O DIÁLOGO SOCIAL NAS AMÉRICAS (*)

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DÉCIMA PRIMEIRA CONFERÊNCIA INTERAMERICANA
DE MINISTROS DO TRABALHO
20 – 21 outubro 1998
Viña del Mar, Chile
OEA/Ser.K/XII.10.1
TRABAJO/doc.8/98
14 outubro 1998
Original: espanhol
O DIÁLOGO SOCIAL NAS AMÉRICAS (*)
Estudo da Doutora Ana Sofía Cardenal, Consultora do
Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID)

As opiniões aqui expressas não são necessariamente as da OEA e dos seus Estados membros.
RESUMO EXECUTIVO
- Diversos fatores contribuíram para a escassa tradição de diálogo social na América Latina.
Destacam-se entre eles um ambiente institucional pouco adequado, caracterizado pela intervenção
estatal nas relações trabalhistas, o legalismo e o centralismo nas negociações, a debilidade dos atores
sociais e a instabilidade político-institucional.
- A atual convergência de diversos processos torna muito necessário o diálogo social. A
democratização, a aplicação de políticas de ajustamento, a integração econômica e a globalização e
as mudanças na estrutura e na organização do trabalho aconselham a criação de mecanismos que
tornem possíveis e sustentem as iniciativas de diálogo social.
- Ligada à falta de tradição de diálogo social, destaca-se na região outra característica: a fraqueza dos
sistemas formas de relações trabalhistas. Em geral, não existe na América Latina uma tradução de
relações ordenadas e permanentes entre as partes. Os órgãos consultivos, quando existem, tendem a
ser pouco ativos ou a cair no desuso. A negociação tríplice é de caráter esporádico e os acordos
freqüentemente encerram uma carga retórica que impede o logro de resultados concretos.
- Apesar disso, registraram-se nos últimos anos, graças ao impulso dos processos de transição para a
democracia, algumas experiências relevantes de concertação e diálogo social que merecem ser
destacadas. Incluem-se neste estudo as experiências do Chile, México, República Dominicana,
Uruguai e Argentina, dada a coincidência, em todos estes casos, de experiências de concertação e
diálogo social ilustrativas – algumas delas muito significativas – com a disponibilidade de
informação.
- Em todos os países, as mudanças de organização da produção e do trabalho estão afetando a
tradicional estrutura das relações trabalhistas e seus atores. Na América Latina, a globalização e os
processo de integração econômica estão exercendo efeitos ainda mais desestabilizadores sobre o
sistema de relações trabalhistas, devido não só à fraqueza dos sistemas formais dessas relações,
como também, e principalmente, a outros fator que reduz a sua eficácia: o crescimento do setor
informal. Este crescimento faz com que um setor cada vez mais importante da população e do
eleitorado (até 50%) n 50%) esteja a descoberto desses mecanismos de negociação formal e dos
benefícios dela decorrentes.
- Até agora, as formas de intervenção pública no setor informal têm-se orientado para a eliminação
dos obstáculos ao acesso desse setor a recursos e a mercados. Contudo, a necessidade de atacar com
êxito os problemas do setor informal exige a aplicação de políticas e medidas que contemplem a sua
participação direta no desenho, na implementação e na avaliação dos programas que lhe dizem
respeito. Para tanto, é necessário adotar medidas e políticas que promovam a auto-organização do
setor e conceber mecanismos específicos de diálogo e negociação com o mesmo.
- Finalmente, condições que favoreçam o diálogo social exigem a autonomia das forças sociais,
organizações representativas e bem coordenadas, a busca de fórmulas ou modelos de relações
trabalhistas que reduzam efetivamente a intervenção do Estado e a excessiva centralização das
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negociações, a simplificação das leis, transparência nas regras de jogo do diálogo, a criação e o
fortalecimento de mecanismos e órgãos de controle e uma atenção aos procedimentos.
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ANTECEDENTES
Na X Conferência Interamericana de Ministros do Trabalho, “Emprego e integração econômica”,
realizada em Buenos Aires, de 1 a 3 de outubro de 1995, os ministros do trabalho aprovaram a
Declaração de Buenos Aires e um Plano de Ação, para cuja implementação estabeleceram quatro
grupos de trabalho no nível ministerial, que foram incumbidos de temas específicos. A primeira
reunião do Grupo de Trabalho II, “Diálogo social e negociação coletiva nas Américas”, realizou-se
em Santafé de Bogotá, de 30 de setembro a 3 de outubro de 1996. Nessa reunião, o Grupo de
Trabalho estabeleceu seus objetivos e sua agenda e preparou algumas conclusões e recomendações
preliminares.
Como objetivos do Grupo de Trabalho, estabelecidos no Plano de Ação de Buenos Aires, incluíamse os seguintes:
- Diálogo Social
Na sociedade atual, a participação dos atores sociais, o diálogo social, a participação tríplice,
o acordo e a concertação entre os fatores de produção constituem os mecanismos mais adequados
para assegurar a institucionalidade trabalhista, evitar confrontações e fazer com que o
desenvolvimento beneficie todos os setores da sociedade. É essencial reconhecer “a responsabilidade
conjunta dos setores sindical, empresarial, governamental e outros, representantes da sociedade civil,
tanto no êxito como no malogro de tais políticas econômicas, comerciais e trabalhistas. Não obstante
essas obrigações, que são a contrapartida da participação da participação, o Estado mantém a
responsabilidade própria de adotar as decisões e realizar as ações necessárias para garantir o bem
comum.
- Os Ministérios do Trabalho:
a) promoverão o diálogo com os trabalhadores e os empresários sobre os temas centrais na
esfera do trabalho: emprego, formação profissional, extensão da cobertura da negociação coletiva e
adequação das instituições representativas dos trabalhadores e dos empresários aos requisitos da
integração econômica e da modernização e, especialmente, aos seus efeitos sociais. Os resultados
deste diálogo deveriam traduzir-se em acordos, que seriam comunicados aos demais órgãos
governamentais de formulação de políticas.
b) Os Ministros criarão um grupo de trabalho para analisar os mecanismos que possibilitem
intensificar o diálogo social nos países do Hemisfério. Como passo inicial, esse grupo examinará as
fórmulas utilizadas na região com tal propósito, que servirão de guia na identificação das formas
mais eficazes para fazer avançar a concertação social nos nossos países.
Quanto à agenda, o Grupo de Trabalho aprovou a seguinte relação de temas:
Diálogo Social
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1.- Atualidade e conceptualização do diálogo social, a representação tríplice e a concertação nos
processos de abertura, modernização e globalização da economia.
2.- Aspectos gerais da experiências e fórmulas de diálogo social, representação tríplice e concertação
nas Américas.
3.- Uma nova cultura das relações trabalhistas como fundamento do diálogo social, da representação
tríplice e da concertação. Identificação de instrumentos e mecanismos para dar-lhes eficácia na
região. Fortalecimento dos atores sociais.
Negociação coletiva
1.- Novas modalidades e técnicas para a modernização da negociação coletiva. Sua influência sobre
o emprego.
2.- A negociação coletiva no contexto dos processos de abertura, modernização e globalização da
economia.
3.- A negociação coletiva e suas relações com o diálogo social, a representação tríplice e a
concertação nas Américas.
APRESENTAÇÃO E CONTEÚDO
Por motivo da XI Conferência Interamericana de Ministros do Trabalho, a realizar-se em Santiago,
Chile, de 19 a 21 de outubro, o presente estudo versa sobre alguns temas da agenda que o Grupo de
Trabalho sobre Diálogo Social e Negociação Coletiva estabeleceu em sua reunião da Colômbia.
Pretende-se, assim, apresentar um documento que sirva de base para a discussão e o debate em torno
do tema do diálogo social. Para tanto, este documento:
-Analisa e revisa as experiências de diálogo social desenvolvidas na região, com ênfase
especial nas que resultaram em reformas de políticas ou pactos sobre linhas de orientação em matéria
de aumentos de salários, estrutura de contratação coletiva e outros aspectos relativos ao
funcionamento de mercado de trabalho.
-Analisa a problemática que a informalidade – ou seja, a existência de mercados de trabalho
em que uma importante parcela da população se dedica a áreas não regulamentadas – representa para
a ação dos ministérios do trabalho; e, concretamente,
-Formula uma série de recomendações com base nas análises precedentes.
