1 PRÓ-REITORIA DE PÓS-GRADUAÇÃO E EXTENSÃO – PPPE PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO SENSU MESTRADO EM COMUNICAÇÃO, LINGUAGENS E CULTURA JORGE HABER RESQUE A LINGUA MATERNA (L1) COMO FATOR DE INFLUÊNCIA NA APRENDIZAGEM DA SEGUNDA LÍNGUA (L2) – INGLÊS BELÉM 2010 2 PRÓ-REITORIA DE PÓS-GRADUAÇÃO E EXTENSÃO – PPPE PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO SENSU MESTRADO EM COMUNICAÇÃO, LINGUAGENS E CULTURA JORGE HABER RESQUE A LINGUA MATERNA (L1) COMO FATOR DE INFLUÊNCIA NA APRENDIZAGEM DA SEGUNDA LÍNGUA (L2) – INGLÊS Dissertação apresentada ao Programa de Mestrado Stricto Sensu em Comunicação, Linguagens e Cultura, da Universidade da Amazônia, como requisito para obtenção do título de Mestre, orientada pela Profa. Dra. Rosa Maria Coelho de Assis. BELÉM 2010 3 Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) Marineide Vasconcellos CRB 2/1.028 418.007 R434l Resque, Jorge Haber. A língua materna (L1) como fator de influência na aprendizagem da segunda língua (L2) - inglês / Jorge Haber Resque. -- 2010. 118 f.: 21 x 30 cm. Dissertação (Mestrado) -- Universidade da Amazônia, Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu, Mestrado em Comunicação, Linguagens e Cultura, 2010. Orientadora: Profª. Drª. Rosa Maria Coelho de Assis. 1. Aprendizagem-Segunda língua. 2. Linguística contrastiva. 3. Apredizagem-Lingua estrangeira-Inglês. 4. Linguística aplicadaEstudo e ensino. I. Assis, Rosa Maria Coelho de. II. Título. 4 A LINGUA MATERNA (L1) COMO FATOR DE INFLUÊNCIA NA APRENDIZAGEM DA SEGUNDA LÍNGUA (L2) – INGLÊS por JORGE HABER RESQUE Dissertação submetida à avaliação, como requisito parcial para a obtenção do título de Mestre. BANCA EXAMINADORA Orientador: Profª Dra. Rosa Maria Coelho de Assis Universidade da Amazônia – UNAMA ______________________________________ Examinador: Profª Dra. Josebel Fares Universidade do Estado do Pará - UEPa ______________________________________ Examinador: Profª Dra. Maria do Perpétuo Socorro Cardoso Universidade da Amazônia – UNAMA Aprovado: _________________________ Belém, ____de _________________2010. 5 A todas as pessoas que me ajudaram a concluir esta dissertação, especialmente a Edila Miranda Porto de Oliveira, esposa e companheira inseparável, que jamais falhou em dizer a palavra certa, na hora certa e soube me incentivar sempre, e compreender minhas ausências e meus momentos de dúvidas e inconsistências. 6 AGRADECIMENTOS A Deus, em primeiro lugar, por me cumular com tantas bênçãos de inteligência, paciência e perseverança em busca do crescimento intelectual e espiritual. Aos meus pais, por todo o grande esforço no sentido de me tornar um homem de bem e me proporcionar as oportunidades necessárias para chegar até aqui. Aos meus familiares, especialmente a minha sogra (Edila Emilia Miranda Porto de Oliveira) e a minha tia ‘postiça’ (Anália Emilia Alves Miranda), pelo permanente incentivo e confiança. A minha amiga, Ana Oliveira, pela paciência em revisar meu trabalho e pelos seus sábios conselhos. A todos os amigos professores do CCHE da UNAMA, pelo encorajamento e pela total confiança em meu potencial. À Professora Célia Jacob, Coordenadora do Curso de Letras e à Professora Edila Miranda Porto de Oliveira, Coordenadora do Curso de Secretariado Executivo Bilíngue, pela compreensão e apoio nos momentos de maior dificuldade operacional. Ao Professor Edval Bernardino, Diretor do CCHE – UNAMA, e aos Membros Diretores da Instituição, por terem acreditado na minha responsabilidade e terem oferecido os meios para que eu pudesse concluir o meu curso. Agradeço especialmente às Professoras Dras. Maria do Perpétuo Socorro Cardoso e Marise Morbach pelas recomendações carinhosas que clarearam meu caminho e enriqueceram o desenvolvimento deste trabalho. Um profundo agradecimento à Professora Dra. Rosa Maria Coelho de Assis, minha orientadora, que sempre me colocou ‘nos trilhos’ do rumo certo e da direção final deste trabalho. E, finalmente, o maior e mais sincero agradecimento a minha esposa, Edila, e aos meus filhos do coração, Manuella e Arthur, este, presente, ainda que distante, os quais sempre foram a minha fonte de inspiração, mesmo sem saberem ou perceberem. E um agradecimento final a Deus, por ter permitido que eu chegasse até aqui. 7 “Teaching a language is like playing a game of chess. At any one moment, there is one, only one best move to make”. (Ferguson) 8 RESUMO Este trabalho busca discutir a influência da língua materna (L1) sobre o processo de aprendizagem da segunda língua (L2), neste caso, em especial, a Língua Inglesa, baseado nos pressupostos da Linguística Descritiva (LABOV), usando o modelo utilizado por TARALLO e as ideias da Análise Contrastiva (ou Linguística Contrastiva), defendidos por ROBERT LADO e FRIES, e os pressupostos da interculturalidade (línguas em contato), bem como as ideias de Chomsky (competência e performance). Para isso, apresentam-se resultados da pesquisa de campo realizada a fim de se observar que o sistema da primeira língua parece exercer interferência na produção do discurso na segunda língua mesmo quando o período de aprendizagem formal já se completou. Palavras-chave: Aprendizagem. Competência. Performance. Segunda Língua. Linguística Contrastiva. 9 ABSTRACT This paper aims at discussing the influence of the mother tongue (L1) upon the process of learning a second language (L2), mainly the English Language, supported by the assumptions made by the Descriptive Analysis (LABOV), using the model proposed by TARALLO and the ideas of the Contrastive Analysis (or Contrastive Linguistics), as posed by ROBERT LADO and FRIES, as well as the presuppositions of intercultural effect (languages in contact) plus the ideas defended by Chomsky (competence and performance), showing some evidence of the research done from the observation that the mother tongue system seems to exert some interference on the production of the written and oral discourse in the second language, even after the formal learning period has been completed. Key-words: Learning. Second Language. Contrastive Analysis. Competence. Performance. 10 SUMÁRIO INTRODUÇÃO............................................................................................. 11 CAPÍTULO 1: O FALANTE USUÁRIO DE LÍNGUA PORTUGUESA E A APRENDIZAGEM DE UMA SEGUNDA LÍNGUA...................................... 1.1 O PAPEL COMUNICATIVO DA LINGUAGEM........................... 1.2 A PERCEPÇÃO PELA MENTE................................................... 1.3 A AQUISIÇÃO DE UMA SEGUNDA LÍNGUA E A INTERFERÊNCIA DA LINGUA MÃE.......................................... 1.3.1 Interferência fonológica............................................................ 1.3.2 Interferência morfossintática................................................... 1.3.3 Interferência grafofonêmica.................................................... 1.4 EFICIÊNCIA COMUNICATIVA.................................................... 1.4.1 Gramática................................................................................... 1.4.2 Falantes não-nativos com níveis de aprendizado diferentes................................................................................... 1.4.3 Situação e contexto.................................................................. 1.4.4 Pronúncia e sotaque................................................................. 1.4.5 Habilidades................................................................................ 1.5 VARIEDADES LINGUÍSTICAS................................................... 1.6 UMA ANÁLISE DESCRITIVA DA LINGUAGEM......................... 1.7 FATORES PSICOLÓGICOS....................................................... 1.7.1 Motivação................................................................................... 1.7.1.1 Motivação extrínseca.................................................................. 1.7.1.2 Motivação intrínseca................................................................... CAPITULO 2: AS TEORIAS E MÉTODOS QUE EXPLICAM A APRENDIZAGEM DE UMA SEGUNDA LÍNGUA ...................................... 2.1 BEHAVIORISMO......................................................................... 2.2 COGNITIVISMO.......................................................................... 2.3 AQUISIÇÃO x APRENDIZAGEM................................................ 2.3.1 Aquisição e aprendizagem....................................................... 2.3.2 Hipótese de monitor.............................................................. 2.3.3 Hipótese da ordem natural....................................................... 2.3.4 Hipótese do input...................................................................... 2.3.5 Hipótese do filtro afetivo.......................................................... 2.4 TEORIAS PSICOLÓGICAS RECENTES.................................... 2.4.1 Processamento da informação................................................ 2.4.2 Coneccionismo.......................................................................... 2.4.4 Interacionismo........................................................................... 2.4.5 A teoria das inteligências múltiplas........................................ 2.4.5.1 A noção de diferentes inteligências na escola e seu papel na aprendizagem............................................................................ 16 19 22 23 23 24 25 26 27 28 29 29 30 31 32 33 33 34 35 37 44 46 47 47 48 49 50 50 51 51 52 54 55 57 CAPITULO 3: VARIAÇÃO E ERRO: considerações................................ 65 3.1 PROBLEMAS EM DEFINIR ‘ERRO’........................................... 66 11 3.2 3.2.1 3.2.2 3.2.3 3.2.4 3.3 TIPOS E CAUSAS: ‘erros’ intra-línguas e de desenvolvimento. Supergeneralização................................................................. Ignorância das restrições da norma........................................ Aplicação das normas.............................................................. Conceitos falsos hipotéticos................................................... NOÇÃO DE ‘ERRO’: o que é considerado ‘certo’ ou ‘errado’ ao aprender uma língua estrangeira................................................ 69 69 71 72 73 74 CAPITULO 4: A PESQUISA....................................................................... 86 4.1 ANÁLISE DOS DADOS............................................................... 101 4.2 ESTRATÉGIAS DE PRODUÇÃO E ANÁLISE PARA GERAÇÃO DE DADOS........................................................... 102 CONSIDERAÇÕES FINAIS........................................................................ 108 REFERÊNCIAS........................................................................................... 110 ANEXOS 12 INTRODUÇÃO Desde a Idade Antiga tem o homem se preocupado com as barreiras de comunicação inerentes ao aprendizado de uma Língua, em especial de uma Segunda Língua. No início isto foi motivado pelas Guerras de conquista quando o povo conquistador precisava fazer o povo conquistado entender as regras da dominação, as leis, as normas que passariam a reger a sociedade a partir daquele momento. Como não havia tempo hábil para ensinar todo o mecanismo linguístico para o povo dominado, buscava-se a criação de códigos sociolinguísticos que suplantassem o conhecimento da norma culta e fizessem a comunicação essencial acontecer. Depois, tal necessidade surgiu por causa das grandes viagens de exploração e descobertas de novas terras. Era preciso fazer com que o povo nativo das regiões recém descobertas aprendesse a comunicar-se de forma correta e plena. Então, era mais fácil criar códigos de comunicação baseados nos costumes e na cultura da sociedade já existente. Uma vez mais os elementos da Língua como agente social da comunicação se mostravam mais fortes que os ensinamentos da Língua culta, das normas gramaticais, as quais iam ficando para mais tarde, não obstante todo o esforço desenvolvido pelos religiosos e estudiosos, em especial os estudiosos de literatura. Tal fenômeno voltou a ocorrer nas duas Grandes Guerras, em especial na Segunda Guerra Mundial, pela necessidade de transmitir ordens rápidas e que não fossem entendidas pelos inimigos, mas sim unicamente pelos aliados. Era preciso então criar uma metodologia que enfatizasse os elementos da comunicação oral, sem levar em conta as regras gramaticais ou o tempo que elas levariam para serem ensinadas. Com o advento da globalização evidenciou-se uma transformação social muito mais veloz, lado a lado com a necessidade de acompanhar a integração das sociedades e das comunicações. A linguagem tornou-se, assim, um forte aliado neste mister, adaptando-se instantanea e integralmente às necessárias modificações de padrão social e linguístico impostas pelos grupos criados pelas grandes comunidades do mundo atual, como por exemplo, as comunidades de relacionamento da web, os sites de relacionamento, onde a linguagem é nada mais 13 nada menos do que um conjunto de códigos que levam em conta a função social da Língua, trazendo uma forma de aculturação linguística, muito mais forte do que qualquer norma culta considerada padrão. Todas estas transformações pelas quais passa a sociedade, em diversos momentos de sua história, também trouxeram uma discussão em torno daquilo que pode e aquilo que deve ser considerado norma culta e o que pode e deve ser considerado norma social. Esta discussão passa, assim, pelo conceito de linguagem. Do ponto de vista da gramática universal, a natureza essencial da linguagem é cognitiva. Porém, este não é o único prisma através do qual a linguagem pode ser analisada, pois apesar da mesma ser um fenômeno de construção cognitivo, deve também funcionar como um meio de comunicação e controle social. De fato, ela é internalizada na mente como um conhecimento abstrato, mas a fim de que tal internacionalização aconteça, ela também deve ser experimentada no mundo externo como comportamento atual. Portanto, outra forma de analisar a linguagem é em termos da função social que ela desempenha. O que é particularmente surpreendente acerca da linguagem a partir deste ponto de vista é a maneira como ela é moldada como um sistema de sinais e códigos cujo objetivo é satisfazer as necessidades comunitárias e sofisticadas das sociedades humanas. Então, por que a linguagem humana existe da forma como ela é? A resposta provavelmente está no fato de que a mesma evoluiu não com a evolução biológica das espécies, mas com a evolução sócio-cultural das comunidades humanas. Assim, o que importa saber e utilizar: a norma padrão ou os padrões de norma? O que importa mais na convivência entre os povos e na sua comunicação, (a qual é uma consequência imediata das interações sociais e das trocas de informação, e é o que mantém o mundo globalizado em sintonia), e, portanto no aprendizado de uma Língua, em especial das segundas Línguas: a exatidão das normas ou a fluência da comunicação? Nos últimos cinquenta anos, muitas coisas foram discutidas e aperfeiçoadas com relação ao aprendizado de uma língua estrangeira, pela evolução de quase todas as metodologias de ensino mais recentes, com suas descobertas, conclusões, mas também, e principalmente, com suas dúvidas e questionamentos. Dentre todas, aquela que mais contribuía para divergências e polêmicas era, sem dúvida, a que tratava do debate entre os conceitos de FLUÊNCIA x EXATIDÃO (fluency x accuracy), isto é, discutia-se o que deveria ter mais importância no processo de 14 aprendizagem: a gramática e a exatidão das regras estruturais da Língua, ou os alunos deveriam também saber que muitas vezes a comunicação se dá mesmo que as normas não sejam totalmente obedecidas; que muitas vezes é possível fazer-se entender (comunicar-se) sem que se conheçam as regras estruturais a fundo; que a correção intensiva dos erros pode, inclusive, barrar o processo interativo de uma comunicação eficaz. Com a evolução dos estudos da sociolinguística e da neurolingustica, ficou claro que é necessário desenvolver nos alunos dois tipos de competência: a competência gramatical, que significa ter o conhecimento das normas gramaticais da língua que se está usando, e a competência comunicativa, que significa a capacidade de usar esta mesma língua em interações sociais, onde o contexto e a necessidade comunicativa são mais importantes do que as regras. Outro fator de extrema importância na aprendizagem de uma Língua, é sem dúvida, o fator cultural. E, no nosso caso, mais especificamente, a interculturalidade, pois estamos falando de aprender uma segunda língua e, consequentemente, de Línguas em contato, elemento que tem estudos realizados com base na Linguística Contrastiva, o que também sustenta a realização de nossa pesquisa. Esta pesquisa objetivou, portanto, analisar e refletir acerca de um questionamento que se faz recorrente, ao longo de vários anos, sobre a questão do aprendizado de uma segunda língua e o fenômeno da interferência da Língua Materna sobre tal aprendizado, e se esta interferência causa desvios de padrão na norma ‘dita culta’. Para isso, buscamos verificar até que ponto as características do sistema linguístico da primeira língua, neste caso, o Português, interferem no aprendizado de outro idioma, de uma segunda língua, aqui o Inglês, quer seja em cursos de idiomas, quer seja em escolas regulares, fato que tenho observado ao longo dos meus mais de 30 (trinta) anos de experiência na sala de aula, com o ensino de inglês como segunda língua, quando também pude acompanhar a evolução de quase todas as metodologias de ensino, desde as antigas até as mais recentes. Pude também acompanhar os resultados trazidos por estas em sala de aula e as incertezas vividas por professores e instrutores, bem como coordenadores e supervisores. Procuramos, também, identificar aquilo que deve ser considerado ERRO, ou desvio linguístico ou normativo não aceito, e se há indicações para fenômenos como a fossilização. 15 Assim, professores e coordenadores de cursos livres e de cursos de Graduação discutiam se não seria importante aceitar e permitir determinados “erros” como eventos linguísticos aceitáveis, mas explicar com clareza o que eles significavam, e suas limitações contextuais, ou seja, que tais manifestações linguísticas só poderiam ocorrer em determinadas situações bem definidas. Para tal fim, o objeto de estudo deste projeto são os desvios linguísticos na produção escrita de falantes usuários de língua portuguesa, durante o processo de aprendizagem de uma segunda língua (Inglês), e a questão central é reconhecer a interferência dos fatores linguísticos da língua materna sobre a aprendizagem da segunda língua, mostrando que certos desvios podem influenciar ou não, o processo de comunicação. Então, esta pesquisa é importante por observar e investigar os problemas mais frequentes envolvidos no processo de aprendizagem da segunda língua, a partir da interferência da língua materna, a fim de estabelecer parâmetros para julgar se ela ocorre, e em que níveis de aprendizagem; se ela ocorre somente nos níveis mais avançados quando a aprendizagem da língua materna já se consolidou, ou se em todos os níveis de aprendizagem, por estar fossilizada. Então, a partir do Referencial Teórico adotado (Linguística Contrastiva e a Linguística Descritiva), realizamos uma pesquisa de campo, através de um estudo descritivo, de abordagem quanti-qualitativa, por meio de um estudo comparativodescritivo-contrastivo, a partir da seleção e análise das manifestações do discurso escrito dos sujeitos selecionados, de acordo com as variáveis estabelecidas, apresentando as manifestações linguísticas da segunda língua (L2), as quais apresentavam desvios, comparando-as com as normas da língua materna (L1), para mostrar que tais desvios ocorriam por influência do sistema da língua materna sobre a produção citada. No primeiro capítulo, discutimos as características do falante usuário de língua portuguesa, aprendendo uma segunda língua (L2), e os elementos presentes no período de aprendizagem, bem como a influência das características inerentes ao sistema da primeira língua sobre a segunda, para depois, então, no segundo, analisar as metodologias presentes neste período de aprendizagem, buscando investigar como tais processos ocorrem, dentro dos preceitos e dos princípios mais aceitos atualmente. 16 No terceiro capítulo, fizemos uma discussão acerca do conceito de ‘erro’, debatendo a ideia da noção de ‘variação linguística’, assim como também os tipos de desvio mais frequentes, especialmente aqueles causados pela influência de um sistema (L1) sobre o outro (L2), apresentando uma série de exemplos destes, colhidos por meio de uma pesquisa de campo, cujos resultados estão demonstrados e analisados no capítulo 5 deste trabalho. E para ilustrar isto, mostramos um exemplo desta manifestação, no ANEXO A, quando debatemos um e-mail, de uma pessoa adulta, completamente alfabetizada, com grau de instrução Superior, já tendo ultrapassado todas as fases de aprendizagem da segunda língua, onde os desvios de que trata esta pesquisa são bem evidentes e estão marcados em cor diferente, no texto. É deste problema que tratamos no capítulo 5, onde apresentamos o resultado da pesquisa que realizamos, com falantes não nativos, aprendendo a língua inglesa como segunda língua, em dois universos diferentes, porém com características fenomenológicas semelhantes, o que tornou o resultado sólido e coerente. Na conclusão deste trabalho apresentamos novamente as questões norteadoras, que foram: a) Como o conhecimento linguístico do falante usuário de língua portuguesa (L1) interfere na aprendizagem da segunda língua (L2)? b) Que tipos de desvio – estruturais ou linguísticos – devem ser corrigidos? Como isto pode afetar a aprendizagem da segunda língua (L2)? c) Qual a função do professor, e do conhecimento que o mesmo tem da língua portuguesa, como condição que pode afetar a aprendizagem da segunda língua (L2)? E, por fim, Referências, onde estão contidas todas as fontes de consulta utilizadas para o aporte teórico desta pesquisa. 17 CAPÍTULO 1: O FALANTE USUÁRIO DE LINGUA PORTUGUESA E A APRENDIZAGEM DE UMA SEGUNDA LÍNGUA “O estudo da linguagem comporta duas partes: uma, essencial, tem por objeto a língua, que é social em sua essência; outra, secundária, tem por objeto a parte individual da linguagem, vale dizer, a fala”. (SAUSSURE, 2000) A primeira questão a examinar é o que se deseja alcançar com o aprendizado de uma língua. Sabe-se que, até a primeira parte deste século, a linguagem, tanto oral quanto escrita, era estudada da mesma maneira que a matemática, para ‘alargar’ a mente e trazer agilidade mental, hoje, é preciso que ela responda às necessidades práticas de entender e ser entendido, isto é, de promover a interação social e, consequentemente, a comunicação. Seria irreal, contudo, afirmar que todos os falantes usuários de uma língua desejam aprender outra língua para ter proficiência como se falante nativo fosse. O usuário da L1 estuda uma outra língua para satisfazer as suas necessidades. Seu objetivo deve ser o de usar a língua para satisfazer a essas necessidades de forma tão natural e efetiva quanto possível: a primeira porque ele quer entender e se expressar sem maiores obstáculos; e a outra porque ele quer entender e expressar ideias de forma coerente e lógica, isto é, ele quer interagir com o campo da comunicação social ao qual ele pertence. Um não-nativo que precise da língua apenas para compreender obras clássicas de literatura terá pouco ou nenhum interesse na linguagem relacionada ao contexto de um supermercado, enquanto que a pessoa que precisa comprar mantimentos no supermercado não terá praticamente nenhum interesse na linguagem presente nas obras clássicas de literatura. A necessidade mais simples de satisfazer é daquela pessoa que, diante de uma situação em que uma pergunta lhe é feita e, mesmo sem entender a pergunta, sabe o que ela tentou transmitir; e sem entender a resposta, sabe o que dizer. Assim, se uma pessoa entra em um ônibus em um país estranho, e o motorista dirige-se até ela e diz algo, não se precisa saber a língua a fundo para pensar que o que ele está provavelmente perguntando é para onde se quer ir. Se, em retorno, a 18 pessoa disser qual é o seu destino e lhe der uma quantia suficiente, com alguma sorte conseguirá seu bilhete e seu troco. Se o usuário da L1 tem este tipo de objetivo, não adiantaria ensinar-lhe a linguagem de um tradutor. Isto posto, vamos, então, supor que este queira entender e falar; entender a partir das palavras e adaptar suas respostas de acordo com as necessidades do momento, do contexto social no qual se encontra. Embora pessoas diferentes tenham interesses diferentes, uma grande parte da linguagem utilizada por todos é a mesma. O primeiro passo do usuário da L1, então, seria buscar este corpo central, comum a todas as línguas; primeiro o estudo das formas genéricas e depois das necessidades específicas. Uma das objeções ao modelo proposto por Chomsky (1957) é que ele definia a natureza do conhecimento linguístico de forma superficial, ao afirmar que era um conhecimento da forma gramatical e, especificamente da sintaxe. Saber uma língua, contudo, envolve mais que saber que forma ela toma. Envolve também saber como esta funciona. E, por conseguinte, isto significa conhecer os signos linguísticos, não apenas como unidades formais, como constituintes de estruturas, e sim como unidades de sentido que interagem com a sintaxe de forma bastante complexa. Os sistemas formais de uma língua, acima de tudo, evoluíram em associação com palavras que carregam o código semântico interno de uma determinada realidade social externa. Portanto, o argumento é que uma explicação de conhecimento gramatical não pode ignorar o fato de que a forma linguística tem uma motivação funcional de tal sorte que abstrair-se totalmente a forma da função, seria negar a natureza da língua. Nesse prisma, a linguística é o estudo de como as línguas tem significado, ou seja, como são funcionalmente informadas. A isso se chama semântica, que é um conceito primário em uma língua. A gramática formal de Chomsky procura identificar características específicas da sintaxe com referência aos princípios universais e inatos da cognição humana. Uma alternativa é a de se pensar em termos de uma gramática funcional, se considerar como a linguagem é diferenciadamente influenciada pelo meio e de como ela é moldada pelo uso social, assim, refletindo a função que ela vem a servir. No entanto, argumenta-se que saber uma língua também implica saber como acessar sua gramática e outros elementos formais da linguagem, expressar significados apropriados aos diferentes contextos em que a comunicação acontece. 