13 INTRODUÇÃO Este trabalho de Conclusão de Curso tem como finalidade atender a Disciplina de “Trabalho de Conclusão de Curso” do Curso de Serviço Social da EMESCAM, trabalho este fruto do processo de estudos de quatro anos e meio de graduação. O objetivo deste trabalho é de trazer a tona “A Trajetória Histórica de Criação dos Cursos de Serviço Social da UFES (1971) e da EMESCAM (2003)” no sentido de resgatar as origens dessa formação. A necessidade desse resgate partiu da inquietação de conhecer melhor quais as etapas desse processo, seus desdobramentos, os atores envolvidos e as particularidades dessa trajetória histórica. Tendo em vista os objetivos deste estudo, realizamos uma pesquisa de caráter exploratório e descritivo, cuja finalidade foi proporcionar uma aproximação com o tema, com vistas a torná-lo mais explícito. De toda maneira buscamos explorar o fenômeno buscando a lógica de sua gênese e desenvolvimento, com o intuito de compreender os diversos aspectos, conexões e relações, procurando entender a historia enquanto um processo de criação e recriação das necessidades humanas. A pesquisa bibliográfica e documental constituiu-se no procedimento metodológico para a coleta de informações, que segundo GIL: “[...] a pesquisa bibliográfica se utiliza fundamentalmente das contribuições dos diversos autores sobre determinado assunto e [...] a pesquisa documental vale-se de materiais que não receberam ainda tratamento analítico, ou que ainda podem ser reelaborados de acordo com os objetivos da pesquisa” (GIL, 2002, p. 66). Portanto, como pesquisa bibliográfica, buscamos, autores de expressão no meio acadêmico que trabalham com a questão do surgimento do Serviço Social no Brasil e no Espírito Santo e o desenvolvimento da formação profissional, nos valendo ainda de leituras de periódicos, como a Revista Serviço Social e Sociedade, o Caderno ABESS e a Revista Temporális; Dissertações relacionadas à temática a ser estudada; legislações concernentes a regulação do ensino superior brasileiro. PDF created with pdfFactory trial version www.pdffactory.com 14 Procuramos focalizar dados documentais que ainda não receberam um tratamento analítico, ou que podem ser reelaborados de acordo com os objetivos da pesquisa, como: Currículos, Programas e Projetos Pedagógicos dos Cursos de Serviço Social; Documentos Oficiais (atas de criação dos cursos, atas de credenciamento e reconhecimento); Documentos Institucionais da ABEPSS e CFESS (Diretrizes Curriculares, Lei que regulamenta a Profissão e o Código de Ética); e sites oficiais de órgãos que poderão contribuir com a análise desta pesquisa, como: (MEC e ANDES). Além dos elementos citados, para um maior aprofundamento da realidade pesquisada, foram realizadas quatro entrevistas semi-estruturadas, na qual são considerados atores importantes que participaram e participam do processo de criação e consolidação do espaço de formação profissional. Desta forma, o tema deste projeto partiu da contextualização de que hoje vivemos numa conjuntura de precarização e mercantilização do Ensino Superior brasileiro, onde, se percebe nitidamente as ofensivas neoliberais no processo de formação profissional, por isso, compreender as dimensões desse processo de formação e buscar uma análise acerca da sua configuração, é sem duvida resgatar o que Iamamoto nos diz: “Pensar a formação profissional no presente é, ao mesmo tempo, fazer um balanço do debate acerca do Serviço Social, indicando temas a serem desenvolvidas, pesquisas a serem estimuladas para decifrar as novas demandas que se apresentam ao Serviço Social” (IAMAMOTO, 2003, p.169). Desta forma, ao pensarmos a formação profissional do Assistente Social precisamos apreender o cenário em que a profissão se efetiva, bem como a realidade social que a cerca, tendo em vista que as mudanças políticas, sociais, econômicas, culturais e ideológicas; as profundas transformações nos processos de produção e reprodução da vida social; assim como as relações entre os sujeitos, nos levam a refletir e repensar sobre as novas demandas e dinâmicas do mundo do trabalho. O Serviço Social brasileiro teve na sua gênese uma forte influência direta da Igreja na dimensão do ensino e do fazer profissional dos assistentes sociais, orientada nesse período pela Doutrina Social da Igreja, em especial pelo Neotomismo, que preconizava o fato de que a dimensão sócio-educativa deveria ser vinculada a uma Reforma Moral do indivíduo. PDF created with pdfFactory trial version www.pdffactory.com 15 O próximo período que marca este processo histórico, datado entre a década de 1940 a 1960, em que o Estado vislumbra-se como provedor de Políticas Sociais, repressor dos movimentos e pela a investida no projeto desenvolvimentista, vai imprimir na dimensão sócio-educativa o papel de integrar o individuo ao projeto societário dominante, onde, o Positivismo coloca-se como Teoria Social norteadora, mesclando-se ainda com a Doutrina Social da Igreja Católica. Temos no atual período o processo de redefinição profissional que vai se consolidando a partir dos anos de 1980, tornando-se marco para a categoria dos Assistentes Sociais, em que se passa a questionar o tratamento dispensado ao significado social da profissão, enquanto especialização do trabalho coletivo, inserido na divisão social e técnica do trabalho, sendo, que esta análise possibilitou a categoria compreender o caráter de historicidade da profissão, entendido no quadro das relações sociais entre as classes e destas com o Estado e com o conjunto da sociedade, fruto de uma aproximação com a Teoria Social Critica Marxista. É a partir deste conjunto de inflexões que o Serviço Social no Brasil vai construindo o seu projeto de formação e exercício profissional comprometido com os interesses da classe trabalhadora, projeto este que se configura por meio, dos dispositivos que regulamenta a nossa profissão: a lei de regulamentação, o Código de ética e as Diretrizes Curriculares da ABEPSS. Esse cenário histórico vai reafirmar a necessidade de superação de práticas, nos impulsionando a ter um olhar crítico e instigante para o mundo contemporâneo, pois, mais do que compreender o significado e o papel da profissão na sociedade do capital diante do processo de reprodução das relações sociais, as novas necessidades do mercado de trabalho vão demandar uma formação profissional que propicie aos Assistentes Sociais subsídios teóricos, éticos, políticos e técnicos que auxiliem no desenvolvimento de habilidades que possibilitarão uma ação crítica, criativa e comprometida, conforme Oliveira. “A contemporaneidade exige cada vez mais profissionais qualificados, dotados de conhecimentos especializados e atualizados, flexibilidade intelectual no encaminhamento de diferentes situações e capacidade de análise para decodificar a realidade social” (Oliveira, 2003, p 43). Nesse contexto, acredita-se que a formação profissional, na atualidade, deve ser (re) pensada, a fim de que possamos possibilitar a capacitação de profissionais condizentes com novas dinâmicas de trabalho, entendendo que as mudanças apresentadas pelo modo de PDF created with pdfFactory trial version www.pdffactory.com 16 produção capitalista alteram visivelmente a esfera da produção e do Estado, tendo como conseqüência o agudizamento da “questão social”, conforme Iamamoto explica: “[...] a formação profissional possibilite aos assistentes sociais compreender criticamente as tendências do atual estagio da expansão capitalista e suas repercussões na alteração das funções tradicionalmente atribuídas à profissão e no tipo de capacitação requerida pela “modernização” da produção e pelas novas formas de gestão da força de trabalho; que dê conta dos processos que estão produzindo alterações nas condições de vida e de trabalho da população que é alvo dos serviços profissionais, assim como das novas demandas dos empregadores na esfera empresarial” (IAMAMOTO, 2003, p.180). Decorrente do processo de flexibilização do sistema capitalista, a “questão social”, vem se complexificando em suas múltiplas expressões e determinações, o que acaba por gerar um aumento da demanda profissional dos assistentes sociais, o que por sua vez traz à tona a essencialidade de formular um projeto de formação cujas bases formem profissionais capazes de aprender este contexto e de responder as demandas que chegam à profissão. A partir dos debates historicamente desenvolvidos pela categoria profissional, buscouse a construção do atual projeto de formação, materializado nas diretrizes curriculares aprovadas pelo conjunto da categoria em 1996, que teve como ponto de partida a construção do Currículo Mínimo de 1982, aprovado na Assembléia Nacional da ABESS (Associação Brasileira de Ensino em Serviço Social) em Natal, RN, onde tal proposição foi orientada pelo pensamento teórico Marxista, que possibilitou a compreensão da realidade a partir do movimento da história. Essas Diretrizes passaram a exprimir a centralidade da “Questão Social”, onde, a formação profissional deve ter como objetivação: capacitar e orientar os profissionais para intervir nas expressões da “questão social”, pois, segundo a ABESS: “A perspectiva é, então, aprofundar a compreensão da ‘questão social’ como elemento que dá concretude à profissão, ou seja, que é ‘sua base de fundação histórico-social na realidade, e que nesta qualidade, portanto, deve constituir o eixo ordenador do currículo” (ABESS, 1997, p.20-21), Assim, os avanços na formação profissional são fundamentais para o aprofundamento e qualificação acerca do debate acadêmico-intelectual e das questões inerentes ao Serviço Social, no sentido de assegurar a direção sócia critica, e refletir na possibilidade de PDF created with pdfFactory trial version www.pdffactory.com 17 intercâmbio que a formação tem para com a elaboração de estratégias que visam a responder aos desafios postos à profissão. Nesse contexto a defesa da formação profissional, sem dúvida, é uma das principais frentes de luta do Serviço Social brasileiro nesse momento histórico e é fundamental apreender o significado da expansão desmesurada do ensino superior sem qualidade, em geral com fins lucrativos e à distância, ainda que não exclusivamente. Segundo Iamamoto (2007) existem no Brasil 253 Cursos de Serviço Social inscritos em instituições de ensino superior (IES), das quais 207 são privadas, correspondente a 82% do total e 46 são publicas, ou seja 18%. A distribuição de vagas segundo a natureza das IES (pública e privada) revela a avassaladora e desordenada expansão do ensino superior privado no país que por sua vez se refrata na área do Serviço Social, pois as 46 IES públicas (estaduais, federais e municipais) oferecem apenas 5.358 vagas, enquanto as 207 IES de natureza privada (privada comunitária, privada comunitária/confessional/filantrópica, privada filantrópica e privada particular) são responsáveis por 27.465 vagas, ou seja, o quíntuplo de vagas ofertadas pelas IES de natureza pública. Logo o crescimento exponencial de vagas na área do Serviço Social tem forte estímulo dos Cursos de Graduação à Distância, autorizadas pelo MEC e que tiveram seu funcionamento a partir de 2006. Segundo Iamamoto “Enquanto os cursos presenciais oferecem 70% das vagas, o EAD, em apenas dois anos de funcionamento já é responsável por 30% do total de vagas ofertadas, concentrada em apenas 06 cursos no País” (IAMAMOTO: 2007: 439). Os 6 cursos de graduação a distancia em Serviço Social recém-criados, autorizados e em funcionamento, já são responsáveis pó 9760 vagas informadas.Destes, apenas 1 curso esta alocado em Fundação, considerada universidade publica estadual, a Fundação Universidade do Tocantins (UNITINS), localizada em Palmas (TO). Somente a UNITINS é responsável por 2760 vagas, com inicio de funcionamento do EAD em 2006. Os outros cursos são oferecidos por instituições privadas: Universidade para o Desenvolvimento do Estado e da Região do Pantanal (UNIDERP) que iniciou o EAD em Serviço Social em 2007 e já é campeã da oferta de vagas: 3800 vagas; Universidade do Vale do Itajaí (UNIVALI) localizada em PDF created with pdfFactory trial version www.pdffactory.com 18 Santa Catarina, oferecendo 3.000 vagas de EAD em Serviço Social, cujo funcionamento data em 2007; Universidade de Tiradentes (UNIT) oferece 200 vagas, localizada em Aracaju (SE) seu funcionamento se deu em 2006; Universidade Paranaense (UNIPAR) situada em Londrina (PR), iniciou o EAD em 2007, mas nos registros do MEC, não constam informações quanto o numero de vagas IAMAMOTO:2007:439-440). Nesse rumo é possível afirmar que mantida a oferta das 10 mil vagas efetivamente ofertadas e declaradas pelas Escolas de Ensino a Distancia (EAD), em 2010 só o ensino de graduação a distancia lançara no mercado, no mínimo um contingente de 10 mil Assistentes Sociais por ano. Estes dados gerais demonstram que a tendência de crescimento de tal modalidade não demorará a abarcar as mais diversas áreas do conhecimento, principalmente aquelas que não dispendem muitos recursos para serem criadas e operacionalizadas, como é o caso das ciências humanas e sociais. Nesse sentido, as entidades representativas do Serviço Social, a saber, o conjunto formado pelo Conselho Federal e Conselhos Regionais de Serviço Social (Conjunto CFESS/CRESS), a Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social (ABEPSS) e a Executiva Nacional dos Estudantes de Serviço Social (ENESSO), estão apreensivas quanto a novidade e expansão da EAD, e seus debates estão pautados na divisão de opiniões sobre a qualidade dos cursos oferecidos em tal modalidade, e conseqüentemente, na qualidade dos serviços prestados por profissionais oriundos de tais instituições, visto que alguns princípios e diretrizes contidos nas Diretrizes Curriculares para os Cursos de Serviço Social do MEC, como a indissociabilidade entre supervisão técnica e pedagógica na atividade de estágio, encontram dificuldades para serem materializados “à distância”. Além disso, a desenfreada expansão da EAD vem trazer questionamentos sobre a regulamentação e fiscalização de tal modalidade de ensino que, como já foi exposto, está abarcando a população mais “vulnerabilizada”, muitas vezes com baixa renda, dificuldade de acesso em instituições presenciais e, em sua grande maioria, pertencente à classe trabalhadora. PDF created with pdfFactory trial version www.pdffactory.com 19 Esses são alguns apontamentos que nos possibilitam indagar por quais razões deve-se estudar a “Trajetória Histórica da Formação Profissional dos Assistentes Sociais da Grande Vitória”, compreendendo sua trajetória como um processo que emerge das articulações de rupturas e continuidades, entendendo as transformações decorrentes deste processo como um movimento de dimensões sócio-históricas. Desta forma, enquanto aluno do Curso de Serviço Social e militante da formação profissional, busco neste projeto desenvolver esta temática que tanto me instiga e que tem se apresentado familiar, mediante a participação em debates e eventos da categoria e do Movimento Estudantil em Serviço Social, por entender a necessidade de problematizar as configurações históricas desta formação, na tentativa de decifrar a avassaladora barbárie capitalista em suas dimensões político-social e econômica e sua repercussão na formação profissional dos Assistentes Sociais. Outro fato que me mobilizou para realizar este estudo é a insuficiência de estudos desta temática no estado do Espírito Santo, constatando-se poucas publicações e produções, assim, esse projeto tem o intuito, de contribuir para com uma parcela da produção acadêmica do Serviço Social no estado. PDF created with pdfFactory trial version www.pdffactory.com 20 1. SERVIÇO SOCIAL NO BRASIL E A CRIAÇÃO DAS PRIMEIRAS ESCOLAS Ao tratarmos a história do Serviço Social se faz necessário sua contextualização, pois somente assim poderemos compreender as determinações que envolvem as metamorfoses de sua constituição genética em seus diferentes contextos históricos, para além dos muros do Serviço Social. Para isso realizaremos um breve resgate histórico da gênese, das bases, dos rudimentos da profissão no Brasil. Não há a pretensão de resgatar a fundo toda essa rica abordagem, pois há uma vasta produção no âmbito da sistematização da história do Serviço Social, haja vista as publicações existentes. Temos como pressuposto a história do Serviço Social no Brasil que só pode ser compreendida a partir da sua inserção nas relações sociais, o que significa compreende-la como fruto de um processo histórico, na dinâmica de relações entre as classes sociais e do protagonismo dos seus sujeitos coletivos. 1.1 – Notas Introdutórias ao capitalismo monopolista: um breve comentário. O Serviço Social enquanto profissão tem sua referência à chamada questão social, ou seja, decorrente das mazelas próprias da ordem burguesa, fruto das seqüelas do processo de constituição da sociedade capitalista, nos marcos do desenvolvimento da industrialização/urbanização ao longo do século XIX. Entretanto, a apreensão da particularidade da constituição genética da profissão nem de longe se esgota na referência à questão social. Ela se finca no concreto tratamento desta num momento muito específico do processo da sociedade burguesa: a que se chamar a era do capitalismo monopolista. A partir dos fins do século XIX, o mundo todo presenciou as profundas transformações do capitalismo. Transformações estas que reorganizaram o seu ordenamento, a sua dinâmica econômica e os rebatimentos na estrutura social e nas instâncias políticas das sociedades nacionais. PDF created with pdfFactory trial version www.pdffactory.com 21 Ao longo do capitalismo concorrencial, o volume de capital acumulado nas mãos de cada capitalista, fez com que a classe capitalista se diferenciasse por esse volume, sendo considerados grandes, médios e pequenos capitalistas, passando a promover uma concorrência desenfreada e desigual, visto que, os grandes capitalistas por sua vez possuíam maiores chances de se sobrepor nas lutas travadas pela classe capitalistas, dado seu volume de capital. A caracterização desse estagio como concorrencial explica-se em função das relativamente amplas possibilidades de negócios que se abriam aos pequenos e médios capitalistas: na escala em que as dimensões das empresas não demandavam grandes massas de capitais para a sua constituição, a “livre iniciativa” (“iniciativa privada”) tinha muitas chances de se consolidar em meio a uma concorrência desenfreada e generalizada – embora as quebras e falências durante as crises afetassem especialmente os pequenos e médios capitalistas, estes dispunham de oportunidades de investimento lucrativo que, no futuro, seriam cada vez menores, já que, à medida que se desenvolvia o capitalismo, mais se faziam sentir os efeitos da concentração e da centralização (BRAZ e NETTO: 2007: 172-1733). Na concepção de Braz e Netto (2007) é nesse período que surgirá as lutas de classes na sua modalidade moderna, ou seja, onde as lutas de classe se fincarão na contradição entre capital e trabalho, que por sua vez trará o antagonismo entre a classe burguesa e operaria. Com o acirramento desse antagonismo, tanto os operários quantos os burgueses vão ganhando consciência de classe, a principio de forma rústica, mas no decorrer do processo avançam para uma perspectiva crescente de politização dessas relações. A partir desse processo que acontecerá as primeiras formas de protesto por parte dos trabalhadores, em repulsa a forma grotesca com que eram explorados, diante de precárias formas de trabalho, jornadas de trabalho extensa, utilização da mão-de-obra infantil e remuneração baixa. Posto isso, a burguesia em resposta a essas manifestações, utilizava-se de instrumentos repressores e brutais, tanto para enfretamento físico, quanto para imposição ideológica na forma de incorporação de novas tecnologias, ameaçando os postos de trabalho dos operários. Desta forma, Braz e Netto (2007) apontara que dada esta relação, as lutas de classe vão se fincar fortemente nos processos de desenvolvimento das forças produtivas. [...] desde 1825, quase todas as novas invenções resultaram das colisões entre o operário e o patrão, que, a qualquer preço, procura depreciar a especialidade do operário. Diante de cada nova greve de alguma importância, surgia uma nova máquina”. (Netto apud Marx, 1982ª: 131). É no bojo dessas mudanças sócio-política, resultante dos eventos revolucionários de 1848, concomitante com outros três processos, um de caráter científico-técnico (onde se PDF created with pdfFactory trial version www.pdffactory.com 22 percebia os avanços no domínio das ciências sociais, estimuladas pelas indústrias, abrindo caminho para a biologia, o avanço da química e o progresso da física tiveram uma extrema importância no processo de desenvolvimento na produção, que fora considerado por alguns historiadores como sendo a segunda fase da Revolução Industrial); outros dois caráter vinculados a dimensão econômica, sendo que todos estes processos estavam de forma direta ou indireta interligados. Esses dois processos de ordem econômicos são o aparecimento dos monopólios e a modificação do papel dos bancos. É neste contexto de transformações de ordem social, político, científico, econômico e cultural, no limiar dos fins do século XIX, que será gestada as bases de transposição do capitalismo concorrencial para o capitalismo monopolista. Na qual esse novo capitalismo, o capitalismo monopolista colocou em patamar ainda mais alto o sistema de contradições produzido pela ordem burguesa como a exploração, a alienação, a transitoriedade histórica. Desta forma, a idade do monopólio vai potencializar as contradições fundamentais do capitalismo já existentes no estágio concorrencial e produzirá novas contradições e antagonismos ainda mais complexos. A organização da era do monopólio procurou viabilizar a meta primária do capitalismo: o acréscimo dos lucros através do controle dos mercados. E, para isso, introduziu na dinâmica capitalista um leque de novos fenômenos, como: aumento progressivo nos preços das mercadorias; taxas de lucros mais altas nos setores monopolizados; elevação da taxa de acumulação; concentração de investimentos nos setores de maior concorrência; crescimento da tendência de economizar trabalho vivo, com introdução de novas tecnologias, entre outros. Contudo, um traço da era monopolista é de fundamental importância para que se possa compreender os efeitos deste processo: o aumento da taxa de afluência de trabalhadores ao exército industrial de reserva. Na idade dos monopólios a “livre concorrência” é convertida em uma luta de vida ou morte entre os grupos monopolistas e entre eles e os outros, nos setores ainda não monopolizados. Este processo promove um completo rearranjo da divisão internacional capitalista do trabalho, dando curso a renovadas políticas neo-colonialistas, o que na concepçao de Netto (1992: 20) “[...] o capitalismo monopolista conduz ao ápice a contradição PDF created with pdfFactory trial version www.pdffactory.com 23 elementar entre a socialização da produção e a apropriação privada: internacionalizada a produção, grupos de monopólios controlam-na por cima de povos e Estados”. Entretanto, o mais relevante é o fato da solução monopolista - a maximização dos lucros pelo controle dos mercados - ser extremamente problemática. Ao chegar a um certo ponto de desenvolvimento, os próprios mecanismos que deflagra tornam-se vítimas de constrangimentos inerentes à acumulação e à valorização capitalistas. Desta forma, para efetivar-se com êxito tornam-se necessários mecanismo de intervenção extra-econômicos. A instância de poder extra-econômico por excelência é o Estado. Ele sempre interviu no processo econômico quando solicitado pela burguesia. O traço intervencionista do Estado a serviço das classes dominantes sempre se revelou ao longo da história desde a origem do chamado absolutismo. No entanto, na idade do monopólio o eixo da intervenção estatal é direcionado para garantir os super-lucros dos monopólios. A partir daí, o elenco de novas funções econômicas assumidas pelo Estado é enorme: inicia uma inserção como empresário nos setores básicos não rentáveis (fornecendo, a baixos custos, matérias-primas fundamentais para os monopólios); passa a controlar mais de perto empresas capitalistas em dificuldades (socialização das perdas e re-privatização); entrega para os monopólios complexos inteiramente construídos com fundos públicos; fornece subsídios imediatos aos monopólios; oferecer garantia explícita de lucro. Vale dizer: o Estado funcional ao capitalismo monopolista é, no nível da suas finalidades econômicas, o “comitê executivo” da burguesia monopolista - opera para propiciar o conjunto de condições necessárias à acumulação e à valorização do capital monopolista (ib ibid: 22). É justamente neste nível que se dá a articulação das funções econômicas e políticas do Estado. Afinal, para se manter como “comitê executivo” da burguesia monopolista ele precisa legitimar-se politicamente incorporando outros protagonistas sócio-políticos. Desta forma, o alargamento da sua base de sustentação e legitimação sócio-política, mediante a generalização e a institucionalização de direitos e garantias cívicas e sociais, permitiu-lhe organizar um consenso que assegura o seu desempenho. Entretanto, o que se faz relevante assinalar é que a realização desta articulação entre as funções econômicas e políticas do Estado burguês está mediatizada pela correlação de forças sociais que não se defrontaram com um movimento democrático, operário e popular sólido, maduro, capaz de estabelecer alianças sócio-políticas em razão de objetivos PDF created with pdfFactory trial version www.pdffactory.com 24 determinados. Isso indica que um componente, mesmo amplo, de legitimação é plenamente