anacosta revista médica Abril | Maio | Junho Revista Trimestral do Hospital Ana Costa - 2013 18.2 Revista Médica ISSN 1677-194X ANA COSTA Órgão Científico Oficial do Hospital Ana Costa Conselho Editorial Revista Médica Dr. Airton Zogaib Rodrigues, Santos - SP - Brasil Dr. André Vicente Guimarães, Santos - SP - Brasil Dr. Celso Afonso Gonçalves, Santos - SP - Brasil Dr. Evaldo Stanislau A. de Araújo, Santos - SP - Brasil Dr. Everson Artifon, Santos - SP - Brasil Dr. Luiz Alberto Oliveira Dallan, São Paulo - SP - Brasil Dr. Rider Nogueira de Brito Filho, Santos - SP - Brasil Dr. Rogério Aparecido Dedivitis, Santos - SP - Brasil Dr. Waldimir Carollo dos Santos, Santos - SP - Brasil Dr. Woite Antônio Bertoni Meloni, Santos - SP - Brasil Divisão de Ensino do Hospital Ana Costa Rua Pedro Américo, 60 - Campo Grande, Santos/SP, Brasil e-mail: [email protected] www.anacosta.com.br Periodicidade: trimestral Tiragem: 500 exemplares Jornalista Responsável: Lucinaira Souza (Mtb: 40.248) Produção Gráfica: Comunicação e Marketing do Hospital Ana Costa A Revista Médica Ana Costa é distribuída gratuitamente para os membros do Corpo Clínico do Hospital Ana Costa, para bibliotecas e faculdades das áreas de saúde cadastradas. É permitida a reprodução total ou parcial dos artigos dessa revista, desde que citada a fonte. Revista Médica Ana Costa, v. 18, n. 2, p. 24 - 57, abr / mai / jun 2013 Revista Médica Ana Costa / Divisão de Ensino do Hospital Ana Costa S.A. v. 18, n. 1 (jan / fev / mar 2013). Santos: Divisão de Ensino do Hospital Ana Costa S.A., 2013. 23 p. :il. Periodicidade trimestral ISSN 1677 194X 1.Ciências Médicas. 2. Medicina CDD 610 CDU 616 Revista Médica Ana Costa, v. 18, n. 2, p. 24 - 57, abr / mai / jun 2013 Normas de Publicação A Revista Médica Ana Costa é publicada trimestralmente pelo Hospital Ana Costa e aceita artigos na área de saúde. Artigos de caráter comercial não serão aceitos. Serão aceitos manuscritos originais relacionados às seguintes categorias: a) artigos originais - trabalhos resultantes de pesquisa científica, apresentando dados originais de descobertas com relação a aspectos experimentais ou observacionais, incluem análise descritiva e ou inferências de dados próprios. Sua estrutura deverá conter os seguintes itens: Introdução, Métodos, Resultados, Discussão, Conclusão e Referências; b) artigos de revisão - têm por objetivo resumir, analisar, avaliar ou sintetizar trabalhos de investigação já publicados em revistas científicas. Apresenta síntese e análise crítica da literatura levantada e não pode ser confundido com artigo de atualização; c) artigos de atualização - destinados a relatar informações geralmente atuais sobre tema de interesse para determinada especialidade, uma nova técnica ou método, por exemplo, e que têm características distintas de um artigo de revisão, visto que não apresentam análise crítica da literatura; d) relato de caso - relata casos de uma determinada situação médica especialmente rara, descrevendo seus aspectos, história, condutas, etc, incluindo breve revisão da literatura, descrição do caso e discussão pertinente. Apresenta as características do indivíduo estudado, com indicação de sexo e idade. Pode ser realizado em humano ou animal. c) indicação da instituição em que cada autor está afiliado, acompanhada do respectivo endereço; d) nome do departamento e da instituição no qual foi realizado; e) indicação do autor responsável para troca de correspondência (nome completo, endereço, telefones de contato e e-mail); f) quando houver, indicar as fontes de auxílio à pesquisa; g) se extraído de dissertação ou tese, indicar título, ano e instituição onde foi apresentada; EXEMPLOS h) se apresentado em reunião científica, indicar nome do evento, local e data de realização. Livros RESUMO - Todos os artigos submetidos deverão ter resumo em português e em inglês, com um mínimo de 150 e no máximo de 250 palavras. Para os artigos originais os resumos devem ser estruturados destacando: objetivos, métodos básicos adotados (informando local, população e amostragem da pesquisa), resultados e conclusões mais relevantes, considerando os objetivos do trabalho, e indicar formas de continuidade do estudo. Para as demais categorias, o formato dos resumos deve ser o narrativo, mas com as mesmas informações. Capítulo de Livros Discussão: deve explorar adequada e objetivamente os resultados, discutidos à luz de outras observações já registradas na literatura. A primeira página deverá conter: b) nome completo de todos os autores; Meltzer PS, Kallioniemi A, Trent JM. Chromosome alterations in human solid tumors. In: Vogelstein B, Kinzler KW, editors. The genetic basis of human cancer. New York: McGraw-Hill; 2002. p.93-113. Dissertações e Teses Silva LCB. Aspectos da fotoestimulação intermitente em pacientes com epilepsia: Teófilo Otoni [dissertação]. Campinas: Pontifícia Universidade Católica de Campinas; 2000. Attenhofer Jost CH, Connolly HM, O'Leary PW, Warnes CA, Tajik AJ, Seward JB. Left heart lesions in patients with Ebstein anomaly. Mayo Clin Proc. 2005; 80(3):3618. Trabalhos de Congressos, Simpósios, Encontros, Seminários e outros APRESENTAÇÃO DO MANUSCRITO a) título do artigo (em português e em inglês); Adolfi M. A terapia familiar. Lisboa: Editorial Veja; 1982. Artigos de periódicos TERMOS DE INDEXAÇÃO - Deverão acompanhar o resumo, um mínimo de 3 e o máximo de 5 palavraschave descritoras do conteúdo do trabalho, utilizando os descritores em Ciência da Saúde - DeCS - da Bireme. Resultados: sempre que possível, os resultados devem ser apresentados em tabelas ou figuras, elaboradas de forma a serem auto-explicativas, e com análise estatística. Evitar repetir dados no texto. Tabelas, quadros e figuras devem ser limitadas a 5 no conjunto e numerados consecutiva e independentemente, com algarismos arábicos de acordo com a ordem de menção dos dados, e devem vir em folhas individuais e separadas, com indicação de sua localização no texto. O autor responsabiliza-se pela qualidade de desenhos, ilustrações e gráficos, que devem permitir redução sem perda de definição. Sugere-se impressão de alta qualidade. Ilustrações coloridas não são publicadas, a não ser que sejam custeadas pelos autores. PÁGINA DE TÍTULO A exatidão das referências é de responsabilidade dos autores. Citações bibliográficas no texto: deverão ser colocadas em ordem numérica, em algarismos arábicos, sobrescrito, após a citação e devem constar da lista de referências. SUBMISSÃO DOS ARTIGOS A submissão dos artigos à Revista Médica Ana Costa implica transferência dos direitos autorais da publicação. Os trabalhos submetidos devem ser originais e acompanhados por uma declaração dos autores de que o trabalho não será publicado em qualquer outra revista no formato impresso ou eletrônico. Os trabalhos serão avaliados por pelo menos dois revisores, em procedimento sigiloso quanto a identidade tanto do(s) autor(es) quanto dos revisores. Todo trabalho que envolva estudo em seres humanos deverá apresentar a carta de aprovação de Comitê de Ética e Pesquisa registrado no CONEP. Caso haja utilização de ilustrações, fotografias e tabelas devem ser de boa qualidade e marcadas no verso somente com o número da figura e o título do trabalho. As legendas devem ser impressas em folhas separadas. Modelo da carta de submissão Título do Artigo: Considerando a aceitação do trabalho acima, o(s) autor(es) abaixo assinado(s) transfere(m) para a Revista Médica Ana Costa, todos os direitos autorais do artigo mencionado, sendo vedada qualquer reprodução total ou parcial em outro meio de divulgação. Declara(m) que o presente trabalho é original, sendo que seu conteúdo não foi ou está sendo considerado para publicação em outro periódico, quer no formato impresso ou eletrônico. Data: Assinatura (s) Os originais deverão ser enviados para o Hospital Ana Costa - Divisão de Ensino, rua Pedro Américo, 60 - 10º andar, CEP 11075-905, Santos/SP, Brasil. Enviar os manuscritos à Revista Médica Ana Costa em duas cópias, impressos em papel sulfite A4, preparados em espaço duplo, com fonte Times New Roman, tamanho 12. Após as correções sugeridas pelos revisores, a forma definitiva do trabalho deverá ser encaminhada em uma via impressa e em disquete 3 ½” ou em CD-ROM. Os originais não serão devolvidos. primeiros autores seguido de et al. As abreviaturas dos títulos dos periódicos citados deverão estar de acordo com o Index Medicus. ESTRUTURA DO TEXTO Introdução: deve conter revisão da literatura atualizada e pertinente ao tema, adequada à apresentação do problema e que destaque sua relevância. Não deve ser extensa, a não ser em manuscritos submetidos como Artigo de Revisão. Metodologia: deve conter descrição clara e sucinta, acompanhada da correspondente citação bibliográfica, dos seguintes itens: · procedimentos adotados; Harnden P, Joffe JK, Jones WG, editors. Germ cell tumours V. Proceedings of the 5th Gern Cell Tumour Conference; 2001 Sep 13-15; Leeds, UK. New York: Springer; 2002. Material eletrônico Periódicos eletrônicos, artigos Sabbatini RME. A história da terapia por choque em psiquiatria. Cérebro & Mente [periódico online] dez. 1997/fev. 1998 [Acesso em 12 ago. 2000]; (4). Disponível em: · universo e amostra; http://www.epub.org.br/cm/n04/historia/shock.htm · instrumentos de medida e, se aplicável, método de validação, Monografia em um meio eletrônico · tratamento estatístico. São Paulo (Estado). Secretaria do Meio Ambiente. Entendendo o meio ambiente [monografia online]. São Paulo; 1999. [Acesso em: 8 mar. 1999]; v.1. Disponível em: http://www.bdt.org.br/sma/entendendo/atual.htm Anexos e/ou Apêndices: incluir apenas quando imprescindíveis à compreensão do texto. Caberá à Comissão Editorial julgar a necessidade de sua publicação. Abreviaturas e Siglas: deverão ser utilizadas de forma padronizada, restringindo-se apenas àquelas usadas convencionalmente ou sancionadas pelo uso, acompanhadas do significado por extenso quando da primeira citação no texto. Não devem ser usadas no título e no resumo. Conclusão: apresentar as conclusões relevantes, considerando os objetivos do trabalho, e indicar formas de continuidade do estudo. Se incluídas na seção Discussão, não devem ser repetidas. Agradecimentos: podem ser registrados agradecimentos, em parágrafo não superior a três linhas, dirigidos a instituições ou indivíduos que prestaram efetiva colaboração para o trabalho. Referências: devem ser numeradas consecutivamente na ordem em que foram mencionadas a primeira vez no texto, baseadas no estilo Vancouver. A ordem de citação no texto obedecerá esta numeração. Nas referências com 2 até o limite de 6 autores, citam-se todos os autores; acima de 6 autores, citam-se os 6 Revista Médica Ana Costa, v. 18, n. 2, p. 24 - 57, abr / mai / jun 2013 Índice / Contents Artigo Original Uso de medicina alternativa em pacientes oncológicos de cabeça e pescoço...........................................................24 Use of alternative medicine in patients with head and neck cancer Julia de Oliveira Cordeiro. Talyta de Sousa Rodriguez Doratiotto, Bruna Gonçalves, Raquel Rodrigues Kierdeika, André Vicente Guimarães e Rogério Aparecido Dedivitis O perfil dos casos de neutropenia em serviço de Oncologia........................................................................................27 The profile of the cases of neutropenia in an Oncology department Gabriela De Luca Oliveira, Ana Paula Carvalho Odoni e Sueli Monterroso da Cruz Relato de Caso Doença de Wilson (degeneração hepatolenticular)........................................................................................................30 Wilson's disease (hepatolenticular degeneration) Nayara Zortéa Lima e Cristiane Serra O desafio diagnóstico do sarampo nos dias atuais........................................................................................................32 The diagnostic challenge of the measles in the current days José Breno de Sousa Neto e Gelvana Flávio Barreto Reis Reestenose coronária intra-stent farmacológico............................................................................................................34 Drug-eluting stent restenosis Amanda Evelyn Andrade Rocha e Rider Nogueira de Brito Filho Atresia de Vias Biliares......................................................................................................................................................37 Biliary atresia Ana Nadyr de Almeida David Gibelli e Ana Cristina Martinez Carvalho Associação entre melanoma e síndrome de Kipplel-Trenaunay....................................................................................40 Association between melanoma and Klippel-Trenaunay syndrome Ana Paula de Carvalho Odoni Rocha e Sueli Monterroso da Cruz Fibrose cística.....................................................................................................................................................................42 Cystic fibrosis Cynthia Aparecida da Silva Rocha e Waldimir Carollo Estenose de artéria renal...................................................................................................................................................45 Renal artery stenosis Nastri Castro, Rodolfo Leite Arantes e Leonardo Martins Barroso Tumor carcinóide................................................................................................................................................................48 Carcinoid tumor Rebeca Mariá Lopes Grezos e Sueli M. da Cruz Artigo de Revisão Como objetos utilizados por profissionais da saúde podem ser veículos de disseminação de microrganismos multi-resistentes...............................................................................................................................51 How objects used by health sector professionals might serve as vehicles of dissemination of multiresistant microorganisms Cynthia Aparecida da Silva Rocha e Waldimir Carollo Psoríase – atualizações terapêuticas...............................................................................................................................54 Psoriasis – therapeutic update Taísa Ferreira Braga e Valéria Fagacho Galvão Revista Médica Ana Costa, v. 18, n. 2, p. 24 - 57, abr / mai / jun 2013 Artigo Original Uso de medicina alternativa em pacientes oncológicos de cabeça e pescoço Use of alternative medicine in patients with head and neck cancer Julia de Oliveira Cordeiro1 Talyta de Sousa Rodriguez Doratiotto1 1 Bruna Gonçalves 1 Raquel Rodrigues Kierdeika 2 André Vicente Guimarães Rogério Aparecido Dedivitis3. RESUMO ABSTRACT Introdução: o uso de medicina complementar ou alternativa (MAC) é crescente entre os pacientes com câncer. Objetivo: avaliar o uso de medicina alternativa em pacientes oncológicos de cabeça e pescoço e as razões para tal uso. Métodos: estudo retrospectivo, feito por meio de questionário. Foram incluídos 158 pacientes portadores de câncer de cabeça ou pescoço, sendo 96 homens (60,7%). Resultados: de 158 pacientes, 136 fazem ou fizeram uso de medicina alternativa (86,1%). Desses 136 pacientes, 83,8% alegam o uso como tratamento antineoplásico; 75% para melhorar os sintomas da doença; e 54,4% para melhorar o efeito colateral dos tratamentos convencionais. Foram utilizados: terapia espiritual (83,8%); ervas medicinais (25%); chá (19,1%); soja (8,8%); entre outros. Conclusão: 86,1% dos pacientes fizeram uso de medicina alternativa, com destaque para terapia espiritual. Introduction: The use of complementary or alternative medicine has been increasing among patients with cancer. Objective: To evaluate the use of alternative medicine in patients with head and neck cancer and that led them to resort to this. Methods: Retrospective study performed through a questionnaire, including 158 patients with head and neck cancer, being 48 men (60.7%). Results: Out of 158 patients, 136 used alternative medicine (86.1%). Of these 136 patients, 83.8% referred to use them as antineoplastic treatment, 75% to improve the symptoms of the disease, and 54.4% to improve the side effect of conventional treatment. The following approaches were employed: spiritual therapy (83.8%); herbs (25%); tea (19.1%); soybeans (8.8%); among others. Conclusion: A rate of 86.1% of patients used alternative medicine, with emphasis on spiritual therapy. Descritores: Câncer da Cabeça e Pescoço; Câncer; Medicina Complementar; Medicina Alternativa. Key words: Head and Neck Neoplasms. Cancer. Complementary Medicine. Alternative Medicine. Introdução O uso de medicina alternativa ou complementar (MAC) é crescente entre os pacientes com câncer1. MAC e os cuidados paliativos são dois grandes movimentos sociais que se têm fortalecido e capturaram a atenção do público e da profissão médica na década passada2. Como a associação entre seu uso e a qualidade de vida em pacientes com câncer não foi muito bem estudada3 há a necessidade de investigação baseada em evidências dos vários tipos de MAC e terapias atualmente oferecidas aos pacientes4. Estudos revelam que as principais fontes de informação sobre MAC foram os amigos (65%), família (48%) e meios de comunicação (21%)4. Quarenta e seis por cento dos pacientes acreditam que a medicina convencional é melhor que a alternativa; 32% acham que ambos os tratamentos são igualmente eficazes; 5% acreditam que a MAC é a melhor opção; e 1% diz que ambos são igualmente ineficazes3. Cerca de 43% dos canadenses acredita que MAC são melhores do que os medicamentos convencionais e apenas cerca de 14% acreditam que podem ser prejudiciais5. Pacientes com câncer que usam tal abordagem são, geralmente, mais jovens, do sexo feminino e mais graduados do que os que não usam6. Tem havido um crescimento exponencial no interesse e no uso das MAC, principalmente em países ocidentais desenvolvidos. A literatura indica também que, em países em desenvolvimento e pobres, as medicinas não convencionais são elemento significativo no tratamento7. Os profissionais de saúde deveriam explorar seu uso em seus pacientes com câncer, educá-los sobre terapias potencialmente benéficas à luz das evidências disponíveis de eficácia limitada e trabalhar para um modelo integrado de cuidados de saúde à disposição8. Já os pacientes utilizaram MAC para uma variedade de razões em conjunto, com a melhora dos efeitos do câncer e seu tratamento sendo o mais comum9. O objetivo deste estudo é avaliar o uso de medicina alternativa em pacientes oncológicos de cabeça e pescoço e as razões para tal uso. Métodos O presente estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da instituição onde foi realizado sob o número 007-2011. Foram entrevistados 138 pacientes, dos quais 31 eram mulheres e 48 homens. Foram incluídos todos pacientes com câncer de cabeça e pescoço avaliados consecutivamente no ambulatório da instituição e foram excluídos os menores de 18 anos. As entrevistas foram por meio de questionário, contendo com os 1) Acadêmica de Medicina da Universidade Metropolitana de Santos UNIMES, Santos/SP. 2) Doutor em Medicina pelo Curso de Clínica Cirúrgica da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo USP. Assistente do Serviço de Cirurgia de Cabeça e Pescoço do Hospital Ana Costa, Santos/SP e da Disciplina de Otorrinolaringologia e Cirurgia de Cabeça e Pescoço da Universidade Metropolitana de Santos UNIMES, Santos/SP. 3) Professor Livre Docente. Supervisor do Grupo de Laringe e Hipofaringe da Disciplina de Cirurgia de Cabeça e Pescoço do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo USP. Chefe do Serviço de Cirurgia de Cabeça e Pescoço do Hospital Ana Costa, Santos/SP e Professor Titular da Disciplina de Iniciação Científica da Universidade Metropolitana de Santos UNIMES, Santos/SP. Instituição: Disciplina de Otorrinolaringologia e Cirurgia de Cabeça e Pescoço da Universidade Metropolitana de Santos. Correspondência: Rua Dr. Olinto Rodrigues Dantas, 343 conj. 92 – 11050-220 Santos/SP, Brasil. E-mail: [email protected] Recebido em: 01/09/2012; aceito para publicação em: 23/2012; publicado online em:30/05 /2013. Conflito de interesse: nenhum. Fonte de fomento: nenhuma. 24 Revista Médica Ana Costa, v. 18, n. 2, p. 24 - 26, abr / mai / jun 2013 dados de identificação do paciente (gênero, idade, escolaridade), dados sobre o tumor (estadiamento clínico), perguntas sobre o uso da MAC (se era feito o uso ou não e quais os tipos utilizados) e o motivo de terem feito tal uso (se era como tratamento antineoplásico, para melhorar os sintomas da doença ou para melhorar os efeitos colaterais dos tratamentos). Resultados Dos 138 pacientes entrevistados, 68 fizeram uso de MAC (86,1%) e 11 não o fizeram (13,9%). Das 31 mulheres 90,3% faziam uso e 9,7% não. Dentre os 48 homens, 83,3% já utilizaram e 16,7% não. Quanto às razões para tal uso, 83,8% utilizaram como tratamento antineoplásico, 75% para melhorar os sintomas da doença e 54,4% para melhorar os efeitos colaterais dos tratamentos. Os tipos mais utilizados foram terapia espiritual com 83,8%, seguido das ervas medicinais com 25% - Tabela 1. Tabela 1 – Ocorrência de uso de medicação alternativa e complementar em pacientes com câncer de cabeça e pescoço (n = 138). Tipo de terapia Ocorrência (%) Terapia espiritual 83,8 Ervas medicinais 25 chá 19,1 Soja e alho 8,8 Polivitamínicos, pomadas e complexo B 7,3 Massagem, gengibre e vinagre 5,9 Ômega 3, compressa e limão 4,4 Graviola, gingko biloba e terapia de grupo 2,9 Vitamina E, gel de girassol, própolis, psicólogo, dança, cápsula de 1,5 guaraná, meditação, Aloe vera, echinácea e reiki Discussão Esse estudo aborda o uso de MAC especificamente para portadores de câncer de cabeça e pescoço, que leva à debilitação na vida cotidiana, mutilação pelo tratamento cirúrgico e alteração da imagem corporal, além dos efeitos da radioterapia. A MAC é popular entre os pacientes com câncer, com uma média de 35,9% dos pacientes utilizando alguma forma de MAC, variando de 14,8% na Grécia até 73,1% que fazem uso na Itália8. Nossos resultados apresentam 86,1% dos pacientes utilizando algum tipo de MA, uma taxa mais alta até que o apresentado pela Itália. Em outra série, 34,3% das mulheres utilizaram MAC e apenas 16,2% dos homens4, contrapondo-se aos nossos 90,3% das mulheres que fizeram uso e 83,3% dos homens. Quanto à percepção dos pacientes sobre a doença, os usuários de MAC percebem maior risco de óbito ou retorno da doença. Assim, o uso dessa modalidade relaciona-se ao grau de ansiedade e depressão7. Pacientes portadores de câncer que utilizam MAC demonstram significativa melhora de sua condição psicológica quando comparado a não usuários10, podendo ter importância, especialmente, no contexto dos cuidados paliativos e de suporte. Uma variedade de razões para seu uso foi relatada, sendo os efeitos colaterais a razão mais comum. Um significativo menor número de pacientes referiu benefícios em relação a tais sintomas11. Tal recurso pode ainda ser usado para a motivação dos pacientes, com a finalidade de aumentar sua esperança e otimismo em face de uma doença devastadora9. Estudo realizado na Escócia revelou que o método mais utilizado é o óleo de fígado de bacalhau, com 43,5%, seguido do óleo de prímula com 23,2%, da massagem com 21,7% e do alho com 20,3%12. Outro trabalho, da Inglaterra, mostra que as ervas medicinais foram as mais usadas, com 47,1%9. Em nosso meio, os pacientes fizeram mais uso de terapia espiritual com 83,8%, seguido das ervas medicinais com 25%, dos chás (19,1%) e soja/alho (8,8%). Também na Inglaterra é relatado o uso de terapias espirituais, a oração como uma terapia, massagem, uso Revista Médica Ana Costa, v. 18, n. 2, p. 24 - 26, abr / mai / jun 2013 de cartilagem de tubarão, chá verde, grupos de apoio e dietas não tradicionais8. A exemplo de nossa série, estudo realizado em Houston, Texas, mostrou que a principal opção de MAC são as abordagens espirituais. Em seguida, vêm vitaminas e ervas. Em estudo canadense, um total de 58,4% de pacientes relatou ter feito o uso de MAC como tratamento anti-câncer ou para fornecer alívio sintomático para o câncer ou seu tratamento14. Nossos relatos mostraram que 83,8% dos pacientes utilizaram-na como tratamento antineoplásico, 75% para alívio dos sintomas da doença e 54,4% para melhorar os efeitos colaterais dos tratamentos convencionais. Como certas MAC podem interagir com medicações convencionais, é importante que os profissionais da saúde conheçam o uso de tais terapias. Um estudo mostrou que somente 50% dos pacientes haviam informado o médico generalista sobre o uso de MAC. Frequentemente os pacientes consideram que MAC são remédios separados e distintos e não reconhecem seus potenciais efeitos colaterais. Muitos produtos são considerados “naturais” e, portanto, potencialmente seguros e menos tóxicos do que a medicação convencional. Médicos habitualmente perguntam sobre o uso de medicações prescritas sob uso pelos pacientes, mas é extremamente incomum indagarem sobre o emprego de MAC. Por sua vez, raramente os pacientes citam tal uso de forma livre e espontânea e alguns ainda se sentem embaraçados em fazê-lo12. De modo geral, os pacientes percebem seu uso de maneira positiva, como sendo úteis e não tóxicas, acreditando propiciar mudança no estilo e qualidade de vida e favorecendo a evolução da doença15. Apesar de a maioria dos participantes de um estudo (96%)13 negar efeitos adversos, o risco potencial da interação droga-erva-vitamina existe e indica a necessidade de maior comunicação por parte do médico e maior confiança nas informações prestadas pelo paciente. Ervas e vitaminas podem mascarar ou distorcer os efeitos do tratamento convencional. Conclusão A maioria dos pacientes com câncer de cabeça e pescoço faz uso de algum tipo de MAC (86,1%), sendo a terapia espiritual a mais utilizada com um percentual bem acima das outras – 83,8% dos que fazem uso. Tanto as mulheres quanto os homens fazem muito uso de MA, sendo as mulheres as que mais utilizam (90,3% VS. 83,3%). O principal motivo que leva os pacientes oncológicos de cabeça e pescoço a utilizarem a MAC é como tratamento antineoplásico (83,8%). Referências 1. Talmi YP, Yakirevitch A, Migirov L, Horowitz Z, Bedrin L, Simon Z, Pfeffer MR. Limited use of complementary and alternative medicine in israeli head and neck cancer patients. Laryngoscope. 