19 Isso também é uma questão de função, porém com um sentido diferente. Nesse caso, preocupa-se não com o que a linguagem significa, isto é, com a função interna do código linguístico, mas sim com o que as pessoas querem dizer por meio da linguagem, ou seja, que formas de funções externas são utilizadas para a comunicação ocorrer. O conhecimento da forma abstrata da língua deve ser transformado em elemento de atualidade, o que normalmente é atingido ao se colocar este a serviço do uso comunicativo, e não apenas o de citar frases a esmo. As pessoas não apenas mostram aquilo que sabem. Elas agem sobre seu conhecimento e suas ações são reguladas por convenções as mais variadas. Assim, por esse prisma, a competência não é apenas conhecimento abstrato, e sim a habilidade de colocar esse conhecimento em uso prático, de acordo com determinadas convenções. Portanto, há dois modos de revisar os conceitos de competência de Chomsky (1957), de redesenhar as linhas de idealização em definir um modelo de linguagem. Primeiro, podemos redefinir aquilo que constitui o código ou a linguagem interna ao incluir aspectos que refletem a natureza da linguagem quanto recurso comunicativo. Isto resulta em uma gramática funcional e, podemos dizer que alarga o conceito de conhecimento linguístico. Em segundo lugar, podemos estender a noção de competência em si mesmo, incluindo tanto o conhecimento quanto a habilidade de agir sobre ele. A performance, então, passa a ser momentos específicos de comportamento que resultam do exercício da habilidade e não são simplesmente reflexos do conhecimento. A habilidade é o ramo executivo da competência, por assim dizer, e capacita alguém a alcançar o significado ao colocar seu conhecimento para atuar. Se não se tivesse esta habilidade de acesso, poder-se-ia argumentar, as estruturas abstratas do conhecimento – isto puramente sendo a competência linguística – permaneceriam internalizadas na mente e jamais ganhariam vida. Passaríamos toda a vida imersa em pensamentos, numa espécie de paralisia cognitiva. Visto que essa habilidade só é ativada por alguma necessidade comunicativa, poderíamos chamá-la de competência comunicativa. Então, embora se possa definir conhecimento linguístico dessa forma, ele envolve alguma abstração da realidade e certo tipo de classificação da experiência. Dizer que você sabe uma língua implica dizer que você inferiu certas generalidades a partir de certas especificidades. É o que se faz quando se aprende uma língua. 20 Dizer que você sabe como atuar sobre seu próprio conhecimento implica dizer que você inverte o processo anterior e identifica momentos, ou seja, refere-se a especificidades a partir de generalidades. 1.1 O PAPEL COMUNICATIVO DA LINGUAGEM Há muitas teorias que estudam a natureza e a função da linguagem. Todas, no entanto, concordam em um ponto: a linguagem é uma resposta a uma necessidade de comunicação e as formas linguísticas são convenções estabelecidas pela sociedade. Uma língua, assim, deve ser considerada um veículo de comunicação e consequentemente a manipulação de elementos estruturais, os quais são uma extensão da gramática internalizada do falante, a qual deveria ser uma atividade puramente comunicativa. Isto vai de encontro à noção de que a manipulação estrutural deve ser distinta do uso comunicativo da linguagem, segundo Newmark e Reibel (1968) [...] Os exercícios estruturais nos quais os falantes não-nativos precisam mudar rapidamente de uma frase apropriada a uma determinada situação para outra frase apropriada a outra situação, completamente diferente são ineficazes em princípio. Eles forçam o falante a produzir frases que são difíceis de absorver a não ser que ele tenha a rara habilidade de imaginar uma situação completamente nova para cada frase, enquanto segue os 1 requisitos mecânicos do exercício. (NEWMARK; REIBEL, 1968, p. 15). O aprendizado, então, deve oferecer um cenário semântico constante nos termos do qual as estruturas possam ser manipuladas. Tais manipulações devem ocorrer na forma de diálogos que estimulem a comunicação, solicitando esta a realizar sua função social. Surge, desse modo, o conceito de Língua como instrumento de comunicação, com base no ensino descritivo, e passam-se a considerar os vários falares 1 Structural drills in which the student practices switching quickly from an utterance appropriate for one situation to another utterance appropriate for quite another situation, are ineffective in principle. They force the student to produce utterances whose use is difficult to grasp unless he has the rare skill…of imagining a whole fresh situation for every utterance. 21 igualmente ‘corretos’, pois não se pode associar o que é ‘correto’ somente ao que é ‘culto’, ainda que o código culto continue regendo o sistema. Logo, a partir desse momento, os códigos do caipira, da criança, do nãoescolarizado, entre outros, não podem ser estigmatizados como ‘errados’, visto que eles conseguem estabelecer a comunicação como variantes linguísticas que, segundo Tarallo (1986, p. 8), são: “[...] diversas maneiras de se dizer a mesma coisa em um mesmo contexto e com o mesmo valor de verdade”. Tarallo (1986) chama o conjunto dessas variantes de variável linguística. Essas variantes podem ser subdivididas em variantes de prestígio, variantes estigmatizadas, variantes inovadoras e conservadoras, variantes livres e combinatórias, estereótipos, indicadores e marcadores e ainda em variantes externas. Com relação a esta ultima variante citada, Monteiro (2002) afirma que dos possíveis fatores externos, os que mais têm sido discutidos são o estilo da fala, o sexo, a idade, a escolaridade, a profissão, a classe social, a região ou a zona de residência e a origem do falante. Fatores como clima e raça parecem não exercer qualquer influência. Labov (1972) defendia arduamente essa relação língua x sociedade, e por volta de 1960 iniciou uma série de investigações sobre a variação linguística. Suas pesquisas tentaram explicar as variações de uma língua por meio de uma redefinição do conceito chomskiano de competência. Labov (apud Tarallo 1986, p. 7) entendia a “[...] competência como o conjunto de regras de conteúdo sociológico – diferentes níveis e registros de língua – que, uma vez conhecidas pelo falante, podem ser empregadas de acordo com o contexto social ou a situação”. Na nossa pesquisa, pudemos constatar a presença das manifestações investigadas mesmo diante das variáveis mencionadas como fatores intervenientes no desenvolvimento das competências, o que representa um dos papéis mais importantes da sociolinguística, que é o de registrar, descrever e analisar sistematicamente diferentes falares e seus condicionadores sociais (diferenças de classe, sexo, educação, idade e ocupação), elegendo, assim, a variedade linguística como seu objeto de estudo. Então, o que se discute hoje, especialmente após o fenônemo da globalização é como as línguas interagem entre si e como a existência de um sistema linguístico já completamente absorvido pode influenciar na aprendizagem de 22 outro sistema e, se tal interferência pode resultar em manifestações que causem problemas de comunicação. O que exerce o papel de principal elo entre a cultura e a sociedade de um povo é a sua língua. Por meio dela, a cultura propaga-se, renova-se e perpetua-se através das gerações, além de propiciar uma característica marcante aos seus falantes, que os diferencia de membros de quaisquer outras sociedades. A respeito desta relação, Jakobson (2005) nos diz que Com efeito, os antropólogos têm sempre afirmado e provado que a linguagem e a cultura se implicam, mutuamente, que a linguagem deve ser concebida como uma parte integrante da vida social, que a Linguística está estreitamente ligada à Antropologia Cultural. (...) No mais, só se pode concordar com nosso amigo N. McQuown, que compreendeu perfeitamente que não há igualdade entre os diferentes sistemas de signos e que o sistema semiótico mais importante, a base de todo o restante, é a linguagem: a linguagem é de fato o próprio fundamento da cultura. (JAKOBSON, 2005; p.17) Se cultura é a coleção de tudo que surge a partir da produção humana, gerada com base em suas experiências em relação ao mundo, a linguagem é provavelmente a primeira ferramenta que desenvolvemos - consciente ou inconscientemente - com o objetivo de exteriorizar essas impressões. No entanto, até aqui se falou apenas de cultura de modo isolado, levando-se em consideração apenas um povo. Mas não podemos jamais esquecer que no mundo existem centenas de sociedades distintas, com línguas, costumes e maneiras próprias, mas isso não impede que as mesmas se relacionem. Voltando aos tempos atuais, vejamos como essas relações se manifestam hoje, após séculos de evolução, tanto das línguas como da sociedade humana. Segundo Hinojosa & Lima (2008), “[...] a interculturalidade é uma forma de relação dialógica entre indivíduos de culturas distintas que visa superar as diferenças e integrá-las em uma unidade.” Portanto, qualquer tipo de interação entre membros de culturas diferentes é uma relação intercultural, seja no campo das artes, da ciência, da política, dentre outros exemplos que fazem parte de nosso cotidiano de forma tão incisiva que, muitas vezes, nem sequer os percebemos como elementos que nos integram a outras culturas. Hoje temos meios de comunicação, como a internet e a telefonia via satélite, que nos conectam instantaneamente com qualquer parte do globo. Temos zonas de 23 livre comércio entre países pertencentes a blocos político-econômicos continentais. Temos tratados de extradição, cidades-irmãs, acordos comerciais e políticos entre países de continentes diferentes. Temos países com diversas línguas oficiais. O mundo vive atualmente um fenômeno único conhecido como globalização. Essa globalização, além de integrar os povos, integra também suas culturas. Em Nova Iorque, por exemplo, há um feriado chamado brazilian day, tamanha a quantidade de brasileiros que vivem lá atualmente. No Japão, outro país onde a presença de brasileiros é grande, há restaurantes especializados em culinária brasileira, como feijoada, churrasco, etc. Há escolas de idiomas que formam turmas com crianças a partir de quatro anos de idade, em um ambiente de imersão total na língua e cultura proposta, com o objetivo de acostumar o mais cedo possível essas crianças à convivência em meio a outras línguas. Assim, há que se observar como uma língua interfere sobre a outra a fim de minimizar seus efeitos e solidificar o aprendizado de uma outra, envolvendo a absorção de sua cultura, seus costumes e tudo o mais que se relaciona a este fenômeno. 1.2 A PERCEPÇÃO PELA MENTE Saussure (1916) há mais de meio século, e mais tarde Troubetskoy (1949) e também a Escola de Praga (1945) demonstraram que a linguagem não é uma série de palavras agrupadas por meio de regras gramaticais, e sim uma série de unidades completas e complexas (ensembles). Dentro de cada uma dessas unidades, cada palavra tem um valor, somente pelo fato de fazer parte de um todo. Esse ponto de vista é compartilhado pela Escola Gestalt, termo que em alemão significa aproximadamente forma, utilizado para enfatizar que aquilo que é ensinado é recebido em partes inteiras organizadas e estruturadas. Ao ouvir uma melodia, entendemos esta como uma forma melódica completa, não como sequência de notas soltas e não relacionadas. Esses elementos inteiros perceptuais são muito mais que o conjunto das partes. Eles têm características próprias. A concepção básica da psicologia Gestáltica se opunha a já estabelecida tradição de analisar uma experiência por meio de seus elementos individuais, 24 conectados por regras de associação. Da mesma forma que se olha uma fotografia de uma pessoa e se absorve o que se vê de relance, também a mente percebe uma unidade sem analisar as partes individuais uma por uma. 1.3 A SEGUNDA LÍNGUA E A INTERFERÊNCIA DA LINGUA MÃE Uma língua é, segundo as considerações acima feitas, percebida e adquirida naturalmente (a primeira língua, pelo menos) em unidades ou Gestalten. Tais unidades, contudo, diferem de uma língua para outra. Ao aprender uma segunda língua, certas diferenças existem com respeito ao método pelo qual a primeira língua é aprendida. A principal diferença repousa no fato de que há uma constante interferência dos elementos da língua ‘mãe’ que já se tornaram automáticos. Tal interferência pode ser de três tipos: fonológicas, morfossintáticas e grafofonêmicas. 1.3.1 Interferência fonológica Tão logo um falante adquire sua primeira língua (L1), a forma dos sons tornase fixada de tal sorte que ele não poderá ouvir certos sons em uma nova língua, em especial aqueles que não existem em sua língua. Portanto, até que se tenha dominado os hábitos linguísticos de uma segunda língua, estes serão substituídos, em nossa audição, pelos sons de nossa língua ‘mãe’ que mais se aproximarem daqueles que pertencem ao segundo idioma. Sabemos que uma língua é percebida em unidades. Isto se dá tanto no âmbito sintático quanto no fonológico, por exemplo. Fonologicamente, as unidades suprassegmentais de sons são a entonação e o ritmo. No caso particular da língua inglesa, algumas dificuldades são muito óbvias. Por exemplo, o português tem acentuação tônica simbolizada por acentos gráficos, enquanto o inglês, não; alguns sons são bastante difíceis de articular para o usuário cuja primeira língua é o português. 25 Assim, palavras como they tendem a soar como day para o falante do português, pois o som do th inicial é inexistente nessa língua. Como tais elementos têm o mesmo som vocálico, eles podem facilmente causar mal-entendidos. Outro problema fonológico muito comum quando um falante de português está aprendendo inglês é o fato de que a segunda língua tem vogais abertas que não são diferenciadas por acento gráfico, mas somente pelo acento articulatório do próprio som, levando palavras como bed e bad a soarem de forma idêntica embora a primeira seja um substantivo (cama) e a segunda um adjetivo (mau). Ainda outro problema é o fato de que a divisão silábica em inglês é feita por meio do valor fonético das sílabas, fato gerador de muitas dificuldades para o usuário da L1 que esteja fazendo uso de discurso expresso na modalidade escrita. 1.3.2 Interferência morfossintática Enquanto uma oração do tipo Eat I asparagus every evening? (que traduzida ao pé da letra seria: Como eu aspargos todas as noites?) não seria correta na língua inglesa, ela poderia ser na língua ‘mãe’. A interferência morfossintática deriva da substituição de elementos da segunda língua por elementos da língua ‘mãe’ na forma de tradução literal. Neste caso, o correto seria dizer Do I eat asparagus every evening? (Eu como aspargos todas as noites?) ou mesmo Can I eat asparagus every evening? (Eu posso comer aspargos todas as noites?). Contudo, como no português não se precisa de verbo auxiliar para começar uma oração interrogativa, coloca-se, na oração em inglês, o verbo diretamente como em português. No caso do português, é muito comum começar uma oração com um verbo conjugado, como o exemplo apresentado no parágrafo anterior. Já em inglês, não. Assim, em português está ‘correto’ dizer: É tarde, enquanto em inglês a oração teria de ter um sujeito neutro, representado pelo pronome pessoal It, fato que traz uma expressão como Is late, em inglês, a qual seria incorreta, mas existiria pela forma utilizada em português. Outro exemplo muito comum dessa interferência é representado pelo uso do artigo definido the antes de nomes próprios como se faz em português quando se diz: O Teatro da Paz é bonito em contraste com o que se 26 diz em inglês The Teatro da Paz is beautiful, o que não está correto, pois em inglês não se deve usar o artigo definido antes de substantivos próprios. 1.3.3 Interferência grafofonêmica Os signos usados no discurso escrito da segunda língua podem provocar uma reação da língua mãe, quando muitas vezes grafamos os mesmos como se fossem desta, mas na verdade teriam uma grafia diferente na L2. Às vezes, isto pode também ocorrer com outras línguas que possam ter sido estudadas. Segundo Saussure (2000) o inglês é uma língua com características lexicológicas, enquanto que o portugues é uma língua com características gramaticais. Podemos citar o exemplo de certas formas verbais. Enquanto a nossa língua, mais gramatical, rica em sufixos e desinências, emprega formas como falávamos ou beberas (-va- e –ra- = desinências modo-temporais; -mos e –s = desinências número-pessoais), o inglês, língua mais lexicológica, menos dotada de recursos gramaticais, utiliza, nesses casos, lexemas específicos para indicar as categorias de modo-tempo e número-pessoa: we spoke, you had drunk (por isso não há sujeito elíptico nos verbos ingleses: falta-lhes a desinência número-pessoal). Caso semelhante ocorre em certas formas de plural ditas irregulares: foot/ feet (pé/ pés); mouse/ mice (rato/ ratos). Em português, a categoria de número é indicada sistematicamente por um processo flexivo, ou seja, gramatical (a desinência –s), formando assim signos relativamente motivados, ao contrário do que ocorre, nestes casos, com seus equivalentes na língua inglesa (compare-se pé + s com feet). Relatos de falantes usuários de língua portuguesa dão conta de que, mesmo depois de anos nos Estados Unidos, ainda era impossível para eles, sem uma considerável dose de esforço, pronunciar um o suficientemente aberto para uma palavra como, por exemplo, hot, onde o deve soar como a, e a mente então resiste a pronunciar um a onde ela vê um o. Porém, é mais provável que se pronuncie um a para a vogal o aberta em palavras que não se vê. Visto que as línguas vivas são 27 primariamente sistemas falados, deve-se adiar, portanto, a introdução da forma escrita da língua a fim de lutar contra a interferência grafofonêmica. 1.4 EFICIÊNCIA COMUNICATIVA Ao debater a competência comunicativa, contudo, como se poderia abandonar os efeitos da interculturalidade? Será que é possível ao falante nãonativo saber o que é apropriado sem realmente viver algum tempo na comunidade da língua de chegada? Fala-se muito sobre a competência comunicativa, mas pouco se define esta em termos de nível. Por exemplo, todos os falantes nativos são comunicativamente competentes? A resposta teria que ser não, se considerarmos que parte desta competência significa saber o que é apropriado em certas circunstâncias. E é, no mínimo duvidoso, esperar que um falante usuário da L1 possa desenvolver a competência comunicativa na L2. Devemos lembrar que grande parte dos falantes usuários da L1 aprende uma segunda língua longe da comunidade de chegada, e também é questionável se um professor (o qual é normalmente também usuário da L1) pode dar esse conhecimento. Então, a competência comunicativa pode não ser apenas um conceito impossível, mas também desnecessário em uma sala de aula de aprendizado de uma segunda língua. O que se pode buscar, contudo, é a eficiência comunicativa. Nesse caso, pode-se esperar que os falantes usuários da L1 sejam capazes de expressar o que querem dizer na L2, isto é, se eles quisessem expressar um desacordo, pode-se assegurar que eles conseguiriam fazê-lo e o significado daquilo que foi expresso seria entendido. O aprendizado de uma língua é um processo físico, mental e emocional, ao mesmo tempo. Ele envolve o desenvolvimento de habilidades musculares, especialmente na fala, isto é, o processamento intelectual de ideias e conceitos, e as emoções que requerem um profundo engajamento pessoal, exigido pelo aprendizado de uma segunda língua. Podemos dizer que dos três elementos mais clássicos da existência humana – o físico, o intelectual e o emocional – este último é o fundamental, a alma. As 28 emoções são o fundamento sobre o qual todas as estratégias, técnicas e sinais do aprendizado de uma segunda língua permanecerão ou desaparecerão. 1.4.1 Gramática As duas orações seguintes ilustram bem o papel da gramática em termos da necessidade de se tornar comunicativamente eficiente: a) He arrived yesterday (ele chegou ontem). b) Not for many years have I felt so exhilarated (Eu não me sinto tão alegre em muitos anos). A primeira oração é claramente importante para quem deseja falar uma língua, enquanto a segunda é uma questão mais sofisticada, que envolve conhecimentos mais complexos e avançados de gramática, sendo mais uma questão de estilo. Fica evidente que para um falante não-nativo ser considerado comunicativamente eficiente, ele precisará conhecer a forma verbal do passado simples, saber como falar acerca de eventos no passado, usando aquele tempo verbal. Porém o fato de que um advérbio (exemplo b acima), ao iniciar uma oração, requer uma inversão de elementos desta (o sujeito troca de posição com o verbo auxiliar), quando se trata da língua inglesa (L2), não é algo que possa comprometer sua eficiência comunicativa, pois este poderá atingir o objetivo esperado com uma oração mais simples, como I have felt exhilarated for many years, onde não há a necessidade de inversão. A fim de ter uma eficiência comunicativa, o falante não-nativo deve buscar uma compreensão e um correto manuseio dos conceitos gramaticais mais essenciais para o usuário da língua. Os efeitos sofisticados de estilo, especialmente usados no discurso escrito, não são considerados essenciais para a comunicação. Para se ter um comando completo da língua, tais estruturas são desejáveis, mas nem todos os falantes usuários da L1 terão interesse em atingir um nível sofisticado de estilo literário. 29 1.4.2 Falantes usuários de língua portuguesa com níveis de aprendizado diferentes Não se pode esperar, obviamente, que um falante usuário de língua portuguesa seja comunicativamente eficiente, depois de apenas dez horas de aprendizagem, por exemplo. A esse nível, ele saberá apenas uma pequena porção de linguagem. O seu objetivo de longo prazo deve ser o de alcançar um alto nível linguístico. Em um estágio inicial do processo de aprendizagem, o falante não-nativo que busca adquirir uma segunda língua terá somente dados limitados da língua de chegada (nesse caso mais específico, o inglês) em seu domínio. Ele, então, deve tentar comunicar-se apenas com este pouco conhecimento da segunda língua. Se pensarmos em termos de funções linguísticas, por exemplo, diz-se que este terá de ser capaz de trocar informações pessoais, uma função linguística vital, embora não se possa esperar o uso de elementos muito complexos neste estágio. Assim, pode-se pedir uma informação usando-se a oração: Excuse me, I wonder if you could tell me where the station is? (Desculpe, eu fico pensando se você pode dizer-me onde fica a estação?), elemento bastante formal e complexo para um falante não-nativo iniciante na aquisição da língua poder usar, quando uma oração do tipo: Excuse me, where is the station? (Desculpe, onde é a estação?) tem o mesmo efeito, realiza a mesma função eficientemente. Com relação à gramática, deve-se esperar que o falante não-nativo saiba usar a linguagem que ele já adquiriu, isto é, se ele já sabe como utilizar o presente simples, ele saberá dizer uma oração do tipo: He leaves the office at six o’clock (Ele sai do trabalho às 6) e, consequentemente, usar a mesma construção para fazer perguntas do tipo: When does the bus for Oxford leave? (Quando o ônibus parte para Oxford?). Com isso, tentamos mostrar que mesmo com o conhecimento de inglês limitado, não possa comunicar-se de forma razoavelmente eficiente com o conteúdo linguístico de que dispõe. Obviamente, quanto mais baixo o seu nível, menos trabalhada será sua linguagem. Mas sem dúvida, ele poderá usar a linguagem que já adquiriu para efeito de comunicar-se. 30 1.4.3 Situação e contexto Já foi dito que o falante não usuário da língua precisa ser treinado a usar a língua, e isto não se resume em adquirir apenas um sistema abstrato. Como se sabe, a linguagem ocorre em situações, e com o intuito de ser capaz de usá-la, o falante deve estar ciente de quais situações e de quais contextos, determinados elementos são comumente usados. A aquisição da segunda língua, com vista a atingir a eficiência comunicativa deve ocorrer, então, com o aprendizado por meio de contextos situacionais, onde determinado conjunto linguístico é utilizado. Seria fácil aprender um conjunto como John is running (João está correndo), mas, sem saber em que circunstâncias o presente progressivo (tempo verbal presente na oração mencionada) deve ser usado, essa aquisição não estará ajudando o usuário de língua portuguesa a alcançar a eficiência comunicativa. 