professor é investir no futuro, é realizar um trabalho que convença o aluno de que, apesar das dificuldades, existe a possibilidade de um futuro diferente para ele. Questão 3. Qual foi meu primeiro contato com a ideia de educação inclusiva? Como reagi? foi com crianças com dificuldades de aprendizagem, durante a graduação e após, com a criação de uma escola onde atendia crianças com diferentes deficiências; considera a experiência como um grande desafio, algo fantástico para sua formação e que exigiu muito estudo, adaptações de materiais, entre outros. (PROFESSORA, M) tem familiares com múltiplas deficiências; sua primeira reação foi de colocar-se no lugar dos pais, sentindo pena; a medida que o acompanhava seu desenvolvimento, sentia-se comovida; a convite da filha que é psicóloga, fez visitas a APAES sendo que na época, diz não ter apostando no desenvolvimento daquelas crianças, não sabia como lidar, como qualificar o espaço/tempo daquelas crianças; hoje se depara com a realidade da inclusão na escola em que trabalha, fato que não acreditava que chegaria até então; sente-se mais tranquila, feliz devido as aprendizagens que já possui nesse sentido, além do apoio da escola, dos profissionais que atendem essas crianças.( COORDENADORA, J) Nesse tópico que tomo a partir desse questionamento, sinto o quanto surge nos educadores a necessidade de iniciar a reflexão a partir das emoções, por acreditar que o bemestar emocional é uma condição necessária para uma excelente prática educativa, principalmente se pensarmos num contexto educacional inclusivo, além de ser considerado fator relevante para a satisfação profissional dos educadores. Se no dia a dia, o trabalho docente está fundamentado nas relações interpessoais que se dão quer com os alunos, colegas, pais, ou outros envolvidos, pode-se afirmar que as experiências emocionais pelas quais passam os professores são permanentes, assim como os sentimentos que vivem podem ser mais ou menos intensos e com maior ou menor amplitude. 32 Porém, nos dias atuais sua importância parece ser ainda maior, uma vez que as mudanças ocorridas na sociedade e na família, as diferentes competências exigidas dos professores, a chegada na escola de novos grupos de alunos na busca por uma educação para todos, nos ajudam a compreender a grande carga emocional que envolve a tarefa de ensinar. O amor é constitutivo da vida humana, mas não é nada especial. O amor é o fundamento do social, mas nem toda convivência é social. O amor é a emoção que constitui o domínio de condutas em que se dá a operacionalidade da aceitação do outro como legítimo outro na convivência, e é esse modo de convivência que conotamos quando falamos do social. Por isso, digo que o amor é a emoção que funda o social. Sem a aceitação do outro na convivência, não há fenômeno social (MATURANA apud CUNHA, 2011, p. 131). Sendo o afeto um instrumento pedagógico, funciona como um agenciador da aprendizagem, ligando memória e cognição. Dessa forma, ao ser afetivo, o educador trabalha com as qualidades, as emoções, os interesses e os sonhos, que por sua vez são impulsionadores de ações. No entanto, é obvio que não basta amar para ser um bom educador, é preciso ir além. É justamente esse amor que impulsiona o estudo, a pesquisa, o trabalho, a responsabilidade e o interesse pelo ofício e que permite descobrir alternativas e instrumentos mediadores nos processos de ensino e aprendizagem. Se a influência das emoções também se dá na motivação, no esforço e na ação desenvolvida pelos professores, por que nem todos experimentam as mesmas emoções, existindo profundas diferenças? Convém lembrar, a esse respeito, que as emoções não são simplesmente experiências subjetivas associadas a mudanças fisiológicas, aliás, derivam da percepção que as pessoas possam ter de uma situação ou acontecimento em função das suas metas pessoais (MARCHESI, p.103, 2008). Ainda segundo o autor, as emoções supõem tendências de ação e estão diretamente relacionadas à competência profissional desse professor. Por essa razão, não são apenas essas, motivos que orientam o tipo e a profundidade dos sentimentos que esse professor irá viver, mas está em jogo sua disposição pessoal para a ação. No entanto, para compreendermos as emoções dos professores, precisamos ir além da sua individualidade, incluindo o contexto profissional, social e cultural em que cada um desenvolve seu trabalho. 