2005;115(8):1505- 08. 2. Pan CX, Morrison RS, Ness J, Fugh-Berman A, Leipzig RM. Complementary and alternative medicine in the management of pain, dyspnea, and nausea and vomiting near the end of life. A systematic review. J Pain Symptom Manage. 2000;20(5):374-87. 3. Chow WH, Chang P, Lee SC, Wong A, Shen HM, Verkooijen HM. Complementary and alternative medicine among Singapore cancer patients. Ann Acad Med Singapore. 2010;39(2):129-35. 4. Amin M, Glynn F, Rowley S, O'Leary G, O'Dwyer T, Timon C, Kinsella J. Complementary medicine use in patients with head and neck cancer in Ireland. Eur Arch Otorhinolaryngol. 2010;267(8):1291-7. 5. Vyas T, Hart RD, Trites JR, Philips TJ, Archibald KE, Phillips JE, Taylor SM. Complementary and alternative medicine use in patients presenting to a head and neck oncology clinic. Head Neck. 2010;32(6):793-9. 6. Shumay DM, Maskarinec G, Gotay CC, Heiby EM, Kakai H. Determinants of the degree of complementary and alternative medicine use among patients with cancer. J Altern Complem Med. 2002;8(5):661-71. 7. Spadacio C, Barros NF. Uso de medicinas alternativas e complementares por pacientes com câncer: revisão sistemática. Rev Saúde Públ. 2008;42(1):158-64. 8. Molassiotis A, Fernadez-Ortega P, Pud D, Ozden G, Scott JA, Panteli V, Margulies A, Browall M, Magri M, Selvekerova S, Madsen E, Milovics L, Bruyns I, Gudmundsdottir G, Hummerston S, Ahmad AM, Platin N, Kearney N, Patiraki E. Use of complementary and alternative medicine in cancer patients: a European survey. Ann Oncol. 2005;16(4):655-63. 9. Molassiotis A, Ozden G, Platin N, Scott JA, Pud D, Fernandez-Ortega P, Milovics L, Panteli V, Gudmundsdottir G, Browall M, Madsen E, Patiraki E, 25 Kearney N. Complementary and alternative medicine use in patients with head and neck cancers in Europe. Eur J Cancer Care (Engl). 2006;15(1):19-24. 10. Gilbar O, Iron G, Goren A. Adjustment to illness of cancer patients treated by complementary therapy along with conventional therapy. Patient Educ Couns. 2001;44(3):243-9. 11. Swisher EM, Cohn DE, Goff BA, Parham J, Herzog TJ, Rader JS, Mutch DG. Use of complementary and alternative medicine among women with gynecologic cancers. Gynecol Oncol. 2002;84(3):363-7. 12. Shakeel M, Newton JR, Bruce J, Ah-See KW. Use of complementary and alternative medicine by patients attending a head and neck oncology clinic. J Laryngol Otol. 2008;122(12):1360-4. 13. Richardson MA, Sanders T, Palmer JL, Greisinger A, Singletary SE. Complementary/alternative medicine use in a comprehensive cancer center and the implications for oncology. J Clin Oncol. 2000;18(13):250514. 14. Warrick PD, Irish JC, Morningstar M, Gilbert R, Brown D, Gullane P. Use of alternative medicine among patients with head and neck cancer. Arch Otolaryngol Head Neck Surg. 1999;125(5):573-9. 15. Algier LA, Hanoglu Z, Ozden G, Kara F. The use of complementary and alternative (non-conventional) medicine in cancer patients in Turkey. Eur J Oncol Nurs. 2005;9(2):138-46. 26 Revista Médica Ana Costa, v. 18, n. 2, p. 24 - 26, abr / mai / jun 2013 Artigo original O perfil dos casos de neutropenia em serviço de Oncologia The profile of the cases of neutropenia in an Oncology department Gabriela De Luca Oliveira1 Ana Paula Carvalho Odoni2 3 Sueli Monterroso da Cruz RESUMO Introdução: a neutropenia febril é uma complicação frequente e grave após administração de medicamentos quimioterápicos em pacientes oncológicos. Assim conhecer melhor as características desses pacientes torna-se importante. Objetivo: Traçar o perfil dos pacientes assistidos pelo Serviço de Oncologia do Hospital Ana Costa que desenvolveram neutropenia após administração de quimioterapia. Métodos: trata-se de estudo descritivo retrospectivo com coleta de dados a partir de consulta em prontuário de pacientes oncológicos que fizeram quimioterapia e desenvolveram neutropenia sendo assistidos no Hospital Ana Costa de Santos no período correspondente ao ano de 2011. Resultados: Foram registrados 47 episódios de neutropenia, dos quais 34% evoluíram com febre. A idade foi em média de 59,14 anos, sendo 68% do sexo feminino. As hemoculturas vieram positivas em 18,25% dos casos, com predomínio de Gram negativos. A internação durou em média 6,9 dias. 25% dos pacientes evoluíram para óbito, desses 75% eram maiores de 60 anos e 50% apresentaram hemoculturas positivas. ABSTRACT Introduction: Neutropenia and febrile neutropenia are common consequences of some cytotoxic chemotherapy regimens. Therefore, understanding the characteristics of these patients become important. Objective: To describe the profile of patients evaluated at the Oncology Clinic of Hospital Ana Costa who developed neutropenia after chemotherapy. Methods: This was a retrospective review of medical records of patients with cancer and Chemotherapy-induced neutropenia. They were followed at Ana Costa hospital during the year 2011. Results: There were 47 episodes of neutropenia, of which 34% developed fever. The age averaged was 59.14 years. 68% of patients were female. Blood cultures came positive in 18.25% of cases, with a predominance of Gram negative. The hospitalization lasted on average 6.9 days. 25% of patients died, of whom 75% were older than 60 years and 50% had positive blood cultures. Keywords: Neutropenia. Fever. Chemotherapy. Descritores: Neutropenia. Febre. Quimioterapia. Introdução A neutropenia febril é uma complicação frequente nos pacientes em tratamento quimioterápico¹. É caracterizada pela contagem de neutrófilos abaixo de 500/mm3 ou entre 500-1000/mm3 com tendência a queda, associada a temperatura axilar maior que 37,8oC². Devido ao alto risco de evolução para um quadro séptico e a possibilidade de óbito, a neutropenia febril é considerada uma emergência clínica. Portanto, é necessário o seu pronto reconhecimento e a introdução rápida de medicação adequada, incluindo antibioticoterapia de amplo espectro³. Dessa forma, é importante conhecer os aspectos que envolvem a ocorrência desse evento para poder melhor amparar os pacientes acometidos. Esse trabalho tem por objetivo traçar o perfil dos casos de neutropenia pós-quimioterapia nos pacientes oncológicos, avaliar aqueles que evoluíram com febre e mostrar a experiência do Serviço de Oncologia do Hospital Ana Costa, Santos, no manejo desses casos. Métodos Trata se de um estudo descritivo retrospectivo com coleta de dados a partir de consulta em prontuário de pacientes oncológicos que fizeram quimioterapia e desenvolveram neutropenia sendo assistidos pelo Serviço de Oncologia do Hospital Ana Costa, Santos, no período correspondente ao ano de 2011. Inicialmente, com ajuda dos resultados de exames armazenados pelo laboratório de patologia clínica, separamos os pacientes com neutropenia <1000/mm3. Em seguida, coletamos os dados de interesse pesquisando os prontuários dos casos previamente separados. Por fim, traçamos o perfil desses pacientes comparando – os com a literatura médica. Foram analisados um total de 47 pacientes quanto ao valor da neutropenia, sexo e idade, o tipo de tumor, a quimioterapia e a data em que foi realizada, as hemoculturas, a temperatura axilar e o desfecho do caso. Resultados Foram analisados 47 pacientes que apresentaram neutropenia durante o ano de 2011, dos quais 34% tiveram concomitantemente temperatura axilar maior ou igual a 37,8ºC. A idade variou de 28 a 80 anos, com a média de 59,14 anos. 68% dos casos eram compostos por mulheres e 32% por homens – Tabela 1. 1. Residente de Clínica Médica do Hospital Ana Costa, Santos /SP 2. Estagiária de Oncologia Clínica do Hospital Ana Costa, Santos /SP 3. Chefe do Serviço de Oncologia Clínica do Hospital Ana Costa, Santos /SP Instituição: Serviço de Oncologia Clínica do Hospital Ana Costa, Santos /SP Correspondência: Gabriela De Luca Oliveira, Av. Dr. Epitácio Pessoa, 131 110 -45-301 Santos/SP. E-mail: [email protected] Recebido em: 01/11/2012; aceito para publicação em: 28 /2013; publicado online em:30/05 /2013. Conflito de interesse: nenhum. Fonte de fomento: nenhuma. Revista Médica Ana Costa, v. 18, n. 2, p. 27 - 29, abr / mai / jun 2013 27 Tabela 1- Dados demográficos dos pacientes neutropênicos. Dados Neutropenia < 1000/mm³ Idade 59,14 (28-80) 50% apresentaram hemoculturas positivas. As neoplasias presentes nesses pacientes eram de mama, de orofaringe e de ovário – Tabela 4. Tabela 4 - Características relacionadas à mortalidade nos pacientes com neutropenia febril. Sexo masculino 68% Característica Total (%) Mortalidade (%) Sexo feminino <60 anos 38,30 25 >61anos 61,70 75 Hemoculturas + 18,75 50 Neoplasia mama 32 50 Neoplasia orofaringe 2,1 25 Neoplasia de ovário 4,25 25 Neoplasia de cólon 14,9 0 Neoplasia de pulmão 14,9 0 Neutropenia Neoplasia de esôfago 4,25 0 Neoplasia de útero 2,1 0 Neoplasia de testículo 6,4 0 Neoplasia de bexiga 4,25 0 32% As hemoculturas vieram negativas em 81,25% dos casos de neutropenia febril. Foram encontrados patógenos Gram positivos em 6,25% e Gram negativos em 12,5% dos pacientes. Foi somado o total de 18,25% de hemoculturas positivas, desses 67% tinham neutropenia menor que 100 células/mm³ e 33% menor que 500/mm³ – Tabela 2. Tabela 2- Hemocultura relacionada à intensidade de neutropenia nos pacientes com neutropenia febril. Hemocultura Neutropenia 500- Neutropenia 500- 1000/mm³ 100/mm³ <100/mm³ Negativa 38,5% 38,5% 23% Positiva 0% 67% 33% A duração da internação foi em média 6,9 dias para os pacientes com neutropenia febril. Na maior parte dos casos a neutropenia ocorreu em 8,4 dias após o tratamento quimioterápico. A intensidade da neutropenia foi comparada ao tipo de quimioterapia – Tabela 3. Neoplasia de partes moles 2,1 0 Neoplasia de Vias biliares 2,1 0 Neoplasia de pâncreas 4,25 0 Neoplasia gástrica 6,4 0 Tabela 4 - Quimioterapia relacionada à intensidade da neutropenia Quimioterapia Neutropenia 500- Neutropenia 500- Neutropenia 1000/mm³ 100/mm³ <100/mm³ Taxol 100% 0% 0% Adriamicina 33% 0% 67% Taxotere 67% 33% 0% Xeloda 100% 0% 0% Taxol 50% 50% 0% 57% 14% 29% Folfori 67% 33% 0% Etoposídeo 57% 28% 15% 0% 0% 100% Folfox 75% 25% 0% Gemzar 100% 0% 0% Carbaplatina 100% 0% 0% Cisplatina Ciclofosfamida Carbaplatina Gencitabina Cisplatina Cisplatina Ciclofosfamida Doxorrubicina Oncorin Todos os pacientes que eram apenas neutropênicos apresentaram melhora clínica, enquanto 25% dos que além de neutropenia também tiveram febre evoluíram para óbito. Dos pacientes que tiveram como desfecho o óbito, 75% eram maiores de 60 anos e 28 Discussão O número de pacientes oncológicos aumentou de maneira considerável em todo o mundo4. Sendo a neutropenia uma complicação frequente do tratamento quimioterápico desses casos5. De maneira geral, esses pacientes constituem uma população heterogênea6. Nesse estudo, a idade variou de 28 a 80 anos, porém houve predominância do sexo feminino. O total de hemoculturas positivas foi de 18,25% de acordo com o esperado para pacientes neutropênicos que é de 11% a 38%7. Contudo, houve o predomínio de gram negativos diferente da tendência norte americana que é o aumento de infecções por gram positivos7. Foi observado que a maior parte das hemoculturas positivas foi proveniente de pacientes com neutropenia entre 500100/mm³. De maneira geral, os pacientes portadores de neutropenia febril ficam de 6 a 8 dias internados8. O período de hospitalização no Ana Costa foi de 6,9 dias em média. No dia 8,4 após o tratamento quimioterápico ocorreu a maior parte das neutropenias febris. A incidência de neutropenia febril depende, entre outros fatores, da intensidade da quimioterapia8. Os esquemas que geraram neutropenias mais importantes foram a associação de Adriamicina, Cisplatina, Ciclofosfamida e de Doxorrubicina,Ciclofosfamida e Oncorin. A mortalidade de 25% dos pacientes que apresentaram neutropenia febril está acima da média que é 10% dos casos9. O desfecho de óbito esteve mais associado a pacientes mais velhos, pois 75% eram maiores que 60 anos e às hemoculturas positivas9. Geralmente os tumores de mama apresentam menores taxas de mortalidade e nos de pulmão observam-se a maiores taxas de mortalidade9. Porém nesse estudo os casos de óbito foram constatados em pacientes portadores de câncer de mama, de Revista Médica Ana Costa, v. 18, n. 2, p. 27 - 29, abr / mai / jun 2013 orofaringe e de ovário. O Serviço de Oncologia do Hospital Ana Costa, reconhecendo a importância do tratamento precoce dos casos de neutropenia febril, deixou a disposição dos médicos responsáveis pela internação desses pacientes um protocolo para utilização precoce de antiboticoterapia de amplo espectro e a solicitação de exames para melhor avalição do quadro. Assim a população será melhor assistida. Referências 1. Wingard JR. Diagnostic approach to the adult presenting with neutropenic fever. Uptodate. [periódico online] 2012 [citado 2012 Set 22]; Disponível em: URL: http://www.uptodate.com 2. Pracchia LF, Costa SF. Neutropenia Febril. In: Martins HS, Brandão RA, Scalabrini A, Velasco IT. Emergências clínicas. Barueri: Manole; 2012. p.857-66. 3. Freifeld AG, Bow EJ, Sepkowitz KA, Boeckh MJ, Ito JI, Mullen CA. Clinical practice guideline for the use of antimicrobial agents in neutropenic patients with cancer: 2010 update by the infectious diseases society of america. Clin Infect Dis. [periódico online] 2011[citado 2012 Out 15]; 52(4). Disponível em:http://www.uphs.upenn.edu/bugdrug/antibiotic_manual/idsaneutropen icfever2010.pdf 4. Guerra MR, Moura GCV, Mendonça GAS. Risco de câncer no Brasil: tendências e estudos epidemiológicos mais recentes. Rev Bras Cancerol. [periódico online] 2005 [citado 2012 Set 20]; 51(3). Disponível em: URL: http://www.eteavare.com.br/arquivos/81_392.pdf 5. Bellesso M, Costa SF, Chamone DAF, Llacer PED. Triagem para o Revista Médica Ana Costa, v. 18, n. 2, p. 27 - 29, abr / mai / jun 2013 tratamento ambulatorial da neutropenia febril. Rev Bras Hematol Hemoter. [periódico online] 2010 [citado 2012 Set 17]; 32(5). Disponível em: URL: 6. Klastersky J, Paesmans M, Rubenstein EB, Boyer M, Elting L, Feld R, Gallagher J, Herrstedt J, Rapoport B, Rolston K, Talcott J. The Multinational Association for Supportive Care in Cancer risk index: A multinational scoring system for identifying low-risk febrile neutropenic cancer patients. J Clin Oncol. 2000;18(16):3038-51. 7. , Seifert H, , Edmond MB. Current trends in the Epidemiology of nosocomial bloodstream infections in patients with hematological malignancies and solid neoplasms in Hospitals in the United States. Clin Infect Dis. [periódico online] 2003[citado 2012 Out 15] 36(9). Disponível em: http://cid.oxfordjournals.org/content/36/9/1103.long 8. Penack O, Buchheidt D, Christopeit M, Lilienfeld-Toal M, Massenkeil G, Hentrich M. Management of sepsis in neutropenic patients: guidelines from the infectious diseases working party of the German Society of Hematology and Oncology. Ann Oncol. [periódico online] 2011 [citado 2012 Out 17]; 22(5). Disponível em: URL: http://annonc.oxfordjournals.org/content/early/2010/10/31/annonc.mdq442 .full.pdf+html 9. Kuderer NM, Dale DC, Crawford J, Cosler LE, Lyman GH. Mortality, morbidity, and cost associated with febrile neutropenia in adult cancer patients. Cancer. [periodic online] 2006 [citado 2012 Out 22]; 106(10). Disponível em: URL: http://onlinelibrary.wiley.com/doi/10.1002/cncr.21847/pdf 29 Relato de caso Doença de Wilson (degeneração hepatolenticular) Wilson's disease (hepatolenticular degeneration) Nayara Zortéa Lima1 Cristiane Serra2 RESUMO Introdução: doença de Wilson (degeneração hepatolenticular) é uma desordem de caráter autossômico recessivo, caracterizado por acúmulo de cobre no organismo, especialmente no fígado, cérebro, rins e córneas, podendo ter diversas manifestações clínicas. O excesso de cobre no cérebro leva à lesão tecidual e, por fim, quando não se institui um tratamento efetivo, conduz à morte. Relato de caso: segue um relato de caso, assistido no Hospital Ana Costa, de paciente jovem que estava recebendo tratamento apenas dos sintomas psiquiátricos até desenvolver distonia extrema por impregnação de cobre em núcleos da base cerebral bilateral. ABSTRACT Introduction: Wilson´s disease (hepatolenticular degeneration) is an autosomal recessive disorder, characterized by accumulation of copper in the body, especially in the liver, kidney and brain as corneas, which can have various clinical manifestations. The excess copper in the brain leads to tissue injury and finally, when not establishing an effective treatment, leads to death. Case report: It is reported a case, of young patient who was receiving only treatment of psychiatric symptoms until developing extreme dystonia by copper compounds in brain bilateral basal ganglia assisted in the Hospital Ana Costa. Key words: Hepatolenticular Degeneration. Copper. Descritores: Cobre. Doença Hepatolenticular. Introdução A doença de Wilson (DW), degeneração hepatolenticular, é distúrbio do metabolismo do cobre em nível hepático, hereditário, de caráter autossômico recessivo, não ligado ao sexo, ocorrendo igualmente em homens e mulheres, sendo necessários dois genes defeituosos que foram mapeados no cromossomo 13 e nomeados ATP7B. Estes, provavelmente, codificam uma ATPase transportadora de cobre. Pessoas com apenas um gene defeituoso são carreadoras, mas não portadoras da doença e não necessitam de tratamento. A prevalência é de aproximadamente 1/30.000 pessoas1. O acúmulo de cobre faz-se inicialmente no fígado e, posteriormente, em diversos órgãos e tecidos, particularmente no cérebro, córnea e rins. As manifestações clínicas incluem doença hepática não específica, anormalidades neurológicas, anormalidades psiquiátricas, anemia hemolíticas, síndrome tubular renal de Fanconi e anormalidades esqueléticas2. A tríade que caracteriza a doença é composta pela presença de anéis de Kayser-Fleischer (acúmulo de cobre na córnea), baixos níveis de ceruloplasmina (proteína carreadora de cobre no sangue) e aumento nos níveis urinários de cobre2. A idade influência na apresentação clínica: os extremos de idade apresentam com mais frequência sinas neurológicos ou psiquiátricos e abaixo de 30 anos tendem a doença hepática. A sintomatolo- gia inicial é bastante variável. Os primeiros sintomas podem ser psíquicos, neurológicos ou digestivos3. As características neurológicas incluem disartria, distonia, rigidez, tremor ou movimentos coreiformes, marcha anormal e escrita manual descoordenada. Sendo exclusivamente motor e dominado pela rigidez plástica e por hipercinesias4. As características psiquiátricas incluem alteração de personalidade (irritabilidade, raiva, baixo auto-controle), depressão e ansiedade. As características hepáticas incluem icterícia, hepatomegalia, edema e ascite. A hepatopatia pode ocorrer de maneira aguda, crônica ou fulminante. A anemia hemolítica é resultado do efeito tóxico direto do cobre na membrana nas hemácias. A disfunção renal é de natureza tubular com perdas anormais de aminoácidos, eletrólitos, cálcio, fósforo e glicose. As anormalidades esqueléticas, como a osteoporose e as alterações osteoarticulares, também são dados que podem auxiliar na caracterização da doença2. O diagnoìstico de doença de Wilson é baseado na presença de pelo menos dois dos seguintes criteìrios: (1) histoìria familiar positiva; (2) presença de anel de KF; (3) ceruloplasmina reduzida (<20mg/dL); (4) cobre livre maior de 25µg/dL [calculado a partir da foìrmula: (cobre livre = cobre seìrico em mcg/dL) – (3 x ceruloplasmina em mg/dL)]; (5) cobre urinaìrio de 24 horas acima de 100µg/24h5. 1) Residente de Clínica Médica do Hospital Ana Costa, Santos/SP. 2) Médica Neurologista do Hospital Ana Costa, Santos/SP. Instituição: Serviço de Neurologia do Hospital Ana Costa, Santos/SP, Brasil. Correspondência: Nayara Zortéa Lima, Av. Senador Pinheiro Machado, 709 ap. 604, Santos/SP, Brasil. E-mail: [email protected] Recebido em: 30/11/2012; aceito para publicação em: 28 /2013; publicado online em:30/05 /2013. Conflito de interesse: nenhum. Fonte de fomento: nenhuma. 