1.4.4 Pronúncia e sotaque Muitos falantes não-nativos, entre os quais se encontram até mesmo os professores, pensam que o único objetivo de longo prazo para um falante nãonativo, que está aprendendo uma segunda língua, é o de falar exatamente como um nativo o faz. Um breve momento de reflexão, no entanto, mostra que essa posição é bastante preocupante. Em primeiro lugar, são raríssimos os falantes não-nativos que vivem na comunidade linguística de chegada e, portanto, compartilham das nuanças comunicativo-sociais dos falantes nativos (característica crucial para o aprendizado de uma língua, conforme estabelecem os estudos da sociolinguística). Em segundo lugar, não é absolutamente necessário, essencial que o falante não-nativo fale exatamente como um falante nativo, fato que ficou ainda mais evidente com o fenômeno da globalização e a desconstrução das identidades culturais, sociais e linguísticas. E, apesar das recentes descobertas da neurolinguística e da psicolinguística, pode-se afirmar que, quanto mais velho for o 31 falante não-nativo, mais difícil será evitar as influências e interferências da primeira língua (L1). Quando se pensa no conceito de eficiência comunicativa, facilmente concluirse-á que este nível de proficiência não é exatamente necessário. A eficiência comunicativa pressupõe que o falante não-nativo possa dizer (e fazer-se entender) aquilo que ele desejar comunicar. A posse de um sotaque eminentemente nativo não assegura ao falante não-nativo qualquer eficiência comunicativa. Ao contrário, dependendo do grau de exigência interna para tal objetivo, este pode atrapalhar a comunicação, pois o sotaque poderá soar exageradamente pesado e de difícil compreensão até mesmo para um nativo. Sabemos que os hábitos linguísticos da primeira língua interferirão na aprendizagem da segunda. Isto se torna particularmente importante para falantes do japonês e do chinês, aprendendo inglês, pois aquelas linguas não possuem o som de r, e, assim, seus falantes poderão facilmente trocar palavras como, por exemplo, light (luz) por right (direito). Estes, então, devem buscar o aperfeiçoamento linguístico a fim de conseguir transmitir a ideia comunicacional correta, o que não significa falar como um nativo, até porque sabemos que, dentro da mesma comunidade linguistica, há muitos sotaques diferentes e, ainda assim, todos os falantes são considerados nativos. 1.4.5 Habilidades Já dissemos que o objetivo de um falante não usuário da língua, na maioria das vezes, é o estudo da linguagem para fins comunicativos, não sendo um objetivo primordial a habilidade de escrever peças literárias ou pesquisas acadêmicas. Assim, ao estudar uma segunda língua, o falante não-nativo deve buscar uma eficiência nas quatro habilidades (ouvir, falar, ler e escrever), numa visão genérica. Devemos buscar, no entanto, a habilidade proficiente dentro do nível linguístico do falante não-nativo para as quatro habilidades, o que, em um ambiente acadêmico de estudos, implicaria ter prática linguística por meio de tarefas simples, porém mais comunicativamente eficientes, sem, no entanto, descuidar-se da norma padrão da língua, isto é, da aquisição das regras da gramática normativa. 32 Sabemos, hoje, que o falante usuário de língua portuguesa pode atingir um nível mais alto nas habilidades receptivas que nas produtivas. Mas, tendo em vista que a teoria das inteligências múltiplas postula que qualquer falante não-nativo pode ser treinado a desenvolver habilidades outras que não aquelas que predominam em seu ambiente linguístico interno, é possível pensar que o falante nativo de língua portuguesa pode atingir também habilidades produtivas em nível mais alto. Portanto, se os falantes usuários de língua portuguesa forem treinados a ouvir e ler material linguístico autêntico na segunda língua, como queria Krashen (1977) com a sua teoria do “input compreensível”, acima do nível de compreensibilidade do falante, eles provavelmente alcançarão a compreensão de textos mais complexos que à primeira vista eles mesmos não seriam capazes de compreender tanto no discurso escrito quanto no oral. A eficiência comunicativa, então, quando se pensa nas quatro habilidades básicas, deve ser uma busca incessante à capacidade de realizar um ato linguístico ao nível do conhecimento linguístico e à capacidade de realizar um ato comunicativo eficiente. 1.5 VARIEDADES LINGUISTICAS A variedade linguística, presente em todas as línguas, como no inglês, portanto, deve ser considerada. No caso do inglês, que tem uma grande variedade linguística, tal fato é ainda mais relevante. Apesar do fenômeno da globalização ter aproximado as sociedades em nível comunicacional e, assim, diminuído a interferência dessas variedades, ainda se sabe que o inglês britânico é diferente do inglês americano, e ambos são, por sua vez, diferentes do inglês jamaicano e australiano, por exemplo. Todas são variedades aceitas na comunidade linguística do inglês enquanto língua e nenhuma pode ser preterida em relação à outra, por ser considerada inferior. O falante usuário de língua portuguesa, então, deve buscar uma eficiência comunicativa genérica, que o possibilite a ter uma performance comunicativa sem importar qual seja a variedade linguística da comunidade com a qual estiver interagindo. A situação é ainda mais complexa quando se considera a variação linguística em um país. Há considerável diferença entre as regionalidades e 33 seus respectivos hábitos linguísticos. Isto é facilmente observável quando as comunidades linguísticas se dividem pelo critério geográfico, propiciando o surgimento de variáveis culturais importantes. Busca-se, então, a aquisição de um padrão linguístico, o qual tem definição muito complicada e controversa em qualquer domínio linguístico que se esteja considerando. Contudo, a linha imaginária de um padrão linguístico é necessária para balizar os estudos de uma segunda língua, bem como todo o apoio didático necessário a tal feito. 1.6 UMA ANÁLISE DESCRITIVA DA LINGUAGEM Uma grande proporção da linguagem utilizada por todos, não importa qual o seu interesse, é a mesma. Assim, a primeira tarefa de um falante não-nativo é estabelecer uma ordem de prioridades para seu aprendizado. Como já se postulou, essas prioridades podem ser analisadas em quatro domínios diferentes: o estrutural, o lexical, o fonológico e o morfografêmico. Ao se descrever uma língua, deve-se ser particularmente cuidadoso em escolher aquelas formas que o falante usuário da mesma utiliza, e não aquelas que se gostaria que ele utilizasse, pois o falante usuário de língua portuguesa deve ter consciência das formas linguísticas que são aceitas como regra, bem como de todas as formas que são aceitas como fenômeno de comunicação, haja vista que nem tudo que postulam as regras ser o que o falante nativo utiliza no seu dia a dia e o que também é considerado manifestação linguística ‘correta’. Um exemplo muito claro desse fenômeno, hoje, são as comunidades de relacionamento da web, cujos usuários criaram um código linguístico todo particular, e nem por isso deixaram de serem considerados falantes nativos ou não-nativos. Em outras palavras, ao se adquirir uma segunda língua, deve-se estar atento para a dinâmica linguística, pois é evidente que novos signos e novos elementos vão aparecendo e vão se incorporando ao léxico daquela língua. No entanto, a aprendizagem de uma segunda língua não passa apenas por fatores linguísticos. Passa também por fatores não linguísticos, como, por exemplo, 34 a motivação e autoestima, a receptividade, o grau de sociabilidade para a interação com uma nova comunidade cultural, dentre outros. Todos esses fatores estão relacionados com a área psicológica do aprendizado. 1.7 FATORES PSICOLÓGICOS O fator psicológico de maior importância depois da motivação é a necessidade de comunicação. No caso da segunda língua, no entanto, concebe-se que a motivação é o fator fundamental no seu aprendizado. 1.7.1 Motivação Em primeiro lugar, devemos dizer que até hoje ninguém sabe ao certo por que alguns falantes não-nativos conseguem aprender uma segunda língua com maior grau de sucesso que outros. Muito já se conseguiu compreender com os avanços da psicolinguística e da neurolinguística nesse sentido, mas ainda não se tem uma resposta definitiva para essa questão. Há, porém, um determinado número de fatores que se acredita possa interferir neste processo. Diz-se que um falante usuário de língua portuguesa terá sucesso linguístico mesmo que as circunstâncias nas quais o processo de aprendizagem ocorra seja desfavorável. E é certo que elas possam ser desfavoráveis. Parece razoável sugerir, então, que a motivação, no caso da aprendizagem de uma segunda língua, é o fator não linguístico mais importante. A motivação é um tipo de estímulo interno que encoraja alguém a perseguir um determinado curso de ação. Parece ser o caso de que, ao se perceber uma meta, se ela for suficientemente atraente, far-se-á tudo o que for necessário para alcançá-la. Obviamente, o falante usuário da língua portuguesa aprendendo uma segunda língua também estabelece metas e objetivos de vários tipos, como os de curto prazo e os de longo prazo. 35 Portanto, deve-se estabelecer uma divisão para a motivação. Normalmente consideram-se dois tipos principais de motivação: extrínseca e intrínseca. 1.7.1.1 Motivação extrínseca A motivação extrínseca é aquela que se refere a fatores de fora do ambiente linguístico de aprendizagem, isto é, está relacionada com os objetivos que o falante usuário de língua portuguesa estabeleceu para seu aprendizado. Consideram-se, normalmente, dois tipos de objetivos: Motivação Integrativa: nesse caso, o falante não-nativo é atraído pela cultura da comunidade linguística de chegada, e é seu desejo integrar-se naquela comunidade ou conhecer sobre ela o máximo que puder. Motivação Instrumental: nesse caso, o falante acredita que o conhecimento da língua de chegada será instrumental ao dar-lhe condições de conseguir um emprego ou uma promoção. A língua, então, serve como um instrumento para seu intento. Sem dúvida, não parece ser o tipo de motivação que conta. Certamente, um falante usuário de língua portuguesa terá maiores chances de sucesso no aprendizado de uma segunda língua se estiver fortemente motivado, tanto integrativa quanto instrumentalmente. Há certo número de outros fatores, contudo, que interferem na motivação extrínseca, e a maioria destes tem algo a ver com a atitude do falante usuário de língua portuguesa em relação à segunda língua, atitude esta que poderá ser fortemente afetada pelas outras pessoas ao seu redor. Se os pais, os amigos e outras pessoas importantes na vida do falante apoiam sua escolha pela cultura de chegada, e, consequentemente, pela língua de chegada, ele logrará probabilidade maior de êxito. O próprio professor pode interferir no grau da motivação extrínseca no que tange à atitude do falante não-nativo. Se ele tiver uma atitude e uma postura negativa em relação à cultura da língua de chegada, poderá criar um ambiente desfavorável para o aprendizado do falante não-nativo. 36 1.7.1.2 Motivação intrínseca Enquanto é razoável pensar-se que muitos falantes usuários de língua portuguesa, adquirindo uma segunda língua, têm algum grau de motivação extrínseca, e que é verdadeira a afirmação de que a atitude destes em contato com a língua de chegada poderá ser afetada por outros membros de sua comunidade, parece também ser o caso de pensar-se que a motivação intrínseca tem um papel bem mais importante para o sucesso ou fracasso da maioria dos falantes usuários de L1, adquirindo a segunda língua. Muitos falantes usuários de língua portuguesa não apresentam nenhum grau de motivação extrínseca, e, no caso de crianças, podem ter sentimentos neutros ou até mesmo negativos acerca da aprendizagem de uma língua. Para estes, será de vital importância aquilo que acontece na sala de aula no sentido de determinar sua atitude em relação à língua, e, então, aplicar a motivação, que é um componente vital no aprendizado de uma segunda língua. Alguns dos fatores que afetam a motivação intrínseca são: Método: o método por meio do qual o falante não-nativo aprende uma segunda língua tem certo efeito sobre sua motivação. Se ele for enfadonho, haverá uma diminuição de motivação; se interessante e motivador, suas chances de sucesso serão maiores. Condições Físicas: o tipo de ambiente favorece em muito a motivação no sentido do aprendizado, pois um lugar escuro e sem conforto desviará a atenção do falante e concorrerá para diminuir sua concentração e atenção, reduzindo suas chances de aprendizado. Professor: muitas vezes, dois professores usando o mesmo método, no mesmo tipo de espaço físico, poderão ter resultados diferentes de aprendizado para os falantes que estão adquirindo a segunda língua. Vários fatores podem interferir, como por exemplo, a atitude do professor, sua relação com os falantes, sua preparação técnica, sua própria motivação, dentre outros. Sucesso: o sucesso, ou a falta dele, tem papel importante no estímulo motivacional de um falante em contato com a língua de chegada. Desenvolver tarefas com o grau de dificuldade balanceada, proporcionar chances iguais de 37 aprendizagem para todos os falantes, utilizar-se de projetos que favoreçam a visão do falante sobre a cultura de chegada, dentre outros, podem ajudar na criação de uma atmosfera mais favorável de aprendizado. 38 CAPITULO 2: AS TEORIAS E MÉTODOS QUE EXPLICAM A APRENDIZAGEM DE UMA SEGUNDA LÍNGUA “O homem é dotado de uma mente e de sentimentos. Separar os dois significa negar tudo o que o homem é. Integrar os dois é ajudar o homem a 2 realizar o que ele poderia ser.” (BROWN, 1973). Nas últimas décadas, os estudiosos e pesquisadores têm se preocupado cada vez mais com os mistérios da aprendizagem, em especial de uma língua. Esta preocupação se acentua quando nos deparamos com os mecanismos de aprendizagem de uma segunda língua. Muito se tem avançado neste campo com as descobertas da sociolinguística e da neurolinguistica, embora as perguntas e dúvidas ainda estejam sem uma resposta definitiva e satisfatória. É o caso, por exemplo, da explicação de como a aprendizagem de uma língua realmente ocorre, quais os mecanismos que atuam para tal fim, como funciona o cérebro humano no processo de aprendizagem, especialmente de uma segunda língua. Um outro problema que preocupa os especialistas é a existência de desvios, de erros, e como isso pode afetar a aprendizagem e os fatores não linguísticos envolvidos no processo, como já vimos no capítulo 1. E, sem uma explicação definitiva, fica difícil minimizar este problema, o qual muitas vezes bloqueia uma aprendizagem eficiente e eficaz. Segue uma visão cronológica das principais tentativas de explicar o fenômeno da aprendizagem de uma segunda língua e suas principais características e indefinições. Sabemos que as sociedades não vivem sem um sistema de signos que expressem suas características linguísticas e culturais, isto é, a vida em sociedade não seria possível sem sistemas de signos que permitissem a comunicação. Segundo Haugen (1962 apud Bagno, 2001, p. 42), “[...] o ideal nacional exige que haja um único código por meio do qual tal comunicação possa existir”. Conforme nos diz Dubois (2006 apud Bagno 2001, p. 46), “Todas as sociedades humanas possuem um meio de comunicação “articulado”, a linguagem, mas as línguas são diferentes”, como também demonstram os estudos recentes 2 Man has a mind. Man has feeling. To separate the two is to deny all that man is. To integrate the two is to help man realize what he might be. 39 sobre interculturalidade (línguas em contato). Por muito tempo, o estudo da língua, centrado no ensino prescritivo – conjunto de regras sistematizadas – concebeu que esta não poderia ir além das normas gramaticais, regras estas que caracterizavam o bom usage. Assim se pensava que a língua deveria ser um sistema estático, pois A cultura escrita, associada ao poder social, desencadeou também, ao longo da história, um processo fortemente unificador, que visou e visa uma relativa estabilização linguística, buscando neutralizar a variação e controlar a mudança. Ao resultado desse processo, a esta norma estabilizada, costumamos dar o nome de norma-padrão ou língua-padrão. (FARACO apud BAGNO, 2002, p.40) Neste sentido, Bechara (1999, p. 52) diz que a “[...] gramática normativa recomenda como se deve falar e escrever segundo o uso e a autoridade dos escritores corretos e dos gramáticos e dicionaristas esclarecidos”. E ainda, Britto (1997, p. 56), afirma que a norma culta se refere à linguagem “[...] que efetivamente resulta da prática social, correspondendo à fala dos segmentos socialmente favorecidos”. Constatamos, então, que a ‘norma-padrão’ trata de um código normatizado de regras imperativas que definem o ‘certo’ e o ‘errado’ em matéria de pronúncia, de gramática, de ortografia e de estilo, propondo um estudo da língua de forma autônoma e descontextualizada, não levando em consideração as condições de produção histórico-sociais. Ora, querer que todos falem e escrevam da mesma forma e de acordo com padrões gramaticais rígidos é esquecer-se que não pode haver homogeneidade quando o mundo real apresenta uma heterogeneidade de comportamentos linguísticos. Labov (1972 apud MONTEIRO, 2002, p. 58) faz ainda outra distinção, mostrando que, “[...] as regras variáveis têm função comunicativa (estilística, expressiva ou enfatizadora), enquanto as regras invariantes servem apenas para facilitar a expressão das seleções já realizadas”. Segundo Tarallo (1986, p. 19), a linguística é a “[...] ciência que estuda a linguagem, priorizando a língua falada e a maneira como ela se manifesta em determinada época”. Esse conceito foi aplicado pela primeira vez no século XIX, para distinguir as novas diretrizes para o estudo da linguagem, em contraposição ao enfoque filológico mais tradicional. 40 Dentre as correntes linguísticas existentes na primeira metade do século XX, destacaram-se as teorias desenvolvidas, um século antes, pelo alemão Wilhelm Von Humboldt, o qual acredita ser a língua um organismo vivo, que nasce, desenvolve e morre. Assim, a língua é uma atividade e não um ato. Humboldt foi o precursor do estruturalismo linguístico de Saussure, que se baseia na convicção de que a linguagem é um sistema abstrato de relações diferenciais entre todas as suas partes. Saussure estabeleceu a dicotomia língua (langue) e discurso (parole), determinando que o objeto de estudo da linguística teria que ser a langue. Então, a partir de um único indivíduo, seria possível analisar o lado social da linguagem, mas somente pela interação de duas ou mais pessoas se poderia estudar o aspecto individual. Este foi o famoso paradoxo saussuriano. Para Chomsky (1957, p. 34), o objetivo da linguística deveria ser “[...] a criação de uma gramática, que, por meio de um número finito de regras, fosse capaz de gerar todas as frases de um idioma, mesmo que o falante nunca as tivesse ouvido ou pronunciado”. Cabia ao linguísta, portanto, desenvolver essa gramática, a partir da competência (o conhecimento que o falante possui e que lhe permite gerar e compreender mensagens), e não do desempenho (uso concreto que o falante faz da língua) do falante, que seria um falante-ouvinte ideal, membro de uma comunidade linguística homogênea e possuidor de um conhecimento excelente da língua, excluindo, assim, a reflexão sobre os conteúdos sociais. As regras gramaticais que permitissem gerar orações inteligíveis num idioma seriam denominadas de gramática gerativa. A teoria gerativa de Chomsky abriu caminho para renovação radical da linguística e para sua aplicação a diversas disciplinas do saber humano, como a psicologia ou a sociologia. Demorou bastante tempo para os linguístas decidirem incorporar os aspectos sociais nas descrições das línguas. Com o progresso do método comparativista, os estudos linguísticos do século XX adotaram uma nova orientação e uma nova postura com relação ao enfoque e ao objeto do estudo da linguística. Ao invés de se concentrar na descrição histórica da língua, como queriam os gramáticos comparativistas, a linguística daria maior ênfase ao estudo da linguagem em si mesma e a seu caráter sociocultural. Monteiro (2000) nos revela que os novos 41 estudos sociolinguísticos foram inaugurados, em 1963, por uma associação de Sociólogos – a Social Sciences Research Council. Vale ressaltar que Labov (apud MONTEIRO, 2002, p. 61) considera o termo sociolinguística redundante, baseado na questão de que a língua é um fato social, por ser “[...] um veículo de comunicação, de informação e de expressão entre indivíduos da espécie humana”, pois as variantes coexistem no meio social, portanto a linguística só poderia ser uma ciência social. A ciência assim referida estuda essa variedade a partir de dois pontos: diacrônico (histórico) e sincrônico (mesmo plano temporal). No primeiro, o pesquisador estabelece ao menos dois momentos sucessivos de uma determinada língua, descrevendo-os e distinguindo as variantes em desuso. Já no segundo, o pesquisador aborda seu objeto a partir de três pontos de vista: geográfico, social e estilístico. A pesquisa geográfica implica o estudo dos falares de comunidades linguísticas distintas em espaços diferentes, mas em um mesmo tempo histórico. Esse estudo distingue a linguagem urbana da rural, por exemplo. Os falares ou dialetos dessas comunidades produzem os regionalismos. A perspectiva social já estuda os falares de diferentes grupos dentro de uma mesma comunidade, que são classificados por nível socioeconômico, escolaridade, idade, sexo, raça e profissão. A partir dessa perspectiva pode-se fazer a distinção entre o falar social/culto, preso à gramática normativa e o social/popular, mais ligado à linguagem oral do povo e às situações menos formais de comunicação. Enquanto a perspectiva estilística analisa o uso que um mesmo falante faz da sua língua, considerando que suas escolhas são influenciadas pela época em que vive, pelo ambiente, pelo tema, por seu estado emocional e pelo grau de intimidade entre interlocutores. Tais fatores determinam a escolha do nível de fala a ser utilizado pelo falante quanto ao grau de formalismo, modo (falado ou escrito) e sintonia (maior ou menor grau de tecnicidade, cortesia ou respeito à norma). Notamos, então, que a língua falada é a enunciação e expressão de fatos e ideias, sem a preocupação de como enunciá-las. Segundo Haugen (1962 apud BAGNO, 2001, p. 45), outra parte também essencial do estudo da sociolinguística é a dimensão da superioridade ou inferioridade funcional, que afirma existirem duas dimensões claramente distintas envolvidas no uso dos termos “língua” e “dialeto”. Uma delas é estrutural, isto é, 42 descritiva da língua em si e a outra é funcional, ou seja, descritiva de seus usos sociais na comunicação. A autora diz ainda que como norma social, “dialeto” é uma língua excluída da sociedade polida. Para Brun (1946 apud BAGNO, 2001, p. 45), é “[...] uma língua que não teve sucesso”. Na estrutura de uma língua, nem todos os elementos têm valor funcional na interpretação social que se fará do fato linguístico. Na língua inglesa, o vocabulário, com várias possibilidades de sinonímia e o caráter polissêmico, como é o caso do verbo to get, o qual aparece em várias expressões idiomáticas com uso e significado diferentes (get up: levantar-se ao acordar; get over: recuperar-se de um problema; get along: relacionar-se bem com etc.); a fonologia, em inglês a posição entre /i/ e /I/ é importante porque permite distinguir as unidades como em hit e heat; e a sintaxe, já que o adjetivo vem anteposto ao substantivo e não faz plural. Assim, se diz He is a handsome boy (Ele é um garoto bonito) e They are handsome boys (Eles são garotos bonitos), e não They are handsomes boys. No português poder-se-ia citar o uso do me com função de sujeito, como em Deixa-me ver isso, que praticamente já desapareceu do português não-culto. No inglês existe uma marca da diferença entre os padrões escrito e falado da maioria das pessoas, como, por exemplo, o uso de contrações (muito comum na língua falada, mas não totalmente aceito na língua escrita): gonna (going to), ain’t (contração que serve para uma quantidade genérica de verbos) e aquilo que se conhece como double negative (permitido no discurso falado formal e informal, mas nunca no escrito). Além disso, esses estilos que poderiam ser chamados de dialetos funcionais oferecem riqueza e diversidade dentro de uma língua e asseguram que a estabilidade ou rigidez da norma terá também um elemento de elasticidade. Aléong (1980 apud BAGNO, 2001) comenta que se é difícil falar com grande precisão de uma gama de formas de variantes no discurso, é evidente que a natureza do contexto e as características pertinentes dos falantes condicionam a escolha de vocabulários em particular e a dos enunciados percebidos como convenientes em uma situação dada. Não se fala da mesma forma em uma igreja ou em estádio assistindo a um jogo de futebol. Todo falante está mais ou menos apto a modificar sua linguagem conforme necessário, estabelecendo aquilo que se denominam níveis de linguagem. 