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A RESPONSABILIDADE DO ESTADO ENQUANTO PROVEDOR DE POLÍTICAS PÚBLICAS E O SERVIÇO
SOCIAL: ASPECTOS POLÊMICOS
Cleusimar Cardoso Alvesi
Taisa Alves Silva Vilelaii
Elizangela Pimenta Rodrigues iii
RESUMO
Este artigo propõe uma reflexão sobre a responsabilidade do Estado enquanto provedor de
Políticas Públicas e a atuação dos assistentes sociais nessas políticas, tendo como objetivo,
promover ponderações a respeito das configurações assumidas pelo Estado no contexto
histórico, das respostas dadas no enfrentamento da questão social, do processo de
constituição e desenvolvimento das políticas sociais na sociedade capitalista
contemporânea. Pois, no que tange ao grande capital, a atuação do Estado está direcionada
por uma política econômica de cunho neoliberal e se propõe a oferecer a população usuária,
somente os mínimos sociais. A metodologia utilizada foi o método histórico-dialético, sendo
feito um estudo teórico, que envolveu um levantamento bibliográfico. Assim, o mesmo
desenvolveu-se através de livros, revistas, periódicos, observando os diferentes pontos de
vista acerca do tema, sendo referenciado pelos seguintes autores: Pereira (2002, 2008),
Behring & Boschetti (2009), Netto (2005), Iamamoto (2004); Raichelis (2007), entre outros.
Palavras-chave: Estado, Welfare State, políticas sociais, Serviço Social.
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INTRODUÇÃO
Na atual conjuntura, vivencia-se uma regressão dos direitos e destruição do legado
das conquistas históricas dos trabalhadores, em nome da defesa do grande capital. Assim
sendo, intensifica-se a investida contra a organização coletiva de todos aqueles que,
destituídos de propriedade, dependem das políticas públicas para sobreviverem.
Por isso, o presente artigo tem como objetivo: promover ponderações a respeito das
configurações assumidas pelo Estado no contexto histórico, pela expansão capitalista, das
respostas dadas ao enfrentamento da questão social e do processo de constituição e
desenvolvimento das políticas sociais na sociedade capitalista contemporânea; e ainda
discutir sobre a atuação do Assistente Social frente as políticas públicas.
Para conseguir alcançar tais objetivos, foram traçados alguns procedimentos
metodológicos, como o histórico-dialético, e referenciado por uma pesquisa qualitativa,
através de um levantamento bibliográfico em livros, revistas, periódicos, baseando-se nos
seguintes autores: Behring & Boschetti (2009), Pereira (2002, 2008), Netto (2005), Pastor &
Brevilheri (2009), Chaui (2009), Iamamoto (2004), Raichelis (2007), entre outros. Sendo
observado os diferentes pontos de vista acerca do tema, no entanto, sempre direcionando o
trabalho a um olhar crítico e visando a garantia de direitos segundo pressupostos do projeto
ético-político do profissional de Serviço Social.
É importante dizer, que este estudo torna-se relevante, pois o cenário das políticas
públicas tem sido, historicamente, um solo fértil de discussões para a categoria profissional
dos Assistentes Sociais, além disso, é um campo de atuação profissional. Este estudo
também, é uma rica contribuição para a revisão crítica do papel do Estado na história do País
no cenário da expansão capitalista.
Logo, este trabalho apresenta informações que contribuem para a categoria
profissional, para os demais profissionais e estudantes das Ciências Sociais, e sociedade.
Deste modo, este estudo está dividido em três partes. Na primeira serão abordados
um breve histórico sobre a origem e transformações do Estado. Na segunda, é caracterizado
a relação do Estado com as políticas sociais, o Estado de Bem-Estar Social e sua
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responsabilidade enquanto provedor de políticas públicas. Na terceira parte a atuação do
Assistente Social nessas políticas.