DEFINIÇÃO
O tratamento do diálogo social exige alguns esclarecimentos prévios sobre o seu conceito, a fim de
esclarecer harmonizar seu significado. Para não aumentar a dispersão, este estudo utiliza o esquema
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conceptual preparado pela OIT sobre a matéria e contido no relatório do COSATE para o Seminário
sobre Diálogo Social e Negociação Coletiva, realizado no contexto da Conferência de Buenos Aires,
em maio de 1996.e Buenos Aires, em maio de 1996. Nesse relatório, especifica-se que:
- La OIT utiliza os conceitos de cooperação tríplice, de relação tríplice ou, diretamente,
representação tríplice, para referir-se aos contatos mantidos entre governos, empregadores e
trabalhadores para tratar da formulação ou aplicação da política econômica e social.
- A representação tríplice pode desenvolver-se tanto no nível central ou nacional interprofissional
com em níveis inferiores, ou seja, o regional, o local ou, excepcionalmente, certos ramos de
atividade ou de algumas empresas que enfrentam graves problemas de adaptação, para cuja solução a
ajuda do governo é indispensável. Também existe a representação tríplice no plano internacional
mundial, como na OIT, e no regional (por exemplo, na União Européia).
- A representação tríplice também pode ter funções de natureza consultiva (por exemplo, os
conselhos econômicos e sociais) ou de verdadeira negociação, quando visa à obtenção de acordos
que vinculam as partes, embora não constituam contratos coletivos no sentido jurídico da expressão
(por exemplo, os pactos econômicos e sociais).
- Existem outras formas de representação tríplice, como as que têm uma função jurisdicional que
implica a presença de representantes de empregadores e trabalhadores em determinado órgão, e as
que implicam a adoção de decisões no âmbito de órgãos de participação tríplice como os conselhos
salariais ou os que gestionam os sistemas de seguro desemprego.
- Embora seja típico que a representação tríplice se exerça em órgãos oficiais para tanto criados por
lei ou por acordo entre as partes, a OIT também inclui no seu conceito todos os contratos não-oficiais
que impliquem relações mais ou menos oficiosas, estabelecidos de maneira ad hoc, no entendimento
de que a consulta e a negociação por essa via têm a mesma finalidade de influir na política dos
poderes públicos.
- Em contraste com esse conceitos, a OIT define a expressão “diálogo social” ou “concertação
tríplice” como a busca metódica e sistemática de acordo ou consenso a respeito dos grandes
problemas econômicos e sociais. Portanto, não designa uma forma jurídica particular de relações ou
de cooperação tríplice, e sim, uma qualidade que lhes é particular. A OIT não insiste quanto aos
meios jurídicos utilizados para esse fim.
- Quanto à relação entre esses conceitos – diálogo social e concertação tríplice – e a dupla
representação e sua extensão a outros componentes da sociedade civil organizada que não sejam
trabalhadores ou empresários propriamente ditos, a OIT considera que:
- a) a dupla representação não está abrangida por esses conceitos, ou seja, não pode ser considerada
como fora de diálogo social, mesmo em situações em que o governo participe com “interlocutor
invisível”.
- b) a participação de outras categorias de trabalhadores e de outros setores sociais está inserida no
diálogo social e na representação tríplice, mesmo quando modifique a fórmula original de três partes.
Isto confirma o princípio segundo o qual todas as categorias sociais que possam ser sensivelmente
afetadas pelas decisões de política econômica e social devem intervir nesse processo decisório.
Em resumo, pode-se afirmar que, de modo geral, é cabível considerar as formas de consulta e
negociação tríplice como inseridas no diálogo social, mas que este conceito admite formas de
contato e relação entre as partes mais flexíveis, não determinadas juridicamente e que contemplem,
de preferência: a) una agenda de discussão mais ampla, que possa incluir grandes temas econômicos
e sociais do país e b) a participação de diversas categorias de trabalhadores e de setores sociais mais
amplos.
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O DIÁLOGO SOCIAL NA AMÉRICA LATINA
Pode-se concluir, por várias razões, que existe pouca tradição social na América Latina:
- Isto se deve, em primeiro lugar, à tradicional intervenção do Estado nas relações trabalhistas. Essa
intervenção, assim como o seu corolário, o centralismo regulador, tem-se manifestado em dois
níveis: o individual, mediante a proteção que o Estado tem estendido diretamente aos trabalhadores
na legislação, e o coletivo, mediante o controle que tem exercido sobre as relações industriais e
trabalhistas (além de estabelecer o contexto regulador geral, o Estado procurou determinar o
funcionamento dos sindicatos, o nível dos salários e a solução de dissídios).
- Em segundo lugar, como conseqüência disto, os atores sociais e as organizações tradicionais –
sindicatos e empresários – caracterizaram-se ou sua escassa autonomia e por sua debilidade, o que
tampouco serviu para facilitar o diálogo social.
- Por último, as experiências de autoritarismo vividas pela região entre os anos 60 e 70 também não
ajudaram a desenvolver as condições para o diálogo social e a concertação. Tais experiências
implicaram um retrocesso para o regime de liberdades públicas e um extraordinário revés para as
organizações sindicais, que acabaram por enfraquecer-se em grande escala com sua proibição e/ou
com a repressão dirigida contra os seus membros.
Apesar da pouca tradição e importância dos sistemas formais de relações trabalhistas na América
Latina, diversos processos contribuam atualmente para que o diálogo social seja muito necessário, o
que torna aconselhável criar mecanismo para sua promoção. Entre esses processos, destacam-se:
- A democratização, que resultou numa explosão da sociedade civil e numa multiplicação das
demandas ao Estado. O “efeito Pandora” provocado pelo retorno da democracia explica-se não
apenas pela restituição das liberdades, principalmente da liberdade de expressão e associação, como
também como reação às tensões acumuladas durante os regimes repressivos.
- As políticas de ajustamento também tornam necessário encontrar mecanismos de diálogo e
consenso entre as forças sociais, exatamente porque impõem altos custos sociais a uma maioria de
setores. Num contexto de democratização e dificuldades econômicas que exigem políticas e medidas
impopulares e restritivas, a governabilidade começa a buscar mecanismo de diálogo entre as forças
sociais e a gerar consensos que legitimes essas políticas.
- A integração econômica e a globalização, com seus poderosos efeitos sobre a estrutura econômica,
os processos de produção e a organização do trabalho, também torna muito necessários o diálogo e a
participação das forças sociais nos processos decisórios, não apenas para somar forças, como
também para controlar tais processos e a conseqüências sociais deles decorrentes.
- Finalmente, as mudanças na estrutura e na organização do trabalho, com a descentralização dos
processos de produção, a diversificação no mundo do trabalho e a fragmentação de interesses,
embora obriguem a revisar as fórmulas tradicionais de relações trabalhistas (representação tríplice,
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negociações bilaterais), em caso nenhum desaconselham a busca de novos instrumentos de diálogo.
Ao contrário: exigem a procura de formas novas e mais significativas de diálogo social (aqui no seu
sentido amplo inicialmente definido) desde as que habilitem a reconstituir as relações dos diferentes
interesses presentes no mundo do trabalho até a encontrar fórmulas de concertação e negociações
trabalhistas.
EXPERIÊNCIAS DE DIÁLOGO SOCIAL NA REGIÃO
Uma característica dos países da América Latina, ligada à falta de tradição de diálogo social, é a
fraqueza dos sistemas formais de relações trabalhistas. Em geral, não existe na América Latina uma
tradição de relações ordenadas e permanentes entre as partes, ao que se soma a fraqueza das
organizações patronais e sindicais. Os órgãos de consulta, quando existem, costumam ser pouco
ativos e chegam a cair em desuso. Por outro lado, a negociação tríplice é de caráter esporádico e os
acordos freqüentemente contêm uma carga retórica que impede o logro de resultados concretos.
As razões para essa fraqueza dos sistemas formais nas relações trabalhistas são encontradas numa
tradução comum: a intervenção do Estado na regulamentação das relações industriais. Essa
característica tem exercido várias e importantes conseqüências para os sistemas de relações
trabalhistas na América Latina:
- Em primeiro lugar, a legislação tem-se sobreposto à negociação coletiva, e este primado da
legislação tem sido paralelo à fraqueza que caracteriza o sistema de negociação coletiva.