43 O mesmo autor propõe ainda uma distinção entre norma explícita e norma implícita para a concepção de variação linguística, como a expressão possível de processos históricos de diferenciação linguística e da função da linguagem enquanto meio privilegiado de interação social. Segundo o autor referido, a norma explícita [...] compreende esse conjunto de formas linguísticas que são objetos de uma tradição de elaboração, de codificação e de prescrição. Ela se constitui a partir de processos sócio-históricos [...]. Codificada e consagrada num aparato de referência, essa norma é socialmente dominante no sentido de se impor como o ideal a respeitar nas circunstâncias que pedem o uso refletido ou monitorado da língua. (ALÉONG, 1980, p. 60) enquanto a norma implícita trata daquelas formas que são raramente objetos de reflexão ou codificação e que representam os usos concretos, utilizados pelos indivíduos em sua sociedade imediata. Observamos que uma língua completa tem seus estilos formais e informais, seus sotaques regionais e seus jargões de classe ou profissionais, e torna-se evidente o fato de que as pessoas transitam de um ao outro sem fazer distinção entre eles. Logo, não podemos acreditar na existência de uma única forma linguística. Uma criança aprende inicialmente a língua de seu ambiente imediato, a língua de sua família, sendo esta essencialmente oral e para fins utilitários. É uma aprendizagem por mimetismo – a criança tenta reproduzir as cadeias sonoras que ouve – e por condicionamento, obtendo o que deseja, por exemplo. Assim, a criança constitui para si uma gramática interna, cujas regras profundas lhe permitem ao mesmo tempo se expressar e interpretar fatos de variação na fala dos outros, afirma Corbeil (1975 apud BAGNO, 2001, p. 57). Em seguida, essa criança é submetida a alguma forma de instrução, que difere de um país para outro. Em nossa sociedade, isto ocorre com a entrada da criança na escola, que privilegia o uso norma-culta como língua do ensino ou como língua ensinada. A língua ensinada adquire assim o prestígio da escrita e um status superior pelo fato de ser confirmada e imposta pelo aparelho pedagógico em detrimento das demais variedades. É a língua da escola, dos livros, imposta nos exercícios e testes. A criança, então, terá que perceber as diferenças de como se utiliza a língua ao seu 44 redor: entre o modelo familiar, o modelo proposto pela escola e o modelo realizado por seus professores e colegas, que pode não coincidir com um ou outro. Aléong (1980 apud BAGNO, 2001) observa que o comportamento linguístico estabelece a existência de uma distância maior ou menor entre o sistema socialmente dominante das prescrições linguísticas e a realidade dos desempenhos diários. Isso significa que [...] de um lado, um conjunto de julgamentos de valores amplamente difundidos – uma ideologia linguística- preconiza o emprego de certas formas com a exclusão de outras em nome da correção linguística, ao passo que, de outro lado, as realidades concretas se apresentam sob o aspecto de uma notável diversidade de formas. (ALÉONG apud BAGNO, 2001, p. 60). Assim, não se deve ensinar só o sistema de cada idioma, mas também o uso comunicacionalmente situado e culturalmente apropriado. Todos os aspectos citados neste capítulo devem ser levados em consideração ao tentarmos estabelecer comunicação oral, escrita ou até mesmo gestual em nossa língua materna ou em uma língua estrangeira. A cultura é também transmitida pela língua. As pessoas não falam ao acaso, os seus usos podem ser compreendidos e explicados tanto pelo exame da história da língua quanto pela inserção social dos falantes. Daí, então, surge a preocupação de que esses fatores fundamentais sejam analisados para se conseguir estabelecer uma comunicação eficaz, bem como traduções adequadas, afinal “[...] pode se variar tudo aquilo que não atentar contra a eficácia da comunicação” , diz Aléong (apud BAGNO, 2001, p.65). Portanto, até a presente data, ninguém sabe rigorosamente como um falante aprende uma língua, embora grande quantidade de pesquisa tenha sido feita ao longo de todos os séculos. Algumas teorias, contudo, tiveram grande impacto sobre os conceitos de aprendizagem, este que permanece até hoje. Muitas dessas teorias foram propostas para explicar o fenômeno da aquisição de uma segunda língua (Second Language Acquisition – SLA). De muitas maneiras, tais teorias apresentam muitas semelhanças com aquelas que visam explicar a aquisição da língua mãe. Então, algumas delas dão importância às características inatas dos falantes; outras enfatizam o papel essencial do meio em formatar o aprendizado de uma língua; outras, ainda, tentam 45 integrar as características do falante com os fatores do ambiente na tentativa de explicar como a aprendizagem da segunda língua acontece. Nos últimos anos, os métodos e materiais didáticos, que são resultado dos estudos mais recentes sobre a aprendizagem de uma segunda língua, têm buscado mostrar falantes com uma variedade de características, aprendendo em uma variedade de contextos. A ênfase, então, será nas teorias que se propõem a explicar quais os mecanismos de aprendizagem que são comuns a todos os falantes aprendendo uma segunda língua, uma preocupação que nem sempre foi tão enfatizada pelas teorias de aprendizagem de uma segunda língua, cuja evolução se descreve a seguir. 2.1 BEHAVIORISMO Em um artigo publicado em 1920, dois psicólogos, Watson e Raynor, relataram resultados de experimentos que eles tinham conduzido com um bebê chamado Albert. Quando Albert tinha nove meses eles descobriram que a maneira mais fácil de assustá-lo era fazer um barulho bem alto (como bater um martelo em uma barra de metal). Em vários intervalos ao longo dos três meses seguintes eles assustaram Albert desta forma enquanto ele estava na presença de vários animais (um rato, um coelho e um cachorro). O resultado destes experimentos mostrou que, após três meses, Albert demonstrou medo quando confrontado com tais animais, mesmo quando o barulho não era feito, e demonstrou desconforto até quando um casaco de pele era colocado próximo a ele. Os psicólogos sugeriram que eles seriam capazes de curar os medos de Albert, mas não o conseguiram porque ele não estava mais disponível para experimentação, e eles até discutiram a possibilidade de Albert ter medo dos casacos de pele até a idade de vinte anos. O lado ético desse experimento é altamente questionável, mas as experiências de Albert são um exemplo primitivo da ideia de condicionamento. Watson e Raynor tinham tido êxito em condicionar Albert a ter medo de rato, coelho, cachorro e casacos de pele quando, antes, ele tinha uma reação neutra a eles. 46 A ideia de condicionamento está baseada na teoria de que você pode treinar um animal a fazer qualquer coisa (dentro da razoabilidade), se você seguir certo procedimento que envolve três fases: estímulo, resposta e reforço. Na forma mais clássica da teoria, um rato é colocado em uma caixa. Um sinal luminoso é operado (estímulo), o rato vai até uma barra dentro da jaula e a pressiona (resposta), e então uma bola de alimento delicioso cai próximo a ele (reforço). Se o comportamento do rato for reforçado um número suficiente de vezes, ele sempre pressionará a barra dentro da jaula quando a luz acender. O reforço, nesse caso, tomou a forma de uma recompensa e, então, era positivo. Mas, você pode treinar o mesmo rato a não fazer alguma coisa dando-lhe reforço negativo, talvez na forma de um pequeno choque elétrico. Assim, os behavioristas explicam a aprendizagem em termos de imitação, prática, reforço (ou feedback para o sucesso) e formação de hábito. De acordo com os behavioristas, todo aprendizado, verbal ou não verbal, ocorre pelos mesmos processos. Os aprendizes recebem input linguístico dos falantes em seu meio e formam associações entre palavras e objetos ou eventos. Tais associações tornam-se mais fortes à medida que as experiências se repetem. Os aprendizes recebem encorajamento por suas imitações corretas e feedback corretivo para os erros, uma vez que o desenvolvimento da linguagem é visto como a formação de hábitos, assume-se que um falante não-nativo aprendendo uma segunda língua começa pelos hábitos formados na primeira língua e que tais hábitos interferem nos novos, necessários para a segunda língua. O Behaviorismo era frequentemente ligado à Hipótese da Análise Contrastiva (Contrastive Analysis Hypothesis ou CAH), desenvolvida pelos linguístas estruturais na Europa e América do Norte. A CAH pressupõe que quando há semelhanças entre a primeira língua e a língua alvo, o aprendiz adquirirá as estruturas desta língua alvo com facilidade; se houver diferenças, o aprendiz terá dificuldades. Em seu livro Verbal Behavior, o psicólogo comportamental Skinner (1957) aplicou essa teoria do condicionamento ao modo como os humanos adquirem a linguagem. Nossa performance como usuários da linguagem é, em grande parte, o resultado dos tais reforços positivos ou negativos. Nesse caso, o hábito linguístico era obtido pela repetição constante e pelo reforço. Os erros, por sua vez, eram 47 imediatamente criticados e as manifestações consideradas corretas imediatamente elogiadas. 2.2 COGNITIVISMO Esse termo é geralmente empregado para definir o método no qual o falante é levado a pensar, muito mais que simplesmente repetir, e está ligado em grande parte a reação de Chomsky aos princípios do behaviorismo de Skinner. Essa teoria está baseada na teoria da competência e da performance. A teoria de Chomsky (1957) sobre a aquisição de uma língua apóia-se na hipótese de que o conhecimento inato dos princípios da Gramática Universal (GU) permite a todas as crianças adquirirem a língua do seu meio, durante um período crítico de seu desenvolvimento. Chomsky não tomou posições específicas sobre as implicações dessa teoria para a aprendizagem de uma segunda língua. No entanto, alguns linguistas trabalhando com a mesma teoria defendem que a Gramática Universal oferece a melhor perspectiva para se entender a aquisição de uma segunda língua. A linguagem não é uma forma de comportamento, afirma Chomsky (1957). Ao contrário, é um intricado sistema de regras e boa parte da aquisição dessa língua significa a aprendizagem desse sistema. Há um número finito de regras gramaticais no sistema e com o conhecimento destas um número infinito de orações pode ser realizado na língua. É a competência que a criança gradualmente adquire, e é esta competência linguística (ou seja, o conhecimento das regras gramaticais) que permite que a criança seja criativa como usuária da língua, isto é, experimentar a dizer coisas que jamais houvera dito antes. Apesar de ser considerada uma boa maneira de se entender a aquisição da primeira língua, a gramática universal não é mais completamente aceita para guiar as ideias sobre a aquisição da segunda língua, especialmente nos falantes que já ultrapassaram o período crítico quando ocorre a aquisição da língua. Esta deveria ser explicada por alguma outra teoria entre as mais recentes, como por exemplo, as da psicolinguística. 48 2.3 AQUISIÇÃO x APRENDIZAGEM Uma teoria inatista sobre a aquisição da segunda língua que tem tido grande efeito sobre a prática do processo ensino-aprendizagem é aquela proposta por Stephen Krashen. Essa teoria é composta de cinco hipóteses, as quais Krashen (1983) originalmente denominou de “modelo monitor”. Ele afirmava que os achados de alguns campos são consistentes com estas hipóteses, que são: a) Hipótese da aquisição e aprendizagem. b) Hipótese de monitor. c) Hipótese da ordem natural. d) Hipótese do input. e) Hipótese do filtro afetivo. 2.3.1 Aquisição e aprendizagem A distinção entre adquirir e aprender uma língua, estabelecida por Krashen, é caracterizada por entender a primeira como um processo subconsciente que resulta em conhecimento da língua; enquanto a segunda, aprender, é um processo consciente que resulta apenas em saber sobre a língua. A aquisição dura mais tempo e tem geralmente mais sucesso que o aprendizado. O que se sugere aqui é que o aprendizado da segunda língua parece mais com a aquisição da primeira língua em uma criança. Embora pareça haver certos limites em relação ao conteúdo linguístico da língua materna a que uma criança esteja submetida, ela nunca é conscientemente ensinada, nem conscientemente a criança se determina a aprendê-la. Ao contrário, ela ouve e experimenta uma quantidade considerável de linguagem em situações nas quais ela está envolvida ao comunicar-se com adultos (na maioria das vezes, seus pais). Sua habilidade gradual para usar a língua é o resultado de muitos processos subconscientes, baseados nas experiências com as quais ela começa a adquirir – sem estar consciente disto – a habilidade de entrar, linguisticamente, em comunicação. 49 Então, a forma tradicional de aprendizagem, na qual um elemento solto era estudado, e depois colocado em situação comunicativa parece equivocado, pois não há garantias de que quaisquer elementos, assim aprendidos, serão usados com sucesso para a comunicação ou mesmo lembrados por longo tempo. Nesse modelo, o foco não era na comunicação, e sim em um segmento de linguagem que deveria ser usado posteriormente para comunicação. Por isso, a segunda língua é adquirida como resultado de um processo mais profundo que uma simples concentração em um ponto gramatical, da mesma forma que a criança aprende sua língua materna. Uma experiência realizada pelo linguísta aplicado Allwright (1977b, p. 5), parece confirmar estas conclusões em certo grau. Ele afirma que “[...] se o falante estiver envolvido em atividades de ensino exclusivamente direcionadas à solução de problemas comunicativos, então a aprendizagem da língua se dará naturalmente.” Em outras palavras, não há necessidade alguma de instrução formal, isto é, a gramática da norma dita culta. Ao invés disto, os falantes são solicitados a realizar atividades comunicativas nas quais a segunda língua precisa ser usada. Quanto mais eles fizerem isso, melhor se tornarão em usar a língua. Krashen (1983), contudo, vê a aquisição como o processo mais importante. Ele afirma que somente a linguagem que é adquirida fica imediatamente disponível para a comunicação fluente e natural. Além disso, também afirma que a aprendizagem não pode se transformar em aquisição. Ele cita como evidência disto o fato de que muitos falantes são muito fluentes sem nunca terem aprendido regras, enquanto outros podem até conhecer as regras, mas não conseguem aplicá-las quando sua atenção está focada muito mais no quê eles querem dizer do que no como eles verbalizam. 2.3.2 A hipótese de monitor Krashen (1983) alega que o sistema adquirido atua no sentido de iniciar as frases do falante, e é responsável pela produção da fluência e dos julgamentos intuitivos acerca da exatidão. Já o sistema aprendido, por outro lado, atua somente como uma espécie de editor ou monitor, realizando pequenas mudanças e refinando aquilo que o sistema adquirido produziu. 50 No entanto, Krashen (1983) diz que os falantes só se utilizam do monitor quando estão focados mais em ser ‘corretos’ que naquilo que eles têm a dizer, quando tem tempo suficiente para buscar em suas memórias as regras relevantes e quando realmente sabem aquelas regras. Portanto, a habilidade de escrever (writing) pode conduzir mais frequentemente ao uso do monitor que o falar (speaking), pois permite mais oportunidades de concentração na forma. Ele afirma que conhecer as regras só ajuda a complementar o que o falante adquiriu, mas que o foco do estudo de uma segunda língua deve ser na aquisição e não na aprendizagem. Contudo, é bastante difícil evidenciar o uso do monitor, ou seja, é quase impossível determinar o que foi produzido como resultado de aquisição e o que foi produzido como resultado do uso do monitor. 2.3.3 Hipótese da ordem natural Krashen (1983) baseou essa hipótese na observação de que, como acontece com os falantes da primeira língua, os que adquirem a segunda língua parecem fazê-lo em sequências previsíveis. Ao contrário da intuição, as regras que são mais fáceis de constatar (e, portanto de ‘aprender’) não são, necessariamente, as primeiras a serem adquiridas. Por exemplo, a regra de adição do sufixo flexionado – s, referente à terceira pessoa do singular dos verbos no presente simples, em inglês, é relativamente fácil de constatar, mas, mesmo aqueles falantes em níveis avançados de aprendizagem da língua estrangeira, falham em aplicá-la na conversação do dia a dia, e até mesmo na sua produção escrita. Além disso, Krashen (1983) observou que a ordem natural é independente da ordem na qual as regras são aprendidas em sala de aula. A maior parte das evidências de Krashen para este fato veio da pesquisa denominada de estudos dos morfemas, na qual o discurso dos falantes foi examinado a fim de detectar a exatidão de certos morfemas gramaticais. Mesmo que tenha havido muitas críticas sobre este experimento, as pesquisas posteriores mostraram que todo falante passa por determinadas sequências ou estágios no desenvolvimento do processo de aquisição da segunda língua. 51 2.3.4 Hipótese do input Krashen (1985) afirma que um falante adquire a língua de um único jeito – pela exposição ao que ele denominou de “input compreensível”. Se o input contém formas e estruturas levemente acima do nível atual de conhecimento do falante (ao que Krashen chamou ‘i + 1’), então, tanto a compreensão quanto a aquisição ocorrerão. Assim, não obstante seja a aquisição ou aprendizagem consciente, haverá estágios por meio dos quais a linguagem é absorvida pelo falante. Contudo, se o falante apenas recebe esse input de linguagem, ele pode terminar por reter uma série de itens armazenados separadamente, mas sem a habilidade de acessá-los ao precisar. Somente quando o falante é submetido à necessidade de produzir ou usar a linguagem é que ele se vê forçado a acessar a linguagem que houvera armazenado. A habilidade de buscar estes itens que foram armazenados é claramente vital para qualquer falante usuário da língua, pois ele terá que selecionar aqueles itens que são apropriados ao seu objetivo de comunicação, combinando-os de várias formas para uma comunicação eficiente. A isto se chama de output. Desse modo, a atividade de aquisição ou aprendizagem de uma língua pode ser dividida em duas grandes áreas: a que se preocupa com o input (quando o falante recebe novos itens de linguagem que ficam armazenados em sua mente); e outra que busca promover o que se poderia denominar de “output comunicativo” (onde o falante é forçado a usar quaisquer itens de linguagem que ele aprendeu para uma comunicação eficiente). 2.3.5 Hipótese do filtro afetivo O filtro afetivo é uma barreira imaginária que não permite a aquisição da linguagem a partir de um input disponível. ‘Afetar’ se refere a tais coisas, como: motivos, necessidades, atitudes e estados emocionais. Um falante que está tenso, aborrecido, ansioso, ou enfadado poderá eliminar o input, deixando-o indisponível para aquisição. Então, dependendo do estado mental ou da disposição do falante, o 52 filtro limita o que é notado e o que é adquirido. O filtro será ‘ligado’ (bloqueando o input)’quando o falante está estressado, consciente, ou desmotivado. Ele será desligado quando o falante estiver relaxado e motivado. Um problema relacionado com esta hipótese é que é bastante difícil estar completamente seguro que os fatores afetivos causam as diferenças no processo de aquisição de uma língua. Parece mais provável que o sucesso na aquisição pode, em si mesmo, contribuir para uma motivação mais positiva, ou para usar o termo empregado por Krashen (1983), contribuir para um “filtro afetivo bem reduzido”. Embora estas conclusões de Krashen tenham tido muita importância para o método chamado communicative language teaching (aprendizagem comunicativa), este tem sido seriamente criticado por não propor hipóteses que possam ser empiricamente comprovadas. 2.4 TEORIAS PSICOLÓGICAS RECENTES 2.4.1 Processamento da informação Alguns psicólogos cognitivistas pesquisaram um modelo, chamado de information processing (processamento da informação), para a aprendizagem e a performance dos falantes, tendendo a acreditar que a aquisição da segunda língua seria a construção de certos sistemas de conhecimento que são eventualmente buscados automaticamente com o intuito de falar e entender. A quantidade de linguagem que um falante consegue focar, em certo intervalo de tempo, é limitada. Assim, nos primeiros estágios, um falante provavelmente concentrar-se-á em palavras soltas, sem levar os morfemas gramaticais envolvidos no discurso. Gradualmente, por meio da experiência e da prática, eles conseguem usar certas partes de seu conhecimento sem sequer dar-se conta de que o estão fazendo. Tal fenômeno os deixa livres para focarem em outros aspectos de linguagem, os quais, por sua vez, gradualmente se tornam automáticos (MCLAUGHLIN, 1987). 53 Neste particular, a prática não é vista como algo mecânico, mas como algo que envolve esforço por parte do falante. Um dos teóricos que tem enfatizado a função de ‘notar’ no processo da aquisição da segunda língua é Richard Schmidt (1990). Ele argumenta que tudo que um falante venha a saber sobre a língua é primeiro observado, notado, conscientemente. Isto vem fortemente de encontro à teoria de Krashen, claro. Schimdt (1990), como qualquer psicólogo cognitivista, não aceita que possa haver uma diferença entre aquisição e aprendizagem. Outra noção nesse aspecto é a chamada reestruturação, onde certos aspectos que o falante já sabe e usa automaticamente pode não ser resultado da construção gradual da automaticidade. Elas parecem ser muito mais resultado da iteração do conhecimento que já se tem, ou a aquisição de novos conhecimentos, os quais, sem a prática extensiva, acabam se acomodando ao sistema já existente, causando uma transformação ou reestruturação. Tal fato pode explicar os repentinos momentos de progresso de um falante, mas também pode ser culpado por causar retrocessos quando um aspecto sistemático da língua é incorporado de forma exagerada, ou de forma errônea. Por exemplo, quando um falante finalmente consegue dominar o uso do sufixo inflexionado –ed dos verbos regulares no passado simples, os verbos irregulares, já previamente dominados, poderão ser afetados. Assim, depois de vários meses produzindo ‘I saw a film (eu vi um filme)’, o falante poderá produzir ‘I seed a film’ ou até mesmo ‘I sawed a film’, o que pode causar mal-entendidos, já que seed é o verbo plantar, ou o substantivo semente, e a palavra saw também existe como verbo regular e quer dizer serrar. 