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Informação Contábil e Risco
Carlos R. Godoy
Resumo:
A informação contábil é normalmente usada para análise do risco de falência e risco de inadimplência. O uso da
informação contábil para cálculo do risco de mercado da empresa tem sido um assunto pouco discutido no mercado e
na academia. Para as empresas que possuem ações negociadas em bolsas de valores o cálculo do risco (beta) e
conseqüentemente do retorno exigido, tem sido feito pelo uso do modelo tradicional de mercado (CAPM), que utiliza
a valorização das ações das empresas e o índice representativo de mercado. Mas, para as empresas que não
negociam suas ações em bolsas, o cálculo através do modelo fornecido pelo CAPM torna-se difícil. Por esse motivo, o
uso das informações contábeis para calcular o risco da empresa pode ser um bom substituto das informações
tradicionalmente exigidas no modelo tradicional de cálculo de risco.
Palavras-chave:
Área temática: CUSTOS E TOMADA DE DECISÕES
VII Congresso Brasileiro de Custos – Recife, PE, Brasil, 2 a 4 de agosto de 2000
INFORMAÇÃO CONTÁBIL E RISCO
Carlos R. Godoy – doutorando em controladoria e contabilidade
Aluno de pós-graduação na FEA.USP
Rua Marta Daher Faiçal, 160 – Jd. São Marcos
S. J. Rio Preto –SP - 15081.350
[email protected]
Área Temática (4): CUSTOS E TOMADA DE DECISÕES
VII Congresso Brasileiro de Custos – Recife, PE, Brasil, 2 a 4 de agosto de 2000
INFORMAÇÃO CONTÁBIL E RISCO
Área Temática (4): CUSTOS E TOMADA DE DECISÕES
RESUMO:
A informação contábil é normalmente usada para análise do risco de falência e
risco de inadimplência. O uso da informação contábil para cálculo do risco de mercado
da empresa tem sido um assunto pouco discutido no mercado e na academia.
Para as empresas que possuem ações negociadas em bolsas de valores o cálculo
do risco (beta) e conseqüentemente do retorno exigido, tem sido feito pelo uso do
modelo tradicional de mercado (CAPM), que utiliza a valorização das ações das
empresas e o índice representativo de mercado. Mas, para as empresas que não
negociam suas ações em bolsas, o cálculo através do modelo fornecido pelo CAPM
torna-se difícil. Por esse motivo, o uso das informações contábeis para calcular o risco
da empresa pode ser um bom substituto das informações tradicionalmente exigidas no
modelo tradicional de cálculo de risco.
Introdução
Uma importante finalidade da analise das demonstrações financeiras e dos
índices é analisar o risco envolvido nas operações da empresa. Através da liquidez,
solvência e lucratividade, a análise das demonstrações financeiras está implicitamente
calçada na probabilidade do fluxo de caixa da empresa atingir um nível mínimo.
Normalmente as análises tradicionais não possibilitam mensurar diretamente esta
incerteza. Algumas pesquisas têm examinado a utilidade da Contabilidade para se
mensurar e predizer o risco. Estas pesquisas podem ser classificadas dentro de três
categorias de risco:
1.
Risco de falência.
2.
Risco de crédito ou inadimplência (default), analisado pelas empresas de ratings.
3.
Risco do patrimônio.
O risco de falência reflete a incerteza sobre a habilidade da empresa em
continuar suas operações, caso sua capacidade financeira atinja um nível mínimo.
Tradicionalmente, o risco de falência é calculado por índices emanados das
demonstrações financeiras ou por modelos que sintetizam em equações a importância de
cada índice ou grupo na análise. Alguns modelos de previsão de falência são bastante
conhecidos e utilizados1 .
O risco de crédito ou inadimplência analisado pelas agências de ratings reflete a
capacidade da empresa em saldar seus compromissos. A forma mais utilizada para
medir o risco de inadimplência de uma empresa é a classificação de seus bônus,
atribuída por uma instituição classificadora independente, com base em informações
privadas e pelas demonstrações financeiras.
O risco do patrimônio é o risco de mercado da empresa. O risco futuro da
empresa diante do mercado é normalmente calculado através das cotações das ações e