Origem e transformações do Estado
Quando se fala em Estado é preciso conceituá-lo e qualificá-lo, para tal, recorrer-se-á
aos seus primórdios. Lembrando que como fato histórico ele existe sob diferentes
modalidades e configurações. Um determinado país, por exemplo, pode viver em domínio
de um Estado totalitárioiv, mas em outro momento, conviver com um Estado democráticov,
como é o caso do Brasil (PEREIRA, 2008). Ao fazer tais constatações, é preciso entender que
o Estado nem sempre existiu e que ele é criatura da sociedade.
Alguns autores afirmam que definir Estado é tarefa quase impossível, pois ele é
constituído de vários aspectos, entretanto têm outros que o definem. O Estado é um
conceito complexo, histórico e relacional (PEREIRA, 2008).
Neste sentido, a autora define que:
O Estado é ao mesmo tempo uma relação de dominação, ou a expressão política da
dominação do bloco no poder, em uma sociedade territorialmente definida, e um
conjunto de instituições mediadoras e reguladoras dessa dominação, com
atribuições que também extrapolam a coerção. Nesse contexto, o governo ganha
persona própria, jurídica, separada tanto da persona física do governante quanto
da instituição estatal (PEREIRA, 2008: 148).
Nesse caminho, faz-se necessário abordar a conjuntura da antiguidade. Nesse
período, verificava-se que o rei ou imperador detinha toda autoridade, que por sua vez, era
delegada pelo povo. Na idade média, quando se via a dissipação do Império Romano, era
possível também visualizar a concepção de Estado como concentrador de repressão,
assinalado pela rescisão das relações entre política e igreja. No entanto, foi na Renascença
que o Estado moderno assumiu sua identidade sob a égide da soberania, conceito este que
ainda demonstra a centralização do poder estatal nas mãos do príncipe, idade do
absolutismo. A revolução burguesa, e a tomada de poder dessa classe fundam as bases do
Estado moderno (SOBRINHO, 2004 apud RODRIGUES & RODRIGUES, 2008).
Há várias teorias que tentam explicar a origem do Estado, mas a que se faz
importante elucidar é que o Estado surgiu da necessidade de ruptura entre a barbárie e a
civilização. Nesse âmbito, o Estado incide da necessidade de fazer cessar o inoportuno do
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estado de naturezavi, os homens decidem passar à sociedade civil criando o poder político e
as leis. Por isso, a passagem do Estado de Natureza à sociedade civil se dá por meio do
Contrato Social. Nesse aspecto, o Estado é constituído por um acordo ou pacto, entre um
aglomerado de homens, sendo ele uma unidade de poder absoluto, tendo o dever de
representar a coletividade. Desse modo, tal transição, intercedida pelo Contrato Social,
permite que os direitos sociais, tidos como direitos naturais, presentes no Estado de
Natureza, possam ser garantidos com mais eficiência pelo Estado (CHAUI, 2009).
Todavia, Pereira (2008: 136) preceitua:
Com efeito, foi com o fortalecimento e a extensão da burocracia que houve a
demarcação de fronteiras territoriais, no interior das quais se tornou mais fácil
recolher informações de todos os tipos, cobrar tributos e exercer a regulação
institucional. Além disso, e como consequência, a combinação de uma estrutura
técnico-administrativa, mais forte com recursos garantidos por impostos,
possibilitou a criação e manutenção de forças armadas como a encarnação do
aparelho repressivo do Estado - que passou a ser o único dotado, legalmente, de
poder coercitivo de última instância. Trata-se esse poder do que Weber (1973)
chamou de monopólio legal da violência, como um atributo característico das
autoridades legítimas [...]. Mas trata-se também do que Gramsci identificou como
Estado restrito, ou sociedade política indicando com essa categorização, que para
além do uso da coerção, há outras ações do Estado que não requer força, nem
mesmo como ameaça.
Neste caminho, é possível compreender que há um lado não restritivo da ação
estatal, que se difere do arbítrio dos governantes e encarado como um absorvedouro dos
poderes que são legítimos também aos cidadãos. Tal constatação é o que difere a visão
embasada no pensamento de Weber (1993 apud PEREIRA, 2008), onde nota o Estado como
uma instância contratualmente rigorosa, racional e auto-suficiente na sua designação
monopolizadora da coerção, que tem como pano de fundo a subestimação das resistências
organizadas na sociedade.