suportável pelo Estado burguês no capitalismo monopolista. E, mais do que suportável, em muitas circunstâncias históricas ele se faz necessário para que o Estado possa continuar desempenhando sua funcionalidade econômica. Por outro lado, o capitalismo monopolista cria condições tais que o Estado por ele capturado, ao buscar legitimação política através do jogo democrático, é permeável a demandas das classes subalternas, que podem fazer incidir nele seus interesses e suas reivindicações imediatas. É somente nestas condições que as seqüelas da questão social podem tornar-se objeto de uma intervenção contínua e sistemática por parte do Estado. É neste momento que a questão social se põe como alvo de políticas sociais. Através da política social, o Estado burguês, na era dos monopólios, procura administrar as expressões da questão social de forma a atender às demandas da ordem monopólica conformando, pela adesão que recebe de categorias e setores cujas demandas incorporam sistemas de consenso variáveis, mas operantes. Neste sentido, a funcionalidade essencial da política social do Estado burguês no capitalismo monopolista se expressa nos processos referentes à preservação e ao controle da força de trabalho. Os sistemas de previdência social, por sua vez, além de atenderem a estas exigências, são instrumentos que contrapõem o subconsumo, oferecendo ao Estado massas de recursos pulverizados. As políticas educacionais e os programas de qualificação técnicocientíficos oferecem ao capital monopolista recursos humanos cuja socialização é feita à custa do conjunto da sociedade. O conjunto dessas políticas tem um peso fundamental no sentido de assegurar as condições adequadas ao desenvolvimento econômico do capitalismo monopolista. Desta maneira, percebemos que é em meio a ordem societária comandada pelo monopólio que se gestam as condições histórico-sociais para que, na divisão sócio-técnica do trabalho, surja um espaço onde possam se mover práticas profissionais como as do assistente social. Portanto, a profissionalização do Serviço Social não se relaciona decisivamente à “evolução da filantropia”, mas vincula-se à dinâmica do capitalismo monopolista. Afinal, não é o mercado que se estrutura para o agente profissional, mediante as transformações ocorrentes no interior da sua prática. As transformações é que definem a estruturação do mercado de trabalho. PDF created with pdfFactory trial version www.pdffactory.com 25 1.2 – A Trajetória do Serviço Social no Brasil. O surgimento do Serviço Social brasileiro remonta o contexto histórico-social da década de 1930 fincado no cenário da sociedade capitalista, num momento particular desta sociedade, onde, o capital monopolista repõe, em patamar mais alto, o sistema totalizante de contradições que confere à ordem burguesa a sua base de exploração e alienação. É sob a feição do monopólio, que no capitalismo será gerada a contradição fundamental do próprio sistema capitalista. Contradição decorrente deste sistema explorador da força de trabalho, onde se estabelece a apropriação pela classe burguesa detentora dos meios de produção, da riqueza socialmente produzida pelo conjunto da classe trabalhadora. O resultante desse sistema contraditório se configura “questão social”, que na concepção de Iamamoto: [...] é senão as expressões do processo de formação e desenvolvimento da classe operária e de seu ingresso no cenário político da sociedade, exigindo seu reconhecimento como classe por parte do empresariado e do Estado (IAMAMOTO, 2003, p.77). Sendo a “questão social” o objeto de trabalho do Serviço Social, é necessário conhecer a extensão da realidade onde estão inseridas as suas múltiplas expressões, fornecendo matériaprima para a pesquisa e, ao mesmo tempo produz o enfrentamento dessa realidade através de seu arcabouço teórico metodológico. Segundo Iamamoto: Sendo a questão Social a base de fundação do Serviço Social, a construção de propostas profissionais pertinentes requer um atento acompanhamento da dinâmica societária, balizado por recursos teórico-metodológicos, que possibilitem decifrar os processos sociais em seus múltiplos determinantes e expressões, ou seja, em sua totalidade (...) (IAMAMOTO, 1998, p.262). Portanto, as condições histórico-sociais que demandaram a emergência do Serviço Social foram colocadas quando o Estado assumiu um papel central neste jogo monopolista: que era de assegurar as condições da reprodução social no âmbito da lógica monopólica e, ao mesmo tempo, legitimar-se para além desta fronteira. Papel que potencializou o seu traço intervencionista através de respostas sistemáticas, contínuas e estratégicas que transcenderam largamente os limites da coerção sempre presente Desta forma, como profissão inscrita na divisão sócio-técnica do trabalho em meio à demandas do Estado na idade do monopólio, o Serviço Social, no Brasil, surge articulado à necessidade de formação social e doutrinária do laicato, para uma presença mais ativa da Igreja Católica na década de 1930. Pois, o crescente processo de secularização que PDF created with pdfFactory trial version www.pdffactory.com 26 invadiu a sociedade no início do século XX e as diversas tensões acirradas entre o Estado e a Igreja, ocasionaram uma grande perda de seus privilégios. Foi, portanto, para recuperar suas áreas de influência que a Igreja procurou superar sua postura contemplativa, iniciando uma ação missionária e evangelizadora. Esta conjuntura propiciara o surgimento de espaço em que se possam mover práticas profissionais como a do Assistente Social, dada às mudanças na forma de produção e reprodução social capitalista, que segundo Netto (1992, p.69) “[...] gestará as condições sóciohistóricas para que, na divisão social (técnica) do trabalho, se constitua nesse espaço [...]”, negando desta forma, o discurso utilizado por alguns autores, de que a profissionalização do Serviço Social e parte resultante de um processo evolutivo da ajuda, ou de racionalização da filantropia, ou ainda organização da caridade. As profissões são construções históricas que somente ganham significado e inteligibilidade no interior do movimento das sociedades nas quais se inserem, no caso do Serviço Social, suas origens deve ser localizada na emergente sociedade urbano-industrial dos anos de 1930, em uma conjuntura peculiar do desenvolvimento capitalista, marcada por conflitos de classe, pelo crescimento numérico e qualitativo da classe operária urbana e pelas lutas sociais que esta desencadeia contra a exploração do trabalho e pela defesa dos direitos de cidadania. As condições propícias à profissionalização do Serviço Social (e de tantas outras profissões) foram criadas a partir da crescente intervenção do Estado nos processos de regulação e reprodução social, por meio das políticas sociais públicas. Foi o contexto de enfrentamento da “Questão Social” pelo Estado e empresariado, com o apoio da Igreja Católica, que conduziu à institucionalização e legitimação do Serviço Social, em um cenário em que a pobreza é, simultaneamente, naturalizada e vista como ameaça à ordem burguesa. No entanto, as primeiras iniciativas de organização da profissão vinculam-se ao protagonismo de grupos sociais majoritariamente femininos, participantes do movimento católico leigo e responsáveis pela ação social da Igreja Católica junto aos segmentos mais vulneráveis e empobrecidos da classe operária, especialmente crianças e mulheres. A Igreja Católica teve importância singular na configuração da identidade que marca a gênese do Serviço Social no Brasil, sendo responsável pelo seu ideário, pelo inicial e PDF created with pdfFactory trial version www.pdffactory.com 27 incipiente campo de ação, pelas agências de formação dos primeiros Assistentes Sociais. As primeiras escolas de Serviço Social do país, fundadas em São Paulo e Rio de Janeiro, respectivamente em 1936 e 1937, organizaram-se sob forte influência européia, especialmente franco-belga, países nos quais foram formadas as pioneiras do Serviço Social. As bases da formação, inspiradas na doutrina social católica, assentavam-se em uma ótica psicologizante e de individualização dos problemas sociais, que tendia a buscar as especificidades da questão social na esfera ético-moral, reforçando o substrato liberal de que o destino pessoal é de responsabilidade do próprio indivíduo. Assim, o que se percebe é que a emergência do Serviço Social brasileiro torna-se iniciativa de representantes da classe dominante-burguesa, intrinsecamente ligada ao poder religioso da Igreja Católica ou do Estado, garantindo a produção e reprodução do sistema capitalista. Neste contexto a profissionalização dos Assistentes Sociais surge a partir dos anos de 1935, sendo mais tarde, no final da década, a legalização do ensino da profissão. Netto (1992) afirma que o caminho para a profissionalização foi construído pelos próprios assistentes sociais, resultante do processo histórico, no qual os mesmos vão se inserindo em atividades interventivas, reordenando seus espaços constituintes de intervenção. A partir dos anos de 1940 e 1950, a “questão social” – expressão das desigualdades decorrentes do aprofundamento do capitalismo no Brasil – passa por grandes transformações, especialmente a partir da II Guerra Mundial. A aceleração industrial, as migrações campo-cidade, o intenso processo de urbanização, aliados ao crescimento das classes sociais urbanas, especialmente do operariado, vão exigir novas respostas do Estado e do empresariado às necessidades de reprodução da vida social nas cidades. A questão social se põe como alvo da intervenção do Estado, por meio das políticas sociais públicas, ao mesmo tempo em que o empresariado, imbuído de um novo espírito social, substitui a mera repressão e assistência eventual por mecanismos que visam á colaboração entre capital e trabalho. É nesse contexto, em plena ditadura de Vargas, que é criada, em 1942, a Legião Brasileira de Assistência Social (LBA), primeira instituição de porte nacional, bem como as grandes instituições patronais que irão configurar o que hoje conhecemos como sistema “S” – PDF created with pdfFactory trial version www.pdffactory.com 28 SESI, SENAI, SESC, SENAC. A diversidade de serviços sociais e educacionais prestados por estas instituições, relacionados às demandas de qualificação da força de trabalho e de sua reprodução física e espiritual, leva à incorporação institucional de contingentes de assistentes sociais que passam a desenvolver ações educativas e normativas de ajustamento psicossocial dos trabalhadores voltadas ao atendimento das novas necessidades relacionadas à integração de massas populacionais ao mercado de trabalho e à vida urbana. A criação das instituições assistenciais, com grande capilaridade no território nacional, amplia significativamente mercado de trabalho do Assistente Social – agora investido de um mandato oficial a partir do seu reconhecimento e legitimação pelo Estado e empresariado. Embora regulamentado como profissão liberal em 1949, o Assistente tem seu desempenho profissional majoritariamente vinculado a instituições públicas e privadas, passando a se responsabilizar pela implementação das políticas sociais, isso, marca seu perfil assalariado, que segundo Netto: [...] a base própria da sua profisionalidade, as políticas sociais, conformam um terreno de conflitos - e este é o aspecto decisivo - constituídas como respostas tanto às exigências da ordem monopólica como ao protagonismo proletário, elas se mostram como territórios de confrontos nos quais a atividade profissional é tensionada pelas contradições e antagonismos que as atravessam enquanto respostas. (NETTO, 2005: 78). A crescente centralização das políticas sociais pelo Estado gera o aumento da demanda pela execução de programas sociais no interior das instituições, induzindo ao crescimento numérico das escolas e do meio profissional, com a conseqüente expansão do Serviço Social e elevação do status profissional. A realização do I Congresso Brasileiro de Assistentes Sociais (CBAS), em 1947, marca o início de uma tendência de valorização crescente dos encontros nacionais, cada vez mais massivos e reveladores dos debates e das polêmicas profissionais. A forte influência norte-americana na América Latina e no Brasil, a partir do segundo pósguerra penetra também na profissão, com a incorporação das teorias estrutural-funcionalistas e das metodologias de intervenção, especialmente o Serviço Social e o Serviço Social de Grupo. O desenvolvimentismo, enquanto ideologia do desenvolvimento foi difundida pelos organismos internacionais com a criação da Organização das Nações Unidas (ONU), em 1945. A partir do contexto da “guerra fria” e com o mundo cada vez mais bipolarizado (bloco capitalista X bloco socialista), a ONU e o governo norte-americano, preocupados com os PDF created with pdfFactory trial version www.pdffactory.com 29 riscos políticos que os latino-americanos (atraso e a pobreza) poderiam trazer para a ordem capitalista no continente, iniciam extenso programa de cooperação e assistência técnica e financeira aos países subdesenvolvidos. A proposta de Desenvolvimento de Comunidade (DC) tem origem nesse cenário do pós-guerra, na segunda metade da década de 40, especialmente por meio de programas de educação de adultos e de modernização da agricultura nas zonas rurais. A partir do final da década de 50, o DC passa a ser recomendado em larga escala pelos organismos internacionais como uma das estratégias de superação do subdesenvolvimento. No Brasil, embora o desenvolvimento tenha constituído o centro da política do governo JK (1956-60), a sua influência no Serviço Social limitou-se às experiências de DC no meio rural com a criação de vários programas inspirados nas propostas norte-americanas. Nesse primeiro período, sob a influência do funcionalismo norte-americano, a proposta oficial de DC é estimulada como mecanismo de correção das “disfuncionalidades” causadas pelo sistema capitalista, constituindo-se em instrumento ideológico de integração da população pobre aos projetos de desenvolvimento, onde o social é concebido como variável dependente do crescimento econômico. Além da participação de Assistentes Sociais em programas de DC com populações rurais, os anos de 1950 e 1960 deram novo impulso ao desenvolvimento quantitativo e qualitativo da profissão: aumento do número de escolas; interiorização do Serviço Social para as prefeituras de pequenas e médias cidades; abertura de um novo campo de trabalho nas grandes empresas, especialmente as industriais; incorporação de novas atribuições profissionais relacionadas à coordenação, planejamento e administração de programas sociais. A partir da influência norte-americana, o Serviço Social alcança maior nível de sistematização teórica e técnica, avança no trabalho com indivíduos e famílias e consolida novas abordagens metodológicas, como o Serviço Social de Grupo e o Serviço Social de Comunidade que passam a ser desenvolvidas nas instituições sócio-assistenciais em diferentes áreas, como saúde, habitação, educação, previdência social. Nos primeiros anos da década de 1960, em uma conjuntura de ampliação da participação política e de radicalização da lutas sociais, o Serviço Social passa a integrar-se às experiências de DC comprometidas com as transformações estruturais que se generalizam PDF created with pdfFactory trial version www.pdffactory.com 30 pelo país num cenário de acirramento das reivindicações pelas “reformas de base” durante o governo João Goulart. Os primeiros anos da década de 1960 desencadeiam um início de mudanças significativas no Serviço Social numa conjuntura de aprofundamento do debate político na sociedade diante do agravamento da Questão Social e dos níveis de empobrecimento da população trabalhadora, contrastando com os índices de crescimento econômico verificados em finais dos anos 1950. O II Congresso Brasileiro de Assistentes Sociais, realizado no Rio de Janeiro em 1961, representa o marco oficial da inserção da profissão no projeto desenvolvimentista e da incorporação do DC numa perspectiva modernizadora e de atualização da profissão frente às novas demandas do Estado e dos setores dominantes. Com o governo João Goulart abre-se um período de ampliação do espaço de participação política e de luta por transformações estruturais na sociedade brasileira, simbolizada pelas “reformas de base”. O debate político se radicaliza e aglutina partidos, sindicatos, movimentos sociais e diferentes atores da sociedade civil. A mobilização política atinge o campo (Ligas Camponesas e sindicalismo rural) e a cidade (Movimento de Educação de Base - MEB, Centros de Cultura Popular). As classes populares se organizam crescentemente. Esse intenso movimento político-cultural reúne profissionais, intelectuais, trabalhadores em torno da luta anti-imperialista na defesa de um projeto nacional-desenvolvimentista. Destaca-se a intervenção ativa do movimento estudantil, por meio da União Nacional dos Estudantes (UNE), e as transformações da Igreja Católica na América Latina, agora sob os influxos do Concílio Vaticano II (1962) que dá origem à chamada Igreja Popular, primeiro passo para a formulação da “teologia da libertação”. O Serviço Social recebe as influências dessa conjuntura e, pela primeira vez, observase no meio profissional um movimento inicial de crítica às práticas tradicionais, assistencialistas e integradoras desenvolvidas até então. Começa a despontar no meio profissional a necessidade do Serviço Social sintonizarse com uma sociedade em mudança e responder a demandas macrossocietárias. Marca esse PDF created with pdfFactory trial version www.pdffactory.com 31 processo as experiências de grupos de Assistentes Sociais vinculadas à esquerda católica e aos projetos de educação de base e de organização popular em comunidades urbanas e rurais, inspirados nas teorias de educação para a libertação e no método de alfabetização de Paulo Freire. No entanto, o golpe de 1964 e a ditadura militar interrompem o processo de radicalização democrática, o que põe fim ao pacto populista e ao engajamento dos sujeitos sociais comprometidos com a implantação de alternativas de desenvolvimento nacional – populares e democráticas em nosso País. O golpe militar de 1964 impôs ao Brasil uma nova ordem política – institucional apoiada num extraordinário fortalecimento do Estado, voltado estrategicamente para a consolidação da chamada modernização conservadora. Para a implantação deste “modelo”, o Estado moderniza e amplia suas funções econômicas, sociais, políticas e culturais. A orientação política geral foi a de integrar a economia brasileira aos padrões internacionais definidos pelo capitalismo monopolista para os países da periferia do sistema capitalista, processo que vinha se desenvolvendo no Brasil desde a década de 1950 (JK). Para tanto, o Estado comprimiu violentamente o espaço político da sociedade civil, especialmente daqueles que se opunham ao novo padrão de desenvolvimento – as classes trabalhadoras e populares. As mudanças operadas nas políticas salarial e sindical vieram acompanhadas de arrocho salarial, aumento dos níveis de exploração do trabalho e perda de direitos historicamente conquistados, como os direitos de greve, de liberdade de organização, de estabilidade no emprego. Ao mesmo tempo, uma rede de relações autoritárias e repressivas penetrou todas as dimensões da vida social, criminalizando a sociedade civil, desarticulando as instituições políticas existentes e a resistência dos movimentos de campo, da cidade e das lideranças democráticas comprometidas com as forças populares e de esquerda. Nesse contexto, a Questão Social passa a ser tratada a partir do binômio repressão/assistência e um leque de políticas sociais e assistenciais é implantado pelo Estado de forma centralizada, autoritária e burocrática. PDF created with pdfFactory trial version www.pdffactory.com 32 O conjunto de instituições responsáveis pela implementação dos serviços sociais públicos em diversas áreas como saúde, habitação, previdência social sofre grande intervenção estatal, reorganizadas sob a lógica mercantil que beneficia os interesses do grande capital. As médias e grandes empresas também se reestruturam e passam a implementar novos programas e benefícios sociais, além da criação de departamentos de recursos humanos encarregados da vigilância e controle da força de trabalho no âmbito da produção. Esse amplo processo de mudanças, que atinge também as tradicionais entidades assistenciais e filantrópicas, é responsável pelo alargamento, diversificação e nacionalização do mercado de trabalho dos assistentes sociais, levando a profissão a modernizar-se, a incorporar nova racionalidade técnica, a modificar o perfil da formação profissional. Trata-se de uma conjuntura do Serviço Social marcada, ao mesmo tempo, por adequação da profissão às demandas impostas pelo regime ditatorial, cujo modelo econômico elevou exponencialmente os índices de pobreza relativa e absoluta, deteriorando ainda mais as condições de vida e de trabalho da população. A insatisfação em relação ao tradicionalismo do Serviço Social ganha visibilidade nos primeiros anos da década de 60 do século XX. O questionamento ao Serviço Social Tradicional é um fenômeno que se insere num movimento de abrangência internacional no qual o paradigmático maio de 68 emerge como expressão de uma crise civilizatória de grandes proporções, de contestação á ordem burguesa e ao conjunto de suas instituições. Na América Latina, esse processo se cruza com as expectativas de mudança desencadeadas com a Revolução Cubana, que alimentou a possibilidade histórica de construção de uma nova ordem societária no continente. Esse quadro penetra mais diretamente no Serviço Social a partir da revisão crítica que se processa nas ciências sociais, como o debate sobre a dependência e as teorias do desenvolvimento. Com a emergência da chamada Igreja Popular e a teologia da libertação; com a presença ativa do movimento estudantil e a contestação nas Universidades; com o movimento de contracultura que rompe valores tradicionais e dissemina, especialmente na juventude, novos comportamentos e expressões culturais comprometidos com a transformação social. Imbuído desse caldo cultural, o movimento de reconceituação do Serviço Social na América Latina, heterogêneo e plural, foi desencadeado pela ação inicial da geração “65”, PDF created with pdfFactory trial version www.pdffactory.com 33 constituída por grupos profissionais de vanguarda reunidos em torno do questionamento ás bases conservadoras do Serviço Social, à importância acrítico de modelos de intervenção, na defesa de um Serviço Social latino-americano comprometido com o projeto de desenvolvimento para o continente. Nesse sentido, os “Seminários Regionais de Serviço Social” tiveram um papel central e seu marco foi o I Seminário Regional Latino-Americano de Serviço Social realizado em 1965 na cidade de Porto Alegre. Posteriormente, o Centro Latino-Americano de Trabalho Social (CELATS) - órgão acadêmico da Associação Latino-americana de Trabalho Social - com sede em Lima, transforma-se em núcleo irradiador da investigação e da produção teórico-metodológica responsável pela elaboração do pensamento crítico mais avançado do Serviço Social na América Latina. No Brasil, o “modelo” de desenvolvimento implantado pela ditadura precipita a crise do Serviço Social Tradicional, provocando um significativo processo de renovação da profissão que neutraliza as vertentes críticas comprometidas com a democratização pré-64 e estimula as tendências sintonizadas com um viés desenvolvimentista-modernizador. Note-se que, das suas origens até a primeira metade da década de 70, o Serviço Social no Brasil foi marcado pela hegemonia de interpretações e análises sob às influência do Serviço Social Europeu e norte-americano, onde: [...] o Serviço Social, em sua trajetória intelectual, [...] cresce no universo cultural do pensamento humanista-cristão e, mais tarde, vai se secularizar e se modernizar nos quadros do pensamento conservador europeu - do anticapitalismo romântico, que tende a ler a sociedade como uma grande comunidade, em que as classes sociais desaparecem da análise - privilegiando-se a ótica da harmonia, da solidariedade no ordenamento das relações sociais. Mais tarde, incorporamos a herança das ciências humanas e sociais, especialmente na sua vertente empiricista norte-americana. A essas fontes de inspiração intelectual alia-se, na década de 70, no auge do movimento de reconceituação, o estruturalismo haurido em Althusser, entre outros, e também o marxismo vulgar, que vêm temperar uma análise de cunho marcadamente positivista e empiricista da sociedade, mas acalentada por um discurso dito marxista, aparentemente progressista e radical (Iamamoto 1998, p.174175), As primeiras expressões da renovação do Serviço Social estão consubstanciadas nos Documentos de Araxá (1967) e Teresópolis (1970), publicados pelo CBCISS (então Comitê Brasileiro da Conferência Internacional de Serviço Social), que tiveram grande repercussão em toda a América Latina. PDF created with pdfFactory trial version www.pdffactory.com 34 Em dissonância com a direção assumida pelo Serviço Social brasileiro, cabe destacar a experiência singular (e breve) da Escola de Serviço Social da PUC de Minas Gerais (197275), formuladora do conhecido “método BH”, que inaugura a vertente de ruptura com o tradicionalismo profissional e será retomado pelo Serviço Social brasileiro apenas uma década depois. Por outro lado, naqueles países que viviam experiências de radicalização democrática, especialmente Chile, Uruguai e Argentina, o movimento de reconceituação tomou novos rumos, rompendo com o pensamento conservador e avançando na elaboração de um projeto profissional crítico e