do desempenho do mercado de ações. Tradicionalmente, esse tipo de risco é estudado
em Finanças, especificamente na Teoria do Portifólio.
1
Por exemplo os modelos de Altman e de Kanitz, appud: SILVA, J. P. Gestão e Análise de Risco de Crédito. São
Paulo: Atlas, 1977.
2
VII Congresso Brasileiro de Custos – Recife, PE, Brasil, 2 a 4 de agosto de 2000
As informações contábeis obtidas nas demonstrações financeiras são
normalmente usadas para se avaliar o risco de inadimplência e o risco de falência, mas
poucas pesquisas associam as informações contábeis com o risco definido pela teoria
do portifólio. Essa dissociação reflete o fato de que a teoria do portifólio mensura o
risco da empresa com itens determinados pelo mercado (variação do preço das ações),
tradicionalmente conhecido de modelo de mercado.
O propósito deste artigo é procurar mostrar que as informações contábeis podem
ser usadas não só para se avaliar o risco de falência e de inadimplência, bem
desenvolvidos e explorados na literatura contábil e na prática empresarial, mas também
para serem usadas em substituição às cotações de preço das ações no cálculo do risco de
patrimônio ou risco de mercado das empresas, abordado pela teoria do portifólio e pelo
Modelo de Precificação de Ativos de Capital (Capital Asset Princing Model - CAPM).
Para montar um arcabouço teórico e prático que sustente o objetivo deste artigo,
passamos antes a uma breve explanação de alguns conceitos fundamentais da Teoria de
Finanças, especificamente nos objetivos da empresa, no Modelo de Precificação de
Ativos de Capital - CAPM e no conceito de risco.
Os Objetivos da Empresa
Uma empresa pode desejar atingir vários objetivos, todos eles ligados a
continuidade e ao crescimento da entidade. Podemos encontrar objetivos econômicos e
sociais que visam a produção de bens e serviços que promovam a satisfação das
necessidades da sociedade. Também, objetivos próprios que visam o crescimento e
sobrevivência da empresa.
Para muitos autores da área de finanças o objetivo da empresa envolve a busca
da maximização do valor de mercado da empresa. Segundo Van Horne2 :
"... o objetivo da empresa é a maximizar a riqueza de seus acionistas.”
Para Brealey e Myers3 :
“O sucesso é geralmente julgado pelo valor: os acionistas ganham com
qualquer decisão que aumente o valor da sua participação na empresa... O segredo do
sucesso da gestão financeira é o de aumentar o valor.”
No contexto da administração financeira o objetivo da maximização do seu valor
de mercado resulta, conseqüentemente, no aumento da riqueza dos acionistas. Esse
objetivo está calçado na premissa de que se a empresa aumenta o seu valor, os outros
objetivos serão naturalmente alcançados.
Assaf Neto4 corrobora esta idéia quando cita que:
"O objetivo de maximização do valor de mercado de uma empresa, conforme foi
exposto, é conseqüência (resultado) dos vários objetivos que podem ser estabelecidos
para a empresa. Ao adquirir ações, o acionista está, implicitamente, adquirindo
determinado potencial futuro de riqueza. O valor de seu investimento é função de suas
expectativas em relação ao futuro da empresa. Assim, ao transmitir uma imagem
positiva com relação a seu crescimento, independência, rentabilidade, segurança etc., a
empresa estará gerando uma expectativa otimista no mercado, acarretando um
incremento de seu valor e, conseqüentemente, da riqueza de seus proprietários"
O valor de mercado de uma empresa pode ser medido pelo valor de mercado de
suas ações, ou pelo valor presente dos benefícios econômicos futuros de caixa,
representado pela fórmula:
2
VAN HORNE, J. C. Finantial Management and Policy. New Jersey: Prentice-Hall. Tenth Edition, 1995.
BREALEY, R. A. Princípios de Finanças Empresariais. Portugal: M cGraw-Hill, 3ª edição, 1992.
4
ASSAF NETO, ª Estrutura e Análise de Balanços. São Paulo: Atlas, 4 ª edição, 1998. Pág. 45.
3
3
VII Congresso Brasileiro de Custos – Recife, PE, Brasil, 2 a 4 de agosto de 2000
t
ValordaEmp
FCe
esa
T
( 1 WACC
)
t 1
onde,