30 Revista Médica Ana Costa, v. 18, n. 2, p. 30 - 31, abr / mai / jun 2013 Tabela 1 – Testes diagnósticos¹ Ceruloplasmina sérica ocorrem em 95% <20 mg/dl (N: 21 a 53 mg/dl) dos pacientes Cobre hepático (biópsia) >250 mcg/g de peso seco (N: até 50mcg/g) Cobre sérico Valores abaixo do normal: Homem: 70 a 140 mg/dl Mulheres: 85 a 155 mg/dl Cobre urinário >100 mcg/24h (N: 15 a 20mcg/24h) Anéis de Kayser-Fleischer (córnea) Exame oftalmológico (lâmpada de fenda) ocorrem em 90% dos indivíduos já com manifestações neurológicas Tomografia cerebral de ressonância Atrofia principalmente dos gânglios da magnética base, putâmen e também do córtex, cerebelo e substância cinzenta A imagem visualizada no mesencéfalo com aspecto semelhante à face do urso panda. Esta imagem resulta da intensidade normal do sinal no núcleo vermelho e pares reticulada da substância negra, hiperintensidade do tegmento e hipointensidade dos colículos superiores. Considerada uma característica da doença de Wilson, passou a ser chamada sinal da “face do panda gigante” presença do sinal da “face do panda no mesencéfalo e na ponte”. Na ponte, foi rotulado de sinal da “face do panda em miniatura”, sendo a imagem formada pela hipointensidade do fascículo longitudinal medial e trato tegmental central (olhos do panda) em contraste à hiperintensidade do aqueduto abrindo-se no IV ventrículo (nariz e boca), limitada na porção inferior pelo véu medular superior6. Relato de caso Paciente masculino, 25 anos, era portador de hepatopatia crônica com varizes esofagianas sem causa definida. Há 6 meses, iniciou quadro depressivo progressivo em tratamento com depakene e alprazolam, porém, sem melhora. Evoluiu com quadro de catatonia, disfagia, tetraespasticidade, não comunicativo, mantendo postura em opistótono e emagrecido, foi internado para investigação diagnóstica. Foram realizados exames laboratoriais de rotina, radiografia de tórax e eletroencefalograma sem alterações significativas. A avaliação neurológica sugeriu a possibilidade de degeneração hepatolenticular devido à associação do quadro que com a presença do quadro psiquiátrico, distonia e antecedentes de hepatopatia. A tomografia computadorizada de crânio favoreceu tal diagnóstico pela presença de hipodensidades inespecíficas no corpo estriado bilateral, na ponte e mesencéfalo, com lesão do globo pallidum, putâmem e atrofia cortical difusa. Realizou RNM de encéfalo, que confirmou as lesões características de doença de depósito. Prosseguindo investigação diagnóstica, foi avaliado pela equipe de Oftalmologia, com exame em lâmpada de fenda que evidenciou a presença de anéis de Kayser-Fleischer. Com isso, foram realizados exames mais específicos, como: dosagem sérica de ceruloplasmina, dosagem de cobre urinário que alterados definiram o diagnóstico de DW e então se iniciou o tratamento com penicilamina até a dose de 1,5g/dia, baclofeno, aumentado progressivamente até a dose de 120mg/d, prolopa 400/100mg/dia, depakene1g/dia, diazepam10mg/dia, associado a medidas higienodietéticas(fisioterapia e dieta pobre em cobre). Evoluiu com melhora do quadro geral, com regressão lenta, mas progressiva dos sintomas neurológicos, digestivos e psiquiátricos. prevenir sua reacumulação. A terapia deverá ser mantida por toda a vida. A partir do momento em que se define o diagnóstico, deve-se iniciar dieta pobre em cobre: evitar fígado, chocolate, frutos do mar, feijão, amendoim, castanha de caju e nozes1. Inicia-se o tratamento com o uso de penicilamina, um quelante de cobre e, concomitantemente, o uso de piridoxina (vitamina B6). Certos indivíduos são intolerantes à penicilamina, apresentando efeitos colaterais significativos como nefrotoxicidade, anormalidades hematológicas e uma erupção distinta, elastose perfurante serpiginosa (que envolve pescoço e axila). Além disso, em alguns pacientes com a DW portadores de desordens neurológicas, o tratamento com penicilamina agrava paradoxalmente o quadro clínico2,3. Nas formas caracterizadas pelo alto grau de rigidez, a associação de Levodopa pode ser benéfica. Outros fármacos também usados são trentina (dicloridrato de trietilenotetramina) e acetato de zinco, também quelantes de cobre, alternativa segura para aqueles que desenvolvem efeitos colaterais com a penicilamina. O transplante hepático deve ser reservado para pacientes com doença hepática terminal ou fulminante7. A DW é uma doença rara e grave, de evolução fatal, sendo seu diagnóstico um desafio, pois pode se apresentar desde a forma oligoassintomática, com exames pouco alterados ou até mesmo com muitas alterações. Deve ser suspeitada em qualquer indivíduo, em qualquer idade, que apresente anormalidades hepáticas ou neurológicas. O diagnóstico depende da observação de dados clínicos e laboratoriais, que evidenciam o metabolismo anormal de cobre, mas nenhum parâmetro é confiável isoladamente. O diagnóstico laboratorial baseia-se na dosagem sérica de ceruloplasmina (<20 mg/dL), cobre em urina de 24 horas(>100 mg/dL) e cobre livre (> 25µg/dL). O erro mais frequente é pensar que todos os parâmetros devem estar alterados8. Para o diagnóstico, quanto mais precoce a suspeita e o tratamento, menos sequelas, e assim menor mortalidade e letalidade. Referências 1. Silva AC, Colósimo AP, Salvestro D. Doença de Wilson. Relato de caso e revisão bibliográfica. Rev Méd Minas Gerais. 2010;20(N. Esp.):404-11. 2. Goldman L, Ausiello D. Doença de Wilson. Cecil, Tratado de Medicina Interna. 22ª ed, volume II, cap. 224, pag 1508-10. 3. Canelas HM. Degeneração hepatolenticular. Revisão bibliográfica. Arq. Neuro-Psiqu. 1987;45(2):197-212. 4. Barbosa ER, Scaff M, Cormela TT, Canelas HM. Degeneração hepatolenticular . Arq Neuro-Psiqu. 1985;43(3):234-42. 5. Sócio AS, Ferreira AR, Fagundes EDT, Raquel MLV, Pimenta JR, Campos LF, Penna JF. Doença de Wilson em crianças e adolescentes: diagnóstico e tratamento. Revisão bibliográfica. Rev Paul Pediatr. 2010;28(2):134-40. 6. Brito JCE, Coutinho MAP, Almeida HJF, Nóbrega PV. Doença de Wilson: diagnóstico clínico e sinais das “faces de panda” à ressonência magnética. Revisão bibliográfica. Relato de caso. Arq Neuro-Psiquiatr. 2005;63:176-9. 7. Protocolo clínico e diretrizes terapêuticas, portaria SAS/MS n° 844, de 31 de outubro de 2002, pp. 261-5. 8. Sócio AS, Ferreira AR, Fagundes EDT, Raquel MLV, Penna JF. Doença de Wilson em crianças e adolescentes: como fazer diagnóstico precoce. Rev Med Minas Gerais. 2009;19(4 Supl 5):S35-41. Discussão A doença de Wilson é uma condição tratável. Com terapia própria, o progresso da doença pode ser paralisado e a recuperação do paciente pode ser total. Aqueles que não são prontamente tratados podem sofrer consequências irreversíveis. O tratamento é direcionado para remover o excesso de cobre acumulado e Revista Médica Ana Costa, v. 18, n. 2, p. 30 - 31, abr / mai / jun 2013 31 Relato de caso O desafio diagnóstico do sarampo nos dias atuais The diagnostic challenge of the measles in the current days José Breno de Sousa Neto1 2 Gelvana Flávio Barreto Reis RESUMO ABSTRACT Introdução: o sarampo é uma doença infecciosa aguda, de natureza viral, grave, transmissível e extremamente contagiosa, muito comum na infância e de grande importância na saúde pública. Relato de caso: relatamos o caso clínico de um garoto de 15 anos com sintomas gripais, exantema e sinal de Koplik com diagnóstico de sarampo confirmado por sorologia. Introduction: Measles is an acute infectious disease, viral in nature, serious, highly contagious and transmissible, very common in childhood and of great importance in public health. Case report: We report a case of 15-year boy with flu symptoms, exanthema and signal of Koplik with measles diagnosis confirmed for serology. Descritores: Exantema. Sarampo. Vacina. Tríplice Viral. Key words: Exanthema. Measles. Vaccine, MMR. Introdução O sarampo é uma doença infecciosa aguda, de natureza viral, grave, transmissível e extremamente contagiosa, muito comum na infância. O vírus do sarampo pertence ao gênero Morbillivirus, família Paramyxoviridae e sua viremia, causada pela infecção, provoca uma vasculite generalizada, responsável pelo aparecimento das diversas manifestações clínicas, inclusive pelas perdas consideráveis de eletrólitos e proteínas, gerando o quadro espoliante característico da infecção (exantema mobiliforme típico generalizado acompanhado de febre e síndrome catarral). Dividese em três fases: prodrômica ou catarral (aparecimento do Sinal de Koplik), exantemática e covalescença ou descamação furfurácea. Além disso, as complicações infecciosas contribuem para a gravidade do sarampo, particularmente em crianças desnutridas e menores de um ano de idade1,2. A vacina utilizada no Brasil para prevenção da doença é a tríplice viral (sarampo, caxumba e rubéola) com doses aos 12 meses e quatro anos de idade, diferentemente do Estado de São Paulo que é dada aos 9 e 15 meses1. Relato de caso Paciente sexo masculino, 15 anos deu entrada no pronto-socorro do Hospital Ana Costa com queixa de tosse seca, febre (38°C), astenia e mal estar havia quatro dias. Evoluiu com aparecimento de exantema em face com posterior acometimento de tronco e membros. Passou cerca de duas vezes em serviços de emergência, sendo medicado com dipirona, anti-alérgicos e liberado em seguida. Negava contato recente com pessoas doentes e refere ter ido ao Aeroporto Internacional de Guarulhos havia cerca de 12 dias. Como antecedentes pessoais, referia ter tomado apenas a primeira dose da vacina tríplice viral (SCR) aos três meses de idade quando apresentou crise convulsiva (sic). Ao exame físico, encontrava-se em regular estado geral, desidratado 1+/4+, febril (38°C), lúcido, eupneico, SAO2 92% (ar ambiente), FC: 102bpm, com exantema máculo-papular em face, pescoço e tronco, oroscopia com pontilhados brancos em pilares e perimolares. Foi internado para investigação diagnóstica, notificação do caso a vigilância epidemiológica e solicitado sorologias para dengue, rubéola, mononucleose e sarampo. O hemograma de entrada mostrava Hb 15,6; leucograma 4100 (0/1/82/1/0/15/1); plaquetas 199.000, PCR 62 e restante dos exames normais (uréia, creatinina e eletrólitos). Evoluiu bem, apresentando regressão do exantema e da febre. As sorologias solicitadas foram negativas, exceto a do Sarampo (IgM +), confirmadas em dois laboratórios distintos. Discussão O sarampo é de ampla distribuição mundial, sendo sua incidência, evolução clínica e letalidade influenciadas pelo nível socioeconômico, além do estado nutricional e imunitário do doente e as condições de aglomeração existentes nas habitações coletivas3. O vírus tem alta infectividade e morbidade, qualidades estas demostradas em diversas epidemias espalhadas pelo mundo4. A maior prevalência é na infância, entretanto, todas as idades são susceptíveis, exceto se proteção por anticorpos (doença, vacina ou proteção por anticorpos maternos até 6° mês de vida)2. As epidemias ocorrem a cada 4 anos, quando crescem as crianças susceptíveis em comunidades não vacinadas ou emigrações para grandes centros populacionais1,5. 1) Residente de Clínica Médica do Hospital Ana Costa, Santos/SP. 2) Médica infectologista do Hospital Ana Costa, Santos. Mestre em Doenças Infecciosas e Parasitárias pela Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP, São Paulo/SP. Professora Assistente do Curso de Medicina da Universidade Metropolitana de Santos – UNIMES, Santos/SP. Instituição: Serviço de Infectologia do Hospital Ana Costa, Santos/SP, Brasil, Correspondência: José Breno de Sousa Neto, Av. Pedro Américo, 60. Santos, SP – Brasil. E-mail: [email protected] Recebido em: 30/11/2012; aceito para publicação em: 03/03/2013; publicado online em:30/05 /2013. Conflito de interesse: nenhum. Fonte de fomento: nenhuma. 32 Revista Médica Ana Costa, v. 18, n. 2, p. 32 - 33, abr / mai / jun 2013 No Brasil, a primeira campanha de vacinação de âmbito nacional foi em 1992 e atualmente tem cobertura vacinal de 95% na população infantil. A erradiacação só é possível quando a cobertura for entre 95% a 100%após a interrupção da transmissão do vírus do sarampo no ano 2000, já foram detectados outros eventos relacionados a casos importados de sarampo, o que significa que a vigilância epidemiológica tem mantido uma elevada sensibilidade para detecção de casos importados5. No período de 2001 a 2006 ocorreram 67 casos, em três estados: São Paulo, Santa Catarina e Bahia. Em 2010, o Brasil enfrentou três surtos de sarampo nos estados do Pará, Rio Grande do Sul e Paraíba. No surto do município de Porto Alegre, os casos relataram viagem a Buenos Aires -Argentina em julho 2010, país este que no mês de agosto, segundo o Ministério da Saúde da Argentina, confirmou três casos de sarampo. Houve suposta relação desses casos confirmados com viagem à África do Sul, onde há circulação do vírus do sarampo e ocorrência de surtos; todos os casos foram confirmados por sorologia. Já no estado da Paraíba, onde 57 foram confirmados genótipo B3, cujo sequenciamento genético é similar ao circulante na África do Sul. Foi identificado ainda, o genótipo D4, que estava em circulação no mesmo período na Inglaterra, França, Holanda e Itália e não havia circulado anteriormente no país e não foi identificado o caso primário. Durante a investigação, constatouse que um jovem não fora vacinado por seguir recomendações de médico homeopata6. Revista Médica Ana Costa, v. 18, n. 2, p. 32 - 33 abr / mai / jun 2013 Considerações finais É necessário fortalecer a integração setor público/privado para a uniformidade da notificação e de sua importância para deflagração das medidas de controle, efetivar capacitação/reciclagem dos profissionais de saúde frente aos casos de doenças exantemáticas febris e por fim, alertar os viajantes e aos participantes de eventos de massa sobre a necessidade de assegurarem suas vacinas atualizadas, antes de viajar ou do início do evento, preferencialmente 15 dias antes. Medidas essas, importantes, para erradicação e evitar a importação do vírus do sarampo. Referências 1. Veronesi R, Focaccia R. Tratado de Infectologia. São Paulo: Atheneu; 2005. 3ª ed.pp. 667-73. 2. Harrison TR, Braunwald E, Hauser SL, Jameson JL, Loscalzo J, Longo DL, Kasper DL, Fauci AS. Tratado de Medicina Interna. Rio de Janeiro: Artmed; 2008. 17ª ed.pp.1214-9. 3. Hersh BS, Tanbini G, Nogueira AC, Carrasco P, Quadros CA. Review of regional measles surveillance data in the America. Lancet. 2008;355:19438. 4. Pan American Health Organization. Measles/Rubella Weekly Bulletin. 2012;18(6). Disponível em: 5. Ministério da Saúde. Guia de Vigilância para erradicação do sarampo e controle da rubéola. Brasília: Ministério da Saúde; 2000. 1ª ed.pp.43-55. 6. Ministério da Saúde. Guia de Vigilância Epidemiológica. Brasília: Ministério da Saúde; 2010. 7ª ed. pp.120-4. 33 Relato de caso Reestenose coronária intra-stent farmacológico Drug-eluting stent restenosis Amanda Evelyn Andrade Rocha¹ Rider Nogueira de Brito Filho² RESUMO Introdução: Os stents coronários reduziram drasticamente os índices de reestenose quando comparados à angioplastia com balão isoladamente e hoje se tornaram a terapia-padrão para tratamento da doença aterosclerótica coronariana obstrutiva. Atualmente, as taxas de reestenose intra-stent (RIS) e revascularização da lesão-alvo são muito menores com o uso de stents farmacológicos em comparação aos metálicos. Apesar disso, a reestenose intra-stent sintomática continua a ser um problema importante, dado o grande número de pacientes que recebem stents farmacológicos. Relato de caso: Com o objetivo avaliar a abordagem da reestenose intra-stent farmacológico, apresentamos o caso de uma paciente de 63 anos, portadora de diabete mellitus, hipertensão arterial e coronariopatia com implantação de stent farmacológico, evoluindo com quadro de precordialgia e lesão multiarterial com reestenose intra-stent. Neste caso, optou-se pela realização de revascularização cirúrgica por se tratar de uma lesão multiarterial em paciente de alto risco. ABSTRACT Introduction: Intracoronary stents reduce the rate of angiographic and clinical restenosis compared to percutaneous transluminal coronary angioplasty and now has become the standard therapy for treatment of obstructive coronary atherosclerosis. Currently, the rates of in-stent restenosis (ISR) and target lesion revascularization are much smaller with the use of drug-eluting stents compared with bare-metal stents. Nevertheless, symptomatic in-stent restenosis continues to be an important problem given the large numbers of patients receiving drugeluting. Case report: In order to evaluate the management of instent restenosis drug, we present the case of a 63-year patient with diabetes mellitus, hypertension and coronary artery disease with drug-eluting stent, evolving to chest pain and multivessel injury with in-stent restenosis. In this case, it was opted for surgical revascularization for treating multivessel injury in high-risk patients. Key words: Drug-Eluting Stents. In-Stent Restenosis. Descritores: Stent Farmacológico. Reestenose Intra-Stent. Introdução A reestenose intra-stent (RIS), é resultante da excessiva resposta reparadora neointimal desencadeada após o implante da prótese e é uma das principais limitações do processo de intervenção coronáriana percutânea. A restenose corresponde a uma redução do diâmetro do lúmen do stent, ocorrendo principalmente entre três a 12 meses após sua implantação1. A introdução do stent farmacológico provou ser um passo importante na redução das taxas de reestenose e revascularização da lesão-alvo após intervenção coronária percutânea. Sua rápida implementação na prática padrão e a expansão das indicações para pacientes de alto risco e lesões complexas, desencadeou o aumento da reestenose intra-stent farmacológico, que ocorre em 3% a 20% dos casos. Sua apresentação clínica é geralmente caracterizada pelo quadro de angina recorrente, mas pode apresentar-se como infarto agudo do miocárdio em cerca de 10% dos casos. Entre os principais fatores desencadeantes destaca-se a resistência ao componente farmacológico, hipersensibilidade, subexpansão ou fratura do stent e barotrauma fora do segmento com stent1. Padrões de RIS têm sido descritos como lesões focais ou difusas. No entanto, a fim de continuar a classificar os tipos de reestenose, uma classificação angiográfica foi desenvolvida: Padrão I: lesão focal (≤ 10 mm); Padrão II: lesão >10 mm dentro do stent; Padrão III: inclui lesão ? >10 mm estendendo para fora do stent; e Padrão IV: totalmente ocluído2. A taxa de reestenose de stents e a necessidade de revascularização da lesão-alvo aumentam à medida que mais fatores de risco estão presentes. Os principais fatores de risco envolvidos incluem a presença de diabetes mellitus, stents múltiplos e diâmetro luminal mínimo após implante de stent < 3 mm3. Relato de caso Paciente de 63 anos, caucasiana, do sexo feminino, portadora de hipertensão arterial, diabete mellitus, obesidade, coronariopatia, foi submetida a colocação de stent farmacológico em artéria circunflexa há um ano e três meses devido a quadro de infarto agudo do miocárdio. Procurou atendimento médico em nosso serviço devido episódios recorrentes de dor precordial de forte intensidade, com irradiação para membro superior direito, há 36 horas, desencadeada ao repouso, sem sudorese ou náuseas associadas. Encontravase assintomática. Ao exame, apresentava-se em bom estado geral, 1) Médica Residente de Clinica Médica do Hospital Ana Costa, Santos/SP. 2) Médico Chefe do Serviço de Cardiologia do Hospital Ana Costa, Santos/SP. Instituição: Serviço de Cardiologia do Hospital Ana Costa, Santos/SP. Correspondência: Amanda Evelyn Andrade Rocha, Av. Presidente Wilson, 72 ap.42 -11065-200, Santos/SP, Brasil. E-mail: [email protected] Recebido em: 30/11/2012; aceito para publicação em: 17/01/2013; publicado online em:30/05 /2013.. Conflito de interesse: nenhum. Fonte de fomento: nenhuma. 34 Revista Médica Ana Costa, v. 18, n. 2, p. 34 - 36, abr / mai / jun 2013 corada, hidratada, anictérica, acianótica, afebril, eupneica, contactante, com PA: 170 x 90 mmHg, FC: 88 bpm, Sat O2: 98% em ar ambiente. Durante sua internação em enfermaria, evoluiu sem novas queixas de dor, porém, apresentou resultado de exames laboratoriais com aumento de enzimas cardíacas, sendo consequentemente transferida para UTI cardiológica (1º amostra= Troponina: 0,71 e CKMB: 50/ 2º amostra= Troponina: 1,2 e CKMB: 56). Foi submetida à cineangiocoronariografia cardíaca, a qual evidenciou coronária direita com múltiplas lesões 90% em terço proximal e médio e oclusão total no seu terço distal, descendente anterior com múltiplas lesões 80% no seu terço proximal e médio, circunflexa exibindo reestenose focal severa de 90% do stent e placa de 50% no seu terço médio – Figura 1. Evoluiu estável em Killip I. Discutido caso com equipe da cirurgia cardíaca, esta optou por intervenção cirúrgica após uma semana sem uso de clopidogrel. Foi realizado posteriormente ecocardiograma evidenciando pequena acinesia da porção apical e parede inferior médio-basal e Doppler de carótidas e vertebrais sem alterações. Após uma semana, paciente realiza cirurgia de revascularização miocárdica, com implantação de ponte safena em ramo marginal da artéria circunflexa e mamária esquerda em artéria descendente anterior, sem intercorrências. Paciente realizou pós-operatório em UTI e evoluiu sem novos quadros de dor, recebendo alta hospitalar, mantendo acompanhamento ambulatorial. Figura 1 – Cineangiocoronariografia cardíaca. a- artéria circunflexa; bartéria descendente anterior; c- artéria coronária direita. Discussão As taxas de reestenose intra-stent e revascularização da lesão alvo são muito mais baixas na era atual de stents farmacológicos. No entanto, a restenose intra-stent sintomática continua a ser um problema importante, dado o grande número de pacientes que receberam stents farmacológicos1. A ultra-sonografia intravascular deve ser utilizada para avaliar a adequada colocação de stent, evitando assim a reestenose3. Em pacientes sintomáticos com reestenose de stent metálico intracoronário, é recomendada implantação subseqüente de um stent farmacológico no local, pois este possui maior eficácia e menor risco de reestenose4. Em pacientes sintomáticos com reestenose intracoronária intrastent farmacológico, não há dados suficientes para sugerir qualquer tratamento específico, embora ultrassonografia intravascular deva ser realizada quando possível para permitir a otimização da expansão do stent. Nova implantação de stent farmacológico é realizada em muitos centros1. A preferência do paciente desempenha um papel importante na tomada de decisão no momento da estenose intra-stent sintomática. Os benefícios e riscos relativos da intervenção percutânea e tratamentos cirúrgicos precisam ser discutidos. Em particular, a necessidade de uma terapia antiplaquetária dupla de longo prazo com uso de aspirina associada a inibidores do receptor P2Y12 das plaquetas (clopidogrel, prasugrel ou ticagrelor), concomitante a implantação do stent farmacológico deve ser compreendida pelo paciente, pois, se prematuramente interrompida, pode desencadear trombose do stent e muitas vezes ocasionar um infarto agudo do miocárdio5. A trombose do stent pode ocorrer de forma aguda (em Revista Médica Ana Costa, v. 18, n. 2, p. 34 - 36, abr / mai / jun 2013 24 horas), subaguda (em 30 dias), ou tardia (em um ano ou mais). No primeiro ano de implantação, ocorre com freqüência similar em pacientes com stents metálicos ou farmacológicos, desde que estejam tratados com terapia antiplaquetária dupla em duração recomendada, sendo esta maior em stents farmacológicos devido à cobertura neointimal tardia6. Um número considerável de pacientes portadores de stents em uso de clopidogrel apresenta alta reatividade plaquetária, caracterizando uma resposta deficiente a esse fármaco. Esses pacientes apresentam risco mais elevado não apenas de trombose de stents, mas também de morte cardiovascular, infarto agudo do miocárdio e reestenose intra-stent. Dobrar a dose de manutenção do clopidogrel não se mostrou eficaz7. Atualmente, a utilização de drogas mais potentes, como prasugrel e ticagrelor tornou-se uma estratégia muito utilizada, principalmente no contexto de síndrome coronariana aguda, embora não existam trabalhos confirmando seu benefícios em pacientes estáveis8. Com a crescente utilização de stents para correção de estenoses coronarianas, é natural que cirurgias de revascularização miocárdica estejam também sendo indicadas para pacientes já portadores dessas próteses endovasculares. O papel da cirurgia de revascularização miocárdica para o tratamento da estenose intra-stent é incerto. Deve ser considerada em pacientes que não são considerados candidatos à intervenção percutânea ou que cumpram os critérios estabelecidos para seu uso em pacientes com angina estável. Para pacientes com doença multiarterial ou com lesão em artéria descendente anterior proximal ≥ 70% é recomendada realização de revascularização cirúrgica9. A taxa de desobstrução à longo prazo é significativamente mais elevado com um enxerto arterial (artéria torácica interna ou radial) em comparação com um enxerto de veia safena10. No caso relatado foi optado pela realização de revascularização cirúrgica por se tratar de uma lesão multiarterial com acometimento de 80% da artéria descendente anterior em terço proximal e médio e reestenose de stent farmacológico em artéria circunflexa. O tratamento adequado da reestenose intra-stent deve incluir também a redução dos fatores de risco. Devem ser atingidos os objetivos do tratamento para hipertenção arterial, dislipidemia, cessar tabagismo, controlar glicemia em pacientes portadores de diabetes e acompanhamento em programa de reabilitação cardíaca11,12. Referências 1. Dangas GD, Claessen BE, Caixeta A, Sanidas EA, Mintz GS, Mehran. Instent restenosis in the drug-eluting stent era. J Am Coll Cardiol. 