INFECÇÕES POR BACTÉRIAS GRAM NEGATIVAS EM PACIENTES ADULTOS HOSPITALIZADOS POR QUEIMADURA EM UNIDADE DE TERAPIA INTENSIVA Otávio Delgado Tavela (bolsista CNPq), Cintia Magalhães Carvalho Grion (orientadora) e-mail: [email protected] Universidade Estadual de Londrina/Departamento de Clinica Médica/CCS. Área e sub-área do conhecimento: Medicina/Clinica Médica. Palavras-chave: Queimaduras; unidades de queimados; bactérias gramnegativas. Resumo As complicações infecciosas demandam atenção prioritária no manejo de pacientes vítimas de queimaduras. Entre elas, as causadas por bactérias gram negativas se destacam por serem as mais prevalentes. Considerando a importância do tema, o presente estudo teve como objetivo quantificar os casos de infecção por bactérias gram negativas em pacientes queimados. Foi realizado estudo longitudinal retrospectivo com pacientes internados no Centro de Tratamento de Queimados no Hospital Universitário Regional do Norte do Paraná (HURNP), Londrina-PR. O período de inclusão de pacientes no estudo foi de janeiro de 2009 a dezembro de 2013, e foram excluídos os pacientes menores de 18 anos de idade. Dados completos foram coletados de todos os pacientes inseridos no estudo até o desfecho hospitalar. A análise foi feita utilizando-se o programa EpiInfo 7, e revelou predomínio de infecções causadas por microrganismos gram negativos em comparação a outras etiologias de infecção. Foram analisados 264 pacientes infectados, a maioria do sexo masciluno e com média de idade de 41,14 anos (DP 16,12). Destes, 160 (60,6%) desenvolveram ao menos uma infecção causada por microrganismo gram negativo, entre os quais 61,31% apresentaram resistência a antimicrobianos. As infecções por gram negativos estiveram ainda ligadas a maior número de óbitos, desenvolvimento de choque séptico e necessidade de ventilação mecânica. Concluiu-se tais infecções foram frequentes entre os pacientes queimados que apresentaram complicações infecciosas, e que sua ocorrência esteve associada com características clínicas de maior gravidade e pior prognóstico. 1 Introdução e objetivo Sabe-se que o paciente queimado apresenta grande suscetibilidade a desenvolver infecção, fato atribuído a complicações intrínsecas à queimadura, ao longo período de internação e à necessidade recorrente de procedimentos invasivos diagnósticos e terapêuticos (MACEDO JLS, SANTOS JB. 2006). Além disso, as infecções em pacientes queimados são responsáveis por aproximadamente 75% do total de óbitos nesses indivíduos (REMPEL LCT et al., 2011). Neste contexto, as bactérias gram negativas assumem importância significativa, uma vez que são responsáveis por aproximadamente 60% dos quadros infecciosos, além de predominarem nos primeiros dias que se seguem à queimadura (AZZOPARDI EA et al., 2014). Este estudo tem como objetivo avaliar os aspectos epidemiológicos de infecções por bactérias gram negativas em pacientes adultos hospitalizados por queimaduras em uma unidade de terapia intensiva de centro de tratamento especializado de um hospital universitário público. Procedimentos metodológicos Foi realizado estudo longitudinal retrospectivo de pacientes na Unidade de Terapia Intensiva do Centro de Tratamento de Queimados do Hospital Universitário/ Universidade Estadual de Londrina (HU/UEL), com amostragem de conveniência de todos os pacientes adultos vítimas de queimaduras internados no período de janeiro de 2009 a dezembro de 2013. Foram coletados, à admissão do paciente, dados clínicos e demográficos, de diagnósticos primários e secundários, sobre o tipo e extensão da queimadura e sobre o agente causal, queimadura e sobre o agente causal, além de dados para cálculo do escore de gravidade de doença Acute Physiology and Chronic Health Evaluation (APACHE II); escore de disfunção orgânica Sequencial Organ Failure Assessment (SOFA); e índice de gravidade ABSI (Abbreviated Burns Severity Index). Coletaram-se ainda dados sobre o diagnóstico de infecção de cada paciente, com data de coleta e positividade de culturas, material de cultura analisado, teste de sensibilidade a antimicrobianos, sítio de infecção e presença de critérios diagnósticos de sepse. Todos os dados do estudo foram obtidos do prontuário dos pacientes. Os resultados foram descritos pela média, desvio padrão e o teste t de Student foi utilizado para comparação. Os dados categóricos foram apresentados como frequência e apresentados em tabelas, e analisados com o teste de qui-quadrado. O nível de significância utilizado foi de 5% e as análises foram realizadas utilizando-se o programa EpiInfo 7, versão 3.5.4., julho de 2012 (CDC, USA). O projeto principal vinculado a este estudo foi aprovado pelo comitê de ética em pesquisa local sob o parecer CEP nº 041/2013, CAAE no 13327013.8.0000.5231. 