1.
2.
a)
b)
c)
6.
1)
2)
3)
4)
FCe = fluxo de caixa esperado da empresa no período t.
WACC = (Weighted Average Cost of Capital) custo médio ponderado de
capital = custo do capital próprio x {Patrimônio Líquido / (Dívidas + Patrimônio
Líquido)} + custo de capital de terceiros x {Dívida / (Dívida + Patrimônio Liquido)}.
O Capital Assets Pricing Model (CAPM)
O Capital Asset Pricing Model (CAPM) ou modelo de precificação de ativos de
capital, desenvolvido por diversos autores5 em meados dos anos 60, causou grande
impacto na literatura financeira e contábil6 . O modelo identificou os fatores que
afetavam o valor de mercado dos títulos, especificamente o risco e o fluxo de caixa
esperado da empresa.
O CAPM é muito utilizado em várias operações do mercado de capitais. Com o
modelo é possível apurar a taxa de retorno exigida pelos investidores, usada como custo
de capital próprio da empresa que é utilizado para calcular o custo médio ponderado de
capital (WACC).
Na verdade o CAPM é composto de um conjunto de premissas 7 fundamentais
para seu desenvolvimento, as mais importantes são:
As distribuições das taxas de retornos dos ativos podem ser perfeitamente
descritas pela taxa de retorno esperada e por uma medida de dispersão.
Os mercados são perfeitos, isso significa que:
Nenhum investidor individual pode afetar o preço de mercado de qualquer
ativo e nenhuma empresa é grande o suficiente que possa afetar a oportunidade de um
grupo de investidores.
Não existem custos de transação ou impostos.
Todos ativos são perfeitamente divisíveis.
3. Os investidores são racionais e aversos ao risco.
4. Os investidores assumem que os outros indivíduos agem racionalmente.
5. Todos os investidores têm o mesmo acesso à informação e possuem expectativas
homogêneas.
Existem ativos livres de risco e todos os indivíduos podem obter
empréstimos.
No estudo de avaliação de investimentos e risco é comum que essas hipóteses
sejam consideradas.
Diante dessas premissas, a taxa de retorno esperada de um ativo E(Rj) está em
função:
da taxa de retorno livre de risco, Rf;
da taxa de retorno esperada da carteira de ativos de mercado, E(Rm);
da covariância entre a taxa de retorno de um ativo i e a taxa de retorno de
mercado, COV(Ri, Rm); e
da variância da taxa de retorno de mercado, VAR(Rm).
5
SHARPE, W. F. Capital Assets prices: a Theory of M arket Equilibrium under Conditions of Risk. Journal of
Finance. Sep. 1964. LINTNER, J. "The Valuation of Risk Assets and the Selection of Risky Investments in Stock
Portifolios and Capital Budgets". Review of Economics and Statistics. February 1965. M OSSIN, J. "Equilibrium in a
Capital M arket". Econometrica. October 1966.
6
BALL, R. J. and BROWN, P. "An Empirical Evaluation of Accounting Income Numbers". Journal of Accounting
Reserarch , n. 6 Autumn 1968. Pp. 159-178.
7
Premissas usadas na EM H - Efficient M arkets Hypothesis.
4
VII Congresso Brasileiro de Custos – Recife, PE, Brasil, 2 a 4 de agosto de 2000
Esse modelo estabelece a seguinte fórmula:
E ( Ri )
COV
VAR
Rf
[ E ( Rm )
Ri ]
COV
( Ri , Rm )
VAR ( Rm )
O prêmio pelo risco é composto por duas partes: 1) pelo nível de risco,
; e 2) pelo valor por unidade de risco, E ( Rm ) Rf , idêntico para todos os
( Rm )
( Ri , Rm )
ativos.
O Coeficiente Beta ou Risco Sistemático
O nível de risco calculado pela fórmula
COV
( Ri , Rm )
VAR ( Rm )
na verdade é o coeficiente
angular de uma reta de regressão8 , também conhecido como coeficiente beta ou
simplesmente beta ( ).
No modelo CAPM o beta exprime o risco sistemático de um ativo. Com base
nas hipóteses de mercado eficiente o modelo admite que a carteira de mercado contém
apenas risco sistemático, ou seja, o risco que não pode ser diversificável. Considera-se
que o risco não sistemático ou diversificável é totalmente eliminado pela diversificação
da carteira de ativos de um suposto investidor racional.
Na avaliação do risco de uma carteira o beta é entendido como a média
ponderada de cada ativo contido na carteira, determinado pela seguinte equação:
n
p
j
Wj
j 1
onde:



p é o beta da carteira;
j é o risco sistemático (não diversificável) do ativo j;
Wj é a participação relativa do ativo j na carteira.
Vale notar que quanto maior for o beta, mais elevado será o risco da ação,
conseqüentemente, maior será o seu retorno esperado. Podemos observar essa afirmação
pela equação básica do CAPM:
E ( Ri )
Rf
[ E ( Rm )
Ri ]
COV
( Ri , Rm )
VAR ( Rm )
Ativos com betas igual a 1 possuem o mesmo nível de risco da carteira de
mercado. Ativos com betas maiores que 1 são relativamente mais arriscados que o
mercado, e ativos com betas menores que 1 possuem riscos menores que a carteira de
mercado, então:

se = 1, risco do ativo é igual ao risco de mercado;

se < 1, risco do ativo é menor que o risco da carteira de mercado;

se > 1, risco do ativo é maior que o risco da carteira de mercado.
No cálculo do coeficiente beta, o retorno das ações da empresa é comparado
com os retornos das ações do mercado9 . Um beta mais específico pode ser calculado
8
Para maiores detalhes ver: ASSAF NETO, A. M ercado Financeiro. São Paulo: Atlas, 1999, p. 145.
Covariância do retorno das ações da empresa com o retorno das ações de mercado divido pela Variância do retorno
das ações de mercado. O retorno das ações de mercado pode ser, por exemplo o Ibovespa no Brasil ou Standard and
Poor's - S&P, nos Estados Unidos.
9
5
VII Congresso Brasileiro de Custos – Recife, PE, Brasil, 2 a 4 de agosto de 2000
pelos retornos das ações de empresas que atuam num mesmo setor, formando uma
carteira de mercado mais específica10 .
A taxa de retorno das ações de uma empresa para um período qualquer é uma
função do fluxo de caixa realizado da empresa para aquele período. Conseqüentemente,
o beta da empresa pode ser expresso como uma função da covariância entre o fluxo de
caixa da firma e índice do fluxo de caixa de mercado 11 .
O Lucro Contábil e o Preço das Ações
Diversos estudos realizados investigaram que os lucros contábeis são
empiricamente relacionados com os preço das ações.
O estudo pioneiro sobre a relação dos lucros contábeis com o preço das ações foi
realizado por Ball e Brown12 . Esse estudo culminou com a popularização da teoria
positiva e da metodologia científica na Contabilidade. Para o estudo foram adotadas as
hipóteses de mercado eficiente (EMH), o estudo concluiu que evidências comprovaram
que alterações nos preços das ações de um dado período (por exemplo, trimestre ou ano)
estão associadas com o movimento e a magnitude dos lucros para aquele período. Dada
as hipóteses do mercado eficiente (EMH), essa evidência é consistente com as hipóteses
de que os lucros contábeis refletem fatores que afetam os preços das ações, ou seja, os
lucros anunciam as futuras alterações nos preços das ações.
Estudos concluíram que os retornos anormais estão muito mais associados com
os lucros do que com o fluxo de caixa operacional13 . Dada a EMH e o CAPM, isso
sugere que o lucro contábil é um bom indicador do fluxo futuro de caixa.
A Segmentação do Risco Empresarial
Verificamos no item anterior que o risco de qualquer ativo é composto por uma
parte sistemática (não diversificável) e outra parte não sistemática (diversificável). O
risco sistemático é determinado pela conjuntura (por exemplo, oscilações na economia),