2010;56:1897. 2. Mehran R, Dangas G, Abizaid AS, Mintz GS, AJ Lansky, Satler LF, AD Pichard, KM Kent, GW Stone, Leon MB. Angiographic patterns of in-stent restenosis: classification and implications for long-term outcome. Circulation. 1999;100:1872. 3. Kastrati A, Schömig A, Elezi S, Schühlen H, J Dirschinger, Hadamitzky M, Wehinger A, Hausleiter J, Walter H, Neumann FJ. Predictive factors of restenosis after coronary stent placement. J Am Coll Cardiol. 1997;30:1428. 4. Dibra A, Kastrati A, Alfonso F, Seyfarth M, Pérez-Vizcayno MJ, Mehilli J, Schömig A. Effectiveness of drug-eluting stents in patients with bare-metal in-stent restenosis: meta-analysis of randomized trials. J Am Coll Cardiol. 2007;49:616. 5. Hamm CW, Bassand JP, Agewall S, J Bax, Boersma E, Bueno H, Caso P, D Dudek, Gielen S, K Huber, Ohman M, MC Petrie, Sonntag F, Uva MS, RF Storey, Wijns W, Zahger D. CES Comissão para as Orientações Práticas. Bax JJ, Auricchio A, Baumgartner H, Ceconi C, Dean V, Deaton C, R Fagard, Funck-Brentano C , D Hasdai, Hoes A, Knuuti J, Kolh P, McDonagh T, Moulin C, Poldermans D, Popescu BA, Reiner Z, Sechtem U, Sirnes PA, Torbicki A, Vahanian A, Windecker S; revisores do documento, Windecker S, S Achenbach, Badimon L, Bertrand M, Bøtker HE, Collet JP, Crea F, Danchin N, Falk E, Goudevenos J, Gulba D, Hambrecht R, Herrmann J, A Kastrati, Kjeldsen K, Kristensen SD, Lancellotti P, Mehilli J, Merkely B, Montalescot G, Neumann FJ, Neyses L, J Perk, Roffi M, Romeo F, M Ruda, Swahn E, Valgimigli M, Vrints CJ, Widimsky P. ESC Committee for Practice Guidelines. ESC Guidelines for the management of acute coronary syndromes in patients presenting without persistent ST-segment elevation: The Task Force for the management of acute coronary syndromes (ACS) in patients presenting without persistent ST-segment elevation of the European Society 35 of Cardiology (ESC). Eur Heart J. 2011;32(23):2999-3054. 6. Ferreira-Gonzalez I, Marsal JR, Ribera A, Permanyer-Miralda G, GarcíaDel Blanco B, Martí G, Cascant P, Martín-Yuste V, Brugaletta S, Sabaté M, Alfonso F, Capote ML, De La Torre JM, Ruız-Lera M, Simmiguel D, Cárdenas M, Pujol B, Baz JA, Iñiguez A, Trillo R, González-Béjar O, Casanova J, Sánchez-Gila J, García-Dorado D. Background, incidence, and predictors of antiplatelet therapy discontinuation during the first year after drug-eluting stent implantation. Circulation. 2010; 122:1017. 7. Wallentin L, Becker RC, Budaj A, Cannon CP, Emanuelsson H, Held C, Horrow J, Husted S, James S, Katus H, Mahaffey KW, Scirica BM, Skene A, Steg PG, Storey RF, Harrington RA; PLATO Investigators, Freij A, Thorsén M.. Ticagrelor versus clopidogrel in patients with acute coronary syndromes. N Engl J Med. 2009;361:1045. 8. Villacorta A, Villacorta H, Antiagregantes Plaquetários e Testes de Função Plaquetária na Era dos Stents Coronarianos, Rev Bras Cardiol. 2012;25(4):340-9. 9. Kapoor JR, Gienger AL, Ardehali R, Varghese R, Perez MV, Sundaram V, McDonald KM, Owens DK, Hlatky MA, Bravata MS. Isolated disease of the proximal left anterior descending artery comparing the effectiveness of percutaneous coronary interventions and coronary artery bypass surgery. JACC Cardiovasc Interv. 2008;1:483. 10. Gaudino M, Cellini C, Pragliola C, C Trani, Burzotta F, G Schiavoni, Nasso G, G Possati Arterial versus venous bypass grafts in patients with instent restenosis. Circulation. 2005;112:I265. 11. Moustapha A, Assali AR, Sdringola S, Vaughn WK, Peixes R, Rosales O, Schroth G, Krajcer Z, Smalling RW, Anderson H. Percutaneous and surgical interventions for in-stent restenosis: long-term outcomes and effect of diabetes mellitus. J Am Coll Cardiol. 2001;37:1877. 12. Smith SC Jr, Feldman TE, Hirshfeld JW Jr, Jacobs AK, Kern MJ, Rei SB, Morrison DA, O'Neill WW, Schaff HV, Whitlow PL, Williams DO, Antman EM, Adams CD, Anderson JL, Faxon DP, Fuster V, Halperin JL, Hiratzka LF, Caça SA, R Nishimura, Ornato JP, Página RL, Riegel B. ACC/AHA/SCAI 2005 guideline update for percutaneous coronary intervention: a report of the American College of Cardiology/American Heart Association Task Force on Practice Guidelines (ACC/AHA/SCAI Writing Committee to Update the 2001 Guidelines for Percutaneous Coronary Intervention). J Am Coll Cardiol. 2006;47:e1. 36 Revista Médica Ana Costa, v. 18, n. 2, p. 34 - 36, abr / mai / jun 2013 Relato de caso Atresia de Vias Biliares Biliary atresia Ana Nadyr de Almeida David Gibelli1 Ana Cristina Martinez Carvalho2 RESUMO Introdução: Atresia de vias biliares é uma condição que acomete recém-nascidos e lactentes numa incidência de 1:15000 nascidos vivos. Relato de caso: O paciente relatado foi diagnosticado com atresia de vias biliares após 60 dias de vida e submetido ao tratamento padrão ouro, a cirurgia de Kasai (portoenterostomia). Apesar de seu diagnóstico tardio evolui com bom prognóstico, sendo, até o momento, excluída a necessidade de transplante hepático. Considerações: O presente relato de caso é uma demonstração de que apesar de não ser uma doença tão frequente, há necessidade de conhecê-la para afastá-la ou diagnosticá-la, frente a um caso de icterícia neonatal persistente, uma vez que o diagnóstico precoce está intimamente ligado ao bom prognóstico do doente. Descritores: Atresia de Vias Biliares. Cirurgia de Kasai. Malformações Congênitas. Icterícia Tardia. Introdução Atresia de vias biliares é uma doença que cursa com colestase. A colestase é uma manifestação comum de doença hepática em pacientes pediátricos, sendo observada em aproximadamente dois terços das crianças com hepatopatia1. De forma geral, dividese em dois grupos: doenças que acometem lactentes e RNs como a atresia de vias biliares e hepatite neonatal; e o grupo que acomete crianças maiores, que são as hepatites virais e doenças auto-imunes1. Uma vez estabelecido o diagnóstico de colestase, deve-se definir o local do obstáculo (intra ou extra-hepáticas) que vai determinar o tratamento. Esse diagnóstico deve ser feito preferencialmente com até 60 dias de vida (idade que mostrou melhor resposta após intervenção cirúrgica). A sobrevida varia de 46 a 73% dos pacientes operados precocemente e em torno de um terço dos pacientes operados após 60 dias de vida2,3. Relato de caso Paciente do sexo masculino, 59 dias de vida, nascido de parto cesárea, a termo e adequado para idade gestacional, sem intercorrencias durante parto ou pré-natal, recebeu alta da maternidade junto com sua mãe. Iniciou quadro de icterícia na primeira semana de vida e procurou ambulatório de aleitamento materno. Foi orientada a dar banho de sol em seu filho e retorno para reavaliação em 15 dias. Persistiu com icterícia e evoluiu com perda de peso e acolia fecal. Procurou atendimento na policlínica, ABSTRACT Introduction: Biliary atresia is a condition that affects newly born and infants in an incidence of 1:15,000 live births. Case report: The related patient was diagnosed with biliary atresia after 60 days of birth and submitted to the golden standard treatment, the Kasai surgery (portoenterostomy). Despite the late diagnosis, the patient has been evolving with a good prognosis, thus, until current time, it is excluded the need of the hepatic transplant. Remarks: The case report hereby is a demonstration that although the disease is not much frequent, there is a need of knowing the disease in order to refute or diagnose it, considering the persistent neonatal jaundice case, once the early diagnosis is deeply connected to the good prognosis of the patient. Key words: Biliary Atresia. Kasai Surgery. Congenital Malformations. Late Jaundice. onde foi orientada a colher exames: Hemoglobina: 11,2/ Hematócrito: 35,5/ Leucócitos: 14.500 (Bastões: 0%, Segmentados: 36%), Plaquetas: 826.000; Urina I: normal; Bilirrubina total: 6,1; bilirrubina direta: 4,4; bilirrubina indireta: 1,7. Com o resultado, a mãe foi orientada a procurar um gastropediatra que encaminhou o paciente diretamente ao Hospital Ana Costa para internação. Foi internado com icterícia 3+/4+ zona IV e fígado palpável a 2 centímetros do rebordo costal direito. Novos exames mostraram: Hemoglobina: 9,9/ Hematócrito: 31/ Leucócitos: 14.200 (0-0-43-2-0-49-6), Plaquetas: 780.000; PCR: 0,8; TGO: 128/ TGP: 65/ FA: 638/ GGT: 636/ TAP: 100%/ INR: 1,0/ TTPA:37; Bilirrubina total: 6,5/ Bilirrubina Direta:5,1/ Bilirrubina indireta: 1,4; Eletroforese Hb: Albumina: 63,7 / Alfa 1: 4,7/ Alfa 2: 14,4/ Beta 1: 6,6/ Beta 2:3,7/ Gama: 6,9/ Relação alfa/gama: 1,75. Além dos exames laboratoriais, foi realizada ultra-sonografia abdominal, que revelou atresia/hipoplasia de vias biliares. Foi encaminhado ao hospital municipal infantil Menino Jesus, em São Paulo, onde foi feita biópsia hepática, que revelou colestase com padrão obstrutivo de vias biliares consistente com o diagnóstico de atresia de vias biliares. Foi submetidoa à cirurgia de Kasai e recebeu alta hospitalar com uso de prednisolona, ursacol e bactrim. Evoluiu com melhora da icterícia e coloração inalterada das fezes. Faz seguimento mensal, com enzimas hepáticas discretamente alteradas atualmente, mas evolui sem necessidade de transplante hepático até o momento. 1) Residente de Pediatria do Hospital Ana Costa, Santos/SP, Brasil. 2) Pediatra no Hospital Ana Costa, Santos/SP, Brasil. Instituição: Serviço de Pediatria do Hospital Ana Costa, Santos/SP, Brasil. Correspondência: Ana Nadyr Gibelli, Rua Joaquim Nabuco, 1028 – 04621-003, São Paulo/SP. E-mail: [email protected] Recebido em: 10/11/2012; aceito para publicação em: 15/02/2013; publicado online em:30/05 /2013. Conflito de interesse: nenhum. Fonte de fomento: nenhuma. Revista Médica Ana Costa, v. 18, n. 2, p. 37 - 39, abr / mai / jun 2013 37 Discussão A atresia de vias biliares é a doença biliar mais comum em cirurgia pediátrica (89% dos casos de doença biliar cirúrgica em crianças). Sua incidência na população ocidental calcula-se em torno de 1:15.000 nascidos vivos . É a causa mais frequente de transplante hepático na criança e representa 60% dos casos operados, em todos os centros que se dedicam ao transplante infantil4. Caracteriza-se por uma obstrução progressiva das vias biliares extra-hepáticas devido a um processo inflamatório recorrente até o completo desaparecimento da luz das vias biliares, formando um cordão fibroso. Sua causa é desconhecida, embora haja referência à etiologia infecciosa5, imunológica6, genética7,8, e vasculares9,10. Dessa forma, a drenagem de bile para o intestino fica comprometida, dando inicio ao quadro de colestase, uma obstrução biliar crônica. No inicio do quadro, quase não há comprometimento do estado geral da criança, diferentemente daquelas acometidas por hepatite neonatal, por infecção congênita e distúrbios metabólicos. As taxas de bilirrubina não são excessivamente elevadas e é típico um aumento de fosfatase alcalina (FA) e outros marcadores de lesões biliares obstrutivas. Posteriormente, ocorre o aparecimento de acolia fecal e colúria devido o acúmulo de bilirrubina direta nas vias biliares e, com o passar do tempo, muito mais importante, o comprometimento do fígado, que se torna cirrótico, entrando em falência e abrindo quadro de insuficiência hepática. Os sinais clínicos e laboratoriais (elevação de FA e GGT) não conferem certeza diagnóstica. A ultra-sonografia, importante exame de triagem para detectar outras doenças biliares possíveis, não ajuda definitivamente no diagnóstico quanto à presença ou ausência de atresia de vias biliares e em muitos casos é responsável pelo atraso no diagnóstico. A cintilografia de vias biliares tem se mostrado eficaz para o diagnóstico indireto da doença, pela ausência do traçador no trato digestivo após 24h da injeção da substância. Durante muito tempo, a atresia de vias biliares não tinha tratamento. Em 1959, foi descrita, no Japão, uma cirurgia que foi uma revolução no tratamento dessa condição que, até então, era inexoravelmente fatal. Trata-se da portoenterostomia ou cirugia de Kasai. Nesse procedimento, a drenagem biliar é estabelecida por meio da anastomose de um conduto intestinal à superfície do hilo hepático, tipo Y-de-Roux, com alça em torno de 40cm11. Embora a drenagem da bile após a cirurgia seja eficaz, em 80% dos casos as crianças futuramente irão necessitar de transplante de fígado em período de tempo variável de caso a caso. Alguns autores sugerem que o prognóstico tardio para os portadores de atresia de vias biliares tratados por portoenterostomia, determinado pela capacidade de obter drenagem biliar efetiva e estável, pode ser previsto já a partir do seguimento inicial (seis meses) por exames simples. A persistência de níveis baixos de bilirrubina total (<2,5mg/dL), ausência de colangites e índices pouco elevados de transaminase podem definir um paciente como provável evolução satisfatória em longo prazo12,13. Atualmente, o tratamento sequencial de cirurgia de Kasai seguido de transplante hepático, se necessário, é a melhor opção terapêutica. Após a cirurgia, o uso de prednisolona como colerético foi efetivo no período imediato de pós-operatório em média a partir do quinto dia após o ato cirúrgico14. A complicação precoce mais frequente é a colangite bacteriana ascendente. Seu tratamento é fundamental para a manutenção do fluxo biliar e do prognóstico do paciente, pois, quanto maior o numero de episódios de colangite, maior a chance de ocorrerem esclerose e perda dos ductos intra-hepáticos remanescentes, com consequente progressão para cirrose hepática15. Do ponto de vista clínico, a colangite caracteriza-se pela presença de febre, irritabilidade, diminuição do apetite, vômitos aumento da icterícia, colúria e acolia fecal. Entretanto, o paciente pode referir apenas início súbito de icterícia ou acolia fecal, sem outros sinais ou sintomas. Obviamente, outras fontes potenciais de infecção devem ser investigadas16. A confirmação diagnóstica pode ser 38 realizada por meio de hemocultura e da histologia hepática, mas não se devem aguardar esses resultados para iniciar o tratamento17, que consiste em antibioticoterapia de largo espectro, efetiva contra bactérias gram-negativas e organismos entéricos. Recomenda-se a terapia empírica com ceftriaxona16. A profilaxia é realizada com sulfametoxazol e trimetoprima ou neomicina, sem diferença entre os fármacos18. A hipertensão portal constitui a segunda complicação mais frequente da atresia. A sua presença depende do grau de fibrose hepática no momento da portoenterostomia e da resposta a esta cirurgia19. No curso evolutivo, o paciente pode desenvolver circulação colateral, esplenomegalia, hiperesplenismo, ascite, peritonite bacteriana espontânea, hemorragia digestiva alta por rotura de varizes esofágicas e/ou gástricas, encefalopatia hepática, síndrome hepatorrenal, síndrome hepatopulmonar e insuficiência hepática20. Após a realização da cirurgia de Kasai, as medidas terapêuticas têm como objetivo minimizar as complicações, promovendo o bom estado nutricional, estimulando a colerese, prevenindo infecções e inflamações persistentes. Dentre essas medidas podemos citar a terapia nutricional, o uso de acido ursodesoxicólico, antibióticos e esteroides. Quanto à terapia nutricional, o primeiro passo é proceder à avaliação nutricional. É importante salientar que, nos pacientes com doenças hepáticas crônicas, o peso não é o melhor parâmetro, pois as visceromegalias e a ascite podem mascarar a desnutrição. É importante, nas crianças com colestase principalmente, prevenir as deficiências de macronutrientes e micronutrientes e das vitaminas lipossolúveis. O aleitamento pode e deve ser mantido após a portoenterostomia. Para os lactentes não amamentados, bem como para aqueles que não estão ganhando peso adequadamente, a terapia nutricional inclui o uso de fórmulas infantis com triglicérides de cadeia média. Em vários casos, é necessário instituir a alimentação por sonda nasogástrica e a suplementação com vitaminas lipossolúveis6. O acido ursodesoxicólico é rotineiramente utilizado com o objetivo de promover a colerese, constituindo, dessa forma, uma tentativa de prevenir a fibrose e a progressão da hepatopatia. O ursacol aumenta a expressão de vários transportadores que atuam na excreção dos ácidos biliares, dos fosfolípides e dos ânions conjugados orgânicos22,23. Quanto aos esteroides, foi levantada uma hipótese de que os mecanismos imunes participam tanto na patogênese da doença como na progressão desta após a cirurgia, o que incentivou seu uso na tentativa de prevenir a colangite inflamatória24. O prognóstico do paciente depende do tratamento instituído e da evolução pós-operatória. Se a portoenterostomia não for realizada, ocorre implacavelmente a progressão da fibrose, com insuficiência hepática e óbito, com 1 ano de idade em 50-80% das crianças, e até os 3 anos em 90-100% dos pacientes25,26. Entretanto, os pacientes submetidos à cirurgia podem ter três evoluções: 1 - resposta satisfatória, na qual o paciente tem boa evolução clínica, embora possa apresentar discretas alterações das enzimas hepáticas; 2 - resposta parcial, na qual o paciente apresenta drenagem biliar satisfatória, mas evolui com fibrose hepática progressiva; 3 - falha terapêutica, situação em que a criança apresenta evolução igual ou mesmo pior à dos pacientes não tratados. Tendo em base os dados da literatura, pode-se observar um pequeno atraso diagnóstico, considerando-se que, ao ter persistência da icterícia após 15 dias de vida, o paciente deveria ter sido imediatamente encaminhado a uma unidade de referência para confirmar ou afastar a hipótese de atresia de vias biliares. O tratamento utilizado foi a cirurgia de Kasai, tratamento padrão-ouro e considerado o único efetivo até hoje. O seguimento foi coerente com a literatura, tendo em vista o uso de esteroides, no caso a prednisolona, para evitar colangite inflamatória, o uso de ursacol (acido ursodesóxicólico) para melhor drenagem da bile e o uso de bactrim na profilaxia da colangite bacteriana. Até o momento, a Revista Médica Ana Costa, v. 18, n. 2, p. 37 - 39, abr / mai / jun 2013 evolução do paciente parece muito satisfatória, tanto clinica como laboratorialmente, levando a pensar que sua provável evolução será favorável, apenas com alterações das enzimas hepáticas. Referências 1. Pinto RB, Silveira TR. Colestase em crianças. In: Lopez FA, Campos Jr D. Tratado de Pediatria - Sociedade Brasileira de Pediatria. 2ª ed. Barueri: Manole; 2010.pp.1009-26. 2. Karrer FM, Lilly JR, Atewart BA, Hall RJ. Biliary atresia registry, 1976 to 1989. J Pediatr Surg. 1990;25(10):1076. 3. Lugo-Vicente H. Biliary atresia, disponível em: http://home.coqui.net/titolugo/articles.htm acessado em abril 2000. 4. LillyJR, Karrer FM, Hall R, Stellin GP, Vasquez-Estevez JJ, Greenholz SK, Wanek EA, Schroter GP. The surgery of biliary atresia. Ann Surg. 1989;210(3):289. 5. Yoon PW, Bresee JS, Olney RS, James LM, Khoury MJ. Epidemiology of biliary atresia: a population-based study. Pediatrics. 1997;99:376-82. 6. Haber BA, Russo P. Biliary atresia. Gastroenterol Clin North Am. 2003;32:891-911. 7. Cunninghan ML, Sybert VP. Idiopathic extrahepatic biliary atresia: recurrence in sibs in two families. Am J Med Genet. 1988;31:421-6. 8. Danasino C, Spadoni E, Buzzi A. Familial biliary atresia. Am J Med Genet. 1999;85:195. 9. Ho CW, Shioda K, Shirasaki K, Takahashi S, Tokimatsu S, Maeda K. The pathogenesis of biliary atresia: a morphological study of the hepatobiliary system and the hepatic artery. J Pediatr Gasstroenterol Nutr. 1993:16:5360. 10. Klippel CH. A new theory of biliary atresia. J Pediatr Surg. 1972;7:651-4. 11. Kasai M. Treatment of biliary atresia with special reference to hepatic porto-enterostomy and its modification. Prog Pediatr Surg. 1974;6:5-52. 12. Ohi R, Nio M, Chiba T, Endo N, Goto M, Ibrahim M. Long-term follow up after surgery for pacients with biliary atresia. J Pediatr Surg 1990;25(4):442. 13. Subramaniam R, Doig CM, Bowen J, Bruce J. Initial response to portoenterostomy determines long-term outcome in pacients with biliary atresia. J Pediatr Surg. 2000;35(4):59. 14. Muraji T, Higashimoto Y. The improved outlook for biliary atresia with corticosteroid therapy. J Pediatr Surg. 1997;32(7):1103. Revista Médica Ana Costa, v. 18, n. 2, p. 37 - 39, abr / mai / jun 2013 15. Lunzmann K, Schweizer P. The influence of cholangitis on the prognosis of extrahepatic biliary atresia. Eur J Pediatr Surg. 1999;9:19-23. 16. Wu ET, Chen HL, Ni YH, Lee PI, Hsu HY, Lai HS, Chanf MH. Bacterial cholangitis in patients with biliary atresia: impact on short-term outcome. Pediatr Surg Int. 2001; 17: 390-5. 17. Davenport M. Biliary atresia. Semin Pediatr Surg. 2005;14:42-8. 18. Bu LN, Chen HL, Ni YH, Peng S, Jeng YM, Lai HS, Chang MH. Multiple intrahepatic biliary cysts is children with biliary atresia. J Pediatr Surg. 2002;37:1183-7. 19. Kang N, Davenport M, Driver M, Howard ER. Hepatic histology and the development of esophageal varices in biliary atresia. J Pediatr Surg. 1993;28:63-6. 20. Sokol RJ, Mack C, Narkewicz MR, Karrer FM. Pathogenesis and outcome of biliary atresia: current concepts. J Pediatr Gastroenterol Nutr. 2003;37:4-21. 21. Balistreri WF, Bezerra JA. Whatever happened to “neonatal hepatitis”? Clin Liver Dis. 2006;10:27-53,v. 22. Balistreri WF. Bile acid therapy in pediatric hepatobiliary disease: the role of ursodeoxycholic acid. J Pediatr Gastroenterol Nutr. 1997;24:573-89. 23. Sokol RJ, Mack C, Narkewicz MR, Karrer FM. Pathogenesis and outcome of biliary atresia: current concepts. J Pediatr Gastroenterol Nutr. 2003;37:4-21. 24. Chardot C, Carton M, Spire-Bendelac N, Le Pommlet C, Golmard j, Rending R, Auvert B. Is the Kasai operation still indicated in children older than 3 months diagnosed with biliary atresia? J Pediatr. 2001;138:224-8. 25. Karrer FM, Price MR, Bensard DD, Sokol RJ, Narkenwicz MR, Smith DJ, Lilly JR. Long-term results with the Kasai operation for boliary atresia. Arch Surg. 1996;131:493-6. 26. Carvalho E, Ivantes CA, Bezerra JA. Extrahepatic biliary atresia: current concepts and futuredirections. J Pediatr (Rio J). 2007;83(2):105-20. 