- Em segundo lugar, a necessidade de influir na legislação explica por que a negociação tem sido
realizada, em geral, nos níveis centrais de governo.
- Em terceiro lugar, a mesma tradição legalista e centralista nas relações trabalhistas explica outra
característica: a aflita de mecanismos que vinculem as decisões adotadas no nível central de governo
com as negociações no nível da empresa.
- Finalmente, a intervenção do Estado e o “regulamentarismo” têm desempenhado um papel decisivo
na fraqueza das organizações sindicais e patronais.
O protagonismo estatal nas relações trabalhistas e as formas que esta intervenção tem revestido ao
longo da história (especialmente as tentativas do Estado de controlar os sindicatos) certamente
condicionaram certas dinâmicas de interação entre as partes, capazes de explicar a falta de êxito e de
continuidade de algumas iniciativas de concertação e diálogo na região.
Apesar disso, têm-se registrado nos últimos anos, por ação dos processos de transição para a
democracia, algumas experiências de concertação e diálogo social que merecem ser destacadas.
Neste trabalho, concentramo-nos nas experiência de concertação no Chile, México, República
Dominicana, Uruguai e Argentina. Em todos estes casos houve coincidência entre certos processos
de concertação ilustrativos – alguns deles muito significativos – e a disponibilidade de informação.
Isto não quer dizer que tenhamos incluído aqui todas as experiências significativas de concertação e
diálogo social que têm ocorrido na região.
Chile
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No Chile, a experiência recente em matéria de concertação social guarda estreita relação com a
concertação política que caracterizou o processo de transição para a democracia. Os acordos
políticos que levaram ao poder um governo de concertação nas primeiras eleições democráticas de
1989, foram seguidos por diversas iniciativas e acordos entre os principais atores sociais.
Como resultado principal da concertação social nesse país, destaca-se a eliminação de alguns
aspectos essenciais da legislação trabalhista herdada do regime militar, tais como a livre despedida e
as restrições à liberdade sindical e sua substituição por novas leis, que oferecem maior proteção aos
trabalhadores e liberalizam o regime sindical chileno.
Esta é a cronologia dos acontecimentos:
- Em 1990, foi assinado um Acordo Marco tríplice (“Chile, uma oportunidade histórica”) entre o
novo governo, a principal entidade sindical, a Central Unitária de Trabalhadores (CUT) e a
organização de empresários a Confederação de Produção e Comércio (CPC), ao qual se seguirão
novos acordos que darão continuidade às práticas de consenso adotadas entre as partes. Composto de
seis capítulos, o Acordo Marco inclui importantes declarações de princípios, mas nele também já se
aprovam algumas ações concretas, como o aumento do salário mínimo – com promessa de
ajustamento ao cabo de um ano – a consideração de pagamentos de bonificações de mobilização e
colação para trabalhadores de salário mínimo, mediante negociações diretas. Por último, reafirma-se
no documento o compromisso de busca de maiores acordos entre as três partes para fins de
elaboração de projetos de legislação trabalhista (além disso, em virtude do Acordo, o governo e a
CUT, uma das suas centrais sindicais, acordaram em enviar ao Congresso um projeto de lei
complementar sobre salário-família e subsídio familiar único e em aumentar todas as pensões
mínimas e assistenciais).
- Como resultado do acordo alcançado em 1990, foi assinado em abril de 1991 um novo acordo entre
as partes (“Acordo Nacional do Governo, dos Trabalhadores e dos Empresários”), também assinado
pela Confederação Nacional da Pequena Indústria e do Artesanato (CONUPIA) e a Associação
Nacional de Funcionários Públicos (ANEP), instrumento que, ademais de afirmar diversos
compromissos – trabalhar pela criação de novos empregos produtivos e de sistemas de informação
sobre emprego, abertura de novos mercados, desenvolvimento tecnológico, preservação do meio
ambiente, etc...-, atualizará alguns dos acordos específicos incluídos no Acordo de 1990 - aumento
do salário mínimo, reajustes dos subsídios familiares, gratificação de Festa Pátria e de Natal,
gratificações para os beneficiários de pensões mínimas e assistenciais e para os trabalhadores do
setor público.
- O acordo de 1991 seria seguido por novos acordos em abril de 1992 e abril de 1993, com estrutura
similar, em que se atualizaram os conteúdos de aumento do salário mínimo, reajuste do saláriofamília e incremento do subsídio familiar único.
A par destes convênios específicos e concretos e como desenvolvimento dos princípios básicos do
Acordo Marco, também seriam iniciados outros processos que culminariam em diversos acordos.
- Em primeiro lugar, alcançaram-se alguns acordos setoriais. Entre estes, o do setor metalúrgico e
metalmecânico, celebrado entre trabalhadores e empresários na Zona Franca de Iquique, mediante o
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qual os empresários assumiram o compromisso de cumprir o Código do Trabalho, respeitar o direito
de filiação a organizações sindicais, descontar dos trabalhadores as cotas sindicais e pagar um salário
mínimo melhor do que o oficial.
- Em segundo lugar, assinaram-se vários acordos de melhoria das condições de trabalho e de vida dos
trabalhadores do setor público.
- Em terceiro lugar, iniciou-se a preparação de projetos de reforma das leis trabalhistas, para cujo fim
o governo designou uma equipe técnica e manteve diversas consultas com as organizações sindicais
e empresariais e as forças políticas. Entre 1990 e 1991, sempre no âmbito do processo de consulta
entre as partes, aprovaram-se três leis – sobre terminação do contrato de trabalho e estabilidade no
emprego, centrais sindicais e organizações sindicais e negociação coletiva – que deram fim à
legislação trabalhista herdada do regime militar em relação a dois aspectos essenciais: os termos da
terminação do contrato – que na nova legislação conferem ao trabalhador maior proteção do que na
anterior – a liberdade de associação – que legaliza os sindicatos e liberaliza o sistema chileno de
associação em consonância com o novo contexto democrático. Concretamente:
- a Lei 19.010, sobre terminação do contrato e estabilidade no emprego, promulgada em
novembro de 1990, põe fim à livre despedida, vincula a terminação do contrato a uma causa objetiva
de despedida e estabelece indenizações para casos de despedida sem justa causa por necessidades da
empresa, criando normas de estabelecem, para os casos de terminação da relação de trabalho, uma
proteção maior do que a prevista na legislação anterior;
- a Lei 9.049, sobre centrais sindicais, aprovada em fevereiro de 1991, reconhece, por sua
vez, o direito de constituir centrais sindicais sem autorização prévia e estabelece o regime para sua
criação, funcionamento e dissolução;
- a Lei 19.069, sobre organizações sindicais e negociação coletiva, aprovada em julho de
1991, 1991, visa a uma liberalização mais ampla do sistema sindical chileno mediante a eliminação
de restrições à ação e à atividade dos sindicatos – tais como a proibição de atividade política por
dirigentes sindicais e o direito à dissolução administrativa dos sindicatos. No que se refere à
negociação coletiva e aos conflitos trabalhistas, a abertura é menor e se Mantêm importantes
limitações. Como pontos de liberalização, ainda que limitada, a) permite-se que as partes acordem
previamente a realização de negociações que não estejam sujeitas a trâmites formas estabelecidos
por lei ou que abranjam mais de uma empresa; b) limita-se a faculdade do empregador de excluir
certos trabalhadores das negociações; e c) estabelece-se um foro para proteger os trabalhadores
durante as discussões. Além disso, introduziram-se outras modificações no Código do Trabalho,
abrangendo os capítulos sobre contrato individual de trabalho e sobre a capacitação, a proteção dos
trabalhadores e a jurisdição trabalhista.
Embora a prática do tripartidarismo tenha sido esporádica na prática, após as importantes
modificações introduzidas na legislação e consolidadas no Código do Trabalho, existe uma
importante exceção. Em 1994, foi criado o Fórum para o Desenvolvimento Produtivo e, em 1996, no
contexto dessa Fórum, foram criadas quatro comissões para tratar, respectivamente de temas tais
como a segurança no emprego, as relações de trabalho, o salário mínimo e o desenvolvimento
regional.
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México
No México, a existência de pactos tríplice entre o governo e as forças de produção, trabalhadores e
empresários, guarda relação, em primeiro lugar, com um contexto de crise econômica no começo dos
anos 80 e, a seguir, com a aplicação de políticas de ajustamento estrutural.