contestador da sociedade capitalista, fundado em vertentes do pensamento marxista que, contudo, foi interrompido pelo ciclo ditatorial que se implantara naqueles países e se generalizara pelo continente. A partir de 1960/70 amplia-se a rede de serviços sociais e com ela a demanda do trabalho do Assistente Social no campo das políticas sociais, impulsionando um avanço nos âmbitos acadêmico, profissional e organizativo. Contribuiu para isso a inserção do Serviço Social no circuito universitário, o diálogo mais estreito com as disciplinas das ciências sociais e a criação e expansão da pós-graduação, com a implantação dos cursos de mestrado e doutorado no início dos anos 1970, de que a PUC – SP é pioneira. As transformações que começam a emergir no debate teórico e na pesquisa são acompanhadas de significativa mudança nas instâncias organizativas e nos fóruns coletivos da categoria dos Assistentes Sociais. Desde a criação das entidades de ensino, pesquisa e representação profissional, como ABESS, CBCISS, CFAS, CRAS que remontam a 1946 e são a matriz das atuais organizações da categoria profissional, são inúmeros os eventos nacionais e regionais patrocinados por esses organismos que registram os debates e as polêmicas que se intensificam com as transformações sócio-políticas da sociedade brasileira. O mais emblemático desses eventos ocorreu no III Congresso Brasileiro de Assistentes Sociais, realizado em São Paulo, em 1979, que passou a ser identificado como o “Congresso da Virada”, quando a sua organização conservadora sofreu fortes questionamentos e os convidados oficiais destituídos da comissão de honra e substituídos por dirigentes de movimentos sindicais e populares, dentre eles Luís Inácio Lula da Silva. PDF created with pdfFactory trial version www.pdffactory.com 35 Esse fato histórico teve grande repercussão na categoria profissional, constituindo um marco no processo de politização e mobilização de profissionais e estudantes de Serviço Social e na reativação das entidades sindicais em todo o país, culminando com a criação da Associação Nacional de Assistentes Sociais – ANAS (1983). No mesmo ano de 1979, e sua XXI Convenção Nacional realizada em Natal, a ABESS aprova o novo currículo mínimo de Serviço Social, implantado em todo território nacional a partir de 1982. No final da década de 1970, no contexto das greves operárias do ABC, da reorganização da sociedade civil e do avanço dos movimentos populares, a crise da ditadura já se expressava com maior vigor. A anistia política, em 1979, foi seguida pela reestruturação partidária que cria o Partido dos Trabalhadores, como resultado da confluência da mobilização de trabalhadores, intelectuais e dos movimentos pastorais aglutinados em torno das Comunidades Eclesiais de Base (CEB´s). A transição democrática – dando sinais de esgotamento e crise do regime ditatorial – reaviva no Serviço Social a vertente comprometida com o projeto democrático-popular que, a partir da primeira metade de 1980, aglutina vanguardas profissionais engajadas em um movimento de crescente explicitação da dimensão política e do significado social da profissão. O aprofundamento do processo organizativo e ampliação das referências teóricometodológicas e ídeo-políticas comprometidas em repensar o Serviço Social em uma perspectiva radicalmente crítica, passam a qualificar o debate acadêmico e político da profissão, o que se expressa com densidade na primeira metade de 1980. O desgaste do regime militar, as contradições no interior das classes dominantes e as conseqüências desastrosas do modelo econômico no aumento da pobreza e da desigualdade social fizeram com que o movimento social contra a ditadura ganhasse novos contornos no início de 1980. A mobilização da sociedade civil, que já vinha ganhando força desde a década passada com a reorganização do movimento sindical e a emergência dos novos movimentos populares, vai se adensando com a incorporação de diferentes categorias profissionais (médicos, professores, sanitaristas, funcionários públicos, assistentes sociais). Esse contingente de PDF created with pdfFactory trial version www.pdffactory.com 36 trabalhadores engrossa as lutas políticas, recriando suas entidades representativas e alinhandose às reivindicações democráticas de retomada do poder civil, de reconhecimento de direitos sociais e políticos das maiorias sociais, de democratização do Estado, de enfrentamento da grave crise social. No âmbito do Serviço Social inicia-se a gestão de um projeto profissional comprometido com os direitos humanos e sociais, com a ampliação da democracia social e econômica, com a qualificação das políticas públicas e a construção da cidadania para todos. As entidades profissionais do Serviço Social jogaram um papel central nesse processo e, juntamente com os círculos acadêmicos mais críticos, que resistiram no espaço universitário à política educacional imposta pela ditadura, foram responsáveis pelas profundas transformações operadas no Serviço Social. A década de 1980 consolidou no plano ídeo-político o rompimento com o histórico conservadorismo no Serviço Social, para isso, foram fundamentais a revisão do projeto de formação profissional conduzida pela entidade nacional representativa do ensino de Serviço Social - ABESS/CEDEPSS (Centro de Documentação e Pesquisa em Serviço Social e Políticas Sociais) e o papel político – organizativo do CFESS/CRESS destacando-se a elaboração do Código de Ética de 1986, comprometido com o um novo projeto ético-político profissional. A direção social assumida revela os esforços de redefinição do Serviço Social no interior da dinâmica societária dos anos 80 no sentido da construção de uma nova legitimidade social do Serviço Social junto às classes subalternas. A perspectiva de “intenção de ruptura” (expressão cunhada por José Paulo Netto que se generalizou no meio profissional) é caudatária desse amplo movimento de renovação crítica do Serviço Social, no qual é possível constatar um notável amadurecimento teórico, a ampliação da produção editorial oriunda especialmente dos cursos de pós-graduação, além de uma rica agenda intelectual que incorpora polêmicas de relevo, decisivamente marcadas pelas correntes de pensamento marxista. Sobre a influência do pensamento marxista no Serviço Social, Barroco salienta que [...] em termos da contribuição do pensamento marxista para o processo de ruptura com o tradicionalismo do Serviço Social, cabe salientar que os anos 80 revelam uma conquista fundamental: a consciência do profissional de sua condição de trabalhador, que rebate na organização política da categoria e na reflexão marxista que, gradativamente, se apropria da realidade social, apreendendo o trabalho como elemento fundante da vida social (Barroco, 1996:282). PDF created with pdfFactory trial version www.pdffactory.com 37 Abrindo a década de 1980, destaca-se a publicação do livro “Relações Sociais e Serviço Social no Brasil” (1982), de Marilda Vilela Iamamoto e Raul de Carvalho,que teve como base o projeto de investigação sobre a história do trabalho social na América Latina. Obra polêmica à época obteve ampla penetração no meio profissional que se estende até o presente pela reflexão inaugural que realiza sobre o significado social do Serviço Social em suas conexões com o movimento de produção e reprodução das relações sociais na formação social brasileira, sob os influxos diretos da teorização marxista. Cabe ainda enfatizar o importante papel desempenhado pela Revista Serviço Social e Sociedade, publicada pela Cortez Editora ininterruptamente desde 1979, na difusão do conhecimento e do debate associados à formulação do projeto de renovação crítica do Serviço Social Brasileiro. Nas lutas pela democratização, o Brasil foi palco de um intenso processo de revitalização da sociedade civil, que colocou em xeque não apenas o Estado ditatorial, mas a rede de relações autoritárias que atravessa a sociedade brasileira. Os anos 1980 representaram um amplo movimento de conquistas democráticas: os movimentos sociais organizaram-se, em diferentes áreas, os sindicatos fortaleceram-se, as demandas populares ganharam visibilidade pública, as aspirações por uma sociedade justa e igualitária expressaram-se na luta por direitos, que acabaram se consubstanciando na Constituição de 1988. A promulgação da Constituição de 1988 representou, ao menos no plano jurídico, a promessa de afirmação e extensão dos direitos sociais em nosso país, em consonância com as transformações sócio-políticas e o agravamento da crise social que exigiam respostas públicas do Estado. Entre as inovações contidas na Carta Constitucional destacam-se a ampliação de direitos, principalmente no campo das relações de trabalho, e a introdução do capítulo referente à Seguridade Social. Apesar das dificuldades para a implementá-la, a adoção do conceito de Seguridade Social, ainda que restrito às políticas de Saúde, Previdência e Assistência Social, representou inegável avanço por inscrevê-la no terreno dos direitos, imprimir-lhes status de política pública, definir fontes de financiamento e novas modalidades de gestão democrática e descentralizada. PDF created with pdfFactory trial version www.pdffactory.com 38 Nesse âmbito, importantes dispositivos foram definidas para a efetivação de um novo pacto federativo que reconhece o município como ente autônomo da federação e transfere para este nível novas competências e recursos públicos, bem como institui mecanismos de participação da sociedade civil na implementação das políticas públicas. Entre eles destacam-se os Conselhos de políticas públicas e defesa de direitos, nas áreas de saúde, criança e adolescente, assistência social, educação, entre outras. Esses conselhos se organizam velozmente em todo o território nacional e representam uma inovação democrática das mais relevantes no sentido de criar novos espaços públicos de interlocução entre governo e sociedade, na perspectiva de tornar a gestão pública mais permeável às demandas emergentes da sociedade e reduzir a tendência do Estado e do poder burocrático de monopolizar as esferas de decisão política. Também as Conferencias de políticas públicas nos três níveis de governo são importantes espaços de participação da sociedade civil no exercício do controle social. O Serviço Social vem participando ativamente da construção da política de seguridade social e das demais políticas sociais em nosso país, destacando-se sua contribuição para a consolidação da assistência social como política pública de direitos a para a elaboração das leis orgânicas como a LOAS, o SUS e também do ECA. Nesse contexto, abrem-se novas possibilidades de exercício profissional ao Assistente Social comprometido com a ampliação de direitos e difusão de uma cultura pública na sociedade brasileira. No entanto, esses avanços vieram na contramão de um movimento internacional de fortalecimento de ideologias contrárias à efetivação dos direitos sociais legalmente definidos pela Constituição, que se expressará com vigor na entrada dos anos 90. O cenário político dos anos 1990 desencadeia novos e importantes processos sóciopolíticos com grandes repercussões no Serviço Social. Porém é no curso da década de 70 que essas transformações societárias têm sua origem na crise mundial do padrão de crescimento capitalista que vinha se desenvolvendo desde o segundo pós-guerra – os “30 anos gloriosos” de expansão da economia capitalista. A estagnação da economia mundial, a crise dos Estados de Bem-estar Social e a derrocada do “socialismo real” colocam em xeque o padrão societário que possibilitou um certo avanço de conquistas sociais, especialmente nos países capitalistas centrais. PDF created with pdfFactory trial version www.pdffactory.com 39 A crise deste “modelo”, no contexto da globalização neoliberal ganha particularidades no Brasil, agregando novas questões às históricas configurações da pobreza estrutural e da desigualdade social que caracterizam a formação social brasileira. Os anos 1990 foram palco de um complexo processo de regressões no âmbito das responsabilidades públicas e da universalização dos direitos, com profundas transformações societárias determinadas pelas mudanças na esfera do trabalho, pela (contra) reforma do Estado e pelas novas formas de enfrentamento da Questão Social, com rebatimentos nas relações público-privado. O agravamento da Questão Social, decorrente do processo de reestruturação produtiva e da adoção do ideário neoliberal, repercute no campo profissional (os usuários dos serviços sociais públicos) como também no mercado de trabalho dos Assistentes Sociais que, como conjunto dos trabalhadores, sofre os impactos das novas feições que atingem o exercício profissional. A globalização do sistema de produção e dos mercados, a financeirização da economia e a explosão tecnológica e informacional promovem intensas mudanças nos processos de trabalho, introduzindo estratégias de flexibilização que levam a precarização, insegurança e vulnerabilidade do trabalho, das condições de vida e das formas de organização e defesa dos trabalhadores, constrangidos pelo crescimento da subcontratação, da informalidade e do desemprego, do achatamento salarial e do aumento da desproteção social. À vulnerabilização do trabalho associou-se a diminuição da ação reguladora do Estado e a erosão do sistema público de proteção social, com a crescente subordinação das políticas sócias ao receituário neoliberal de ajuste macroeconômico e de privatização dos serviços públicos. Nesse contexto, difunde-se o discurso da solidariedade social e das parcerias entre Estado e organizações privadas e ganha força uma nova concepção de sociedade civil, comunitarista e despolitizada, valorizada como pólo de virtualidades em oposição à crescente desqualificação da ação estatal. Trata-se de uma dinâmica societária que contribui para reforçar a privatização do fundo público, o encolhimento da esfera pública e da legitimidade universalista dos direitos, a difusão de uma cultura política anti-pública e privatista. PDF created with pdfFactory trial version www.pdffactory.com 40 A herança da última década deixa como pesado legado a subordinação do social aos interesses do capital financeiro, o social constrangido e determinado pelo econômico. São processos que atingem as diferentes profissões e também o Serviço Social, que tem nas políticas sociais seu campo de intervenção privilegiado. O enfrentamento do projeto neoliberal transformou o campo das políticas públicas e da luta por direitos muito mais complexa. Ao lado do avanço do ideário conservador nos âmbitos do Estado, da economia e da sociedade, a década de 90, também foi cenário de um intenso movimento de forças sociais, que desde os anos 80 se engajaram na formulação de propostas e na invenção de novos desenhos e formas de implementação das políticas públicas com participação popular. Nesses últimos dez anos, diferentes mecanismos participativos e de controle social, democratizadores da gestão pública das políticas sociais, começaram a ser postos em prática, como os conselhos gestores, fóruns em defesa das políticas públicas, plenárias populares, conferências nos três níveis de governo, orçamento participativo, audiências públicas, ouvidorias sociais, com notável presença e participação ativa dos Assistentes Sociais. É próprio dos anos 1990 o debate e a construção do que se convencionou denominar projeto ético-político-profissional do Serviço Social brasileiro, resultado da organização coletivas da categoria profissional por meio de suas principais entidades: O Conjunto CFESSCRESS; a Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social (ABEPSS); a Executiva Nacional de Estudantes de Serviço Social (ENESSO). Além de encontros e seminários específicos voltados para as questões do ensino e da pesquisa, do exercício profissional e da organização dos estudantes de Serviço Social, este conjunto de entidades realiza a cada três anos o Congresso Brasileiro de Assistentes Sociais (CBAS), espaço público de reflexão, debate e proposição, para onde converge um número cada vez mais expressivo de profissionais. Decorre dessa dinâmica a nova Lei se Regulamentação da Profissão (Lei nº 8662) e o novo Código de Ética (Resolução CFESS nº 273), ambos de 1993; e também as atuais Diretrizes Curriculares da formação profissional, aprovadas em 1998. Esse esforço ético, político, acadêmico e profissional expressa a construção do Serviço Social brasileiro dos últimos vinte anos, que afirma como valores centrais à liberdade, a PDF created with pdfFactory trial version www.pdffactory.com 41 emancipação e a plena expansão dos indivíduos sociais, o compromisso com a competência e com a qualidade dos serviços prestados, o aprimoramento intelectual, a formação acadêmica qualificada, uma nova relação com os usuários e outras categorias profissionais, rumo à emancipação e à construção de uma nova ordem social radicalmente humana. O aprofundamento deste projeto profissional do Serviço Social na direção apontada, em um contexto de despolitização do social e da política, supõe a continuidade da atuação de entidades representativas e legitimas, capazes de coordenar e articular o trabalho profissional, o ensino e a pesquisa na área, tendo como baliza a dimensão pública do papel exercido pelo Assistente Social na contemporaneidade. Em tempos de globalização neoliberal, implica também na expansão profissional para além das fronteiras nacionais, na perspectiva de integração regional e inserção internacional, em um movimento que busca fortalecer um projeto ético-político-profissional do Serviço Social como resposta coletiva aos desafios do presente. É a partir deste processo, que os assistentes sociais passam a questionar a orientação que a burguesia vinha imprimindo na atuação profissional dos mesmos. Esse entendimento se processa no contexto de sua própria intervenção na realidade, e no confronto e na convivência de ideologias distintas do capitalismo. Iamamoto (1998) sublinha que o significado social da profissão deve ser contextualizado como resultante do caráter contraditório da pratica profissional nas relações sociais, na reprodução destas relações, na reprodução da própria sociedade capitalista, ou seja, na sua totalidade, inclusive das suas contradições e antagonismo. Assim, a atuação profissional do assistente social, possui uma dimensão interventiva, pois é demandado e contratado pelo capital, com a finalidade de intervir nas expressões da “questão social” sentidas pela classe operária. Neste contexto, destaca-se a importância de uma formação profissional capaz de orientar o exercício profissional dos assistentes sociais, pautando-se por um pensamento critico e dialético. Pauta decorrente do Movimento de Reconceituação, que na concepção de Netto, refere-se a um movimento que promove a intenção de ruptura com o caráter conservador, objetivando orientar e redimensionar o exercício profissional do Serviço Social. PDF created with pdfFactory trial version www.pdffactory.com 42 É a partir desta necessidade de construção de uma nova identidade profissional, que os assistentes sociais buscarão uma nova matriz teórica que compreenda a sociedade burguesa e suas contradições, lócus de sua intervenção profissional. Colocando em questão a objetividade de se avaliar qual projeto de formação capaz de orientar a formação dos profissionais para uma analise mais totalizante e dialética dos fenômenos sociais? Pensar a formação profissional no presente é, ao mesmo tempo, fazer um balanço do debate acerca do Serviço Social, indicando temas a serem desenvolvidas, pesquisas a serem estimuladas para decifrar as novas demandas que se apresentam ao Serviço Social (IAMAMOTO, 2003, p.169). Visualiza-se, assim, um processo que conduzirá as bases para o debate do projeto de Formação Profissional, cujo processo culmina com a aprovação do Novo Currículo Mínino para os Cursos de Serviço Social em 1982, que buscou evidenciar a ultrapassagem da visão endógena da profissão, sem perder de vista que o debate acerca da formação vinha sendo desenvolvido pela categoria e por ora não foi estagnado com a aprovação do currículo de 1982. Pois se percebia que ainda tal currículo mantinha traços do conservadorismo, assim a categoria profissional manteve o debate com o intuito de eliminar todas as formas de conservadorismo no processo de formação que de acordo com Guerra (2004, p.38) “Por meio da intenção de ruptura, o serviço social brasileiro consolida sua maturidade intelectual (Cf. Netto, 1996 e Iamamoto, 1992). O movimento que o conjunto dos assistentes sociais vem desencadeando com maior intensificação a partir dos anos 1980, no âmbito da formação busca compreender e articular a Formação Profissional e a demanda posta à profissão pelo mercado de trabalho, não de forma linear às exigências do mercado, mas com uma direção que objetiva apreender as demandas posta a profissão no contexto nacional. O que se buscou foi à construção de uma proposta de formação profissional que formasse assistentes sociais capazes de responderem as demandas contemporâneas que vão se constituindo decorrentes das mudanças apresentadas pelo modo de produção capitalista, que por sua vez, altera visivelmente a esfera da produção e do Estado, tendo como conseqüência o agudizamento da “questão social”. Iamamoto, afirma que estas mudanças percebidas no “mundo do trabalho”, não são alheias ao Serviço Social, as mesmas também ocorrem na relação de trabalho do Assistente Social e ao mesmo tempo com os nossos usuários, assim é essencial que: PDF created with pdfFactory trial version www.pdffactory.com 43 [...] a formação profissional possibilite aos assistentes sociais compreender criticamente as tendências do atual estagio da expansão capitalista e suas repercussões na alteração das funções tradicionalmente atribuídas à profissão e no tipo de capacitação requerida pela “modernização” da produção e pelas novas formas de gestão da força de trabalho; que dê conta dos processos que estão produzindo alterações nas condições de vida e de trabalho da população que é alvo dos serviços profissionais, assim como das novas demandas dos empregadores na esfera empresarial (IAMAMOTO, 2003, p.180). Decorrente do processo de flexibilização do sistema capitalista, a “questão social”, vem se complexificando em suas múltiplas expressões e determinações, o que acaba aumentando a demanda profissional dos assistentes sociais, o que traz à tona a essencialidade de formular um projeto de formação cujas bases formem profissionais capazes de aprender este contexto e de responder as demandas que chegam à profissão. Através dos debates historicamente desenvolvidos pela categoria profissional, fundamentou-se a construção do atual projeto de formação, materializado nas diretrizes curriculares aprovadas pelo conjunto da categoria em 1996, que teve como ponto de partida a construção do Currículo Mínimo de 1982, aprovado na Assembléia Nacional da ABESS (Associação Brasileira de Ensino em Serviço Social) em Natal, RN. Tal proposição foi orientada pelo pensamento teórico marxista, que possibilitou a compreensão da realidade a partir do movimento da história. Essas Diretrizes passaram a exprimir a centralidade da “Questão Social” em que a formação profissional tem como objetivação: capacitar e orientar os profissionais para intervir nas expressões da “questão social”, pois de acordo com a ABESS: A perspectiva é, então, aprofundar a compreensão da ‘questão social’ como elemento que dá concretude à profissão, ou seja, que é ‘sua base de fundação histórico-social na realidade’, e que nesta qualidade, portanto, deve constituir o eixo ordenador do currículo (ABESS. 