27. Jesus LE, Monteiro PACC. Surgical treatment of biliary atresia: the Hospital Municipal Jesus experience 1997-2000. Rev Col Bras Cir. 2000;28(2):97-103. 39 Relato de Caso Associação entre melanoma e síndrome de Kipplel-Trenaunay Association between melanoma and Klippel-Trenaunay syndrome Ana Paula de Carvalho Odoni Rocha1 Sueli Monterroso da Cruz2 RESUMO Quando ocorre perda de regulação na angiogênese, podem ocorrer diversas doenças, como isquemias, doenças inflamatórias, neurodegeneração, maformações vasculares e câncer. Tanto nos casos de melanoma como nas mal formações vasculares, na qual se enquadra a síndrome de KipplelTrenaunay, observa-se a hiperexpressão de fator vascular endotelial. O melanoma maligno é o câncer de pele mais letal, altamente angiogênico, altamente metastático e refratário a todos os tratamentos. O aumento dos níveis séricos do fator de crescimento vascular endotelial se correlaciona fortemente com pior prognóstico do melanoma. Buscamos, por meio do relato de caso de uma paciente, de 58 anos, portadora de Síndrome de Kipplel-Trenaunay com diagnóstico de melanoma inicial, tratado com ressecção cirúrgica, até momento sem evidencia de recidiva, avaliar a incidência e prognóstico do paciente diagnosticado com melanoma e portador dessa síndrome. ABSTRACT The loss of regulation in angiogenesis may predispose many diseases, such as ischemia, inflammatory diseases, neurodegeneration, vascular disorders and cancer. In the cases of melanoma and in vascular malformations, in which is inserted the Kipplel-Trenaunay syndrome, overexpression of vascular endothelial factor occurs. Malignant melanoma skin cancer is the most lethal, highly angiogenic, highly metastatic and refractory to all treatments. Increased serum levels of vascular endothelial growth factor correlates strongly with poor prognosis of melanoma. We look assess the incidence and prognosis of patients diagnosed with this syndrome and melanoma through the case report of a 58-year patient with KipplelTrenaunay syndrome with initial diagnosis of melanoma, treated with surgical resection, without evidence of recurrence. Key words: Melanoma. Kipplel-Trenaunay Syndrome. Angiogenesis. Descritores: Melanoma. Síndrome de Kipplel-Trenaunay. Angiogênese. Introdução A Síndrome de Kipplel-Trenaunay apresenta-se com tríade de manifestações que incluem manchas vinho do porto, hipertrofia óssea e dos tecidos moles, veias varicosas com ou sem malformações venosas. Afeta geralmente uma das extremidades e proporciona crescimento acentuado dessa região. A presença de pelo menos duas dessas características permite seu diagnóstico1-2. Foi descrita inicialmente em 1900, por dois médicos franceses, Maurice Klippel e Paulo Trenaunay, que relataram dois pacientes com lesões hemangiomatosas da pele associado com tecido macio assimétrico e hipertrofia óssea, e cunhou o termo "nevo variqueux osteohypertrophique", sendo mais trade chamada de Sindrome de Kipplel-Trenaunay3. Para permitir crescimento de todo e qualquer tecido celular, como desenvolvimento embrionário, ciclo menstrual e cicatrização, as células devem recrutar novos vasos sanguíneos, primeiro por vasculogênese. Vasos embrionários formam-se a partir de precursores endoteliais, em seguida, ocorre a angiogênese, que é o surgimento das colunas de tecidos intersticiais na luz de vãos sanguíneos preexistentes4. Quando a formação de vasos sanguíneos sofre perda de regulacão, numerosas doenças podem ser originadas, como: malformações vasculares, isquemias neurodegeneração e doenças neoplásicas5. A desregulação angiogênica ocorre em mais de 90% dos tumores sólido. O melanoma maligno é o câncer de pele mais letal, altamente angiogênico, altamente metastático e refratário a todos os tratamentos6. O aumento dos níveis séricos de fator de crescimento vascular endotelial correlaciona-se fortemente com a progressão do melanoma e com pior prognóstico. Células de melanoma secretam várias citocinas, incluindo fator de crescimento pró-angiogênico VEGF-A, de fibroblastos, fator de crescimento de plaquetas, interleucina-8, e fator de crescimento de transformação que modulam a angiogênese, alterando os níveis de expressão a partir do tumor permitindo o crescimento vertical e, em seguida, metastático invasivo. 1) Estagiária de Oncologia do Hospital Ana Costa, Santos/SP. 2) Chefe do Serviço de Oncologia do Hospital Ana Costa, Santos/SP. Instituição: Serviço de Oncologia do Hospital Ana Costa, Santos/SP, Brasil. Correspondência: Rua Pedro Américo, 60 – 11075-905 Santos/SP, Brasil. E-mail: Recebido em: 30/11/2012; aceito para publicação em: 05/02/2013; publicado online em:30/05 /2013. Conflito de interesse: nenhum. Fonte de fomento: nenhuma. 40 Revista Médica Ana Costa, v. 18, n. 2, p. 40 - 41 abr / mai / jun 2013 Relato de caso Paciente de 58 anos, feminina, natural e procedente de Santos, veio com diagnósticos de Síndrome de Kipplel-Trenaunay desde a infância, com hipertrofia óssea, alterações vinho de porto e veias varicosas em membro inferior direito. Em agosto em 2008, notou aparecimento de nevo enegrecido em membro comprometido pela síndrome. Foi realizada a ressecção cirúrgica em setembro de 2008 de lesão compatível com melanoma com tamanho de 2,00 mm, Breslow 3,00 mm, sem ulceração, margens livres e ausência de linfonodo comprometido. Tomografia de tórax e abdome e desidrogenase lática estavam sem alterações. Foi iniciado seguimento sem evidência de recidiva até momento. Discussão Pouca literatura descreve associação de melanona e Síndrome de Kipplel-Trenaunay, o que em parte se deva a raridade desta sindrome que acomete 1/27500 recém-nascidos3. Conforme o caso descrtito, a maioria dos casos de síndrome de Kipplel-Trenaunay são esporádicos. No entanto, a literatura relata, em alguns casos, alterações cromossômicas, como translocações t (5; 11) (q13.3; p15.1) , t (8; 14) (q22.3; q13) e um cromossomo supranumerário anel adicional 18. A constatação de três defeitos citogenéticas diferentes associados com Síndrome de Kipplel Trenaunay pode sugerir que a síndrome é geneticamente heterogénea e vários genes diferentes podem ser envolvidos em diferentes casos5. A pele humana apresenta grande expressão de agentes sensíveis a hipóxia, tais como nitroimidazole, no compartimento basal da epiderme. Nos pacientes com síndrome de Kipplel-Trenaunay, essa epiderme já é hipóxica pela alteração vascular pré-existente, o que pode proporcionar um ambiente permissivo para melanócitos displásicos evoluírem para melanoma, conforme o caso descrito, em que o desenvolvimento de melanoma ocorreu no membro afetado pela síndrome5-6. O estímulo angiogênico presente na síndrome de KipplelTrenaunay também pode favorecer aparecimento de melanoma bem como outros tumores, em outras partes do corpo que não o membro acometido pela síndrome, como relatado em paciente que desenvolveu melanoma em região de coroide1-7. Há poucas evidências na literatura, não sendo possível avaliar a associação das duas condições. Entretanto, uma vez que está definida a hiperexpressão angiogênica nessas duas afecções, é prudente que os pacientes com síndrome de Kipplel-Trenaunay sejam acompanhados frequentemente, quanto a presença de alterações de pele para intervenção diagnóstica e tratamento precocemente. Revista Médica Ana Costa, v. 18, n. 2, p. 40 - 41, abr / mai / jun 2013 Referências 1. Simas A, Matos C, Lopes da Silva R, Brotas V, Teófilo E, Albino Pereira J. Epithelioid Angiosarcoma in a Patient with Klippel-Trénaunay-Weber Syndrome: An Unexpected Response to Therapy. Case Rep Oncol. [Periódico online] 2010 [citado 2010 Apr 30]; 3(2):148-53. Disponível em: http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/20740188 2. Leon CA, Braun Filho LR, Ferrari MD, Guidolin BL, Jardim BJ. KlippelTrenaunay syndrome: case report. An Bras Dermatol. [Periódico online]. 2010 [citado Feb 2010];85(1): 93-6. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S036505962010000100015&lng=en. http://dx.doi.org/10.1590/S036505962010000100015 Iqbal Zea M., Hanif M, AnsarA. Klippel-Trenaunay Syndrome: a case report with brief review of literature. J Dermatol Case Rep. [Periódico online] 2009 [citado 2009 Dec 30]; 3(2):148-153. Disponível em: http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC3163347/ 4. Chun F, Ping O, Ayse Timur A, Ping H, Sun- Ah Y, Ying H, Tie K, Driscol Qiyun C, Qing Kenneth W. Novel roles of GATA1 in regulation of angiogenic factor AGGF1 and endothelial cell function. J Biol Chem. [Periódico online] 2009 [citado 2009 Aug 28]; 284(35): 23331-43. Disponível em: http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC2749107/ 5. Timur AA, Driscoll DJ, Wang Q. Biomedicine and diseases: the KlippelTrenaunay syndrome, vascular anomalies and vascular morphogenesis. Cell Mol Life Sci. [Periódico online] 2005 [citado 2005 Jul]; 62(13):1434-47. Disponível em: http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC1579804/ 6. Dewing D, Emmett M, Pritchard Jones R. The roles of angiogenesis in malignant melanoma: trends in basic science research over the last 100 years. ISRN Oncol. [Periódico online] 2012 [citado 2012 Jun 7] 546927. Disponível em: http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC3376762/ 7. Manquez ME, Shields CL, Demirci H, Shields JA, Berg P, Peters III G. Choroidal melanoma in a teenager with Klippel-Trénaunay-Weber syndrome. J Pediatr Ophthalmol Strab. [Periódico online] 2006 [citado July/August 2006 ]- 43( 4): 197-198. Disponível em: http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/16915894 41 Relato de Caso Fibrose cística Cystic fibrosis Cynthia Aparecida da Silva Rocha1 Waldimir Carollo2 RESUMO A fibrose cística é uma doença genética autossômica recessiva, multissistêmica, de expressão clínica variada, sendo a perda de função pulmonar e a insuficiência pancreática exócrina as mais comuns. Apresenta-se um caso clínico de um paciente masculino, 26 anos, com diagnóstico de fibrose cística, queixando-se de quadro febril e escarro fétido amarelado em moderada quantidade. Indicada internação hospitalar com hipótese diagnóstica de bronquiectasias infectadas, para administração de antibioticoterapia endovenosa. Solicitada análise de escarro que demonstrou Staphylococcus aureus e Proteus sp, sendo tratado com ceftriaxone e clindamicina, conforme antibiograma. ABSTRACT Cystic fibrosis is a genetic disease, autossomic recessive, multisystemic, characterized by a clinical expression quite varied (the progressive loss of lung function and the exocrine pancreatic insuficiency are the most common). Report a clinical case about a masculine patient, 26 years old, previously diagnosed with cystic fibrosis disease, complaining about fever and a moderate amount of fetid yellowish sputum. Indicated hospitalization based on diagnosis hypothesis of infected bronchiectasis, for administration of intravenous antibiotics. Requested sputum analysis that showed Staphylococcus aureus and Proteus sp, treated with ceftriaxone and clindamycin, according the antibiogram. Key words: cystic fibrosis; diagnosis; treatment. Descritores: fibrose cística; diagnóstico; tratamento. Introdução A fibrose cística é uma doença genética autossômica recessiva, multissistêmica, de expressão clínica variada, sendo a perda de função pulmonar e a insuficiência pancreática exócrina as mais comuns1. O diagnóstico baseia-se em achados fenotípicos, história familiar e testes de screening para fibrose cística no período neonatal positivos1,2. O tratamento deve ser holístico e multidisciplinar, objetivando melhor performance de órgãos e sistemas. A partir do relato de um caso clínico de paciente portador de fibrose cística, internado na enfermaria de Pneumologia de Hospital Ana Costa, abordaremos os principais aspectos fisiopatológicos, diagnóstico e tratamento de tal entidade clínica. Relato de Caso Paciente masculino, 26 anos, solteiro, natural e procedente de Santos, em acompanhamento em ambulatório de Pneumologia por diagnóstico de fibrose cística, realizado aos nove meses de idade (prova do suor: 200 e 160mmol de cloro/ml de suor - normal: até 40mmol de cloro/ml de suor - em primeira e segunda amostras respectivamente). Fazia uso domiciliar de tobramicina inalatória, lipase oral e insulina NPH subcutânea. Queixava-se de quadro febril e escarro fétido amarelado em moderada quantidade. Indicada internação hospitalar com hipótese diagnóstica de bronquiectasias infectadas, para administração de antibioticoterapia endovenosa. Solicitada análise de escarro que demonstrou Staphylococcus aureus e Proteus sp, sendo tratado com ceftriaxone e clindamicina, conforme antibiograma. Trazia consigo alguns exames complementares prévios, tais como: 1) Espirometria: pré-broncodilatador com VEF1= 1,55L (39,38%), CVF = 2,77L (60,56%) e VEF1/CVF= 64,39%; pósbroncodilatador com VEF1= 3,14L (37,45%), CVF = 3,71L (66,47%) e VEF1/CVF= 55,79%, concluindo-se tratar-se de distúrbio ventilatório obstrutivo grave com CVF reduzida; 2) Ecocardiograma: sem alterações; 3) USG abdome total: sem alterações. Durante a internação, foi solicitada TC tórax que demonstrou espessamento peribrônquico com bronquiectasias centrais, áreas de perfusão em mosaico em lobos superiores pulmonares e opacidades nodulares ramificadas em lobo inferior direito e língula. Após 10 dias em regime hospitalar, paciente apresentou melhora clínico-laboratorial, sendo concedida alta hospitalar e sequência de tratamento em ambulatório de especialidade. 1) Médica Residente de Clínica Médica do Hospital Ana Costa, Santos/SP. 2) Médico Pneumologista, chefe da Enfermaria de Pneumologia do Hospital Ana Costa, Santos/SP. Instituição: Serviço de Pneumologia do Hospital Ana Costa, Santos/SP. Correspondência: Rua Pedro Américo, 60 – 11075-905 Santos/SP, Brasil. E-mail:[email protected] Recebido em: 30/11/2012; aceito para publicação em: 31/01/2013; publicado online em:30/05 /2013. Conflito de interesse: nenhum. Fonte de fomento: nenhuma. 42 Revista Médica Ana Costa, v. 18, n. 2, p. 42 - 44 abr / mai / jun 2013 Discussão Trata-se de uma doença genética autossômica recessiva, causada por uma mutação no gene que codifica o regulador de condutância transmembrana (CFTR), responsável pela regulação do transporte de cloretos por entre a membrana plasmática de células exócrinas, localizado no braço longo do cromossomo 7 2,3,4. Em 2010, de acordo com a Cystic Fibrosis Foundation Patient Annual Data Report, nos Estados Unidos, estimava-se haver 30000 pacientes portadores de fibrose cística (FC), sendo a idade média predita de sobrevida de 38,3 anos, ocorrendo predominantemente em brancos, afetando igualmente homens e mulheres5. A expressão clínica da doença é variada, caracterizada principalmente por perda progressiva da função pulmonar, insuficiência pancreática exócrina, infertilidade masculina e altas concentrações de cloreto no suor 2. O diagnóstico é feito pela presença de pelo menos 01 achado fenotípico (tabela 1), história familiar de fibrose cística, ou um screening positivo pra a doença no período neonatal, e uma documentação da disfunção do CFTR1,2,3. Tabela 1: Achados fenotípicos consistentes com fibrose cística · Doença sinopulmonar crônica: - colonização/infecção crônica por patógenos típicos da FC (S. aureus, H.influenzae, P. aeruginosa e B. cepacia); - tosse e expectoração crônicas; - anormalidades persistentes em RX tórax (bronquiectasias, atelectasias, infiltrados e hipeinsuflação); - obstrução de vias aéreas com respiração difícil e ruidosa; - pólipos nasais, com RX ou TC anormais de seios paranasais. · Anormalidades gastrointestinais e nutricionais: - intestinal: íleo meconial, síndrome da obstrução intestinal distal e prolapso retal; - pancreático: insuficiência pancreática e pancreatite de repetição; - hepática: doença hepática crônica com evidência clínica ou histológica de cirrose biliar focal ou cirrose multilobar; - nutricional: retardo no desenvolvimento com hipoproteinemia e edema, complicações secundárias à deficiência de vitaminas lipossolúveis. · Síndrome perdedora de sal: - depleção aguda de sal e alcalose metabólica crônica. · Infertilidade masculina: - por anormalidades urogenitais, resultando em azoospermia obstrutiva. O teste de screening para FC é o teste do suor. Constitui-se de uma mensuração quantitativa de cloreto em 75mg de suor, após estímulo com pilocarpina, em duas ocasiões diferentes. Concentrações ≥ 60 mmol/l são consideradas diagnósticas e, entre 40-60mmol/l, boderline2,3,4. A disfunção do gene CFTR é demonstrada pela sua genotipagem: a presença de duas mutações num contexto clínico pertinente e Revista Médica Ana Costa, v. 18, n. 2, p. 42 - 44 abr / mai / jun 2013 com história familiar compatível, tem sensibilidade diagnóstica de 95% 2,3, porém, a presença de apenas uma ou nenhuma mutação não tem significado diagnóstico2. O tratamento da FC deve ser holístico, atenuando sintomas e corrigindo disfunções orgânicas, com o apoio de uma equipe multidisciplinar. O suporte clínico fornecido ao sistema respiratório é baseado em alguns pilares: 1) Antibióticoterapia a.Nas exacerbações, deve ser guiada pela cultura de escarro e antibiograma; de forma empírica, tendo em vista os principais patógenos causadores da infecção, inicia-se fluroquinolonas (exacerbações leve/moderada) ou associação de dois antibióticoa anti-pseudomonas (por exemplo ß-lactâmicos e aminoglicosídeos) nas exacerbações moderada/grave1,2; b.Mediante infecções por S.aureus, com cultura de escarro positiva, além da terapêutica durante a exacerbação no momento do diagnóstico, inicia-se tratamento a longo prazo com flucloxacilina1,2; c.Devido às bronquiectasias pulmonares, a infecção por P. aeruginosa torna-se comum e sua erradicação precoce é feita com ciprofloxacino oral e colistina inalatória por 3-6 semanas1,2; d.Já a infecção crônica pela P. aeruginosa é tratada com antibióticoterapia inalatória: tobramicina 60-80mg 2-3vezes/dia, sob nebulização, por 28 dias, com espaço de 28 dias entre os ciclos, ou colistina 500 000 -1 000 000UI 2vezes/dia sob nebulização6,7; o uso crônico de antibiótico oral é inconclusiva e, portanto, não recomendada1,2. 2)Fisioterapia respiratória: tapotagem e drenagem postural facilitam a remoção de secreção usando a gravidade1,2. 3)Mucolíticos: ajudam na diminuição de recorrências de exacerbações e na melhora da função pulmonar; utiliza-se DNAase 2,5mg 1vez/dia, sob nebulização, ou inalação com solução salina hipertônica a 3-7%1,2. 4)Broncodilatadores: para a hiperreatividade brônquica, os ßbloqueadores de curta duração estão indicados1, 2. 5)Agentes antinflamatórios: corticoide oral na dose de 1-2mg/kg em dias alternados parecem retardar a doença pulmonar; altas doses de ibuprofeno (20-30mg/kg/dia) parecem diminuir a taxa de declínio do VEF11,2. 6)Oxigenioterapia suplementar: indicado se PaO2 ≤ 55 mmHg ou <59mmHg com edema de membros inferiores, policitemia ou evidência eletrocardiográfica de sobrecarga de câmaras direitas; a fim de prevenir hipertensão pulmonar, no exercício se SatO2 < 90% e no sono se SatO2 < 90% em mais de 10% do tempo total de sono1,2. Em relação aos cuidados com as manifestações extra-pulmonares, destacam-se: 1)Insuficiência pancreática exócrina: 500U lipase/kg/refeição e 250U/kg/lanche; suplementação de vitaminas lipossolúveis (A, D, E e K) 1,2. 2)A prevalência de diabetes mellitus e intolerância à glicose aumentam com o avançar da idade; monitorização com TTGO permite intervenção insulínica precoce1,2. 3)A prevalência de osteoporose em adultos com FC varia de 3877%, portanto, vigilância intensa, exercício físico e suplementação com cálcio, vitaminas D e K são essenciais1,2. 4)95% dos pacientes do sexo masculino portadores de FC são inférteis por azoospermia obstrutiva, sendo a fertilização possível por concepção assistida2. O transplante pulmonar é feito a partir de doador cadáver, preferencialmente bilateral, a fim de evitar infecção no enxerto. Os critérios para indicação de transplante são VEF1 < 30% do predito, hipoxemia severa, hipercapnia, dano funcional progressivo com frequentes hospitalizações para tratamento de exacerbações recorrentes, complicações como hemoptise e resistência bacteriana à antibióticos1,2,3. Considerações finais Conhecer a fisiopatologia, reconhecer parâmetros para diagnóstico e instituir terapêutica adequada são fundamentais para controle de tal patologia e melhora da qualidade de vida do paciente. 43 Referências 1.Yankaskas JR, Marshall BC, Sufisn B, Simon RH, Rodman D. Cystic fibrosis adult care: consensus conference report. Chest 2004; 125; 1S39S. 2.Dalcin PTR, Silva FAA. Cystic fibrosis in adulta: diagnostic and therapeutic aspects. J Bras Pneumol. 2008; 34(2): 107-117. 3.Gershman AJ, Mehta AC, Infeld M, Budev MM. Cystic fibrosis in adults: an overview for the internist. Cleveland Clinic Journal of Meficine 2006; 79(12): 1065-1074. 4.Welsh MJ. Fibrose Cística. In: Goldman L, Ausiello D, editors. Cecil Tratado de Medicina Interna. Rio de Janeiro: Elsevier; 2009. p.728-733. 5.Cystic Fibrosis Foundation Patient Annual Data Report [Acesso em 20 de agosto de 2012]. Disponível em: http://www.cff.org/UploadedFiles/LivingWithCF/CareCenterNetwork/Patie ntRegistry/2010-Patient-Registry-Report.pdf 6.Jensen T, Pedersen SS, Garne S, ET AL. Colistin Inhalation therapy in cystic fibrosis patients with chronic Pseudomonas aeruginosas lung infection. J Antimicrob Chemother 1987; 19:831-838. 7.Littlewood JM, Miller MG, Ghoneim AT, et al. Nebulised colomycin for early pseudomonas colonization in cystic fibrosis (letter). Lancet 1985: 1:865. 