Com efeito, percebe-se que o Estado não existe desvinculado de um processo
histórico e nem possui as mesmas características em todos os lugares. Verifica-se que os
primeiros autores que pesquisaram sobre tal se recusam a formulá-lo ou a associá-lo ao
sobrenatural. Estes o veem como criação do próprio homem e daí começaram a teorizar de
acordo com cada época.
Verifica-se que no século XVII, o Estado emerge como uma instituição genuinamente
política sobre as demais instituições, quando este contraiu persona própria apartada da
persona do governante e da influência da igreja - devido ao surgimento da organização
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burocrática e de seu respectivo distanciamento do controle da sociedade civil (CREVELD,
2004).
No Estado Liberal (1850 até 1930) verifica-se uma redução da intervenção do Estado,
no que se refere à garantia dos direitos sociais, onde se tem a explicação para tal, seus
defensores amparavam a ideia de que tais direitos ocasionariam a acomodação por parte da
classe trabalhadora, podendo assim, colocar em risco o bom êxito do mercado. No que se
refere à pauperização da população, esta ficaria a mercê da benesse e da caridade. A
responsabilização estatal se daria apenas para aqueles sujeitos sociais que não tinham
nenhuma condição de competir no mercado de trabalho, como as crianças, os deficientes e
os idosos (PASTOR & BREVILHERI, 2009).
Entretanto, Behring e Boschetti (2009), resumem os elementos essenciais do Estado
Liberal no que se refere a sua intervenção minimizada. No que diz respeito às políticas
sociais, são esses os elementos: o bem estar individual sobrepondo-se ao coletivo,
predomínio da liberdade e da competitividade, predomínio do individualismo, a
naturalização da miséria, o predomínio da lei da necessidade e a manutenção de um Estado
mínimo.
Nesse campo, segundo Netto (2005), faz-se importante salientar que até o final do
século XIX e início do século XX, o que existia era o capitalismo concorrencial, ou seja, regido
pela livre concorrência. Neste âmbito, verifica-se o acréscimo dos lucros capitalistas
controlados pelo mercado, acontece um processo de concentração de produção e de capital
nas mãos das grandes corporações e a livre concorrência é substituída pelos monopólios
capitalistas.
Neste caminho, o autor assevera que:
A idade do monopólio altera significativamente a dinâmica inteira da sociedade
burguesa: ao mesmo tempo em que potencializa as contradições fundamentais do
capitalismo já explicitadas no estágio concorrencial [...] a combina com novas
contradições e antagonismos (NETTO, 2005: 19).
Sobre esse aspecto, é possível assimilar que o Estado, desde a sua criação, vem
assumindo algumas responsabilidades no que tange ao social. Mas, isso não ocorre com o
intuito de garantir o bem comum, mas sim como forma de controle e manutenção da
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ordem, fato este que muitas vezes foi visto na história através de ações repressivas (PASTOR
& BREVILHERI, 2009).
Ainda sobre esta perspectiva, verifica-se que, o Estado no capitalismo concorrencial
passa a ter uma interferência pontual no social, em sua fase monopolista, assume outras
funções, com uma influência contínua na reprodução da força de trabalho (PASTOR &
BREVILHERI, 2009).
Estado e Políticas Sociais
Historicamente a relação do Estado com as políticas sociais, foi sendo minada pelo
implacável crescimento das forças produtivas, acondicionado pelo processo de
industrialização e pelo aumento do poder político dos trabalhadores. É possível notificar que
no final do século XIX, predominou de fato essa relação, como afirma Pereira (2008: 34).
Um conjunto de fatores econômicos, sociais e políticos favoráveis à construção de
um moderno conceito de proteção social. E este conceito, ao associar bem estar à
cidadania, expressou verdadeiramente um padrão de regulação sócio econômico
avesso ao paternalismo, passando a ser visto como o início do Welfare State.
Ainda segundo a autora, o Estado social tomou como parâmetro um modelo estatal
de intervenção na economia de mercado, que “expandiu e fortaleceu o setor público e geriu
sistemas de proteção social” (PEREIRA, 2008: 23).