2 Resultados e Discussão Foram analisados 264 pacientes infectados, com média de idade de 41,14 anos (DP 16,12), dos quais 160 (60,6%) desenvolveram ao menos uma infecção causada por micro-organismo gram negativo, coincidindo com o estudo realizado em 2014 por Azzopardi. Entre as internações, pacientes do sexo masculino constituíram maioria, com 169 (64,0%) internações. A etiologia principal da queimadura foi chama direta (76,9%). Feita a análise apenas entre culturas em que foram isoladas bactérias gram negativas, chegou-se ao número de 305 microrganismos isolados, de 17 gêneros diferentes. Acinetobacter sp. mostrou-se o mais encontrado (33,44%), seguido de Pseudomonas sp. (20%), Klebsiella sp. (12,45%), Enterobacter sp. (9,83%), E. coli (6,55%) e outros em menor número. O principal foco infeccioso foi o pulmão, com um total de 142 (46,55%), seguido dos focos urinário (25,25%) e de pele e partes moles (21,63%). Bacteremias e infecções de corrente sanguínea associadas a cateter somaram 4,59%, com um total de casos de 10 e 4, respectivamente, e outros focos foram responsáveis por 1,96% do total de infecções. Multirresistência a antimicrobianos foi achado frequente: 61,31% microrganismos multirresistentes, quando feita análise com antibiograma. Quanto à classe de carbapenêmicos, encontrou-se resistência em 39,34% culturas. A tabela 1 mostra os fatores de risco encontrados para desenvolver ao menos uma infecção por gram negativo. Tabela 1 – Comparação das características clínicas e desfechos dos pacientes queimados com infecções por microrganismos gram negativos e outras etiologias infecciosas Variável MO gram Outros MO Valor de p negativo Idade (anos) 40,45 (DP 16,00) 42,57 (DP 15,94) p = 0,29 65% 62,5% p = 0,38 APACHEII* 17,82 (DP 9,14) 12,75 (DP 7,29) p < 0,001 SOFA* admissão 6,16 (DP 6,61) 3,31 (DP 3,51) p < 0,001 ABSI* 7,78 (DP 2,01) 6,62 (DP 2,01) p < 0,001 SCQ* total (%) 32,06 (DP 17,29) 22,32 (DP 13,55) p < 0,001 Lesão inalatória 46,3% 23,1% p < 0,001 Ventilação 74,4% 36,5% p < 0,001 Gênero masculino 3 mecânica Dias em VM 26,57 (DP 22,73) 18,39 (DP 16,95) p = 0,02 Choque séptico 56,9% 31,7% p < 0,001 Óbito 48,8% 21,2% p < 0,001 Fonte: o próprio autor MO = microorganism; APACHE II = Acute Phisology and Chronic Health Evaluation; SOFA = Sequential organ failure assessment; ABSI = Abbreviated Burn Severity Index; SCQ = superfície corporal queimada; VM = ventilação mecânica. As variáveis contínuas estão expressas como média (desvio padrão – DP). Avaliaram-se fatores de risco para morte em análise selecionada do grupo com infecção por gram negativa. As médias de idade e de superfície corporal queimada total mostraram-se mais altas no grupo dos não sobreviventes: 46,02 (DP 16,11) e 36,65% (DP 18,75), respectivamente. Lesão inalatória esteve presente em 60,3% dos não sobreviventes, e 78,2% dos não sobreviventes apresentaram choque séptico. A média dos escores prognósticos também se relacionaram à maior ocorrência de óbito. Houve ainda relação do desfecho estudado com a necessidade de ventilação mecânica – todos os pacientes que evoluíram a óbito necessitaram de ventilação mecânica. Conclusão A frequência de infecções por microrganismos gram negativos entre os pacientes que apresentaram complicações infecciosas é alta. Além disso, a ocorrência dessas infecções esteve associada a características clínicas de maior gravidade e pior prognóstico, além de multirresistência a antimicrobianos. Referências AZZOPARDI, EA. et al. Gram Negative Wound Infection in Hospitalised Adult Burn Patients: Systematic Review and Metanalysis. [S. l.: s. n.], 2014. MACEDO, JLS.; SANTOS, JB. Complicações infecciosas em pacientes queimados. Rev. Soc. Bras. Cir. Plást [S. l.: s. n.], 2006. REMPEL, LCT.; TIZZOT, MRPA.; VASCO JFM. Incidence of bacterial infections in burn patients undergoing treatment at university hospital in Curitiba. Rev Bras Queimaduras [S. l.: s. n.], 2011. 4