44 Revista Médica Ana Costa, v. 18, n. 2, p. 42 - 44 abr / mai / jun 2013 Relato de Caso Estenose de artéria renal Renal artery stenosis 1 Nastri Castro 2 Rodolfo Leite Arantes 3 Leonardo Martins Barroso RESUMO ABSTRACT Introdução: a estenose arterial renal corresponde de 1 a 5% das causas de hipertensão arterial, sendo grande parte delas causadas por aterosclerose. As manifestações clínicas podem ser relacionadas tanto à hipertensão arterial como à nefropatia isquêmica. Existe forte associação da doença aterosclerótica renal com outros vasos arteriais, sugerindo a necessidade da ampliação da investigação. Pacientes portadores de múltiplos fatores de risco para a aterosclerose, como a diabetes mellitus, hipertensão arterial, hipercolesterolemia e tabagismo são aqueles onde a investigação de doença multiarterial deve ser estimulada. Relato de caso: Apresentamos o caso clínico de um paciente portador de doença renovascular, que evoluiu com quadros repetidos de edema agudo de pulmão. O diagnóstico necessitou da suspeita clínica por meio da doença aterosclerótica sistêmica. A arteriografia renal foi o procedimento padrão-ouro para diagnóstico e tratamento, permitindo que o paciente obtivesse melhora da qualidade de vida. Introduction: The renal artery stenosis corresponds to 1 to 5% of the causes of hypertension, and most of them caused by atherosclerosis. Clinical manifestations may be related to both hypertension and ischemic nephropathy. There is a strong association with other atherosclerotic renal arterial vessels, suggesting the need to expand the research. Patients with multiple risk factors for atherosclerosis, such as diabetes mellitus, hypertension, hypercholesterolemia, and smoking are those where the investigation of multivessel disease should be encouraged. Case report: We present the of a patient with renovascular disease, which progressed with repeated frames of acute pulmonary edema. It required the diagnostic suspicion by systemic atherosclerotic disease, and renal arteriography is the gold standard procedure for diagnosis and treatment, allowing the patient to obtain improved quality of life. Key words: High Blood Pressure. Renal Artery Stenosis. Renovascular Hypertension. Atherosclerosis. Coronary Artery Disease. Descritores: Hipertensão Arterial. Estenose de Artéria Renal. Hipertensão Renovascular. Aterosclerose. Doença Arterial Coronária. Introdução A doença renovascular é caracterizada por estenose uni ou bilateral da artéria renal ou de seus ramos principais, desencadeada e mantida por isquemia do tecido renal e de estenose superior a 70% da artéria renal. Considera-se clinicamente importante quando determina estenose hemodinamicamente significativa em uma ou ambas as artérias renais, capaz de comprometer a pressão de perfusão e o fluxo sanguíneo renal, determinando HAS e, eventualmente, insuficiência renal1. A causa mais frequente da doença renovascular é a aterosclerose (65%), observada caracteristicamente em pacientes mais idosos, com fatores de risco para doença cardiovascular, acometendo geralmente, a região proximal da artéria renal1. A aterosclerose é uma doença inflamatória crônica sistêmica de origem multifatorial que ocorre em resposta à agressão endotelial, acometendo principalmente a camada íntima de artérias de médio e grande1,2. Sendo assim, há o envolvimento dos diferentes territórios vasculares, como artérias coronárias, renais e periféricas. Relato de caso Paciente de 73 anos, caucasiano, masculino, hipertenso, coronariopata, revascularizado há 20 anos, submetido a implante de stent em membro inferior direito há 1 ano veio encaminhado por quadro de dor precordial, de moderada intensidade, sem irradiação, com duração de duas horas, associado a dispnéia súbita, estertoração pulmonar e elevação da pressão arterial, na ocasião 160x100 mmHg. Encontrava-se assintomático, em bom estado geral, corado, hidratado, anictérico, acianótico, afebril, eupneico, contactuante. A pressão arterial era de 150 x 100 mmHg, frequência cardíaca de 80bpm, com saturação de O2: 98%. Apresentou duas vezes quadro semelhante ao de entrada. O exames complementares anteriores mostraram doença em artérias carótidas e vertebrais estabilizada e de membros inferiores. A cineangiocoronariografia realizada anteriormente evidenciava doença multiarterial e oclusão de artéria descendente anterior e circunflexa; artéria coronária direita fina com lesão proximal de 70% sem condições de enxertos. A hipótese diagnóstica inicial levava a crer que os sintomas estava relacionados com a doença aterosclerótica coronariana, tendo em vista as internações serem acompanhadas de dispnéia e dor 1. Médica Residente de Clínica Médica do Hospital Ana Costa, Santos/SP. 2. Médico Cardiologista do Hospital Ana Costa, Santos/SP. 3. Médico Cardiologista e Hemodinamicista do Hospital Ana Costa, Santos/SP. Instituição: Serviço de Cardiologia do Hospital Ana Costa, Santos/SP. Correspondência: Rua Pedro Américo, 60 – 11075-905 Santos/SP, Brasil. E-mail: [email protected] Recebido em: 30/11/2012; aceito para publicação em:07/02/2013; publicado online em:30/05 /2013. Conflito de interesse: nenhum. Fonte de fomento: nenhuma. Revista Médica Ana Costa, v. 18, n. 2, p. 45 - 47 abr / mai / jun 2013 45 precordial típica. Após otimização terapêutica, recebeu alta em boas condições, sendo sugerido a estratificação não invasiva para doença coronariana por meio da cintilografia de perfusão do miocárdio, que não revelou isquemia residual. Duas semanas depois, reinternou com quadro semelhante. Foi estabilizado clinicamente, mas um dado que chamou a atenção foi a discreta elevação da creatinina, apesar de bem hidratado e não ser portador de diabetes. A ultra-sonografia mostrou assimetria renal com alterações na relação córtico- medular. Optou-se por um novo estudo hemodinâmico mas ampliando-se para artérias renais. O resultado das artérias coronárias foi semelhante ao anterior, mas evidenciou-se lesão em artéria renal esquerda de 95% - Figura 1. Após o implante de stent na artéria renal esquerda, o paciente teve melhora da função renal e está sob acompanhamento ambulatorial, oligossintomático – Figura 2. Figura 1 – Arteriografia renal pré-colocação de stent. Figura 2 – arteriografia renal pós-colocação de stent. Discussão A doença aterosclerótica da artéria renal é uma condição prevalente, especialmente em pacientes com doença coronária associada. Geralmente é difusa e acomete artérias coronárias, renais e periféricas. Estudos mostram que isso ocorre, principalmente, pela 46 presença de muitas características clínicas semelhantes entre a doença arterial coronária e doença renal aterosclerótica: idade avançada, hipertensão arterial, insuficiência renal, doença carotídea e doença arterial periférica. A população de pacientes referida para cinecoronariografia frequentemente exibe muitas dessas características clínicas, sugerindo forte associação entre doença coronariana e renal aterosclerótica. Quanto maior o número de coronárias envolvidas, maior a probabilidade de estenose significativa da artéria renal. Assim, a EAR é fator independente de mortalidade cardiovascular, com 20% dos pacientes portadores evoluindo a óbito em quatro anos1. O maior risco associado a EAR não parece ser devido exclusivamente à presença de hipertensão arterial, mas também a outros fatores relacionados à aterosclerose renal. Mortalidade por infarto do miocárdio, necessidade de angioplastia coronária e cirurgia de revascularização miocárdica são estatisticamente muito maiores quando existe estenose em artérias renais. Assim, torna-se importante a avaliação da presença de DAC em pacientes com EAR aterosclerótica e vice-versa1. O diagnóstico da doença arterial renal deve ser ativamente pesquisado principalmente em pacientes hipertensos com disfunção renal. Deve-se, entretanto, ressaltar que, aparentemente, são os pacientes com função renal ainda preservada aqueles que mais beneficiam-se com a revascularização3. Estudos recentes4 mostraram resultados com angioplastia nos pacientes portadores de estenose de artéria renal por aterosclerose não são tão satisfatórios quanto os demonstrados em displasia fibromuscular. As principais séries publicadas mostraram um índice de cura de pelo menos 50% e melhora em cerca de 35% nos pacientes com fibrodisplasia, enquanto para os casos de lesões ateroscleróticas a cura da hipertensão não é descrita em mais de 30% e a melhora variou de 19% a 62%, conforme a série. Recentemente, os resultados do estudo DRASTIC suscitaram grande discussão sobre os benefícios da angioplastia no controle da pressão arterial de pacientes com estenose de artéria renal aterosclerótica. Neste, que é o maior estudo comparativo, até o momento, entre angioplastia e tratamento medicamentoso em pacientes com estenose renal aterosclerótica, demonstrou-se que a angioplastia não foi mais eficaz que o tratamento medicamentoso anti-hipertensivo isolado após um ano de tratamento. No entanto, os resultados deste estudo não devem desencorajar o procedimento, pois um grupo considerável de pacientes considerados previamente para tratamento clínico necessitaram intervenção por angioplastia no decorrer do estudo devido à refratariedade ao tratamento clínico, e apresentaram melhor controle após o procedimento, embora não tivessem atingido níveis considerados normais. Além disso, em apenas um paciente houve implante de endoprótese vascular (stent), que tem sido considerada uma técnica promissora em pacientes com lesões ostiais ateroscleróticas de artéria renal. Em uma metanálise de 14 estudos que avaliaram os resultados do implante de stent em estenose de artéria renal, Leertouwer TC et al observaram que o implante de stent teve uma alta taxa de sucesso técnico (98%) e 11% de complicações mais graves. Além disso, a freqüência de cura ou melhora de hipertensão foi de 69%, enquanto a função renal melhorou em 30% e estabilizou em 38% dos pacientes, com uma taxa de reestenose de 17%. Mais recentemente, Watson et al. demonstraram que o implante de stents em pacientes com insuficiência renal crônica e hipertensão renovascular aterosclerótica bilateral, melhora ou estabiliza a função renal e preserva o tamanho renal3,5. Assim, o tratamento por implante de stent de lesões estenóticas de artéria renal por aterosclerose deve ser considerada em vários grupos de pacientes: aqueles com elevadas concentrações de creatinina plasmática e estenose de artéria renal bilateral, portadores de estenose grave de artéria renal em rim único, e em pacientes portadores de estenose de artéria renal com hipertensão arterial refratária ao tratamento clínico ou com edema agudo de pulmões Revista Médica Ana Costa, v. 18, n. 2, p. 45 - 47 abr / mai / jun 2013 recorrente5. Em pacientes portadores de doença aterosclerótica, o acometimento vascular nem sempre é restrito, sugerindo a ampliação da investigação. Referências 1. Macedo TA, Bortolotto LA. Associação de estenose de artéria renal e doença coronária em pacientes com hipertensão e aterosclerose. Rev Bras Hipertens. 2009;16(3):190-1. 2. Sposito AC, Sposito AC, Caramelli B, Fonseca FAH, Bertolami MC, Afiune Neto A, Souza AD, Lottenberg AMP, Chacra AP, Faludi AA, LouresVale AA, Carvalho AC, Duncan B, Gelonese B, Polanczyk C, Rodrigues Sobrinho CRM, Scherr C, Karla C, Armaganijan D, Moriguchi E, Saraiva F, Pichetti G, Xavier HT, Chaves H, Borges JL, Diament J, Guimarães JI, Nicolau JC, Santos JE, Lima JJG, Vieira JL, Novazzi JP, Faria Neto JR, Torres KP, Pinto LA, Bricarello L, Bodanese LC, Introcaso L, Malachias MVB, Izar MC, Magalhães MEC, Schmidt MI, Scartezini M, Nobre M, Foppa M, Forti NA, Berwanger O, Gebara OCE, Coelho OR, Maranhão RC, Santos Filho RD, Costa RP, Barreto S, Kaiser S, Ihara S, Carvalho T, Martinez TLR, Relvas WGM, Salgado W. IV Diretriz Brasileira sobre Dislipidemias e Prevenção da Aterosclerose: Departamento de Aterosclerose da Sociedade Brasileira de Cardiologia. Arq Bras Cardiol. 2012. 3. Wainstein, Marco V, Lemos P. Doença aterosclerótica da artéria renal. Rev Bras Cardiol Invas. 2007;15(1):70-2. 4. Bernardes Silva H, Frimm CC, Bortolotto LA. Angioplastia percutânea e revascularização cirúrgica em hipertensão renovascular. Experiência no tratamento e seguimento de longo prazo em 124 pacientes. Arq Bras Cardiol. 1994;62:417-23. 5. Bortolotto LA, Malachias MVB. Atualização no diagnóstico e tratamento das principais causas de hipertensão secundária. Rev Bras Hipertens. 2011;18(2):46-66. Revista Médica Ana Costa, v. 18, n. 2, p. 45 - 47 abr / mai / jun 2013 47 Relato de Caso Tumor carcinóide Carcinoid tumor Rebeca Mariá Lopes Grezos¹, Sueli M. da Cruz² RESUMO Introdução: os tumores carcinóides são neoplasias de baixa prevalência, com lenta multiplicação e com pequena capacidade de metastização. Porém, são considerados neoplasias malignas e que portanto devem ser tratados cirurgicamente sempre que possível. Acometem principalmente o trato gastrointestinal e em menor número, o trato respiratório. Clinicamente, manifestam-se pela síndrome carcinóide, que inclui flushing, diarréia e hipertensão arterial. Relato de caso: paciente com quadro inicial de síndrome carcinóide, com algum retardo diagnóstico, foi submetida a tratamento clínico medicamentoso, associado à ressecção local, evoluindo oligossintomática, permacendo sob acompanhamento ambulatorial. ABSTRACT Introduction: Carcinoid tumors are tumors of low prevalence, with slow proliferation and metastasis of small capacity. However, they are considered malignant and therefore should be treated surgically whenever possible. They mainly affect the gastrointestinal tract and outnumbered, the respiratory tract. They manifested clinically by carcinoid syndrome, including flushing, diarrhea and hypertension. Case report: a patient with initial carcinoid syndrome, with some delayed diagnosis, underwent clinical treatment associated with local resection, evolving oligosymptomatic, as an outpatient. Key words: Carcinoid Tumors. Carcinoid Syndrome. OctreoScan. Descritores: Tumores Carcinóides. Síndrome Carcinóide. Octreoscan. Introdução Os tumores carcinoides são tumores raros. Sua incidência oscila em 0,7 casos por 100.0001,2. Trata-se de neoplasia derivada do tecido celular neuro-endócrino, de comportamento variado de acordo com sua localização. Acomete principalmente o trato digestório (73%)2,3,5, com predomínio do intestino delgado, apêndice cecal e reto, e o trato respiratório (aproximadamente 25%), em pacientes predominantemente na quinta década de vida ao diagnóstico1,4. Comumente, podem metastizar para o fígado1,2. Inicialmente descritos em 1888, por Lubarsch, que encontrou tumores no íleo distal durante uma autópsia, que considerou esses tumores similares, porém, morfologicamente distintos e menos agressivos que os adenocarcinomas, daí o termo carcinóide3. Relato de caso Paciente feminina, de 31 anos, parda, com quadro de hipertensão arterial e diarréia há aproximadamente 6 meses procurou prontoatendimento diversas vezes, sendo medicada com medicações sintomáticas com melhora transitória. Não apresentava antecedentes. Ao exame, apresentava-se PA 160 x 100mmHg, se outras alterações. Foi solicitada colonoscopia, que mostrou lesão submucosa em reto, de superfície lisa e aproximadamente 1cm. Realizou eco-endoscopia, com evidência de lesão restrita à submucosa, optando-se por polipectomia. O anatomopatológico revelou tumor carcinóide de mucosa retal, medindo 0,8cm, com pedículo comprometido. Foi iniciado anti-hipertensivo regular (losartan 25mg/dia), com controle dos níveis pressóricos. Os exames de estadiamento revelaram: endoscopia digestiva alta com gastrite crônica com hiperplasia linfóide reacional, pesquisa H pylori negativa; tomografia de tórax sem alterações, tomografia de abdome e pelve com esteatose hepática e microlitíase calicial bilateral; cromogranina 2,0, 5-hidroxiidolacético 3,4 e CEA 0,8. A imunoistoquímica do tumor carcinóide retal mostrou cromogranina negativa, enolase positiva, EMA positiva, SYNAP 998 positiva, KI67 positivo em 3% núcleos. Realizou colonoscopia de controle (18/01/12), com retite crônica inespecífica discreta. Evolui estável, sintomática para síndrome carcinóide, tendo sido solicitado Octreoscan para avaliação de outros focos, que resultou negativa. Discussão Fatores genéticos certamente estão envolvidos na gênese do tumor. Acredita-se que a deleção do gene supressor PLCb3 provoque descontrole de crescimento de células neuro-endócrinas, com perda do controle do processo de apoptose e desenvolvimento de neoplasias2. Os tumores carcinóides têm sido classificados de acordo com sua formação embriológica, se originários do intestino anterior (foregut), médio (midgut) ou posterior (hindgut). Os tumores de origem embrionária no intestino anterior acometem, na fase adulta, o trato respiratório e o timo3,4. Os originários no intestino médio são os de maior frequência, manifestando-se em jejuno, íleo e cólon direito e sendo os maiores produtores de serotonina2. Já os tumores originários do intestino posterior embrionário acometem o cólon esquerdo e o reto na fase adulta, raramente originando a síndrome 1) Estagiária de Oncologia do Hospital Ana Costa, Santos/SP. 2) Chefe do Serviço de Oncologia do Hospital Ana Costa, Santos/SP. Instituição: Serviço de Oncologia do Hospital Ana Costa, Santos/SP, Brasil Correspondência: Rua Pedro Américo, 60, Santos/SP, Brasil. E-mail: [email protected] Recebido em: 10/12/2012; aceito para publicação em: 28/01/2013; publicado online em:30/05 /2013. Conflito de interesse: nenhum. Fonte de fomento: nenhuma. 48 Revista Médica Ana Costa, v. 18, n. 2, p. 48 - 50 abr / mai / jun 2013 carcinóide, por produzirem pouca serotonina. Ainda podem ser classificados de acordo com a diferenciação, visando predizer o prognóstico desses pacientes, com análise do Ki67, marcador de proliferação celular e índice mitótico: tumor endócrino bem diferenciado (índice de proliferação < 2%), carcinome endócrino bem diferenciado (índice de proliferação 2 a 15%), carcinoma endócrino pobremente diferenciado (índice de proliferação 15%), tumores endócrinos mistos e lesões tumorlike4. A variabilidade na produção de hormônios de acordo com sua origem embrionária é fator presente nesse grupo de tumores. Podem produzir neuropeptídeos e aminas como a serotonina, ACTH, calicreína, histamina, catecolaminas, prostaglandinas, gastrina e insulina, gerando diversas reações orgânicas e originando diferentes quadros clínicos1,2. A síndrome carcinóide é de rara ocorrência, incidindo em 3% a 5% dos pacientes, geralmente já possuidores de neoplasias em estágio avançado de desenvolvimento e de disseminação e caracteriza-se pela secreção exagerada de serotonina produzida pelo tumor e se manifesta principalmente por flushing, diarréia, hipertensão arterial. Manifestações como alterações cardíacas, atingindo as câmaras direitas do coração podem estar presentes em até 50% dos pacientes. Outros sintomas incluem o bronco-espasmo. O quadro clínico é inespecífico e variado, de acordo com o perfil de produção endócrina e com a localização do tumor, o que dificulta um diagnóstico baseado no quadro clínico. Na maioria das vezes, o diagnóstico se faz por análise histológica de lesões de natureza a esclarecer, como achado histopatológico ou de exames complementares1,3,4. Assim, neoplasias acidentalmente encontradas e ressecadas apresentam surpreendentemente o diagnóstico ao exame anatomopatológico. O diagnóstico laboratorial é realizado por meio da dosagem urinária do ácido 5-hidroxiindolacético (5-HIAA), que consiste em produto da degradação da serotonina, assim como com a dosagem sérica de cromogranina A ( proteína presente nos grânulos da células neuroendócrinas) , que se encontram acima dos níveis da normalidade4. Exames de imagem podem ser usados para auxiliar no diagnóstico, localização e estadiamento de tumores carcinóides, tais como: radiografia de abdômen e exames contrastados14, ultra-sonografia abdominal, tomografia computadorizada, ultrasonografia endoscópica e endorretal e ressonância nuclear magnética, com valores diferentes de acurácia, sempre inferiores a 50%1,4. Exames mais específicos são baseados em cintilografia (octreoscan)2,3, com utilização de isótopos ligados a derivados da somatostatina, alcançando acurácia superior a 80%. Nos exames anatomopatológicos inconclusivos, o emprego de marcadores imunoistoquímicos, tais como a cromogranina-A e a sinaptofisina, possibilitam a definição do quadro. Apesar de apresentarem baixa taxa de crescimento e de metastatização, trata-se de entidade maligna e que deve ser submetida a tratamento cirúrgico sempre que possível. No caso de doença avançada, ou seja, com metástase à distância, são utilizados derivados da somatostatina, com paliação dos sintomas, possibilidade de redução das lesões e maior taxa de sobrevida. O diagnóstico precoce é fator prognóstico, principalmente nos tumores localizados no apêndice e reto. As lesões do reto podem provocar sintomas em até 50% dos casos, principalmente sangramento, constipação, dor e prurido anal. Após confirmação do diagnóstico de lesão carcinóide, a ultrasonografia endorretal possibilita a avaliação do grau de infiltração local4,5. A definição do tratamento a ser estabelecido depende da verificação do grau de disseminação local e à distância, sendo utilizados exames como a tomografia de pelve e de abdômen, a cintilografia. É fundamental a verificação da profundidade de invasão na parede do reto. Notadamente, a lesão retal é interpretada inicialmente como pólipo de natureza benigna, submetido à excisão endoscópica, sendo efetuado o diagnóstico de tumor neuroendócrino somente ao exame anatomopatológico posterior- Revista Médica Ana Costa, v. 18, n. 2, p. 48 - 50 abr / mai / jun 2013 mente efetuado. O tratamento consiste na ressecção sempre que possível, inclusive das lesões hepáticas, se houver. A complementação com métodos adjuvantes pode ser necessária. Deve-se preconizar a excisão cirúrgica radical, por ressecção anterior ou por amputação abdominoperineal do reto, em todos os casos de tumores carcinóides retais em que haja invasão da muscular própria, dimensões maiores que 1 cm de diâmetro, elevada atividade mitótica ou ulceração de mucosa3,4. Em pacientes com metástases hepáticas somente, comprovadamente por exames de imagem e de cintilografia é possível a realização de ressecções hepáticas com intenção curativa, elevando a sobrevida desses pacientes em cinco anos de 29% para 73%. Ressecções paliativas de metástases hepáticas, com o intuito de amenizar os sintomas da síndrome carcinóide por redução da massa tumoral, somente estão indicadas se mais de 90% do tecido neoplásico puder ser excisado2. Além do tratamento de ressecção do tumor e das metástases sempre que possível, outros métodos terapêuticos adjuvantes têm sido empregados e testados, tais como: radioterapia, quimioterapia (5-fluorouracil, dacarbazina, epirrubicina, adriamicina e outros compostos) e uso de interferon-a, proporcionando melhora na sintomatologia, porém, sem impacto comprovado na redução desses tumores. Além disso, derivados da somatostatina também podem ser utilizados no controle da sintomatologia de síndrome carcinóide. Acredita-se que em altas doses, induz apoptose e até regressão tumoral. Atualmente o octreotide tem sido utilizado nas doses de 0,05 a 0,5 mg SC três vezes ao dia e o lanreotide, 1 mg ou 5 mg SC três vezes ao dia. São inconvenientes a freqüência das administrações injetáveis, as reações observadas nos locais de aplicação e o custo do tratamento para os pacientes3,4,6. De recente lançamento, encontra-se o octreotide injetável em preparado de depósito para liberação prolongada (LAR), com uma aplicação mensal IM de 20 mg, com melhor adesão do paciente ao tratamento, porém com elevado custo de manutenção6. No tratamento de metástases hepáticas irressecáveis, têm sido empregadas desarterialização (cirúrgica ou por embolização por arteriografia) e a quimioembolização3,5. Os tumores carcinóides são considerados tumores indolentes, contudo, deve-se ter postura ativa na terapêutica, preferindo a ressecção cirúrgica das lesões e das metástases sempre que possível, associado a tratamento sintomático com melhora da qualidade de vida2,3. A sobrevida com doença disseminada ao diagnóstico e sem tratamento era de 18% em cinco anos. O uso dos análogos da somatostatina modificou esse índices para até 67%em cinco anos, com sobrevivência média total de 12 anos após o diagnóstico de doença metastática3,6. Portanto, apesar de doença avançada, o tratamento deve ser instituído, preferencialmente com derivados e análogos da somatostatina. Com relação a fatores prognósticos, a origem no intestino médio embrionário induz menores índices de sobrevida que os originários no intestino posterior. Em relação ao tamanho do tumor, lesões maiores que 2 cm apresentam potencial de metastatização maior. O carcinóide periampular apresenta comportamento clínico mais agressivo, com metástase linfonodal periduodenal em lesões < 1,0 cm, não relacionado ao tamanho do tumor e à atividade mitótica, devendo, consequentemente, ser considerado a parte1,3,5. Elementos patológicos preditivos da disseminação da doença identificaram três aspectos do tumor primário como fatores independentes: presença de mitose, invasão da camada muscular própria e tamanho > 2,0cm2,5. Embora ainda não comprovado, há suspeita de que tumores com alto KI 67 possam responder melhor à quimioterapia6 Sabe-se que, por meio dele, pode-se prever o comportamento biológico e a sobrevida desses pacientes. 