Do ponto de vista dos conteúdos, o objetivo principal – e o êxito – dos pactos consistiu no controle
da inflação e sua conseqüência social mais visível: a perda de poder aquisitivo dos trabalhadores,
cujos salários mínimos reais registraram perdas de 60% entre 1983 e 1994.
A seqüência cronológica dos pactos é a seguinte:
- Em 1983, em meio a uma grave crise caracterizada pelo aumento desmedido da inflação, a queda
das cotações do petróleo, a escassez de divisar, o ônus da dívida externa e a desvalorização da
moeda, o governo e os dirigentes sindicais e empresariais assinaram o chamado “Pacto de
Solidariedade Nacional”. Contudo este acordo continha apenas declarações de apoio a políticas
sociais e econômicas formuladas de modo geral e não se traduziu em qualquer resultado concreto.
- Em 1987, a persistência das más condições econômicas levou ao anúncio de um segundo pacto
entre as três partes, o “Pacto de Solidariedade Econômica”, desta vez com conteúdos mais concretos
e com a intenção fundamental de combater a inflação – mediante o congelamento de preços e
salários. Entre as decisões adotadas, destacavam-se medidas tributários e políticas de preços e de
tarifas do setor público, despesa pública, taxa de câmbio, abertura comercial, preços, créditos e
seguros relacionados com os produtos básicos, capitalização do campo e promoção de elevação do
nível de vida dos campesinos.
- Em 1988, já inaugurado o mandato presidencial de Salinas, ocasião em que a situação econômica
havia melhorado, concluiu-se o “Pacto de Estabilidade e Crescimento Econômico” (PECE), para dar
continuidade aos demais pactos em matéria de crescimento, com a participação e o apoio das partes.
Nesse pacto, acordou-se um aumento dos salários mínimos, a atualização dos preços e tarifas dos
serviços públicos e uma ampliação da desregulamentação da economia e da liberalização de tarifas
alfandegárias. O pacto foi prorrogado diversas vezes (1989, 1990, 1991 e 1992). Nos acordos de
renovação, manteve-se a estrutura fundamental do pacto: acordaram-se alguns aumentos de preços –
especialmente no setor da energia – e alguns aumentos salariais.
- Em 1992, celebrou-se um novo pacto que, mantendo a mesma sigla, adotou uma nova
denominação: Pacto para a Estabilidade, a Competitividade e o Emprego. Nele se afirma o
compromisso das partes com as políticas fiscais, econômicas e sociais aplicadas pelo governo desde
1988.
Outros acordos mais recentes incluem:
- a assinatura de um acordo de partes entre a COPARMEX, a federação de empresários, e a CMT, a
federação de sindicatos, denominado “Por uma nova cultura de trabalho”, que visa a reconciliar o
respeito aos direitos básicos dos trabalhadores com as necessidades da produção; e
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- um acordo tríplice, “Aliança para a renovação econômica”, negociado em outubro de 1995, que
propõe medidas específicas para manter o poder aquisitivo dos trabalhadores mediante um aumento
no salário mínimo e dos benefícios para desempregados e para incentivar as empresas a realizar
contratações por meio de incentivos fiscais.
Ainda que se possa dizer, com base no número de pactos concluídos no México nos anos 80 e no
começo dos anos 90, que a concertação social tem desempenhado importante papel nesse país, é
necessário fazer certos esclarecimentos a respeito do caráter:
- Em primeiro lugar, alguns pactos, especialmente os dois primeiros, não foram precedidos de um
processo aberto de negociação pelas partes e apanharam de surpresa a opinião pública – ao serem
anunciados pelo Presidente, de um dia para outro, pela televisão.
- Em segundo lugar, os pactos concentraram-se essencialmente em acordos sobre princípios de
política fiscal, econômica e – em menor escala – social e não incluíram reformas na legislação
trabalhista. Manteve-se, portanto, uma legislação trabalhista rígida e excessivamente protetora dos
direitos dos trabalhadores, ainda que as políticas de liberalização adotadas têm exigido, de fato, sua
transgressão.
- Em terceiro lugar, os pactos servir de instrumentos para legitimar (e não para acordar) políticas
econômicas e de ajustamento estrutural previamente elaboradas pelo governo.
- Em quarto lugar, os pactos têm-se caracterizado pela intervenção do governo e pela fixação
centralizada de políticas de salários e preços, e não é permitido o ajuste salarial em função da
produtividade de cada empresa.
- Em quinto lugar, uma das chaves do êxito das medidas adotadas consistiu no estabelecimento de
mecanismos de supervisão e controle dos pactos. A Comissão de Avaliação e Seguimento dos
Pactos, presidida pelo Ministro do Trabalho e pelas partes sociais, está dividida em subcomissões
tríplices, que se reúnem com certa freqüência. A Comissão tem sido eficaz no controle da inflação e,
de certa forma, em relação à estabilização da moeda e a certos índices de crescimento econômico.
República Dominicana
A experiência nacional de concertação e diálogo social é interessante porque sua realidade tem sido
permeada pela contestação, configurando uma cultura de conflito, e exatamente porque isto permite
observar alguns mecanismos utilizados para superar a desconfiança existente entre as partes.
Por outro lado, o principal resultado do processo de concertação social no país foi a reforma do
Código do Trabalho, aprovado por unanimidade pelo Congresso em 1992.
Esta é a recapitulação dos fatos:
- No começo de 1985, após uma onda de protestos que culminou, em 1984, com várias dezenas de
mortes, realizou-se na cidade de Jarabacoa um encontro informal, auspiciado pela Igreja, entre
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representantes de empresários, dirigentes sindicais, funcionários do governo e acadêmicos. O
encontro de Jarabacoa marcou o início de um processo informal de conversação e intercâmbio entre
representantes das partes sociais e, em certas ocasiões, do governo. O processo que recebeu o nome
de Diálogo Tripartidário, conseguiu alcançar alguns resultados concretos, embora as primeiras
reuniões realizadas e, março de 1985, outubro de 1986 e abril de 1987, não tivessem resultado em
conclusões de importância.
- Em março de 1988, dos acontecimentos importantes mudaram a dinâmica desses encontros, que
passaram a ser um ponto de inflexão no processo de concertação. Em primeiro lugar, o Episcopado
fez um chamamento no sentido de que as partes chegassem a acordos, pois – como foi dito – a fé na
concertação social poderia ser perdida. Em segundo lugar, representantes do governo passaram a
participar das reuniões.
- A partir deste momento, iniciaram-se discussões que culminaram no Acordo do Diálogo
Tripartidário, assinado em maio de 1988, em presença do Presidente da República, por funcionários
do governo, seis centrais sindicais, o Conselho Nacional de Empresários e suas filiadas e, na
qualidade de testemunhas, por representantes da Igreja. Nesse documento, as partes chegaram a
acordos sobre vários pontos concretos tendentes a resolver diferentes problemas, mas que
necessitavam de aprovação parlamentar e medidas governamentais. Este último aspecto provocou
sérios atrasos na execução dos acordos, devido às demoras no processo de aprovação dos mesmos
pelo Congresso e, em outros casos, a atrasos na promulgação pelo Executivo e sua publicação
oficial. Segundo alguns analistas, este foi o principal obstáculo à concertação social no país.
- Em julho de 1989, decorrido um ano sem que a maioria dos pontos acordados tivesse sido
executada, as centrais sindicais e o Conselho Nacional de Empresários assinaram um acordo
bipartidário. Embora o seu alcance fosse reduzido, tendo as partes afirmado o compromisso de
continuar as conversações e definido questões de procedimento, o acordo foi interpretado como uma
forma de impulsionar o acelerar a provação dos instrumentos antes acordados.
- Em agosto de 1990, instalado o novo governo do Presidente Balaguer, assinou-se um novo acordo,
o Pacto de Solidariedade Econômica, que continha as diretrizes de um programa econômico e social.
Mediante este pacto, o governo assumiu uma série de compromissos: aplicar uma política de
austeridade e equilíbrio orçamentário, executar uma reforma tributária, fixar os preços de venda aos
consumidores, aumentar os vencimentos dos servidores públicos e promover o aumento dos
trabalhadores do setor privado e ampliar os programas de assistência social do novo governo –
embora não tivessem sido fixados parâmetros concretos para o seu cumprimento. O pacto
estabeleceu um prazo de seis meses e seu acompanhamento ficou a cargo de uma comissão tríplice,
com participação da Igreja Católica. Contudo, as organizações sindicais recusaram-se a assiná-lo e
anunciaram a deflagração de uma greve.