2.4.2 Coneccionismo Como ocorre com a discussão da aquisição da língua materna, os coneccionistas, ao contrário dos inatistas, não veem necessidade de fazer hipóteses sobre a existência de um módulo neurológico destinado somente à aquisição de linguagem. Da mesma maneira que os psicólogos cognitivistas, os coneccionistas atribuem maior importância à função do meio que a qualquer conhecimento inato do 54 falante, afirmando que o que é inato é apenas a habilidade para aprender, e não qualquer estrutura linguisticamente especificada. Os coneccionistas discutem que os falantes gradualmente constroem seu conhecimento de linguagem com base na exposição a vários exemplos das características linguísticas que eles eventualmente aprendem. Assim, enquanto os inatistas veem o input linguístico como uma espécie de ‘gatilho’ que ativa o conhecimento inato, os coneccionistas veem o input como a principal fonte de conhecimento linguístico. Após ouvir certos padrões linguísticos em contextos linguísticos e situacionais específicos, repetidas vezes, os falantes desenvolvem ‘conexões’ mentais e neurológicas cada vez mais fortes entre esses elementos. Então, a presença de certo elemento situacional ou linguístico ativará o(s) outro(s) na mente do falante. Tais conexões podem ser bastante fortes porque os mesmos elementos já ocorreram muitas e muitas vezes, ou relativamente fracas por não ter havido chances suficientes de experimentá-las. Por exemplo, o falante poderá absorver a correta concordância sujeito – verbo, não porque eles conhecem uma regra e sim por eles terem ouvido exemplos, tais como: I say (eu digo) e He says (ele diz), tanta e tantas vezes que cada pronome sujeito ativa a forma verbal correta. A pesquisa coneccionista tem mostrado que um determinado mecanismo de aprendizagem, simulado por um programa de computador, não apenas pode ‘aprender’ o que ouve, mas também pode generalizar, até mesmo ao ponto de cometer erros de generalização exagerada. Tais estudos, até hoje, só consideraram quase que exclusivamente, a aquisição de vocabulário e morfemas gramaticais, isto é, aspectos da linguagem que até os inatistas concordariam poderem ser adquiridos grandemente por meio da memorização e da simples generalização. Como esse modelo de aprendizagem cumulativa pode conduzir ao conhecimento de estruturas sintáticas mais complexas ainda hoje é objeto de investigação. 2.4.4 Interacionismo 55 Alguns teóricos interacionistas, embora influenciados pelas teorias psicológicas de aprendizagem, têm desenvolvido pesquisas no campo da aquisição da segunda língua. Hatch (1992), Pica (1994) e Long (1983), entre outros, têm debatido o fato de que muito da aquisição da segunda língua acontece graças à interação conversacional. As ideias de Long (1983) são baseadas em observações das interações entre falantes não-nativos e falantes nativos. Ele concorda com Krashen que o input compreensível é necessário para a aquisição da língua. Contudo, sua preocupação maior é com o fato de como tal input se faz compreensível. Ele considera a interação modificada como o mecanismo que faz tal fato ser possível. Ele afirma que não há nenhum caso de falantes nativos que não tenham modificado seu discurso nas interações de conversação com falantes nãonativos. Ele infere que a interação modificada se faz necessária para a aquisição da língua, o que podemos sintetizar assim: a) A modificação interacional faz o input tornar-se compreensível. b) O input compreensível traz a aquisição. Portanto, c) a modificação interacional promove a aquisição. Outra visão sobre o papel da interação na aquisição da segunda língua é a teoria sociocultural de Vygotsky (DONATO, 1994), acerca do processamento mental humano. Essa teoria afirma que todo desenvolvimento cognitivo, inclusive o desenvolvimento linguístico, resulta de interações entre indivíduos. Ao ampliar as considerações de Vygotsky (DONATO, 1994) para o campo da aquisição da segunda língua, Lantolf (1994) e outros concluíram que os falantes das segundas línguas avançam para níveis mais altos de aprendizagem linguística quando eles colaboram ou interagem com falantes nativos que possuem mais conhecimento que eles. De acordo com os teoristas vygotskyanos, a diferença entre essa perspectiva e outros modelos interacionistas é que esta considera que a aquisição da língua ocorre nas interações entre emissor e receptor, enquanto outros modelos afirmam que é a modificação de input que provê o material linguístico ‘cru’ que os agentes processarão interna e invisivelmente. 2.4.5 A teoria das inteligências múltiplas 56 “Mas, não são todos os professores que se encontram treinados para ouvir linguagens diferentes das que a escola instituiu como única e universal” (ANTUNES, 2000) Gardner (1999), psicólogo americano, professor de Cognição, Educação e Neurologia, fez muitas pesquisas na área da cognição humana e escreveu a respeito das inteligências múltiplas, em seu livro Inteligências Múltiplas: a teoria na prática, onde também valorizou a individualidade do ser humano, especialmente quando se fala em aprendizado. Está aí o porquê de a nomenclatura "múltiplas" ter sido escolhida. Ele quis, com esse nome, dar a ideia de uma imensidão de possibilidades de estratégias e/ ou estilos de aprendizado diferentes em cada indivíduo, deixando, até em aberto, a possibilidade de haver mais inteligências do que as sete, inicialmente propostas por ele, a que futuramente acrescentou mais uma. E seu livro, ao contrário do que muitos podem pensar, trouxe, sim, implicações importantes para a educação. Aliás, foram estudiosos e profissionais dessa área que deram mais atenção e mostraram muito mais interesse pela sua teoria do que os próprios "colegas" seus, pesquisadores do mesmo ramo, dos quais ele esperava o contrário. Ele, inclusive, diz que alguns gostaram, poucos não gostaram e a maioria ignorou sua teoria sobre as inteligências. Eles alegavam que era quase impossível tentar mudar as teorias ou definições psicológicas sobre a inteligência. Depois que o livro Estruturas da Mente fez bastante sucesso, com seu grupo de pesquisa da Universidade de Harvard, Gardner começou a dar uma atenção também maior para o seu público, que trabalha diretamente com educação, estudando implicações educacionais da teoria das inteligências múltiplas. Ou seja, ele passou a pesquisar como seria possível desenvolver as inteligências múltiplas num indivíduo, no âmbito escolar, nos estudantes, como, também, planejar novos instrumentos de avaliação, baseados na individualidade, nas diferenças de cada aluno e na inteligência principal deles. Para ele, quando o falante é ciente dessa questão de individualidade e sabe a sua inteligência e que será avaliado conforme a sua inteligência, ele se sentirá mais confortável para ser avaliado por outrem do que em situações de avaliação no 57 método tradicional. E também permitirá que o aluno aprenda a se autoavaliar e, assim, se incentiva da mesma forma que ele tenha autonomia nos seus estudos. Gardner (1999) conta que todo esse interesse em estudar as inteligências, testá-las e desenvolvê-las iniciou em 1900, em Paris, na época conhecida como La Belle Époque, em português: a Bela Época, quando muitos pais procuraram a um psicólogo chamado Alfred Binet (GARDNER, 1999), pois queriam que ele fizesse um teste para saber se seus filhos teriam um futuro escolar de sucesso escolar ou não. Binet criou, então, os testes de Ql, que deram certo e se tornaram famosos em todo o país até chegar aos Estados Unidos, onde foi utilizado para recrutar cerca de 1.000.000 (um milhão) de soldados na 1a Guerra Mundial. Daí em diante, espalhouse por todo o mundo. Esses testes de Ql e os de SAT, que são uma versão mais sofisticada (Scholastic Aptitude Test), possuem uma visão unidimensional, ou seja, veem a inteligência por um só ângulo e de dimensão única e veem as pessoas como se devessem pertencer a essa única dimensão, para serem de fato aceitas na sociedade. As escolas que aplicam esses testes para seleção de estudantes, também possuem esse tipo de visão unidimensional na educação. Assim, só existe uma forma de ensinar, de aprender e de avaliar, o que faz dessa educação, um modelo de ensino seletivo e exclusivo. Foi a insatisfação com esses testes que fez com que estudiosos como Tarustone e Guilford (apud GARDNER, 1995) criticassem bastante o conceito que se tinha a respeito de inteligência. Gardner (1999) via que só as críticas não eram o suficiente, era necessário deixar os testes para trás e passar para um trabalho de observação de como as pessoas desenvolviam suas capacidades, de acordo com o seu modo particular de vida. E por meio de todos os resultados e observações obteve muitas informações que se sintetizaram nas inteligências múltiplas. A teoria das inteligências múltiplas não é uma ‘receita’ pedagógica, pois não existe nenhuma abordagem pedagógica aprovada que se baseie na teoria. Gardner (1999), inicialmente, teve interesses grandes pela possibilidade de criar uma escola que tem uma visão direcionada para a particularidade do ser humano, para uma educação personalizada, para a multiplicidade de inteligências, uma escola que 58 aceita as multifacetas da cognição, que valoriza as diferenças e a implicação de tudo isso na aprendizagem e nos seus resultados. Porém, isso não existia na época de Binet, por não existirem, ainda, pesquisas nas Ciências Cognitivas (estudo da mente) e na Neurociência (estudo do cérebro). Dessa forma, para Gardner (1999), os testes, hoje, perderam sua importância. Sua teoria não serve para fazer testes, mas para fazer com que o professor tenha uma visão diferente, seja um observador de seus estudantes e, assim, identifique como as pessoas desenvolvem habilidades e capacidade importantes para seu modo de vida, para resolver seus problemas ou para elaborar produtos importantes e valorizados no seu ou outros ambientes culturais. 2.4.5.1 A noção de diferentes inteligências na escola e seu papel na aprendizagem O objetivo de Gardner (1995) não é tão-somente deixar clara a existência de múltiplas inteligências, mas afirmar que todos nós temos todas as inteligências, porém em níveis diferentes de desenvolvimento. Uma pessoa pode, não somente usar uma, e sim várias inteligências juntas para resolver um determinado problema. Uma pessoa, que utiliza várias inteligências para resolver problemas ou criar produtos, teve a possibilidade de desenvolver essas inteligências para isso. Aí entra o papel do educador. Ele deve ser, em um primeiro passo na sala de aula, um observador. Observar quais inteligências estão ou não desenvolvidas nos estudantes e, logo, em seguida, orientá-los, auxiliá-los a desenvolvê-las a fim de que consigam atingir seus objetivos escolares e suas metas na vida. A partir desse momento, passa-se uma carga muito importante para as costas do educador, a de entender e desenvolver o perfil cognitivo de cada um de seus estudantes. Mas, antes disso entrar em ação, alguns pontos ou passos importantes são necessários para realizar uma educação, baseada verdadeiramente nesses princípios, embutidos na teoria de Gardner (1995), como: É importante compreender que nem todas as pessoas possuem os mesmos interesses e as mesmas habilidades. Saber dos alunos, da vida que levam, como se relacionam com sua família, o que gostam de fazer, entre 59 outras, são informações importantes, não só para conhecer e ter intimidade com os alunos, e sim para utilizar isso como um recurso para a preparação de uma aula personalizada para suas necessidades. Quando o aluno sente que aquilo que está sendo compartilhado com ele em sala de aula contribuirá como uma ‘ponte’ importante para o alcance dos seus próprios objetivos e não os da escola ou do professor, terá uma motivação forte e suficiente para que produza com eficiência diante da situação de aprendizagem. Nem todos aprendem da mesma maneira. Assim como existem interesses e habilidades diferentes, existem diferentes formas de aprender. Momentos a sós com o falante ou com o grupo de falantes que possuem habilidades ou formas de aprender, parecidas ou iguais, para conversar sobre como se sentem mais confortáveis para aprender e sugerir-lhes formas de estudo ou atividades que se encaixam às suas maneiras particulares de aprender, são atitudes importantes que contribuem no processo de aprendizado do aluno e um segundo passo valoroso para oferecer uma educação centrada no indivíduo. Ninguém pode aprender tudo o que há para ser aprendido. Gardner (1995) diz que essa suposição de aprender tudo é que, certamente, nos faz muito mal, porque tentamos, absurdamente, aprender tudo o que tem sido colocado diante de nós nas escolas e temos tentado ensinar da mesma forma. E de uma forma seletiva separamos os "bons" dos "maus" alunos, quando os primeiros ganham espaço de crescimento social e intelectual, e os outros ganham a exclusão e um lugar no grande banco dos que vão esperar pela sorte para alcançar os seus objetivos de aprendizagem, outrora frustrados. Para a escola em geral, Gardner (1995) também propõe alguns passos importantes, que devem acontecer antes, durante e até depois da vivência do educando no ambiente escolar: Uma escola centrada no indivíduo é aquela que é rica na avaliação das capacidades e tendências individuais. Gardner (1995) não criou a Teoria das Inteligências Múltiplas para fazer testes, e sim para avaliar as capacidades, o desenvolvimento delas nos estudantes e as probabilidades de progressos individuais. Uma escola centrada no indivíduo precisa, 60 constantemente, acompanhar e promover situações que façam progredir as capacidades individuais. Uma escola centrada no indivíduo é aquela em que o mesmo é adequado às áreas curriculares. Isso significa encaixar o falante com todas as suas habilidades, capacidades particulares dentro do currículo e seus objetivos, sem que sua particularidade seja alterada, nem mesmo as áreas curriculares, mas sincronizar um ao outro. Uma escola centrada no indivíduo é aquela que o mesmo é adequado às maneiras de se ensinar. Essa escola e o professor estão sempre dispostos a reelaborar materiais, mudar planos de aulas, refazerem aulas para adequar o ensino às habilidades dos alunos e suas inteligências. Uma escola centrada no indivíduo é aquela que tenta adequar esses indivíduos aos vários tipos de vida e de opções de trabalho existentes em sua cultura. A escola precisa desenvolver e estimular os alunos a se prepararem para a sociedade e os trabalhos que existem naquela determinada cultura. Ela precisa estimular o desenvolvimento das inteligências dos alunos, dentro da própria cultura deles, e de como utilizá-las. Na figura a seguir, podemos visualizar, resumidamente, o complexo educacional de Gardner: 61 Fonte: (GARDNER, 1995). Atenção especial às diferenças, às particularidades do FALANTE (usuário da língua portuguesa que está aprendendo a segunda língua), fazer constante AVALIAÇÃO das inteligências, habilidades e capacidades dele, contribuindo para o desenvolvimento delas. Adequar o CURRÍCULO a essas diferenças dos FALANTES de forma a criar um ensino personalizado e a prepará-lo para contribuir da mesma forma à sua COMUNIDADE, exercendo nela funções que valorizem as suas inteligências. Cada inteligência possui uma operação nuclear ou um conjunto de operações identificáveis, ou seja, possui sensibilidades que são ativadas quando se encontram diante de sensações ou estímulos internos ou externos. Tais sensibilidades são os instrumentos que captam os símbolos que, por sua vez, as utilizam para serem incorporados pelo indivíduo. As inteligências sempre trabalham combinadas, ao invés de isoladas, em cada pessoa, com exceção em indivíduos anormais. Inteligência Musical. Gardner (1995) tenta justificar essa inteligência empiricamente por meio da função da música na sociedade e a sua tão forte presença desde os primórdios dela como forma de comunicação, até mesmo, entre os animais. A música é uma faculdade presente em todas as 62 sociedades como expressão cultural. E por meio de testes pode-se perceber que provavelmente a música se localiza no lado direito do cérebro, e mesmo que ela não seja tão considerada como uma inteligência, como a matemática ou a linguística, aqui ela ganha o mesmo valor. As pessoas que possuem inteligência musical são aquelas que demonstram grande interesse pela música, canto, instrumentos musicais e assim por diante. Elas têm grande desenvoltura para exercer atividades relacionadas à música. Na sala de aula, temos os estudantes que se desenvolvem mais no aprendizado quando relacionamos certa atividade com a música. É perceptível, nos alunos de inteligência musical, o interesse pela atividade e pela matéria quando envolvemos a música como atividade didática. Inteligência Corporal-Cinestésica. Como seria utilizar o corpo para resolver um problema? Ou mesmo criar um produto? Certamente não é como resolver um problema matemático, mas aspectos cognitivos se tornam evidentes ao utilizarmos o corpo para realizar alguma tarefa, seja jogar um esporte, realizar passos de dança etc. Muitas funções no cérebro são ativadas para calcular espaço, tempo, intensidade, entre outras, para cumprir atividades como num esporte. Também não se tem dúvida de que atividades, envolvendo o uso do corpo, são completamente presentes em diversas culturas; dessa forma, também pode ser considerada uma inteligência corporal-cinestésica. Em sala de aula, as pessoas que possuem essa inteligência fazem um rápido reconhecimento e se interessam imediatamente em atividades que exploram exercícios do tipo ‘mãos à obra’, representações, pesquisas ou exercícios de campo, cozinhar, mímica, atividades competitivas etc. Tudo que se torna prático e aguça o interesse desses alunos. Inteligência Lógico-Matemática. Pessoas com essa inteligência, geralmente são mais valorizadas na sociedade, por terem mais sucesso nos testes de Ql, geralmente são rotuladas como pessoas de "pensamento científico", pois possuem poderes intelectuais de observação e dedução sobre as coisas. Geralmente pensam, decifram e deduzem as coisas na mente para depois organizá-las no papel de forma prática. Elas deduzem a solução de um problema de forma rápida porque criam com facilidade numerosas hipóteses, pois lidam com diversas variáveis. 63 Para esses estudantes, atividades que lhes propiciarão condições boas para o aprendizado são do tipo experimentos científicos ou demonstrações científicas, jogos do tipo que "quebram" a cabeça, materiais com explicações lógicas e sequenciais de regras gramaticais, problemas matemáticos, trabalhos com estatísticas, classificações, categorizações, criação de códigos etc. Os estudantes, cuja inteligência lógico-matemática é mais desenvolvida, interessam-se bastante pela construção do quadro estatístico e deduzem com mais facilidade a solução para o mistério que lhes fora proposto, por meio das informações que vão recebendo, mesmo que ainda não tenham tudo passo a passo completo. Inteligência Linguística. Na psicologia e nos testes de Ql, essa inteligência sempre foi considerada, tal como a lógico-matemática, uma inteligência de fato. Empiricamente é reconhecida, especialmente, por existir uma área no cérebro chamada de Centro de Broca, região responsável pela produção de sentenças gramaticais. Como também é reconhecível que a linguagem é um fator universal, cujo desenvolvimento é rápido e surpreendente em crianças de todas as culturas. Até deficiências não impedem a comunicação e a criação de uma linguagem. Falantes com a inteligência linguística, ou verbal, como também é conhecida, têm facilidade em fazer anotações quando estão ouvindo ou assistindo a uma palestra, gostam de leitura, contam histórias, participam de debates etc. Tudo envolvendo, de certa forma, o exercício e a exploração da linguagem. Inteligência Espacial. Também conhecida como inteligência visual, trata da capacidade que uma pessoa tem de perceber o mundo espacial e visual com precisão. É a habilidade de representar e manipular objetos mentalmente, de perceber detalhes pequenos etc. Um exemplo que Gardner (1995) dá para representar essa inteligência é a habilidade que marinheiros têm de conduzir um navio rumo a uma ilha, mesmo sem vê-la, só levando em consideração a posição das estrelas, a cor da água e as condições atmosféricas, como o tempo. Daí ele consegue, com as informações adquiridas visualmente, escrever um mapa que lhe fará chegar precisa e seguramente até o local almejado. Na aprendizagem, atividades que valorizam a inteligência visual-espacial são aquelas que se utilizam de vídeos, filmes, imagens, 64 desenhos, organização de gráficos, uso de computação gráfica, construção de mapas etc. Inteligência Interpessoal. Trata-se da capacidade e habilidade que uma pessoa tem de perceber o outro, seus sentimentos, estados de ânimo, temperamentos, motivações e intenções etc. De uma forma mais avançada, essas pessoas podem perceber tudo isso, mesmo que a outra pessoa esconda. Geralmente são religiosos, professores, terapeutas, pais etc. Existem dois fatores que são reconhecidos como aspectos biológicos em todos os seres humanos que identificam a inteligência interpessoal: um deles é a prolongada infância, que seria o apego e afeto que todo ser humano tem pela mãe; no caso de pessoas que não tiveram a presença da mãe, nos anos iniciais da vida, têm um prejuízo no desenvolvimento do comportamento interpessoal. Outro fator é a grande importância que todo ser humano dá à interação social. Desde os primórdios da humanidade, o homem é acostumado a exercer variadas atividades em grupo. A necessidade de se organizarem em grupo, de terem líderes, de comportarem-se com solidariedade, demonstram a existência desenvolvida em todos os seres humanos da inteligência interpessoal. Atividades que contribuem na educação dessas pessoas são exercícios em grupos ou duplas, projetos em equipes, liderança de atividades, oportunidade de mediação e cooperação com o professor, ensinar aos colegas etc. Ou seja, eles se desenvolvem mais na resolução de problemas quando não estão sozinhos ou quando estão sendo cooperados ou estão cooperando com alguém. Inteligência Intrapessoal. Um aluno que possui inteligência intrapessoal é aquele que tem a habilidade aguçada para perceber-se a si mesmo, seus sentimentos, personalidade, temperamentos, enfim, ele pode acessar as suas emoções internas, discriminá-las e utilizá-las para entender o próprio comportamento. Essa inteligência é a menos evidente de todas, por ser tão privada, ela precisa de outras inteligências para expressar-se, como por meio de escrita, música, filmes e outros. Por meio de um texto, um indivíduo pode falar, descrever coisas, criticar a si mesmo, perfeitamente, a fim de formar uma imagem de si e utilizá-la de forma efetiva. E, por utilizar símbolos de outras inteligências, ela é reconhecida como responsável por corporificar a interação das inteligências. Uma pessoa com essa inteligência contribui bastante para o próprio aprendizado quando pode realizar tarefas de auto- 65 avaliação, preferindo fazê-las sozinho. Esta gosta de escrever diários ou roteiros da própria jornada de aprendizagem, de fazer descrições pessoais, e assim por diante. Inteligência Naturalística. Esta foi a última inteligência adicionada ao grupo mais recentemente, e, portanto, ainda precisa de mais aprofundamento de pesquisa, mas, em geral, é a capacidade de reconhecer, categorizar e descrever certas características da natureza. Inteligência Existencial. Este é outro tipo de inteligência que tem merecido estudos e menção como parte do grupo das inteligências múltiplas, mas, como envolve elementos como questões de valor, por exemplo, ainda não pode ser considerada no âmbito científico. 66 CAPITULO 3: VARIAÇÃO x ERRO: considerações Identificar e analisar a interferência entre línguas tem sido um aspecto central no estudo do bilingualismo. A ‘intrusão’ de características de uma língua sobre a outra na produção do discurso, especialmente o discurso falado, de falantes não nativos tem sido estudado ao nível fonológico, morfológico e sintático. Os sistemas de contato que as línguas têm, em si mesmas, vêm sendo contrastados e, assim, um importante resultado na análise contrastiva tem sido a possível antecipação de dificuldades específicas, envolvidas no processo de aquisição de uma segunda língua. Segundo Lado (1964, p.2), “[...] Aqueles elementos que são semelhantes na língua mãe (L1), serão simples para o falante nativo, enquanto aqueles que não são tão simples serão difíceis.” Tais considerações têm recebido maior ênfase nas últimas décadas, devido às discussões sobre interculturalidade (línguas em contato) e também devido à importância que a linguística contrastiva passou a ter a partir do estudo mais profundo deste fenômeno. Como se pode verificar pela afirmação de Politzer (1970): [...] Talvez a menos questionada e menos questionável aplicação da linguística seja a sua contribuição da análise contrastiva. Especialmente na aquisição de uma segunda língua, onde a análise contrastiva pode apontar e antecipar as dificuldades dos falantes. (POLITZER, 1970, p. 151) Alguns estudos a respeito da aquisição de uma segunda língua parecem sugerir que a análise contrastiva seja mais eficiente ao nível da fonologia do que da sintaxe. Algumas das pesquisas observacionais, em salas de aula, de segunda língua, examinaram a resposta dos professores aos ‘erros’ dos alunos, seguindo a mudança lógica de foco da análise contrastiva para a análise de ‘erros’, ocorrida entre o final dos anos 60 para os anos 70. A análise contrastiva gerava previsões, baseadas na comparação entre a L1 e a L2. Os pesquisadores, porém, sabiam a partir da experiência de sala de aula que os ‘erros’ que os falantes frequentemente cometiam em sala não eram necessariamente sempre os que haviam sido antecipados pela análise contrastiva. Havia ‘erros’ que não podiam ser explicados pela simples observação das diferenças 67 entre as línguas envolvidas, haja vista que alguns deles, previstos pela análise contrastiva, não serem sequer encontrados na prática. A análise dos ‘erros’ difere da análise contrastiva pelo fato de que ela estuda os ‘erros’ realmente produzidos pelos falantes, levantando assim uma série de questionamentos, tais como: 1) O que leva os falantes a cometerem ‘erros’?; 2) Os ‘erros’ são, na verdade, um problema ou uma parcela importante do próprio aprendizado?; Como os professores reagem aos ‘erros’?; Tais respostas fazem alguma diferença para o progresso do falante? Antes de tudo, no entanto, é necessário estabelecermos o conceito de ‘erro’ propriamente dito. Ao contrário do que se possa pensar em princípio, a noção de ‘erro’ não é tão simples assim. 