49 Referências 1. Linhares E, Freitas RR, Gonçalves R, Ramos C. Tumores neuroendócrinos do intestino delgado: experiência do Instituto Nacional de Câncer em 12 anos. Neuroendocrine tumors of the small intestine: experience of the National Cancer Institute in 12 years. Gastroenterol Endosc Dig. 2011:30(1):7-12. 2. Fernandes LC, Pucca L, Matos D. Tumores carcinóides do trato digestivo. Rev Assoc Med Bras. 2002;48(1):87-92. 3. Vilar E, Salazar R, Pérez-García J, Cortes J, Oberg K, Tabernero J. Chemotherapy and role of the proliferation marker Ki-67 in digestive neuroendocrine tumors. Endocr Relat Cancer. 2007;14(2):221-32. 4. Yanes R, Badra C. Os Tumores neuroendócrinos (carcinóide): aspectos gerais. Prát Hospit. 2009;11(63). 5. Bhutani MS. Curative endoscopic resection of a carcinoid tumor of the rectum. Am J Gastroenterol. 1994;89:645. 6. Czepielewski MA, Colli M, Harlos T, Silveiro SP, Maraschin J, Copette F, Leitão CB, Rollin GA. Octreotide-LAR + adrenalectomia bilateral no manejo de tumores carcinóides produtores de ACTH. Arq Bras Endocrinol Metabol. 2005;49(5):791-6. 50 Revista Médica Ana Costa, v. 18, n. 2, p. 48 - 50 abr / mai / jun 2013 Artigo de Revisão Como objetos utilizados por profissionais da saúde podem ser veículos de disseminação de microrganismos multi-resistentes How objects used by health sector professionals might serve as vehicles of dissemination of multiresistant microorganisms 1 Cynthia Aparecida da Silva Rocha Waldimir Carollo2 RESUMO Ultimamente, a mídia tem destacado o uso do jaleco branco pelos profissionais da saúde fora do ambiente de trabalho, causando constrangimento e polêmica. Diante disso, este trabalho tem como objetivo analisar a literatura ligada à disseminação de bactérias multi-resistentes (MR) por meio de acessórios utilizados por esses profissionais durante a jornada de trabalho. Este artigo tem o objetivo de auxiliar os profissionais e acadêmicos da área da saúde a conscientizarem-se sobre o uso correto desses objetos de maneira a reduzir a disseminação de bactérias. Foi realizado levantamento bibliográfico nas bases de dados MEDLINE, LILACS e SCIELO, entre 1991 e 2009. Os resultados apontam que MR podem ser encontrados em jalecos, estetoscópios, crachás, gravatas, telefones celulares, unhas postiças. Dessa forma, é importante ampliar as discussões sobre este tipo de risco de transmissibilidade, já que mudanças comportamentais não ocorrem de forma imediata, mas sim após muitos debates e discussões. ABSTRACT The media has recently shed light on the use of white coats by health sector professionals out of their working environment which has caused embarassment and controversy. In view of that, this paper aims to analyze the literature related to the dissemination of multiresistant bacteria (MR) by accessories used by these professionals during their working hours. This article aims to make health sector professionals and students aware of the correct use of these objects in order to reduce bacterial dissemination. Literature review has been carried out through searches in MEDLINE, LILACS and SCIELO databases, between 1991 and 2009. Results point to the fact that MR may be found in white coats, stethoscopes, identity badges, ties, cellular telephones, nail extensions. Therefore, it is important to widen the discussions on this type of transmissibility risk since behavioral changes do not occur immediately, but only after plenty of debates and discussions. Key words: Infection. Biosafety. Vehicle. Prevention. Descritores: Infecção. Biossegurança. Prevenção. Introdução O jaleco tem como primeiro propósito ser um importante equipamento de proteção individual (EPI) para profissionais da saúde. Originalmente, passou a ser utilizado como símbolo de esperança e vida, em contraste com o preto da morte. No entanto, nos últimos anos tem sido associado ao risco de disseminação de microrganismos nosocomiais à comunidade externa, já que muitos profissionais utilizam-no fora do local de trabalho1. Desde 2005, o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) publicou a Norma Regulamentadora 32 (NR 32) e, conforme estabelecido em seu artigo 32.2.4.6.2, “os trabalhadores não devem deixar os locais de trabalho com os equipamentos de proteção individual e as vestimentas utilizadas em suas atividades laborais”. Apesar de já existir há quase 5 anos, passou a ser fiscalizada em dezembro de 20102. Essa preocupação do MET fundamenta-se no fato de que bactérias, vírus e fungos podem permanecer viáveis em roupas, materiais e equipamentos utilizados na assistência a pacientes. Objetivo principal O objetivo deste trabalho é destacar o papel do avental branco e de outros objetos usados por profissionais na atenção a saúde na propagação de MR. Objetivos secundários - Proporcionar maior discussão e reflexão sobre o tema em particular no que tange a NR32. - Contribuir, de certa forma, para que o profissional de saúde tenha maior cuidado com higiene e limpeza de seus acessórios utilizados no cotidiano tendo em vista, sobretudo a segurança do paciente. Metodologia A possibilidade de o jaleco tornar-se um transmissor de bactérias MR nas dependências hospitalares levou à reflexão da comunidade da saúde. Para explorar mais esse assunto, foi realizada busca de material científico nas bases de dados MEDLINE, LILACS e SCIELO, utilizando como limitação temporal o período de 1991 a 2009. Foram utilizados os descritores: Infecção, Biossegurança, 1) Acadêmica do Curso de Medicina da Universidade Estadual de Londrina, Londrina/PR. 2) Acadêmica do Curso de Enfermagem da Universidade Estadual de Londrina, Londrina/PR. 3) Doutora em Educação pela UNESP-Marília. Enfermeira. Coordenadora de Enfermagem da CCIH/ Hospital Universitário da UEL. Instituição: Universidade Estadual de Londrina, Londrina/PR. Correspondência: Av. Robert Koch, 60 – 86038-440 Londrina/PR, Brasil. E-mail: [email protected] Conflito de interesse: nenhum. Fonte de fomento: nenhuma. Recebido em: 30/10/2011; aceito para publicação em: 25/09/2012; publicado online em:30/05 /2013. Revista Médica Ana Costa, v. 18, n. 2, p. 51 - 53 abr / mai / jun 2013 51 Veículo, Vestimenta, Prevenção e Controle, conforme apresentação do vocabulário contido nos Descritores em Ciências da Saúde, da Bireme, em português e inglês. Foram selecionados 23 artigos que continham os descritores pré-determinados e, para refinar a seleção, separaram-se os que abordavam aspectos ligados a jalecos e/ou objetos pessoais usados por profissionais da saúde na assistência a pacientes, descritos como possíveis veículos de infecção ou transmissão de MR, além da limitação temporal do período. Foram considerados os termos “jaleco”, “avental”, “casaco” e “bata” e foram incluídos os artigos que identificaram objetos pessoais dos profissionais da saúde relacionados com o crescimento de micro-organismos patogênicos MR: crachás, celulares, gravatas, estetoscópios e unhas postiças. Após leitura sistemática, os textos foram agrupados e analisados a fim de definir as categorias necessárias para atender aos objetivos propostos, identificando dados da literatura que auxiliem na compreensão da NR32 do MTE. Discussão Provavelmente, muitos ainda não se conscientizaram da importância do avental branco e acreditam que, por ser uma vestimenta que, aparentemente, não tem um contato direto contínuo com o paciente, pode ser considerado limpo por seus usuários. Entretanto, pesquisas comprovam que diversos equipamentos têm sido vetores de infecção hospitalar, pois é preciso um curto período de contato entre a pele de um paciente e a superfície de um estetoscópio, por exemplo, para ocorrer a transferência de bactérias3 e que os profissionais da saúde estão negligenciando os processos básicos, porém essenciais, de limpeza e desinfecção em suas práticas diárias4-6. O jaleco é historicamente um símbolo da profissão médica. Por estar sendo foco da mídia, a questão de seu uso fora das dependências do serviço de saúde vem causando polêmica e a realização de pesquisas diversas, que apontam a contaminação microbiana desSa vestimenta até mesmo em serviços rurais de Odontologia7. Pilonetto et al.8 identificaram o crescimento de bactérias patogênicas na parte abdominal da roupa utilizada por profissionais da saúde (Klebsiella spp., Stenotrophomonas spp., Serratia spp. e Staphylococcus aureus) e nos punhos de aventais de mangas longas (Acinetobacter spp., S. aureus e Stenotrophomonas spp.). Stenotrophomonas são bactérias intrinsicamente resistentes aos antimicrobianos, devendo ser classificadas como MR. A região torácica também apresentou contaminação por MRSA6 assim como os bolsos e punhos9. Bactérias com perfil de resistência aos antimicrobianos também foram encontradas por Treakle et al.10 em uma pesquisa com 149 participantes, que identificaram que, das amostras coletadas de aventais brancos, 34 (23%) estavam contaminadas por Staphylococcus aureus, dos quais 6 (18%) eram MRSA. Nesi et al.11, em um estudo com amostras de diferentes áreas dos jalecos de 30 estudantes de odontologia da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, destacam a importância de discutir-se o papel dessa ferramenta de trabalho, principalmente como fonte de infecções cruzadas. Diferentemente dos estetoscópios, que podem ser utilizados de forma segura desde que os profissionais lavem as mãos imediatamente após a assistência ao paciente e façam a desinfecção do mesmo com álcool a 70%12, essas medidas não podem ser seguidas em relação ao jaleco, que permanece em uso por várias horas e, em muitos casos, por vários dias, mostrando, inclusive, sujidades visíveis7. Wilson et al.13 analisaram a contaminação dos uniformes dos profissionais da saúde e revelaram que, apesar de os mesmos tornarem-se progressivamente contaminados durante o uso, 30% dos microrganismos eram provenientes do próprio usuário. Esses autores alertam para a falta de fortes evidências que sustentem a hipótese de que um uniforme contaminado pode ter ligação direta com a transmissão de infecção hospitalar. 52 Considerando também demais acessórios de uso dos profissionais de saúde, Kurtz et al.14 investigaram a contaminação de estetoscópios, instrumento que tem contato direto com o paciente e, apesar da acessibilidade à prática de sua desinfecção entre cada uso, identificaram MRSA nos mesmos. Outras pesquisas comprovam a contaminação de crachás15 principalmente os usados com cordão, ou seja, tecido que não é lavado e mantém o microrganismo vivo, da mesma forma que gravatas16, estetoscópios17,18 e telefones celulares19,20. Kotsanas et al.15 identificaram Staphylococcus aureus meticilinaresistente (MRSA) em crachás e em cordões usados no pescoço para pendurar canetas, crachás e esparadrapos. Assim, esses discretos dispositivos, que entram em contato com outros objetos freqüentemente tocados pelas mãos de profissionais e nunca são lavados, devem ser considerados possíveis fontes de microrganismos patogênicos. Lintott & Parry21 e Ditchburn22 revelaram que as gravatas também podem apresentar contaminação por MRSA devido sua localização no peito do profissional, que permite seu contato direto com o paciente durante determinados procedimentos e, também, por não serem lavadas na maioria das vezes. Nos últimos anos, o telefone celular passou a ser um importante acessório na vida pessoal e profissional, mas para trabalhadores da saúde ele representa um fômite, principalmente de bactérias Gram positivas, como MRSA23,24. Carvalho et al.1 apontam a relevância do assunto, sugerem a realização de campanhas educativas com a finalidade de conscientizar os profissionais e indicam também a vigilância rígida das instituições de saúde para evitar práticas incorretas no uso do jaleco. Entretanto, campanhas educativas nem sempre obtém resultados positivos em curto espaço de tempo. Considerações finais Na prática, a utilização correta do jaleco depende de mudanças comportamentais e as mesmas levam tempo para ocorrer, principalmente porque para muitos pacientes o jaleco branco é um dos itens que confere credibilidade ao médico e transmite segurança24, sendo utilizado por muitos anos como tradição, forma de identificação do profissional e meio de transporte de objetos utilizados continuamente nas atividades de trabalho, como canetas, termômetro, carimbo etc. Mais que proibir o uso do jaleco fora das dependências físicas do serviço de saúde, tanto as CCIH quanto os serviços de medicina ocupacional, de educação continuada e órgãos fiscalizadores devem orientar e supervisionar a adoção de medidas que minimize o risco de disseminação de microrganismos dentro e fora destas instituições, a começar pela prática de lavar as mãos, dificultada tanto pelo comprimento das mangas dos jalecos, pelo uso de anéis, alianças, pulseiras e relógios quanto pela falta de lavatório, de sabão e de papel toalha de qualidade. Ressalta-se também a falta de rigor nas práticas de limpeza e desinfecção do ambiente, negligenciadas por muitos serviços de saúde e que contribuem para a disseminação de MR. É importante alertar que, além de proibir crachás pendurados por cordões, deve-se orientar sobre seu uso em local que não toque o paciente ou superfícies hospitalares e sua desinfecção; que as unhas compridas impedem a higienização adequada das mãos e podem rasgar as luvas; que celulares nunca devem ser atendidos durante o uso de luvas e que precisam de limpeza e desinfecção freqüentes, da mesma forma que estetoscópios, otoscópios, pranchetas, termômetros e outros dispositivos. Para reduzir o risco de contaminação dos profissionais da saúde e a disseminação de MRs na comunidade, muito precisa ser implantado, a começar pelo número inadequado de recursos humanos para garantir uma assistência médica segura, na qual pacientes são colocados a uma distância mínima de um metro entre cada um, em camas com colchões que puderam ser limpos e desinfetados adequadamente e, posteriormente, atendidos por profissionais conscientizados sobre o uso correto das vestimentas e dispositivos Revista Médica Ana Costa, v. 18, n. 2, p. 51 - 53 abr / mai / jun 2013 utilizados na assistência. Assim, muito precisa ser analisado e melhorado, mas as medidas estipuladas pela NR32 necessitam de aplicação imediata, principalmente porque determinados órgãos estaduais, como no Paraná, estabeleceram leis que estipulam o pagamento de multa a quem a descumprir, como a nº 16.491/PR de 2010. Assim, os profissionais da saúde precisam ser informados sobre as novas determinações para a área da saúde, estabelecidas no intuito de promover a saúde da população. Referências 1. Carvalho CMRS, Madeira MZA, Tapety FI, Alves ELM, Martins MCC, Brito JNPO. Aspectos de biossegurança relacionados ao uso do jaleco pelos profissionais de saúde: uma revisão da literatura. Texto & Contexto Enferm. 2009;18(2):355-60. 2. Comissão Nacional Permanente da NR32. Riscos biológicos guia técnico – Os riscos biológicos no âmbito da norma regulamentadora 32. Brasília, 2008. 3. África-Purini FMC, Dy EER, Coronel RF. Stethoscopes: a potencial source of nosocomial infections. Phil J Microbiol Infect Dis. 2000;29(1):913. 4. Parmar RC, Valvi CC, Sira P, Kamat JR. A prospective, randomised, double-blind study of comparative efficacy of immediate versus daily cleaning of stethoscope using 66% ethyl alcohol. Indian J Med Sci. 2004;58:423-30. 5. Panhotra BR, Saxena AK, Al-Mulhim AS. Contaminated physician's stethoscope - a potential source of transmission of infection in the hospital. Need of frequent disinfection after use. Saudi Med J. 2005;26(2):348-50. 6. Youngster I, Berkovitch M, Heyman E, Lazarovitch Z, Goldman M. The stethoscope as a vector of infectious diseases in the paediatric division. Acta Paediatr. 2008;97:1253-55. 7. Priya H, Acharya S, Bhat M, Ballal M. Microbial contamination of the white coats of dental staff in the clinical setting . JODDD. 2009;3(4):136-40. 8. Pilonetto M, Rosa EAR, Brofman PRS, Baggio D, Calvário F, Schelp C, Nacimento A, Messias-Reason I. Hospital gowns as a vehicle for bacterial dissemination in an intensive care unit. Braz J Infect Dis. 2004;8(3):206-10. 9. Wong D, Nye K, Hollis P. Microbial flora on doctors' white coats. Br Med J. 1991;303(6817):1602-4. 10. Treakle AM, Thom KA, Furuno JP, Strauss SM, Harris AD, Perencevich EN. Bacterial contamination of health care workers' white coats. Am J Infect Control. 2009;37(2);101-5. 11. Nesi MAM, Bitu Filho RS, Lima EG, Medeiros AMC, Lima KC. Revista Médica Ana Costa, v. 18, n. 2, p. 51 - 53 abr / mai / jun 2013 Contaminação em jalecos utilizados por estudantes de odontologia. Saúde Ver. 2006;8(20):47-54. 12. Uneke CJ, Ogboma A, Ovibo PG, Onu CM. Bacterial contamination of stethoscopes used by health workers: public health implications. J Infect Dev Ctries. 2010;4(7):436-41. 13. Wilson JA, Loveday HP, Hoffman PN, Pratt RJ. Uniform: an evidence review of the microbiological significance of uniforms and uniform policy in the prevention and control of healthcare-associated infections. Report to the Department of Health (England). J Hosp Infect. 2007;66(4):301-7. 14. Kurtz ACN, Rutzen W, Krummenauer EC, Renner JDP, Carneiro M. Estetoscópio: uma ferramenta para diagnóstico e de disseminação de bactérias resistentes? Rev AMRIGS 2009;53(3):319. 15. Kotsanas D, Scott C, Gillespie EE, Korman TM, Stuart RL. What's hanging around your neck? Pathogenic bacteria on identity badges and lanyards. Med J Aust. 2008;188(1):5-8. 16. Steinlechner C, Wilding G, Cumberland N. Microbes on ties: do they correlate with wound infection? Bul R Coll Surg Engl. 2002;84:307-9. 17. Schroeder A, Schroeder MA, D'amico F. What's growing on your stethoscope? (and what you can do about it). J Fam Pract. 2009;58(8):4049. 18. Rehman SU, Nietert PJ, Cope DW, Kilpatrick AO. What to wear today? Effect of doctor's attire on the trust and confidence of patients. Am J Med. 2005;118(11):1279-86. 19. Golblatt JG, Krief I, Klonsky T, Haller D, Milloul V, Sixsmith DM, Srugo L, Potasman L. Use of cellular telephones and transmission of pathogens by medical staff in New York and Israel. Infection Control Hosp Epidemiol. 2007;28(4):500-3. 20. Marcham CI. Coats, ties, stethoscopes, cell phones, and ID Badges: Potential Sources of Healthcare-Associated Infections? University Environmental Health and Safety Officer, Oklahoma, 2009;16(1)1-4. 21. Lintott P, Parry D. Let's lose the tie. J Hosp Infect. 2001;48(1):81-2. 22. Ditchburn I. Should doctors wear ties? J Hosp Infect. 2006;63(2):227-8. 23. Brady RR, Fraser SF, Dunlop MG, Paterson-Brown S, Gibb AP. Bacterial contamination of mobile communication devices in the operative environment. J Hosp Infect. 2007;66(4):397-8. 24. Datta P, Rani H, Chander J, Gupta V. Bacterial contamination of mobile phones of health care workers. Indian J Med Microbiol. 2009;27(3):279-81. 53 Artigo de revisão Psoríase – atualizações terapêuticas Psoriasis – therapeutic update 1 Taísa Ferreira Braga 2 Valéria Fagacho Galvão RESUMO A psoríase é uma doença inflamatória crônica recorrente que afeta a pele, couro cabeludo e as articulações. Em gravidade, ela varia de leve a grave. Pacientes que portam a doença classificada em moderada a grave possuem uma deterioração significativa na qualidade de vida. Os objetivos do tratamento são obter o controle inicial e rápido da doença, redução da percentagem de área de superfície corporal envolvida, diminuir lesões em placa, atingir e manter a remissão em longo prazo, minimizar os efeitos adversos e melhorar a qualidade de vida do paciente. A terapia varia de acordo com a gravidade da doença e a disseminação. O tratamento tópico da forma leve inclui o uso de corticosteróides tópicos, calcipotrieno, tazaroteno, alcatrões tópicos, antralina e queratolíticos. Tratamento da psoríase moderada a grave inclui terapias sistêmicas, como o metotrexato, acitretina, ciclosporina e agentes biológicos. Cada paciente necessita de um plano individualizado de tratamento. ABSTRACT Psoriasis is a chronically recurring inflammatory disease that affects the skin, scalp and joints. It ranges in severity from mild to severe and patients with moderate to severe disease experience significant deterioration in quality of life. The goals of its treatment are to gain initial and rapid control of the disease process, decrease the percentage of body surface area involved, decrease plaque lesions, achieve and maintain longterm remission, minimize adverse events and improve patient quality of life. Therapy varies depending on disease severity and spread. Topical treatment for mild psoriasis includes the use of topical corticosteroids, calcipotriene, tazarotene, topical tars, anthralin and keratolytics. Treatment of moderate to severe psoriasis includes systemic therapies, such as methotrexate, acitretin, cyclosporine, and biologic agents. Each patient requires an individualized plan. Key words: Psoriasis. Management. Biologic Therapy. Treatment. Descritores: Psoríase. Tratamento. Tratamento Biológico. Introdução A psoríase é uma das doenças inflamatórias da pele mais frequentes do mundo1. É uma doença crônica, sistêmica e inflamatória que afeta a pele, semi-mucosas e, em alguns casos, as articulações. Apresenta origem imunológica e predisposição genética, porém, a influência de múltiplos fatores ambientais pode levar ao desenvolvimento ou à piora da doença2,3. Caracteriza-se por lesões eritêmato-descamativas com padrões e distribuição corpórea variáveis, podendo ser classificada fenotipicamente em formas vulgar, gutata, eritrodérmica e pustulosa4. A forma mais frequente é a psoríase em placas ou vulgar. O número, dimensão e extensão das lesões são variáveis entre os pacientes e conforme a evolução da doença. A lesão clássica é caracterizada por placas eritematosas, de número e tamanho variável, bem delimitadas, recobertas com escamas micáceas em áreas de traumas constantes na pele, como cotovelos, joelhos, região pré-tibial, couro cabeludo e região sacra. Embora possam afetar qualquer área do corpo, cobrindo, nos casos mais graves, extensas áreas do tronco e membros5-8. Há uma série de comorbidades associadas à psoríase, entre elas alcoolismo, depressão, obesidade, diabetes mellitos, hipertensão arterial, síndrome plurimetabólica, colite e artrite reumatóide9,10. A psoríase tem importante impacto no prejuízo à qualidade de vida dos pacientes. Há evidência de que o prejuízo físico e mental desses pacientes é comparável ou maior do que o experimentado por pacientes portadores de outras doenças crônicas como câncer, artrite, hipertensão arterial sistêmica, cardiopatias, diabete melito e depressão11. Em relação à epidemiologia, as taxas de prevalência da psoríase em todo o mundo variam de 0,6 % a 4,8%. Não existem ainda dados quanto à epidemiologia da doença no Brasil12,13. Um estudo de base populacional nos Estados Unidos estimou que a prevalência de psoríase seria de 2,5% em caucasianos e 1,3% em afroamericanos14. Afeta igualmente homens e mulheres e é vista em todas as raças. Aspectos ambientais, geográficos e étnicos podem interferir na sua incidência. Embora possa começar em qualquer idade, parece haver dois picos de início: um entre 20 e 30 e outra entre 50 e 60 anos15, associados a diferentes antígenos de histocompatibilidade. 1) Residente de Clínica Médica do Hospital Ana Costa, Santos/SP, Brasil. 2) Médico Assistente do Serviço de Dermatologia do Hospital Ana Costa, Santos/SP, Brasil. Instituição: Serviço de Dermatologia do Hospital Ana Costa, Santos/SP, Brasil. Correspondência: Rua Paraguaçu, n53/44 – 11050-020 Santos/ SP, Brasil. E-mail: [email protected] Recebido em: 01/11/2012; aceito para publicação em: 17/02/2013; publicado online em:30/05 /2013. Conflito de interesse: nenhum. Fonte de fomento: nenhuma. 