33 Os professores só terão condições de favorecer o desenvolvimento emocional de seus estudantes buscando novas estratégias que lhe permitam enfrentar os conflitos que venham a surgir, se também cuidarem do seu próprio desenvolvimento emocional, sendo essa uma responsabilidade que deve ser compartilhada pela direção das escolas e pelos próprios docentes. Trata-se de sentirem-se compreendidos, apoiados, valorizados, incentivados em sua formação continuada. Só assim estarão melhor preparados para enfrentar, sem ansiedade, as mudanças educacionais. Questão 4. Como avalio minha condição pessoal/profissional (experiência, formação,...) para uma atuação na educação inclusiva? apesar de pensar que a inclusão é algo ainda novo para os educadores, entende que apesar de sua formação e experiência profissional lhe darem aporte para atuar na educação inclusiva, necessita estar sempre aprendendo. (PROFESSORA, M) considera ainda tímida e de muita aprendizagem, embora sua capacidade de busca; reconhece que ainda necessita de referenciais teóricos, revisão de paradigmas; embora já tenha lido muito, não sente-se preparada para uma atuação docente, não sabe se no dia a dia conseguiria incluir e acolher esses sujeitos no processo.( COORDENADORA, J) acredita que atuar na educação inclusiva torna-se um constante aprendizado, uma vez que cada criança é única, por mais que tenha um diagnóstico semelhante à outra; procura estar sempre lendo materiais com assuntos referentes a educação especial; na graduação, as disciplinas estão lhe ajudando; uma condição pessoal que considera muito importante para atuar é a emocional.(MONITORA, C) Nas respostas apresentadas revela-se a insegurança desses educadores e a preocupação por qualificar-se, por dominar saberes, métodos, novos conhecimentos para atender as exigências de uma educação inclusiva. 34 Porém, o ofício de educar vai além de reflexões, leituras ou domínio de teorias e métodos. Diante de tal colocação tornamos a discutir a questão da identidade na formação do professor [...] e os professores, ao agir de determinadas maneiras, revelam/escondem uma identidade complexa em que representações de conhecimentos, crenças, valores e atitudes se compõem integrando as vivências nas salas de aula e fora delas (GATTI apud SCOZ, p.55, 2011). Vista assim, a identidade passa a ter influência direta na maneira pela qual os educadores constroem diariamente a natureza de seu fazer, seja na motivação, satisfação ou competências. Ou seja, a experiência de cada um apresenta uma história e diferentes significações que são atualizadas no modo como exercem a construção e a produção dos seus saberes. Se voltarmos no tempo, veremos que em diferentes tempos e espaços, o homem busca a origem e a verdade das coisas utilizando-se do conhecimento e dos diferentes saberes. Assim também nós construímos e “marcamos” nossa relação no mundo, bem como experienciamos nossa subjetividade, que pari passu se apropria do que está fora e dentro de nós mesmos como novas demandas formadoras. Por isso, o fora e o dentro compõem a complexidade de viver e de estar no mundo. Perguntar e responder pressupõe a apreensão e a análise de um conhecimento imediato (por meio da percepção, do julgamento, da memória ou da imaginação) de um objeto relativamente simples, que por sua presença à consciência nos impulsionam sempre para fora e para frente de nós mesmos (PERES, 2009, p.113-114). Ainda segundo a autora, no perguntar e responder tem-se a possibilidade da transformação, que por sua vez, pode resultar de uma emergência interior ou ter sido provocada pelo meio ambiente. Mas ficamos a nos perguntar se realmente ao longo de uma formação continuada, temse a garantia de que vão se desconstruindo as visões primárias e preconceituosas que temos em relação aos indivíduos, como ao classificar uns como “inteligentes e outros não”, “os fracos”, os “preguiçosos”, os que “não dão para as exatas”, os “desatentos”, e tantas outras. Não estaria no acompanhamento dos complexos processos do aprender humano, o sentido da docência? 35 Para que isso de fato ocorra, em tempos de inclusão escolar, procura-se apontar alguns pontos considerados relevantes sobre o fazer docente, conforme Silveira (2010), esclarecendo que não se trata de “receita”, e sim contribuições que possam levar a uma reflexão sobre o mesmo. Ser capaz de reconhecer-se como uma pessoa com capacidade de renovação e de relacionar-se com o outro, refletindo sobre os seus saberes e seu fazer. Aprender a lidar com as incertezas do cotidiano. Ver no novo, no desafiador, possibilidade de construção de conhecimentos. Adquirir resistência aos embates da sala de aula, avaliando constantemente sua prática. Conhecer e respeitar a realidade e a diversidade dos sujeitos em formação. Compreender os sujeitos com sua subjetividade. Aprender a ouvir, a