1997, p.20-21) Assim, se faz necessário problematizarmos as configurações históricas desta formação neste período de barbárie capitalista em suas dimensões político-social e econômica, onde a formação profissional dos assistentes sociais vem sofrendo brutal ataque da ordem do capital, que traz sérias implicações para o Ensino, a Pesquisa e Extensão. PDF created with pdfFactory trial version www.pdffactory.com 44 1.3 Criação das Primeiras Escolas de Serviço Social no Brasil. A primeira Escola de serviço social da América Latina foi fundada em 1925 em Santiago no Chile, por Miguel Cruchaga - Escola Elvina Matte de Cruchaga. A formação da Escola Elvira Matte de Cruchaga inscreve-se no contexto dos interesses globais da igreja Católica, que procurava colocar-se à frente do conjunto do movimento intelectual para recuperar o seu papel de condutora moral da sociedade. Comprimida entre o pragmatismo burguês e o “ateísmo” socialista, a Igreja redobrava a sua ação nos terrenos mais diversos, renovando os seus intelectuais orgânicos e dotando-os dos instrumentos de intervenção requeridos pelo momento (CASTRO, 2000, p. 73). A Escola de Serviço Social Elvira Matte de Cruchaga exerceu grande influência para a criação de outras escolas pelo mundo, sob orientação da União Católica Internacional de Serviço Social (UCISS), em Bruxelas, na Bélgica. Essa influência resultou, no final de 1935, na fundação da escola no Uruguai; em 1937, no Peru; em 1940, na Argentina e na Venezuela (Castro, 1993). De acordo com Castro (2000) a relação Igreja e Estado possuía uma dimensão continental, pois suas influências bastante poderosas, contudo era a Igreja católica quem obtinha certa eloqüência – papel desempenhado pela Ação Católica Internacional. Esse papel difusor da qual se produziram inúmeros intercâmbios. Anos depois, papel desempenhado pela Igreja possibilitou-lhe o fortalecimento de uma tendência de vasto alcance latino-americano, mediante a expansão de uma “ideologia profissional” em função semelhante seria cumprida por organismos como a ONU e a OEA, derivando daí uma crescente secularização do Serviço Social (id.) O cenário mundial conviveu com uma séria crise econômica gerada pelo "crack" da bolsa de valores de Nova York (1929) que repercutiu fortemente na política brasileira. Paralelamente, a Revolução de 30 no Brasil veio garantir uma nova política, substituindo o domínio dos grandes latifundiários (nos âmbitos regionais) pela forte liderança presidencialista de Getúlio Vargas, quando da instauração do populismo. Lima (1982) neste contexto, coloca que a Revolução de 30 já encontrou um clima favorável para uma legislação social no Brasil que vinha se esboçando desde a década anterior e que se reafirmou com a criação do Ministério do Trabalho. O cenário de mudanças políticas, econômicas e sociais perpetuadas no inicio do século XX também teve seus reflexos no sistema religioso da época. Após a elaboração da constituição brasileira de 1891, que propõe a separação da Igreja e o Estado e as encíclicas PDF created with pdfFactory trial version www.pdffactory.com 45 papais, Rerum Novarum e a Quadragésimo Ano, a Igreja inicia um caminho de aproximação entre o clero e os leigos. Com a Carta Pastoral de 1916, Dom Leme, bispo de Recife, conclama os padres a se aproximarem do laicato, num retorno às bases, atuando juntamente com os fiéis na Questão Social. Esta, por sua vez, além de receber atenção do Estado, passa a ser foco de preocupação, também, da Igreja Católica, que passa a intensificar o trabalho de mobilização de católicos leigos: visava a difusão do pensamento social da Igreja. Portanto, a ação controladora do governo sobre os movimentos operários encontra apoio nas elites políticas, militares, como também da igreja temerosa da penetração comunista. Neste contexto histórico e impulsionado pela influência da Igreja Católica, que se dará o início da formação para o Serviço Social tendo como base fundamental o doutrinarismo e a moral. Portanto, o elemento vocacional aliado ao catolicismo, configura o perfil inicial a ser formado para o exercício do Serviço Social. Segundo Aguiar (1995, p.29) “Muitas escolas de Serviço Social nascem de grupos que participaram dos cursos de formação social e das semanas sociais. Entre elas as de São Paulo, Rio de Janeiro, Natal e Porto Alegre”. Assim, podemos observar que as escolas de Serviço Social no Brasil surgem dentro da visão da Igreja, com caráter neotomista e influenciado pelas Escolas Latino Americanas, lutam contra o consumo e contra o liberalismo. As escolas no Brasil vão surgir sob a influência do modelo franco-belga, que se fundamentava numa linha de apostolado de “Servir ao Outro”, baseado no princípio tomista de salvação da unidade corpo e alma. O foco principal voltava-se para a família, por essa ser o alicerce da reprodução material e ideológica da força do trabalho. Por isso, a ação era assistencialista, na tentativa da cobertura das seqüelas materiais da exploração capitalista (Castro, 2000; Cornely, 2003). Nesse foco o Brasil, terá no Centro de Estudos uma instituição de caráter novo, criado com o objetivo de promover os estudos sociais, surgindo enquanto uma instituição feminina com a finalidade de capacitar pessoas a exercer certas atividades na área de ação social. O centro começava as suas atividades. Albertina Ferreira Ramos e Maria Kiehl partiram para a escola católica de Serviço Social em Bruxelas. Fizeram o curso a fim de voltar ao Brasil com um diploma para assim, constituir uma Escola de Serviço no país. Retornam em 1935 tendo como preocupação adequar os conhecimentos adquiridos no exterior PDF created with pdfFactory trial version www.pdffactory.com 46 com a realidade brasileira. Maria Kiehl diz que as duas estavam conscientes da responsabilidade que iriam assumir: formar assistentes sociais – pessoas capazes de auxiliar os indivíduos a encontrar na sociedade o bem que é destinando a eles. É oriundo dos movimentos da ação social da Igreja deram origem à fundação das duas primeiras Escolas de Serviço Social no Brasil, em 1936, na Cidade de São Paulo e, em 1937, no Rio de Janeiro (Castro, 2000). Assim, em 15 de Fevereiro de 1936 funda-se a primeira escola de Serviço Social no Brasil em São Paulo, estimulada pelo interesse de um grupo de jovens católicas que, durante um curso de formação social, idealizou a criação de um Centro de Estudos e Ação Social (CEAS) que resultou posteriormente na fundação dessa escola. As bases para a criação dessa escola foram fundamentadas na orientação da Escola de Serviço Social de Bruxelas e, por isto, a influência européia (franco-belga), sob orientação tomista, é a primeira repercussão doutrinária na formação dos Assistentes Sociais brasileiros. Nessa orientação, o Serviço Social, como profissão, converteu-se numa das frentes mobilizadas pela Igreja Católica para o desenvolvimento da formação doutrinária e social do laicato, qualificando seus intelectuais para a recuperação moral do operário, visando afastá-lo das influências maléficas dos ideais socialistas e do liberalismo econômico. Por meio da Ação Social a Igreja procura fortalecer sua influência ideológica e reconquistar os privilégios perdidos pela crescente laicização da sociedade no bojo das relações que estabelece com o Estado. Nesses moldes, encarrega-se durante muito tempo da formação dos Assistentes Sociais. Para Yasbek, a necessidade sentida por uma preparação melhor para a ação social da Ação Católica, foi um dos motivos pelo qual se criou esta escola. Sendo a primeira, a escola de São Paulo foi muito importante para a fundação de outras escolas pelo Brasil, não recebiam alunos de outros estados, mas davam assistência a seus diretores. Em 1938, será organizada a Seção de Assistência Social, que, tendo por finalidade ‘realizar o conjunto de trabalhos necessários ao reajustamento de certos indivíduos ou grupos às condições normais de vida’, organiza para tal: o Serviço Social dos casos Individuais, a Orientação Técnica das Obras Sociais, o Setor de Investigação e Estatística e o Fichário Central de Obras e Necessitados. O método central a ser aplicado é definido como sendo o Serviço Social de Casos Individuais, devendo-se ‘estimular o necessitado, fazendo-o participar ativamente de todos os projetos que se relacionam com seu tratamento [...] utilizar todos os elementos do meio social que possa influenciá-lo no sentido desejado, facilitando sua readaptação e propiciar um PDF created with pdfFactory trial version www.pdffactory.com 47 auxilio material reduzido ao mínimo indispensável, ‘para não prejudicar o tratamento (IAMAMOTO; CARVALHO, 2004, p. 175). De acordo com Aguiar, a segunda escola de Serviço Social do país, a primeira no Rio de Janeiro foi fundada em 1937, com influência da Escola de Serviço Social de São Paulo. Sob esta inspiração católica fundou-se a primeira escola de Serviço Social do Rio de Janeiro e a segunda do país que, como a escola paulista, inscrevia-se na luta travada pela Igreja para defender o povo de influencias consideradas nocivas e para constituir-se como a forma normativa da sociedade (CASTRO, 2000, p. 107). Yasbek menciona que o curso de Serviço Social foi organizado ao mesmo tempo em que se originou o curso de Formação Familiar e Social do Rio de Janeiro, ou o Instituto Familiar e Social como Castro e Aguiar denominam, e era respaldado pelo Grupo de Ação Social (GAS) que tinha por objetivo: Formar entre mulheres, não de uma classe, mas de todas as classes sociais, uma consciência de comunidade cristã que venha substituir o individualismo liberal egoísta sem cair na socialização inumana e estatal. Para isso forma assistentes sociais, educadores familiares e donas de casa que venham ser nomeio em que vivam e trabalham, nos institutos em que ensinam ou nos ambientes sociais em que atuam, como elementos de correção das anomalias sociais, verdadeiros elementos de renovação pessoal e católica (LIMA, p. 66. In AGUIAR, 1995, p. 30). Castro (2000) afirma que surgiu também, em um curto período de tempo, a Escola Técnica de Serviço Social criada em 1938 através do Juizado de Menores, e em 1940, a Escola de enfermagem Ana Nery aderiu o curso de preparação ao Serviço Social. Conforme Castro, podemos assim afirmar, que no Brasil, a Igreja católica está entrelaçada a origem desta profissão, nos âmbitos não apenas social, mas político também. E ainda, nasceu conectada à Medicina e ao Direito como explicita Castro: Enquanto, no Chile a primeira escola surge impulsionada a partir da beneficência pública, por um médico – ou seja, a partir do Estado e para auxiliar o exército da medicina - no Brasil a primeira escola surge no seio do movimento católico e sem estar medularmente vinculada a qualquer profissão que lhe atribua um papel explicitamente tributário. Mas, no Rio de Janeiro, a expansão da profissão conectase à Medicina e ao Direito. Nos dois países, porém, apesar destas diferenças, o Serviço Social surge como resposta à questão social e, em particular, à presença do movimento operário e popular, estimulado por contingentes que desenvolviam uma ativa prática de apostolado católico, provenientes das classes dominantes. [...] o surgimento do Serviço Social recebe auxilio de mãos belgas – o que não quer dizer que se operou uma transposição rígida dos modelos europeus (belga, no caso) [...]; a funcionalidade desta variável européia só se explica a partir da base social que propiciou a sua intervenção. (CASTRO, 2000, p. 109). PDF created with pdfFactory trial version www.pdffactory.com 48 Ressaltando ainda que, conforme Yasbek, as primeiras escolas brasileiras, moldaramse em métodos das escolas européias e possuíam como característica comum o objetivo de intensificar e aperfeiçoar o trabalho social católico social católico. Até 1950, as escolas terão influência direta da Igreja Católica como: Belo Horizonte, Porto Alegre, Natal, Escolas Masculinas de São Paulo e Rio de janeiro, usando como padrão as primeiras escolas do país, São Paulo e Rio de Janeiro. Acreditamos que a influência funcionalista não foi a única herdada dos Estados Unidos – embora possa ser predominante – recebemos também e concomitantemente uma influência neotomista fundamentando as técnicas encontradas pelo Serviço Social norte-americano. (AGUIAR, 1995, p. 61). O conservadorismo católico que estruturou os anos iniciais do Serviço Social no Brasil começa perder espaço, a partir dos anos de 1940, ao entrar em contato com o Serviço Social norte-americano, na qual passa a ter suas propostas de trabalho permeadas pelo caráter conservador da teoria social positivista, dentro de uma perspectiva de um Serviço Social mais técnico. Sob essa reorientação na qual a profissão perpassa é que se exige a qualificação e sistematização de seu espaço sócio - ocupacional tendo como objetivo atender às novas configurações do desenvolvimento capitalista e, conseqüentemente, às requisições de um Estado que começa a implementar políticas sociais. Nesse contexto, a legitimação do profissional, expressa em seu assalariamento e ocupação de um espaço na divisão sóciotécnica do trabalho, vai colocar o Serviço Social brasileiro diante da matriz positivista, na perspectiva de ampliar seus referenciais técnicos para a profissão. De acordo com Aguiar, esse contexto traz alguns métodos utilizados para analise das questões sociais de acordo com o “espírito” católico eram três: Serviço Social de Caso, Serviço Social de Grupo e Serviço Social de Comunidade. Serviço Social de Caso: teria como finalidade trabalhar a pessoa de forma personalizada, utilizando a individualidade, autodeterminação, não julgamento, aceitação, relacionamento - respeito à personalidade do cliente. Mas, [...] algumas escolas não aceitavam o título dado ao método, pois argumentavam que ‘caso’ estaria ligado ao anonimato e reduziria a pessoa à ‘coisa’; contrariando dessa forma os objetivos e intenções do Serviço Social de Caso (AGUIAR. 1995, p. 61 62). PDF created with pdfFactory trial version www.pdffactory.com 49 Serviço Social de Grupo: o autor salienta que quem chama a atenção para essa metodologia é o Pe. Terence J. Cook em sua tese de doutorado. Ele a dividiu em três princípios utilizando também a teoria de Santo Tomás. - Primeiro princípio: “Todos os indivíduos têm necessidades humanas comuns que tratam de satisfazer em grupo. (...). O homem necessita viver para os outros e não somente para si” (id., p. 64). - Segundo princípio: O objetivo [...] é o desenvolvimento do indivíduo por meio de grupo em que algumas das necessidades são satisfeitas e o desenvolvimento do individuo e do grupo. [...] O grupo social está acima do indivíduo, ele existe primeiro para o bemestar de todos os membros de grupo e em segundo lugar para o bem do indivíduo.(id., p. 64 - 65). - Terceiro principio: [...] a dinâmica interação entre os membros do grupo e o trabalhador e o grupo é o meio primário de crescimento pessoal, mudança e desenvolvimento. [...]. A filosofia tomista nos esclarece que o membro do grupo é fator de mudança do grupo e, por conseqüência, das mudanças sociais (id., p. 65). Serviço Social de Comunidade: Helena Junqueira (In: id., p. 63), diz que esses modelo tem sentido cristão, A doutrina da pessoa humana, da comunidade e do bem-comum. [...]. A comunidade é vista como meio para desabrochar, para o desenvolvimento da pessoa humana (id., p. 64). É por volta dos anos 40 do século passado que o Serviço Social passa a receber a influência norte-americana que é um dos frutos da hegemonia econômica daquele país no Bloco Ocidental, resultando na sua ascensão política, ideológica e cultural. A aproximação do Brasil com os Estados Unidos da América - EUA foi resultante da supremacia americana, com relação à 45 européia, decorrente do Pós - Segunda Guerra Mundial. Também decorreu da política de boa vizinhança que representou uma tentativa americana de alcançar maior penetração comercial na América Latina e se fortaleceu à medida que o governo americano injetou recursos nos programas de industrialização do governo brasileiro (PINTO, 1986). A influência norte-americana se fazia notar através da igreja e do Estado na formação do Assistente Social. PDF created with pdfFactory trial version www.pdffactory.com 50 Nesse contexto têm-se a criação em 1946 da ABESS (Associação Brasileira de Escolas de Serviço Social) entidade civil, de âmbito nacional, sem fins lucrativos e que, de acordo com Pinto (1986) até a década de 1960, preocupou-se com a formação profissional do Assistente Social na perspectiva cristã. Dessa forma, de 1941 a 1957, o panorama do ensino e da profissão, no Brasil modificou-se. A intervenção no campo das reformas institucionais era facilitada pela origem do Assistente Social: quanto mais próxima fosse do poder econômico e político, maiores possibilidades teriam de realizar a tarefa destinada. Não só aos assistentes sociais, mas também a todos os que participavam do apostolado da Igreja e militavam nessa tarefa era dada atenção preferencial. Tal fato já era visível e percebido em trechos da Encíclica Papal. Castro (2000) coloca que com a exigência de qualificação acadêmica, religiosa e técnica para atender a demanda profissional, as escolas de Serviço Social prepararam e formaram um contingente de Assistentes Sociais imbuídos de todos os bons valores sociais e religiosos, orientados para a melhoria dos costumes. A função do profissional em Serviço Social era atuar junto à família operária, intervindo em seus valores e nas instituições, visando a sua reforma. Nesse caminho várias outras escolas de Serviço Social foram surgindo pelo Brasil, sendo que ate finais dos anos de 1979 já haviam sido criados 65 curso, espalhados no pais, se mostrando enquanto uma ampla rede formação de Assistentes Sociais. Sendo que metade era ministrada por instituições públicas e a outra metade por instituições privados. Na qual as instituições públicas concentravam-se, sobretudo no nordeste e no sudeste, onde se encontravam 44% e 31% das instituições de ensino, respectivamente. A região norte só contava com 3 instituições públicas (ou 9%); a região sul (12%) contava com o dobro de instituições públicas que a região centro-oeste (6%). Portanto, as instituições públicas de ensino levaram para todo o território nacional o ensino de serviço social, enquanto as instituições privadas concentraram-se, principalmente, na parte mais rica do Brasil (Simões, 2006). Posto isso, o final da década de 1970 se mostrara na condição de um cenário de crescimento de um novo setor privado empresarial lucrativo, sem compromissos com a PDF created with pdfFactory trial version www.pdffactory.com 51 pesquisa ou com a qualidade do ensino, em face da coexistência de um setor não lucrativo que seguia mais de perto o modelo do setor público. Portanto, o que se verifica que a maior proporção de cursos privados de Serviço Social criados nesse período, concentrados nas zonas Sudeste e Sul do País e, em especial, em São Paulo, é coerente com a dinâmica educacional vigente no país de mercantilização do ensino. Assim, Aguiar (1985) aponta que o perfil do aluno que se formava nos cursos de Serviço Social era de caráter religioso e idealista. Onde os conteúdos teóricos apreendidos estavam, fincados em princípios filosóficos humanistas e eram articulados à prática na tentativa de superar a aparente dicotomia. A preocupação em articular teoria e prática se construía numa perspectiva cristã de homem. A intervenção na sociedade tinha em vista torná-la mais justa e fraterna, como expressão do bem comum. Nos currículos predominavam as tarefas de aconselhamento. O objetivo era aliviar as tensões sociais, visando à recondução dos desviados como capital humano necessário à industrialização e ao progresso. Igreja, Estado e empresariado vão se constituindo no campo de trabalho do Assistente Social. Mesmo que evidenciada a influência ideológica, de natureza positivista, no postulado de formação para o Serviço Social, durante a década de 1950 e início da década de 1960, o Serviço Social passa a incorporar a política desenvolvimentista no ensino. Na qual essa política tinha por caráter, enfatizar a aceleração econômica, incentivada pela industrialização e modernização capitaneada pelos Estados Unidos. Desta forma, caberia ao Serviço Social contribuir no aprimoramento do ser humano, mesmo que o país convivesse com a existência de setores subdesenvolvidos. O desenvolvimento de comunidade se apresentava enquanto uma estratégia lançada para garantir a prosperidade, o progresso social e a hegemonia da ideologia americana (capitalismo). Esta política visava preservar o mundo livre de ideologias não-democráticas. Parte do pressuposto de que as populações pobres têm maior receptividade ao comunismo. Então, é preciso melhorar e desenvolver o sistema capitalista. Daí, a busca de estratégias, uma das quais foi a implantação de programas de Desenvolvimento de Comunidade (AGUIAR, 1985). PDF created with pdfFactory trial version www.pdffactory.com 52 Foi na esteira do desenvolvimentismo que o Serviço Social produziu as condições necessárias para sua legitimação como profissão na sociedade brasileira. Deste modo, a profissão traz uma herança relacionada ao atendimento de interesses dominantes, à manipulação do trabalhador e à reprodução social. Esta situação tem sido geradora de contradições para a prática profissional, pois a configuração historicamente assumida pelos profissionais coloca-os a serviço do capital, embora o ideário de categoria fosse o de articulação com os dominados. É nessa convivência com as contradições oriundas de seu legado tipicamente assistencial e de sua legitimação por parte das classes dominantes, que o Serviço Social terá sua identidade atribuída pelo capitalismo, o que significou a ausência de identidade profissional, não reunindo condições para realizar o percurso em direção a uma consciência crítica, política, a profissão não consegue igualmente, até mesmo por seus limites corporativistas, participar da prática política da classe operária, sendo absorvida pela tecnoburocracia da sociedade do capital (MARTINELLI, 1989). PDF created with pdfFactory trial version www.pdffactory.com 53 2. A Trajetória Histórica dos Cursos de Serviço Social da UFES (1970) e da EMESCAM (2003). 2.1 – Como tudo Começou: Um pouco da História. O Serviço Social no Espírito Santo tem sua gênese no decorrer do processo de transição do final da década de 1940 para o inicio da década de 1950, contexto em que ocorria o declínio da cultura cafeeira, oriunda das novas taxações de preço em nível internacional, e dado o esgotamento do solo, configurando assim um momento de recessão da econômica capixaba. Assim, a zona rural passou por um processo de despovoamento, com descolamento de grande parte da população rural para a cidade, e no caso especifico a Grande Vitória, ocasionando uma aglomeração populacional, resultando o aumento da pobreza, da mendicância, da miserabilidade, que somados a falta de emprego e de equipamentos comunitários, levou o Estado ao agravamento de uma crise com repercussão em sua estrutura econômica, social e política. Surge nesse contexto o Serviço Social no Espírito Santo, como uma das possibilidades de amenizar os impactos dessa crise, constituindo-se uma forma de profissionalização da assistência no sentido de ajudar o Governo Estadual a resolver os problemas sociais influenciados pelas já referidas conseqüências da situação sócio-econômico vivenciado pelo estado nesse período, conforme aponta Viza (1981, p.67) “Nesse momento histórico, a aparição de uma Assistente Social veio como uma resposta e uma resolução-salvadora para os problemas sociais decorrentes da crise do momento e das anteriores, saldo de outras épocas”. Tomando ainda, como referencia as citações da Dissertação de Mestrado da Professora Floresta, observou-se a importância da participação de Geny Grijó nesse processo. Funcionária da Comissão Estadual da LBA foi contemplada com uma bolsa de estudos de Serviço Social, na qual escolheu a Escola de Serviço Social do Instituto Social do Rio de Janeiro. O curso teve a duração de três anos, acrescidos de mais um para elaboração do Trabalho de Conclusão de Curso – TCC, quando após a sua defesa retornou para o Espírito Santo. Ao voltar, Geny Grijó formada Assistente Social se apresentou ao então Diretor Geral do Departamento de Saúde – Drº. Jaime Santos Neves, e propôs a criação do Serviço Social PDF created with pdfFactory trial version www.pdffactory.com 54 no estado. Assim, no final dos anos de 1949 começa os primeiros preparativos para a criação do Serviço Social no Estado, com a implantação junto ao campo da saúde publica. Nesse encontro com o Drº. Jaime Santos Neves – Diretor Geral do Departamento de Saúde, Geny Grijó se colocou na condição de portadora de uma nova mensagem de possibilidade de ajuda ao homem carente, interpretando desta forma, a finalidade do Serviço Social, seus campos de ação e os benefícios advindos com a sua implantação. Encontrou no Drº Jaime, um forte aliado para essa nova empreitada, uma vez que, este, desde sempre esteve preocupado com os problemas sociais, compreendendo que não se podia dissociar o problema social do problema médico. Logo percebeu a gravidade da situação da saúde pública, e da importância do Serviço Social para atuar nesse processo. Convidou Geny Grijó para assumir a criação do Serviço Social, levando a proposta ate o Governador da época o então Drº. Carlos Fernando Monteiro Lindemberg, que compartilhou das idéias do Drº Jaime, e providenciou as medidas cabíveis para a devida regulamentação do Serviço Social no Espírito Santo. Ao desenvolver seu trabalho no Centro de Saúde de Vitória, Geny Grijó, com apoio da imprensa local, começou a divulgar o Serviço Social, interpretá-lo junto a população e profissionais da área de Saúde expondo a diferença desta nova forma de ajuda em relação a tradicional caridade e filantropia. No processo de implantação do seu trabalho, Geny Grijó, “constatou que a demanda oriunda dos problemas sociais, era bastante complexa e para intervir nesses problemas, seria necessário contar com outras colaboradoras, levou essa questão ao Drº. Jaime Santos Neves, sugerindo a realização de um curso dos moldes dos cursos de Legionárias Visitadoras, da qual participou em São Paulo em 1944 e de outros realizados pela Comissão Estadual da LBA em 1945. Aceita a idéia, o curso foi realizado, formando 31 auxiliares sociais das quais as oitos primeiras colocadas foram admitidas pela Agência de Serviço Social do Centro de Saúde”. A proposta que se abria para o Serviço Social no Estado segundo Viza (1981), estava relacionado aos novos espaços no campo social que não se restringia o ato de ajuda ao homem de forma a prover apenas suas necessidades, mas estava relacionado também a causa mais profunda do problema aparente, carecendo de fundamentos técnicos e filosóficos As primeiras ações desempenhadas pela Agência de Serviço Social constituíram-se basicamente na realização de atividades de Informação sobre o Serviço Social e de PDF created with pdfFactory trial version www.pdffactory.com 55 organização de plantão para atendimento dos casos individuais de acordo com as concepções do modelo de Serviço Social da época (esse modelo já foi descrito no primeiro capitulo). Nessa época, de acordo com Viza (1981) dada a grande demanda social se fez necessário estender as frentes de atendimento da Agencia de Serviço Social, para todos “os casos de desajustamento social”, abrangendo toda comunidade carente que procurasse o atendimento da Agencia do Centro de Saúde. Embora tenha tido suas primeiras atividades no ano de 1950, a Agencia de Serviço Social foi inaugurado oficialmente no ano seguinte, ocasião em que ocorreu o primeiro concurso de títulos e provas para provimento de cargos da classe inicial de Visitadora Social na qual foram habilitadas 21 candidatas e cuja homologação deu-se no mesmo ano. O Serviço Social no Centro de