O desenvolvimento da esfera pública, por meio de sua estrutura administrativa, com
um corpo especializado, foi uma das necessidades descobertas para que o Estado tivesse a
capacidade de ser o norteador da economia e capaz de implementar as medidas almejadas.
Vê-se, portanto, um Estado burocrático que age por meio do denominado sistema estatal
(PASTOR & BREVILHERI, 2009).
Vale destacar, segundo Pereira (2002), a questão social que eclodiu no século XIX
com a Revolução Industrial nos países europeus conferiu um fato ameaçador à ordem e às
instituições liberal-burguesas. Nesse contexto, nasce o Estado Capitalista regulador, ou seja,
o Estado de Bem-Estar Social. Iamamoto (2004) destaca que, a questão social é apreendida
como o conjunto das expressões das desigualdades da sociedade capitalista. Neste sentido,
a questão social explica a necessidade das políticas sociais, no âmbito das relações entre as
classes e o Estado.
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O Estado capitalista regulador e intervencionista submergiu com a gestão e o
financiamento do seguro social e de atividades afins, ou seja, com o aumento da proteção
social na expectativa do direito (PEREIRA, 2002).
Nestes termos, assevera a autora:
[...] mas tal ascensão não deu por cima e por fora dos conflitos de classe. Nesses
conflitos, ganha proeminência a história participação dos trabalhadores em sua
luta contra o despotismo do capital e o poder tendencialmente concentrador do
Estado. Na falta de condições objetivas de transformar o sistema que os oprimia, a
classe trabalhadora aproveitou os impactos de outras condições objetivas e
subjetivas presentes [...] para abraçar, no seio do próprio sistema, a causa dos
direitos sociais (PEREIRA, 2002: 33).
Assim, o Estado de bem estar social que emergiu após a segunda grande guerra, teve
como uma de suas finalidades a de promover reformas, trouxe uma melhoria das condições
de vida da classe trabalhadora, uma sensação de estabilidade empregatícia, o que levou os
trabalhadores a pensarem em níveis de igualdade, a absterem-se de um projeto mais radical
em prol de conquistas e reformas imediatas (PASTOR & BREVILHERI, 2009).
Segundo Behring e Boschetti (2009), o Estado de bem estar social, foi logo, um
acordo em que os partidos social-democratas renunciaram de fazer a revolução socialista
para conseguir o atendimento de exigências mínimas, de reformas imediatas, viabilizado
pelas políticas sociais.
Neste âmbito, é admissível afirmar que o Estado de bem estar social não foi um
Estado voltado exclusivamente para a classe trabalhadora, embora fosse possível conseguir
alguns benefícios para grande parte desta categoria assalariada, como exemplo, viu-se um
ganho na melhoria das condições de vida dos trabalhadores. O que é possível detectar é que
este Estado convencionou medidas de caráter social sem, contudo, perder seu caráter
capitalista (PASTOR & BREVILHERI, 2009).
Segundo Navarro (2002), o Estado de Bem-Estar Social, que teve seu auge nos anos
50, caracterizou-se pela ampliação dos gastos sociais e pela significativa conglobação de
capital. Enfim, no final da década de 60, as perspectivas de desenvolvimento principiaram a
esgotar. Nesta mesma ocasião, se energizaram os movimentos da classe trabalhadora, cujas
exigências não se restringiam às questões econômicas, mas, sobretudo, à democracia no
cerne das fábricas.
Neste caminho, o autor pontua que os movimentos operários reivindicavam o
controle operário sobre o processo trabalhista, considerado por amplos setores como
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estreitamente ligado à propriedade da empresa. Por essa razão, o direito da classe
capitalista de controlar o processo produtivo passou a ser questionado pelos trabalhadores
(NAVARRO, 1996).
Desse modo, faz-se nítido a ruptura com a condição da existência do capital - a
subordinação do trabalho - o que representou, assim, uma colisão com o capital, em um
período que anunciava o fim da sua expansão (PASTOR & BREVILHERI, 2009).