- Finalmente, o governo concordou em negociar com os sindicatos alguns aspectos específicos do
pacto, o que significou o reconhecimento das centrais sindicais como sujeitos de diálogo, em que
pese sua escassa representatividade (entre 10 e 15%). Outro aspecto de destaque nesses pactos é que
ambos dão importância ao controle de preços.
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- Em outubro de 1990, visando a incorporar à legislação os acordos adotados, o governo nomeou
uma comissão técnica, integrada por três destacados professores, para preparar um projeto de
reforma do Código do Trabalho. O projeto apresentado pela comissão excedeu inclusive o âmbito
dos acordos tríplices, e os empresários manifestaram sua oposição.
- Em maio de 1991, sob os auspícios da OIT, realizou-se uma reunião tríplice a fim de discutir o
projeto de Código do Trabalho.
- De dezembro de 1991 a março de 1992, realizaram-se sessões periódicas de diálogo tríplice para
facilitar o trabalho da Câmara dos Deputados.
- Em abril de 1992, com mediação da Igreja e da Secretaria do Trabalho, as partes aproximaram suas
posições, facilitando a aprovação unânime do Código de Trabalho pela Câmara e o Senado.
Pode-se afirmar que o processo que culminou com a aprovação do Código de Trabalho pelo
Legislativo representou um processo de verdadeira concertação social. Seu êxito serviu para animar
a Secretaria do Trabalho a iniciar outros processos de diálogo – para resolver conflitos nas zonas
francas -, mas sem muito êxito.
Entre os resultados alcançados pelo processo de concertação em matéria de relações trabalhistas,
cabe destacar os acordos sobre salários, alíquotas de isenção do imposto sobre a renda, devolução da
natureza tríplice à administração do seguro social e sua extensão a várias categorias de trabalhadores
excluídos e, finalmente, a aprovação da reforma do Código do Trabalho.
Uruguai
A concertação social desempenhou importante papel ao longo da transição do país para a
democracia. Um dos seus resultados principais – e um dos primeiros atos do primeiro governo
democrático – foi a revogação, em março de 1985, da legislação trabalhista promulgada durante o
regime militar – muito restritiva à liberdade de associação. Essas mudanças, embora não tenham
implicado a adoção de novas regras, situaram-se entre as mais radicais em termos de liberalização da
ação sindical. Por outro lado, significaram o retorno ao antigo sistema de relações trabalhistas nãoregulamentado ou desregulamentado que sempre caracterizou o país.
Completada a transição para a democracia e devido em parte a que isto implicou o retorno a relações
trabalhistas não-regulamentadas, a concertação teve alcance e impacto limitados. Não obstante, a
concertação e o trabalho da CONAPRO deixaram outro legado importante do ponto de vista da
cooperação tríplice: o restabelecimento do “Conselho de Salários”, um foro de natureza tríplice que
formula as propostas sobre política salarial ao governo.
Estes são alguns dos aspectos mais salientes da concertação:
- A principal plataforma de concertação social no Uruguai durante a transição foi a Concertação
Nacional Programática (CONAPRO). Suas origens são encontradas no prelúdio da mudança de
regime, quando a necessidade de mudança política e as condições que a favoreciam levaram as
forças sociais de oposição a criar de várias instâncias de concertação, entre as quais a CONAPRO,
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para dialogar com os militares a respeito das condições de transição para o novo regime democrático.
Existem dois aspectos da CONAPRO que a converteram em instrumento atípico:
- em primeiro lugar, não era uma plataforma tríplice, pois reunia amplos setores da
sociedade, incluindo os partidos políticos mais importantes, os organismos representativos dos
setores sindicais, empresariais, rurais, industrias e comerciais e outras organizações sociais, como as
de estudantes, cooperativas e atividades dos direitos humanos; e
- em segundo lugar, era uma plataforma de natureza programática, destinada a influir na
agenda política, social e econômica do primeiro governo democrático.
- Contudo, as propostas da CONAPRO incluíam temas trabalhistas, entre os quais a
revogação da legislação militar sobre relações trabalhistas coletivas, a reinstalação, em seus cargos,
dos servidores públicos despedidos em razão dos seus vínculos políticos e sindicais; a fixação dos
salários de acordo com um sistema ou mecanismo de ajuste a cada quatro meses (depois
abandonada); e o estabelecimento de uma entidade administrativa para assuntos de seguridade social,
o Banco da Seguridade Social, de que todas as partes poderiam participar.
- Com o primeiro governo democrático, obtiveram-se alguns resultados em matéria trabalhista:
revogou-se a legislação militar em matéria de relações trabalhistas, restabeleceu-se a liberdade de
associação e o direito de greve e voltou-se ao antigo sistema não-regulamentado nas relações
trabalhistas coletivas; e, com algumas variações, reinstaurou-se o Conselho de Salários, um foro de
cooperação tríplice para a formulação de propostas salariais ao governo e que já existia antes da
ditadura.
- Embora a chegada da democracia tenha reacendido o debate sobre a necessidade de regulamentar o
sistema de relações trabalhistas, o governo e os empresários não conseguiram incluir os sindicatos
nas discussões, dadas as suspeitas suscitadas pela regulamentação. Tanto a tradição de nãoregulamentação do sistema de relações de trabalhistas do país como a experiência vivida durante o
regime militar contribuíram para explicar a atitude dos sindicatos, que os leva a identificar
regulamentação com restrição. Para estes, a regulamentação, que só conheceram durante o regime
militar, ameaçava e atentava contra os princípios de liberdade de associação e direito de greve.
Para concluir, a concertação no Uruguai revestiu as seguintes características:
- foi uma concertação programática, não destinada a uma aplicação imediata;
- foi uma concertação dos interlocutores sociais com os partidos políticos, e não com o executivo;
além dos costumeiros interlocutores – empresários e sindicatos -, participaram estudantes, membros
de sociedades cooperativas, possíveis compradores de casas, familiares de prisioneiros políticos e
ativistas de direitos humanos;
- os temas da concertação social – a forma e a extensão da fixação dos salários, problemas
trabalhistas, meios e significados do controle da inflação e do desemprego...- não foram os únicos
abordados;
- obtiveram-se alguns resultados no plano institucional, como o Conselho de Salários, uma expressão
concreta de cooperação tríplice em matéria de salários.
Argentina
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Nesse país, a recente experiência de concertação social em matéria trabalhista movimentou-se entre
tentativas de diálogo do governo com os atores sociais e a intervenção unilateral do Estado. Quanto
aos resultados, adotaram-se medidas que modificam a legislação trabalhista dando maior
flexibilidade ao mercado de trabalho, introduzindo novas modalidades de contratos e permitindo
condições de emprego distintas para pequenas e médias empresas. Contudo, as tentativas do governo
Menem continuar a avançar na flexibilização trabalhista viram-se frustradas pela oposição dos
sindicatos. Medidas como a descentralização da negociação coletiva, além de outras, ficaram à
margem após as reformas da legislação trabalhista aprovadas em setembro de 1997.
Esta é a cronologia dos fatos:
- No mandato presidencial de Alfonsín, quando a crise econômica era mais aguda e a inflação mais
descontrolada, o governo adotou algumas iniciativas visando à abertura de canais para o diálogo
social, que malograram.
- Em 1984, o governo formulou uma proposta de pacto social que não obteve o consenso requerido.
- Em 1985, foi lançado o Plano Austral, composto de uma série de medidas para conter a inflação,
que também fracassou ao não conseguir obter o apoio dos sindicatos.
- Em 1991, já com Menem na presidência, aprovou-se a Lei de Emprego, após dois anos de consultas
e negociações tríplices com os atores sociais. Entre outras medidas, essa lei instituiu novas
modalidades de contratos que eliminam a estabilidade.
- Em 1993, o Executivo encaminhou ao Congresso um projeto de reforma trabalhista, que foi
intensamente discutido pelos atores sociais. O projeto visava a simplificar ainda mais os requisitos
em matéria de contratações por tempo determinado e a flexibilizar os horários de trabalho. O projeto
acabou por seu retirado, chegando-se, em seu lugar, a um acordo com os atores sociais para a
formação de consenso sobre a introdução de emendas à legislação.