Saúde (VIZA, 1981) priorizou seu antedimtento por meio de um plantão, através de entrevistas iniciais, abertura de casos e tratamento social, com visitas domiciliares visando conhecer melhor a família e diligências a instituições como: Instituto de Previdência, LBA, Obras Sociais e outros. Para VIZA o objeto material do Serviço Social, na época, era a pessoa humana desajustada, na qual, por meio da intervenção procurava-se ajustar o cliente (uma pessoa dotada de inteligência, vontade e liberdade) visando ajudá-lo a ter uma vida normal. Sendo assim o Serviço Social buscava remover as causas que originaram os desajustes, mas sempre respeitando sua personalidade enquanto individuo. Antes mesmo que a Agencia de Serviço Social do Centro de Saúde de Vitória promovesse a realização de um Curso de Serviço Social, o Colégio Americano Batista de Vitória havia criado a Escola Técnica de Serviço Social, cujas bases estavam entrelaçadas ao modelo desenvolvido pela Escola do Rio de Janeiro. O Curso criado pela Escola Técnica de Serviço Social de Vitória foi inaugurado em 1951 destinado a formar Assistentes Sociais, com duração de três anos. Segundo Viza (1981) essa Escola não influenciou de forma expressiva a expansão do Serviço Social no Espírito Santo, pois das alunas formadas somente uma exerceu suas atividades como Assistente Social na mesma instituição promotora do Curso. Em 1952 teve inicio as atividades do Curso de Serviço Social do Centro de Saúde de Vitória, cuja proposta foi apresentada pelas Auxiliares Sociais à Assistente Social Geny Grijó que logo encaminhou as providencias necessárias para a concretização do mesmo. O Curso de PDF created with pdfFactory trial version www.pdffactory.com 56 nível universitário e com duração de três anos orientou-se nos moldes dos ministrados pelas Escolas de Serviço Social de São Paulo e do Rio de Janeiro. Este Curso contribuiu de fato para o processo de expansão do Serviço Social no Espírito Santo possibilitando a criação, ampliação e ocupação de novos campos e espaços profissionais. Entre 1952 e 1954 foi realizado também em Vitória um Curso para formação de auxiliares sociais na perspectiva de treinar e aperfeiçoar os ”Agentes Sociais existentes” e abrir novas contratações além de capacitar aquelas que já trabalhavam e não haviam participado de cursos. Essa iniciativa veio responder as necessidades da demanda e a expansão do trabalho dos poucos Assistentes Sociais que atuavam no Centro de Saúde. Esse foi o ultimo Curso avulso realizado ate 1957, quando inaugurou uma nova fase para o Serviço Social decorrente desse processo de expansão, ou seja, com a criação de um novo Curso de Serviço Social de nível universitário, vinculado a Arquidiocese de Vitória (Igreja Católica) dirigido pelas Freiras da Ordem Jesus Crucificado, promovido pelo Instituto Social de Vitória, semelhante ao que ocorreu em algumas cidades brasileiras, principalmente no Nordeste. O Curso propiciou a consolidação do Serviço Social no Estado, formando um contingente expressivo de Assistentes Sociais que contribuíram para a criação de novos espaços sócio-institucionais existentes e em expansão a exemplo do quadro abaixo. Quadro de Expansão de Assistentes Sociais * Nº. de Assistentes Sociais Discriminação 1969 1970 Secretaria de Serviços Sociais 11 12 Serviço Social da Indústria 10 26 Fundação Legião Brasileira de Assistência 4 4 Instituto Nacional de Previdência 5 5 Fundação Espírito Santense do Bem Estar do Menor 3 8 Serviço Social do Comércio 2 3 Fundação Hospitalar do Espírito Santo 2 22 Prefeitura Municipal de Vitória 5 5 Juizado de Menores 5 5 PDF created with pdfFactory trial version www.pdffactory.com 57 Instituto de Orientação as Cooperativas Habitacionais - 1 Companhia Ferro e Aço de Vitoria 1 1 Braspérola 1 1 Hospital das Clinicas - FMUFES 3 3 Cáritas Arquidiocese de Vitória 2 2 Hospital Santa Rita de Cássia - 1 Centro de Serviço Social e Relações Humanas Kurt Lenem - 1 Escola Técnica Federal do Espírito Santo 1 1 Total 55 101 * Quadro contido no “Ante-Projeto do Curso de Serviço Social da UFES (1970)”. O Instituto Social por razões particulares e da conjuntura da época encerrou as atividades da Escola de Serviço Social de Vitória, com o seu fechamento no final de 1970, ocasionando a extinção do vestibular para os anos subseqüentes, fato esse que impossibilitaria a continuação da formação de novos Assistentes Sociais para suprir a demanda de mercado. No entanto algumas tentativas, sem êxito, foram realizadas pelo Instituto, visando à absorção do Curso pelo Estado no Governo de Cristiano Dias Lopes. 2.2 – O Cenário Sócio, Político e Econômico Capixaba até os finais dos anos de 1970. A economia capixaba ate o início da segunda metade do século XX, tinha como característica uma economia fincada na agro-exportação da monocultura cafeeira, numa condição de região subdesenvolvida, desprovida dos processos de incentivos e integração ao mercado nacional. A região localizada entre grandes pólos industriais consolidados, como São Paulo, Rio de Janeiro e Belo Horizonte, naquele período contava com uma população fragmentada e com grandes vazios demográficos. Logo o mercado urbano capixaba diferentemente da estrutura urbana formada nos Estados de grandes Pólos Industriais como São Paulo e Rio de Janeiro, que possuíam as bases necessárias para o desenvolvimento manufatureiro (pois contavam com população densa, mão-de-obra especializada e dinheiro disponível), se mostrava desprovido de tais condições para se desenvolver de forma crescente, restando-se a comercialização do café. PDF created with pdfFactory trial version www.pdffactory.com 58 Assim, podemos observar que o processo de industrialização capixaba ocorreu arquitardiamente, dada a ausência de uma estrutura econômica sólida e dinamizadora. Desta forma, a economia capixaba será marcada pela preponderância da cafeicultura, na qual teve com o advento da Segunda Guerra Mundial o aumento do consumo de café na Europa e nos Estados Unidos, o que proporcionou o aumento do plantio do café no Espírito Santo. É nesse contexto, que se acentuou o peso da cafeicultura na economia capixaba, levando a sua monopolização não só na sua economia, mas também permitiu que esse processo incentivasse a economia de todas as regiões cafeeiras do país e de vários lugares do mundo, as quais ampliaram de forma significativa sua capacidade produtiva da lavoura cafeeira. Mas dada a circunstancia do aumento das safras anuais, que superou a capacidade de absorção do consumidor, essa relação converteu a superprodução em crise no mercado internacional e, com a instabilidade no setor, levando a uma queda vertiginosa dos preços internacionais. De forma a reduzir os impactos dessa crise, o Governo Federal na década de 1950 promoveu uma política econômica cujas diretrizes objetivou ocasionar a erradicação dos cafezais anti-produtivos em toda região cafeicultora, no sentido de promover a diversificação das áreas erradicadas com outras culturas e a renovação de uma parcela dos cafezais, na perspectiva de controlar os preços do café. Verificou-se que as duas últimas diretrizes não tiveram conseqüências significativas, mas a erradicação trouxe profundas transformações para economia capixaba, trazendo os efeitos dessa crise para a economia da região que abateu fortemente sobre estado, trazendo a tona à necessidade de se diversificar a tradicional base agrícola que, desde o século XIX, era dependente de um único produto. Diante dessa recessão da economia cafeeira, a indústria madeireira se apresentou enquanto alternativa à economia então decadente, visto que o norte do Estado dispunha de terras cobertas por florestas naturais, onde existiam cedros, perobas, jequitibás e a maior concentração de jacarandás do planeta, cujo valor comercial atraia parte do capital disponibilizado pela erradicação do café. PDF created with pdfFactory trial version www.pdffactory.com 59 As indústrias madeireiras passam a exportar nesse período para a indústria mobiliária e para o setor da construção civil dos centros urbanos do país, principalmente do Rio de Janeiro e de Minas Gerais uma quantidade expressiva de matéria prima. Outras alternativas se comportaram na economia capixaba como a cultura de mandioca, milho, feijão e arroz, enquanto tendências de crescimento na economia vigente, mas nenhuma desempenhou papel tão preponderante e marcante quanto a cultura cafeeira. O profundo abalo provocado pela política federal de erradicação dos cafezais ‘antieconômicos’ não foi compensado pelos programas de estímulo para a diversificação da produção agrícola, o que levou o Espírito Santo a defrontar-se com graves problemas pertinentes a essa questão, tal como o desemprego no campo. Era notório a necessidade de modernizar a economia capixaba, mas para isso fazia-se necessário exigir medidas decisivas por parte dos poderes públicos, pois a elite local começou a vislumbrar como saída estratégica para enfrentar a crise, o crescimento industrial do país, e para fomentar o desenvolvimento estadual não parecia ser outra que não a industrialização. Nesse rumo várias iniciativas foram tomadas e dentre as quais se destacam os projetos de indústrias de siderurgia, mineração e metalurgia, de papel e celulose, além de ter sido criada uma política de transporte naval e rodoviário. Poucos foram os empreendimentos realizados nesta época, conforme apronta Rocha: […] Desta forma foram implantadas as seguintes indústrias: Usina Paineiras; Fábrica de Tecidos de Cachoeiro de Itapemirim; Fábrica de Cimento; Serraria Industrial; Usina Hidrelétrica de Fruteiras; Fábrica de Óleo; Fábrica de Papel (ROCHA, 1998, p. 45) Para que esse processo fosse impulsionado foi necessária a intervenção do governo da época, segundo Rocha e Cossetti: […] O Governo, idealizou e implementou um programa de investimento integrado, que objetivava implantar indústrias processadoras de matérias-primas minerais e agrícolas existentes na região sul (Rocha e Cossetti, 1983, p. 154-74). Apud, (ROCHA, 1998. p. 46.) Rocha e Cossietti (1998) trazem à tona a realidade de que em 1920, o censo já mostrava que decorrente das manifestações do crescimento geral da economia durante a PDF created with pdfFactory trial version www.pdffactory.com 60 Primeira Guerra mundial, o Espírito Santo possuía 77 estabelecimentos de pequenos portes industriais, sendo a media de trabalhadores por estabelecimentos da ordem de 14,4%. Constata-se que no decorrer das três décadas seguintes o volume de investimentos nos setores de grande porte como ferroviária, indústrias e bancos, não se realizou conforme o desejado. A iniciante expansão industrial ate os anos de 1959, teve sua concentração em pequenos estabelecimentos de gêneros tradicionais da indústria (produtos alimentares, madeira, têxtil e minerais não-metálicos). Na qual de 1920 ate 1959 o numero de estabelecimentos passou de 77 para 1.600 e o de operários de 1.109 para 7.300. Na arena politica retomando o final do século XIX e inicio do século XX, temos alguns marcos importantes, como após a proclamção da Repúblia , em 1889, o Espírito Santo faz sua primeira constituição estadual; sendo Moniz Freire o presidente do Estado que investiu na rede ferroviaria e na infra-estrutura do Porto de Vitória. Com a desvalorização do café, os recursos se tornaram escassos e até 1908 o Estado viveu um período de estagnação. Jerônimo Monteiro, eleito em 1908 , iniciou um processo de modernização, levando luz elétrica a Cachoeiro de Itapemirim e a Vitória, foi contruido nessa epoca o primeiro complexo industrial do Estado, sediado em Cachoeiro, com indústria de cimento, oléo e açucar, mas, tantos investimentos na modernização do Espírito Santo, gerou dívidas externas altas , que prejudicou os governos posteriores. Florentino Avidos foi eleito em 1924 e seu governo foi marcado pela contruções de pontes. A ponte de Colatina acelerou a ocupação populacional do Norte do Estado. Em Vitória , foi feita a "primeira ponte" , hoje conhecida como ponte Florentino Avidos. Em 1930 , Aristeu Borges , então presidente de Estado , apoiou a candidatura de Júlio Prestes e ,por isso, foi deposto com a revolução de 1930. Getúlio Vargas nomeia Punaro Bley como interventor no Estado. Bley ficou no poder entre 1930-1943. Investiu na saúde , criando hospitais e leprosários. Sanou as finanças do Estado, em situação ruim, depois dos governo republicanos. Focalizou a agricultura como a principal produção e a criação de obras sociais. Nese período, a AIB cresceu no estado, dado seu caráter fascista, que encontrava apoio nos imigrantes italianos e alemães. Porém , com a eclosão da Segunda Guerra Mundial , esses grupos foram persiguidos. Medidas como a proibição de se falar italiano e alemão demontram isso. PDF created with pdfFactory trial version www.pdffactory.com 61 Jones Santos Neves assumiu o governo entre 1943 e 1945. Ele foi o articulador político, no estado, do processo de transição para a democracia. Neste mandato, ele executou os planos de obras e equipamento e fomento de produção. Esses planos visava saneamento, aumento na produção, melhorias no transporte, e incentivo a industrialização. Ofereceu vantagens especiais para quem instalasse novas industrias que aproveitasse a matéria prima existente no Estado. Carlos Linderberg venceu as eleições e assumiu o 1º mandato democrático pós Estado Novo (1947-1950). O seu governo foi caracterizado pelo o apoio pela agricultura. Continuou o processo de expansão para o norte, entregando as terras devolutas (pertencente ao governo) a novos fazendeiros. Seu empenho em possibilitar o aparecimento das industrias foi tímido, apesar de seu governo ser marcado pela construções de hidrelétricas. Na educação , fundou a Faculdade de Medicina, federalizou de Direito e reabriu a de Odontologia. Jones Santos Neves, volta ao Governo do Estado, agora eleito pelo o povo. A sua meta era industrialização do Estado , por meio de um planejamento prévio. O governo passou a intervir diretamente na economia, a fim de criar condições de infra-estruturas que proporcionasse o arranque industrial. O plano de valorização priorizou quatro setores: Porto de Vitória, energia elétrica, malha rodoviária e fomento de produção. O porto de Vitória foi aparelhado para reparo e construção de barcos. Foi feita uma dragagem da baía, para possibilitar a entranda de embarcações com maior capacidade de carga. Ainda foram feitas construções no cais de carvão e instalação de aparelhagem moderna. Na questão de energia elétrica, a construção de inúmeras hidrelétricas (Suíça, Rio Bonito). Já na malha rodoviária, seus feitos para a ampliação e asfaltamento das rodovias Vitória – Colatin , Cachoeiro – Alegre e a pavimentação da rodovia Vitória – Cachoeiro. Ate finais dos anos de 1950, as principais industriais instaladas no Estado, eram: Moinho Vitória do Grupo Buaiz; Fábrica da Chocolates Garoto S/A; Fabrica de Tecidos – localizada em Cachoeiro de Itapemirim, de propriedade da empresa Cia Têxtil Ferreira Guimarães; Cia. União Manufaturadora de Tecidos; Cia. Ferro e Aço de Vitória; e Usina Paineiras S/A (ROCHA, 1998, p. 49). PDF created with pdfFactory trial version www.pdffactory.com 62 Na educação , foi criada a Universidade Federal do Espírito Ssanto (UFES) e a Escola Politécnica com o objetivo de preparar e qualificar a mão-de-obra do estado. Também criou o IBES (Instituto do Bem-Estar Social), um conjunto habitacional com verbas estaduais, que visava a criação de residências populares para operários . Francisco Larceda de Aguiar, Chiquinho, põe fim na hegemonia do PSD no estado. Eleito pela Coligação Democrática; Chiquinho era populista; e o seu governo era voltado para a área rural. O incentivo a agricultura, o fortalecimento da agroindústria do leite e estações de tratamento de água foram seus principais feitos. Porém Chiquinho enfrenta um grave problema. O café capixaba é acusado de conter pragaso que gera a segunda crise cafeeira . O café é erradicado, e como conseqüencia várias famílias se vêem obrigadas a se mudarem para a cidade, provocando o êxodo rural e a aglomeração populacional urbano. Como vimos nos iténs anteriores a crise cafeeira de 1950, deixou para a decada seguinte o agravamento dos problemas sociais, visto que, com o processo de erradicação dos cafezais, a taxa de desemprego elevou-se subtamente. Estima-se que nesse periodo o desemprego atingiu cerca de 60.000 trabalhadores. Logo, o caos econômico que se estabelecera em decorrência da erradicação cafeeira levou o Governo Estadual a chamar a atenção do Governo Federal para a necessidade de medidas especiais, também requeridas pela sociedade local, pois a decadência econômica de grande parte dos municípios capixabas levou milhares de pessoas para Vitória, resultando daí inúmeros problemas sociais (ROCHA, 1998, p. 50-51). As poucas indústrias instaldas na capital começaram a atraír a população rural, mas estas por sua vez não ofereciam empregos suficientes para suprir a demanda de mão-de-obra que cresceu decorrente do êxodo rural. Acrescentando-se a desqualificação do pessoal desempregado e a baixa renda per capita regional, situada aquém da metade da nacional, o Espirito Santo foi se aproximando dos traços econômicos e sociais do Estado com os do Nordeste brasileiro, historicamente sabidos como desiguais e desequilibrados. O governador Christiano Dias Lopes (1967-1971) apelou para o Governo Federal, mostrando que o Nordeste era [...] mais “subdesenvolvido” em relação ao Brasil em geral do que o próprio Brasil em relação aos Estados Unidos e à Europa do Mercado Comum. O Espírito Santo começou a ser visto como o “Nordeste sem a SUDENE”. PDF created with pdfFactory trial version www.pdffactory.com 63 Nesse sentido, esse discurso, fez com que o Governo Estadual conseguisse autorização federal para criar incentivos fiscais que eliminariam da economia local os tributos necessários para a construção de um parque industrial, ou seja, o Governo do Estado do Espírito Santo viria a ser o próprio fornecedor de capital social básico para seu progresso, conforme aponta ROCHA: “A política de incentivos fiscais, por seu lado veio a constituir em importante mecanismo de apoio ao desenvolvimento de indústrias de pequeno e médio porte, predominantemente ligadas a capitais privados regionais e processadoras de matérias-primas locais” (ROCHA, 1998, p. 52) . O Estado nesse período começa transferir recursos públicos para o setor privado, contribuindo assim para a industrialização capixaba por meio de fornecimento de incentivos fiscais e de uma legislação correlata. Segundo Rocha (1998) a política de incentivos fiscais do Governo Estadual em conjunto com o Plano de Metas do Governo JK, possibilitou a conclusão de alguns investimentos, como: a construção de novas fábricas da Itabira Agro-industrial (cimento), em Cachoeiro de Itapemirim, e da Companhia Ferro e Aço de Vitória (laminação de aço), em Cariacica, passando a substituir as antigas fábricas existentes. No campo da energia teve a construção das usinas Hidrelétricas de Rio Bonito e Suíssa, consideradas até hoje como uma das importantes usinas do estado. Em relação as rodovias a BR-101 e a BR-262, que são as principais vias de ligação do estado com as demais regiões do Brasil. Desta forma, o Espírito Santo a partir dos anos de 1960 começa a se integrar de forma efetiva à dinâmica do mercado nacional. Nesse período, podemos afirmar que ocorreu a formação dos mais importantes grupos empresariais locais, em atividades não ligadas a cafeicultura Todavia, esse capital interno era insuficiente para impulsionar o processo de desenvolvimento do Estado, uma vez, que a economia local ainda se caracterizava pela expansão dos gêneros alimentícios tradicionais, situando-se abaixo da média nacional. Para obter recursos de ordem a promover o aceleramento dessa industrialização, os projetos criados pela Federação das Indústrias do Espírito Santo - FINDES tinha como objetivo apresentar as restrições geográficas do Estado em relação à vocação agrícola, como PDF created with pdfFactory trial version www.pdffactory.com 64 argumento para captar recursos federais e dar prosseguimento à implantação do projeto de desenvolvimento do Estado na área industrial. A defesa desse objetivo fincava na necessidade de se alocarem recursos para a efetivação de projetos que fossem de porte igual aos da Companhia Vale do Rio Doce – CVRD –, os quais, por sua eficiência comercial, possibilitava poder de barganha suficiente para negociar novos empreendimentos no Espírito Santo, além de possibilitar a gestação desses empreendimentos em cadeia. O significativo crescimento industrial capixaba a partir dos anos de 1960, permeado pela aplicação do capital privado local, sobretudo por empreendimentos de pequeno e meio porte, por indústrias dos gêneros tradicionais e pelo forte e incisivo subsidio dos incentivos fiscais, somado ao movimento da econômica nacional, conhecido no período como “Milagre Brasileiro”, ocorrido de 1967/1973, fizeram com que a indústria capixaba transformasse radicalmente, tendo reflexo em todo tecido social do nosso estado. Nesse rumo, o II Plano Nacional de Desenvolvimento (II PND), lançado pelo Governo Federal em 1974, para enfrentar a crise econômica de então, tinha como objetivo a substituição acelerada das importações no setor de bens de capital e insumos básicos (química pesada, siderurgia, metais não ferrosos e minerais não metálicos), bem como o desenvolvimento de grandes projetos de exportação de matéria-prima (celulose, ferro, alumínio e aço). Para isso, precisava contar com um centro localizado estrategicamente entre as jazidas de minério de ferro e o mar, que oferecesse condições para se formar uma infraestrutura portuária e ferroviária e estivesse apto a receber grandes investimentos capazes de atender ao mercado externo. O Espírito Santo, que desde a década de 1940 contava com uma moderna infra-estrutura desenvolvida para atividades exportadoras de minério de ferro criada pela CVRD, viabilizava os planos do Governo Federal. Enquanto isso era atendida a política do Governo Estadual, direcionada para a divulgação das vantagens locais do Espírito Santo voltadas para investimentos estatais e de capital estrangeiro. Rocha (1998) aponta que o Estado nesse período recebeu alguns investimentos, que devem ser pontuados, visto que são investimentos que ate hoje permeiam a estrutura econômica da região, como: a Criação da Escelsa – Espírito Santo Centrais Elétricas, em 1956, tornando responsável pela viabilização de um sistema de fornecimento de energia elétrica suprindo as demandas do setor industrial emergente. A CVRD teve destaque PDF created with pdfFactory trial version www.pdffactory.com 65 importante nesse período, pois passou a estabelecer ligações profundas e diretas com a economia regional, ampliando e diversificando suas atividades, com a criação do Porto de Tubarão, dando suporte a ampliação das operações da empresa, empregando aproximadamente 1.800 trabalhadores. Nesse mesmo patamar foi implantada a Samarco Mineração S/A (Usina de Pelotização), com geração de 450 operários por ano. A CST – Companhia Siderúrgica de Tubarão, que teve sua planta industrial construída entre 1979 e 1983, envolvendo um grande giro de capital. E a Aracruz Celulose S/A, que começou a sua operacionalização em 1979, tendo 80% de sua produção voltada para a exportação, esta além de impactar a economia capixaba, trouxe grandes impactos que ate os dias atuais são percebidos, visto que se transformou no maior proprietário rural do Espírito Santo, possuindo mais de 100 mil hectares de terra, sendo que 80% aproximadamente de sua área era ocupada para finalidade de plantações de eucaliptos. Esses projetos industriais passaram a ser nomeados na época como sendo os chamados “Grandes Projetos de Impacto, ou Grandes Projetos Industriais”, tendo duas particularidades expressivas, uma de ter sido desenvolvido pelo Governo Federal, respaldado pelo capital privado nacional ou estrangeiro, em alguns casos, unicamente por via do capital privado; a outra particularidade por se destinar ao mercado externo, estimando-se que cerca de 90% da sua produção estava destinado ao mercado estrangeiro. Esses investimentos passaram a definir e redefinir a dinâmica de quase todo o desenvolvimento estadual, caracterizando para o Estado a sua a importância econômica em todo o território nacional. Nesse contexto as indústrias que se abriam passavam a atrair para a cidade a população rural capixaba que ficou desempregada depois da erradicação dos cafezais improdutivos e, também, um formidável contingente de migrantes de outras localidades do país, o que contribuiu para agravar ainda mais o quadro caótico que se instalara em Vitória e ao seu redor. Conforme Siqueira (2001) o aumento populacional da cidade de Vitória, principalmente por aquelas pessoas que vinham do campo de uma só vez, promoveu um processo de inchação populacional em Vitória e nos municípios vizinhos, de aproximadamente 250 mil pessoas, a partir de 1970. Nesse ano, a população que se concentrava na Capital era de 133.019 habitantes, significando 24,1% do total da população PDF created with pdfFactory trial version www.pdffactory.com 66 do Estado, enquanto que na década de 1940 essa população não passava de 45.212 habitantes, ou seja, 6,03% do total de habitantes do Espírito Santo. Estima-se que aproximadamente 250 mil pessoas desempregadas e de mão-de-obra desqualificada chegaram à Grande Vitória no início da década de 1970, resultando na proliferação de favelas e em inúmeros outros problemas sociais. O desemprego no campo promoveu um processo migratório rural que se refletiu na estrutura de aglomeração dentro do espaço geográfico de Vitória, acelerando o processo urbano sem infra-estrutura adequada. As pessoas vinham do sul da Bahia, do norte do Estado do Rio de Janeiro e da Zona da Mata Mineira e em sua grande maioria desprovidos de qualificação para as atividades do trabalho urbano. Na realidade, a população que chegava todos os dias a Vitória constituía-se de um grande contingente de pessoas sem conhecimento das atividades desenvolvidas no setor formal de trabalho e com limitadas condições de acesso a alojamentos. Rocha e Morandi (1991) afirmam que o fluxo dessas pessoas intensificou a ocupação de áreas periféricas de Vitória, sem nenhuma infra-estrutura. Estabeleceram-se favelas em que essas pessoas se concentravam nas mesmas condições de miséria dos desassistidos, analfabetos e desempregados, dando origem a graves problemas sociais estigmatizados por doenças, promiscuidade e criminalidade. Vitória concentrava 34,9% do total da população do Estado. Finalmente, observa-se que Vitória cresceu, mas à custa de grandes transformações que não redundaram em benefícios para a população em geral. Embora houvesse uma alta na taxa de crescimento da economia, esta não foi acompanhada de redução das desigualdades sociais. A Grande Vitória, com todo o aparato econômico e social viu a intensificação a proliferação de bolsões de pobreza, no bojo do contínuo processo de sua urbanização concentrada. Os parcos investimentos do Governo ficaram comprometidos por força das dívidas adquiridas pelos financiamentos concedidos pelo Governo Federal, e pelos empréstimos externos. Pessoas de várias classes sociais, etnias, graus de escolaridade, estado civil, idade e crença passaram a compor um novo mosaico para sociedade capixaba. O cotidiano pacato das cidades da Grande Vitória cedeu lugar a um aglomerado urbano cada vez mais plural e com PDF created with pdfFactory trial version www.pdffactory.com 67 conflitos cada vez mais explícitos. A manutenção da baixa renda familiar, o desemprego e a concentração urbana na Grande Vitória, deram à Vitória o título de uma das Capitais mais violenta do Brasil. Os índices de criminalidade levaram à criação de conselhos de segurança envolvendo a comunidade na busca de solução para o problema, acoplado a programas sociais insuficientes face a questão social. A coexistência de migrantes do interior e de diferentes cidades brasileiras, que trouxeram consigo hábitos e valores típicos do mundo rural, caracterizou a Grande Vitória como uma região de sociedade multifacetada que integra hábitos típicos do mundo rural com a inquietação ocasionada pela complexidade do processo de industrialização e urbanização que ocorreu nos últimos trinta anos do século XX. A antiga cidade deu espaço a cidades mais complexas e as novas formas de vivência, alterando sensivelmente o cotidiano de seus habitantes. O panorama exposto contribuiu para a expansão do Serviço Social face a questão social e a criação de novos cursos tanto no setor público como no setor privado. 