escutar, mostrando-se sensível ao imprevisível. Partilhar de uma visão ampla das questões sociais e suas relações com as situações do cotidiano, falar da ética, das lutas, das desigualdades. Enfim professor, [...] ponha em jogo suas representações (...) renuncie a seus próprios preconceitos, aceite ser desestabilizado, surpreendido, contradito, (é o adulto) que autoriza o aluno a se liberar do papel que lhe foi atribuído. A escola precisa ser um espaço aberto, um espaço de segurança em que o risco seja possível, o erro tolerado, as tentativas aceitas, sem gracejos, sem humilhações nem julgamentos definitivos. Não basta, contudo, atribuir um novo papel a um aluno. É preciso fornecer-lhe os recursos necessários para pôr em prática suas tentativas, ajudando-o a adquirir os saberes e as habilidades sem os quais fracassaria. É preciso dar-lhe o direito de escrever (a sua história) por si mesmo (BAPTISTA, apud LIMA, 2011, p.33). Ao relembrar que “o máximo que um aluno pode dar está dentro do máximo que um educador pode dar” (SANCHES, 2005, p.27), tem-se clareza de que acreditar na esperança é acreditar na transformação, no ser humano e em todas as suas possibilidades. Questão 5. Quais aspectos aponto como necessários para viabilizar a educação inclusiva no contexto da escola? 36 considera essencial a compreensão por parte da comunidade escolar; um planejamento flexível; o número reduzido de alunos na turma; profissionais competentes e comprometidos com a inclusão. (PROFESSORA, B) considera como mais importante o compromisso ético, cristão e responsável dos gestores em acolher e viabilizar uma educação inclusiva de qualidade; cita também o conhecimento da legislação; priorizar o afeto a superação; acreditar nesse indivíduo e na busca da construção de sua autonomia. (COORDENADORA, J) aponta a vontade, a disponibilidade e a aceitação por parte do professor; observar o aluno, pois o mesmo vai dando os rumos por onde o professor deve caminhar; parceria entre os pais e a escola. (MONITORA, C) Este último aspecto abordado traz à tona com a fala desses educadores a necessidade de se pensar a educação inclusiva, não somente como responsabilidade dos mesmos, mas como compromisso assumido por toda a comunidade escolar. Contudo, conforme Mosquera et al (2006) mesmo sabedores de que a inclusão é uma possibilidade que se abre para crescimento e mudanças no contexto escolar com benefícios estendidos aos alunos com e sem deficiência, ela necessita de uma disponibilidade interna para vivenciar as mudanças, algo que não é comum tanto aos educadores como vimos anteriormente, tão quanto aos sistemas educacionais. Isso acontece porque [...] o que entendemos por educação abrange nossa representação imaginária acerca do professor, do aluno e da escola, bem como dos papéis que atribuímos como “naturais” a cada um desses “personagens” do processo educativo. Na verdade, vivemos numa sociedade em que são, constantemente, “inventadas”, “forjadas” e criadas novas necessidades a cada dia que passa. (CASTORIAIDS apud TROMBETTA, 2010, slide 25). 37 Ainda, segundo a autora, é com base nesse dinamismo dialético entre o que está posto (imaginário instituído) e o que pode vir a ser (imaginário instituinte) que há a possibilidade de criação do novo. Essa criação parte do que já existe, pois é histórica e parte do real. Talvez resida aí o maior desafio a ser enfrentado pelas escolas na busca por uma educação inclusiva [...] elas não foram concebidas para atender à diversidade dos alunos e têm uma estrutura rígida e seletiva, no que diz respeito à aceitação e à permanência de alunos que não preenchem as expectativas acadêmicas clássicas, centradas na instrução e na reprodução de conteúdos curriculares (MOSQUERA et al, 2006, p. 29). Se pararmos para pensar, a própria formação do professor, da graduação estendendose a formação continuada, é impregnada dessa visão, pois obedece a esse modo tradicional de ensinar esperando que o aluno lhe devolva passivamente o que lhe foi ensinado. Isso acontece porque, como vimos acima, há uma idealização de professor e de aluno onde a diferença não tem vez, é ignorada. Porém, diante do exposto, faz-se necessário esclarecer que [...] adaptar o ensino para alguns alunos de uma turma de escola comum não conduz e não condiz com a transformação pedagógica dessas escolas, exigida pela inclusão. A inclusão implica uma mudança de paradigma educacional, que gera uma reorganização das práticas escolares: planejamentos, formação de turmas, currículo, avaliação, gestão do processo educativo (MANTOAN, 2011, p.37). Alguns estudiosos da inclusão defendem a ideia de que ao