3.1 PROBLEMAS EM DEFINIR ‘ERRO’ O que se considera ‘erro’ na aprendizagem de uma língua? As definições mais primitivas consideram a produção de uma forma linguística que se desvia da forma ‘padrão’, ‘correta’. A versão ‘correta’, por sua vez, é geralmente associada com a maneira pela qual um falante nativo usuário da segunda língua produziria aquela forma. Chamamos a isso de ‘norma do falante nativo’. Contudo, a noção de usar o falante nativo da segunda língua como norma de partida não é nem apropriada nem muito abrangente, pois, primeiro, isto não leva em consideração o fato de que alguns falantes não nativos têm um modelo de língua de chegada diferente daquele do falante nativo. Grande parte da aprendizagem de uma segunda língua por falantes usuários da primeira língua (L1) vem de modelos que não são nativos da segunda língua (L2), (professores não nativos são a maioria nos países em que a língua inglesa, por exemplo, é estudada como segunda língua). Da mesma forma, as pesquisas sociolinguísticas mostram que os falantes usuários da L1, no aprendizado da segunda língua, ao viverem na sociedade e cultura da língua de chegada (língua objeto) - de forma naturalística (fora da sala de aula, sem instrução formal) - nem sempre adotam uma variação ‘padrão’ ou ‘nativa’ como seu modelo para língua objeto. 68 Outros estudos revelaram que há variação até na forma linguística que os falantes nativos de um dialeto específico produzem, em diferentes contextos. Os estudos da sociolinguística, portanto, tem exercido profunda influência sobre os conceitos de ‘correto’ e não ‘correto’. Algumas mudanças na pedagogia também têm influenciado as atitudes acerca do conceito de erro e seu tratamento. Com o surgimento recente do método comunicativo para o aprendizado de uma língua, menos ênfase, hoje, tem sido dada ao tratamento da norma dita ‘culta’, e mais importância tem sido dada à questão da fluência. O discurso dos estudantes de língua geralmente ‘desvia’, de certa forma, do modelo que eles estão tentando absorver, e tais variações ou discrepâncias, na forma, têm tipicamente sido vistas como ‘erro’. Porém, hoje, sabemos que mais importância deve ser dada à habilidade do falante em passar suas ideias, conseguir informações, e tudo o mais, do que produzir frases gramaticalmente corretas. Devese considerar mais importante para um falante conseguir alcançar suas metas comunicativas do que criar frases perfeitamente bem formadas. Assim, deve-se pensar no grau de sucesso comunicativo de um falante ao reagir à sua produção, tanto escrita quanto oral. As pesquisas no campo de ‘erro’ têm sido limitadas, em grande parte, aos erros de exatidão, que são relativamente fáceis de identificar. Porém, não se poderá dizer muito acerca do que pode ser feito para remediar os ‘erros’ até que o tratamento das variações comunicativas tenha sido bem estudado. Quando se considera o ambiente de aprendizagem de uma segunda língua, a resposta do instrutor à produção do falante aprendiz deve ser o critério mais importante no julgamento de um ‘erro’. Sem dúvida, uma das definições afirma que “[...] erro é uma forma indesejada pelo instrutor” (GEORGE, 1972, p. 2). Quando se observam certas transcrições de sala de aula, nota-se que algumas respostas são algumas vezes rejeitadas pelo instrutor, não porque estejam erradas, mas por serem inesperadas. Fanselow (1977b, p. 585) observou lições nas quais “[...] o objetivo aparente do instrutor era fazer o aluno responder a uma pergunta do jeito que o professor tinha planejado, sem nenhuma variação permitida”. Nystrom (1983) documentou um exemplo deste fenômeno, como se mostra a seguir. As observações sobre 69 comportamento não-verbal estão em parênteses. Os comentários do instrutor estão entre barras. P representa aprendiz e T instrutor. Transcrição 1: ‘I see a pig’ (‘Eu vejo um porco’). I: Eu quero que você olhe isto e diga-me UMA COISA que esteja acontecendo nesta figura. Diga-me uma frase completa. Okay, Dione? P: (Engasga / quer participar). I: Dione. P: Um porco. I: (Olha pelo canto do olho / hesitantemente/). Um porco. Você poderia dizer isso em uma frase completa? Você precisa dizer mais que simplesmente ‘um porco’. Você precisa ver, diga, ‘Eu vejo um porco’ ou você precisa dizer, ‘O porco está fazendo alguma coisa’. P: Um carneiro? I: Okay, Tony? (A transcrição 1 foi reproduzida de NYSTROM, 1983, p. 171-172, grifos do autor)3 Como afirma Nystrom (1983), a resposta “um porco” é muito lógica. Está realmente ‘correta’ e reflete o padrão natural de fala em um discurso oral (em frases mais que orações completas) quando um contexto suficiente é oferecido. Contudo, o instrutor não aceita a frase porque o aprendiz cometeu um ‘erro’ de discurso de sala de aula, ao “não usar uma oração completa como o instrutor solicitou” (NYSTROM, 1983, p. 172). Em um estudo das reações do instrutor aos ‘erros’ de crianças, feito em uma turma de imersão de língua francesa no Canadá, Chaudron (1986b) também discute as várias formas de definir ‘erro’, como: 1) formas linguísticas ou conteúdo que difere das normas ou fatos de um falante nativo; 2) qualquer outro comportamento assinalado pelo instrutor como precisando de melhora. 3 Transcript 1: ‘I see a pig’. T: I want you to look at this and tell me ONE THING that’s going on in this Picture. Tell me a complete sentence. Okay, Dione? P: (Gasps/wants to be called on/) T: Dione? P: A pig. T: (Looks out of the corner of her eye / uncertainly /). A pig. Can you tell me that in a complete sentence? You need to say more than just, ‘a pig’. You need to see, say, uh, ‘The pig is doing something’. P: A goat? T: Okay, Tony? 70 Chaudron (1986b, p. 66, grifos do autor) também usa o conceito de “reações corretivas”, definidas, como: “[...]quaisquer reações, da parte do instrutor, que transformem, ‘referem-se a’ de forma desaprovadora, ou exigem a ‘melhora de’ uma produção ou comportamento de um aprendiz”. As categorias de ‘erro’ estudadas, nesta pesquisa, incluem variações fonológicas, léxicas, morfológicas, sintáticas, discursivas e de conteúdo. Chaudron (1986b) resume os problemas enfrentados pelos pesquisadores e instrutores, ao tentarem identificar os ‘erros’ dos falantes não nativos, adquirindo uma segunda língua. A determinação de erros é claramente um processo difícil que depende do contexto imediato da produção em questão, bem como no entendimento do conteúdo da lição, o objetivo do instrutor ou do aprendiz, e às vezes, o aprendizado prévio do aprendiz. (CHAUDRON, 1986b, p. 69) 3.2 TIPOS E CAUSAS: ‘erros’ intralínguas e de desenvolvimento ‘Erros’ intralínguas são geralmente aqueles que refletem as características gerais da aprendizagem da norma culta, tais como: generalizações falsas, aplicação incompleta da norma e fracasso em aprender as condições nas quais a norma se aplica. Os erros de desenvolvimento, por sua vez, ilustram a tentativa do aprendiz de construir hipóteses sobre a segunda língua L2 (inglês) a partir de sua pouca experiência adquirida com a sala de aula e o livro texto. Assim, podemos categorizar os ‘erros’ em quatro grupos distintos. 3.2.1 Supergeneralização Dentre os erros mais frequentes quando se considera as hipóteses que o falante faz dentro do próprio sistema da L2 está o de generalizar conceitos ou estruturas, isto é, assumir determinadas conclusões como corretas tendo como base 71 a extensão de uma estrutura a outras que parecem semelhantes, embora, na verdade não o sejam. Se tomarmos uma das definições do verbo generalizar a partir do dicionário Aurélio eletrônico (2009), vemos que: a) Verbo intransitivo: Fazer generalizações. b) Verbo transitivo: Tornar mais amplo; dar maior extensão a (algo) (Dicionário Aurélio 5+, 2009, em http://aurelio.ig.com.br, 23/01/2010). Outro tipo de erro comum neste grupo é o da transferência de regras, o que acontece pela interferência da L1 sobre a L2, ou seja, o falante transfere normas que estariam corretas na língua materna e as aplica como se corretas fossem na L2. Novamente, se virmos o conceito de transferir a partir de considerações do dicionário Aurélio, temos: a) Verbo transitivo direto e indireto: Pôr a cargo de; passar ou fazer passar a outrem; passar: "Rousseau é o gênio que deu forma às democracias, transferindo de Deus ao povo a origem do poder." (Tarqüínio J. B. de Oliveira, As Cartas Chilenas, p. 13.) (Dicionário Aurélio 5+, 2009, em http://aurelio.ig.com.br, 23/01/2010). Ainda mais, Jakobovits (1969a) define generalização ou transferência, como: [...] o uso de estratégias previamente disponíveis em novas situações. No aprendizado de uma segunda língua, algumas destas estratégias serão úteis para organizar os fatos da segunda língua, mas outras, talvez, por causa de semelhanças superficiais, sejam enganosas e inaplicáveis. (JAKOBOVITS, 1969a, p. 32) A supergeneralização refere-se a exemplos, onde o falante não nativo cria uma estrutura variacional com base na sua experiência de outras estruturas na língua de chegada, como, por exemplo: He can sings; we are hope; it is occurs; He come from. A supergeneralização geralmente envolve a criação de uma estrutura variacional em lugar de duas estruturas padrão. Pode ser o resultado da tentativa do aprendiz de reduzir seu fardo linguístico. Por exemplo, a omissão do sufixo flexionado da terceira pessoa do singular do presente simples –s remove a 72 necessidade de concordância, aliviando, assim, o aprendiz, de um esforço considerável. A supergeneralização está associada com a redução de redundâncias. Pode ocorrer, por exemplo, com itens que têm contraste na gramática da língua, mas que não carregam contraste óbvio e significativo para o aprendiz. O sufixo flexionado do passado simples dos verbos regulares, -ed, em narrativas ou outros tipos de contexto de passado parece carregar nenhum significado, pois a noção de passado é normalmente indicada lexicalmente nas estórias e a noção essencial de sequenciamento na narrativa também pode ser expressa, igualmente bem, no presente, como Yesterday I go to the university and I meet my new professor (Ontem eu vou a universidade e encontro com meu novo professor). Assim, o aprendiz corta as tarefas envolvidas com a produção de orações. Ervin-Tripp (1969) sugere que [...] possivelmente as simplificações morfológicas e sintáticas do aprendiz de uma segunda língua correspondem a alguma simplificação comum entre as crianças (falantes nativos) aprendendo a mesma língua. (ERVIN-TRIPP 1969, p. 33) Naquilo que se conhece como superaprendizado de uma estrutura (WOLFE, 1967, p.3-4, grifos do autor), o exemplo “[...] ‘he walks’ pode ser contrastado com ‘he is walking’; ‘he sings’ com ‘he can sing’ e, uma semana depois, sem nenhum aprendizado consciente ter acontecido, o falante produz ‘he can sings’ e ‘he is walks’”. 3.2.2 Ignorância das restrições da norma Muito relacionado com a generalização de estruturas variacionais está o fracasso em observar as restrições das estruturas existentes, isto é, a aplicação das regras a contextos onde elas não se aplicam: The man who I saw him (O homem que eu vi ele) viola a limitação dos sujeitos nas estruturas com o relativo who. I made him to do it (Eu o fiz fazê-lo) ignora as restrições do uso do infinitivo com o causativo make. 73 Estes, novamente, são exemplos de generalização ou transferência, visto que o aprendiz está usando uma norma previamente adquirida em uma situação nova. Alguns ‘erros’ de restrição de norma podem ser explicados em termos da analogia; outros exemplos podem resultar do aprendizado ‘errado’ das normas. A falha em observar restrições no uso do artigo pode derivar da analogia, com o aprendiz racionalizando um uso variacional a partir de sua experiência prévia de inglês. Isto pode ocorrer mesmo quando a língua materna é próxima ao inglês. Por exemplo, em inglês diz-se: The sparrow is a small bird. Sparrows are small birds (A gaivota é um pequeno pássaro. Gaivotas são pequenos pássaros). Como as duas orações são exatamente paralelas, uma substituição bastante lógica na segunda língua seria The sparrows are small birds. Ao invés de seguir o ‘modelo’ da língua materna, o aprendiz, já tendo primeiro produzido The sparrows are a partir de The sparrow is, vê um paralelo entre sparrows e birds e, então, produz o ‘erro’ comum The sparrows are the small birds (As gaivotas são os pequenos pássaros). 3.2.3 Aplicação incompleta das normas Aqui, nota-se a ocorrência de estruturas, cuja variação representa o grau de desenvolvimento das normas requeridas para produzir frases aceitáveis. Por exemplo, nas línguas básicas, dificuldades sistemáticas no uso de perguntas podem ser observadas. Uma forma afirmativa pode ser usada como pergunta, uma das transformações em uma série pode ser omitida, ou um advérbio interrogativo pode simplesmente ser adicionado a uma forma afirmativa. Não importa o intenso estudo tanto das formas interrogativas quanto das afirmativas, uma forma interrogativa gramatical jamais poderá tornar-se parte da competência de um falante não nativo na aquisição de uma segunda língua. A redundância poderá ser um fator explicativo. O falante usuário de língua portuguesa, adquirindo a segunda língua, interessado primariamente na comunicação, poderá alcançar uma comunicação bem eficiente sem precisar dominar mais que as normas bem elementares do uso da interrogativa. A motivação para atingir a comunicação pode ser mais forte que a motivação para produzir orações gramaticalmente corretas. 74 3.2.4 Conceitos falsos hipotéticos Além da enorme gama de ‘erros’ intralínguas que tem relação com o aprendizado falho da norma em vários níveis, há também uma classe de ‘erros’ que derivam de uma compreensão falha das distinções na língua objeto. Estas, algumas vezes, resultam de uma gradação pobre dos itens aprendidos. A forma was, por exemplo, pode ser interpretada como marcador de passado, como em One day it was happened (Um dia ele foi aconteceu); e is poderá ser entendido como o marcador correspondente do presente, como em He is speaks French (Ele está falar Francês). Também, pode-se encontrar a forma do progressivo (contínuo) ao invés do passado simples, em narrativas. Ainda, encontra-se certa confusão entre too, so e very; entre come e go, e assim por diante. Já foram identificados certos ‘erros’ desta natureza em situações formais de sala de aula, e em situações baseadas na análise contrastiva do inglês com outra língua, ou contrastes dentro do próprio inglês. Uma análise mais detalhada dos principais ‘erros’ intralínguas ou de desenvolvimento – supergeneralização, ignorância das restrições da norma, aplicação incompleta da norma e a construção de conceitos e sistema falsos – pode conduzir a um exame dos procedimentos de aprendizagem em busca de evidências das suposições por trás destes. Tem-se reiteradamente repetido que [...] surpreendentemente há muito poucas descrições publicadas acerca de como e do quê as crianças aprendem. Há muitas descrições do que o instrutor faz e que materiais são apresentados para as crianças, mas muito pouco sobre que erros as crianças fazem e como eles podem ser explicados, ou que generalizações e estratégias de aprendizagem as crianças parecem desenvolver. Pode ser que a estratégia de uma criança para aprender seja parcialmente ou totalmente independente dos métodos pelos quais ela esteja sendo instruída. (DAKIN 1969, p. 107-111) A interferência da língua materna é claramente uma fonte importante das dificuldades de aprendizagem de uma segunda língua e a análise contrastiva provou ser uma valiosa aliada em localizar áreas de interferência interlínguas. Muitos ‘erros’, no entanto, derivam das estratégias empregadas pelos falantes durante a aquisição de uma língua assim como também da interferência mútua de certos itens dentro da própria língua. 75 3.3 NOÇÃO DE ‘ERRO’: o que é considerado ‘certo’ ou ‘errado’ ao aprender uma língua estrangeira? Mesmo com todo o avanço das últimas décadas a definição de erro ou desvio da norma culta continua sem uma formulação precisa. As opiniões de gramáticos e de linguistas diferem quanto aos aspectos de competência e de fluência de comunicação. Se tomarmos o conceito do dicionário eletrônico Aurélio 5+, 2009, erro é: (ê) [Dev. de errar.] Substantivo masculino. 1.Ato ou efeito de errar. 2.Juízo falso; desacerto, engano. 3.Incorreção, inexatidão. 4.Desvio de bom caminho; desregramento, falta. 5.E. Ling. Desvio em relação a variedade padrão de uma língua. 6.E. Ling. No aprendizado de língua estrangeira (q. v.) ou de segunda língua (q. v.), o uso sistemático de uma forma de modo diverso daquele que seria o de um falante nativo. (Dicionário Aurélio 5+, 2009, em http://aurelio.ig.com.br, 23/01/2010) Como se vê, são muitas as definições de ‘erro’, o que traz um grau de dificuldade ainda maior para o seu tratamento, especialmente quando se trata do aprendizado de uma língua, onde os desvios podem ser de várias naturezas e podem ter características muito semelhantes. Conforme destaca Ellis (1994) [...] o 'erro' é um aspecto flagrante e bastante comum em língua estrangeira. Vários estudos mostram, de maneira descritiva, os ‘erros’ presentes na fala de falantes não-nativos. Além disso, todos nós cometemos ‘erros’ na produção linguística, e tais ‘erros’ (na maior parte das vezes) tendem a variar (em intensidade e tipo) à medida que vamos ficando mais "proficientes" na língua estrangeira (LE). (ELLIS, 1994, p.57, grifos do autor) Ellis (1994) aponta ainda que é importante diferenciar ‘erros’ e lapsos linguísticos (error e mistake, na terminologia inglesa usada pelo autor). Os ‘erros’ refletem a natureza (ou estado/estágio) atual de nossa estrutura psicológica da língua (i.e., nosso conhecimento linguístico) ou ainda lacunas ou inadequações (sistemáticas) em relação à língua estrangeira estudada, ao passo que os lapsos são falhas ocasionais na produção, provocadas por fatores afetivos e circunstanciais presentes no uso da linguagem. 76 Aprender um idioma estrangeiro vai muito além de apenas ler e escrever, é preciso antes de tudo vencer as interferências negativas da língua materna, embora essas interferências estejam presentes com mais força na pronúncia. Na gramática, as interferências também se manifestam, porém de uma maneira mais sutil, entretanto isso não significa que a interferência negativa da língua materna na gramática não exista. Mas então o que é que a palavra ‘erro’ tem a ver com a interferência negativa da língua materna? Muita coisa, visto que ambas estão tão intimamente ligadas e que são confundidas umas com as outras. Mas quando o assunto envolve o aprendizado de uma língua estrangeira, independentemente de qual for essa língua, o aluno tende a usar a língua materna de forma negativa como referencial para tentar se expressar e isso não está errado, visto que, com exceções à parte, toda língua tem um verbo, um pronome, um adjetivo, um sujeito, etc. O que pode variar é a maneira com que esses elementos de um sistema (língua estrangeira) se organizam na hora de se expressar (são os padrões linguísticos de cada língua). Assim, esse fator é tão relativo quando a variedade de dificuldades que o aluno pode encontrar dentro desse sistema e que dificuldades são essas? A falta de exemplos semelhantes na língua materna é um dos maiores indutores de ’erros‘, pois é exatamente nesse momento que a influência negativa da língua materna age, induzindo o aluno a improvisar seu raciocínio de acordo com necessidade da situação, comprometendo de tal forma a capacidade do aluno de aprender um idioma estrangeiro com naturalidade. Existe uma diferença de ‘erro’ por falta de prática e o costume de fazer algo interferir na hora de tentar algo novo, em outras palavras: a força do hábito impede que as pessoas assimilem novos mecanismos. Dois especialistas em Programação Neurolinguística (PNL), Joseph O´ Connor e John Seymour, afirmam que “[...] o inconsciente é muito mais sábio que a mente consciente” (1990, p. 72). Segundo eles, em PNL, algo é consciente quando está presente na nossa percepção presente; e algo é inconsciente quando não está presente na nossa percepção atual. Vivemos numa cultura que acredita que a maior parte de nossos atos são conscientes. Contudo, a maior parte de nossas ações é produzida de maneira inconsciente. O fator inconsciente tem mais força do que muitas pessoas imaginam, 77 e isso não está recebendo a atenção necessária na hora de lidar com o ensino da língua estrangeira. Por exemplo, a formulação de ideias interrogativas e negativas: (‘erro’ bastante comum apenas no início do aprendizado) é algo quase que automático no falante usuário de uma determinada língua. A primeira grande dificuldade que o brasileiro, falante usuário de português, enfrenta ao iniciar seu aprendizado em inglês, é normalmente a estruturação de frases interrogativas e negativas. Frases interrogativas em português são diferenciadas apenas pela entonação, não exigem alteração da estrutura da frase, sendo um modelo estrutural bem mais simples que no inglês, pois, para a formulação de perguntas no português, é completamente desnecessário o uso de verbo auxiliar, diferentemente do inglês, fato que causa muita confusão quando o falante tenta se expressar. No inglês, além da entonação, temos, no caso das Be Phrases (frases com o verbo to be ou com qualquer outro verbo auxiliar ou modal), a inversão de posição entre sujeito e verbo. He's a student Ele é estudante. Is he a student? Ele é estudante? I can speak English Eu sei falar inglês. Can I speak English? Eu sei falar inglês? Fonte: (JACOBS, 1999, p. 129-142). Note que a estrutura das sentenças em português praticamente continua intacta, enquanto em inglês a estrutura sofre algumas mudanças de posição do verbo. E, no caso de Do Phrases, frases em que não há verbo auxiliar, surge a necessidade de uso do verbo auxiliar DO/DOES para formular perguntas ou frases negativas. He speaks English Ele fala inglês. Does he speak English? Ele fala inglês? He doesn't speak French Ele não fala francês. Fonte: (JACOBS, 1999, p. 129-142). 78 Além de contrastarem profundamente em relação ao português, esses dois tipos de estruturas contrastam entre si. O contraste entre Be Phrases e Do Phrases aparece nos modos interrogativo e negativo. Be Phrases faz a inversão de posição entre sujeito e verbo para formação de frases interrogativas ou negativas, não precisando de verbo auxiliar, enquanto Do Phrases precisa do verbo auxiliar DO/DOES. Isto representa uma dupla e acentuada dificuldade para os falantes usuários do português, por não haver necessidade do uso de verbo auxiliar nestas circunstancias e a formação de frases não é afetada pelos modos afirmativo, negativo e interrogativo. O modo interrogativo, em português, como visto nos exemplos, consiste apenas em uma diferente entonação, enquanto em inglês exige uma significativa alteração na estrutura da frase, além da entonação. A dificuldade não é de entender, e sim de assimilar e automatizar. Quem fala o português como língua materna não está acostumado a estruturar seu pensamento dentro dessas normas e precisará praticar para conseguir "internalizar" essas estruturas. Um dos erros gramaticais mais comuns é o mau uso das preposições FOR e TO. O fato de ser o infinitivo em inglês formado pelo verbo precedido da preposição TO, aliado ao fato de ser comum em português a colocação de ideias do tipo VERBO + PARA + VERBO NO INFINITIVO, induz o aluno frequentemente a colocar a mesma ideia em inglês, usando a combinação das preposições FOR + TO. Esta, entretanto é uma combinação impossível, não ocorrendo jamais em inglês. Observe nos seguintes exemplos as alternativas corretas: I came to talk to (with) you. Eu vim para falar contigo. She offered to help me. Ela ofereceu-se para ajudar-me. It's necessary to study, in order to learn. This is an instrument for measuring speed. Para aprender, é necessário estudar. Isto é um instrumento para medir velocidade. Fonte: (JACOBS, 1999, p. 129-142). Como regra geral, sempre que houver tendência de colocar FOR + TO, o aluno deve lembrar-se de simplesmente eliminar a primeira preposição. 