54 Revista Médica Ana Costa, v. 18, n. 2, p. 54 - 57 abr / mai / jun 2013 A psoríase vulgar pode ser classificada em dois tipos. A psoríase tipo I ou de início precoce inicia-se antes de 40 anos e apresenta tendência à disseminação, maior número de recorrências, maior frequência de história familiar de psoríase e de associação com HLA-Cw6 (human leucocyte antigen-Cw6) e DR7 (outro antígeno considerado fator de risco e geralmente associado a Cw6), quando comparada à psoríase tipo II ou de início tardio, que pode surgir durante ou após a quinta década de vida11,16. Estudos epidemiológicos mostram que a psoríase está associada com um maior risco de comorbidades e de mortalidade17,18. Diversos instrumentos de medidas são utilizados para determinar a gravidade da psoríase e auxiliar na avaliação da evolução do paciente e a sua resposta às intervenções terapêuticas. Os instrumentos geralmente utilizados são PASI (Psoriasis Area and severe Index), BSA (Body Surface Area) e PGA (Psoriasis Global Assessment). Para avaliar a qualidade de vida são utilizados principalmente o DLQI (Dermatology Life Quality Index) e o EQ-5D. A gravidade da psoríase pode ser avaliada por um dos três métodos citados acima, onde a psoríase grave é aquela que apresenta: PASI>10 ou BSA>10 ou DLQI>10 (regra dos 10)6. Discussão Embora a fisiopatologia da psoríase ainda não esteja totalmente esclarecida e permaneçam dúvidas quanto à natureza dos antígenos que levam à ativação do linfócito T e quanto ao papel dos mecanismos reguladores dos surtos e da resolução da inflamação, são inegáveis os avanços terapêuticos das últimas décadas. Além do surgimento de novos medicamentos, a melhor utilização de tratamentos clássicos e a valorização do impacto da terapêutica na qualidade de vida dos pacientes têm contribuído para a diminuição dos índices de morbidade da doença. O Protocolo Clínico e Diretriz Terapêutica (PCDT) para Psoríase do Ministério da Saúde está em elaboração. Na ausência de protocolo do Ministério da Saúde, estão descritas as recomendações de 2009 do Consenso Brasileiro de Psoríase19, que recomenda que os casos leves possam ser tratados apenas com terapia tópica. Na psoríase moderada a grave, o paciente deve iniciar o tratamento pela fototerapia e, em caso de falha, passar para medicamentos sistêmicos (metotrexato, acitretina, ciclosporina) antes de iniciar a terapia com medicamentos biológicos20. Por décadas, os corticosteróides tópicos, particularmente os esteróides de alta potência, foram o esteio no tratamento tópico da psoríase. Sua eficácia pode ser atribuída aos múltiplos mecanismos de ação, incluindo efeito antiinflamatório, imunossupressivo e antiproliferativo. Para a escolha da potência do corticóide apropriado e seu veículo, a severidade da doença, o local a ser tratado e a preferência do paciente, devem ser considerados. Os esteróides são também excelentes constituintes para serem associados a outros agentes antipsoriáticos efetivos, tais como ácido salicílico e liquor carbonis detergens (LCD)21. Coaltar foi usado desde os tempos antigos para o tratamento de várias doenças de pele, e sua utilidade para o tratamento da psoríase é datada aproximadamente de 100 anos. Contudo, seu mecanismo de ação não é bem conhecido. Ele é conhecido por suprimir a síntese de DNA pela redução no índice de classificação mitótica dos queratinócitos. Existem muitas formulações com coaltar, no entanto, estes produtos carecem da aceitação do paciente, devido à inelegância cosmética (sujando as roupas e seu forte odor característico) e também aos efeitos adversos (dermatite de contato, foliculite etc.)22. O retinóide tópico aprovado para a psoríase é o tazaroteno e está disponível em formulações de gel e creme a 0,05% e 0,1%. Existem duas preparações tópicas dos inibidores da calcineurina: pomada de tacrolimo (0,03% e 0,1%) e creme de pimecrolimo (1%). Estudos iniciais indicaram eficácia no tratamento em pacientes com psoríase quando usados sob oclusão. Isso conduziu à convicção de que a penetração dos inibidores da Revista Médica Ana Costa, v. 18, n. 2, p. 54 - 57 abr / mai / jun 2013 calcineurina tópicos no foco das placas psoriáticas foi limitada. Conseqüentemente, tacrolimo e pimecrolimo foram usados em áreas da pele onde grande parte da penetração tópica está aumentada22. Os análogos da vitamina D3 são conhecidos por apresentarem um papel importante no tratamento da placas na psoríase crônica por meio da estimulação da diferenciação celular, inibição da proliferação e imunomodulação. Os análogos da vitamina D3, calcipotriol e calcitriol, inibem a proliferação de corneócitos e estimulam a proliferação de corneócitos in vitro23. A combinação calcipotriol associado a betametasona diproprionato gel reduz significativamente as placas de psoríase em uma semana24. Ambos os medicamentos têm um efeito maior nos marcadores de proliferação epidérmica e queratinização. O calcipotriol une-se aos receptores da vitamina D nos queratinócitos do tecido. A ativação do complexo ligando-receptor produz uma inibição da proliferação celular e a indução da diferenciação celular na pele lesionada. Essas ações revertem as alterações anormais que se apresentam na psoríase. O calcipotriol tem um efeito dosedependente sobre o eritema, engrossamento e formação de cicatrizes25. A betametasona apresenta efeito antinflamatório, antipruriginoso e vasoconstritor. Em nível celular, as lipocortinas induzidas pela betametasona antagonizam a fosfolipase A2, diminuindo a formação subsequente de mediadores inflamatórios endógenos, incluindo prostaglandinas, quininas, histaminas, enzimas liposomais e sistema de complemento26. Os medicamentos biológicos são inibidores do fator de necrose tumoral alfa (TNF-α), fator relacionado à manutenção do processo inflamatório psoriásico, exceto o ustequinumabe que é antiinterleucina (IL)-12/23. São indicados no tratamento de pacientes adultos com psoríase crônica moderada a grave, sem resposta ou intolerantes ao tratamento com fototerapia, metotrexato, acitretina e ciclosporina27. O Princípio ativo e nome comercial são: Etanercepte - Enbrel®, Adalimumabe - Humira®, Infliximabe Remicade®, Ustequinumabe - Stelara®. Os estudos a seguir avaliam o tratamento da psoríase moderada a grave com biológicos: Schmitt et al. (2008)28: realizaram metanálise que avaliou a eficácia do Etanercepte e outros tratamentos sistêmicos no manejo da psoríase moderada a grave, através do PASI. Foram incluídos ensaios clínicos randomizados, controlados por placebo, com tamanho amostral maior que 50 pacientes. Dos 24 estudos selecionados, 14 avaliaram a eficácia do tratamento da psoríase moderada a grave com imunobiológicos, destes, três avaliaram o Infliximabe, cinco o Etanercepte, cinco o Efalizumabe e um o Adalimumabe. As proporções de pacientes com prévio tratamento sistêmico e/ou fototerapia foram semelhantes nos estudos. O infliximabe foi o tratamento mais eficaz e foi significativamente superior a todas as outras intervenções analisadas, seguido do Adalimumabe. Etanercepte 50mg duas vezes/semana foi superior ao Etanercepte 25mg duas vezes/semana e efalizumabe. No processo, foram apresentado somente os estudos e resultados para o Etanercepte, mas, de acordo com o estudo na íntegra, o Infliximabe é a opção de tratamento mais eficaz para psoríase moderada a grave, seguido por Adalimumabe. Para Etanercepte e Efalizumabe, as taxas de resposta PASI-75 tende a aumentar até a semana 24. Dados suficientes sobre o efeito do tratamento na qualidade de vida foram identificados apenas para Infliximabe e Etanercepte. Daudén et al. (2009)29 realizaram um estudo clínico randomizado, aberto, para avaliar PRO em pacientes tratados com Etanercepte em terapia contínua ou pausada. O PRO incluiu: DLQI, EQ-5D, Hospital Anxiety and Depression Scale (HADS) e subescalas do SF-36 Vitality. Os pacientes incluídos nesse estudo foram previamente submetidos à terapia com ciclosporina, metotrexato, PUVA ou fumaratos, porém, falharam a uma dessas terapias ou apresentaram contra-indicação ou intolerância. Dos 720 pacientes incluídos, 352 receberam a terapia contínua (dose de 25mg duas 55 vezes/semana) por 54 semanas, enquanto 359 receberam a terapia pausada (dose de 50mg duas vezes/semana por no máximo 12 semanas e reintrodução de 25mg duas vezes/semana). Tanto a terapia contínua quanto a pausada apresentaram melhora no resultado de PRO. REVEAL - Menter et al. (2008)30: é um ensaio clínico, com duração de 52 semanas, controlado por placebo, com o objetivo de avaliar a eficácia e segurança do adalimumabe. O estudo foi conduzido em 67 centros nos EUA e 14 no Canadá. No total, 1212 pacientes foram incluídos no estudo e dividido em três períodos de tratamento: período A – pacientes recebram adalimumabe 40mg ou placebo em semanas alternadas, com duração de 16 semanas; período B – pacientes que atingiram uma melhora igual ou superior a 75% do PASI na semana 16 continuaram o estudo por mais 17 semanas, nessa fase, todos recebendo adalimumabe; e período C – na semana 33 os pacientes que receberam adalimumabe no período A e mantiveram a resposta ≥ PASI 75 no período B, foram randomizados para receber placebo ou adalimumabe 40mg até a semana 52. A resposta PASI dos pacientes tratados com adalimumabe foi estatisticamente melhor do que a obtida com placebo em todas as etapas. CHAMPION - Saurat et al. (2008)20: é um ensaio clínico que compara a eficácia, segurança e tolerabilidade do adalimumabe versus o metotrexato. Um total de 271 pacientes foram randomizados e incluídos em três braços: adalimumabe 40mg, Metotrexato 25mg ou 7,5 mg e placebo. A resposta PASI 75 dos pacientes ao adalimumabe foi de 23,1 % em quatro semanas versus 3,8 % para o placebo e 2,7 % para o MTX. O tempo de segmento do estudo foi muito pouco, apenas 16 semanas. Ambos os estudos, REVEAL e CHAMPION também avaliaram o efeito do adalimumabe na qualidade de vida dos pacientes com psoríase e mostraram que durante 16 semanas houve uma melhora no estado geral de saúde dos pacientes, com redução na pontuação DLQI. Bansback et al. (2009)31: realizaram uma revisão sistemática da eficácia dos tratamentos sistêmicos para psoríase. Foram incluídos apenas ensaios clínicos de pacientes com psoríase moderada a grave, em um total de 22 estudos. Os ensaios tinham desfechos primários em oito a 16 semanas, os tratamentos sistêmicos incluídos foram adalimumabe, alefacepte, efalizumabe, etanercepte e infliximabe e os agentes sistêmicos não biológicos foram os retinóides, metotrexato e ciclosporina, além da fototerapia e terapias combinadas. A medida de desfecho avaliada foi o PASI. De acordo com a meta-análise, o infliximabe apresentou maior chance de alcançar todas as categorias de resposta PASI. Um estudo multicêntrico, duplo-cego, controlado por placebo conhecido como EXPRESS I32, de 2005, avaliou eficácia do infliximabe a curto e longo prazo, randomizando 378 pacientes com psoríase moderada a grave (PASI >12, BSA >10) em dois grupos, nos quais um recebia dose 5 mg/kg de infliximabe nas semanas 0,2, 6 e depois a cada 8 semanas até a semana 46; e o outro que recebia placebo nas mesmas doses até a semana 24, quando então esses pacientes foram incluídos no grupo com tratamento efetivo. Na semana 10, 80% dos pacientes recebendo infliximabe alcançaram escore PASI 75, contra 3% do grupo recebendo placebo. Essas percentagens mantiveram-se quase inalteradas até a semana 24. Entretanto, a percentagem de pacientes que alcançaram PASI 75 na semana 50 caiu para 61% no grupo tratado com infliximabe, demonstrando uma queda discreta, porém real, na eficácia da medicação após 24 semanas. PHOENIX 133 e PHOENIX 234 avaliaram a eficácia e a segurança do ustequinumabe, em um período de 76 semanas de acompanhamento. O objetivo principal desses estudos foi avaliar a porcentagem de pacientes que obtiveram resposta PASI 75 na 12ª semana. PHOENIX 1 também avaliou a porcentagem de pacientes que obtiveram uma pontuação na Avaliação Médica Global (Physician's Global Assessment – PGA) de “ausente” (0) ou “mínimo”(1) na 12ª semana, manutenção de uma resposta PASI 75 com ustequi- 56 numabe com o passar do tempo e o impacto do ustequinumabe nas avaliações de qualidade de vida, incluindo o DLQI. PHOENIX 1 e 2 mostraram que o ustequinumabe proporciona uma melhora rápida e clinicamente significativa após apenas 2 doses. Na 12ª semana, 66,7% dos pacientes que receberam 45mg e 75,7% dos que receberam 90mg de ustequinumabe tiveram PASI 75 em comparação com 3,7% dos pacientes que receberam placebo (p < 0,001). O nível máximo de resposta foi observado com 6 meses e mantido até 76 semanas. Os sintomas gradualmente recorreram após suspensão da terapia, o que demonstra que o bloqueio de IL-12 e IL-23 é temporário. Em pacientes que pararam o ustequinumabe, a resposta foi restaurada na 12ª semana de reinício do tratamento. Os respondedores parciais (pacientes que obtiveram PASI ≥ 50 e ≤ 75) representavam um grupo com características distintas como elevada massa corporal, uma longa história de psoríase, história de artrite psoriásica e grande resistência a agentes biológicos. Os resultados foram efetivos por pelo menos um ano, quando administrado a cada 12 semanas e os eventos adversos foram mínimos, sugerindo que o tratamento foi seguro. No geral, os efeitos colaterais não exigiram ajuste do tratamento, não se relacionaram à dose e não foram considerados graves. Ressalta-se, porém, que são necessários estudos mais detalhados, de longo prazo para permitir melhor análise dos perfis de segurança das medicações analisadas em longo prazo. Os curtos prazos estudados com os medicamentos sob avaliação consistem fortes limites à sua difusão para a assistência, dado à necessidade premente de gerar conhecimentos sobre os desfechos e aspectos de segurança, sobretudo com a observação de seu desempenho na população brasileira, em mais longo prazo. Embora o primeiro estudo randomizado sobre o uso de biológicos para o tratamento da psoríase tenha sido publicado há dez anos, os estudos publicados até o momento não apresentam comparadores adequados e o tempo de seguimento é reduzido, incompatível com o caráter crônico da doença. Considerações finais Os pacientes com psoríase moderada a severa, muitas vezes, dependem de uma terapia combinada sistêmica por períodos de tempo maiores. O uso de retinóides e fototerapia é o único regime de combinação bem documentado para esta doença. Casos severos, contudo, devem justificar o uso da terapia combinada em curto prazo, com um agente biológico e fototerapia ou um citostático (metotrexato, azatioprina, por exemplo) a fim de alcançar a remissão, seguida pela terapia de manutenção com a monoterapia biológica35. Os estudos avaliaram a psoríase moderada a grave, no entanto, não há definição clara do que seria psoríase grave, situação em que o benefício do uso de biológicos, que tem perfil de segurança ainda incerto, talvez pudesse justificar o risco. Nos pacientes com psoríase grave, a duração do efeito dos medicamentos é relativamente pequena e, até o momento, não há evidência que demonstre a resposta sustentada dos biológicos nestes pacientes. Permanece a incerteza quanto à melhor terapêutica de longo prazo tendo em vista cronicidade da doença. Não se sabe se o medicamento pode ser descontinuado ou reduzido, quando ocorrem as remissões, sendo importante que sejam realizados estudos de longo prazo de eficácia e segurança. O perfil de segurança de um medicamento depende das características do produto e também da doença de base que está sendo tratada. Assim, no caso da psoríase moderada a grave estes medicamentos biológicos, que sabidamente tem efeito imunodepressor, tem apresentado mesmo em estudos de curta duração aumento significativo do risco de infecções e câncer de pele31. Referências 1. Davidson A, Diamond B. Autoimmune diseases. N Engl J Med. 2001;345:340-50. 2. Sociedad Latinoamericana de Psoriasis. Consenso Latinoamericano de Revista Médica Ana Costa, v. 18, n. 2, p. 54 - 57 abr / mai / jun 2013 Psoriasis – Guias de Tratamiento. Actualización 2009. 2009;33. 3. Menter A, Korman NJ, Elmets CA, Feldman SR, Gelfand JM, Gordon KB, Gottlieb AB, Koo JY, Lebwohl M, Lim HW, Van Voorhees AS, Beutner KR, Bhushan R. Guidelines of care for the management of psoriasis and psoriatic arthritis: section 4. Guidelines of care for the management and treatment of psoriasis with traditional systemic agents. J Am Acad Dermatol. 2009; 61(3):451-85. 4. Griffiths CE, Christophers E, Barker JN, Chalmers RJ, Chimenti S, Krueger GG, Leonardi C, Menter A, Ortonne JP, Fry L. A classification of psoriasis vulgaris according to phenotype. Br J Dermatol. 2007;156:25862. 5. Meier M, Sheth P. Clinical spectrum and severity of psoriasis. Curr Probl Dermatol. 2009;38:1-20. 6. Sociedade Brasileira de Dermatologia. Consenso Brasileiro de Psoríase e guias de tratamento. Rio de Janeiro: SBD; 2009. 7. Guttman-Yassky E, Nograles KE, Krueger J. Contrasting pathogenesis of atopic dermatitis and psoriasis-part I: clinical and pathologic concepts. J Allergy Clin Immunol. 2011;127(5):1110-8. 8. Langley RG, Krueger GG, Griffiths C. Psoriasis: epidemiology, clinical features, and quality of life. Ann Rheum Dis. 2005 mar; 64(suppl 2): ii18-23; discussion ii254-5. 9. Gisondi P, Ferrazzi A, Girolomoni G. Metabolic comorbidities and psoriasis. Acta Dermatovenerol Croat. 2010;18(4):297-304. 10. Naldi L, Mercuri S. Epidemiology of comorbities in psoriasis. Dermatol Ther. 2010;23(2):114-8. 11. Rapp SR, Feldman SR, Exum ML, Fleischer AB, Jr., Reboussin DM. Psoriasis causes as much disability as other major medical diseases. J Amn Acad Dermatol. 1999;41(3 Pt 1):401-7. 12. Christophers E. Psoriasis - epidemiology and clinical spectrum. Clin Exp Dermatol. 2001;26:314-20. 13. Arruda LHF, Campbell GAM, Takahashi MDF. Psoríase. An Bras Dermatol. 2001;76:141-67. 14. Schön MP, Henning WB. Psoriasis. N Engl J Med. 2005;352:1899-912. 15. Feldman SR. Epidemiology, pathophysiology, clinical manifestations, and diagnosisofpsoriasis. In: http://www.uptodate.com/contents/epidemiology- pathophysiologyclinical-manifestations-and-diagnosis-of-psoriasis?source=search _result&search= psoriasys&selectedTitle=2~150 16. Kormeili T, Lowe NJ, Yamauchi PS. Psoriasis: immunopathogenesis and evolving immunomodulators and systemic therapies; U.S. experiences. Br J Dermatol. 2004;151:3-15. 17. Ortonne JP. Psoriasis, metabolic syndrome and its components. Ann Dermatol Venereol. 2008;135 Suppl 4:S235-42. 18. Späh F. Inflammation in atherosclerosis and psoriasis: common pathogenic mechanisms and the potential for an integrated treatment approach. Br J Dermatol. 2008;159 Suppl 2:10-7. 19. Consenso Brasileiro de Psoríase e Guias de Tratamento da Sociedade Brasileira de Dermatologia-2009 http://www.sbd.org.br/flash/flash/Arquivos/Pdfs/ConsensoPsor%C3%ADa se2009.pdf - acessado em 18/04/2012. 20. Saurat JH, Stingl G, Dubertret L, Papp K, Langley RG, Ortonne JP, Unnebrink K, Kaul M, Camez A; CHAMPION Study Investigators. Efficacy and safety results from the randomized controlled comparative study of adalimumab vs. methotrexate vs.placebo in patients with psoriasis (CHAMPION). Br J Dermatol. 2008;158(3):558-66. 21. Bowcock AM, Barker JN. Genetics of psoriasis: the potential impact of new therapies. J Am Acad Dermatol. 2003;49(2 suppl):S51-S6. 22. Paul C, Gallini A, Maza A, Montaudié H, Sbidian E, Aractingi S, Aubin F, Bachelez H, Cribier B, Joly P, Jullien D, Le Maître M, Misery L, Richard MA, Ortonne JP. Evidence-based recommendations on conventional systemic Revista Médica Ana Costa, v. 18, n. 2, p. 54 - 57 abr / mai / jun 2013 treatments in psoriasis: systematic review and expert opinion of a panel of dermatologists. J Eur Acad Dermatol Venereol. 2011;25(suppl 2):2-11. 23. Guenther L, Van de Kerkhof PC, Snellman E, Kragballe K, Chu AC, Tegner E, Garcia-Diez A, Springborg J. Efficacy and safety of a new combination of calcipotriol and betamethasone dipropionate (once or twice daily) compared to calcipotriol (twice daily) in the treatment of psoriasis vulgaris: a randomized, double-blind, vehicle-controlled clinical trial. Br J Dermatol. 2002;147(2):316-23. 24. Van de Kerkhof P, de Peuter R, Ryttov J, Jansen JP. Mixed treatment comparison of a two-compound formulation (TCF) product containing calcipotriol and betamethasone dipropionate with other topical treatments in psoriasis vulgaris. Curr Med Res Opin. 2011;27(1):225-38. 25. Van de Kerkhof PC. The impact of a two-compound product containing calcipotriol and betamethasone dipropionate (Daivobet®/ Dovobet®) on the quality of life in patients with psoriasis vulgaris: a randomized controlled trial. Br J Dermatol. 2004;151:663-8. 26. Bottomley JM, Auland ME, Morais J, Boyd G, Douglas WS. Costeffectiveness of the two-compound formulation calcipotriol and betamethasone dipropionate compared with commonly used topical treatments in the management of moderately severe plaque psoriasis in Scotland. Curr Med Res Opin. 2007;23:1887-901. 27. Mehlis SL, Gordon KB. The immunology of psoriasis and biologic immunotherapy. J Am Acad Dermatol. 2003;49(2 suppl):S44-S50. 28. Schmitt J, Zhang Z, Wozel G, Meurer M, Kirch W. Efficacy and tolerability of biologic and nonbiologic systemic treatments for moderate-to-severe psoriasis: meta-analysis of randomized controlled trials. Br J Dermetol. 2008;159(30):513-26. 29. Daudén E, Griffiths CE, Ortonne JP, Kragballe K, Molta CT, Robertson D, Pedersen R, Estojak J, Boggs R. Improvements in patient-reported outcomes in moderate-to-severe psoriasis patients receiving continuous or paused etanercept treatment over 54 weeks: the CRYSTEL study. J Eur Acad Dermatol Venereol. 2009;23(12):1374-82. 30. Menter A, Tyring SK, Gordon K, Kimball AB, Leonardi CL, Langley RG, Strober BE, Kaul M, Gu Y, Okun M, Papp K. Adalimumab therapy for moderate to severe psoriasis: A randomized, controlled phase III trial (REVEAL). J Am Acad Dermatol. 2008;58(1):106-5. 31. Bansback N, Sizto S, Sun H, Feldman S, Willian MK, Anis A. Efficacy of Systemic Treatments for Moderate to Severe Plaque Psoriasis: Systematic Review and Meta-Analysis. Dermatology. 2009;219(3):209-18. 32. Reich K, Nestle FO, Papp K, Ortonne JP, Evans R, Guzzo C, Li S, Dooley LT, Griffiths CE; EXPRESS study investigators. Infliximab induction and maintenance therapy for moderate-to-severe psoriasis: a phase III, multicentre, double-blind trial. Lancet. 2005;366:1367-74. 33. Leonardi CL, Kimball AB, Papp KA, Yeilding N, Guzzo C, Wang Y, Li S, Dooley LT, Gordon KB; PHOENIX 1 study investigators. Efficacy and safety of ustekinumab, a human interleukin-12 /23 monoclonal antibody, in patients with psoriasis: 76-week results from a randomised, double- blind, placebocontrolled trial (PHOENIX 1). Lancet. 2008;371:1665-74. 34. Papp KA, Langley RG, Lebwohl M, Krueger GG, Szapary P, Yeilding N, Guzzo C, Hsu MC, Wang Y, Li S, Dooley LT, Reich K; PHOENIX 2 study investigators. Efficacy and safety of ustekinumab, a human interleukin-12 /23 monoclonal antibody, in patients with psoriasis: 52-week results from a randomised, double- blind, placebo-controlled trial (PHOENIX 2). Lancet. 2008;371:1675-84. 35. Philipp S, Wolk K, Kreutzer S, Wallace E, Ludwig N, Roewert J, Höflich C, Volk HD, Sterry W, Sabat R. The evaluation of psoriasis therapy with biologics leads to a revision of the current view of the pathogenesis of this disorder. Expert Opin Ther Targets. 2006;10:817-31. 57 Sua saúde em boas mãos www.anacosta.com.br