Contudo, nos anos 70 a crise do capital, cujas manifestações mais significantes foram:
a crise financeira e do comércio internacional e a inflação crônica associada ao baixo
desenvolvimento econômico. O Estado de Bem-Estar Social, eleito como um dos principais
responsáveis começou a ser combatido pelos economistas denominados neoclássicos,
neoliberais ou mesmo de liberais, em um movimento chamado de “retorno à ortodoxia”. As
medidas neoliberais traziam consigo a ideia da neutralidade, já que o livre jogo do mercado
permitiria uma melhor utilização dos fatores produtivos, em benefício de toda a coletividade
(SOARES, 2002).
Segundo Pastorine (2002:21) as medidas neoliberais, em especial sua proposta,
aponta “como solução o desmonte do Welfare State, promovendo o Estado mínimo. Isto
implica uma redução dos direitos sociais, das políticas sociais e, se for necessário, dos
direitos políticos, tudo em nome dos direitos civis (principalmente o direito à propriedade
privada)”. O ideário neoliberal traz em seu discurso, que os gastos com o social são um ônus
para os cofres públicos, negativando uma ação mais efetiva do Estado com as políticas
sociais. Assim sendo, o neoliberalismo representou um retrocesso nos direitos sociais, já que
este projeto tem como proposta o enxugamento do Estado na execução das políticas
públicas. Estas, por sua vez, passam a ser orientadas e subordinadas aos interesses do
grande capital que transfere a responsabilidade de executá-las para a sociedade civil e o
terceiro setor. Desresponsabilizando assim, o Estado na condução das políticas sociais e
anulando o caráter de direito das mesmas, que passam a ser vistas como um favor, um
benefício (PASTORINI, 2002; SOARES, 2002).
De acordo com teóricos da economia, após os primeiros resultados da globalização,
eles têm plena consciência de que a economia de mercado não assegura, espontaneamente,
a inclusão e o desenvolvimento social e somente com a intervenção do Estado, por meio de
políticas públicas, é que será reduzida a desigualdade social a níveis moralmente aceitáveis.
De maneira geral, as Políticas Públicas, “são instrumentos ou um conjunto de ações de
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intervenção do Estado na sociedade com o intuito de possibilitar o alcance de certos
resultados, impedir outros, ou ambas as coisas” (SEDESE, 2006: 37).
Todavia, no caso do Brasil como afirna Yazbek (2005), a criação dos direitos sociais foi
resultante da luta de classes, que por sua vez, expressa a correlação de forças
predominante, onde o Estado é pressionado a garantir esses direitos. Nesta perspectiva, a
autora apregoa que, “pela via social e de seus benefícios o Estado busca, portanto, manter a
estabilidade, diminuindo desigualdades e garantindo direitos sociais, embora o país não
alcance a institucionalização de um Estado de Bem Estar Social” (YAZBEK, 2005: 82).
Vale salientar que, as políticas públicas podem ter diferentes metas: promover a
industrialização, garantir a saúde da população, assegurar assistência social; intervir na área
econômica, na área social. No caso da última, podem-se destacar as políticas de educação e
as que compõem a Seguridade Social: Saúde, Previdência e Assistência Social. Essas políticas
podem ser realizadas em diferentes prazos, podem ser formuladas e implantadas por
diferentes atores políticos, tendo por objetivo alcançar toda a população que dela necessita
ou apenas alguns segmentos, ou seja, podem ser “focalizadas ou universais” (SEDESE, 2006).
Nessa esfera, autores acreditam que, para uma política pública ser implementada, é
necessário que haja demanda e apoio. Os dois fatos devem existir, pois uma política sem um
apoio maior não pode ser implementada, já que os atores políticos podem boicotar sua
implementação, impedindo assim que os resultados esperados sejam alcançados. Vale
lembrar que nenhum sistema político apoia uma política, se ela não contempla, ou mesmo
se contraria suas preferências. Se as preferências mudam, mudam as demandas, mudam os
apoios e, consequentemente, as políticas (SEDESE, 2006).
Segundo Cabrero (2002), a crise histórica que ocorreu entre os objetivos
universalizantes do Estado de bem estar, no pós-segunda guerra, e os interesses do grande
capital desregulado em ascensão nos anos 80, redundou em 1995, numa articulação
ambivalente e desigual entre o universalismo protetor, formas crescentes de particularismo
social e crescente mercantilização da política social.
