Notas de aula Uma maneira simples de se demonstrar que gama de meio é raiz de Pi Rodrigo Marín1 Para demonstrar (5), usaremos como auxílio outra fun- Universidad de Santiago de Chile ção famosa, a função beta. Após sua definição, estabeleceremos a relação entre essa função e a função gama. A A função beta toma pares (u, v) de números positivos função gama Γ : (0, +∞) → R se define, para e leva a valores reais, pela fórmula p > 0 não necessariamente inteiro, por Γ( p) = ∞ 0 x p −1 − x e dx . β(u, v) = (1) ∞ x u −1 dx . (1 + x ) u + v 0 (6) É um exercício dos cursos de cálculo mostrar que essa Mostrar a convergência da integral para u > 0 e v > 0 integral está bem definida, para todo p > 0 (pois o de- é também um exercício de cálculo (note que perto de crescimento exponencial sempre domina o crescimento zero o integrando diverge apenas se u < 1, mas domi- polinomial). nado por uma potência com expoente entre −1 e 0; o A função gama tem uma propriedade recursiva notá- que notadamente implica a convergência da integral; e vel. Para todo p > 0, mediante integração por partes, p − x ∞ 1 ∞ p −x x e Γ( p) = + x e dx p p 0 0 (2) 1 = · Γ ( p + 1) , p que perto de infinito a convergência é garantida porque a potência dominante do denominador é estritamente maior do que a potência do numerador mais um). Pela substituição de variáveis x = β(u, v) = isto é, (3) Γ ( p + 1) = p Γ ( p ) . ∞ −x Em particular, como Γ(1) = 0 e dx = 1, a recorrên- yu−1 (1 − y)v−1 dy , 0 (7) definida). Lema 1. Para quaisquer u > 0 e v > 0, (4) β(u, v) = para todo inteiro n positivo. Nesta nota, demonstraremos que √ 1 Γ( ) = π , 2 se chega a que é outra forma como a função beta é conhecida (ou cia (3) implica Γ ( n ) = ( n − 1) ! , 1 y 1− y Γ(u)Γ(v) . Γ(u + v) (8) Demonstração. Em primeiro lugar, notemos o que faz a substituição de variáveis x = ay, para a > 0, na integral (5) (1) que define a função gama. É fácil ver que obtemos o que permite calcular imediatamente, usando (3), to- Γ( p) = a p dos os valores Γ(n + 12 ), com n 0. ∞ 0 y p−1 e− ay dy , (9) A demonstração da igualdade (5) será feita apenas para qualquer p > 0. Isto nos dá uma maneira alter- com as ferramentas usuais dos dois ou três primeiros nativa para escrevermos a potência negativa de um nú- semestres dos cursos de cálculo. mero positivo a: 1 O autor foi orientado por seu professor, Rafael Labarca, na redação a− p = deste artigo. 1 14 Matemática Universitária nº47 1 Γ( p) ∞ 0 x p−1 e− ax dx . (10) {Notas de aula} Em seguida tomamos como ponto de partida a pró- Usando (8), (3) e (4), chegamos em pria definição da função beta em (6) para obter Γ ( 1 )2 π = 2 , 8 8 Γ(u + v) β(u, v) ∞ y u −1 = Γ(u + v) dy u+v 0 (1 + y ) ∞ ∞ x u+v−1 yu−1 e−(1+y) x dx dy , = de onde resulta a igualdade procurada. (11) Rodrigo Marín 0 0 (17) sendo que na passagem entre a segunda e a terceira linhas aplicamos a fórmula (10) com a = 1 + y e p = u + v ao denominador da integral. A integral iterada da terceira linha é finita (pois é igual a β(u, v)) e tem integrando positivo, logo, pelo Teorema de Fubini, podemos mudar a ordem de integração, obtendo Γ(u + v) β(u, v) ∞ = x u + v −1 0 ∞ 0 yu−1 e−(1+y) x dy dx . Chamemos de Y a integral interna ∞ 0 (12) yu−1 e−(1+y) x dy de (12). Fazendo a substituição de variáveis t = xy, obtemos Y = x −u e− x ∞ 0 tu−1 e−t dt = x −u e− x Γ(u) . (13) Inserindo (13) em (12), resulta ∞ Γ(u) β(u, v) = x v−1 e− x dx Γ(u + v) 0 Γ(u)Γ(v) = , Γ(u + v) (14) como queríamos demonstrar. Sabemos que a área delimitada por uma semicircunferência de raio 1 2 é π 8. A equação de uma tal semicircun- ferência, centrada em ( 12 , 0), é 1 1 ( x − )2 + y2 = , 2 4 (15) implicando que sua área é a integral, no intervalo [0, 1], da função y = x (1 − x ). Portanto 1 π = x (1 − x ) 8 0 = 1 0 3 3 x 2 −1 (1 − x ) 2 −1 dx (16) 3 3 = β( , ) . 2 2 2 Matemática Universitária nº47 15