- Assim, em 1994, o governo, a Confederação Geral do Trabalho e as organizações empresariais
firmaram o Acordo Marco para o Emprego, a Produtividade e a Eqüidade Social. O objetivo do
acordo era conseguir consenso e apoio para as reformas legislativas em matéria de funcionamento do
mercado de trabalho (modalidades contratuais, resolução de conflitos, segurança e saúde,
treinamento, riscos ocupacionais e negociação coletiva). Deste marco de concertação tríplice,
emanaram algumas leis, com a que regula as condições de emprego em pequenas empresas (aprovada
em 1995) e a lei de falências. Embora os esforços de concertação e o desejo de alcançar um consenso
mínimo nas linhas básicas tenham sido reais, o fato é que, em certos casos, as disposições legais
interpretaram com considerável liberdade as conclusões a que chegaram as discussões tríplices.
- Como exemplo disso, em setembro de 1996, o governo, à margem do acordo tríplice, declarou
unilateralmente a intenção de introduzir novas modificações na legislação trabalhista. O governo
propôs-se introduzir modificações em três áreas, a saber: reformar o atual sistema se seguro médico,
descentralizar o sistema de negociação coletiva e modificar o seguro de desemprego. Os sindicatos
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opuseram feroz oposição a essas propostas, sustentando que elas representam uma ameaça direta à
sua base de poder.
- Em 1997, o governo retrocedeu em face da oposição dos sindicatos, e o novo código do Trabalho
foi aprovado sem as modificações propostas e com a oposição dos empresários.
PRINCIPAIS DIFICULDADES DO DIÁLOGO SOCIAL
A partir destas experiências e tendo a história como pano de fundo, é possível assinalar alguns
fatores que têm dificultado e ainda dificultam a concertação social na região. Alguns desses fatores
são de natureza política ou se inserem no legado político, mas nem por isto estão menos presentes
nesses processos, na forma de atitudes e do comportamento dos atores – e da sua interação mútua.
Outros são mais de ordem técnica e de procedimento e devem ser levados em consideração como
fatores capazes de ajudar a tornar o processo mais neutro e de suavizar as diferenças de posição dos
atores.
Dificuldades de ordem política:
1-. Instabilidade institucional e limitações às liberdades públicas. São várias as suas conseqüências:
a) impediram a consolidação de mecanismos e estruturas formais, mais ou menos estáveis, de relação
entre as partes; b) impediram o desenvolvimento de consensos políticos e sociais mínimos, que ficam
assim cristalizados em acordos básicos sobre as regras do jogo. Pela mesma razão, não contribuíram
para a geração de confiança entre as partes; e c) limitaram a autonomia das forças sociais.
2-. A polarização e combatividade que têm caracterizado a vida política, aspectos que também
encerram várias conseqüências: a) dificultando a possibilidade de alcançar acordos políticos
mínimos, o que, por sua vez, não facilitou a concertação social. Como demonstram os casos do Chile
e da Venezuela, o acordo político ou a existência de consensos básicos sobre as políticas sociais e
econômicas facilitam a concertação social ao estabelecerem um marco que lhe seja aceitável; e b)
fomentando a defrontação, ao gerar atitudes de ação e posições de contestação entre os atores
políticos e sociais. Esta cultura de defrontação, aliada à instabilidade política, dificultou o processo
de estabilização das relações trabalhistas como sistema institucionalizado em que as partes se
reconhecem mutuamente como atores qualificados e participam ativamente do estabelecimento de
normas que regulam suas vinculações. As atitudes radicais, além de contribuírem para que o respeito
aos acordos seja escasso, limitaram as possibilidades reais de desenvolver uma efetiva concertação –
tanto nas negociações globais como de política econômica e social e tanto na negociação
centralizada como na descentralizada.
3-. O escasso respeito aos acordos. Trata-se de uma conseqüência da instabilidade política e
institucional que se tem manifestado numa constante mudança de regras, reduzindo o seu valor, da
freqüência com que os atores formularam regras com finalidade exclusivamente política, e da
politização e radicalização das posições dos atores políticos e sociais. Embora sejam aceitos
verbalmente, é freqüente que os acordos sejam objeto de violenta reação posterior por questões
puramente táticas.
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Dificuldades de ordem técnica:
4-. A carência de informação suficiente e adequada. Nos países com maior tradição de relações de
trabalho coletivas e de negociações no nível de empresa, os trabalhadores têm direito a obter
informação sobre aspectos fundamentais de uma empresa, sobre a participação de uma empresa em
particular num grupo de empresas ou num ramo de atividade e sobre a implicação e inter-relação
destas com a situação econômica e social do país. Na América Latina, existem importantes vazios no
direito de informação, não apenas do ponto de vista das leis como também da prática nas relações
trabalhistas. Isto é muito importante porque, sem informação adequada, dificilmente se pode
formular propostas sólidas, negociáveis e ajustadas à realidade.
5-. Preparação técnica insuficiente. A concertação inclui complexos temas de discussão, como o
controle da inflação, ajustes salariais, reestruturação industrial e política fiscal e monetária. As
partes devem dispor de conhecimento adequado desses temas e do contexto em que se inserem.
6-. Concisão e precisão das propostas. Sem uma informação adequada e uma preparação técnica
suficiente, é difícil preparar propostas que reúnam atributos de concisão e precisão. Na América
Latina, as propostas geralmente são apresentadas em termos muito gerais e são programáticas, mais
do que concretas.
Dificuldades de ordem ideológica
7-. Excesso de ideologia. Embora este problema tenha sido parcialmente superado, ainda persistem
os enfoques e as colocações excessivamente ideológicas, que distanciam as partes e dificultam sua
aproximação no que se refere a aspectos concretos.
A PROBLEMÁTICA DO SETOR INFORMAL
Em todos os países, as mudanças na organização do trabalho e da produção, produto do rápido
avanço tecnológico e da liberalização econômica ou globalização, estão afetando a estrutura
tradicional das relações trabalhistas e seus atores. Em geral, o aumento da autonomia da empresa, a
proliferação de pequenas e médias empresas e o surgimento de formas precárias de emprego levaram
a uma crescente heterogeneidade – mediante o aparecimento de novos grupos sociais com problemas
trabalhistas específicos – e a uma fragmentação de interesses no mundo do trabalho. Tudo isto
representa sérios desafios tanto para os atores tradicionais nas relações trabalhistas como para as
autoridades públicas.
Na América Latina, a globalização e a liberalização econômica exercem efeitos ainda mais
desestabilizadores sobre o sistema de relações trabalhistas já que, ademais da falta de tradição dos
sistemas formais de relações trabalhistas, existe outro fator que retira eficácia a esses mecanismos: o
crescimento do setor informal. Tal crescimento resulta em que uma percentagem cada vez menor da
população (variável conforme o país) é abrangida por mecanismos de negociação formal e pelos
benefícios deles decorrentes.
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Qualquer debate sobre relações trabalhistas e diálogo social deve abordar a problemática do setor
informal pelas seguintes razões:
- porque as mesmas considerações essenciais para as relações trabalhistas, ou seja, a integração
econômica, a coesão social e a democracia a democracia, são importantes no caso do setor informal;
- porque o setor informal inclui situações de emprego e relações de trabalho que não só diferem do
setor formal, com atentam contra as normas e leis estabelecidas;
- porque a manutenção de uma parcela tão ampla da população trabalhadora à margem da estrutura
reguladora gera graves perturbações no funcionamento do mercado de trabalho; e
- porque as necessidades desses setores não podem ficar desatendidas, levando em conta, ademais,
que representam cerca de 50% do eleitorado.
Por outro lado, como mostram as cifras, a importância do setor informal em termos de percentagem e
de geração de emprego não só não diminuiu nos anos 90 como continua a aumentar. Entre 1990 e
1994, geraram-se na América Latina 15,7 novos empregos e, entre estes, 8,4 de cada dez
corresponderam ao setor informal. Na região, o emprego no setor informal cresceu ao ritmo anual de
4,7%, contra 1,1% no setor formal (World Labour Report, 1997).
As dimensões e proporções do fenômeno representam desafios tanto para as organizações
tradicionais, como os sindicatos, que perdem influência e poder de negociação na medida do
crescimento do setor informal, como para as autoridades públicas, que devem velar pela coesão e o
desenvolvimento econômico e social.