Dessa maneira, Pereira (2008) expõe que:
Foi no contexto dessa nova articulação político-institucional que a política social
entrou no século XXI e trouxe à luz mudanças internas e externas ao Estado de
Bem-Estar, causadas, respectivamente, pela passagem de um modelo de produção
fordista para um outro, pós-fordista, e pelo processo de globalização. Disso
resultou uma nova fase de reforma social eivada de desafios e de conflitos
inevitáveis. A presença de situações dilemáticas decorrentes do envelhecimento
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populacional, do desemprego estrutural, da reestruturação da família, da dinâmica
migratória, transcenderam as dimensões econômicas e fiscais e requereram, no
bojo da política social, novas correlações de forças. (PEREIRA, 2008: 192).
Neste caminho, é possível verificar que baseado nas experiências, o Estado não se
apartou por completo do processo de regulação da força de trabalho; da concretização de
atos no campo da saúde e da educação; de intervenções ativas por meio de transferências
de renda e de domínio da pobreza, ou seja, no campo das políticas sociais, dentre várias
outras interferências.
Com efeito, é possível detectar que existem ações institucionalizadas que visam o
provimento de rendas básicas ou mínimas, objetivando atender às demandas dos sujeitos
sociais. “Tudo isso não pode reeditar a noção clássica de Welfare State; mas não retiram do
Estado funções sociais históricas de gestão e distribuição direta ou indireta de benefícios e
serviços, que ainda se fazem presentes em quase todos os contextos nacionais” (PEREIRA,
2008: 204).
Nesse âmbito, a autora pontua:
Na verdade, ocorreram apenas mudanças nos métodos de distribuição de
benefícios e serviços, sem que o Estado tenha se tornado redundante ou
dispensável. Pelo contrário, o Estado continua empregando pessoal para
desempenhar funções sociais e usando e/ou regulando atividades dessa
pluralidade de organizações que compõem o sistema de bem-estar, cada vez mais
extenso e espontâneo. É certo que nessa tarefa o Estado de bem-estar se
distanciou do padrão que vigorou entre o segundo pós-guerra e o final dos anos
1970. Mas nada indica que ele perdeu importância-especialmente diante de
mudanças econômicas, demográficas, sociais e políticas de monta, como as atuais,
em que a sua presença se faz indispensável (PEREIRA, 2008: 205).
Por fim, pode-se ressaltar que é um erro pensar que a participação de muitos atores
não-governamentais na efetivação da política social, melhorou a provisão do bem estar ou
que houve mudanças substantivas nessa provisão, tal provisão que antes era protagonizada
somente pelo Estado, hoje é difundida também para a sociedade civil (PEREIRA, 2008).
A atuação do Assistente Social nas Políticas Públicas
Há uma grande conexão entre o Serviço Social e as Políticas Sociais, pois os
Assistentes Sociais são um dos profissionais que trabalham com essas políticas, intervindo
nas consequências da questão social nas suas mais variadas expressões quotidianas, com
atuação em diversas áreas, baseadas na identificação dos determinantes sócio-econômicos
(IAMAMOTO, 2004).
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É mister lembrar que a concepção e o planejamento das políticas sociais ficavam ao
cargo de outras categorias profissionais e dos agentes governamentais – ao Serviço Social,
cabia apenas executá-las, na relação direta com os “indivíduos, grupos e comunidades” que,
de algum modo, eram atendidos pelos serviços sociais públicos; isto se modificou a partir da
ruptura com o conservadorismo.
Na contemporaneidade, com descentralização e municipalização das políticas
públicas vêm ampliando o mercado de trabalho para os assistentes sociais. Com isso abremse novos canais de atuação profissional que não se restringem apenas à execução, mas
também à formulação, elaboração, gestão, monitoramento e avaliações de políticas públicas
de proteção social, como também na assessoria a movimentos sociais e populares.
Devido a essa nova demanda, é que Iamamoto (2004) e Raichelis (2007) destacam a
exigência de um trabalhador qualificado, apto para responder as novas e antigas atribuições.
