Coluna Agronegócios E Novos biocombustíveis: ficção científica? m primeiro lugar, os conceitos de gerações de biocombutíveis: 1ª geração: é a geração atual, composta, principalmente, pelo etanol, biodiesel e biogás (proveniente de biodigestores); 2ª geração: são biocombustíveis obtidos por novas técnicas de processamento, a partir de matéria-prima já existente. O exemplo mais conhecido é o etanol celulósico; 3ª geração: serão obtidos biocombustíveis através de novas técnicas de processamento, resultantes de aprimoramentos da 2ª geração, porém, sua grande marca será a utilização de matérias-primas específicas. Um bom exemplo são os biocombustíveis a serem obtidos de microalgas melhoradas para obtenção de energia; 4ª geração: plasma à 2ª e à 3ª geração, Avanços da 2ª geração Pesquisa conduzida no Califórnia Institute of Technology permitiu obter 15 catalisadores enzimáticos, altamente termoestáveis, que desconstruíram eficientemente a celulose a açúcares, sob altas temperaturas. O material genético foi sintetizado em Saccharomyces cerevisae, a partir de genes obtidos dos fungos Humicola insolens, H. jecorina e Chaetomium thermophilum. A inovação está na notável estabilidade térmica, permitindo degradar celulose em um variado leque de condições, tanto de ambiente quanto de matéria-prima. A termoestabilidade é uma característica de celulases eficientes, pois em temperaturas mais altas - entre 70ºC e 80ºC - as reações químicas são mais rápidas. Como a celulose “incha” em altas temperaturas, é mais fácil quebrar a sua cadeia, por ataque enzimático. de milho em produtos tão valiosos como os grãos. A inovação está no seu genoma, que incorporou enzimas celulases na planta de milho. Esta variedade é o exemplo concreto do conceito de 3ª geração de biocombustíveis, ou seja, matéria-prima inovadora, que soluciona problemas tecnológicos industriais, questões ambientais e econômicas. Como o milho transgênico da MSU já contém as enzimas necessárias para degradação da celulose, após a colheita da biomassa (ou seja, a planta inteira), as celulases degradam o material celulósico a monossacarídeos, que são fermentados a etanol ou outro biocombustível mais avançado. Obviamente, estudos serão necessários para definir quanta biomassa será possível exportar e quanta deverá permanecer no campo, para reciclagem de nutrientes e para manutenção do teor de matéria orgânica do solo. Até o final desta década, assistiremos a uma verdadeira revolução na indústria de biocombustíveis, com um forte impacto mercadológico no agronegócio e no estilo de vida com otimização do balanço energético, integração de processos, conjugados com captura e estocagem do gás carbônico resultante do processo de obtenção. O etanol de primeira geração resulta da fermentação de sacarídios de baixo peso molecular, usando cepas melhoradas de microrganismos encontrados na natureza. Exceção feita à cana-de-açúcar, restrições são apostas ao etanol obtido de outras matériasprimas (produto caro, compete com produção de alimentos, baixa eficiência energética, alto fluxo de carbono etc). Entretanto, os resíduos agrícolas, compostos de celulose, poderiam solucionar estes problemas. Porém, a celulose é muito mais difícil de degradar a açúcares simples, fermentáveis, do que o amido. Além disso, enquanto a fermentação do amido de milho só precisa de uma enzima, a degradação da celulose requer uma série de enzimas, trabalhando em conjunto. Adicionalmente, para cada matéria-prima com arranjo celulósico diferente, são necessárias enzimas diferentes e condições de reação específicas. As celulases naturais são inativadas acima de 50ºC. As enzimas altamente termoestáveis também duram por um longo tempo, mesmo em temperaturas baixas. Enzimas mais duradouras quebram mais celulose, reduzindo a necessidade de reposição, logo seus custos são mais baixos. A sequência genética das enzimas foi desenhada pelo computador e sintetizada em laboratório. Posteriormente, foram transferidas para o fermento Saccharomyces cerevisae, que transforma os açúcares em etanol. A levedura transgênica produziu as novas enzimas, que comprovaram a sua capacidade e sua eficiência para degradar celulose. Este trabalho demonstrou o que é possível fazer através da biologia sintética. Sem recorrer a qualquer organismo vivo – sequer os fungos que tiveram as sequências genéticas copiadas – foi possível resolver uma série de problemas que vinham se constituindo em barreiras ao avanço dos processos de obtenção do etanol celulósico, de forma competitiva. Avanços da 3ª geração Uma nova variedade de milho (Spartan Corn), desenvolvida por cientistas do Michigan State University, torna as folhas e caules Outros exemplos da terceira geração de biocombustíveis são árvores cujo teor e estrutura de lignina foram artificialmente enfraquecidos e reduzidos, que se desintegram facilmente através de técnicas já dominadas industrialmente. Plantas com baixo teor de lignina estão sendo desenvolvidas por vários institutos de pesquisa, entre eles o laboratório do pai da engenharia genética de plantas, Marc van Montagu, da Universidade de Ghent, na Bélgica, que trabalha com o gênero Populus. Ainda existem problemas tecnológicos a serem superados. Porém, as inovações que brotam a todo o instante dos laboratórios de pesquisa e, principalmente, os avanços alentadores que se observam na fase pré-industrial, ou no lançamento de novas variedades, reforçam minha tese de que, até o final desta década, assistiremos a uma verdadeira revolução na indústria de biocombustíveis, com um forte impacto mercadológico no agronegócio C e no estilo de vida da sociedade. Décio Luiz Gazzoni Engenheiro agrônomo, membro do Painel Científico Internacional de Energia Renovável do Conselho Internacional de Ciências http://dlgazzoni.sites.uol.com.br www.revistacultivar.com.br • Outubro 2010 49