79 Veremos agora alguns erros fonológicos que atrapalham na hora de pronunciar ‘corretamente’. O primeiro problema, e talvez o mais evidente deles, ocorre na área das vogais anteriores altas. Os fonemas /iy/ e /I/, do inglês, muito provavelmente serão percebidos e reproduzidos como o /i/, do português, neutralizando, portanto, o único contraste entre palavras, como: beach /biytsh/ bead /biyd/ beat /biyt/ cheap /tshiyp/ eat /iyt/ feel /fiyl/ feet /fiyt/ heat /hiyt/ heel /hiyl/ lead /liyd/ leap /liyp/ least /liyst/ bitch /bItsh/ bid /bId/ bit /bIt/ chip /tshIp/ it /It/ fill /fIl/ fit /fIt/ hit /hIt/ hill /hIl/ lid /lId/ lip /lIp/ list /lIst/ leave /liyv/ meal /miyl/ neat /niyt/ peel /piyl/ reach /riytsh/ seat /siyt/ seek /siyk/ sheep /shiyp/ sheet /shiyt/ sleep /sliyp/ steal /stiyl/ wheel /wiyl/ live /lIv/ mill /mIl/ knit /nIt/ pill /pIl/ rich /rItsh/ sit /sIt/ sick /sIk/ ship /shIp/ shit /shIt/ slip /slIp/ still /stIl/ will /wIl/ Fonte: (SCHUMACHER, 1999, p. 133-148). Pelo fato dos fonemas /iy/ e /I/ do inglês terem uma carga funcional muito ampla, isto é, ocorrem com muita frequência como único elemento diferenciador, qualquer neutralização nessa área pode representar um sério problema. Outro problema de provável ocorrência situa-se na área dos fonemas /æ/ e /e/ do inglês. Ambos serão percebidos como /é/ do português, cuja posição de articulação é intermediária, um pouco mais próxima de /e/ do que de /æ/. Este desvio neutraliza o contraste entre palavras, como: bed /bed/ beg /beg/ dead /ded/ end /end/ flesh /flesh/ gem /dzhem/ guess /ges/ head /hed/ bad /bæd/ bag /bæg/ dad /dæd/ and /ænd/ flash /flæsh/ jam /dzhæm/ gas /gæs/ had /hæd/ lend /lend/ men /men/ met /met/ pen /pen/ said /sed/ send /send/ shell /shel/ then /ðen/ land /lænd/ man /mæn/ mat /mæt/ pan /pæn/ sad /sæd/ sand /sænd/ shall /sæl/ than /ðæn/ Fonte: (SCHUMACHER, 1999, p. 133-148). A vogal média-central neutra /ə/ do inglês, especialmente quando tônica, não tem equivalente em português, o que significa possibilidade de erro fonológico em 80 palavras como but /bət/ e rubber /'rəbər/. Também a forma reduzida e atônica deste fonema, denominada "xuá" (de alta ocorrência no inglês) representa uma notória dificuldade até mesmo a longo prazo. Isto porque, no português, as vogais atônicas não são reduzidas e neutralizadas como em inglês. É muito provável que o aluno brasileiro venha a ser influenciado pela ortografia nesse caso. A palavra photographer, por exemplo, poderá vir a ser pronunciada /fô'tógrafêr/ em vez do ‘correto’ /fə'tagrəfər/. Brasileiros encontrarão dificuldade para distinguir entre os sons de /a/ e /o/ do inglês. Na maioria das vezes, /a/ será percebido como /ó/ do português. Este problema é agravado pelo fato de que o fonema /a/ do inglês é, muitas vezes, representado na ortografia pela letra “o”, a qual frequentemente corresponde, em português, a /ó/, como na palavra pó. Sendo /ó/ do português muito parecido com /o/ do inglês, como por exemplo, na palavra law, haverá possibilidade de erro fonológico, como nos seguintes exemplos: collar /'kalər/ cot /kat/ are /ar/ caller /'kolər/ caught /kot/ or /or/ Fonte: (SCHUMACHER, 1999, p. 133-148). As fricativas /s/ e /z/, quando em posição de final de palavra, têm carga funcional em inglês, isto é, são responsáveis por diferenciação entre palavras. Em português, entretanto, /s/ e /z/ não têm a mesma carga funcional quando em final de palavra. A ocorrência de um ou de outro vai ser determinada pela característica fonética do meio em que ocorrerem. A dificuldade daí resultante pode produzir ‘erros’, conforme os seguintes exemplos: ice [ays] peace [phiys] rice [rays] eyes [ayz] peas [phiyz] rise [rayz] Fonte: (SCHUMACHER, 1999, p. 133-148). A retroflexa /r/ do inglês, de forma semelhante às interdentais, não tem qualquer fonema semelhante na maioria dos dialetos do português (a única exceção é o dialeto da região de Piracicaba - SP). Portanto, alunos brasileiros não acostumados com a retroflexão da língua, terão que exercitar a articulação desse 81 fonema. Devido à interferência ortográfica, a retroflexa /r/ do inglês, quando ocorre no início da palavra, é facilmente interpretada como se fosse a fricativa velar /rr/ do português, uma vez que ambas são representadas pelo grafema "r". Por outro lado, a fricativa glotal /h/ do inglês é muito próxima e semelhante à fricativa velar /rr/ do português. A confusão resultante disto poderá causar a neutralização do contraste entre palavras como: hat [hæt] head [hed] high [hay] hoe [how] rat [ræt] red [red] rye [ray] row [row] Fonte: (SCHUMACHER, 1999, p. 133-148). . Uma das atitudes mais comuns entre os falantes usuários do português, que estão aprendendo uma língua estrangeira, é a transferência da estrutura da língua materna para a língua estrangeira, o que significa fazer uma transferência literal, neste caso, do português para o inglês, o que consiste em expressar-se em uma língua estrangeira sem levar em consideração a sua estrutura gramatical e outras regras que a compõe, transferindo dessa forma, diretamente para a língua estrangeira, a mesma estrutura da língua materna. Os ‘erros’ que os alunos cometem ao aprender inglês não são um mero resultado da transferência de "regras" que caracterizam sua língua materna. São, portanto, índices das reações que os alunos têm para atribuir um sentido ao novo, seja com base no conhecimento linguístico do português, de outra língua ou mesmo do repertório que já possui em relação ao próprio inglês. Quando os alunos de inglês que são falantes nativos da língua portuguesa aprendem inglês, mostram bastante dificuldade no uso do verbo there to be (haver, existir). Ao procurarem dizer "houve uma festa na minha casa ontem", dizem had a party at home yesterday, em vez de dizerem there was a party at home yestarday. Isso acontece porque o aprendiz está usando como referência o uso que ele faz da língua portuguesa para compor seu enunciado. É bastante evidente que a referência seja "teve uma festa na minha casa ontem", maneira como nos expressamos, em português, nas situações mais informais. No português, normalmente, colocamos dupla-negação na mesma frase. Pronomes indefinidos como NADA, NENHUM, NINGUÉM podem ser usados 82 livremente em frases negativas, entretanto, quando levamos a mesma regra para o inglês, estamos transferindo costumes da língua materna para a língua estrangeira, pois isto em inglês é gramaticalmente incorreto. Exemplos: There's nothing I can do. / There isn't anything I can do.- Não tem nada que eu possa fazer. I have no problems. / I don't have any problems.- Eu não tenho nenhum problema. There's nobody home. / There isn't anybody home.- Não tem ninguém em casa. Possíveis casos de transferência de ideias: There isn’t nothing I can do. I don’t have no problem ou I haven’t no problem. There isn’t nobody home. Torna-se necessário colocar o problema dos ‘falsos cognatos’ ou ‘falsos amigos’, os quais se caracterizam como vocábulos de igual ou parecido significante em duas línguas, mas que possuem significados distintos. Definimos, ainda, os cognatos como palavras semelhantes em forma e sentido, independentemente da origem; e ‘falsos cognatos’ como palavras semelhantes na forma, mas de significados diferentes. Os cognatos têm uma importância significativa quando os ‘erros’ envolvem transferência e generalização. Cognatos são aquelas palavras, termos, vocábulos ou signos linguísticos que, apesar de terem uma origem comum e uma grafia idêntica ou semelhante, em duas línguas, evoluíram de forma diferente, total ou parcialmente, quanto ao significado sem que tivessem mudado substancialmente a grafia. O conceito de “falsos amigos” foi estabelecido em 1928 pelos linguistas franceses Maxime Koessler e Jules Derocquigny no livro Les Faux-Amis ou Les trahisons du vocabulaire anglais. Outro conceito relacionado são os heterossemânticos. Estes são pares de palavras de origem comum, ou seja, verdadeiros cognatos, mas que ‘sofreram’ evoluções semânticas distintas nas duas línguas, acabando por apresentar significados distintos. As listas a seguir apresentam tanto os heterossemânticos quanto os ‘falsos cognatos’. Ambos os tipos de cognatos podem ser usados como 83 exemplos de transferência de vocabulário pela escrita semelhante adotada pelos dois idiomas. ‘Falsos cognatos’ entre a língua portuguesa e a língua inglesa: Palavra em inglês Anthem Ingenious Pregnant Spectacles Falso cognato em português Antena Ingênuo Impregnada Espetáculos Significado real Hino Engenhoso Grávida; prenhe Óculos Fonte: (JACOBS, 1999, p. 129 – 142). Heterossemânticos entre a língua portuguesa e a língua inglesa: Palavra em inglês Actually Alias Advert Appoint Argument Assign College Comprehensive Conceit Deception Devolve Exquisite Eventually Graduate Inhabitable Injury Intend Library Prejudice Pretend Push Realize Retribution Scholar Sensible Silicon Sympathy Heterossemântico em português Atualmente Aliás Advertir Apontar Argumento Assinar Colégio Compreensivo Conceito Decepção Devolver Esquisito Eventualmente Graduação Inabitável Injúria Entender Livraria Prejuízo Pretender Puxar Realizar Retribuição Escolar Sensível Silicone Simpatia Fonte: (JACOBS, 1999, p. 129-142). Significado real Na verdade; realmente Pseudônimo; apelido Menção; propaganda Marcar Discussão; debate Atribuir; designar Faculdade Abrangente Vaidade; presunção Ilusão; fraude Transferir Requintado; agudo; sensível Mais cedo ou mais tarde Pós-graduação Habitável Lesão Pretender Biblioteca Preconceito Fingir Empurrar Perceber Represália; punição Erudito Sensato Silício Compaixão; pena 84 Esses exemplos mostram algumas das diversas possibilidades de ‘erros’, envolvendo transferência de vocabulário do português para o inglês, entretanto é possível que o aluno inverta o processo de transferência, isto é, o equívoco pode ocorrer do inglês para o português. Rumelhart e McClelland (1982) desenvolveram um modelo conexionista (um programa de computador) para o processamento de verbos da língua inglesa que reproduz o fenômeno da curva do U observado na aprendizagem do passado dos verbos em inglês. O processo de aprendizagem revela, basicamente, três estágios: 1) inicialmente o uso, pela criança, de um número limitado de verbos de alta frequência, geralmente verbos irregulares, e o uso correto do passado de cada verbo (isto é, as crianças parecem usar os verbos separadamente, tratando-os item por item); 2) neste segundo estágio a criança tende a generalizar, tratando todos os verbos como regulares. Nesse estágio há um processo de super-generalização de regras/padrões abstratos subjacentes aos verbos, ou seja, busca de aprendizagem sistemática. Nessa fase, muitos erros ocorrem resultantes de uma busca constante por sistematização por meio da generalização de padrões diferentes; 3) o último estágio revela a coexistência de formas verbais regulares e irregulares, consequência de um processo de categorização a partir da sistematização de padrões diferentes. O quadro a seguir, adaptado de Ellis (1994, p.23), ilustra bem o fenômeno relatado no estudo aqui descrito: Estágio Descrição Exemplo 1 Os aprendizes inicialmente não usam o verbo no tempo passado. 'eat' 2 Os aprendizes começam a produzir formas do passado irregular dos verbos. 'ate' 3 Os aprendizes supergeneralizam a forma do passado regular dos verbos. 'eated' 85 Às vezes, os aprendizes produzem formas híbridas. 'ated' Os aprendizes finalmente produzem as formas corretas do passado irregular dos verbos 'ate' Fonte: (ELLIS, 1994, p.23). Observe, agora, um exemplo de um ‘erro’, envolvendo generalização. Sabemos que, ao formularmos um enunciado na 3ª pessoa do singular do presente simples, os verbos ganham, em geral, um -s ou -es. Assim, dizemos I usually wake up early e he usually wakes up early. Ao analisarmos os ‘erros’ dos aprendizes, é comum encontrarmos a generalização do uso do -s do presente simples quando se expressam por meio dos verbos modais. Em vez de dizerem He can drive a car, os alunos dizem he can drives a car. Em enunciados em que figuram os verbos modais (can, must, should, may, etc.) não empregamos as regras do presente simples. Os verbos SAY e TELL, embora praticamente sinônimos no significado (transmitir informação), gramaticalmente são diferentes, porém os alunos de língua inglesa tendem a generalizá-los, desprezando de fato essa diferença gramatical que existe entre os verbos SAY e TELL. Ambos podem ser traduzidos, respectivamente, em português pelos verbos DIZER e FALAR, sendo que TELL pode ser também traduzido por CONTAR no sentido de NARRAR.. A diferença reside no fato de que com o verbo SAY, normalmente, não há na frase um receptor da mensagem (objeto indireto); enquanto com o verbo TELL, o receptor da mensagem está normalmente presente na frase. Veja os exemplos: He said that inflation will decrease. - Ele disse que a inflação vai diminuir. He told the reporters that inflation will decrease. - Ele disse aos jornalistas que a inflação vai diminuir. What did he say when you told him this? - O que é que ele disse quando tu disseste isso para ele? OBSERVAÇÃO: O que não pode acontecer é o aluno generalizar a situação como mostraremos a seguir: 86 She Said me [that] she was really tired ou she told [that] she was really tired. Outro caso que envolve generalização são os verbos modais (auxiliary modals) em inglês (can, may, might, should, shall, must), que nunca ocorrem isoladamente, ou seja, ocorrem apenas na presença de outro verbo. Ao contrário dos demais verbos, entretanto, os modais ligam-se ao verbo principal diretamente, isto é, sem a partícula TO. No entanto, existe uma insistência dos alunos para usar o TO, após os modais verbs, logo que a maioria dos verbos em inglês aceita a partícula TO após estes. Como podemos observar nos seguintes exemplos: He can speak English. - Ele sabe falar inglês. He likes to speak English. - Ele gosta de falar inglês. Can I smoke here? - Posso fumar aqui?-Do you want to smoke? - Você quer fumar? Possíveis casos de generalização de ideias: He can to speak english. Can I to smoke? I could to speak japanese whe I was a child. I think Johnny should to spend less time watching TV. E para concluir, os ‘erros’ de transferência ou de interferência são classificados como ‘erros’ interlínguas. Eles refletem a interferência da língua materna durante a produção da língua estrangeira. E o ‘erro’ de generalização está caracterizado como um ‘erro’ de cunho intralínguas, isto é, aqueles resultantes da aprendizagem de uma língua estrangeira que não refletem a influência da língua materna do indivíduo. 87 CAPÍTULO 4: A PESQUISA Durante o desenrolar de nossa pesquisa, utilizamos as seguintes estratégias de produção e análise para geração de dados, os quais vamos expor, mostrar estatisticamente e analisar, como agentes de interferência da língua materna na aprendizagem da língua estrangeira. Seleção dos sujeitos (alunos do Curso de Língua Inglesa do CCBEU e dos Cursos de Graduação de Letras, Secretariado Executivo Bilingue e Relações Internacionais), no total de 300, selecionados de acordo com a metodologia já explicitada, sendo a produção de dados referente a esta amostra feita através de observações in loco, registro e contagem do número de vezes que uma determinada ocorrência acontecia. Também foram feitos registros em fotografias (na van de turismo receptivo e nos posters do Projeto Tamar, em Salvador), para ocorrências fora da amostra em investigação, a fim de corroborar com o estudo proposto, bem como registro de um e-mail com autorização do emitente. Análise comparativa e contrastiva dos registros nas duas línguas, levando-se em conta a norma considerada “culta” da L2. Identificação dos desvios morfo-sintático-semânticos e sua frequência de ocorrência, através de contagem simples e cálculo de porcentagens. Análise da natureza dos desvios encontrados, de acordo com a norma considerada padrão e não padrão na L1 e L2. Nossa investigação busca avaliar qual o grau de influência da Língua Materna (L1), neste caso o Português, sobre a produção do discurso, aqui o escrito, da Segunda Língua (L2), especificamente o Inglês. O aporte teórico-metodológico é colocado nas áreas da Sociolinguistica Quantitativa e da Gramática Funcional, mais precisamente no modelo sugerido por Labov (1977) e seguido por Tarallo (2006), o qual tem por finalidade principal registrar, descrever e analisar sistemática e estatisticamente o uso pelos falantes de duas ou mais formas linguísticas. Utiliza como referenciais teóricos principais os postulados de Chomsky (1957) – 88 competência e performance, bem como os princípios da Linguística Contrastiva defendidos por Robert Lado (1945), no qual a identificação e a análise da interferência entre línguas em contato é um ponto central para o estudo do bilinguismo. A intrusão de características de uma língua sobre a outra, no discurso de falantes bilíngues, deve ser estudado ao nível da fonologia, morfologia e sintaxe. Os dois universos escolhidos para a realização da pesquisa foram a Escola de Línguas (Centro Cultural Brasil-Estados Unidos) e a Universidade da Amazônia (UNAMA). O CCBEU possui um Curso de Língua Inglesa regular, composto de 10 semestres (5 anos), dentre os quais 3 são básicos, 3 são intermediários e 4 são avançados. A progressão entre os níveis é semestral. Já nos Cursos de Graduação da UNAMA, escolhidos para a pesquisa - Letras, Secretariado Executivo Bilíngue, e Relações Internacionais, a progressão é também semestral e os conteúdos de cada curso são similares aos níveis de estudo associados ao CCBEU, tornando a análise contrastiva dos desvios produzidos no discurso em ambos os universos, consistente e lógica, a fim de estabelecer um quadro estatístico de frequência das interferências do sistema da Língua Materna que causaram desvios na produção do discurso escrito na Segunda Língua (L2). A coleta de dados foi iniciada há mais ou menos cinco anos, em 2005, quando a Embaixada dos Estados Unidos da América do Norte, em Brasília, através do Escritório de Projetos de Inglês, convidou-me a tornar-me um In-Country Speaker, isto é, um especialista em ensino de Inglês como língua estrangeira, para participar de Seminários e Conferências, Brasil afora, para discutir problemas relacionados à aprendizagem do Inglês como língua estrangeira. Então, a partir do Referencial Teórico adotado (Linguística Contrastiva e a Linguística Descritiva), realizamos uma pesquisa de campo, através de um estudo descritivo, de abordagem quanti-qualitativa, por meio de um estudo comparativodescritivo-contrastivo, a partir da seleção e análise das manifestações do discurso escrito dos sujeitos selecionados, de acordo com as variáveis estabelecidas, apresentando as manifestações linguísticas da Segunda Língua (L2), nesse caso, o inglês, as quais apresentavam desvios da norma dita culta, manifestações estas que indicavam ser resultado da influência da Língua Materna (L1), aqui o Português, comparando as manifestações nas duas línguas, na tentativa de mostrar que tais desvios eram resultado desta interferência, considerando especialmente o contraste entre FLUENCY (FLUÊNCIA) x ACCURACY (EXATIDÃO). 89 Portanto, nosso objeto de estudo serão os desvios linguísticos na produção do discurso de falantes usuários da língua portuguesa, durante o processo de aprendizagem da segunda língua, especificamente o inglês, a fim de reconhecer a interferência dos fatores intervenientes na aprendizagem da segunda língua, mostrando que certos desvios, aparentemente irrelevantes, em nossa pesquisa indicaram que podem influenciar ou não o processo de comunicação. Durante o transcorrer da pesquisa, encontramos alguns exemplos dos desvios mencionados, fora do universo da pesquisa, mas que apontavam na mesma direção. Alguns destes exemplos foram registrados apenas para reforçar a necessidade da pesquisa, bem como a análise dos dados colhidos na mesma. Entre eles temos fotografias e um e-mail, este recebido de um sujeito de fora da amostra delimitada (ANEXO A). Na primeira fotografia, aparece um aviso em forma de poster, contendo uma oração em língua portuguesa e sua correspondente em língua inglesa, colhido em uma van de turismo receptivo de passageiros na cidade de Salvador, Bahia, cujo conteúdo é a análise comparativa entre as frases escritas na língua materna (L1) e na segunda língua (L2), e mostra claramente dois desvios provenientes da interferência da L1 sobre a produção da L2, como se pode observar abaixo: Van da empresa PRIVÊTUR, de turismo receptivo em Salvador, Bahia, em 23/04/2009. Fonte: Pesquisa de campo 2009. 90 O primeiro, de ordem estrutural, é o uso do artigo definido the antes de um nome próprio, não usado na língua inglesa, fato que se explica pela existência do artigo definido a na oração em L1; o segundo se refere à grafia da palavra responsible, em que aparece um a no lugar do i, fato também explicado pela grafia da palavra na L1. Uma outra foto, em outra van da mesma empresa, com o mesmo tipo de pôster, apresentando o mesmo tipo de manifestação, como se vê abaixo: Fonte: Foto tirada pelo autor em Abril de 2009, em Salvador/BA. Pesquisa de campo 2009. NOTA: observa-se o uso do artigo definido the antes de nome próprio, vem como a eliminação do verbo da oração, neste caso, is, além da grafia da palavra responsible, grafada como responsable. Segundo informações da própria empresa, a redação das frases estava a cargo de pessoas que trabalhavam na mesma e foram elaboradas por um guia da empresa em questão, que já havia passado por todos os níveis de instrução formal da segunda língua (L2). A outra foto, em forma de um poster, é informativa, registrando um texto em português e seu equivalente em inglês, também em Salvador, na área onde está situado o PROJETO TAMAR, na Praia do Forte. No cartaz, pode-se identificar o uso 91 do artigo definido antes do nome próprio PROJETO TAMAR. No segundo parágrafo do texto em Inglês, visualiza-se a frase seguinte: [...] The Projeto TAMAR BAHIA [...], em que o uso do artigo definido the seria considerado um desvio da norma dita culta, do mesmo tipo observado na van da empresa de turismo anterior. Vale salientar que o texto neste, e em vários outros posters do projeto TAMAR, de preservação ambiental, foi de responsabilidade da Secretaria de Cultura de Salvador, e produzidos por alunos voluntários da UFBa, do Curso de Letras ou Turismo, os quais, portanto, também já tinham completado as fases esperadas de aprendizagem formal da L2 (anexo A), portanto sedimentado o seu conhecimento da normas da mesma. Cartaz explicativo-indicativo no PROJETO TAMAR, Salvador, Bahia abril/2009 Fonte: Pesquisa de campo 2009. Outros posters, contendo mais exemplos dos mesmos tipos de desvio, colhidos neste universo, podem ser encontrados a seguir: 92 Fonte: Foto tirada pelo autor no Projeto Tamar, em Salvador /BA, em Abril de 2009. Pesquisa de campo/2009. NOTA: nota-se, na segunda linha, a falta do particípio, na voz passiva, isto é, onde se lê protect, deveríamos ter protected. 