Os assistentes sociais, comprometidos com um projeto societário mais amplo, vêm lutando
em diferentes frentes e de diversas formas para defender e reafirmar os direitos e as
políticas sociais. Com suas próprias palavras Raichelis (2007: 282) pontua:
é fundamental o acervo teórico e a produção cientifica nesse campo, enriquecidos
pelas experiências em curso, mas capazes, ao mesmo tempo, de antecipar
tendências societárias que sinalizem os possíveis desafios a serem enfrentados.
Decorre daí uma dupla tarefa: impulsionar e ampliar o movimento social que se
organiza em torno da defesa da política de assistência social, propondo novas
estratégias para enfrentamento das situações conjunturais, e, ao mesmo tempo,
ampliar a produção teórica articulada à análise de tendências e projeções
macrossocietárias, que iluminem estrategicamente os rumos a serem seguidos.
Nesse sentido, Abreu (2002) chama atenção para o papel de educador social dos
assistentes sociais, com uma “função pedagógica” própria da profissão. O desafio
profissional é buscar responder às demandas da população com o compromisso no projeto
ético-político da profissão através de princípios e valores fundados na concepção de
superação das desigualdades sociais, com direitos sociais universais na reafirmação da
cidadania, ou seja, no seu caráter emancipatório (NEVES, SANTOS, SILVA, 2012).
Vale destacar que, ao longo da história da humanidade e no contexto da ordem
burguesa, os direitos de cidadania tornam-se fundamentais para que as classes subalternas e
o conjunto de forças interessadas na construção de uma sociedade mais igualitária,
consigam avançar na construção de projetos políticos que apontem nesta perspectiva. Com
isso, torna-se importante, sobretudo, para os excluídos do mercado e da participação
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política, a luta para garantir melhores condições de vida e por oportunidade de participar
das decisões que dizem respeito à vida de toda sociedade (SOARES, 2002).
Logo, o profissional do Serviço Social tem um papel relevante a desempenhar, pois é
no dia-a-dia de sua prática e da convivência social que pode construir e fazer a história da
profissão, na medida em que a atuação comprometida de cada Assistente Social com a
dimensão ético-política aponta uma direção social que poderá, de forma efetiva, responder
às necessidades dos usuários na intervenção das políticas públicas.
Considerações Finais
É imprescindível mencionar que a promoção de uma vida digna a todos é dever do
Estado e para tanto, este deve assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a
liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça. Tais
preceitos são garantidos por dispositivos Constitucionais e estão ligados diretamente com o
Princípio da Dignidade da Pessoa Humana, que constitui fundamento do Estado
Democrático.
Nesse enfoque, nota-se um retrocesso quanto a sua efetividade, dando-lhe um
aspecto meramente formal, isso se evidencia com respeito a políticas arcaicas, apenas
distributivas das sobras orçamentárias e incapazes de levar em conta a importância da
cidadania popular. Prova disso, é a posição que o Estado assume frente a efetivação dos
direitos sociais, na medida em que delega tal atribuição à iniciativa privada, abrindo mão de
seu protagonismo como provedor social, gerando a mercantilização de tais direitos.
Desse modo, o que se tem é uma combinação que gera um quadro perverso de
dualidade entre os que podem e os que não podem pagar pelos serviços e, ao mesmo
tempo, cria um espaço lucrativo para o capital, como é o caso da educação particular, saúde,
habitação, entre outros.
Tal cenário contraria a definição do Estado como uma unidade de poder que deve
representar a coletividade. Contraditoriamente, o que se assiste é a defesa de um Estado
representante dos interesses do Capital.
Destaca-se que a atuação do Estado está
direcionado por uma política econômica de cunho neoliberal e se propõe a oferecer a
população usuária das políticas sociais, somente os mínimos sociais. Neste sentido o Estado
não é o único a executor de políticas sociais, na qual tem-se o Estado, segundo e terceiro
setor.