por isso ele não é diversificável, seu grau independe das decisões da empresa, pois é
inerente a todas(os) a(o)s empresas (ativos) do mercado. Já o risco não sistemático esta
diretamente relacionado às decisões da própria empresa. Portanto:
Risco Total = Risco Sistemático + Risco Não Sistemático
O risco de uma empresa é segmentado em duas grandes partes, risco operacional
ou econômico e risco financeiro. Segundo Assaf Neto14 :
"O risco operacional é derivado do ativo da empresa, da natureza de sua
atividade. Reflete a estabilidade dos negócios da empresa diante do comportamento da
conjuntura econômica".
"Por outro lado, o risco financeiro é determinado pelo endividamento da
empresa".
10
Um beta mais específico poderia ser calculado, por exemplo, pelos retornos das ações da indústria de construção
civil, formando o retorno de mercado da indústria de construção civil.
11
WATTS, R. L. and ZIM M ERM AN, J. L. Positive Accounting Theory. New Jersey: Prentice-Hall, 1986. Pág. 118.
12
BALL, R. J. and BROWN, P. op. Cit.
13
Entre os estudos estão o de: BALL, R. J. and BROWN, P. Op. Cit. BEAVER and DUKES. "Interperiod Tax
Allocation, Earnings Expectation, and the Behavior of Security Prices". Accounting Review. n. 48, April 1972.
PATELL, J. M . and KAPLAN, R. "The Information Content of Cash Flow Data Relative to Annual Earnings".
Unpublished working paper. Palo Alto, Califórnia: Stanford University, August 1977. (appud: WATTS, R. L. and
ZIM M ERM AN, J. L. Positive Accounting Theory. New Jersey: Prentice-Hall, 1986.
14
ASSAF NETO, A. Estrutura e Análise de Balanços - Um Enfoque Econômico - Financeiro. São Paulo: Atlas, 1998,
4ª edição.
6
VII Congresso Brasileiro de Custos – Recife, PE, Brasil, 2 a 4 de agosto de 2000
Com isso podemos concluir que uma empresa pode não incorrer em risco
financeiro. Mas como?
Tendo em sua estrutura de capital apenas capital próprio. Entretanto, ela
dificilmente estará livre do risco operacional, determinado: 1) pela conjuntura
(alterações na economia e tecnologia); 2) pelo mercado (concorrência); e 3) pela gestão
da empresa (custos, preços, investimentos e distribuição). Portanto:
Risco Total (empresa) = Risco Operacional + Risco Financeiro
Refletindo sobre os conceitos descritos, podemos ver que o risco operacional
contém uma parte que é sistemática (por exemplo, a economia) e outra parte não
sistemática (por exemplo, a gestão da empresa). O risco financeiro pode conter uma
parte não sistemática, relacionada a decisão inicial de endividamento, e diante desta
decisão incorrer num risco sistemático, advindo, por exemplo, da flutuação da taxa do
câmbio num financiamento em moeda estrangeira.
O Beta Contábil e a Estrutura de Capital
O lucro contábil é um bom indicador do fluxo futuro de caixa da empresa, então
poríamos usá-lo como um substituto do fluxo de caixa? Se isso for verdade, poderíamos
usar o lucro contábil para calcular um beta contábil, calculado pela covariância entre os
lucros da empresa e dos índices de lucros do mercado, dividida pela variância do índice
de lucros do mercado. Criaríamos um substituto ao beta ( ) da empresa calculado pelo
modelo tradicional de mercado.
COV
contábil
( lce , lcm )
VAR ( lcm )
onde,