Até agora, as formas de intervenção pública têm-se caracterizado pelo seguinte:
- a melhoria do acesso ao mercado de serviços, principalmente à provisão de crédito, o que é
conseguido mediante reformas de políticas e regulamentos do setor financeiro ou a criação
alternativas de financiamento e distribuição;
- programas de formação, assistência técnica e treinamento para esses setores:
- a criação de um contexto microeconômico mais adequado para o desenvolvimento de empresas do
setor informal, mediante reformas na estrutura reguladora e política. O México e o Brasil são bons
exemplos.
Até agora, porém, as iniciativas dos poderes públicos quase nunca contemplaram a participação
direta desses setores no desenho, implementação e avaliação de programas a eles destinados. Isso
nos leva a extrair a seguinte conclusão: as políticas do estado deveriam orientar-se não só para a
eliminação dos obstáculos do acesso do setor informal aos recursos e ao mercado, como também
oferecer amplo espaço para a auto-organização desses setores e conceber mecanismos apropriados
para o diálogo e a negociação.
A participação e a incorporação desses setores nos foros de discussão e/ou negociação de políticas
trabalhistas, econômica e/ou sociais permitiriam: obter conhecimento direto e, portanto, mais correto
e preciso, de sues problemas; melhorar a capacidade de formulação de políticas adequadas aos seus
problemas; e aumentar a integração social e a coordenação das políticas trabalhistas.
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A participação e a integração desses setores nos foros de diálogo e discussão de problemas
trabalhistas poderiam ser concretizadas pelos seguintes meios:
a) – as estruturas e os atores tradicionais das relações trabalhistas. Nesse sentido, os
sindicatos e as organizações empresariais poderiam exercer pressão no sentido de promover políticas
favoráveis aos trabalhadores do setor informal e seria possível utilizar os mecanismos formais de
relações trabalhistas existentes em muitos países, para abordar os problemas do setor informal.
b) – a auto-organização desses setores e a criação de mecanismos específicos de diálogo.
Aparentemente, a opção de auto-organização suscita certos problemas em razão das limitações
estruturais – fragmentação e isolamento desses setores – e à carência de recursos organizacionais –
técnicos e de gestão – que caracteriza os trabalhadores do setor informal. Contudo, determinadas
políticas e a criação de um contexto regulador e institucional propício poderiam favorecer a autoorganização desses setores. Além disso, o estabelecimento de mecanismos específicos de diálogo
para abordar os problemas desses setores poderia reforçar a sua organização, dar-lhes visibilidade e
aumentar seu acesso ao mercado e a certos serviços.
Entre as políticas e medidas que poderiam favorecer la auto-organização dos setores informais e a
aplicação de mecanismos de diálogo, destacam-se:
1. Políticas que promovam a liberdade de associação.
2. Políticas que promovam e facilitem o registro legal dessas organizações, mediante a
simplificação e a melhoria da transparência dos procedimentos de registro. Se os requisitos e
procedimentos forem simples e transparentes e o processo de registro não for percebido como
uma forma de aumentar o controle e a regulamentação em vez de facilitar o acesso aos serviços e
o desenvolvimento de oportunidades, é mais provável que os trabalhadores do setor informal
reajam positivamente a esse incentivo.
3. Estabelecer mecanismos ou foros para o tratamento dos problemas específicos e de relevância
para os trabalhadores informais afetados. A criação desses mecanismos, se deles também
participam organizações governamentais e não-governamentais, pode ser muito proveitosa para
fomentar o entendimento mútuo e abrir novas vias e caminhos para os trabalhadores que operam
no setor informal. Tais mecanismos só funcionam quando existe coordenação entre as políticas
macro e os regulamentos micro e quando se promove a organização desses trabalhadores.
4. Assegurar a coordenação vertical entre níveis de governo. De nada serve que a elaboração de
políticas de apoio a esses setores (por exemplo, a promoção da sua organização ou a aprovação
de leis que beneficiem os setores organizados dentro do setor informal) emane do nível central,
se as medidas adotada no nível local não as apoiarem ou lhes forem contraditórias.
5. A necessidade de coordenação horizontal, setorial ou entre políticas.
6. para realizar tudo isto, os ministérios do trabalho devem dispor de equipes técnicas dotadas de
profundo conhecimento de todos os aspectos – técnicos, jurídicos e sociais – que afetam o
funcionamento do mercado de trabalho e, concretamente, daqueles que afetam de modo mais
específico o setor.
7. A importância do setor informal – não apenas em termos de percentagem da população
trabalhadora que ocupa, como também dos seus efeitos de perturbação do mercado de trabalho –
a aconselharia a própria criação de unidades dedicadas à investigação dos problemas e dinâmicas
específicas do setor informal.
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8. Somente por meio de unidades familiarizadas com os problemas do setor informal e capazes de
operar nas mesmas condições que afetam os trabalhadores do setor informal, poderão os
ministros do trabalho abrir vias de diálogo e participação que, por sua vez, habilitem esse setor a
abordar seus problemas e lhes dêem visibilidade e acesso aos serviços e recursos do mercado.
9. Essas políticas e medidas de fomento da organização e do diálogo com o setor informal não
apenas permitirão trabalhar com o potencial e a energia de alguns de setores como os da
microempresa, como também, afinal, trabalhar no sentido da sua incorporação ao setor formal.
UMA RECAPITULAÇÃO: CONDIÇÕES PARA O DIÁLOGO SOCIAL
Na América Latina, os instrumentos clássicos das relações trabalhistas (participação tríplice,
negociação coletiva) e as experiência de concertação e diálogo social têm-se caracterizado por sua
informalidade e sua escassa tradição. Vimos também que isto se deve a causas tais como inexistência
de contexto institucional adequado. A intervenção do Estado ou sua excessiva participação nas
relações trabalhistas, o legalismo ou “regulamentarismo”, o centralismo e, em conseqüência de tudo
isto, a debilidade das forças ou atores sociais contribuíram para gerar condições pouco adequadas
para o diálogo social e para a escassa institucionalização dos sistemas clássicos de relações
trabalhistas.
Embora existe, por parte das autoridades públicas e das forças sociais, a vontade de fortalecer o
diálogo social, resulta evidente que o diálogo não se gera espontaneamente ou só se promove com
altas do com altas doses de “boa vontade”. E, embora uma certa dos de boa vontade sempre facilite o
diálogo, é necessário orientar os esforços para a criação de condições – o contexto institucional e
mecanismos específicos- que tornem possíveis e sustentáveis as iniciativas de diálogo social. Nesta
seção, incluem-se alguns fatores capazes de contribuir para a criação do contexto institucional e
organizacional adequado para o diálogo social e mencionam-se alguns mecanismos concretos
capazes de facilitá-lo. Como se pôde constatar, as condições favoráveis ao diálogo e à concertação
afetam desde os fatores de ordem geral relacionados com o contexto institucional, até variáveis de
ordem mais concreta ou de microdimensão, que têm a ver com mecanismos específicos e ad hoc que
as autoridades sempre podem aplicar a fim de facilidades iniciativas de diálogo.
Entre os fatores que contribuíram para criar condições favoráveis ao diálogo social, cabe destacar:
1- A autonomia dos atores sociais. A autonomia dos atores sociais é uma condição necessária para
que possa existir um genuíno processo de diálogo social, porque nivela o terreno de discussão e
estabelece as condições mínimas de igualdade necessárias para que o intercâmbio de a
negociação possam ocorrer. Levando em conta a tradição de intervenção nas relações
trabalhistas que vigora nos países latino-americanos, a independência e a autonomia dos atores
sociais também são uma garantia contra a intervenção e a participação estatal.
2- Organizações representativas e bem coordenadas. A autonomia dos atores não basta: também é
necessário que as organizações sindicais e patronais disponham de estruturas capazes de garantir
o cumprimento dos acordos, transferindo o resultado dos mesmos para suas bases e permitindo
que transacionem com os setores que representam. Para tanto, é importante que essas
organizações sejam representativas e estejam muito bem coordenadas. Organizações capazes de
assumir e fazer cumprir compromissos se projetarão, por sua vez, como interlocutores legítimos
aos olhos dos demais atores da negociação.