2.3 Criação do Curso de Serviço Social da UFES É nesse quadro de transformações sócio, político, econômico e cultural, de transição para um cenário de industrialização/urbanização, que no estado se manifestara o agudizamento das expressões da questão social, tendo nessa a base para a constituição genética da Formação Profissional dos Assistentes Sociais da Grande Vitória. Para atender à demanda econômica e social que se formava na Grande Vitória/ES foram criados nesse período vários cursos profissionalizantes, cercando-se de uma infraestrutura escolar na perspectiva de absorver anualmente um número crescente de matrículas em todos os graus de ensino. No ensino superior, as principais escolas da cidade matricularam em torno de 4.591 alunos no ano de 1971. Nessa época contava-se com a Universidade Federal do Espírito Santo (UFES), única do Estado, e algumas Faculdades isoladas como de Medicina, Administração PDF created with pdfFactory trial version www.pdffactory.com 68 de Empresas, Bioquímica e Farmácia. Só a UFES em 1971, oferecia, neste ano, 23 cursos profissionalizantes. (Anuário, 1971). Dentre esses cursos, destaca a implantação do Curso de Serviço Social na Universidade Federal do Espírito Santo (UFES), curso esse que iniciou suas atividades em Agosto de 1971, porém registrado no portal do MEC em 05 de maio de 1971 na modalidade de ensino presencial, com prazo para integralização do curso de 08 semestres letivos, sendo a carga horária mínima de curso de 2800 hora/aula, ofertando inicialmente 80 vagas anuais, ou seja, 40 por semestre letivo, integrando-se a Antiga Faculdade de Direito. No entanto “foi elaborado de acordo com a nova base administrativa da Universidade, cujo sistema de departamentalização seria implantado a partir do ano de 1971”. (Ante Projeto do Curso de Serviço Social -1970). O curso foi implantado no decorrer do processo de transição da reestruração da Universidade que saia do modelo tradicional de unidades isoladas (escolas/faculdades) para o de Departamentalização dos cursos e introdução de sistema de créditos (CARDOZO; 2009). A criação do Curso de Serviço Social da UFES se deu a partir do fechamento da Escola de Serviço Social de Vitória em 1970, que resultou na extinção do vestibular, onde o ultimo vestibular ofertado pela Escola foi em 1967. O curso veio como alternativa de continuação do processo de formação profissional de novos Assistentes Sociais, uma vez que nesse momento não se ofertava mais vagas para Cursos de Serviço Social no Estado conforme aponta o quadro abaixo: PDF created with pdfFactory trial version www.pdffactory.com 69 Quadro Comparativo e Demonstrativo de Estados Circunvizinhos Quanto*: • Crescimento das Matriculas • Procura do Curso Relativo a população conforme índice matricula/1000 hab. Estados Cursos Nº. de Matriculas no Conclusões de início do ano. Curso Existentes População (1000 Hab.) Índice matrículas A.S/1000 Hab. 1966 1967 1968 1966 1967 1968 1966 1967 1966 1967 1968 Guanabara 5 612 777 795 61 120 3886 4007 4132 0,1574 0,1939 0,1924 Rio de Janeiro 2 311 436 463 _ 96 4181 4340 4506 0,0743 0,1004 0,1027 Minas Gerais 2 216 205 221 50 53 10986 11230 11480 0,0196 0,0182 0,0192 Espírito Santo 1 76 83 ** 14 18 1403 1446 1491 0,0541 0,573 ** Bahia 2 137 132 154 14 19 6645 6778 6915 0,0206 0,0194 0,0222 Fonte: Anuário Estatístico do Brasil – IBGE – 1969 * Quadro contido no Ante Projeto do Curso de Serviço Social da UFES (1970) ** O próximo fechamento da Escola de Serviço Social no final do ano de 1970, ocasionou a extinção do Vestibular PDF created with pdfFactory trial version www.pdffactory.com p/ 70 O processo da viabilização da Criação do Curso de Serviço Social da UFES se deu a partir da iniciativa de duas Assistentes Sociais (Elizete Cardoso e Maria Helena Rauta Ramos) profissionais vinculadas, na época, ao SESI e a Secretaria de Serviços Sociais que lutaram para alcançar os meios necessários a sua viabilização. Com base na entrevista realizada com a Professora Elizete Cardoso, constatou-se que esse processo contou com apoio fundamental do Drº. Jones Santos Neves então Diretor do SESI e Presidente da FINDES que se sensibilizou com a possibilidade da interrupção do processo de formação de novos assistentes sociais para responder as demandas decorrentes da expansão sócio-econômica do Estado e da Rede sócio-institucional antevendo o agudização dos problemas sociais decorrente desse processo. Sendo assim o Drº Jones compartilhou da idéia proposta pelas Assistentes Sociais Elizete Cardozo e Maria Helena Rauta Ramos no sentido de criar alternativas para a continuação da formação profissional do Assistente Social no Estado. Após varias investidas no sentido de viabilizar a Criação de um novo Curso o Drº Jones sugeriu a formação de uma comissão formada pelos Dirigentes das Grandes Instituições Sociais do Estado, como LBA, Secretaria de Serviços Sociais, Fundação do Bem-Estar-Social, SESI que responderam positivamente ao projeto de Criação de um Curso na UFES. Para isso foi convocado o Reitor da época que indicou como seu Representante o Presidente de Comissão Permanente de Criação de Novos Cursos da UFES então Diretor da Faculdade de Direito. Após varias reuniões com os Dirigentes Institucionais e alguns assessores vinculados a Secretaria de Serviços Sociais – Maria Helena Rauta Ramos; a Legião Brasileira de Assistência/LBA – Leila Maria Vello; e ao Serviço Social da Indústria/SESI/DR/ES – Elizete Cardozo, juntamente com o Representante da UFES. O debate e sugestões em torno dos meandros políticos e burocráticos indispensáveis a concretização do Curso foram registrados em atas, coordenados pelo Drº. Jones, secretariado pela Elizete Cardozo. Todo esse processo foi finalmente materializado com a formulação de um Ante Projeto, pré-requisito para a criação do curso de Serviço Social da UFES, cujo ato de criação se deu em dezembro de 1970 na Reitoria da Universidade Federal do Espírito Santo. O marco de criação do Curso de Serviço Social da UFES, esta fincado no cenário industrial/urbano que a Grande Vitória passou a conviver com o crescimento industrial PDF created with pdfFactory trial version www.pdffactory.com 71 favorecido pela concentração das grandes indústrias, dentro do que alguns autores, consideram como “Grandes Projetos de Impacto, ou Grandes Projetos Industriais”. Para a criação do Curso a equipe que o formulou buscou utilizar de subsídios fornecidos pelas Escolas de Serviço Social dos Estados do antigo Guanabara, Rio de Janeiro e mesmo do Espírito Santo, e as exigências legais estabelecidos pelo Conselho Federal de Educação. O contexto de sua criação, conforme aponta o “Ante-Projeto do Curso de Serviço Social da UFES – 1970”, está justificado na contextualização do fato de que o Espírito Santo passou a operar nos fins da década de 1960 e inícios dos anos de 1970 algumas transformações gradativas em sua economia, visto que este saiu da monocultura cafeeira para a industrialização em grande escala, observando que a taxa média geométrica era de 10,7 % ao ano, crescimento que vinha se comparando aos Estados de São Paulo (10,6%) e Rio de Janeiro (11,2%). Desta forma, tal crescimento permitiu avaliar que durante os próximos cinco anos da década de 1970, ocorreria uma verdadeira explosão industrial, conforme já exposto nos itens anteriores, o que por sua vez geraria um conseqüente crescimento nos setores de comércio e serviços, desencadeando um processo de transformação social, num processo de agravamento da questão social, na qual o Estado não possuía equipamentos sociais para buscar melhorias para o quadro caótico que conseqüentemente iria se estabelecer. Assim o Serviço Social tornou-se um componente imperioso para a busca de soluções e o desenvolvimento social do Estado. Essa necessidade imperiosa de busca por profissionais especialistas em Serviço Social foi uma realidade decorrente da criação de novas Instituições Sociais e expansão de outras. Estas Instituições vinham na perspectiva de atuar no campo social em termos de organização, mudanças, desenvolvimento e eliminar ou atenuar os problemas decorrentes das expressões da questão social, enquanto novas frentes de trabalho para o Serviço Social. Os estudos realizados que justificaram a criação do Curso de Serviço Social contidos no Ante Projeto vislumbrou outros elementos importante como a portaria 155 de 27/11/1953 do então Ministério do Estado dos Negócios de Trabalho, Indústria e Comercio que regulamentou a organização da Comissão Interna de Prevenção de Trabalho (CIPA) que incluiu o Assistente Social entre os demais profissionais; como também o trabalho desenvolvido pelo SESI/FINDES junto as empresas conscientizando-as sobre programas de PDF created with pdfFactory trial version www.pdffactory.com 72 bem-estar-social para o trabalhador que redundava na contratação de Assistentes Sociais como: Vale do Rio Doce, ESCELSA, Ferro e Aço, Telefônica, DNOS e outras. Outros dados que foram considerados foi a existência de um numero significativo de obras sociais em torno de cento e cinco entidades que em grande parte careciam de orientação profissional para o desenvolvimento de programas assistenciais e sócio-educativos, alem das possibilidades de instalação de Serviço Social nas instituições do poder municipal e local. O Curso de Serviço Social da UFES se propôs como finalidade, promover a formação de profissionais de Serviço Social para atuar junto a programas de Bem Estar Social; aperfeiçoar e difundir os conhecimentos técnico-científico do Serviço Social e contribuir para o equacionamento dos problemas sociais. Para tanto as atividades a serem desenvolvidas no Curso visavam à aplicação adequada de métodos, processos e técnicas do Serviço Social, no sentido de possibilitar a análise, aperfeiçoamento e sistematização exigidos para a atuação do profissional frente às questões complexas emergidas na sociedade. Os conteúdos ministrados, através de atividades teórica-prática, de forma flexível e científica, buscava permitir uma introjeção do comportamento analítico e criativo face a reformulação metodológica do Serviço Social. O Ensino era dividido em dois ciclos. O Ciclo Básico que era pré-requisito para que o aluno pudesse adentrar ao Ciclo Profissional, pois esse englobava todas as disciplinas de natureza humana e social, de conteúdo que permitisse a capacitação do aluno para o embasamento teórico-prático, nos aspectos bio-psico-social. As disciplinas que compreendiam o ciclo básico eram: Psicologia, Sociologia, Economia Geral, Higiene Preventiva, Medicina do Trabalho, Teoria do Serviço Social, Direito, Legislação Trabalhista e Antropologia. E o Ciclo Profissional por sua vez compreendia-se enquanto parte específica e indispensável para a formação profissional, na qual era representado pelas disciplinas de: Ética Profissional, Pesquisa Social, Política Social, Administração em Serviço Social, Serviço Social de Caso, Serviço Social de Grupo, Serviço Social de Comunidade e Teoria do Serviço Social. Pode-se assim constatar que as disciplinas estavam agrupadas em dois Ciclos de Conhecimento (Básico e Profissional) que de acordo com o “Ante Projeto” correlacionavamse entre si, e foi elaborado nesse formato somente para fins de efeito didático, uma vez que PDF created with pdfFactory trial version www.pdffactory.com 73 pretendia-se alcançar uma perspectiva global de totalidade. Integravam-se a partir das dimensões teóricas-práticas em conformidade com o debate da formação profissional do Assistente Social na época e o Currículo aprovado pelo MEC. O Currículo do Curso era constituído pelo conjunto das disciplinas, conforme quadro abaixo: PDF created with pdfFactory trial version www.pdffactory.com 74 Currículo do Curso de Serviço Social – UFES (1970) Ciclo Básico Ciclo Profissional 1º Periodo 2º Período 5º Período 6º Período Psicologia I Psicologia II Ética Profissional I Pesquisa Social II Sociologia I Sociologia II Pesquisa Social I Administração em Serviço Social II Econômica Geral I Econômica Geral II Administração em Serviço Política Social II Social I Higiene Preventiva e Medicina do Higiene Preventiva e Medicina do Trabalho I Trabalho II Política Social I Serviço Social de Caso I, Serviço Social de Grupo I e Serviço Social de Comunidade I 3º Período 4º Período 7º Período 8º Período Psicologia III Direito e Legislação Trabalhista II Serviço Social de Casos II, Serviço Social de Casos III, Serviço Social de Grupo II E Serviço Social de Grupo III e Serviço Social de Comunidade Serviço Social de Comunidade III II Sociologia III Teoria do Serviço Social II Pesquisa Social III Direito e Legislação Trabalhista I Antropologia Administração Social III Teoria do Serviço Social I PDF created with pdfFactory trial version www.pdffactory.com Política Social III em Teoria do Serviço Social III Serviço 75 O planejamento do Curso foi esboçado a partir de dois Eixos: pesquisa e política; e projetos de Serviço Social. O primeiro reunia disciplinas de áreas afins do ciclo básico e profissional como (Pesquisa Social, Administração em Serviço Social e Política Social); e o segundo que englobava as demais disciplinas do ciclo profissional (Serviço Social de Casos, Serviço Social de Grupo, Serviço Social de Comunidade, Teoria do Serviço Social e Ética Profissional). Além disto, incluíam-se disciplinas que objetivavam subsidiar o conhecimento da realidade social como (Sociologia, Direito, Psicologia , Antropologia e etc) e perpassavam os dois eixos. Para acompanhar a formação profissional a partir da dimensão teoria-prática, o projeto previu realização de pesquisas e avaliações, no sentido de preservar a integração dos elementos constitutivos do Curso. O Ensino aplicado a partir da dimensão teórica-prática foi articulado a partir de uma coordenação geral, supervisão setorial e orientação individual ao corpo discente, no sentido de reunir todos os atores envolvidos no processo de formação, incluindo-se os responsáveis pela prática no espaço sócio-institucional. O curso funcionou inicialmente com o ciclo básico na estrutura da antiga Faculdade de Direito da UFES, contando com os professores vinculados aos outros cursos da universidade como: Ciências Sociais, Direito, Medicina e Economia para ministrar as disciplinas relacionadas as respectivas áreas de conhecimento. Nessa fase contou com uma professora de Serviço Social para ministrar a disciplina de Teoria do Serviço Social - Elizete Cardozo, que já coordenava a implantação do Curso. Em seguida contou-se com a presença da Professora Maria Helena Rauta Ramos e alguns professores da antiga Escola como Leila Maria Vello, Diogéna Malacarne, Regina Murad, além daquelas que comungavam das idéias propostas no projeto Político Pedagógico do Curso como Eugenia César Rayser, Maria de Lourdes Frizera, Noelia Escandian, Licéia Louro, Marlene Simonete. No decorrer do curso ampliou-se o quadro docente inclusive com absorção de ex alunos do próprio curso como Gláucia Sales Xavier, Ana Maria Petroneto, Alacir Ramos Silva e Raquel Gentili. Entre os anos de 1975 e 1976 com implantação do sistema de departamentalização no Centro de Ciências Jurídicas e Econômicas (CCJE) foi instalado o departamento do Curso de PDF created with pdfFactory trial version www.pdffactory.com 76 Serviço Social com uma estrutura física própria para as atividades burocráticas e acadêmicas do Curso (Chefia de Departamento, Coordenação de Estágio Supervisionado e posteriormente a Coordenação de Curso). A professora Ana Petroneto, lembra que o inicio do funcionamento do Curso de Serviço Social se deu de forma incipiente e dentro de uma conjuntura adversa, momento do auge da Ditadura Militar, que configurou algumas limitações na produção do conhecimento e na forma de organização políticas dos sujeitos políticos. O Curso de Serviço Social não tinha centro acadêmico, os alunos não podiam reunir, tínhamos alunos mais críticos, outros despolitizados. Me lembro que um grupo da nossa turma saiu para se reunir em Vila Velha mas o grupo foi perseguido pela policia. Falava-se que na nossa sala tinha um informante da política. Então era um momento muito vigiado. Nós procurávamos os debates, as respostas para as nossas inquietações, nos íamos a qualquer coisa aqui no estado, porque não havia organização nacional. A gente tinha muita ânsia em saber das coisas, mas era tudo muito difícil. Um debate acadêmico extremamente pobre, ausência de bibliografia de grandes autores. O Brasil se empobreceu culturalmente. O movimento todo estraçalhado. Então a gente não tinha ambiente universitário critico, ambiente universitário que era dominado pelo debate acadêmico profundo, relevante. (SERPA; 2009). A bibliografia utilizada na época tratava-se de uma bibliografia que pelo contexto da ditadura era cerceada no sentido do seu conteúdo representar a ideologia dos militares, numa forma de controlar o ensino e produção do conhecimento, pois nesse momento qualquer tipo de manifestação ou subversão era considerada uma afronta ao regime militar. Era uma bibliografia extremamente pobre. Tivemos-nos uma disciplina de política social e o material que a gente teve acesso foi um material da escola superior de guerra, era uma instituição que elaborava os materiais de acordo com os interesse dos militares. (SERPA; 2009) Por outro lado, com a consolidação do Curso o Currículo também foi se reformulando para atender as novas demandas postas pelo ensino e pela sociedade, incorporando novos conhecimentos específicos da profissão e de outras áreas afins fundamentando-se nas discussões e proposta da ABEPSS antiga ABESS., que segundo a Professora Ana Petroneto: Reformamos nosso Currículo, buscamos orientação da PUC-SP que tinha uma proposta de formação bem diferente. Levando os alunos a estarem em contato com a realidade desde o primeiro período. Fazendo com que estes estivessem em contato com as periferias urbanas, movimentos sociais, políticas públicas, desde o primeiro período, porque o modelo de Currículo que agente tinha o aluno ia para campo do 5º Período, fazia estagio e só. Então os alunos reclamavam muito porque queriam estar em contato com as coisas do Serviço Social desde o primeiro período. O velho PDF created with pdfFactory trial version www.pdffactory.com 77 modelo da UFES tinha as disciplinas básicas (sociologia, filosofia, direito, economia, antropologia, etc.) e da metade para frente tinha-se as disciplinas profissionalizantes, nos revertamos e reformulamos isso, o aluno desde o primeiro período, já começa a ter contato com a realidade social, ter contato com as disciplinas de Serviço Social e em doses homeopáticas entender essa profissão. (SERPA; 2009) Nesse processo de crescimento e expansão do Curso, começou-se a ter acesso a publicações criticas que subsidiassem a formulação de pensamento mais critico e que entendesse a realidade de forma mais concreta. As primeiras aproximações com as idéias críticas foram impulsionadas com a vinda do Grupo ECRO da Argentina, trazidos pelas professoras Elizete Cardozo e Maria Helena Rauta Ramos. No fim do Curso que a gente começou a ter acesso a algumas produções, que vinha da Argentina, pois lá tinha o grupo ECRO. Esse grupo era um grupo critico que estudava o Marxismo, a dialética. Então começamos a receber esses materiais, eles vieram aqui uma época, trazidos pela Maria Helena Rauta Ramos e Elizete Cardozo, que tinham uma atitude investigativa, que procuravam muito, que tinham ânsia de conhecer e aprofundar a nossa formação. Eles vieram aqui umas duas vezes e trouxerem os livros que eles estavam produzindo lá. E o Brasil produzindo aqui, vale ressaltar, os documentos de Araxá, de Teresópolis. O Movimento de Reconceituação Brasileiro não segue uma vertente critica. Segue um modelo desenvolvimentista (SERPA; 2009) Diante desse processo de crescimento algumas professoras foram contempladas com bolsas de Mestrado, primeiro foi a professora Maria Helena Rauta Ramos, em seguida a professora Elizete Cardozo. E a política de capacitação dos docentes continuou sendo realizada, conforme relatou a professora Elizete Cardozo. Nossos professores começam a fazer o mestrado. Nesse meio tempo uma das primeiras professoras daqui a ir fazer o mestrado foi a Professora Maria Helena Rauta, depois eu. Os professores iam toda semana, com aquela ansiedade de terem um conhecimento um pouco mais sistematizado. (CARDOZO; 2009) A conjuntura começava mudar a partir de 1977, pois nesse momento teve-se o fortalecimento das Comunidades Eclesiais de Base que foram se organizando nas comunidades e levando um olhar mais critico sobre o momento econômico e político do Brasil. Muitos movimentos de bairro foram surgindo nesse período na Grande Vitória, reivindicando saneamento, escola, transporte, saúde, coisas que eles não tinham porque a Grande Vitória não se preparou para receber um grande numero de habitantes em função de “Grandes Projetos Industriais”. PDF created with pdfFactory trial version www.pdffactory.com 78 Nesse processo o Serviço Social começa a ser questionado sobre sua postura profissional, logo o curso vai sendo conduzindo para um olhar mais critico visto as exigências de interpretação que se buscava naquele momento, na qual a Professora Ana afirmou que: Começávamos a entender o movimento da sociedade, a busca pelo processo de redemocratização as forças políticas. Então nos fomos nos politizando. Assim começamos a fazer essa travessia para um olhar mais critico um olhar mais histórico, para entender as classes sociais, pra entender o movimento político da sociedade. Sentamos varias vezes, discutimos varias vezes, o Serviço Social ainda não tinha uma bibliografia satisfatória, no sentido de que se lia muito sobre a dialética, mas era uma leitura que ficava presa as leis da dialética, um discurso genético, mais abstrato, não era ainda uma leitura sobre as condições concretas da sociedade brasileira. Mas isso agente foi fazendo todo um processo de amadurecimento. Então fizemos um estudo de currículo, como seria conduzida a formação. Tínhamos projetos especiais no sentido de que íamos para os bairros trabalhar com nossos alunos, assessorar as associações de moradores. A gente passava a entender que estávamos contribuindo para o processo de transformação social, visto que nesse momento, não se compreendia que era as classes que fariam essa transição, mas o movimento social, ele faria essa transformação. (SERPA; 2009) A professora Ana Petroneto, ressalta ainda que: O Serviço Social do Espírito Santo sempre teve essa marca da inquietação, ele sempre buscou a se aliar aos Cursos de Serviço Social mais avançado, mais progressista e mais críticos. Sempre fizemos um debate com as disciplinas da Sociologia e da Filosofia, sempre entendendo que não poderíamos ficar endógenos ao Serviço Social, que tínhamos que buscar apoio nas ciências sociais e em outras ciências (SERPA; 2009) O curso sempre buscou se relacionar com os aspectos conjunturais do Serviço Social brasileiro