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Diante do exposto, e por decorrência desse cenário, ocorre uma ampliação da
questão social e do mercado de trabalho dos assistentes sociais frente aos desafios postos
pela conjuntura. Por conseguinte, com as ponderações aqui sistematizadas que,
inegavelmente, expressaram avanços significativos no âmbito da formação profissional, tais
como: na participação ativa da categoria na luta por direitos, na construção de inúmeras
legislações sociais, na construção do projeto ético-político, na discussão, aprovação e
implantação das diretrizes curriculares, entre outras importantes conquistas, o que se
percebeu foi uma crença persistente dos assistentes sociais, de que a afirmação de direitos,
a implantação e a maior radicalização da democracia seria o caminho para a construção de
uma outra sociedade com indivíduos emancipados.
AUTORES CITADOS NAS REFERÊNCIAS
Abreu (2002); Behring & Boschetti (2009); Cabrero (2002); Chaui, 2009; Creveld (2004);
Iamamoto (2004); Pereira (2002, 2008); Netto (2005); Navarro (1996); Neves; Santos; Silva
(2012); Pastor (2009); Pastorini (2002); Raichelis (2007); Rodrigues; Rodrigues (2008); Simões
(2009); Sedese (2006); Soares (2002); Yasbek (2005).
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REFERÊNCIAS
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políticas sociais”. Tese (doutorado). Rio de Janeiro: UFRJ, 2002.
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PEREIRA, P. A.P. Política Social e Democracia. 2. ed. Rio de Janeiro: Cortez, 2002.
__________. Política Social: temas & questões. São Paulo: Cortez, 2008.
RAICHELIS, R. Esfera pública e conselhos de assistência social: caminhos da construção
democrática. São Paulo: Cortez, 2007.
RODRIGUES, V. F.; RODRIGUES, E. P. A ineficiência do Estado frente aos direitos sociais e
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(Graduação em Serviço Social). Centro Universitário do Sul de Minas- UNIS. Varginha, 2008.
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de Serviço Social; v.3)
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15
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YASBEK, M. C. Estado e Políticas Sociais. Revista Praia Vermelha. 18. ed. UFRJ. Rio de
Janeiro, segundo semestre 2005.
i
Bacharel em Serviço Social. Especialista em Gestão de Políticas Públicas e Serviços Sociais.
Mestranda em Gestão Pública e Sociedade da Universidade Federal de Alfenas – Campus
Varginha/MG. E-mail: [email protected]
ii
Bacharel em Serviço Social. Especialista em Psicologia e Serviço Social Judicial. Assistente Social
de Serviço de Acolhimento Institucional. Email: [email protected]
iii
Graduada em Serviço Social. Especialização em Política de Assistência Social e Gestão do Sistema
Único de Assistência Social.
iv
Estado Totalitário é aquele que estende sua presença reguladora e repressiva, em absolutamente
todos os níveis da sociedade (cultura, artes, economia, política, leis e etc.), ou seja, o Estado Total.
v
Estado Democrático: Expressa a “descentralização das decisões, das políticas públicas e dos
gastos sociais; pelas autonomias de gestão e participação da sociedade civil; pelo respeito à vida
familiar e às comunidades, às regionalidades e plurinacionalidades”(SIMÕES, 2009: 87).
vi
O conceito de Estado de Natureza tem a função de explicar a situação pré-social na qual os
indivíduos vivem isoladamente. Segundo Hobbes (século XVII) em Estado de Natureza, os indivíduos
vivem isolados e em luta permanente, vigorando a guerra de todos contra todos ou “o homem lobo do
homem”. Nesse estado reina o medo e, principalmente, o grande medo: o da morte violenta. Já para
Rousseau (século XVIII), em Estado de Natureza, os indivíduos vivem isolados pelas florestas
sobrevivendo com o que a Natureza lhes dá, desconhecendo lutas e comunicando-se pelo gesto, o
grito e o canto, numa língua generosa e benevolente. Esse estado de felicidade original no qual os
humanos existem sob a forma do bom selvagem inocente, termina quando alguém cerca um terreno
e diz: “É meu”. A divisão entre o meu e o teu, isto é, a propriedade privada, dá origem ao Estado de
Sociedade (CHAUI, 2002).
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