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3- A busca de formas ou modelos de relações trabalhistas que reduzam efetivamente a intervenção
do Estado e a excessiva centralização das negociações. As formas organizações que as relações
trabalhistas e a negociação coletiva adotam também podem incidir sobre o diálogo por meio do
efeito que produzem nas partes. Por exemplo: um sistema de relações trabalhistas caracterizado
pela intervenção e a regulamentação excessiva do Estado pode exercer o efeito de desincentivar
a filiação dos trabalhadores a sindicados, já que estes não necessitam dessa filiação para sentir-se
protegidos. Por sua vez, a debilidade dos atores sociais pode converter-se – como j[a ocorreu –
em pretexto para continuar a justificar a intervenção do Estado nas relações trabalhistas. Da
mesma forma, a descentralização dos processos de negociação coletiva, ao aproximar a
discussão e o diálogo dos problemas específicos da empresa ou do lugar de trabalho, também
pode aumentar a participação e o interesses das partes no processo de diálogo e negociação.
Embora a intervenção do Estado e a centralização das relações trabalhistas sejam pouco
aconselháveis como modelo de relações trabalhistas, a solução não passa por respostas ou
receitas simples – como a não-intervenção e a descentralização. O Estado é chamado a
desempenhar um novo papel, mas continua a ser um ator destacada nas relações trabalhistas;
portanto, a solução não passa pela não-intervenção, e sim, pela determinação da qualidade e do
tipo de intervenção que seja necessária. Igualmente, a solução da rigidez que a centralização
excessiva das relações trabalhistas pode ocasionar não está na descentralização extrema, e sim,
na promoção da negociação em várias níveis, conseguindo-se uma boa coordenação.
4- O caráter e a amplitude da agenda de discussões. Uma ampla agenda de temas, que vá mais além
das questões estritamente referentes ao mercado de trabalho, também pode tornar o diálogo mais
atraente para um número maior de atores sociais.
5- A simplificação da legislação e do quadro regulador. O legalismo – ou a tendência de
regulamentar o sistema de relações trabalhistas até os seus detalhes – também pode incidir no
modelo de relações trabalhistas e, portanto, no diálogo social. De um lado, a importância da
legislação força os atores a deslocar-se para o nível central de governo a fim de negociar. Do
outro, a regulamentação excessiva provoca rigidez – eleva os custos de transação de cada
negociação ou iniciativa de diálogo – e aumenta a complexidade. Ao aumentar a complexidade,
também aumenta a confusão. A regulamentação excessiva afeta as iniciativas de diálogo em dois
sentidos: não facilita a negociação nos níveis inferiores de governo ou no nível de empresa – que
é o nível mais imediato para o trabalhador e o empresário – e, ao gerar confusão, impede que os
atores es estabeleçam suas perspectivas a respeito do processo de diálogo e negociação,
reduzindo seus incentivos para o diálogo. Isto nos leva ao ponto seguinte.
6- A transparências das regras do jogo no diálogo e/ou na negociação. A clareza das regras de jogo
e a garantia de cumprimento do que é acordado (a confiança das partes de que será cumprido o
que pactado, se não por vontade própria, então por imposição externa) são dois aspectos chave
que agem como incentivos para que os atores participem de um processo de diálogo e/ou
negociação. Quando não está claro por que e para que se irá negociar, quando não se sabe se vai
haver diálogo ou negociação e quando se desconhece em que se traduzirão os resultados do
processo, é provável que os atores tenham poucos incentivos para participar. O Ministério do
Trabalho, como órgão competente para atuar tanto no âmbito do governo como em contato com
os agentes sociais em matéria trabalhista, deve atuar como intermediário a) colocando à
disposição das partes toda a informação relevante para o processo de diálogo e/ou negociação e
b) assegurando-se de que os resultados do processo, os acordos alcançados no âmbito do
processo, se transfiram para o governo para que ganhem efetivamente vigência.
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7- O fortalecimento ou a criação de mecanismos e entidades de controle. Trata-se de outro aspecto
crucial no processo de diálogo e negociação. Já dissemos que as partes, para ingressar num
processo de diálogo e negociação, devem ter garantias de que se cumprirá o que foi acordado ou
de que os acordos que resultem do processo adquiram efetiva vigência. Para tanto, é necessário
que se ofereçam os meios, através de entidades ou organismos de controle e supervisão, que
garantam o cumprimento dos acordos. Este aspecto, guarda relação como o que se chama, em
inglês, de “enforcement”, afeta a capacidade do Ministério de fazer cumprir tanto a legislação
trabalhista em geral, como a de fazer cumprir os acordos específicos que possam ser adotados
nos foros tríplices. Ambos os objetivos obrigam a medidas de diferentes tipos. O cumprimento
da legislação trabalhista exige que o Ministério conte com entidades permanente ou com uma
equipe de inspetores que controlem com eficiência esse cumprimento. Já em relação ao
cumprimento de acordos adotados em foros tríplices, é possível aplicar, dependendo da
permanência desses foros, mecanismo ad hoc de controle e supervisão dos acordos. Em alguns
países, a inobservância da legislação trabalhista e a incapacidade dos ministérios do trabalho em
fazer cumpri-la têm sido esgrimidas como argumento por alguns setores sociais para não retornar
à mesa de negociações.
8- A atenção às questões de procedimento, ou seja, à regras que governam cada processo de diálogo
e determinam sua organização particular. Os processo de paz e de diálogo social na América
Central revelam a importância dos procedimentos e podem lançar luz sobre os efeitos e a
idoneidade de certos procedimentos. Neste aspecto, cabe levar em conta a) questões de
arbitramento: quem é o árbitro e a definição do seu papel. Em certos casos, quando o grau de
desconfiança entre as partes é muito alto, deve-se procurar um novo árbitro que seja aceito e
percebido por todas elas como sendo neutro. Existem, na região, vários exemplos da diferença
que pode fazer um bom arbitramento e, acima de tudo, a legitimidade do árbitro (as Nações
Unidas em El Salvador e a Igreja Católica a experiência de concertação social na República
Dominicana; b) o momento do processo em que se acordam as regras que devem presidi-lo; c)
quem estabelece a agenda, sua amplitude e a ordem dos temas; e d) o compromisso de
estabelecimento de comissões de supervisão e vigilância dos acordos. Isto é importante para
oferecer às partes uma garantia de os acordados não serão simples papéis com tinta.
RECOMENDAÇÕES
Com base em tudo o que foi exposto, formulam-se as seguintes recomendações:
- Desenhar e aplicar políticas que contribuam para o fortalecimento dos atores sociais, para que estes
gozem de autonomia e capacidade suficientes para assumir e cumprir compromissos no processo de
diálogo e negociação coletiva.
- Desenhar e aplicar políticas que promovam e protejam a liberdade de associação e de negociação.
- Abrir espaços e criar canais de participação que possibilitem a inclusão de todos os setores no
processo de diálogo e concertação, sem que isto vá em detrimento do cenários institucionais de
participação tríplice, que devem conservar sua força.
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- Desenhar uma institucionalidade de diálogo social que incorpore seus interlocutores, especifique as
regras do jogo e contenha mecanismos de acompanhamento, supervisão e controle dos acordos.
- Avançar na busca de instrumentos e mecanismos que permitam incorporar os trabalhadores
excluídos do setor informal à preparação, ao desenho e à execução dos programas que os afetem.
- Desenhar e aplicar política que promovam a organização desses setores.
- Pôr em prática mecanismos específicos de diálogo com os trabalhadores do setor informal.
- Dotar-se de uma organização adequada para abordar a problemática do setor informal por meio de
unidades de pesquisa dos problemas e dinâmicas que o afetam, de modo a poder operar nas mesmas
condições que afetam esse setor.
- Melhorar os meios e o pessoal técnico a fim de avançar na formação de equipes de peritos
conhecedores de todos os aspectos relativos ao funcionamento do mercado de trabalho, incluindo os
processo do setor informal.
- Reforçar mecanismos de controle que assegurem o devido cumprimento das leis trabalhistas e criar
órgãos adequados para a supervisão, a avaliação e o controle dos acordos alcançados em foros de
participação tríplice permanentes ou temporários.
- Zelar pela coordenação vertical e horizontal com as políticas trabalhistas. Além disso, garantir que
os acordos adotados em foros de diálogo social e concertação seja transferidos ao governo para que
tenha efetiva vigência.
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