participando dos debates da profissão e levando inúmeras contribuições no sentido de fortalecer a profissão e buscar o seu significado. A nossa trajetória é uma trajetória de muita inquietação. Muita busca, muita leitura, muita participação. Em 1982 sai o currículo novo, puxado por uma grande discussão pela Associação Brasileira de Ensino em Serviço Social (ABESS). Sai um currículo novo. Logo começa um novo momento para nós. Então a ABESS começa um processo nacional de implantação do novo currículo, com muita participação e debate. E nos de Vitória, um grupo da UFES sempre estivemos participando da ABESS, fizemos parte da direção da ABESS por um grande período, continuamos a fazer parte de um processo de uma ABESS mais participativa, com pesquisa nacional sendo feita, com autores como a Alba, Marilda, Zé Paulo. Todos liderando esse processo intelectual e nos ajudando a encontrar nosso caminho. Íamos para os seminários, as oficinas regionais, vinha uma discussão de que a ABESS era uma entidade paquidérmica, ou seja, não andava, não se movimentava porque o Brasil era muito grande, que não valia a pena insistir na ABESS, e nós nos posicionávamos contra, dizendo que a ABESS não era paquidérmica. E nos começamos a realizar os encontros de pesquisa e foi aqui em PDF created with pdfFactory trial version www.pdffactory.com 79 vitória. Fomos ao Congresso em Fortaleza em 1987 (não me lembro muito bem da data) e em Fortaleza criamos o Centro de Pesquisa em Serviço Social em meio a uma disputa na qual um grupo queria formar uma entidade descolada do ensino da graduação e nós entendendo que não se podia fazer essa separação, lutamos para não criar uma entidade separada da ABESS, pois entendíamos que a ABESS já vinha acumulando grande experiência e postura histórica dentro do nosso processo de formação. (SERPA; 2009). Diante dos esforços e das constantes lutas que a categoria travou em seu debate teórico-metodológico / técnico-operativo, o Serviço Social capixaba ajudou nesse processo levando inúmeras contribuições. No plano local o curso também tinha grande prestigio pelo seu caráter combativo, conforme relatou a professora Ana: Na Universidade o nosso Curso teve um comprometimento permanente com a democratização da Universidade e da Sociedade. A nossa contribuição pela eleição do Diretor de Centro do CCJE, pela eleição dos Reitores, pela maior democratização da Universidade, por eleição dos nossos participantes nos Conselhos. Tudo isso foi muito vivido pelo Serviço Social da UFES, que em função desse seu compromisso histórico e social, dessa luta que ele travava. Também era um Curso muito respeitado no CCJE. Era referencia, éramos muito respeitados, como acredito que seja ate hoje. (SERPA; 2009). Os anos foram se passando e novos entraves e demandas foram sendo postos para o Curso de Serviço Social da UFES, como: Na Universidade criamos o Núcleo da Criança, depois o Núcleo da Mulher e das Relações de Gênero, e outros Núcleos foram surgindo como dos Movimentos Sociais [...] tivemos a Rosa Stein liderando a discussão da Assistência Social, a Ângela Campos na área da Saúde [...] Eugenia foi militar na área do HIV [...] Gláucia começou a discutir a questão da violência a questão de gênero, Sissa a questão do poder local e da urbanização. E eu na militância da defesa dos direitos da criança e do adolescente. Na questão do estágio pensava-se em criar laboratórios sociais dentro da Universidade para o aluno ter contato com a prática, mas dialogamos e refletimos na necessidade destes terem contato com os laboratórios concretos, levando eles para os programas sociais, os movimentos sociais. Valorizamos tantos as disciplinas das Ciências Sociais como também as do Serviço Social. Depois todo ano agente discutia, fazíamos um seminário de Currículo e chegamos a reflexão de que o Currículo não é algo fechado, que ele é algo aberto e precisa anualmente ser revisado, de forma a compreender quais as novas demandas que a sociedade esta trazendo e que nós temos que incorporar na nossa discussão. (SERPA; 2009). Assim, foi se constituindo o processo de criação e desenvolvimento do Curso de Serviço SOCIAL da UFES que sem duvida tem muitos outros aspectos que precisam ser mais bem elucidados e aprofundados no sentido de reavivar essa história em sua totalidade sem perder de vista sua particularidade e singularidade. PDF created with pdfFactory trial version www.pdffactory.com 80 2.4 – O Cenário Sócio, Político e Econômico Capixaba a partir da década de 90 do Século XX. O Espírito Santo adentra a década de 1990 com uma notória redefinição do seu perfil econômico, na qual se mostra como um perfil urbano-industrial predominantemente, consolidando assim uma nova estrutura produtiva, na qual se evidencia pela sua principal característica: a da presença de grandes plantas industriais produtoras de semi-elaborados destinados a exportação. Essa transformação da economia do Espírito Santo se deu acompanhada ao processo de urbanização, uma vez que, a população urbana que ate 1960 representava 28,45% da população total do estado, passou a representar em 1990 78%. Por sua vez, essa configuração urbana nesse processo de crescimento possibilitou as condições favoráveis a expansão de indústrias de bens de consumo como diversas outras atividades empresariais ligadas ao atendimento do mercado regional. No desenrolar dos anos de 1990 a economia capixaba se defronta com duas circunstancias exteriores que condicionaram o seu desenvolvimento. A primeira esta relacionada ao adiantado estagio de globalização da economia mundial que pela desobstrução de alguns entraves, havia, desde 1983 retomado o processo de crescimento, o que por sua vez, garantiu um ambiente favorável à expansão dos negócios em nível mundial. A segunda circunstancia esta relacionada ao plano interior na qual a partir dos anos de 1990 o Brasil mesmo que atrasado passou a implementar medidas de cunho liberalizante na perspectiva da sua reestruturação econômica. Essas medidas foram representadas, sobretudo, pela flexibilização do comercio exterior e pela privatização das empresas estatais, na qual afetaram positivamente a economia do estado, visto que, possibilitou a retomada dos grandes investimentos, sobretudo naquelas empresas de grande porte e voltadas para o comercio exterior. Segundo Rocha (1998) a combinação dessas duas políticas, possibilitou a abertura comercial e a desregulamentação geral da economia, impondo as empresas brasileiras um duplo desafio: a necessidade de ampliação das exportações de seus produtos, uma vez que o PDF created with pdfFactory trial version www.pdffactory.com 81 mercado nacional encontrava-se sob fortes restrições de consumo, e o ajuste das suas estruturas produtivas visando à redução de custos e ao aumento da competitividade. Esses dois desafios levaram grande parte das empresas brasileiras, sobretudo, as industriais à realizarem um processo de ajuste defensivo, ou seja, a implementação da modernização do processo produtivo, adoção da terceirização de vários serviços e introdução de inovações organizacionais/gerenciais. Por sua vez, esse ajustamento trouxe outros fenômenos como: substituição de equipamentos antigos por outros modernos e eletrônicos, adoção de programas de qualidade, drástica redução dos custos, com o conseqüente aumento da competitividade, e, ainda, o fenômeno indesejável do desemprego. Assim, ao longo da década de 1990, o modelo econômico adotado – pautado pela desregulamentação comercial e financeira, desestruturação do papel do Estado e desregulamentação do mercado de trabalho – alterou radicalmente a inserção do país na economia mundial. Da posição de terceiro maior gerador de excedentes comerciais do mundo (alcançado nos anos de 1980), o Brasil se transformou, com a adoção do Plano Real, numa economia deficitária nas trocas de bens De acordo com Pochmann (2001) o eixo do conjunto das reformas implementadas durante os anos de 1990 esteve comprometido com a integração do Brasil à econômica internacional. Para isso, a estabilidade monetária assumiu muita relevância, pois sem a volta da presença da função da moeda como unidade de conta, as grandes empresas transnacionais não teriam como avaliar precisamente o desempenho econômico, a rentabilidade e os custos de produção e serviços. Pochmann (2001) vai caracterizar os anos de 90 como a segunda década perdida, já que esta foi marcada pelo desemprego crescente, pela continua concentração de renda, pelo aumento do endividamento interno e externo, e pela ausência de crescimento sustentado (baixo crescimento econômico e reduzido patamar dos investimentos). No caso do Espírito Santo o ajuste defensivo atingiu o conjunto das empresas, tanto as exportadoras como aquelas mais voltadas para o mercado domestico. A particularidade regional conviveu com o fato de que o ajuste foi acompanhado da realização de grandes investimentos das empresas exportadoras em ampliação de capacidade produtiva. PDF created with pdfFactory trial version www.pdffactory.com 82 Isto, por um lado, fez com que o parque produtivo local experimentasse um processo de modernização tecnológica e gerencial sem precedentes na história do Estado, e pode-se considerar também um fato singular no contexto dos estados brasileiros. Por outro lado, esse mesmo fenômeno possibilitou de certa forma minimizar os efeitos indesejáveis do desemprego, na medida em que o aquecimento econômico geral possibilitou o desenvolvimento de outras atividades, sobretudo no setor terciário, que buscou absorver parcela expressiva das pessoas virtualmente desempregadas. O setor terciário desde a década de 1970 assumia um papel relevante dentro do mercado empregatício de Vitória, e era uma das atividades que mais gerava emprego, principalmente no setor de serviço, que em dez anos teve um crescimento na ordem de 48,59%. A prestação de serviço que também ocupava grande parte dos empregos da administração pública, em 1996, ocupava 73% dos empregos de Vitória, sua participação também se vinculava às concessionárias públicas e aos bancos estatais (NADER, 2001). A diversificação do setor de serviços e a expansão do comércio incentivaram a concentração espacial de diversos ramos empresariais, estimulando desse modo uma série de atividades pertinentes ao transporte, à circulação de matérias-primas e de mercadorias, e de atividades ligadas diretamente ao seu processo operacional, como as de fornecedores de componentes, acessórios, os cursos de especialização de pessoal, entre outras. Essa aglomeração empresarial ocasionou uma concentração de renda em Vitória que estimulou a ampliação dos setores de comércio e de serviços que abrangem atividades produtivas de compra e venda, armazenagem, transportes, sistema bancário, telecomunicações, fornecimento de energia, além da atividade da administração pública. Esse crescimento do comércio e do setor de serviços, excetuando-se os de monopólio estatal e os industriais, experimentou um processo simultâneo de concentração de capital e modernização e foi reproduzido pelo capital local, que encontrou condições favoráveis para sua expansão. Os grupos econômicos locais investiam principalmente no setor terciário, pelo fato de esse setor não exigir grande volume de dinheiro e por render lucros sem riscos, apesar dos constantes enfrentamentos com a concorrência de empresas nacionais que atuavam no ramo. Exemplo disso foram as grandes redes comerciais brasileiras e multinacionais que instalaram suas filiais em Vitória, tais como lojas de departamento de dimensões da Mesbla, das Lojas Americanas e da C & A. (Rocha e Morandi, 1991) PDF created with pdfFactory trial version www.pdffactory.com 83 Ainda dentro dessas atividades voltadas para a produção de serviços, incluíam-se as da administração pública, que respondiam por aproximadamente 50% dos empregos da Capital, e as do conjunto de ocupações que representavam os mais altos salários, como as dos profissionais liberais, dos especialistas, dos associados em pequenas empresas ou dos autônomos, que atingiam a casa dos 30% dos empregos formais da cidade. Esses últimos criaram possibilidades de geração de outros empreendimentos, aumentando os postos de trabalho em Vitória (NADER, 2001) Algumas empresas ligadas ao turismo, como agências de viagens, redes hoteleiras e restaurantes de porte nacional e internacional, também tinham um movimento crescente. No período de 1990 a 2000, o turismo de negócios e eventos foi-se constituindo em um importante fator de ocupação dos hotéis capixabas, principalmente aqueles situados na orla marítima da Capital. Em 1996, 26% dos motivos que levavam turistas à cidade eram viagem de negócios e de eventos, como congressos, seminários, feiras, exposições e atividades do gênero. Em fins da década de 1990, o turismo de eventos realizados em Vitória representava 35% de todo o turismo no Estado, gerando em torno de 20 milhões de reais no ano de 1999. Segundo informações obtidas no Fórum Brasileiro dos Conventions x Visitors Bureaux, em 2000 essa espécie de turismo gerou 44 mil empregos diretos e indiretos no Espírito Santo, chegando a arrecadar, por pessoa, o equivalente a cem dólares por dia, espécie 300% maior do que o turismo de lazer (NADER, 2001). Logo com as perspectivas advindas da nova dinâmica das atividades industriais, e, sobretudo, com a ampliação do comércio e do setor de serviços, motivou a concentração da população do Estado do Espírito Santo na região da Grande Vitória. Em 1991, 74% da população estadual concentravam-se na zona urbana e, só na Capital, viviam 13,44% desse universo populacional. (FIBGE, 1991). É preciso também destacar que é a partir dos fins da década 80 e inicio dos anos 90 que ocorreu os programas de privatização por parte do Governo Federal, que por sua vez trouxe impactos relevantes para a estrutura econômica capixaba, na qual tal medida atingiu quatro das grandes empresas instaladas no Estado e duas das empresas estratégicas para a economia regional. Assim, o processo de privatização tem inicio em 1989, com a venda de parte do capital acionário da Aracruz Celulose, pelo BANDES. Neste caso especifico não houve mudanças PDF created with pdfFactory trial version www.pdffactory.com 84 significativas na empresa, visto que o controle acionário já estava anteriormente em mãos de grupos privados. No mesmo ano, a Companhia Ferro e Aço de Vitória foi privatizada estando sob controle de grupo privado de São Paulo. Em 1992 ocorreu a privatização da CST, na qual o Governo Federal manteve participação minoritária por meio da CVRD.E em 1993 aconteceu a venda das ações da ESCELSA. A eminência desses fatores configurou uma conjuntura de expansão do crescimento da economia capixaba, sobretudo pelo fato de sua função elevada de especialização na produção de semimanufaturados para exportação, visto que 90% da sua produção estava voltada para o mercado externo, exigindo grandes investimentos para ampliação da sua capacidade produtiva (ROCHA, 1998). Essa nova onda impulsionada pelos grandes investimentos desses grupos tem uma dupla face. Uma de que se confirma e amplia a especialização da economia capixaba na produção de semimanufaturados para exportação e na prestação de serviços especializados ligados ao comercio exterior. E a outra face se dá na dependência destas empresas em relação ao mercado externo, o que lhes permite boa rentabilidade em alguns momentos, mas também ficam sujeitos a uma situação de drásticas flutuações de preços, dado que se trata de um mercado de comodities passível a manipulação de estoques de e de grande sensibilidade frente ao comportamento cíclico da economia mundial. O conjunto de investimentos industriais que por ora vêm ocorrendo no Estado, se apresenta por seus efeitos positivos e negativos sobre a realidade local. Os positivos estão ligados a ampliação da renda e do mercado consumidor regional e a modernização tecnológica. A ampliação da renda e do mercado consumidor regional por sua vez amplia as possibilidades de crescimento de outras atividades industriais e de serviços, que estão voltados para o atendimento desse mercado, o que pode ser visto através dos novos investimentos em construção civil residencial, hospitais, clínicas médicas, escolas particulares, supermercados, shopping centers etc. A modernização tecnológica por sua vez, além de melhorar a competitividade das próprias industriais que realizam os investimentos acabam impactando também a economia regional de um modo geral. Os impactos negativos processados por esses novos investimentos estão relacionados a diminuição do numero de empregos diretos, decorrente da automatização crescente dos processos produtivos, visto que as empresas estão realizando investimento tanto em PDF created with pdfFactory trial version www.pdffactory.com 85 ampliação de sua capacidade, como também investindo na racionalização dos processos produtivos já existentes, o que, nos dois casos, resulta em redução do numero de empregos. É diante desse contexto de modernização, que o desemprego vai adquirir um novo mecanismo em face do modelo econômico adotado a partir da década de 1990, na qual pelos dados apresentados no Relatório Final do Projeto de Avaliação do Plano Estadual de Qualificação, de 1998, mostram que, não só no Espírito Santo, mas também em todo o Brasil, o mercado de trabalho só não foi melhor pelos desajustes de qualificações entre as oportunidades de emprego, “num contexto de rápida difusão de novas tecnologias”, e a formação educacional e profissional da grande maioria da população desempregada. Essa carência de mão-de-obra técnica pode ser justificada pela tradicional economia primárioexportadora e pela deficiente educação profissionalizante do Estado. Desta forma, a educação também sofreu transformações para atender à demanda do mercado que se formava na Grande Vitória. Foram criados vários cursos profissionalizantes, cercando-se de uma infra-estrutura escolar capaz de absorver anualmente um número crescente de matrículas em todos os graus de ensino. No período de 1997 a 2000, a administração municipal investiu aproximadamente 30,15% na área de educação. Em 1994, 88% da população de Vitória, em idade escolar, estava matriculada, enquanto que a taxa nacional, nesse mesmo ano, se situava em 85%. No ensino médio, em 1971, Vitória contava com 11.992 matriculas, sendo que dessas 9.554 eram matrículas iniciais e 2.438 eram matrículas de conclusão de curso. Em 1988, Vitória tinha 191.862 pessoas matriculadas no ensino fundamental e 32.910 no ensino médio. A formação profissional desenvolvida pelas instituições de serviços de aprendizagem industrial e comercial – SENAC, SESC e SESI – também ofereciam cursos de diversas modalidades de ensino. Destacavam-se os cursos nas áreas de aprendizagem industrial, de aperfeiçoamento profissional, de qualificação profissional, de treinamento, de habilitação parcial, de desenvolvimento gerencial, de suplementação, de desenvolvimento técnico operacional, além de constantes estágios, seminários e encontros de equipes de trabalho. Considerando toda a estrutura do ensino regular, supletivo e especial, da cidade, composto por escolas públicas e privadas, em 1999, foram oferecidas 113 mil matrículas, em 184 estabelecimentos. (Espírito Santo, 1999). PDF created with pdfFactory trial version www.pdffactory.com 86 Quanto ao ensino superior em 1998, ensino superior abrangia novas áreas do conhecimento e Vitória contava com 14 estabelecimentos que abriram vagas para aproximadamente 15 mil alunos. No ano 2000, o Caderno Vitória. Uma Ilha de Oportunidades a sua Espera, afirmava que a UFES havia sido classificada pelo Ministério da Educação como uma das oito melhores universidades do Brasil. Além desse dado, o Caderno Vitória ainda dizia que a taxa de alfabetização da população acima de 10 anos, no ano de 1999, havia sido de 87,70%, e que a escolaridade dos chefes de família, no ano de 1999, era de 9 anos. Entre os anos de 1980 e 1990 os cursos de pós-graduação constituíram em outras modalidades de ensino profissional desenvolvido em Vitória. Especificamente os cursos oferecidos pela UFES que abrangiam diversas áreas do conhecimento e dentre eles destacavam-se o de Fisiologia Cardiovascular, Artes Contemporânea, Automação Industrial, Informática, Engenharia Ambiental, Economia, História, Geografia, Filosofia, Psicologia, Letras e Pedagogia. Em 2000, a UFES ofereceu 14 cursos de mestrado e 03 de doutorado. A qualificação profissional se tornou um aspecto fundamentalmente significativo na vida capixaba, uma vez que o Estado entrou no século XXI com um cenário de uma economia diversificada, em termos de ampliação da participação de atividades produtivas e de serviços voltados para o mercado domestico exigindo mão-de-obra técnica e qualificada. Junto com esse progresso econômico, o Estado passou a conviver com as mais variadas expressões da questão social, decorrentes do processo de acumulação e concentração do capital, como o fenômeno do desemprego que perpassa o processo de reestruturação produtiva devido a incapacidade do sistema de absorver a mão-de-obra disponível, intensificando a pobreza como expressão desumanizador do capital. Enfim, o que se percebe dessa trajetória é que o Espírito Santo, até os anos de 1960, esteve apoiado na economia agroexportadora da monocultura cafeeira e se apresentava como uma região periférica e subdesenvolvida, com pouca integração ao mercado nacional. Contudo, essa situação se modificou com a implantação de grandes indústrias produtoras de bens de capital, que abriram novas possibilidades para o mercado de trabalho na cidade e ao mesmo tempo trouxe para Vitória milhares de pessoas desempregadas. PDF created with pdfFactory trial version www.pdffactory.com 87 Em decorrência desse processo de instalação das grandes indústrias como a Companhia Siderúrgica de Tubarão (CST), a Companhia Vale do Rio Doce (CVRD), a Usina de Pelotização Samarco, a Aracruz Celulose, a Belgo-Mineiro antiga Companhia Ferro e Aço de Vitória (COFAVI), e outras centenas de empresas que se lhes seguiram, fez com que em menos de vinte anos, a Grande Vitória sofresse um enorme impacto populacional. O congestionamento da região com a expansão de favelas e atividades informais, ao mesmo tempo em que adquiria características de metrópole sofreu uma descaracterização na medida em que, perdeu o tradicional perfil de capital administrativa e comercial com ares coloniais, para tornar-se um complexo aglomerado urbano industrial que absorvia enorme quantidade de pessoas vindas não só do campo rural, mas de várias cidades do Brasil em busca de emprego. O cenário descrito evidencia a existência das varias expressões da questão social, exigindo respostas do Estado e da Sociedade Civil através da intervenção dos seus agentes institucionais. 2.5 – CRIAÇÃO DO CURSO DE SERVIÇO SOCIAL DA EMESCAM. A implantação do Curso de Serviço Social da EMESCAM se finca no contexto dos anos de 2000, num momento em que havia uma expansão da demanda/oferta de vagas para o ensino superior no Espírito Santo, visto que desde os anos de 1990 ocorria o aumento da população juvenil, do seu nível de escolaridade e do processo de valorização da educação enquanto meio de integração social nas sociedades globalizadas, que por sua vez, traziam em seu bojo mudanças significativas no mundo do trabalho, tornando esse cada vez mais competitivo. Tratava-se de um contexto de reestruturação do Estado e desregulamentação das relações econômicas e sociais em uma perspectiva neoliberal, que submete o Estado nacional aos ditames do capital internacional e dos organismos internacionais como ONU, Banco Mundial, FMI, OMC. Como sinaliza o ANDES (2007) refere-se a uma lógica de “contrareformas” que visam a atender as demandas do capital PDF created with pdfFactory trial version www.pdffactory.com 88 As contra-reformas, conforme já amplamente analisadas no âmbito das produções críticas (Behring, 2003), iniciadas após a Constituição Federal de 1988, atingiram e remodelaram o Estado em três áreas estratégicas: 1) as funções típicas do Estado (segurança nacional, emissão da moeda, corpo diplomático e fiscalização); 2) as políticas públicas (saúde, cultura, ciência e tecnologia, educação, trabalho e previdência); e 3) setor de serviços (empresas estatais estratégicos, como energia, mineração, telecomunicações, recursos hídricos, saneamento e outros) (ANDES, 2007). Assim, a implantação do Curso de Serviço Social da EMESCAM só pode ser compreendido em sua totalidade se inserido na Contra Reforma do Ensino Superior, que tem início com a aprovação e implementação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação, em 1996, uma vez que esta legislação que regula o ensino superior brasileiro propiciou condições para que as Unidades de Ensino ampliassem e diversificasse a oferta de cursos superiores, acrescenta-se a isso a expansão da iniciativa privada na área do Ensino Universitário. Nesse contexto a EMESCAM começou a se expandir e a criar cursos novos voltados para a área da Saúde transformando-se no Centro de Ciências da Saúde de Vitória (CCSV) em 1996. A EMESCAM funcionou inicialmente com o Curso de Medicina fundada em 1966 por ato da Mesa Administrativa da Irmandade da Santa Casa de Misericórdia, entidade Mantenedora, e autorizada a funcionar em 1968, tendo na época a finalidade de preservar, elaborar e transmitir os conhecimentos necessários ao exercício e desenvolvimento da profissão medica. O Centro de Ciências da Saúde de Vitória (CCSV) com o intuito de atender as necessidades criadas pela sociedade face a crescente demanda por vagas no ensino superior e o natural crescimento da Instituição, possibilitou condições para o Projeto de implantação do Curso de Serviço Social na referida Instituição. Em entrevista realizada com a Professora Alacir Ramos Silva - Ex-Coordenadora do Curso de Serviço Social -, constatou-se que a criação do Curso de Serviço Social da EMESCAM foi viabilizado face à expansão da Instituição para a criação de novos cursos na área da Saúde. A criação do Curso de Serviço Social na EMESCAM foi proposto pela professora Ana Petroneto Serpa sendo a idéia abraçada pela Profª. Alacir Ramos Silva, professora do Curso de Medicina da EMESCAM, que se prontificou a negociar e dar início a esse processo de discussão para a implantação do Curso de Serviço Social. PDF created with pdfFactory trial version www.pdffactory.com 89 Nesse tempo então, começamos a pensar no que fazer, como seria pra frente, começou a surgir alguns espaços que não deram certo, e nós que tínhamos a ideologia de que o conhecimento é publico, da não privatização do conhecimento. Mas veio a EMESCAM, na qual enxergamos um diferencial, pois ela é privada na sua organização, mas publica na sua finalidade. Ela não tem fins lucrativos. Começamos a refletir sobre esse espaço que é um espaço não governamental, e com menos drama, sentamos e começamos a elaborar uma proposta para EMESCAM. (SERPA; 2009) O Projeto do Curso de Serviço Social da EMESCAM começou a ser construído em 2000, na qual participaram desse processo a Profª. Ana Petroneto – idealizadora da proposta com experiência nos processo de revisão do Currículo da Federal -, Profª. Maria de Lourdes Frizera – com acumulo teórico e -, a Profª. Alacir com participação em discussões de reformulações dos Currículos de Serviço Sócia, todas com inserção na ABESS. Participou também a Assistente Social Ângela Campos, com inserção histórica na área da Saúde. O Projeto foi construído coletivamente, visto que outros atores contribuíram para a construção das ementas das disciplinas, conforme relatou a Professora Alacir: “A ementa da disciplina de Gênero com a professora Glaucia, a ementa de Comunicação e Expressão que o professor Fábio fez. Então a gente foi discutindo as ementas com as pessoas, ou seja, foi um trabalho coletivo. Ninguém sentou e construiu sozinho e nem copiou isso de algum lugar. O projeto da EMESCAM tem essa diferença, ele é original, porque fomos até a lei, distribuímos as tarefas para as pessoas. Então tem muitos atores. É um projeto coletivo!”