adequar ou selecionar antecipadamente as atividades para determinado aluno, o professor passa a adotar uma postura controladora em relação à aprendizagem, desconsiderando a potencialidade desse indivíduo para a aprendizagem, assim como o faz quando facilita tarefas e adapta currículos e avaliações. É impossível para qualquer pessoa antever o que a outra é capaz de realizar, e diante disso, é preciso confiar e acreditar na capacidade desse outro. Ainda dentro do aspecto da diversidade, há de se fazer uma ressalva já que nossa experiência como educadora revela que também muitos pais/famílias ainda demonstram ter dificuldade e preconceito diante da diversidade, com atitudes de intolerância frente ao diferente e na insistência em cobrar da escola, dos educadores e dos próprios alunos, a 38 continuidade de um modelo de ensino tradicional, competitivo, homogeneizado, impedindo a todos poder reconhecer a riqueza oriunda das diferenças no processo educativo. Conforme Arroyo (2000), precisamos de uma postura humana, pedagógica. É preciso deixar de tratar os saberes humanos como apenas conteúdos, conhecimentos de uma disciplina, como precondição para passar de série. É preciso deixar de ter o foco somente na aprendizagem e começar a pensar nos problemas de ensino e no que deve ser mudado para que se ofereçam oportunidades diferentes de aprender. Dessa forma, assim como a sustentação de um projeto escolar inclusivo precisa ser idealizada e executada por todos os envolvidos na comunidade escolar, torna-se interessante também conhecer as diretrizes que regem o funcionamento da escola, como se dá o trabalho em equipe, como são resolvidos os conflitos, ajuda e apoio aos professores e a formação continuada para todos os integrantes da comunidade escolar, formas de comunicação com as famílias, soluções para a remoção de barreiras para a aprendizagem e participação de todos, entre tantos outros aspectos aqui não citados e que podem ser de fato norteadores de mudanças na escola. Enfim, os novos tempos na educação nos dão sinais de humanização, porém não nos dão certeza alguma! Todo o ofício passa a ser uma arte reinventada que supõe sensibilidade, intuição, sintonia com a vida e com o humano. Em educação o que importa conforme Ribeiro, é que [...] planta-se e não se sabe quando e onde colher. Em educação, não se marca tempo ou se estabelecem prazos, ainda que sejamos atormentados pelo imediatismo do resultado. Mas planta-se! Em educação acredita-se no que se faz, confia-se em seu projeto educativo e o leva em frente, com convicção própria dos que a escolheram como missão em suas vidas (RCE, 2010, p.19). Por fim, no espaço de escuta desses educadores, foi possível caminhar pelos territórios do imaginário e aprender a dialogar também com o que não se mostra, com o que fica silenciado, vislumbrando o que “o silêncio significa. [...] Ele passa pelas palavras (ORLANDI apud TROMBETTA, 2010, Slides 24). 39 CONSIDERAÇÕES FINAIS Iniciar a reflexão com breve levantamento histórico da deficiência, desde os primórdios até o Brasil de hoje, possibilita a compreensão das formas de exclusão adotadas pela sociedade ao longo dos tempos. Ou seja, refletir a história é compreender que todas as atitudes de uma sociedade são produtos culturais que atendem as necessidades dos homens num determinado contexto ou época e não mais vê-las como espontaneamente naturais. Na história da humanidade os diferentes sempre foram vítimas da segregação, dada à ênfase voltada para sua incapacidade física e para sua anormalidade, mostrando-nos uma trajetória humana marcada pela exclusão. A partir da criação de programas, convenções, decretos e leis, vê-se elaborada a Política Nacional de Educação Inclusiva (2008), com a definição de como deve ser oferecida a educação para todos os que possuem deficiência. Com tudo isso, fica claro que não podemos ignorar o longo processo histórico em que foi produzida a inclusão, com a luta constante de diferentes minorias, na árdua busca pela defesa e garantia de seus direitos enquanto seres humanos e cidadãos. Tampouco, não ignoramos o fato do quanto, normas e leis foram criadas para sustentar um sujeito que apenas é diferente e que se busca na norma a eficácia e garantia do respeito à diferença. Em se falando em inclusão, trata-se de algo bem maior, a necessidade de um compromisso de toda a sociedade para um repensar a inclusão como ação humana e social, afinal, “as pessoas com deficiência não têm de pedir licença ou permissão para ser incluídas. Têm apenas de ocupar seu lugar no universo humano de que fazem parte” (RAMOS, 2011, p.118). Atualmente, a grande questão