93 Fonte: Foto tirada pelo autor, no projeto Tamar, Salvador/BA, em Abril de 2009. Pesquisa de campo/2009. NOTA: observa-se a falta da inflexão da terceira pessoa do singular, o sufixo –s, na primeira linha, onde se lê strengthen, deveríamos ter strengthens. Além destes registros fotográficos, também segue abaixo um e-mail recebido pelo autor de uma pessoa que, mesmo com grau de instrução superior completo, todo o processo de instrução formal de língua inglesa finalizado, intercâmbio feito no exterior, apresenta desvios devido à interferência da língua materna, alguns 94 dos quais estão sinalizados em cor vermelha. O autor do e-mail nos autorizou a utilizá-lo de forma nomeada. RES: Aluguel SP albertomartins ([email protected]) De: Enviada:quarta-feira, 2 de dezembro de 2009 12:37:05 Edila Porto ([email protected]); Jorge Resque Para: ([email protected]); [email protected] ([email protected]) albertomartins ([email protected]); [email protected] ([email protected]); Cc: [email protected] ([email protected]) Folks, hello!!! I´m answering all 4 msgs here okay... I see Edilinha is way too much worried about how to locate Arthurzinho and obviously I don´t blaim her...; anyhow, please let´s not antecipate any suffer on this matter okay - not because it isn´t something to be worried about, but because it won´t do any good and I´m sure it will be solved soon. Well, I´ve already talked with Edilinha and need to tell all the others that to me and my family the possibility of Arthurzinho and some roomate live at our apartmente is a great new, so we´ll do whatever is on our hands to help so I would like to tell Arthurzinho thay probably we´ll not come back to this apartment because after a 5 years period we will be living in Sto Andre, we´ll return to São Paulo (that´s for sure!) but probably to any place very near to Paola´s school, so they can be here for a long period, if they need and want to, besides we won´t mind if they paint the walls, the ceilling or the floor... Other thing - that has no relation on coming or not to live in our apartment - is that all you guys are invited to stay at our home during while you´ll be in São Paulo - to bad we´ll travel to Belem at the very same day you´ll arrive here; other thing is that it would do some good if you guys should visit the 2 apartments in our building - one is for rent and the other for sale - as well as talking to Fernando, that guy Edilinha meet and that told us (and keep on saying it) that was preparing to move because I would like very much if we could by one of these apartments together (so I rent ap 41 to anyone and Arthur and his roomate move to this other building unit). note: I decided to test my writen English; probably there are many mistakes!!! (don´t mind to point them, only answer in English, so I get some practice) kisses, Alberto Filho, Miriam & Paola Keeping in Touch - answering Jorge´s & Edila´s msgs albertomartins ([email protected]) De: 95 Enviada:quarta-feira, 2 de dezembro de 2009 15:46:03 [email protected] ([email protected]); [email protected] Para: ([email protected]); [email protected] ([email protected]) albertomartins ([email protected]); [email protected] ([email protected]); Cc: [email protected] ([email protected]) Hi Jorge, Please do use my messages (the one I sent this morning and all other, inc this very one) as data for your academic work, as well as for your classes, if it would fit for some reason; I will be happy to take part (a veru tinny part, of course) on the best English academic work in Para (or should I write in Brasil - rsrsrs). Thanks for the correction on the "blaim" and for offering to exchange e-mails in English; I think I worte as I spelled the word; thanks for your words too - actually I understand basically everything, writen or spoken, write regular as you are seeing, but unfortunatelly lost most of my English spoken skills, what is a shame. Well, reading all the messages Edilinha wrote I was wondering how you (didn´t) slept yesterday - you should had called me. Be sure that if it happens that Arthurzinho live in our home, we will be doing something good to all concerned - I learned only to do business like that, so it´s only the case keep in touch and finding someone to live with Arthur (by the way, I think that sharing a place is the best option to him). So, I hope and believe that Proenças won´t do anything else to let the situation worst - especially related to the date Arthurzinho will move - but if something happen that make you guys (or himself) prefer to move, don´t concern too much either - he can stay with us for a while and I also can rush renting the apartment in Sto Andre (actually we already have onde in mind and it´s owned by a Miriam´s client that is keeping it for us, so we really can move soon) and I´ll also understand if for sometime Arthurzinho have to live alone (naturally paying only his part on the deal) so DON´T WORRY! Being father is an excellent experience; in my case, my feelings for Paola grow everyday and we keep on learning each other more and more so its getting easier too. All messages I send (and sent) are being copyied to Miriam but I will know how much she´s understanding only at night; by now I only want to say that she was at home when Edilinha called and I told her about our conversation and she´s as happy as I am; also need to say that she loves being mom too (if I don´t write this, she´ll probably get mad). We hope you enjoy your stay in São Paulo and in our home; I remind you we have 2 places to park and only one will be occupied, so be our guests to use a car and park it here (by my office´s window). p.s.: I was almost sending this msg when I saw Edila´s msg, so I add to what I wrote above to say that Miriam´s client apartment is brand new, they are with the keys since middle of november and just waiting for us; by the other hand, it would bee way too crasy for me and Miriam move before we come back from Belem and at 96 that time we´ll need somedays to move all the things - but to our commodity, moving during the beggining of 2010 is the best option, because work will be lighter; anyhow we decorated Paola´s room with wall paper and I think it´s my obligation to remove it and paint and I only have to do that after Paola has moved, so, as our conversation is getting more specific, a option that is clearing in my mind and that I would share with you is: Arthurzinho comes to our apartment whenever he needs (eventually stays with us a couple of days - depending on the day he comes, for a couple of weeks); As soon as Paola has moved, I begin whatever will be done (painting, etc...), maybe with Arthurzinho already living in the apartment (I think there isn´t much to be done, but you´ll guys have to see and talk to me about that); During the time Arthurzinho will be living alone, you pay me his part on the deal and I get using the garage and sleeping at the apartment (probably won´t happen but might happen one day or the other, specially during the painting). Some other thing is that I would like to know what he has in common with Caio before they start sharing these goods, because (i) there are some spaces that were thought according to our things (for example: the washing machine spot) and (ii) the place we probably will move to is as big as our apartment, bus we may have to leave some of our things and we´ll be help to leave to him. After all, I need to remind that my folks (Alfredo, excluded) don´t know about our plain yet, so I need to ask you how decided you are to do this thing, because if it will happen I must (i) talk with Miriam´s cliente as soon as posible and (ii) talk to my folks, so that my mom won´t run naked & crying at Doca. Best regards (your message remind me this ending...) Alberto de Oliveira Martins Filho OAB/SP 141.536 B Estas ocorrências apontam no sentido de que, mesmo tendo-se concluído o processo de aprendizado formal da segunda língua, essas manifestações tendem a permanecer. Na fase investigativa da pesquisa colhemos dados a partir de observações e registros feitos nos universos escolhidos, por análise visual e contagem de frequência de ocorrência das manifestações investigadas, a partir da produção do discurso escrito dos alunos selecionados como amostra. A princípio foram escolhidos 150 sujeitos, de forma aleatória, 50 em cada grupo de três níveis que compunham os ciclos de estudos definidos como BÁSICO (Básico 1, Básico 2 e Básico 3); 50 no ciclo INTERMEDIÁRIO (Intermediário 1, Intermediário 2 e Intermediário 3); e 50 no ciclo AVANÇADO (Avançado 1, Avançado 2 e Avançado 3) do CCBEU, em turnos de estudos diferentes (manhã, tarde e noite), o que garantiu a análise da variável relacionada 97 à faixa etária, posto que, neste universo, nos turnos da manhã e da noite os sujeitos possuem idade cronológica variada, sendo o turno da noite composto na maioria por adultos; já no da tarde os sujeitos encontram-se na faixa etária dos 10 aos 18 anos de idade. A distribuição dos níveis de estudo é total nos vários turnos, isto é, o CCBEU tem todos os níveis, em todos os horários, exceto o noturno, onde a frequência dos adolescentes é muito pequena, o que garante a confiabilidade da variável denominada nível de aprendizagem da Língua Inglesa (L2), bem como aquela que chamamos grau de instrução, posto que, no horário matutino e noturno temos também estudantes universitários e profissionais de diversas áreas. Como o CCBEU tem progressão semestral e, levando-se em conta a desistência e a reprovação, o número correspondente a este total era descartado, a cada semestre, e a diferença deste era recomposta, também de forma aleatória, para garantir a variável continuidade dos estudos, mantendo-se a amostra sempre com um total de 150 sujeitos, em cada ciclo de estudos. Também foi preciso verificar quais destes sujeitos já estavam na Universidade para garantir que os mesmos não seriam escolhidos em duplicata no segundo universo estudado, a UNAMA. No quadro abaixo encontramos a evolução do total dos alunos matriculados no CCBEU ao longo de 2005 a 2009, por nível de aprendizagem. Quadro 1 - Evolução do total de alunos, por nível, de 2005 a 2009, no CCBEU Nº alunos 2005 2006 2007 2008 2009 SEMESTRE 1º 2º 1º 2º 1º 2º 1º 2º 1º 2º BASICO 01 111 41 121 30 141 34 82 33 80 95 BÁSICO 02 * 105 56 121 53 134 45 70 43 45 BÁSICO 03 63 21 99 47 100 54 161 153 126 112 INTERMEDIÁRIO 01 180 167 153 146 107 143 134 144 132 125 INTERMEDIÁRIO 02 149 153 137 137 136 104 148 132 137 118 INTERMEDIÁRIO 03 * 140 147 136 123 133 88 122 105 AVANÇADO 01 161 124 241 167 164 164 192 138 158 150 97 98 AVANÇADO 02 132 141 119 221 155 140 151 178 125 110 AVANÇADO 03 157 110 128 114 192 139 143 125 152 145 AVANÇADO 04 99 127 97 110 94 165 126 123 103 96 Fonte: Centro Cultural Brasil-Estados Unidos, Dept. Pedagógico, Maio/09. No segundo universo escolhido para a pesquisa, a Universidade da Amazônia (UNAMA), nos cursos anteriormente mencionados, em que o aprendizado da língua inglesa é considerado essencial para a formação de graduação dos alunos, constando de quatro a seis semestres letivos, em diversos níveis de aprendizagem, da mesma forma, foram escolhidos 150 sujeitos, aleatoriamente, 50 em cada curso, em vários semestres, tendo-se o cuidado de confirmar que os mesmos não estudavam no CCBEU. Como muitos alunos destes cursos já estudaram Inglês como Língua Estrangeira (L2), também foi preciso escolher alguns sujeitos que nunca houvessem feito um Curso de Inglês de forma regular, os quais foram considerados Nível Básico, no primeiro semestre (ingressantes do vestibular), e corresponderam a aproximadamente 50% da amostra total. Como a progressão dos Cursos citados é semestral, aqueles sujeitos que não continuaram seus estudos, ou foram reprovados, foram descartados e o restante da amostra recomposto de forma aleatória por outros sujeitos, procedimento este semelhante ao adotado para o primeiro universo pesquisado. O total deste universo está representado nos quadros a seguir: Quadro 2 - Evolução do total de alunos, por semestre, de 2005 a 2009, no CURSO DE LETRAS, da Universidade da Amazônia (UNAMA) SÉRIES SEMESTRES 2005.1 2005.2 2006.1 2006.2 2007.1 2007.2 2008.1 2008.2 2009.1 2009.2 1º 2º 3º 4º 5º 6º 7º 8º 108 30 116 41 87 43 42 45 - 56 74 31 73 18 53 35 43 51 159 56 67 28 68 21 44 32 28 - 99 70 134 26 17 62 20 43 25 43 62 47 58 11 54 12 35 29 70 43 59 18 54 16 42 78 49 56 19 60 27 66 61 68 43 75 Fonte: Secretaria Geral da Universidade da Amazônia – Set/2009. 99 Quadro 3 - Evolução do total de alunos, por semestre, de 2005 a 2009, no CURSO DE SECRETARIADO EXECUTIVO BILINGUE, da Universidade da Amazônia (UNAMA) SÉRIES SEMESTRES 2005.1 2005.2 2006.1 2006.2 2007.1 2007.2 2008.1 2008.2 2009.1 2009.2 1º 2º 3º 4º 5º 6º 52 28 47 46 23 31 - 46 26 32 35 29 27 63 41 23 28 28 18 - 23 35 30 30 27 25 22 31 24 25 28 - 20 30 23 28 27 Fonte: Secretaria Geral da Universidade da Amazônia – Set/2009. Quadro 4 - Evolução do total de alunos, por semestre, de 2005 a 2009, no CURSO DE RELAÇÕES INTERNACIONAIS, da Universidade da Amazônia (UNAMA) SÉRIES SEMESTRES 2005.1 2005.2 2006.1 2006.2 2007.1 2007.2 2008.1 2008.2 2009.1 2009.2 1º 2º 3º 4º 5º 6º 7º 8º 95 39 82 42 76 56 - 52 28 55 26 63 45 47 23 44 17 54 - 39 28 36 15 45 36 24 31 12 33 26 32 32 22 32 Fonte: Secretaria Geral da Universidade da Amazônia – Set/2009. A intenção ao escolhermos dois contextos diferenciados para nossa investigação se deve à necessidade de comparar nossas observações no intuito de encontrar maior segurança para a avaliação de nosso objeto de estudo, dentro de nosso universo, na mensuração e análise de nossas variáveis, que são as seguintes: 100 a) faixa etária dos sujeitos; b) nível de aprendizagem da Língua Inglesa; c) grau de instrução; d) nível de autonomia e criatividade; e) continuidade dos estudos. Essa comparação é possível porque em ambos os contextos, a progressão dos níveis de aprendizagem ocorre de forma semestral, e os cursos levam aproximadamente o mesmo tempo para serem concluidos, isto é, na UNAMA, os cursos de Letras, Secretariado Executivo e Relações Internacionais têm duração de 8, 6 e 8 semestres, respectivamente; no CCBEU, a progressão se dá da mesma forma, e o curso tem duração média de 4 anos, ou seja, 8 semestres. Os conteúdos programáticos, em cada semestre, têm equivalência quase total, o que garantiu a confiabilidade dos contrastes realizados, em cada amostra, bem como a contagem total das manifestações como estatística única. O objetivo é mostrar, mediante os registros de observações que as interferências da Língua Materna (L1) sobre a aprendizagem da Segunda Língua (L2) tendem a permanecer ao longo do tempo, independente dos conteúdos já alcançados, e são recorrentes, isto é, do mesmo tipo, provocando os mesmos desvios, podendo resultar no fenômeno chamado de fossilização, gerando dificuldades tanto para a obtenção da competência linguística quanto na obtenção da competência comunicativa, isto é, tal influência não se dissipa, mesmo depois de um longo período de aprendizagem e exposição ao segundo sistema. Assim, podemos observar, a seguir, algumas manifestações produzidas pelos sujeitos aqui descritos: universo investigado: UNAMA Data: 16/03/2009 Nível de Aprend. na L2: Básico Prof. A Manifestação – falante 1. “I’M A SECRETARY EXECUTIVE”. x “Eu sou uma Secretária Executiva” CORRETO: I’m an executive secretary. Nesse exemplo, como se pode observar, o falante utiliza uma sintaxe equivocada, na L2, isto é, o substantivo vem antes do adjetivo, como é o ‘correto’ na 101 L1, embora não sendo assim na L2, onde o adjetivo deve vir na frente do substantivo, ocasionando assim um desvio da norma dita culta na L2. No segundo exemplo, a seguir, podemos observar um problema semelhante: Universo Investigado: CCBEU DATA: 16/03/2009 Manifestação – falante 1 “MY JOB IS TEACHER” Nível de Aprend. na L2: Básico Prof. B x “Meu trabalho é professor” CORRETO: I am a teacher. Nesse caso, houve o emprego de uma estrutura que não se utiliza na L2 para expressar atividade de trabalho, quando se deve usar o verbo ser (TO BE - AM) com o pronome pessoal reto (I). Mais uma vez, a L1 ocasionou um desvio na norma ‘dita’ culta da L2, embora neste caso, não tenha havido prejuízo de sentido, isto é, a comunicação se fez sem maiores comprometimentos. Universo Investigado: UNAMA Data: 26/05/2009 Manifestação – falante 2. HAVE/HAS A LOT OF EMPLOYEES HERE. Nível de Aprend. na L2: Básico Prof. A x “Tem muitos funcionários aqui”. CORRETO: THERE ARE A LOT OF EMPLOYEES HERE. No supra, houve a utilização do verbo ter (em Inglês HAVE/HAS) como sinônimo do verbo haver (em Inglês THERE IS/ARE), o que é possível em Português (L1), mas não é aceito na Língua Inglesa (L2), o que novamente acarreta um desvio da norma ‘dita’ culta da L2 pela interferência da L1. Universo Investigado: CCBEU Data: 26/05/2009 Nível de Aprend. na L2: Básico Prof. A Manifestação – falante 2. Is good business. x “É um bom negócio”. CORRETO: IT IS GOOD BUSINESS. 102 Neste caso particular, o falante omitiu o sujeito da frase e começou a mesma com o verbo SER conjugado, como é possível em Português. Contudo, em Inglês, tal uso não é correto e a aplicação do pronome neutro IT é essencial. Embora não haja comprometimento da comunicação, nota-se claramente a influência da L1 sobre a L2. Como se pode observar, alguns desvios provocados pela interferência da Língua Materna (L1) sobre a Língua Estrangeira (L2), podem ser causados pela sedimentação das regras do sistema da Língua Materna (L1), trazendo ou não problemas de comunicação. Temos a seguir uma lista das principais manifestações observadas em nossa investigação, quando da performance de, pelo menos, 90% dos falantes observados nos dois universos considerados, porcentagem bastante significativa se considerarmos as noções de autonomia e criatividade já mencionadas como variáveis possíveis destas manifestações, as quais puderam ser dimensionadas pela extensão dos trabalhos considerados para efeito de nossa investigação, onde houve a seleção de produção escrita com um mínimo de 15 linhas, o que para os parâmetros da aprendizagem da Língua Estrangeira representa uma boa dose de exploração dos conteúdos linguísticos estudados. a) WHAT’S YOUR DEPARTAMENT? b) WHAT’S YOUR RESPONSABILITY? c) I’M A SECRETARY EXECUTIVE. d) WHAT’S DOES YOUR JOB INVOLVE? e) MY JOB IS SECRETARY. f) WHAT’S YOUR JOB? SECRETARY EXECUTIVE. g) WHAT DOES YOUR JOB INVOLVES? IT’S INVOLVES... h) WHAT’S YOUR NAME? i) I WORK IN/AT UNAMA. j) I’M GO TO THE OFFICE. k) I’M WENT TO THE OFFICE. l) IS GOOD BUSINESS m) MY COMPANY IT’S BIG. n) HAVE/HAS A LOT OF EMPLOYEES IN MY COMPANY. o) WE WILL/CAN BUY NEW EQUIPMENT. 103 p) WE SHOULD DOES MORE PRODUCTION. q) I WORK FOR INDUSTRY OF FOOTWEAR. r) WHEN IS A SECRETARY CONFERENCE? s) IN EXAMPLE OF MEXICO IS IMPORTANT... A frequência de cada um dos desvios listados antes, em função de cada uma das variáveis determinadas para análise do objeto, dentro de cada uma das amostras, é apresentada nas tabelas e nos gráficos (elaborados a partir dos resultados da pesquisa de campo) a seguir: a) Faixa etária dos sujeitos. Tabela 1 - Frequência de ocorrência dos desvios analisados de acordo com a faixa etária UNIVERSO CCBEU UNAMA A, b, c, d 90% 87% e, f, g, h 85% 92% VARIAÇÃO i, j, k, l 80% 84% m, n, o, p 89% 80% q, r, s 70% 70% Gráfico 1 - Frequência de ocorrência dos desvios analisados de acordo com a faixa etária 104 b) Nível de aprendizagem da Língua Inglesa. Tabela 2 - Frequência de ocorrência dos desvios analisados de acordo com o nível de aprendizagem da L2 UNIVERSO CCBEU UNAMA A, b, c, d 70% 57% e, f, g, h 65% 42% VARIAÇÃO i, j, k, l 50% 34% m, n, o, p 39% 20% q, r, s 20% 10% Gráfico 2 - Frequência de ocorrência dos desvios analisados de acordo com o nível de aprendizagem da L2 c) Grau de instrução. Tabela 3 - Frequência de ocorrência dos desvios analisados de acordo com o grau de instrução UNIVERSO CCBEU UNAMA A, b, c, d 80% 77% e, f, g, h 75% 52% VARIAÇÃO i, j, k, l 80% 34% m, n, o, p 59% 20% q, r, s 70% 20% 105 Gráfico 3 - Frequência de ocorrência dos desvios analisados de acordo com o grau de instrução d) Nível de autonomia e criatividade. Tabela 4 - Frequência de ocorrência dos desvios analisados de acordo com o nível de autonomia e criatividade UNIVERSO CCBEU UNAMA A, b, c, d 92% 88% e, f, g, h 85% 90% VARIAÇÃO i, j, k, l 85% 84% m, n, o, p 80% 80% q, r, s 80% 75% 106 Gráfico 4 - Frequência de ocorrência dos desvios analisados de acordo com o nível de autonomia e criatividade e) Continuidade dos estudos. Tabela 5 - Frequência de ocorrência dos desvios analisados de acordo com a continuidade de estudos UNIVERSO CCBEU UNAMA A, b, c, d 50% 37% e, f, g, h 45% 42% VARIAÇÃO i, j, k, l 30% 34% m, n, o, p 20% 10% q, r, s 20% 15% 107 Gráfico 5 - Frequência de ocorrência dos desvios analisados de acordo com a continuidade de estudos 108 109 110 111 112 113 114 115 116 117 118 4.1 ANÁLISE DOS DADOS Todos os resultados da frequência de manifestação dos desvios investigados demonstram que, independente da faixa etária e, portanto, do nível de instrução na Língua Materna (L1), isto é, do maior ou menor grau de solidificação do sistema linguístico da L1, este causa os mesmos tipos de desvio por interferência da L1 sobre a produção da L2. Pode-se observar também que, quanto maior é a experimentação com a L2 (autonomia e criatividade), maior é a frequência da manifestação investigada. Em contrapartida, se o sujeito permanece no estudo da L2, ou seja, se existe continuidade de estudos, a frequência das manifestações cai consideravelmente, embora continue ocorrendo. Tal fato nos leva a crer que é possível criar mecanismos remediais para tentar minimizar ou até mesmo eliminar a interferência da L1 sobre a produção da L2. A investigação também aponta no sentido de que os desvios mais básicos, isto é, aqueles relacionados com as estruturas mais básicas da Língua são mais frequentes em todas as análises feitas, de acordo com todas as variáveis. E, ainda com relação aos mecanismos de correção que os alunos possam empregar no sentido de eliminar as interferências e a ocorrência dos desvios registrados, podemos dizer que: Os alunos não produzem mecanismos de autocorreção por entenderem, automaticamente, que sua produção esteja correta; Os métodos de ensino-aprendizagem não estabelecem análises contrastivas sobre o que pode ser considerado um desvio; Os livros e outros materiais didáticos não levam em conta as manifestações linguísticas inerentes a cada realidade de aplicação dos mesmos. Alguns outros exemplos das amostras do objeto de nossa investigação estão no anexo A. 119 CONSIDERAÇÕES FINAIS Toda e qualquer pesquisa relacionada ao aprendizado de uma segunda língua é difícil pois até hoje não se conseguiu chegar a respostas convincentes sobre uma série de perguntas, dentre as quais, por exemplo, está a de como se dá a interferência de uma língua sobre a outra e quais suas consequências. Sempre que se pensa, avalia, ou debate a produção linguística, até hoje, esta e outras perguntas, como com que frequência os desvios ou erros provocados por esta interferência acontecem, continuam sem resposta. Apesar de toda a evolução da sociolinguística, da psicolinguística, dos estudos da mente humana e do funcionamento do cérebro humano, ainda há uma série de pontos não totalmente esclarecidos com relação às etapas de aprendizagem de uma segunda língua, por exemplo. O que se pode dizer com certeza (análise contrastiva) é que a língua materna exerce influência sobre a produção da segunda língua, até ao ponto de produzir manifestações que podem se fossilizar, caso não se dê a elas o devido tratamento. Os resultados encontrados nesta pesquisa conduzem a uma reflexão bastante profunda sobre não como as coisas acontecem, mas o que se pode fazer no sentido de minimizar este impacto. Ao observar a frequência de determinadas manifestações, claramente concretizadas pelo forte pensamento na língua materna, e não na segunda língua, deve-se concluir sobre a necessidade de preparar materiais didático-pedagógicos que combatam tal tendência. Ao constatarmos que, mesmo depois de concluído o processo de aprendizagem, as manifestações continuam a ocorrer, mesmo diante de todas as informações ao dispor dos autores e estudiosos da língua, os pensamentos metodológicos na condução dos programas de aprendizagem da língua inglesa continuam ineficazes na direção de remediar os desvios resultantes da influência da língua materna. Parece-nos de extrema importância que os estudiosos do processo de aprendizagem de uma segunda língua, especialmente o inglês, e, portanto, autores e escritores de material didático-pedagógico busquem formas de incluir em seus programas cada vez mais informações que proporcionem ao falante usuário da língua materna fazer comparações que o ajudem a desenvolver um pensamento cognitivo dentro da língua que esteja aprendendo, buscando eliminar, ou minimizar, a interferência da língua materna no aprendizado da segunda língua. 120 Então, a importância de qualquer pesquisa que busque investigar e esclarecer a real interferência de um sistema linguístico sobre o outro, ou seja, que os padrões lingüísticos de uma determinada língua não se transferem para a outra, bem como os desvios que tal interferência provoca e sua freqüência, é irrefutavelmente relevante para a aprendizagem bem sucedida de uma segunda língua. Esperamos, assim, que este trabalho tenha trazido alguma ‘luz’ sobre esta questão e possa ser útil para todos os que estão neste campo de trabalho. Sabemos que alguma definição sobre este assunto ainda está longe de ser alcançada. Os grandes linguistas e estudiosos da atualidade continuam aprimorando seus estudos sobre o assunto e seu fascínio sobre as teorias da aprendizagem continua vivo. Assim, nossa intenção é oferecer aos pesquisadores, professores e alunos um material que conduza a uma reflexão profunda sobre o tipo de ‘remédio’ que podemos aplicar, de forma antecipatória, sobre o processo de aprendizagem da língua inglesa, a partir do conhecimento das teorias de aprendizagem da primeira língua, embora saibamos que, conforme nos diz Celani (2009) 1. Já baseamos as aulas em tradução e em gramática, mas hoje sabemos que cabe ao professor analisar a turma para atuar bem; 2. Não há uma receita no ensino de Língua Estrangeira; 3. Não existe um método perfeito. A saída agora é entender por quê, para quê, como e o que ensinar – nessa exata ordem; 4. O professor precisa estar preparado para enxergar como um pesquisador da própria prática. A reflexão proporciona isso. (CELANI, 2009, p. 40-44). Concluindo, podemos dizer que um falante só consegue dominar uma segunda língua quando efetivamente pensa nesta língua. 121 REFERÊNCIAS . ADAMS, M. L. Five co-occurring factors in speaking proficiency. In: FRITH, James. Measuring spoken language proficiency. Washington, D.C.: Georgetown University Press, 1980. ALLWRIGHT, R. Language learning through communication practice. ELT Documents 76/3. London: The British Council, 1977b) ANTUNES, Celso. Como desenvolver as competências em sala de aula. 5. ed. Petrópolis: Vozes, 2001. BAGNO, Marcos. Norma linguística. São Paulo: Loyola, 2001. ______. Preconceito linguístico: o que é, como se faz. 22 ed. São Paulo: Loyola, 2003. ______. Erro sobre ‘erro’. 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