. (SILVA; 2009). Da construção do Projeto a implantação do Curso levou cerca de três anos. O Curso foi autorizado a funcionar pela portaria do MEC de Nº. 1.696 de 07/06/2002, sendo a data de publicação no dia 10/06/2002, quando iniciou-se a chamada para o vestibular. O curso previa o regime de matricula anual, ofertando 80 vagas (40 vagas para o turno matutino e 40 vagas para o turno noturno), sendo de 04 anos ou 08 semestres o período mínimo de integralização do Curso e de 06 anos a 12 semestres o período máximo de integralização. O horário de funcionamento previsto era de turno matutino – de segunda à sexta-feira das 07h às 12h; e o turno noturno – de segunda à sexta-feira das 19h às 23h e aos sábados de 07h às 12h. A professora Alacir lembra que nesse primeiro momento o Curso não conseguiu fechar uma turma para o inicio das atividades. Com isso constatou-se que o perfil do ingressante do Curso de Serviço Social da EMESCAM era um aluno trabalhador, tornando PDF created with pdfFactory trial version www.pdffactory.com 90 assim, inviável a oferta de vaga para o turno matutino. Em nova negociação apesar da resistência de alguns Membros do Conselho Deliberativo da EMESCAM conseguiu-se autorização para abrir novamente o vestibular, agora somente com vagas para o turno da noite. O Curso foi autorizado pela Direção a funcionar com a quantidade de candidatos aprovados no vestibular. Considerando o não preenchimento da totalidade das vagas foi oferecido algumas bolsas de filantropia da própria instituição, beneficiando alguns funcionários da EMESCAM e outros que por ventura fizessem jus aos requisitos necessários. Em conseqüência disso mediante acordo com o “Projeto Universidade Para Todos” - que funcionava como um pré-vestibular na UFES - a EMESCAM disponibilizou algumas vagas e respectivas bolsas. Assim o curso começou a funcionar com uma turma cuja estrutura era incipiente, que foi gradativamente melhorando as condições de funcionamento. A Coordenação do Curso funcionou inicialmente em uma sala dividida com o professor Drº. Augusto, e com uma secretaria em comum (Roberta) que era também aluna do Curso. O corpo docente inicial foram os professores: Ana Maria Borlotti, Elizete Cardozo, Eliane Tozato, Fabio Malini, Guimarães, Neide Maria de Oliveira e Rosa, que foi ampliando de acordo com a integralização do curso. Nesse momento o Curso contava com o apoio incondicional de dois autores fundamentais no processo de elaboração e implantação do Projeto, como lembra a professora Alacir: “Drº. Augusto foi uma pessoa extremamente preciosa, que deve ser lembrada sempre. Drº Augusto, quando for se lembrar do Curso de Serviço Social da EMESCAM tem que se lembrar dele e o Drº Nilo que era o diretor da época também. São duas pessoas que são inesquecíveis para a implantação no inicio desse curso”. (SILVA; 2009). Com o desenvolvimento do processo de implantação do Curso de Serviço Social novas demandas foram surgindo como a questão da reprografia, da tesouraria e da secretaria que antes funcionava num horário que era incompatível com o Curso, não atendendo as necessidades acadêmicas e administrativas, passando posteriormente, após muitas argumentações com a diretoria, a funcionar no horário da noite PDF created with pdfFactory trial version www.pdffactory.com 91 Com a eleição do Drº. Álvaro para Direção da EMESCAM o Curso começa a se expandir internamente no que tange ao seu espaço físico, o Curso nesse momento contava com uma sala mais abrangente mais tarde conseguindo outra, formando um anexo que comportasse as repartições do Estágio, do Departamento e da Coordenação do Curso. A professora Alacir registra a pessoa inesquecível que foi o Drº Álvaro, na qual precisou renunciar a Direção por motivos de Saúde, ficando o Drº Severino e o Professor Adércio (Coordenador do Curso de Farmácia) na direção, momento de crescimento e expansão da EMESCAM, logo para o Curso também. Nesse bojo de expansão e crescimento e o curso faz novas aquisições para o corpo docente, chegando a 29 professores, com formação, capacitação e titulação, que de acordo com a professora Alacir “se sobressai na instituição e na categoria”. Academicamente o Curso vai se estruturando em torno do estágio supervisionado, tendo a figura da professora Elizete Cardozo, que segundo a professora Alacir, foi fundamental na estruturação do mesmo, tendo em vista a sua vasta experiência acadêmica e profissional com fácil dialogo junto as instituições, na busca por novos campos de estágio, e ampliação de oferta de vagas. Dialogo indispensável a uma coordenadora de estágio, característica da professora Elizete. Em seguida veio a professora Tânia Prado com um perfil de extensão, conduzindo as atividades do projeto de extensão ”Saúde e Qualidade de Vida na Terceira Idade”, somando-se ao projeto que a professora Elizete também conduzia, ou seja, conforme aponta a professora Alacir, o Curso de Serviço Social da EMESCAM, começa a ter o marco da extensão. Em seguida o Curso adentra ao eixo pesquisa, quando a FACITEC lança seu edital, sendo um momento oportuno e de grandes benefícios para o conjunto do Curso e para Instituição, nesse momento a professora Alacir aponta que o Curso estava com o OBEVIO, que é o Observatório de Estudos da Violência, sendo formado por uma parcela do LOCUS, Núcleo de Estudos de Poder Local, que o grupo de professores trouxe da UFES para EMESCAM, assim foi criado esse sub-núcleo o OBEVIO, para poder se estudar a violência. Nesse contexto, quando a FACITE lançou seu edital de pesquisa tendo como eixo a violência,”caiu como uma luva”, segundo a professora Alacir, uma vez que: “dos 09 projetos de pesquisas que foram contemplados com bolsa de financiamento, 03 foram da EMESCAM, PDF created with pdfFactory trial version www.pdffactory.com 92 sendo o meu, do professor Fabio e da professora Eliane, esse momento foi muito importante, salientou a professora Alacir. A professora Alacir considera esse momento muito importante para o crescimento e expansão do Curso, culminando no seu reconhecimento pelos órgãos de regulamento da Educação Superior do Brasil e pela sociedade. “É muito interessante! Estágio para o aluno, a extensão, uma forma de estágio para o aluno cumprindo com os objetivos da instituição, a pesquisa. Daí não parou mais. Os professores tiveram projetos de pesquisa aprovados pela FAPES. Daí veio eu, Fabio, Eliane, Adriana, Rauta, Francis e Raquel todos financiados pelas agencias de fomento (FACITEC E FAPES). E um curso que era só graduação. Você não encontra esse luxo em outra escola, como eu costumo dizer. E isso nos deu perna pra abrirmos o Mestrado, com tanto pouco tempo, a gente conseguiu ter uma estrutura interna de pesquisa e de pesquisador para poder pleitear junto a CAPES na área do Serviço Social um Mestrado em Políticas Públicas e Desenvolvimento Local. É muito pouco tempo pra isso tudo. E eu brinco que só vou sair daqui depois que implantar o doutorado” (SILVA; 2009). Em relação ao currículo algumas mudanças foram efetivadas visto a atender as demandas trazidas pelo grupo de avaliadores na época do reconhecimento, e atender as demandas inerentes do convívio diário destas disciplinas com os professores e alunos, segundo a professora Alacir: “O Currículo é vida! Ele tem que ser mexido diariamente. Porque a realidade é muito rápida [...] O Currículo tem que acompanhar muito além da realidade ele tem que acompanhar o real [...] Houve mudanças legais em termo da carga horária [..] Houve o atendimento a uma demanda posta pelos avaliadores que não conseguiram entender que a discussão da Questão Social perpassa por todos as disciplinas. A avaliadora, uma profª. Assistente Social, ela entende que de acordo com as Diretrizes Curriculares da ABEPSS, você tem que ter uma Disciplina de Estudo da Questão Social. E nós tínhamos três! Então agente transformou a Disciplina de Estudo da Questão Social I numa parte teórica para fazer o atendimento desta colocação. Mesmo agente entendendo que o Eixo da Questão social perpassa por todas as disciplinas, mas tínhamos que atender. E a questão hoje do Estagio Supervisionado hoje no atendimento dessa nova lei posta. E a disciplina de Trabalho de Conclusão de Curso que antes podia ser feito ate três alunos e hoje tem que ser individual [..] e a questão da aula relógio, porque quando agente fez o Curso, ele tinha o direito de minuto a menos na chama hora/aula, hoje não, o INEP PDF created with pdfFactory trial version www.pdffactory.com 93 trabalha com a hora relógio independente qual o turno que o aluno esta estudando ou que o curso esta sendo implantado. Essas foras as mudanças, mas na estrutura de fato agente não precisou de mudar ainda”. (SILVA; 2009). O Currículo pleno do Curso de Serviço Social da EMESCAM buscou e tem buscado referência, no Currículo Mínimo aprovado em Assembléia Geral Extraordinária da ABPESS em 1996, entendendo que o Currículo Mínimo vem no horizonte de estabelecer diretrizes, princípios e marcos essenciais, garantido também a flexibilidade para fazer as adequações locais, de forma, a propiciar um acréscimo para atender as especificidades da realidade sócio-econômica e cultural da região. Desta forma, o Currículo Pleno do Curso de Serviço Social da EMESCAM tem como eixos estruturantes: I – Eixo da Fundamentação nas Ciências Humanas e Sociais; II – Eixo do conhecimento sobre a sociedade brasileira, sua história, constituição e especificidade; III – Eixo das políticas sociais como mediações entre o Estado e Sociedade; IV – Eixo da pesquisa e da produção do conhecimento; V – Eixo da especificidade profissional e do conhecimento instrumental complementar. Esses eixos articulam disciplinas e atividades que se interpenetram e se complementam O Currículo tem uma carga horária global de 3.285 (três mil, duzentos e oitenta e cinco) horas, sendo distribuído da seguinte forma: 2.730 – horas de disciplinas/atividades obrigatórias; 405 – horas de estágio supervisionado; 150 – horas de atividades livres. Às 2.730 horas de disciplinas/atividades obrigatórias estão distribuídas 11 (onze) disciplinas de 30 (trinta) horas, 09 (nove) disciplinas de 45 (quarenta e cinco) horas, 32 (trinta e duas) disciplinas de 60 (sessenta) horas e 01 (uma) disciplina de 75 (setenta e cinco) horas. Esse corte das disciplinas tem exigido da Coordenação e dos professores um empenho pela busca de uma articulação vertical e horizontal dos conteúdos que integram a grade curricular, formando um grande espiral na qual cada disciplina completa a outra e da seqüência as que estão por vir. A formação ofertada pelo Curso de Serviço Social da EMESCAM se finca num caráter generalista,, propondo assim denominações abrangentes em determinadas disciplinas de forma que estas possam ser ofertadas para os alunos de outros cursos a Instituição e das demais Unidades de Ensino, buscando uma interlocução constante com as demais áreas PDF created with pdfFactory trial version www.pdffactory.com 94 profissionais, ou seja, a estrutura curricular do curso não se fecha por si próprio, ele permite um dialogo construtivo com outras áreas. É valido registrar que o caráter generalista do curso não significa ausência de direção, ao contrario o mesmo em sua estrutura tem adotado a teoria social crítica que possibilita a apreensão da totalidade social em suas dimensões de universalidade, particularidade e singularidade. Da criação ao processo de implantação do curso alguns momentos foram marcantes para a estruturação e a consolidação do mesmo, momentos que são descritos como essências para se entender a história do Curso de Serviço Social da EMESCAM segundo a professora Alacir, estabelecendo a seguir os quatro marcos dessa historia. 1º Momento: Foi uma luta enorme primeiro pra gente implantar. Porque da feitura de escrever o projeto ate implantar, foram cerca de três anos, e aí mudou a diretoria, e ai passamos a ter no conselho deliberativo um favorável a implantação do curso e outro grupo não favorável, que eram contra a implantação do projeto e deram graças a Deus que no processo seletivo não conseguimos formar turma pra funcionar o curso. Esse foi o primeiro momento e que eu era sozinha, era eu e o Conselho Deliberativo. Aí entra a figura do Drº Nilo e ele foi brilhante pra implantação desse curso de Sérvio Social, porque ele entendeu a necessidade dessa Instituição, enquanto Instituição Filantrópica e que goza de um certificado. E foi muito interessante o dia dessa votação no Conselho se ofertava ou não o vestibular, que me deram então a palavra pra fazer a defesa e deram também às pessoas que eram contrarias. E antes do processo de votação o Presidente do Conselho que tinha o voto de minerva, ele escreveu o voto dele e deixou guardado, se precisasse o mesmo iria abrir. Mas não precisou porque agente conseguiu por dois votos contrários somente passar a abertura do Vestibular do Serviço Social, aí foi muito engraçado porque o presidente abriu o voto e disse que o voto dele (já era sim) .Eu acho isso histórico. (SILVA; 2009) 2º Momento: O segundo momento foi o da autorização o do reconhecimento, porque querendo ou não o reconhecimento é o marco de qualquer curso. Porque o marco do reconhecimento ele traz muito benefícios pro curso. É o momento em que a Escola precisa dotar dos recursos que ela disse que ia dispor no ato da autorização. E pra qualquer escolar esse momento é um fato marcante. E o fato da gente ter sido reconhecido com o maior crédito de qualquer outro curso de Serviço Social do PDF created with pdfFactory trial version www.pdffactory.com 95 estado da rede privada, ninguém teve a nota que agente teve nem na autorização, nós fomos autorizados com a nota A, e nem no reconhecimento. (SILVA; 2009) 3º Momento: E o outro marco que foi muito bonito, foi quando você vê a formatura da primeira turma que significa que você cumpriu o seu objetivo, você formou e o seu quadro esta completo, daí qualquer um pode pegar e administrar, desde que entenda o projeto político pedagógico, desde que entenda a estrutura, porque aquele pedaço da luta, do espaço físico, da contratação do professor, daí em diante a coisa fica mais tranqüilo. Porque a estrutura esta toda pronta. (SILVA; 2009) 4º Momento: E o quarto marco foi quando fomos bancar o Mestrado. E eu falei no dia seguinte que fomos autorizados a funcionar, com o numero de alunos que viesse e que agente instalou o Curso de Serviço Social, eu fui muito atrevida, cheguei lá na Diretoria e falei: estamos implantando o Curso de Serviço Social hoje e o primeiro Stricto Sensu vai ver pelas mãos do Serviço Social. Perguntei vocês autorizam escrever o projeto, eles falaram autorizamos. Então ta. Deixa passar o reconhecimento, deixa agente formar a primeira turma. E hoje estamos com o Mestrado. (SILVA; 2009). Esses foram os marcos de uma historia pequena, mas com muitos detalhes que o Curso de Serviço Social da EMESCAM conviveu e tem convivido, e com certeza vivenciara outros momentos. PDF created with pdfFactory trial version www.pdffactory.com 96 CONSIDERAÇÕES FINAIS Há muitas considerações a se fazer num trabalho como este, até mesmo pela própria temática desenvolvida que é complexa e envolve diversos elementos que se configuram de suma importância para a compreensão dos processos históricos da Formação Profissional dos Assistentes Sociais do Espírito Santo. Foi extremamente desafiador e gratificante desenvolver esse estudo como contribuição ao Serviço Social Capixaba, mesmo com possíveis limitações temporais e de análise. Desenvolver esse trabalho na atualidade representou a necessidade de buscarmos as origens da profissão para assim refletirmos sobre os dias de hoje. A discussão acerca da formação profissional dos Assistentes Sociais do Espírito Santo ainda é incipiente e carente de um tratamento crítico. Poucas são as publicações acerca da constituição genética da profissão no estado. Ao chegarmos ao fim desse percurso, concluímos que as bases para a formação do Serviço Social capixaba também esteve ligado a transição da estrutura econômica ate então baseada na monocultura cafeeira para a estrutura industrial/urbana que o estado adentrava. Seu processo de expansão e consolidação vai ganhando terreno na medida em que novas demandas vão exigindo a atuação de profissionais que desfrutando de instrumentos técnicos pudessem intervir na realidade de forma a amenizar os problemas sociais decorrentes da expansão econômica que não foi acompanhada por um planejamento social no estado. É nesse contexto que a figura do Assistente Social aparece como “Salvador da Pátria”. Tal concepção permitiu que alguns cursos de Serviço Social fossem criados para formar novos profissionais na perspectiva de ajudar o Estado a controlar os desajustes sociais daquela época. Assim, tanto o Curso de Serviço Social da UFES quanto o Curso de Serviço Social da EMESCAM, apesar de tempos diferentes, são justificados por contextos que se aproximam na PDF created with pdfFactory trial version www.pdffactory.com 97 medida em que chamam o Serviço Social para atuar nas demandas sociais decorrentes dos seus respectivos contextos sócio-históricos. Essa forma de conceber o Serviço Social é entender que o mesmo se constituiu a partir de um momento histórico determinado, assim, a profissão é determinada sócio-historicamente, a mesma se constrói sustentada pela contradição, seu significado social se dá, segundo Iamamoto (1992), na vinculação concreta que esta profissão vai ter na sociedade capitalista, mas especificamente na era industrial, conferida pela ordem dos monopólios. Ao compreender esse movimento, podemos dizer que a profissão avançou, no sentido de romper com antigas concepções da mesma descoladas da realidade, numa visão endógena do Serviço Social (IAMAMOTO, 1999) que não compreendia essa forma histórica de reconhecer a profissão no rol de profissões que surgem a partir de um determinante histórico que é a “questão social”. [...] a base própria da sua profisionalidade, as políticas sociais, conformam um terreno de conflitos- e este é o aspecto decisivo- constituídas como respostas tanto às exigências da ordem monopólica como ao protagonismo proletário, elas se mostram como territórios de confrontos nos quais a atividade profissional é tensionada pelas contradições e antagonismos que as atravessam enquanto respostas”. (NETTO, 2000: 78). No Brasil, a profissão de Serviço Social sempre esteve determinado pela estrutura e conjuntura de uma dada formação profissional, que a partir dos anos 80 do Século XX teve como fundamento a realidade social compreendida criticamente em seu movimento complexo e heterogêneo. Esta formação considera as demandas sociais dos diferentes grupos e classes sociais. Nesse caminho para garantir o desenvolvimento da profissão priorizou-se a afirmação da investigação como atividade vital para a própria atualização do Serviço Social; uma formação contínua que promovesse importantes espaços de reflexão e troca de experiências, e, por fim, uma reorientação dos conteúdos das matérias do currículo que se traduzira em nossas angulações implicadas no tratamento da prática profissional como um processo de trabalho no cenário da questão social. Esses elementos consubstanciados oferecem bases para enriquecer o debate do processo de formação profissional a nível nacional e local. PDF created with pdfFactory trial version www.pdffactory.com 98 É interessante analisar que ambos os Cursos de Serviço Social (UFES e EMESCAM), tiveram atores que participaram de forma direta e indireta dos processos iniciais de formulação e implantação dos referidos cursos. Atores que historicamente vem contribuindo para o fortalecimento da profissão e afirmação da condução critica e histórica da nossa formação profissional. O envolvimento desses atores, não por si só, mas se fazendo também por esse meio, acaba tendo implicações na formulação do Currículo dos respectivos cursos, uma vez que os dois conforme observado nas entrevistas realizadas, tem na sua formulação a participação coletiva de diversos atores, afirmando-se numa construção coletiva. São dois marcos que influem no Serviço Social, uma vez que se constituem em espaços de formação e capacitação de novos e permanentes sujeitos sociais, que por meio de sua intervenção técnica-operativa contribuem para a eliminação das desigualdades sociais. Desse modo, buscamos nesse trabalho apresentar algumas aproximações acerca dos elementos que vem constituindo a formação sócio-histórica do Serviço Social capixaba, numa perspectiva de totalidade. Depois de estudarmos um pouco dessa trajetória, chegamos a conclusão de que para fortalecermos o Serviço Social no Espírito Santo e até mesmo garantir o seu desenvolvimento enquanto profissão determinada pela divisão social e técnica, precisamos: à criar condições para que novos estudos sejam viabilizados no sentido de aprofundarmos o debate acerca da origem da profissão; à aprofundar o conhecimento das condições reais de trabalho do Assistente Social, enquanto trabalhador assalariado que se articula com as lutas mais gerais dos trabalhadores frente as reformas sindical, trabalhista e universitárias; à estimular o estudo sobre novos espaços ocupacionais, compreendendo seu mercado de trabalho; à realizar pesquisas que visem averiguar os rumos dos processos de formação profissional em nosso estado; PDF created with pdfFactory trial version www.pdffactory.com 99 à acompanhar a expansão dessa formação profissional, entendendo a criação de novos cursos e a expansão dos já existentes; à criar grupos de estudos que visem refletir sobre as dimensões teórica, metodológica, técnico e operativa; à do constante debate acerca do nosso Projeto Ético Político Profissional. Pensamos que tais elementos podem ajudar a responder questões que merecem destaques nos tempos atuais, como: Que tipo de formação vem sendo ofertado? Que princípios tem norteado a criação e a expansão de novos cursos de Serviço Social? Qual o entendimento que se tem do Principio Ético Político da profissão? Quais as demandas emergentes no cotidiano de nossa prática? Quais os rumos da profissão no Brasil e no Espírito Santo? Qual contexto que estamos inseridos? Qual o entendimento de nossa pratica? Como que o Serviço Social tem sido visto pelo conjunto da sociedade? São estas e outras questões que precisamos constantemente estarmos atentos no intuito de não perdemos os caminhos que a profissão vem passando e quais os novos caminhos a serem trilhados. Chegamos ao final de um ponto da viagem. Acreditamos que ainda existe um caminho a percorrer. Como dissemos anteriormente, muitas são as incompressensões, dúvidas e inquietações sobre os elementos historiográficos e teóricos que permeiam a formação profissional dos Assistentes Sociais no Brasil e no Espírito Santo. Daí, creditamos importância a todos aqueles que insistem em revisitar esse passado, reconhecendo sua importância como processo que desencadeou uma nova postura, uma nova reflexão profissional e, consequentemente um repensar da formação profissional dos assistentes sociais, potencializando a relação do Serviço Social com as lutas e necessidades da classe subalternizada, de mobilização e de articulação. PDF created with pdfFactory trial version www.pdffactory.com 100 REFERÊNCIAS ABEPSS/CEDEPSS – Proposta básica para o projeto de formação profissional. In: Revista Serviço Social e Sociedade. São Paulo: Cortez, ano XVII, n.50, 1996. ABEPSS. Proposta básica para o projeto de formação profissional. Novos subsídios para o debate. Caderno ABESS. 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