em discussão é a inclusão escolar, cujo objetivo é incluir os indivíduos anteriormente excluídos, tendo o desafio de não deixar ninguém fora da escola regular, como determinam as leis. 40 Embora já sabido que trabalhar com a diversidade acolhendo a diferença pode trazer inúmeros benefícios ao desenvolvimento das crianças com deficiências e para as não deficientes, na medida em que possam vivenciar a importância da cooperação nas relações humanas, o como incluir tem se mostrado a maior preocupação dos educadores, pais e estudiosos da área. Como já mencionado anteriormente, para que se efetive de fato uma prática educacional inclusiva, não basta a garantia legal e a presença física dos sujeitos na classe regular, trata-se de um desafio que compromete a comunidade escolar como um todo e que pressupõe uma mudança de estruturas, de atitudes dos envolvidos e principalmente, do trabalho desenvolvido pelos educadores. Preparar-se para dar conta e trabalhar com esses indivíduos, acolhendo suas diferenças e características individuais, significa também, a escola perceber as razões sociais, culturais, familiares e pessoais que determinam essas diferenças, o que vai além da mera função que desenvolve até então, de transmissão de conhecimentos. Contudo, mesmo sabedora do quanto esse desafio exige, tímidos são os avanços percebidos para que a escola seja local inclusivo de ensino e de aprendizagem. Ainda temos uma estrutura escolar impregnada de ranços e modelos considerados arcaicos para a realidade educacional que se vislumbra na atualidade, que vai desde um modelo ideal de educador a um modelo de aluno ideal que cada educador elaborou a partir da sua própria trajetória como estudante e profissional, passando por um sistema de avaliação excludente e que não considera as potencialidades e principalmente as singularidades dos sujeitos envolvidos. Segundo Scoz (2011), a eliminação da singularização faz com que tanto educadores quanto alunos sejam percebidos como elementos padronizados, ou seja, possíveis de serem classificados num determinado padrão de referência, por conseguinte “a resistência dos professores à inclusão escolar tem sido o despreparo para ensinar a turma toda, sem discriminações, ensino adaptado, diferenciado, nas salas das escolas comuns” (MANTOAN, 2011, p. 13). Ou seja, é necessário abrir mão dos conhecimentos já adquiridos, abandonar velhos métodos e rever experiências acumuladas para se reconstruir uma pedagogia que vê na diversidade a possibilidade de novas formas de organizar o contexto escolar. Do contrário, 41 nenhuma ação, seja ela pedagógica ou legal e que não considere o respeito às diferenças, pode ser chamada de inclusão. Sob esse ponto de vista torna-se necessário o compromisso dos gestores e dos próprios educadores para com uma formação pessoal, sendo que nessa, deve encontrar-se também imbricada a subjetividade, a identidade e o significado da escolha profissional dos envolvidos. Isso significa considerar o educador como sujeito impregnado de crenças, valores e expectativas e que vai, a partir desses, produzindo sentidos em relação aos processos de aprender e ensinar e na sua atuação profissional. A subjetividade e identidade podem ser compreendidas como algo em construção, com base nos sentidos que os sujeitos vão produzindo na condição singular em que se encontram inseridos em suas trajetórias de vida e, ao mesmo tempo, em suas diferentes atividades e formas de relação. Assim, são o resultado de complexas sínteses das experiências individuais dos sujeitos em diferentes contextos de expressão (SCOZ, 2011, p. 29). As emoções também podem ser vistas como produzidas nesses diferentes momentos e espaços da vida desses educadores, em situações de ensino e aprendizagem. Elas podem estar manifestadas nos momentos de segurança ou insegurança, interesse ou desinteresse, entusiasmo ou desilusão, mostrando que o aspecto afetivo interfere na prática docente. Ignorar tal aspecto significa negar a possibilidade de transformação das ações docentes, principalmente numa educação inclusiva. É na experiência de conviver com a diversidade, alicerçada no respeito, na ética e na solidariedade, que se vislumbra uma preocupação com o futuro da humanidade, com gerações que respeitem e acolham o seu próximo e onde todos possam viver a plenitude da cidadania. Essa pode ser a realidade de todas as escolas! 42 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ARANHA, Maria Lúcia de Arruda. História da Educação e da Pedagogia: geral e Brasil. São Paulo: Moderna, 2006. ARANHA, Maria Salete Fábio. 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