= beta contábil;
COV(lce, lcm) = covariância entre o lucro contábil da empresa e o índice de
mercado dos lucros contábeis;

VAR(lcm) = variância do índice de mercado dos lucros contábeis.
Watts e Zimmerman15 mencionam que dados contábeis podem ser usados para
estimar o beta de empresas que não possuem ações negociadas no mercado.
Portanto, as variações nos lucros contábeis podem ser úteis para estimar o beta
da empresa. Em empresas não alavancadas (ausência de dívidas na estrutura de capital)
o beta da empresa é igual ao beta das ações. Entretanto, se a empresa possuir dívidas o
beta é diferente do beta das ações. Nesse caso a alavancagem financeira da empresa
(presença de dívidas na estrutura de capital) deve afetar o beta das ações, e por essa
razão a alavancagem deve ser usada na estimação do beta da empresa.
Na ausência de impostos, hipótese do CAPM, a relação dos betas da ação, a, das
dívidas, d, e da empresa, e, pode ser descrita pela equação:
contábil
e
D
E
d
A
E
a
onde,


e:
é o risco da empresa, calculado pela média ponderada dos betas das ações
e das dívidas;
D: é valor de mercado das dívidas;
15
WATTS, R. L. and ZIM M ERM AN, J. L. Positive Accounting Theory. New Jersey: Prentice-Hall, 1986. Pág. 118.
7
VII Congresso Brasileiro de Custos – Recife, PE, Brasil, 2 a 4 de agosto de 2000


A: é valor de mercado das ações; e
E: D + A = valor total da empresa.
Rearranjando a equação, temos:
a












e
D
A
(
e
d
)
Na ausência de impostos, hipótese do CAPM, o valor da empresa independe de
sua estrutura de capital16 . Desse modo, o beta da empresa é independente da
alavancagem financeira. Contudo, o aumento da alavancagem aumenta o beta das ações
da empresa, desde que o beta da empresa seja maior que o beta da dívidas. Podemos
testar estas afirmações com um exemplo simples.
Suponha que a empresa X apresente os seguintes números:
Estrutura 1- ausência de dívidas:
Valor de mercado das dívidas = 0,0 (isso irá definir futuramente a
alavancagem financeira).
Valor de mercado das ações = 5.000 (diferença entre o valor de mercado da
empresa e das dívidas).
Valor de mercado da empresa (ativo) = 5.000 (já que na ausência de
impostos o valor da empresa independe da forma como ela é financiada, vamos manter
o seu valor inalterado, alterando somente a estrutura de capital).
s = 1,5.
d = 0,0 (o beta das dívidas tende normalmente a 0, devido a ausência de
17
risco , mas poderemos atribuir em algum momento deste exemplo um valor ao beta das
dívidas apenas para exemplificar a relação dos números).
Estrutura 2 - presença de dívidas:
Valor de mercado das dívidas = 1.000.
Valor de mercado das ações = 4.000.
Valor de mercado da empresa (ativo) = 5.000.
Beta das dívidas = 0,01.
Estrutura 3: beta da dívidas maior que o beta das ações:
Beta das dívidas = 1,70.
Estrutura 4: aumento no valor das dívidas:
Valor de mercado das dívidas = 3.500.
Valor de mercado das ações = 1.000.
Usando as equações apresentadas teríamos em cada estrutura os valores
apresentados no quadro 1:
16
M ODIGLIANI, F. and M ILLER, M . H. "The Cost of Capital, Corporation Finance and Theory of Investment",
American Economic Review 48. June 1958. "Corporate Income Taxes and the Cost of Capital: A Correction".
American Economic Review 53. June 1963.
17
BREALEY, R. ª and M YERS, S. C. Princípios de Finanças Empresariais. Portugal: M cGraw-Hill, 1988, 3ª edição,
pág. 191.
8
VII Congresso Brasileiro de Custos – Recife, PE, Brasil, 2 a 4 de agosto de 2000
QUADRO 1
ESTRUTURA DE CAPITAL E RISCOS DA EMPRESA X
Estrutura 1
Dívidas
Ações
D+A=E
BETA Ações
BETA Dívidas
BETA Empresa
5.000
5.000
1,50
1,50
Estrutura 3
Dívidas
Ações
D+A=E
BETA Ações
BETA Dívidas
BETA Empresa
1.000
4.000
5.000
1,45
1,70
1,50
Estrutura 2
Dívidas
Ações
D+A=E
BETA Ações
BETA Dívidas
BETA Empresa
1.000
4.000
5.000
1,87
0,01
1,50
Estrutura 4
Dívidas
Ações
D+A=E
BETA Ações
BETA Dívidas
BETA Empresa
3.500
1.500
5.000
1,03
1,70
1,50
Estrutura 5
Dívidas
Ações
D+A=E
BETA Ações
BETA Dívidas
BETA Empresa
3.500
1.500
5.000
4,98
0,01
1,50
Comentários:
Estrutura 1:

Apresenta os dados iniciais do exemplo. O beta das ações é igual ao beta da
empresa (ativo), 1,50.
Estrutura 2:

O efeito da alavancagem financeira não alterou o beta da empresa.

A alavancagem financeira aumentou o beta das ações, passando de 1,50
(estrutura 1) para 1,87 (estrutura 2). Note que o beta da empresa, 1,50 era maior que o
beta das dívidas, 0,01.
Estrutura 3:
A alavancagem financeira diminuiu o beta das ações, passando de 1,87
(estrutura 2) para 1,45 (estrutura 3). Note que aqui o beta da empresa, 1,50 é menor que
o beta das dívidas 1,70.
Estrutura 4:

O beta das ações subiu de forma elevada, pois o beta da empresa apresentase maior que o beta das dívidas.

9
VII Congresso Brasileiro de Custos – Recife, PE, Brasil, 2 a 4 de agosto de 2000
Numa suposta estrutura 5 (quadro 1), o beta das dívidas próximo de 0, igual à
estrutura 2 e o beta da empresa maior que o beta das dívidas. Nessa estrutura com o
aumento acentuado das dívidas o beta das ações diminuiu de forma acentuada chegando
a 4,98.
Portanto, a estrutura de capital não altera o risco da empresa, e o risco (beta) das
ações varia negativamente ou positivamente com a alavancagem financeira.
Risco das Empresas através dos Lucros Contábeis
Para calcular o risco de uma empresa (beta) através dos lucros contábeis deve-se
usar a fórmula tradicional do modelo de mercado. A fórmula do beta contábil nesse caso
seria:
COV
contábil
( lce , lcm )
VAR ( lcm )
onde:

lce: lucro contábil da empresa, e

lcm: lucro contábil de mercado.
O lucro contábil da empresa e do mercado se referem, respectivamente, as
variações nos lucros da empresa e as variações nos lucros de mercado.
O beta contábil de uma empresa é calculado conforme o quadro 2 apresentado a
seguir:
QUADRO 2
EMPRESA X S.A.
PER
95
96
97
98
MÉDIA MD
BETA
A
B
EMPRESA X MERCAD
O
20,0%
18,0%
10,0%
11,0%
12,0%
11,0%
16,0%
14,0%
0,145
0,135
Cov(vl,mc)
Var(mc)
0,004
0,003
C
A-MD
D
B-MD
E
(C x D)
F
QD D
0,055
-0,045
-0,025
0,015
0,045
-0,025
-0,025
0,005
0,002
0,001
0,001
0,000
0,004
0,002
0,001
0,001
0,000
0,003
Cov(vl,mc)
Var(mc)
1,30
Na composição dos cálculos apresentados no quadros 2 temos:
Coluna A: variação dos lucros da empresa.
Coluna B: variação dos lucros do setor (mercado).
Coluna C: variação do lucro da empresa menos a média das variações do
lucro da empresa.

Coluna D: variação do lucro do setor menos a média das variações do lucro
do setor.

Coluna E: multiplicação das diferenças encontradas nas colunas C e D. O
somatório da coluna representa a covariância entre os lucros da empresa e do mercado.

Coluna F: quadrado das diferenças encontradas na coluna D. O somatório da
coluna representa a variância dos lucros do setor (mercado).



10
VII Congresso Brasileiro de Custos – Recife, PE, Brasil, 2 a 4 de agosto de 2000
Portanto, a divisão da covariância entre os lucros da empresa e do mercado pela
variância dos lucros do setor é igual ao beta contábil da empresa.
Caso a taxa livre de risco em um mercado seja de 6%, e o retorno médio de
mercado seja de 15%, o custo de capital (retorno exigido) da empresa X é calculado por:
E ( Ri )
Rf
E ( Ri )
[ E ( Rm )
6%
E ( Ri )
[15 %
Ri ]
COV
( lce , lcm )
VAR ( lcm )
6 %] x 1 , 30
17 , 7 %
Vale lembrar que:
empresas com betas igual a 1 possuem o mesmo risco do setor. Empresas
com betas maiores que 1 são relativamente mais arriscadas que o setor (agressivas); e
empresas com betas menores que 1, possuem riscos menores que o setor (defensivas).

Se a empresa utiliza apenas capital próprio esse valor encontrado é o custo
de capital da empresa.

Se a empresa utiliza capital de terceiros esse valor servirá para alimentar o
cálculo do custo médio ponderado de capital (WACC).

Conclusão
Os modelos básicos de avaliação de empresa calculados pelo fluxo de caixa
descontado, podem ser usados em qualquer tipo de empresa, empresas de capital aberto
ou de capital fechado. Porém, alguns problemas podem aparecer na avaliação de
empresas fechadas: a) a estimação da taxa de desconto dos fluxos de caixa 18 ; e b) a
estimação dos fluxos de caixa.
O fluxo de caixa pode ser estimado pelos lucros da empresa, e a taxa de
desconto que é normalmente calculada pelo modelo de mercado do CAPM pela
fórmula:
Re
Rf
( Rm
Rf )
COV
( Rj , Rm )
VAR ( Rm )
onde,




Re = retorno exigido.
Rf = retorno livre de risco.
Rm = retorno de mercado.
COV ( Rj , Rm )
beta da empresa das ações.
VAR ( Rm )
Por não terem ações negociadas em bolsas, o beta de empresas de capital
fechado pode ser calculado através dos lucros contábeis. Para Watts e Zimmerman19 os
dados contábeis são úteis para estimar o beta das empresas, não somente para empresas
de capital fechado, mas também para empresas de capital aberto, cujos betas das ações
são calculados pelo modelo de tradicional de mercado.
Bibliografia
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ASSAF NETO, A. Mercado Financeiro. São Paulo: Atlas, 1999. Pág. 145.
18
DAM ODARAN, A. Damodaran on Valuation - Security Analysis for Investment and Corporate Finance. New
York: John Wiley & Sons, Inc. 1994.
19
WATTS, R. L. and ZIM M ERM AN, J. L. Op. Cit. Pág. 120.
11
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12
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